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Dentifrícios infantis comercializados no município de Londrina/PR, Brasil: análise da rotulagem segundo especificações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
Children’s toothpastes commercialized in Londrina/PR, Brazil: labeling analysis according to specifications of the National Health Surveillance Agency
Vigilância Sanitária em Debate, vol. 9, núm. 3, pp. 107-113, 2021
INCQS-FIOCRUZ

ARTIGO


Recepção: 03 Agosto 2020

Aprovação: 19 Janeiro 2021

DOI: https://doi.org/10.7440/res64.2018.03

RESUMO

Introdução: Devido à grande variedade de formulações químicas entre os dentifrícios infantis e à possibilidade de apresentarem ou não o flúor (F) em sua composição, a vigilância é essencial para o controle da qualidade desses produtos.

Objetivo: Analisar a rotulagem e as informações presentes em dentifrícios infantis, disponíveis comercialmente, segundo especificações das Resoluções nº 07, de 10 de fevereiro de 2015, e nº 79, de 28 de agosto de 2000, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Método: Estudo transversal realizado por meio da análise da disponibilidade, preço e avaliação das embalagens (primárias e secundárias) de dentifrícios infantis à venda no município de Londrina, localizado no Norte do Paraná, Brasil. Os produtos foram adquiridos no mês de maio do ano de 2019. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva.

Resultados: Foram avaliados 11 dentifrícios infantis dos quais 73,0% (oito) apresentaram concentração convencional de F (≥ 1.000 ppm F), 9,0% (um) baixa concentração de F (500 ppm F) e 18,0% (dois) eram sem F. O valor do grama do dentifrício sem F foi cerca de três vezes maior que o dos demais produtos. Todos os dentifrícios analisados atendiam às normas estabelecidas pela Resolução nº 79/2000 e 82,0% (nove) estavam em consonância com as exigências da Resolução nº 07/2015.

Conclusões: Há uma ampla oferta de dentifrícios infantis no mercado que, em sua grande maioria, encontra-se de acordo com as normas da Anvisa sobre composição e rotulagem. Contudo, ressalta-se a importância da vigilância desses produtos para a garantia do máximo efeito no controle da cárie dentária e o mínimo risco para o desenvolvimento de fluorose dental.

Palavras chave: Dentifrícios, Fluoretação, Legislação em Saúde, Vigilância Sanitária, Cárie Dentária.

ABSTRACT

Introduction: Due to the wide variety of chemical formulations among children’s toothpaste and the possibility of having fluoride in its composition, surveillance is essential for quality control of these products.

Objective: To analyze the labeling and recommendations in commercially available children’s toothpastes, according to Resolutions No. 07, 10 February, 2015 and No. 79, 28 August, 2000, published by the National Health Surveillance Agency (Anvisa).

Method: This is cross-sectional study carried out to analyze the availability, price and packaging (primary and secondary) of children’s toothpaste for sale in Londrina, located in the north of Paraná, Brazil. The products were purchased in May of 2019. Data were analyzed using descriptive statistics.

Results: Eleven children’s toothpastes were evaluated and 73.0% (8) had conventional fluoride concentration (≥ 1,000 ppm F), 9.0% (1) low fluoride concentration (500 ppm F) and 18.0% (2) did not have fluoride. The gram value of fluoride-free toothpaste was about 3 times greater than the other products. All dentifrices analyzed met the standards determined by Resolution No. 79/2000 and 82.0% (9) were in line with the requirements of Resolution No. 07/2015.

Conclusions: There was a wide offer of children’s toothpaste on the market and, the most part of these toothpastes was in accordance with Anvisa’s rules concerning composition and labeling. However, it is important to emphasize the importance to have a frequently monitoring of these products to keep an effective dental caries control and to guarantee the minimum risk for dental fluorosis.

Keywords: Toothpastes, Fluoridation, Health Legislation, Health Surveillance, Dental Caries.

INTRODUÇÃO

Os dentifrícios são formulados com uma diversidade de componentes, como: sistemas abrasivos, detergentes, flavorizantes, solventes, umectantes, aglutinantes, edulcorantes e conservantes1 . Apesar de terem sido rotulados como cosméticos no passado, atualmente, os dentifrícios têm assumido um papel terapêutico importante, principalmente no controle da cárie dentária. Nesse sentido, a escovação com dentifrícios fluoretados tem sido apontada como um dos principais fatores responsáveis pelo declínio da cárie dentária em países desenvolvidos e em desenvolvimento, como o Brasil2 . Isso tem sido atribuído ao fluoreto agregado às formulações, que age reduzindo os processos de desmineralização e ativando a remineralização das estruturas dentais3 . Todavia, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), esses produtos ainda permanecem vinculados à categoria de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes4 .

Diferentes formulações químicas de dentifrícios estão disponíveis no mercado, dentre as quais se encontram aqueles direcionados ao público infantil, que podem apresentar ou não o F em suas composições. As concentrações de F, quando presentes nesses dentifrícios, também se mostram bastante variadas5 . Nesse sentido, revisões sistemáticas da literatura têm concluído que esses produtos devem conter uma concentração de pelo menos 1.000 ppm de flúor (F) para terem efeito no controle da cárie dentária e que essa concentração deve estar em forma quimicamente solúvel para que o fluoreto possa interferir de modo efetivo no processo de desmineralização e remineralização da superfície dentária6 , 7 , 8 . Especificamente em relação à dentição decídua, revisões sistemáticas que incluíram apenas ensaios clínicos com pré-escolares encontraram evidências para redução significativa no incremento de cárie a partir de 1.000 ppm F, quando comparados aos dentifrícios sem F ou com menos de 600 ppm F7 , 8 .

Diante desses aspectos, a vigilância dos dentifrícios torna-se cada vez mais importante para o controle da qualidade dos produtos disponíveis comercialmente e daqueles distribuídos pelos serviços públicos de saúde bucal no Brasil7 , 8 , 9 . Para isso, atualmente encontram-se vigentes Resoluções da Anvisa4 , 10 que regulamentam os produtos para higiene bucal, dentre eles os dentifrícios. Em relação à concentração de F, a Resolução nº 79, publicada em 28 de agosto de 2000 pela Anvisa10 , determina apenas a concentração máxima total presente nas formulações, que não deve exceder 0,15% expresso em F (1.500 ppm F) e também especifica os diversos sais de F que podem ser utilizados em dentifrícios. Além disso, exige que no rótulo dos dentifrícios estejam claramente expressos o nome e a concentração do composto de F adicionado, bem como o modo de uso. Entretanto, essa Resolução não informa quanto de flúor solúvel (potencialmente ativo contra cárie) um dentifrício deveria conter e manter ao longo do seu prazo de validade10 .

Quanto à definição, classificação, aos requisitos técnicos de rotulagem e procedimento eletrônico para regularização de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes, a Anvisa publicou a Resolução n° 7, em 10 de fevereiro de 20154 . Essa Resolução define todas as indicações necessárias referentes aos produtos e também as informações indispensáveis que devem figurar nos rótulos concernentes a sua utilização, como: a descrição dos componentes da fórmula por meio de uma designação genérica, a identificação precisa da empresa fabricante, o período de tempo em que o produto consegue manter suas propriedades se utilizado e armazenado da maneira adequada e o número de registro da mercadoria para comprovar a sua autorização de comercialização4 . Essa normativa foi alterada pela Resolução nº 288, de 4 de junho de 2019, tendo-se, contudo, poucas modificações no que se refere aos componentes dos invólucros11 .

Dessa forma, considerando a importância de se equilibrar benefícios e riscos no uso de dentifrícios e a necessidade de que os rótulos desses produtos contenham informações claras e seguras sobre as suas características, o objetivo do presente estudo foi analisar a rotulagem e as informações presentes em dentifrícios infantis disponíveis comercialmente, verificando a sua conformidade com as especificações estabelecidas pelas Resoluções nº 7/20154 e nº 79/200010 , publicadas pela Anvisa.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal realizado por meio da análise de disponibilidade, preço e avaliação das embalagens de dentifrícios infantis comercializados no município de Londrina, localizado na região Norte do estado do Paraná, Brasil. Para isso, cinco estabelecimentos comerciais de grande porte foram visitados para levantamento inicial dos dentifrícios disponíveis para venda. Com base nesse levantamento, foi selecionado para a realização da compra o estabelecimento com a maior variedade de dentifrícios infantis, tratando-se de um supermercado. Ainda nesse aspecto, optou-se por adquirir todos os produtos em um local específico para possibilitar a análise da precificação, evitando variações relativas às margens de lucro empregadas pelos diferentes comércios. Os produtos foram adquiridos no mês de maio do ano de 2019, sendo a amostra composta por um total de 11 dentifrícios infantis.

Os dados foram coletados a partir da análise da rotulagem dos produtos de embalagens primárias e secundárias. Conforme a Anvisa, entende-se como embalagem primária o envoltório ou recipiente que se encontra em contato direto com os produtos, e embalagem secundária aquela destinada a conter a(s) embalagem(ns) primária(s)4 . Para garantir o sigilo das marcas/nomes comerciais dos dentifrícios analisados neste estudo, foi adotada uma codificação alfanumérica, utilizando a letra D (dentifrício) seguida da numeração correspondente à ordem de análise (D01 até D11).

Para a coleta, considerou-se os critérios descritos na Resolução nº 7/20154 , descritos no Quadro 1 , e na Resolução nº 79/200010 , ambas publicadas pela Anvisa. Para organização e tabulação dos dados foram construídos dois instrumentos. O primeiro instrumento foi composto por informações relativas ao nome do produto/conteúdo, à marca do produto, ao prazo de validade, ao modo de uso, à concentração e tipo de F/abrasivo e ao preço do produto/peso (g). No segundo instrumento foram abordadas as recomendações e precauções presentes nas embalagens dos dentifrícios analisados. A extração dos dados das embalagens foi realizada de forma sequencial por produto, conduzida por um único pesquisador, previamente treinado.

Quadro 1
Itens da rotulagem obrigatória segundo a Resolução nº 7, de 10 de fevereiro de 2015.

Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva, valores absolutos e percentuais, verificando o cumprimento dos principais requisitos nas embalagens primárias e secundárias dos produtos. Para isso, utilizou-se o software Microsoft Excel®.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Resolução nº 7/20154 da Anvisa tem como objetivo estabelecer as informações indispensáveis que devem figurar nos rótulos dos produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes, concernentes a sua utilização, assim como toda a indicação necessária referente ao produto, tanto em embalagens primárias como em secundárias, determinando que contenham informações e advertências referentes ao produto conforme legislação vigente. Em junho de 2019, porém, instituiu-se a Resolução nº 288 da Anvisa11 , alterando alguns aspectos da normativa anterior. Especificamente sobre a arte das embalagens, acrescentou-se a exigência de que as informações sejam legíveis e que os produtos importados cujos rótulos originais não contenham os dados requeridos pelas normas brasileiras sejam readequados previamente à sua comercialização.

Nesse sentido, dos 11 dentifrícios analisados neste estudo, dois apresentavam apenas embalagens primárias, enquanto os outros nove possuíam embalagem primária e secundária. Em todas as embalagens foram encontradas as informações referentes ao lote ou partida, número de registro do produto, país de origem e dados do fabricante, conforme a recomendação da Resolução.

No Quadro 2 são apresentados os dados coletados por meio das embalagens, organizados de acordo com a codificação do produto, ingredientes/composição, prazo de validade, modo de uso, concentração em ppm F, tipo de F/abrasivo e custo do produto (preço/peso).

Quadro 2
Informações presentes nas embalagens primárias e secundárias de dentifrícios infantis analisados quanto à data de fabricação e validade, à composição, ao modo de uso, à concentração e ao tipo de F/abrasivo e preço/peso em gramas. Londrina/PR, 2019.

De acordo com a legislação vigente, nas embalagens devem estar contidas informações sobre as precauções e recomendações a serem respeitadas no que tange a utilização dos dentifrícios. No Quadro 3 são apresentadas as recomendações encontradas em cada uma das embalagens analisadas. Todos os dentifrícios alertavam sobre a não ingestão do produto e a necessidade de que este fosse aplicado por adulto ou sob sua supervisão. Em oito (73,0%) havia recomendações sobre seguir as orientações de um médico ou dentista nos casos em que há a utilização de F proveniente de outras fontes, manter fora do alcance de crianças e sobre a quantidade a ser utilizada por crianças de até seis anos de idade. Dois (18,0%) alertavam a não usar o dentifrício caso a embalagem estivesse aberta e que o produto não continha açúcar em sua composição e apenas um (9,0%) orientava a suspender o uso em caso de reação indesejável. Observou-se, desse modo, a ausência de padronização entre as informações fornecidas pelos invólucros dos diferentes dentifrícios avaliados.

Quadro 3
Recomendações/precauções presentes em embalagens primárias e secundárias dos dentifrícios analisados no estudo. Londrina/PR, 2019.

A absorção excessiva de F durante o período de formação dos dentes, especialmente para crianças até seis anos de idade, pode levar a alterações na mineralização das estruturas dentais, conhecida como fluorose dental. Assim, a deglutição e consequente ingestão/absorção inadvertida de F por crianças por meio dos dentifrícios fluoretados são fatores de risco para a fluorose12 , 13 . Quanto mais jovem a criança, mais propensa ela estará a deglutir o produto, provocando uma ingestão acima da estimativa empírica de dose de ingestão diária de F que mantém a fluorose em graus que não causam comprometimento estético (0,05 a 0,07 mg F/kg peso corpóreo/dia)12 . Contudo, ressalta-se que, nas normativas vigentes, como a Resolução da Anvisa nº 16, de 12 de abril 201114 , a qual dispõe sobre as advertências obrigatoriamente presentes em produtos que contenham substâncias de uso restrito, não há nenhuma exigência quanto a apresentação de alertas sobre o potencial de toxicidade dos dentifrícios fluoretados.

Enfatiza-se, portanto, a necessidade da supervisão das crianças durante a escovação, tendo em vista que, devido à pouca idade, podem apresentar dificuldades motoras para expelir toda a saliva com o dentifrício. Desse modo, é possível se obter o máximo efeito no controle da cárie dentária e o mínimo risco de desenvolvimento de fluorose13 . Nesse contexto, é essencial que conste, nas embalagens dos dentifrícios, informações que orientem os adultos responsáveis sobre o modo adequado de uso do produto, identificando a quantidade a ser utilizada, a frequência de uso e ainda alertas sobre a deglutição e a ingestão de F, o que não foi identificado em dois (18,0%) dos produtos analisados neste estudo.

Para Batista e Valença15 , os cuidados e as recomendações pertinentes ao uso do F não se restringem apenas a pais/responsáveis e crianças. Os dentistas necessitam ter maior cuidado na identificação das fontes de consumo de F empregadas por seus pacientes, orientando os responsáveis pela criança sobre as precauções a serem consideradas ao se proceder com a escovação dental. É relevante, ainda, a orientação a outros profissionais de saúde quanto ao risco da suplementação de flúor e quanto à indicação correta desse método, tendo em vista que suplementos ainda têm sido prescritos mesmo sabendo-se que esta indicação não está baseada nas evidências científicas que explicam o mecanismo de ação do fluoreto no controle da cárie dentária15 , 16 .

Com relação à concentração de F nos dentifrícios avaliados, oito (73,0%) continham 1.100 ppm F, um (9,0%) 500 ppm F e dois (18,0%) eram sem F. A concentração máxima de F adicionada aos dentifrícios convencionais no Brasil é de 1.500 ppm de F, seguindo as normas regulamentadas pela Resolução nº 79/2000 da Anvisa, que determinam o valor máximo de 0,15% de F (1.500 ppm de F)10 . Dessa forma, todos os dentifrícios avaliados nesse estudo se encontram de acordo com essa resolução. Contudo, revisões sistemáticas da literatura mundial, que confirmaram a eficácia e os benefícios do uso dos dentifrícios fluoretados no controle da cárie dentária, quando comparados a placebos, apontam que, para se garantir o efeito preventivo de maneira significativa, os dentifrícios devem conter em sua composição uma concentração mínima de 1.000 ppm de F6 , 7 , 8 , o qual, por princípio, deve estar em sua forma solúvel.

De acordo com Santos et al.7 , dentifrícios com concentrações iguais ou maiores que 1.000 ppm F possuem efeito anticárie, enquanto dentifrícios com menos de 600 ppm F não produzem redução significativa na incidência da doença, quando comparados a um dentifrício placebo. Nessa discussão, torna-se importante ressaltar também que ainda não existem dados clínicos disponíveis que mostrem que os dentifrícios com baixa concentração de F, independentemente da formulação, sejam eficazes na redução dos riscos de desenvolvimento de fluorose dental em crianças em idade pré-escolar7 . Considerando que muitas crianças brasileiras ainda são acometidas por cárie na primeira infância, o uso regular de dentifrícios fluoretados é fundamental no controle dessa doença. Assim sendo, aqueles cuja concentração de F é baixa ou os que não contém F não devem ser indicados17 .

Ainda com relação à Resolução nº 79/200010 , destaca-se que parâmetros mínimos de F até o prazo de validade dos produtos não estão contemplados na referida norma da Anvisa. Nesse sentido, tem sido ratificada a necessidade de revisão dessa Resolução, estabelecendo a concentração mínima de F solúvel que um dentifrício deveria manter por determinado tempo após sua fabricação para o seu máximo efeito no controle da cárie dentária6 . Contudo, essa discussão não é uma especificidade do Brasil, mas sim um problema mundial sinalizado pela Federação Dentária Internacional (FDI)18 .

Outro aspecto relevante diz respeito à combinação adequada do tipo de composto fluoretado e sistema abrasivo, a qual é fundamental para garantir que a formulação tenha eficácia anticárie (flúor solúvel). Diante disso, dentifrícios contendo cálcio (Ca++) no abrasivo não podem ser formulados com compostos fluoretados que geram íon fluoreto (F-) quando dissolvidos e agregados à formulação (NaF, SnF2 ou AmF)19 . O F- reage imediatamente com íons Ca++ do abrasivo formando dentro da bisnaga do dentifrício o Fluoreto de cálcio (CaF2), o qual é insolúvel e não tem efeito no controle da cárie dentária. Dessa forma, a sílica (SiO2) tem sido usada como agente abrasivo em dentifrícios que geram íon F-, como observado nos resultados apresentados no Quadro 2 . Essa combinação permite que todo o F agregado permaneça solúvel na formulação pelo prazo de validade20 , agindo no controle das lesões de cárie.

Nesse contexto, considerando que as diferentes combinações de compostos fluoretados com sistemas abrasivos podem influenciar a concentração de F nos dentifrícios ao longo do tempo, as informações relacionadas à data de fabricação e aos prazos de validade dos produtos tornam-se relevantes, embora a Resolução da Anvisa recomende apenas a informação do prazo de validade ( Quadro 1 ).

Em relação aos resultados relativos ao custo por quantidade em gramas de produto, oito (73,0%) dentifrícios apresentaram embalagens com peso igual a 50 gramas, dois (18,0%) continham 100 gramas e um (9,0%) possuía 130 gramas. Os preços dos produtos variaram entre R$3,98 e R$16,90 a unidade. A Figura apresenta o valor do grama de cada um dos produtos analisados, o qual variou de R$0,04 a R$0,35 o grama.


Figura
Custo (por grama) dos dentifrícios infantis analisados no estudo. Londrina/PR, 2019.
Fonte: Elaborada pelos autores, 2020.

De acordo com os achados, o dentifrício com o valor mais elevado era não fluoretado, apresentando um valor de R$0,34 por grama. Em contrapartida, o mais barato, que era fluoretado, apresentou o valor de R$0,04 por grama. Quando comparadas as médias de preços de dentifrícios com e sem F, observou-se que o grama do dentifrício sem flúor foi três vezes maior do que os com flúor. Esse dado se encontra de acordo com outros estudos, como o de Roza et al.21 , que avaliaram as características dos dentifrícios infantis disponíveis no mercado brasileiro de acordo com sua apresentação comercial, disponibilidade e preços. Os autores concluíram que há uma grande variação de preço entre esses produtos, sendo que os sem F são os mais caros.

Nesse sentido, os consumidores devem se atentar à relação entre o peso e o preço dos dentifrícios infantis, bem como o custo-benefício, tendo em vista que há dentifrícios fluoretados produzidos conforme os padrões preconizados pelas evidências científicas disponíveis com preços, inclusive, menores do que aqueles que não possuem eficácia cientificamente comprovada21 . Além disso, ainda que eficaz o dentifrício com F é, em grande parte, dependente de sua integração aos hábitos pessoais de higiene bucal, à disponibilidade e à capacidade dos indivíduos em adquiri-los e usá-los regularmente22 .

Por fim, ressalta-se que, embora o quantitativo de dentifrícios infantis fluoretados analisados nesta pesquisa não represente a totalidade de produtos disponíveis para comercialização no mercado brasileiro, os resultados encontrados podem contribuir para que novos estudos sejam conduzidos futuramente.

CONCLUSÕES

Há uma ampla oferta de dentifrícios infantis disponíveis para a comercialização de diferentes marcas, composições e preços. Ao analisar as embalagens primárias e secundárias dos produtos, observou-se que, em sua maioria, elas se encontravam de acordo com as normas estabelecidas pelas Resoluções de nº 79/2000 e nº 7/2015 da Anvisa. Contudo, não há padronização das recomendações dos fabricantes em relação ao modo de uso desses produtos para a garantia do máximo efeito da ação do fluoreto no controle da cárie dentária com o mínimo risco para o desenvolvimento de fluorose dental.

Atualmente, não existe no Brasil uma legislação vigente que determine a quantidade mínima de concentração de F solúvel nos dentifrícios infantis ao longo do seu prazo de validade, ainda que as evidências científicas demonstrem que dentifrícios com concentrações de F menores que 1.000 ppm não produzam redução significativa na incidência de cárie dentária. Além disso, é importante ressaltar que, embora todos os dentifrícios avaliados apresentassem informações sobre a não ingestão do produto e alertassem sobre a necessidade de que este fosse aplicado por um adulto ou sob sua supervisão, não há atualmente no Brasil normativas que exijam a presença de informações sobre o potencial de toxicidade dos dentifrícios fluoretados em suas embalagens.

Tendo em vista que a alta prevalência de cárie dentária, ainda é uma realidade em muitas crianças de diferentes regiões do país, é essencial a garantia de acesso aos dentifrícios fluoretados para que seja possível a manutenção dos hábitos de higiene bucal e o controle da doença. Nesse sentido, pondera-se que os consumidores devem estar atentos não somente aos preços, mas também ao custo-benefício desses produtos, uma vez que foram encontrados dentifrícios com a concentração ideal de F com preços muito menores que àqueles sem ou com baixa concentração.

Por fim, salienta-se a fundamentalidade da vigilância constante dos dentifrícios para que eles possam ser utilizados de maneira correta, efetiva e segura, equilibrando os benefícios e riscos do fluoreto no controle da cárie dentária.

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Autor notes

Contribuição dos Autores

Fonseca LNM, Martins CA, Inagaki LT, Caldarelli PG – Concepção, planejamento (desenho do estudo), aquisição, análise, interpretação dos dados e redação do trabalho. Todos os autores aprovaram a versão final do trabalho.

* E-mail: pablocaldarelli@uel.br

Declaração de interesses

Conflito de Interesse

Os autores informam não haver qualquer potencial conflito de interesse com pares e instituições, políticos ou financeiros deste estudo.



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