Resumo: A felicidade é o sentimento que cada ser humano busca durante a sua vida, e quando analisada no contexto de cidade, é possível identificar quais são as mudanças necessárias para que ela se faça presente em cada cidadão. Para tanto, o objetivo da presente pesquisa é apresentar as possibilidades que a percepção da população pode trazer quando utilizada em conjunto com as metas para o desenvolvimento urbano. Os procedimentos metodológicos se basearam em um estudo piloto realizado na cidade de Curitiba para fins acadêmicos, caracterizando-se em bibliográfico e descritivo para a análise qualitativa e exploratório para a quantitativa. A aplicação da pesquisa se deu por meio do método de Felicidade Interna Bruta (FIB), pelo emprego de 425 questionários estratificados. Os resultados apresentaram que o FIB de Curitiba está em uma classificação entre "regular" e "feliz", baseando-se em uma escala de Likert de 5 pontos. A partir dos resultados obtidos, foi possível identificar o nível de satisfação da população referente ao meio em que vivem, assim como, em captar o que as pessoas esperam para o futuro da sua cidade, mostrando-se um importante instrumento de pesquisa a ser considerado no desenvolvimento da cidade.
Palavras-chave:FIBFIB,Felicidade Interna BrutaFelicidade Interna Bruta,Desenvolvimento UrbanoDesenvolvimento Urbano.
Abstract: Happiness is the feeling that every human being seeks during his life, and when analyzed in the context of a city, it is possible to identify what changes are necessary to make it part of each citizen. Therefore, the objective of the present research is to present as possibilities that the perception of the population can bring when used together as a goal for urban development. The methodological procedures were based on a pilot study carried out in the city of Curitiba for academic purposes, being characterized in bibliographical and descriptive for a qualitative and exploratory analysis for a quantitative one. The application of the research was done through the method of Gross National Happiness (GNH), using 425 stratified questionnaires. The results showed that the Curitiba’s GNH is in a classification between "regular" and "happy", based on a Likert scale of 5 points. From the results obtained, it was possible to identify the level of satisfaction of the population regarding the environment in which they live, as well as to capture what people expect for the future of their city, proving to be an important research tool when considered in the development of the city.
Keywords: GNH, Gross National Happiness, Urban development.
Artigos
Análise da felicidade interna bruta: estudo piloto na cidade de Curitiba, Paraná
Analysis of the gross national happiness: pilot study in Curitiba city, Parana
Recepção: 11 Dezembro 2017
Aprovação: 12 Março 2018
O desenvolvimento urbano tem se intensificado nas últimas décadas. Atualmente, a maioria das pessoas reside nas cidades e este número só tende a aumentar nos próximos anos. Juntamente com este crescimento, muito problemas e consequências negativas sobre o meio ambiente e sobre a população começaram a se acentuar, resultando em mudanças climáticas, poluição, aumento de pessoas em áreas de risco e problemas de saúde modernos (LIMA; KRÜGER, 2004). Os processos utilizados hodiernamente no desenvolvimento precisam ser revistos, considerando todos os riscos e mudanças causadas pela ação antrópica (LOURES, 2009). Por isto, é de suma importância destacar que o desenvolvimento depende das pessoas, e um fator fundamental pode estar sendo esquecido pelos gestores: a felicidade da sua população (TANSCHEIT, 2016).
Algumas pessoas podem pensar que no mundo moderno a felicidade é algo quase impossível de se existir. Em uma cultura onde o consumo está cada vez mais presente, muitos confundem o ter com o ser (SABÓIA, 2009). Este cenário decorre da sociedade mercantilista que se formou, fazendo com que a qualidade de vida e a felicidade dependam da satisfação pelo consumo. Infelizmente, “[...] a busca pelo alcance da satisfação dos desejos humanos é constantemente renovada, tornando a necessidade de consumir uma constante das aspirações humanas, criando um ciclo infinito” (OLIVEIRA; CÂNDIDO, 2010. p. 4).
A partir deste cenário, pode-se perceber que, de um lado, o desenvolvimento local e as melhorias na qualidade de vida se beneficiam com o consumo. Porém, do outro lado, há também a desigualdade social e o aumento da exploração dos recursos naturais (COSTA; TEODÓSIO, 2011). Por isto, é necessário que cada um saiba suas limitações e reconheça a si mesmo, de forma a encontrar a felicidade além do lado material (SABÓIA, 2009). Além da cultura local, outros fatores podem interferir diretamente na felicidade da sociedade. O desenho urbano de uma cidade é essencial para a qualidade de vida. A proximidade das pessoas com as áreas verdes, a diminuição dos congestionamentos e o incentivo para pequenos bares e restaurantes, tornando as ruas mais vivas e seguras, são apenas alguns exemplos da interação que pode resultar de um bom planejamento (TANSCHEIT, 2016).
Estas situações reforçam a busca pelo equilíbrio que a sociedade precisa, visando um desenvolvimento mais sustentável. Atualmente, a utilização de indicadores para se medir e avaliar o desenvolvimento é muito comum, principalmente ao tratar-se do Produto Interno Bruto (PIB) e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). O problema destes indicadores é que os mesmos não permitem avaliar os diversos setores da sociedade, necessitando complementações quando avaliados em sua estrutura.
Para tanto, muitos indicadores vem sendo criados, a fim de se avaliar muito além da economia dos países. Exemplos disto são: o Índice do Planeta Feliz (Happy Planet Index) desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa New Economics Foundation, o Índice para uma Vida Melhor (Better Life Index) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD), a Avaliação do Desenvolvimento Econômico Sustentável (Sustainable Economic Development Assessment) do Boston Consulting Group (BCG) e o Relatório Mundial de Felicidade (World Happiness Report),da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) (TANSCHEIT, 2016).Visando o objetivo de considerar indicadores que relacionem outros setores além dos econômicos, destaca-se a criação do Gross National Happiness (GHN), conhecido como Felicidade Interna Bruta (FIB). Com origem em 1972, em Butão, seu conceito foi criado por Jigme Singye Wangchuck e é utilizado até hoje no país, como cita Lustosa e Melo (2010, p. 37):
[...] o cálculo da ‘riqueza’ deve considerar outros aspectos além do desenvolvimento econômico, como a conservação do meio ambiente e a qualidade de vida das pessoas. Considera-se o empreendedorismo social como geração ética de riqueza – produção de bens e serviços – para alcançar o bem-estar social e a sustentabilidade ambiental, cultural, econômica e social.
Muito além da análise econômica do país, os representantes de Butão consideraram a felicidade como sendo sua principal medida de avaliação. A partir dela é possível medir o desenvolvimento local através da percepção das pessoas quanto ao meio em que vivem, além de conhecer as aspirações futuras da população. A aplicabilidade deste indicador em diferentes cenários pode possibilitar uma nova visão sobre o desenvolvimento urbano das cidades do mundo.
A partir deste contexto, o objetivo da presente pesquisa é apresentar as possibilidades que a utilização de indicadores de felicidade pode trazer às cidades quando utilizados em conjunto com a percepção da sua população, caracterizando-se assim como instrumentos de auxílio nos processos de desenvolvimento urbano. Para isto, foi realizado um estudo piloto na cidade de Curitiba, Paraná, com a aplicação do Indicador de Felicidade Bruta (FIB).
A cidade de Curitiba possui reconhecimento nacional e internacional quanto suas inovações, relações sociais e altos índices de bem-estar. Nos últimos anos, a capital paranaense vem acumulando diversos prêmios nas áreas de meio ambiente, mobilidade, governança e educação (PIZZO, 2017). Com quase 2 milhões de habitantes a cidade possui 55,7% da sua população em trabalho formal, um PIB de mais de 44 mil reais e um IDH de 0,823. Já em relação à saúde, transporte e educação, são mais de 250 estabelecimentos públicos de saúde, mais de 1 milhão de veículos e uma taxa de escolarização de mais de 97% (IBGE, 2017). Por fim, o atendimento municipal de água, esgoto, resíduos e energia elétrica ultrapassa os 99% (IPARDES, 2018).
Deste modo, o presente artigo está estruturado de forma a apresentar o olhar da população de Curitiba frente aos aspectos que podem influenciar na felicidade local. No referencial teórico são discutidos os conceitos de felicidade e suas relações com outros instrumentos que não se limitam apenas à dados estatísticos. Na metodologia será apresentada a estruturação do FIB, com as medidas tomadas anteriormente à aplicação do presente instrumento de pesquisa. Por fim, nos resultados, será abordada a caracterização dos entrevistados e dos domínios pertencentes ao Indicador de Felicidade Bruta, destacando os principais problemas levantados pela população e suas sugestões de melhoria para o aumento da felicidade na cidade.
A felicidade pode ser definida como um bem público que todos almejam alcançar, devendo estar na mesma constante do planejamento governamental (LUSTOSA; MELO, 2010). Ela envolve várias emoções associadas ao prazer, assim como está presente na ausência de qualquer tipo de sofrimento (CAPELAS, 2014). Segundo Russell (1956), existem dois tipos de felicidade: a felicidade natural enquadra-se à todas as pessoas, de forma a ser a que nasce junto conosco, enquanto a felicidade concebida é aquela que é adquirida com o tempo.
Por mais que Russell acredite que ela possa ser obtida, não existe uma receita concreta para alcança-la. Para Andrews (2011), existem dois fatores que podem influenciar para que ela seja duradoura: laços afetivos com familiares e amigos e ter um significado na vida. Quanto mais coisas o homem vir a se interessar, maiores serão as oportunidades dele ser feliz, assim como, o entusiasmo pela vida é o segredo para se alcançar a felicidade e o bem-estar (RUSSEL, 1956). Em vista disto, pode-se observar que a felicidade é um estado de espírito, o qual pode variar de acordo com os sentimentos momentâneos.
Easterlin (2001) considera a felicidade como sinônimo de bem-estar e satisfação, sendo possível compará-la devido às preocupações em comum das pessoas como a família e a saúde. Porém, Lyubomirsky (2008, p. 28-29) afirma que existem três grandes mitos em que as pessoas costumam acreditar ser a forma de atingi-la:
[...] mito 1: a felicidade pode ser “encontrada” – a felicidade não deve ser encontrada, ela já está dentro de nós. Ela pode ser considerada com um estado de espírito, onde varia de acordo com o modo que nos relacionamos com o mundo em que vivemos; mito 2: a felicidade está em mudar as circunstâncias – as mudanças em nossa vida, sejam elas negativas ou positivas, não possuem relação com o bem-estar. O que realmente determina nossa felicidade é o presente; mito 3: você tem ou não tem – muitos autores comentam que você nasce feliz ou infeliz, acreditando que a felicidade é algo genético.
O entendimento referente a si mesmo e ao que se tem, ajuda muito no quesito de sentir-se bem, mas quando as pessoas confundem a felicidade com a posse de bens materiais, muitos problemas começam a surgir como frustrações e depressão (BETTO, 2003). Esta característica pode resultar em uma sociedade egoísta, já que a felicidade de uma pessoa é afetada de maneira negativa decorrente a renda da outra, enfraquecendo os laços sociais devido à desigualdade (VEENHOVEN, 1988; LAYARD, 2006). Vale lembrar que a felicidade está ligada à consciência de cada um, e não aos prazeres momentâneos do dinheiro, poder ou sucesso (OSHO, 2006). Lyubomirsky (2008) ainda acrescenta que a felicidade deve ser encontrada a partir da perspectiva de cada um, já que ninguém pode dizer o quanto somos felizes. Deste modo, é importante que cada pessoa apresente seu ponto de vista em relação ao seu meio, pois só ela conhece a si mesma e ao que acontece ao seu redor.
Atualmente, o tema vem apresentando destaque cada vez maior na sociedade, principalmente relacionando a felicidade com a qualidade de vida, de forma a orientar a política social (VEENHOVEN, 1988). A ONU aprovou a resolução “A Felicidade: para um Enfoque Holístico do Desenvolvimento", a qual intitula a busca pela felicidade como um objetivo universal e fundamental. A Organização também convidou os 193 países-membros a desenvolverem políticas públicas que façam refletir melhor sobre este objetivo (BRASIL, 2015). No Brasil, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ocorreu em 2010, com a alteração do artigo 6 da Constituição Federal, onde se incluiu os direitos sociais para a busca da felicidade (BRASIL, 2010). Assim como os direitos básicos de alimentação e habitação, a felicidade e a liberdade também devem ser consideradas como necessidades fundamentais (SAWAIA, 2003).
Em conjunto com estas novas iniciativas, as quais valorizam as opiniões das pessoas frente à construção das cidades, outras políticas também estão sendo implementadas, servindo de base para a elaboração de projetos e ações inovadores, como é o caso da Política de Desenvolvimento Territorial (PDT). Esta política considera a percepção da população para a formulação de novas propostas e atuação local, tendo “o propósito de adequar às ações governamentais de acordo com a necessidade de cada território, de oferecerem alternativas inovadoras aos problemas encontrados” (ANDRADE; ALMIRANTE; OLIVEIRA, 2017, p. 80). Cada local possui suas próprias características, sendo necessário que a gestão municipal saiba como lidar com todos os aspectos da sociedade sem possuir uma fórmula padrão. Para que haja uma maior efetividade dos processos e economia dos recursos financeiros, é possível integrar os moradores nas tomadas de decisão, a fim de que os mesmos possam apontar as dificuldades enfrentadas no dia-a-dia e as possíveis soluções para que elas sejam resolvidas.
Outro ponto relevante, levantado por Stiglitz, Sen e Fitoussi (2012), é que os aspectos econômicos locais não devem ser considerados mais importantes que o bem-estar das pessoas. Esta afirmação possibilita uma reflexão sobre os padrões atuais adotados pela sociedade, tendo em vista as longas jornadas de trabalho, os salários baixos, a produção em massa e a cultura do consumo. São as pessoas que fazem uma cidade crescer, e consequentemente, que movimentam a economia. Porém, a partir do momento em que mudanças ocorrem sem que se considere a opinião da população, a insatisfação aumenta e resulta na redução de esforços e na perda de produtividade, prejudicando não só o sistema econômico, mas também a qualidade de vida da população.
Vale destacar que considerar questões que envolvem sentimentos, tais como o bem-estar e a felicidade, são grandes desafios para as gestões, pois eles consistem em elementos difíceis de mensurar. A utilização de indicadores pode auxiliar nas padronizações e classificações dos resultados, como o caso do PIB e IDH, os quais são instrumentos que auxiliam na elaboração de planos, ações e políticas públicas, sendo importante aprimorá-los para que haja maiores avanços no desenvolvimento (STIGLITZ, SEN; FITOUSSI, 2012). Porém, o PIB e o IDH são formados apenas por elementos quantitativos, sem considerar a percepção do meio. Tendo em vista isto, a utilização de indicadores que também considere questões qualitativas, e não apenas censitárias, se faz necessária como uma opção de inovação para a governança, aproximando os cidadãos das questões políticas.
Sendo assim, destaca-se a importância do Estado perante as atitudes de promoção de felicidade aos moradores dos municípios, considerando que sua busca não é apenas algo individual, mas sim, um sentimento (SCHAFRANSKI, 2012). Desta forma, vale ressaltar a inclusão da felicidade nas políticas públicas das cidades, de tal modo que se aumente a satisfação da população pelas atividades desenvolvidas pelo Estado. Quando a opinião da população é considerada, a identificação dos principais problemas regionais se torna mais fácil, já que são as pessoas que os vivenciam diariamente. Outro ponto positivo é o retorno de ideias do que pode ser realizado para resolvê-los. Esta interação entre população e governantes auxilia no desenvolvimento sustentável das metrópoles e consequentemente na felicidade populacional.
O indicador de Felicidade Interna Bruta (FIB) é um projeto da Organização das Nações Unidas (ONU), o qual foi criado com a visão de se medir a felicidade da população como forma de desenvolvimento. O questionário original do FIB constitui 249 questões relacionadas com nove dimensões: bem-estar psicológico, saúde, uso do tempo, vitalidade comunitária, educação, cultura, meio ambiente, governança e padrão de vida, como é apresentado no Quadro 1. Devido à estrutura do questionário, com perguntas focadas em Butão, anteriormente a aplicação foi necessário selecionar e filtrar as questões mais pertinentes à região em estudo, sendo 14 delas previamente determinadas.
Tendo em vista que a cidade de Curitiba foi escolhida para a aplicação do estudo piloto, foram considerados os dados do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC, 2015) quanto sua população, sendo considerado 1.800.004 habitantes para o ano de 2015. Deste modo, para obtenção da amostra de pesquisa, foi utilizada a fórmula do cálculo de amostras para populações infinitas de Gil (2008), ou seja, superiores a 100.000 elementos.
Tendo em vista que a cidade de Curitiba possui uma população muito grande, se faz necessário a adoção de porcentagens de erro e confiança adequados, para que resulte em uma quantidade ideal de amostra. Quando o erro é muito grande, a pesquisa pode se tornar duvidosa quanto as conclusões realizadas a partir das informações obtidas, e quando é muito pequeno, a pesquisa tornar-se inviável de aplicação.
Por isto, foram adotados 5% de erro e 95% de confiança, com um total amostral obtido de 385. Contudo, para um resultado proporcional, foi realizada a estratificação entre os bairros da cidade (GIL, 2008), procedendo também com o arredondamento para números inteiros, totalizando em 425 questionários. A Tabela 1 (a, b e c) apresenta a estratificação realizada nos bairros da cidade de Curitiba.



Vale destacar que dentre estes bairros, aqueles que estão mais ao sul de Curitiba apresentam os menores índices de desenvolvimento humano municipal, mas mesmo assim, enquadram-se em um índice ‘Alto’. Por mais que seja uma boa classificação, todas as outras regiões da cidade já pertencem à classificação ‘Muito Alto’, o que contribui para o elevado IDH de Curitiba (PNUD; FJP; IPEA, 2010).
A ONU não estipula padrões para análise dos dados do FIB. Desta forma, foi adotado o Software Microsoft Office Excel 2010, para a realização dos cálculos, seguindo as etapas: (1) verificar os valores de entrada, sendo estes válidos quando preenchidos de 1 a 5; (2) realizar a média através da soma das questões por domínios; e (3) realizar a média geral através da soma dos domínios. Além disto, a escala adotada para avaliação destes dados é realizada partir de Likert, com uma variação de 1 a 5 (Tabela 2).

Destaca-se que a escala de Likert foi escolhida para a análise dos dados por ser utilizada na medição das percepções e dos interesses das pessoas (SILVA JUNIOR; COSTA, 2014), a fim de se avaliar a felicidade da população nas situações atuais, e nas suas aspirações futuras.
O emprego dos questionários ocorreu no primeiro semestre do ano de 2015, em O emprego dos questionários ocorreu no primeiro semestre do ano de 2015, em primeiro momento, por meio da ferramenta online pesquisa, a fim de se viabilizar o tempo das aplicações e o custo da pesquisa. Esta etapa online resultou em um total de 398 questionários respondidos, sendo os outros 27 sido realizados manualmente, com um total de dois dias de atividade externa. A aplicação manual foi necessária decorrente ao não atingimento das 425 pesquisas estratificadas nos bairros, de forma online.
Anteriormente ao instrumento de pesquisa ser posto em prática, cada respondente foi informado sobre o objetivo das informações, respondendo seu formulário particularmente. Ressalta-se que, em algumas situações, as pessoas não conseguiram responder os questionários em particular devido a problemas de visão, sendo necessária a leitura das perguntas, buscando-se não interferir nas respostas.
Destaca-se que o presente método teve sua criação para avaliar o desenvolvimento de um país específico e, por isto, a escolha dele para aplicação na cidade de Curitiba apresentou algumas dificuldades durante o processo. A quantidade de questionários a serem aplicados, visando o menor erro possível, resultou em um número estratificado elevado, sendo necessária uma durabilidade estendida para a realização da pesquisa. Outro ponto a ser destacado é o formato das perguntas. As questões são muito extensas, resultando em um tempo grande para respondê-las, assim como este perfil pode interferir no entendimento do que está sendo perguntado. Por fim, ressalta-se que a adaptação do presente método para questões mais objetivas ou a adoção de escalas visuais, como figuras ou cores, pode facilitar na compreensão e, consequentemente, no tempo de aplicação.
Para aplicação do método, foi necessário filtrar o questionário original do FIB, constituinte originalmente de 249 questões relacionadas com as nove dimensões de sua estrutura. Dentre as questões originais, foram escolhidas 14 para a aplicação na cidade de Curitiba, sendo pelo menos cada uma delas, pertencente a cada domínio. A partir dos 425 questionários, obteve-se a caracterização dos entrevistados, sendo composto por 51,5% de mulheres e 48,5% de homens, com uma faixa etária variando de 18 a 73 anos (GRÁFICO 1).

Ao analisar a felicidade da população pelo gênero, tem-se um equilíbrio nos resultados, de tal forma que a média para o feminino foi de 3,36 enquanto que o masculino foi de 3,37, ambos muito próximos da classificação “moderadamente feliz”. Já ao tratar-se da felicidade pela idade, a variação entre os resultados também foi baixa, com 3,34 até 25 anos, 3,38 até 50 anos e 3,40 com mais de 50 anos. Observa-se que eles também se encontram próximo a classificação “moderadamente feliz”, porém, é possível destacar que quanto maior a faixa etária, mais felizes as pessoas se consideram.
Com a estratificação por bairros, obteve-se a média geral e a média por domínios do FIB, em uma escala de Likert de cinco pontos. A média geral obtida foi de 3,60, classificando se entre “moderadamente feliz” e “feliz”. Dentre as questões, as que tiveram menores resultados foram sobre o desempenho do governo, sendo estas o combate à corrupção (Q42), melhorias educacionais (Q40), melhoria na energia elétrica (Q45) e melhoria dos serviços de saúde (41), com 1,59, 1,69, 1,75 e 1,78 respectivamente. Os melhores resultados foram sobre os ensinamentos que as crianças devem aprender em casa, sendo respeito aos pais (Q22), honestidade (Q24), respeito pelos mais velhos (Q21) e disciplina (Q23) com 4,83, 4,82, 4,76 e 4,68 respectivamente.
A média de variação das respostas entre os entrevistados foi de 6,04%. As maiores variâncias se deram nos assuntos relacionados ao combate à corrupção (Q42), melhoria na energia elétrica (Q45), melhorias educacionais (Q40) e redução da distância entre ricos e pobres (Q39), com 61,98%, 52,64%, 51,14% e 50,51% respectivamente. As menores variações estão relacionadas com respeito aos pais (Q22), honestidade (Q24), respeito pelos mais velhos (Q21) e disciplina (Q23), com 10,44%, 10,64%, 11,49% e 12,58% respectivamente (GRÁFICO 2).

A média por domínios variou de 1,87 a 4,51. O domínio da governança apresentou o menor resultado, com 1,87. Ele aborda questões sobre criação de empregos, melhorias educacionais, combate à corrupção, proteção do meio ambiente e melhorias em estradas. O segundo menor resultado se deu no domínio vitalidade comunitária com 2,87. Tal domínio considera questões sobre confiança nas pessoas da cidade e nos vizinhos. O bem-estar psicológico (3,12) trata de questões sobre autoavaliação da felicidade, ajuda quando se está doente, problemas financeiros ou emocionais e estresse. O domínio da saúde (3,35) apresenta questões sobre satisfação com a competência da equipe médica, limpeza e tratamento médico prescrito, e da dificuldade em relação à distância do hospital, transporte e tempo de espera para ver o médico. O padrão de vida apresentou média de 3,94. Ele considera a compra de roupas de segunda mão para manter custos baixos, inadimplência de empréstimos e aluguéis, dificuldade de apoio financeiro dos familiares e equipamentos que foram vendidos para aumentar o dinheiro das despesas básicas.
Os domínios com maiores médias foram cultura (4,51), educação (4,45), meio ambiente (4,31) e uso do tempo (4,03). O domínio cultura aborda questões sobre respeito pelos pais, tolerância, cuidados com a família e parentes, ajudar os outros e imparcialidade em relação às diferenças. O da educação trata de afirmações diárias sobre comer vegetais verdes, quantidades excessivas de gordura, carnes, peixes e frutas. O do meio ambiente aborda leis mais severas contra poluição, fechamento de empresas que não atendam os requisitos ambientais, impostos e multas mais pesadas aos que causam danos, reutilização de materiais recicláveis, e economia de energia e água. Por fim, o domínio uso do tempo considera o tempo reservado para si mesmo e a pontualidade em compromissos.
Destaca-se que estes quatro domínios obtiveram resultados que se enquadram entre “feliz” e “muito feliz”, sendo estes os com maior satisfação da população. Ao se analisar a variação entre a média geral e cada domínio, observa-se 9,17% na avaliação da média geral. Em relação aos domínios, a cultura possui uma diferença de 10,59%, o meio ambiente de 11,41%, a educação de 11,93%, o uso do tempo de 19,57%, o padrão de vida de 19,61%, a saúde de 20,79%, o bem-estar psicológico de 22,47%, a vitalidade comunitária de 31,75% e a governança de 37,55%. A Tabela 3 apresenta os resultados pelos domínios em que o índice é subdividido.

A partir da percepção das pessoas pelo método do FIB, foi elaborado o mapa de felicidade da cidade de Curitiba (FIGURA 1). Destaca-se que dos 75 bairros, apenas 24%atingiram a classificação “feliz”, onde, em sua maioria, estão localizados na regional matriz da cidade, nas proximidades das áreas centrais. Observa-se que, enquanto nos resultados do IDH de Curitiba a classificação do índice se deu “Muito Alto” para a maioria dos bairros, na análise do FIB, em sua quase totalidade (76%), a felicidade foi classificada como “moderadamente feliz”.
Outro ponto a ser levantado é que embora nenhum bairro tenha atingido o nível máximo pela classificação de Likert, nenhum deles foi classificado como “pouco feliz” ou “nada feliz”. Ao considerar os bairros separadamente, avaliam-se as localidades com as maiores médias, sendo Cascatinha (3,67), Centro Cívico (3,65), Juvevê (3,63), Capão da Imbuia (3,62) e Alto da Glória (3,61). Os bairros com as médias mais baixas foram Cachoeira (2,94), Augusta e São Miguel (2,97 cada), Atuba (3,01), Prado Velho (3,05) e Ganchinho (3,15).

Além dos resultados quantitativos, vale destacar as colocações qualitativas da população, as quais se resumem em 330 contribuições. Muito além das melhorias dos serviços básicos - saúde, educação, meio ambiente, mobilidade e segurança – os moradores fizeram sugestões do que os deixaria mais felizes se fossem realizadas algumas mudanças. Para a presente cidade, muitos ressaltaram a importância de se mudar o comportamento das pessoas (10,9%), de forma que se façam mais receptivos, humildes e gentis. Além disto, as mudanças sociais e culturais foram ressaltadas com as sugestões de eventos gratuitos semanais, conscientização contra o preconceito, combate à corrupção e à desigualdade social.
Muitos moradores (11,2%) apresentaram como um motivo de felicidade a oportunidade de proporcionar a melhoria na vida dos que possuem poucas condições na sociedade. Alguns pontos levantados foram à realização de cursos profissionalizantes para capacitação e inserção no mercado de trabalho; o acesso de todos para o saneamento básico e água potável; e melhorias no sistema de acolhimento e reintegração dos moradores de rua.
A localização de espaços verdes para lazer também foi levantada por alguns dos respondentes. Aumentar a quantidade de locais seja nos bairros ou áreas centrais, a fim de haver disponibilidade para as pessoas poderem aproveitar estas áreas ao ir para o trabalho ou na hora do almoço. Ainda quanto ao meio ambiente, foi ressaltada a importância de se investir na limpeza dos rios da cidade; na criação de leis que incentivem a utilização de energias renováveis; e nas leis efetivas que não permitam os maus tratos animais, tirando-os da rua.
Assuntos políticos fizeram parte de 12,7% do levantamento. Implantação de provas teóricas para os candidatos, a fim de se avaliar a formação cultural e profissional, e alterações na legislação para que não possua mais brechas, são algumas das sugestões. Quanto à mobilidade, além do aumento às ciclovias, outras sugestões são a implantação de transporte público para locais turísticos ligados de Curitiba à região metropolitana; melhorar o sistema ferroviário; incentivar o sistema de caronas entre vizinhos; aluguéis de bicicleta e a permissão para levá-las nos ônibus.
Por fim, o assunto mais levantado foi a segurança. As pessoas não visam à felicidade se possuem medo de sair na rua, decorrente do aumento da violência, dos assaltos, roubos, agressões e drogas. Muitos pediram por postos policiais em parques; melhorias na iluminação; aumento da frota policial; e a permanência da polícia nas escolas públicas, a fim de se erradicar o vandalismo. As pessoas também reconhecem a necessidade do aumento dos salários dos servidores, em função dos riscos diário em que se apresentam.
Neste momento, cabe destacar os resultados obtidos em comparação com os resultados do FIB de Butão. Para tal, analisou-se o relatório GNH Survey Report de 2015. Os resultados do país chegaram, em 2015, a 4,02, tendo uma evolução de 1,8% desde 2010. Considerando sua população, 91,2% reportaram ser “felizes”, onde, destes, 43,4% se classificaram como “muito feliz”. Destaca-se que eles também reconhecem que os serviços governamentais devem ser melhorados, e a busca pela educação, padrão de vida e fortalecimento cultural, também são pontos em comum com a pesquisa realizada na cidade de Curitiba (CBS, 2016).
Após o destaque recebido pela maneira de se medir o desenvolvimento em Butão, as pesquisas sobre felicidade das cidades vêm aumentando a cada ano. Porém, a aplicação do FIB em outros países ainda é um desafio tendo em vista suas características estruturais específicas para Butão. Desta forma, apartir dos resultados encontrados, buscou-se avaliar o presente indicador em comparação com os demais projetos aplicados no Brasil.No ano de 2012, o FIB foi aplicado na cidade de Lavras, Minas Gerais. Assim como em Curitiba, a governança foi a que apresentou o menor resultado (2,55), porém observa-se uma variação de 27% entre ambas as cidades, demonstrando que a insatisfação com o governo é maior na capital paranaense. A saúde (2,74) e a vitalidade comunitária (2,86) foram os outros dois domínios com índices mais baixos na cidade de Lavras (SALES et al., 2012).
Destaca-se que diferentemente de Curitiba, a educação (2,94) e o uso do tempo (2,95) do município mineironão atingiram os maiores resultados.Os melhores índices representam os domínios de bem-estar psicológico (3,13) e padrão de vida (3,03). Ressalta-se ainda que os domínios de cultura e meio ambiente não foram analisados separadamente. Deste modo, conclui-se que o indicador geral na cidade de Lavras foi de 2,83 contra os 3,60 da cidade de Curitiba (SALES et al., 2012).
Com uma variação de 21,4% entre as avaliações gerais de percepção das populações locais, é importante destacar os perfis municipais. De modo geral, o Índice de Desenvolvimento Humano de Lavras é de 0,782 contra 0,823 de Curitiba. Em relação às infraestruturas, a capital paranaense possui 96,3% de esgotamento sanitário e 76,1% das suas vias públicas arborizadas. Em contrapartida, Lavras possui 94,6% de esgotamento e apenas 18,9% de arborização. Por fim, destaca-se a situação financeira de ambos, onde 55,7% dos curitibanos encontram-se ocupados e apenas 28,4% dos lavrenses possuem emprego. Destes, a média salarial é de 4 salários mínimos em Curitiba e de 2,6 em Lavras (IBGE, 2017a, b).
O perfil de desenvolvimento das cidades acaba interferindo diretamente na percepção da população quanto ao meio em que vivem. Quanto mais acesso e oportunidades de interação, mais satisfeita as pessoas se caracterizam,pois existe a necessidade pelas trocas de experiências, sentimentos e aspirações (LAYARD, 2006). Por isto, ressalta-se a importância de se considerar a opinião das pessoas quanto aos problemas vivenciados e de que maneira pode-se resolve-los. À vista disso, é possível agir em prol de questões prioritárias, poupando tempo e recursos financeiros, além de aumentar a satisfação dos moradores, resultando assim em um desenvolvimento mais sustentável para as cidades.
Esta pesquisa teve por objetivo apresentar uma nova percepção sobre o uso de indicadores de felicidade como forma de instrumento de auxílio para o desenvolvimento. Para isto, foi utilizado o método FIB, elaborado pela Organização das Nações Unidas (ONU), a fim de se considerar a opinião dos moradores da cidade de Curitiba. Com um total de 425 respondentes ao presente instrumento de pesquisa, foi possível caracterizar a cidade a partir dos domínios estruturantes do FIB.
Ao analisar os resultados de acordo com o gênero e faixa etária, pôde-se perceber que as variações quanto aos resultados foram muito baixas, de tal modo que as classificações permaneceram próximas à “moderadamente feliz”. Já ao analisar a percepção das pessoas referente à felicidade da cidade de Curitiba em geral,a variação entre seus domínios foi muito grande, desde "pouco feliz" até “muito feliz”.
Estes resultados apresentam na sua análise qualitativa o quanto que o cenário que a sociedade está vivenciando hoje tem afetado na sua felicidade. O cenário de crise econômica e os escândalos de corrupção foram um dos assuntos mais criticados pelos moradores. Juntamente com as questões políticas, muitas reclamações foram em relação aos serviços básicos, como segurança, saúde e educação. O descaso perante estes assuntos tem afetado muito a população. Falta de vagas em creches, aumento de assaltos nos bairros, tempo de espera para conseguir marcar exames, falta de médicos, são apenas alguns exemplos do que os moradores precisam enfrentar.
Porém, além dos problemas destacados pela população de Curitiba, muitas foram as ideias apresentadas. Campanhas culturais contra o preconceito, incentivo à gentileza, e boas atitudes dentro de casa foram citadas; incentivo ao grafite na cidade para que se hajam mais cores; criação de mais espaços de lazer para que não seja necessário se deslocar em um trecho tão longo; punições mais severas na legislação de crimes cometidos na cidade; programas para não haver mais animais nas ruas; inserção de cursos gratuitos para que crianças e adolescentes tenham em seu tempo mais atividades e consequentemente os afaste de drogas e crimes; dentre tantas outras ideias.
Deste modo, confirmou-se pelos resultados da pesquisao quanto a opinião das pessoas pode ser útil no desenvolvimento das cidades. A população enfrenta problemas todos os dias, e é ela quem sabe onde eles estão, qual a prioridade dos que precisam ser resolvidos, além de ideias para solucioná-los. Ao considerar a opinião dos moradores, é possível manter uma relação de aproximação entre governo e comunidade, para que a felicidade possa realmente acontecer na cidade. Por fim, uma cidade feliz se desenvolve de maneira mais saudável, por isto“colocaria nas ruas mais flores e balões; mais palhaços; mais algodão doce e pipoca; mais ciclovias; mais arte; mais poesia” (respondente do presente instrumento de pesquisa, 2015).







