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Interpretação da distribuição de valores de concentração de fluoreto requer cuidado
Vigilância Sanitária em Debate, vol. 10, núm. 3, pp. 133-134, 2022
INCQS-FIOCRUZ

CARTA PARA OS EDITORES


Recepção: 16 Dezembro 2021

Aprovação: 14 Julho 2022

DOI: https://doi.org/10.22239/2317-269X.02028

Prezado Senhor Editor,

Desde 2013, quando do seu lançamento, acompanhamos com bastante interesse a revista “Vigilância Sanitária em Debate: Sociedade, Ciência e Tecnologia” (Visa em Debate), pelo seu potencial para servir de referência acadêmica para a diversidade de temas que abrangem o campo da vigilância sanitária e para a tomada de decisão na proteção à saúde e no controle dos riscos à saúde da população.

No fascículo 4, do volume 9 (2021), foi publicado o artigo intitulado “Análise de dados do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua) no estado do Amazonas, 2016-2020”2. O trabalho despertou imediatamente nosso interesse, pois atuamos nessa área. Frustramo-nos, todavia, ao detectar uma falha na análise dos resultados e, como pesquisadores, nos sentimos no dever de apresentar as considerações que seguem, com vistas a colaborar para o aprimoramento dos procedimentos editoriais adotados na Visa em Debate.

O referido artigo apresenta um conjunto de informações de grande relevância para a gestão da vigilância da qualidade da água no estado do Amazonas. Entretanto, a interpretação dos dados relativos ao teor de fluoreto exige algumas ressalvas do ponto de vista analítico que podem, inclusive, ser úteis para o juízo crítico de outros parâmetros, como o cloro residual livre.

Os autores calcularam o valor mediano correspondente à distribuição de valores de concentração de fluoreto presente nas amostras de água dos municípios da microrregião do interior e daqueles da microrregião da capital do estado, para cada ano, dentro do período de 2016 a 2020; e classificaram esses valores em três categorias: (i) abaixo do recomendado, para valores inferiores a 0,6 mg/L; (ii) faixa ideal recomendada, correspondendo a valores entre 0,6 mg/L e 1,5 mg/L; (iii) acima do recomendado, considerando os valores acima de 1,5 mg/L.

A opção pelo valor mediano não é consistente com as exigências de proteção à saúde e leva a interpretações equivocadas. Recomendamos consultar literatura especializada1,4. Do total de registros de fluoreto, apenas 2,3% referem-se às microrregiões do interior e os dados apresentados não autorizam afirmar que “Observa-se concentrações de flúor em todas as amostras analisadas nas microrregiões do interior do estado em 2018 e 2019” (p. 31). Há importantes diferenças entre as microrregiões do interior e as da capital que não foram destacadas pelos autores. Acresce que a classificação dos valores medianos, adotada para a análise dos dados, não é preconizada pela literatura científica especializada. Além disso, as citações indiretas sustentadas nos estudos indicados pelas fontes Rebelo et al.3 e Frazão et al.4 contêm erros de interpretação que levam a um juízo equivocado pelos leitores.

Ressaltamos ainda que não existe um “sistema Vigifluor do Sisagua”, como foi enunciado pelos autores. Em termos de política pública, o que existe é o Programa Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental relacionada à Qualidade da Água para Consumo Humano, que tem no Sisagua o seu correspondente sistema de informações, cujos dados têm organização interna ao sistema relacionados às fontes de abastecimento e à qualidade da água oferecida e consumida. Cabe enfatizar que, enquanto o Sisagua é um sistema oficial de registro de dados, o “Sistema Vigifluor” é um recurso tecnológico, compatível e complementar ao Sisagua, disponível no site do Centro Colaborador do Ministério da Saúde em Vigilância da Saúde Bucal da Universidade de São Paulo (CECOL/USP) e derivado de uma investigação científica financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)5 para aprimorar o modelo de vigilância em relação ao parâmetro fluoreto. Além disso, o Sistema Vigifluor adota, como referência para a organização dos dados que disponibiliza ao público, a “Classificação de Águas de Abastecimento Público segundo o Teor de Flúor”, um Documento de Consenso Técnico produzido por pesquisadores brasileiros com publicações científicas sobre o assunto, reunidos pelo CECOL/USP em dois “Seminários sobre Vigilância da Fluoretação de Águas”, realizados em 2009 e 2011 (http://www.cecol.fsp.usp.br/noticias/mostrar/245). A partir dessa classificação, são sugeridos indicadores para propiciar o monitoramento longitudinal da fluoretação da água como uma política pública, por meio de uma plataforma desenvolvida para apoiar a disseminação dessas informações aos interessados4. O acesso a esses dados pode ser feito acessando-se a área “Fluoretação da Água no Brasil”, no site do CECOL/USP (http://www.cecol.fsp.usp.br).

Por fim, Senhor Editor, cumpre-nos alertar que o significado atribuído à variação anual, mostrado nas Tabelas 3 e 4, é inconsistente e denota fragilidade teórica da análise empreendida pelos autores. Por sua relevância, recomendamos alertar sobre esses aspectos os leitores da Visa em Debate, pois um número de pontos muito reduzido tende a diminuir o poder estatístico e a dificultar a identificação de uma tendência significante, crescente ou decrescente, e o valor mediano não é um indica dor apropriado para essa finalidade.

REFERÊNCIAS

Belotti L, Zilbovicius C, Soares CCDS, Narvai PC, Frazão P. Municipality-level characteristics associated with very low to good quality of water fluoridation in São Paulo state, Brazil, in 2015. JDR Clin Transl Res. 2022;7(1): 90-100. https://doi.org/10.1177/2380084420970867

Santana ABC, Lopes AF, Mendes AP, Yamaguchi KKL. Análise de dados do sistema de informação de vigilância da qualidade da água para consumo humano (SISAGUA) no estado do Amazonas, 2016-2020. Vigil Sanit Debate. 2021;9(4):25-34. https://doi.org/10.22239/2317-269x.01936

Rebelo MAB, Freitas YNL, Bandeira RHL, Quadros LN, Gome ASC, Gomes AC et al. A fluoretação das águas de abastecimento público: uma análise a partir do princípio da equidade. Vigil Sanit Debate. 2020;8(4):93-100. https://doi.org/10.22239/2317-269x.01491

Frazão P, Ely HC, Noro LRA, Pinheiro HHC, Cury JA. O modelo de vigilância da água e a divulgação de indicadores de concentração de fluoreto. Saúde Debate. 2018;42(116):274-86. https://doi.org/10.1590/0103-1104201811622

Frazão P, Narvai PC, organizadores. Cobertura e vigilância da fluoretação da água no Brasil: municípios com mais de 50 mil habitantes. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2017. https://doi.org/10.11606/9788588848252

Autor notes

* E-mail: pafrazao@usp.br

Declaração de interesses

Conflito de Interesse

Os autores informam não haver qualquer potencial conflito de interesse com pares e instituições, políticos ou financeiros deste estudo.



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