Resumo: Nas últimas décadas, o desenvolvimento local tem sido amplamente discutido por diferentes abordagens teóricas em resposta à crise do paradigma nacional-desenvolvimentista. Vale salientar que o papel tradicional do Estado com a construção de grandes plantas industriais que reestruturava as economias em crise e era propulsor de reformas sociais foi paulatinamente sendo desmontado. As cidades-empresas vinculadas ao projeto de industrialização entram em declínio econômico e diferentes atores locais-regionais veem-se compelidos a buscar alternativas e caminhos para cidade-região como tentativas para superação do desemprego e da desigualdade social. Este artigo estabelece uma relação desta dinâmica com a cidade de Ipatinga/MG com os impactos da privatização da USIMINAS e as inciativas dos atores locais para reinventar a economia local. O procedimento metodológico adotado foi abordagem qualitativa com a técnica de entrevista semiestruturada e análise do discurso. Foram realizadas 12 entrevistas semiestruturadas com os atores locais e pesquisa documental. Os resultados apresentados na pesquisa demonstram que os efeitos da privatização da empresa, impactam no desenvolvimento econômico do município com redução dos postos de trabalho e comércio que ressente do arrefecimento da atividade do setor siderúrgico. Também revela que o poder público municipal tem pouca predisposição para estruturar parcerias público-privadas em promover o desenvolvimento local endógeno fato relacionado a trajetória de dependência e a inexistência de coesão e capital social. Sob estes aspectos, pode-se conceber que os projetos desenvolvidos são pouco ousados e ineptos para estimular suficientemente o desenvolvimento econômico e reduzir o elevado nível de desemprego.
Palavras-chave:Desenvolvimento LocalDesenvolvimento Local,Atores LocaisAtores Locais,EstadoEstado,PrivatizaçãoPrivatização.
Abstract: In the last decades, local development has been widely discussed by different theoretical approaches in response to the crisis of the national-development paradigm. It is worth mentioning that the traditional role of the State with the construction of large industrial plants that restructured economies in crisis and propelled social reforms was gradually dismantled. The city-enterprises linked to the industrialization project are in economic decline and different local-regional actors are compelled to seek alternatives and ways to city-region as attempts to overcome unemployment and social inequality. This article establishes a relationship of this dynamics with the city of Ipatinga/MG with the impacts of the privatization of USIMINAS and the initiatives of local actors to reinvent the local economy. The methodological procedure adopted was a qualitative approach with semi-structured interview technique and discourse analysis. Twelve semi-structured interviews were conducted with the local actors and documental research. The results presented in the research show that the privatization effects of the company have an impact on the economic development of the municipality, with a reduction in jobs and trade, which is a consequence of the cooling of the steel industry. It also reveals that the municipal public power has little predisposition to structure public-private partnerships in promoting local development endogenous fact related to the trajectory of dependency and the lack of cohesion and social capital. In these respects, it can be conceived that the projects developed are too bold and inept to sufficiently stimulate economic development and reduce the high level of unemployment.
Keywords: Local Development, Local Actors, State, Privatization.
Artigos
As relações interinstitucionais de desenvolvimento local em Ipatinga (MG)
The interinstitutional relations of local development in Ipatinga (MG)
Recepção: 17 Setembro 2017
Aprovação: 27 Junho 2018
No final da década de 1970, o Estado brasileiro passou a apresentar sinais de crise devido ao endividamento externo, diante de uma conjuntura internacional desfavorável e a vários problemas sociais. Desde então, iniciativas de desenvolvimento local têm sido discutidas no contexto de falência do paradigma nacional-desenvolvimentista (PEREIRA; DATHEIN, 2014; BIELSCHOWSKY, 2013).
Estes fatores intensificaram-se na década de 1980, período caracterizado pela estagnação, crise econômica e desemprego, no qual o Estado revelou-se inoperante para estimular o desenvolvimento. A política desenvolvimentista foi interrompida, desde então, e o Estado começou a usar o argumento da necessidade de seu afastamento que constitui um entrave ao progresso e ao desenvolvimento da economia (PEREIRA; DATHEIN, 2014; BIELSCHOWSKY, 2013; RIBAS JÚNIOR, 2008).
Na década de 1990, o governo federal passa a defender a globalização e o neoliberalismo como condição para sua reinserção na economia mundial. A partir deste momento, introduz o plano de desestatização como uma forma de adaptação às regras impostas pela globalização dos mercados e da política neoliberal em um contexto de acirrada competição no mercado internacional. Tal medida, promoveu impactos no mundo do trabalho repercutindo no desenvolvimento da cidade-região evidenciando implicações sociais como desemprego, aumento da pobreza e da desigualdade social (PEREIRA; DATHEIN, 2014; PEREIRA, 2011; OLIVEIRA, 2010).
É neste quadro que o desenvolvimento local pode ser visto como resposta associada a um contexto em que diferentes atores locais-regionais buscam alternativas e caminhos para superar a desigualdade e a exclusão social, visando a reconstrução de políticas e de ações a partir das potencialidades endógenas do local. Um dos desafios para o poder local é organizar e desenvolver uma rede de arranjos interinstitucionais de confiança e cooperação entre os atores locais, condição primordial para estabelecer uma governança e possibilitar êxito nas políticas públicas (CAMPOS; SOMEKH, 2013; FARIA, 2011; KLINK, 2010).
A partir destas considerações iniciais, o objetivo do presente trabalho consiste em analisar, sem a pretensão de esgotar o tema, como as iniciativas de promoção do desenvolvimento local vêm sendo implementadas em Ipatinga, cidade localizada na região metropolitana do Vale do Aço em Minas Gerais.
Para atender o objetivo proposto, a metodologia adotada inicialmente foi descrever a reconstituição da história da Usinas Siderúrgica de Minas (USIMINAS) através de uma pesquisa documental. A posteriori foi realizada pesquisa qualitativa, para a qual foram realizadas 12 entrevistas semiestruturadas com os atores locais envolvidos no processo de desenvolvimento local no período de 1990 a 2017. Para análise das entrevistas foi utilizado análise de conteúdo.
Além desta introdução, este artigo está estruturado em sete seções. Na segunda seção apresenta uma breve revisão da literatura sobre o papel do poder local adotar estratégias de desenvolvimento no contexto de transferência de responsabilidades e atribuições do Estado em âmbito federal para o local-regional. Nas demais secções são apresentados os resultados de uma pesquisa, no qual a terceira seção são apresentados os procedimentos metodológicos adotados. Na quarta seção busca relacionar que a criação da USIMINAS e da cidade de Ipatinga surge no cenário do modelo nacional desenvolvimentista da década de 1950. Na quinta seção objetiva analisar o comportamento dos atores locais diante das repercussões da privatização da USIMINAS na atividade econômica do município de Ipatinga e o desafio na resolução deste problema propondo a realização de parcerias. Na sexta seção apresenta o panorama em que foi criada Agência de Desenvolvimento de Ipatinga e suas atribuições para a promoção de desenvolvimento local baseado na potencialização dos recursos endógenos. Na sétima seção são discutidas as reflexões dos atores locais sobre os projetos que vem sendo desenvolvidos atualmente e os limites que comprometem o desenvolvimento local. Na última seção, são apresentadas as considerações finais.
No Brasil, o debate sobre desenvolvimento local ganhou destaque após a Constituição da República Federativa do Brasil ter sido promulgada em 1988. Nesse cenário, o Brasil passou por um redesenho do sistema federativo, com transferência de responsabilidades e atribuições do Estado em âmbito federal para o fortalecimento da capacidade de tomada de decisão das instâncias subnacionais estaduais e municipais, processo reforçado em 2001 com a promulgação da Lei Federal de nº 10.257, denominada de “Estatuto da Cidade”. Esse valoriza o papel do município no contexto nacional e estadual no que diz respeito à desburocratização da máquina pública para se adaptar os efeitos do desemprego e do aumento da informalidade (DOWBOR, 2010; KLINK, 2010; ALVIM, 2008).
Contudo, o declínio econômico de determinadas áreas industriais no Brasil, decorrentes do processo de privatização das indústrias que foram criadas pelo Estado ao projeto nacional desenvolvimentista, trouxe desafios para o poder local, obrigando as cidades a assumirem novos compromissos na agenda de geração de emprego e renda e a implementar políticas de atração de empresas e atividades econômicas. Neste contexto, a disseminação de um novo conceito e método de planejamento constitui-se então, um objetivo a ser perseguido pelas cidades e regiões que pretendem inserir-se nos fluxos econômicos globais e locais (CAMPOS; SOMEKH, 2013; KLINK, 2010).
Na década de 1990, algumas cidades brasileiras começaram a elaborar um modelo competitivo de inserção nas novas exigências do circuito (inter)nacional assumindo novas atribuições e novos compromissos de promotoras do desenvolvimento local atraindo empresas e atividades econômicas para seus territórios no sentido de alavancar o crescimento econômico (SILVEIRA, 2010, PIRES, 2010; SÁNCHEZ, 2010).
Convém destacar que no quadro de impactos da globalização, da política neoliberal, da concorrência entre as cidades, os desafios para o município são complexos. Se as próprias empresas já compreenderam a necessidade da reestruturação, as administrações municipais estão descobrindo que a complexidade e a dinâmica do contexto atual exigem encontrar novos caminhos de gestão local (CAMPOS; SOMEKH, 2013; KLINK, 2010; SILVEIRA, 2010; PIRES, 2010).
Análises como a de Faria (2011) e de Silveira (2010) identificaram que a maioria dos gestores públicos locais não conseguem reconhecer a necessidade de mudança no modelo administrativo, não sabem o que mudar, não tem informações que são consideradas importantes para realizar um projeto. Isto porque não dispõem de um quadro de funcionários técnicos com a competência administrativa para orientar as ações do prefeito. Portanto, constata-se que estão despreparados e desencorajados para enfrentar e diagnosticar os problemas sociais e buscar uma solução para promover desenvolvimento local no sentido de haver uma interação econômica no âmbito regional e nacional.
A literatura acadêmica destaca experiências exitosas, porém, Souza (2008) em suas pesquisas desvendou que na cidade de Castro Alves no estado da Bahia, a tentativa de promover o desenvolvimento local endógeno foi frustrada diante de um poder público centralizador, clientelista, assistencialista e patrimonialista.
Neste âmbito, o Estatuto da Cidade destaca o planejamento estratégico como um instrumento de política pública relevante para promover o desenvolvimento local e regional. Entretanto, o planejamento deve contar com a participação de todos os atores locais de dar respostas à recessão dos setores básicos da economia, às crises de desemprego, de buscar uma coesão e integração territorial da cidade-região (FARIA, 2011; DOWBOR, 2010; REZENDE, 2007).
Diante destas reflexões, o planejamento é elaborado por diferentes e complementares técnicas administrativas como o Planejamento Estratégico Municipal, o Plano Diretor da Cidade e o Plano Plurianual Municipal com o envolvimento de todos os atores sociais. Estes podem ser considerados instrumentos para a construção de um projeto e uma proposta convergente dos atores locais que organizam as ações na perspectiva do desenvolvimento local. Dentro desta perspectiva, o desenvolvimento local pode ser visto como resposta associada a esta conjuntura em que diferentes atores locais e regionais buscam alternativas e caminhos para superar a desigualdade e a exclusão social, visando a reconstrução de políticas e de ações a partir das potencialidades endógenas do local (FARIA, 2011; REZENDE, 2007).
Um dos desafios para o poder local é a habilidade do prefeito para organizar e desenvolver uma rede de arranjos interinstitucionais de confiança e cooperação entre os atores locais, condição primordial para estabelecer uma governança exitosa nas políticas públicas. É neste quadro que o poder local assume, ou deveria assumir, papel central nas políticas de atração de investimentos anteriormente reservadas ao Estado, elaborando modelos eficazes de gestão urbana e estratégias bem-sucedidas de desenvolvimento (CAMPOS; SOMEKH, 2013; FARIA, 2011; KLINK, 2010).
O papel dos gestores públicos torna-se fundamental despertando nos envolvidos a sensação de pertencimento e de protagonistas, valorizando e difundindo as ações institucionais e sua importância para a sociedade. Deve-se destacar que a identidade territorial pode ser construída local ou regionalmente, mediante espaços de articulação e de confiança entre os atores locais para enfrentar os desafios que são comuns. Esta promoção interna deve apoiar-se em obras e serviços para melhorar os espaços públicos e de bem-estar da população (KLINK, 2010; COELHO, 2010; SILVEIRA, 2010).
Constata-se que a conscientização e a participação dos diferentes atores sociais na discussão dos problemas locais impulsionam várias iniciativas de aproximação entre os atores locais para a solução de problemas comuns e aqueles relacionados ao desenvolvimento regional colaborando para a construção da identidade territorial compartilhada e participativa através da busca de consensos. Logo, é preciso manter a mobilização e participação dos atores locais, estimulando e consolidando alianças, parcerias e redes de cooperação entre os atores (KLINK, 2010; COELHO, 2010; SILVEIRA, 2010).
As pesquisas desenvolvidas por Dowbor (2010) desvendam que as experiências com projetos de desenvolvimento local-regional confirmam que a capacidade de auto-organização, a riqueza do capital social, a participação cidadã e o sentimento de apropriação do processo pela comunidade são elementos fundamentais à concretização dos projetos. Entretanto, o autor enfatiza que desenvolvimento local não é somente um conjunto de projetos voltados ao crescimento econômico, mas, que envolve uma dinâmica cultural e política que não é promovida só de cima, ou só de baixo, sobretudo resulta da articulação inteligente de diversos tipos de colaboração entre os atores locais. Assim, as ações e estratégias de desenvolvimento econômico local ocorrem num ambiente em que as relações sociais, políticas, econômicas, culturais e institucionais ocorrem no território em um espaço que é apropriado, construído e transformado por uma história local que repercute na gestão e no desenvolvimento local. É preciso considerar e fazer uma reflexão do contexto social que os atores institucionais estão inseridos e como seus desempenhos determinam no processo de desenvolvimento econômico local (PUTNAM, 2000; PRZEWORSKI, 2005).
Neste sentido a eficácia e a eficiência administrativa dos atores locais em promover desenvolvimento no sentido de dinamizar a economia dependem do ethos de capital social, cooperação voluntária, virtuosidade do equilíbrio social, formação de alianças, gestão pública participativa e democrática. Ainda dentro desta perspectiva, as relações sociais estruturadas em sentimento de pertencimento, reciprocidade e solidariedade é que determinam um desenvolvimento local de sucesso (PUTNAM, 2000; TENÓRIO, 2007). As pesquisas desenvolvidas por Putnam (2000) demonstram que as regiões do mundo de maior crescimento econômico e social são aquelas que apresentam todos esses elementos citados num ambiente de relações sociais de confiança e coesão social. No cerne dessa questão, para o neoinstitucionalismo[1], a trajetória passada ou o path dependence de cada instituição interfere na atuação e no futuro das políticas de desenvolvimento (SANTOS; BITARELLO; PEDDE 2008; PRZEWORSKI, 2005). É preciso considerar que a história pode facilitar ou obstruir determinadas trajetórias em que as instituições construíram, pois, segundo Tenório (2007) se a intervenção foi assistencialista cria uma dependência, se a intervenção foi autoritária cria baixo estima, se a intervenção foi clientelista cria adesão, por fim se a intervenção foi democrática cria autonomia e cidadania.
As análises realizadas por Dowbor (2010) indicam que várias cidades se deram conta desta dimensão pela busca desenvolvimento local. Construíram espaços de mobilização democrática e produtiva, onde os atores sociais se organizam para mobilizar o potencial local para estimular um conjunto de atividades econômicas através de novos pactos e arranjos sociais e da mobilização dos recursos disponíveis.
A literatura acadêmica destaca várias experiências de cidades brasileiras (ABCD Paulista, Campinas, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Fortaleza, Juiz de Fora, entre outras) que alcançaram resultados através das parcerias, convênios, consórcios, acordos muitas vezes informais, tendo em comum a sabedoria de articular os interesses diferenciados e envolver os atores locais na construção de uma nova cultura política e na resolução dos problemas da cidade-região (KLINK, 2010; SÁNCHEZ, 2010; MARTINS, VAZ; CALDAS, 2010).
À luz destas considerações, Bugs (2009) salienta que para fazer frente às mudanças econômicas e sociais que vêm ocorrendo nas últimas décadas, os governos locais precisam adotar práticas de inovação na forma de gestão urbana e iniciativas empreendedoras para gerir os projetos urbanos com eficácia. Entretanto, os governos locais para alcançar êxito na maneira de atuar na gestão urbana vêm buscando uma aproximação dos modelos privados de administração, tornando-se mais ágil nas decisões e desprovido de amarras burocráticas.
Segundo a pesquisadora Bugs (2009), os argumentos que justificam a necessidade de adotar modelos mais eficazes de gestão urbana adequados são: importância econômica das cidades; responsabilidades da administração local; papel que os municípios têm na tomada de decisões; pressão sob o uso do território; necessidade da prestação de serviços públicos de qualidade aos cidadãos. É nesta conjuntura de dar respostas à multiplicidade e complexidade crescente aos problemas das cidades que a administração pública se depara com a quase obrigatoriedade de transformar sua maneira de atuar, de aproximar-se de modelos privados de gerenciamento das empresas.
O termo gestão urbana segundo Bugs (2009) e Villaescusa (1998) pode ser definido como o conjunto de recursos e instrumentos da administração pública que, ao ser aplicado na cidade, tem a pretensão de focar a qualidade dos equipamentos e dos serviços urbanos, e na mobilização de capital e negócios em busca de qualidade de vida para os cidadãos. Além das responsabilidades de um sistema de gestão urbana municipal, destaca-se, a gestão de projetos urbanos, a gestão dos serviços públicos como limpeza e segurança.
Diante desta questão, Bugs (2009) e Bahia (2000) apontam que as escolas, europeia e norte-americana explicam esta mudança de atitude dos governos locais em direção à inovação, iniciativas empreendedoras e de novas formas de arrecadação e financiamento, para fazer frente às mudanças econômicas e sociais do modo de produção capitalista que repercute nas cidades. A superação deste quadro tem se dado através de uma nova forma de ver, pensar e administrar as cidades, buscando adequá-las às oportunidades oferecidas pela atual dinâmica de acumulação caracterizada pela seletividade de investimentos.
A vertente europeia do planejamento estratégico enfatiza que a nova política das cidades no contexto de mudanças econômicas e sociais pode ser sintetizada na elaboração de planejamento estratégico e territorial, na elaboração de um projeto de cidade que mobilize recursos (Jogos Olímpicos, Exposições Internacionais, etc.) e permita “vender” a cidade na competição interurbana (BUGS, 2009; BAHIA, 2000).
A vertente norte-americana do empresariamento urbano concebe que governos locais bem-sucedidos passaram a gerir-se através de modelos baseados na lógica da acumulação de capital e eficiência econômica (BUGS, 2009; BAHIA, 2000). O pensamento de Marchesini Júnior (2010) coaduna com o pensamento dos autores, ao salientar que o empresariamento consiste numa nova forma de pensar e administrar as cidades, a fim de adequá-las às oportunidades oferecidas pela dinâmica de acumulação capitalista caracterizada pela seletividade de investimentos. Destaca que as cidades assumem um comportamento empresarial em relação ao desenvolvimento econômico, sendo importante especificar quem está sendo empresário em relação a quê.
Deve-se destacar que o city marketing, as parcerias público-privadas, as novas relações entre o Estado e o planejamento são ferramentas estratégicas e políticas que transformam as cidades em espaços atrativos para os investidores. Estas ferramentas procuram reestruturar o meio urbano, promover mudanças importantes relativas ao planejamento e à gestão urbana envolvendo uma nova agenda urbana (OCKE; IKEDA, 2014; CAMPOS; SOMEKH, 2013).
As Agências de Desenvolvimento Local surgiram nesta conjuntura para dar suporte institucional às prefeituras através da intermediação entre os setores públicos e privados, traçar estratégias de desenvolvimento e incentivar o potencial endógeno da cidade (KORNIN, 2011; RIBAS JÚNIOR, 2008; LLORENS, 2001). O surgimento das Agências de Desenvolvimento Local faz parte dos novos modelos de associação civil voltados à gestão pública, criados no ambiente de descentralização e do discurso do desenvolvimento local e regional que começou a ser propagado no Brasil na década de 1990. Os atores locais começaram a tomar uma nova postura diante dos problemas sociais que as cidades enfrentam decorrentes de crises econômicas e da reestruturação produtiva do setor industrial, da falência do Estado, buscando agir de forma articulada e organizada em torno de estruturas capazes de reunir toda a sociedade em torno de ações de combate à pobreza, o desemprego, à desigualdade social e executar projetos estratégicos para atender as necessidades locais (KORNIN, 2011; RIBAS JÚNIOR, 2008;GOEDERT, 2005).
De acordo com os autores, a Agência de Desenvolvimento Local pode ser conceituada como uma entidade de promoção de desenvolvimento econômico, social e ambiental com autonomia para reunir o setor público e privado objetivando a atração de investimentos para a cidade-região com a proposta de enfrentar os problemas de elevado nível de desemprego. No bojo desta análise, as agências são apontadas como instrumentos relevantes para promover diálogo entre o setor empresarial, retomar o ambiente econômico, assegurar situação favorável ao empreendedorismo, elevar os indicadores de qualidade de vida da população e incrementar a produção de conhecimento e informações sobre o crescimento da economia da cidade-região.
Agências de Desenvolvimento Local são constituídas por um arranjo institucional cujo objetivo é atuar no sentido de realizar a gestão do desenvolvimento refutando o planejamento tradicional e centralizador com ações voltadas para políticas públicas de desenvolvimento local-regional para reduzir as desigualdades sociais. Portanto, os arranjos institucionais são realizados com a construção de parcerias entre os diferentes setores governamentais, empresariais e comunitários no qual as Agências de Desenvolvimento Local sejam executoras e revisoras dos projetos estabelecidos no Planejamento Estratégico Municipal contribuindo para a geração de emprego e renda na cidade. Cabe ressaltar que são experiências recentes e ainda em constituição, portanto, são iniciativas importantes de instrumentos de promoção de desenvolvimento local-regional (BOCCA, 2009; ALMEIDA, 2008).
Na próxima seção expõe-se de forma sucinta que a construção da Usinas Siderúrgica de Minas (USIMINAS) e, respectivamente, da cidade de Ipatinga ocorreu no cenário do modelo nacional-desenvolvimentista da década de 1950, bem como analisar os aspectos propulsores a sua privatização.
Para finalização do trabalho, importantes processos foram elaborados e articulados entre questões teóricas e práticas visando seguir um recorte epistemológico. Levando em consideração estes, o ponto inicial foi realizar uma revisão na literatura acadêmica sobre o tema pesquisado para auxiliar na análise da pesquisa.
Considerando o objetivo proposto, outro passo foi a decisão por utilizar à pesquisa qualitativa que do ponto de vista de Alves-Mazzotti (2006) e Gil (1988), a aplicação vem do desejo de se compreender fatos sociais complexos, de responder questões relevantes de natureza investigativa e buscando apreender a multiplicidade de suas dimensões política, cultural e social, empregando todas as técnicas disponíveis. Para os autores supracitados, a pesquisa qualitativa é traduzida por aquilo que não pode ser mensurável, busca compreender e explicar a dinâmica das relações sociais. Os dados são retratados por meio de relatórios, levando-se em conta aspectos tidos como relevantes, como as opiniões e comentários do público entrevistado.
Para a coleta de dados foi utilizada a técnica da entrevista que pode ser definida como um processo de interação social entre o entrevistado e o entrevistador. É necessário frisar que essa técnica foi escolhida por ser flexível e não apresentar rigidez, dar liberdade ao entrevistado para se expressar sobre o tema da pesquisa fazendo de acordo com suas próprias categorias e linguagem. As entrevistas foram semiestruturadas do tipo individual, esse formato consistiu em um roteiro de questões que através de uma conversa guiada obter informações precisas e detalhadas, conferindo maior grau de liberdade durante as entrevistas e aprofundamento das questões (GUERRA, 2008; ALVES-MAZZOTTI, 2006; GIL, 1988).
No que diz respeito à seleção dos entrevistados foi estabelecido como parâmetro os atores locais envolvidos nos programas de políticas de desenvolvimento da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Turismo (SEMDETur) e Agência de Desenvolvimento de Ipatinga (ADI) no período de 1990 a 2017. Este recorte temporal justifica-se porque a privatização da empresa ocorreu em 1991 e as mudanças administrativas da mesma afetaram a economia da cidade. Os atores locais que participaram desta trajetória são constituídos por: gestores e servidores da Prefeitura Municipal de Ipatinga, diretores do Sindicato dos Metalúrgicos de Ipatinga e Região (SINDIPA), empresários do setor comercial e industrial representados pela da Associação Comercial, Industrial, Agropecuária e de Prestação de Serviços de Ipatinga (ACIAPI) e Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), Departamento de Recursos Humanos da Usinas Siderúrgica de Minas (USIMINAS) e gestores da Agência de Desenvolvimento de Ipatinga.
Foram realizadas 12 entrevistas semiestruturadas do tipo individual que iniciaram no mês de janeiro a julho de 2017. Todas entrevistas foram gravadas e com cerca de uma hora de duração cada. A transcrição das entrevistas ocorreu de forma integral, mantendo a fidelidade das falas dos entrevistados. A posteriori, as entrevistas foram digitadas e impressas, sendo feita uma leitura cuidadosa e criteriosa de cada entrevista com anotações.
Com base nessa leitura foi construída a sinopses das entrevistas que são as sínteses do conteúdo que contém as mensagens das entrevistas e linguagem dos entrevistados. As sinopses tiveram como objetivos primordiais: a- reduzir o montante de material a ser trabalhado, identificando o tema central da entrevista; b- permitir o conhecimento da totalidade do discurso; c- facilitar a comparação das entrevistas.
No que diz respeito à escolha da técnica para analisar o material das entrevistas foi utilizado análise de conteúdo. A análise de conteúdo trabalha com materiais textuais escritos. Estes textos segundo Chizzotti (2010) podem ser produzidos em pesquisa, através de transcrições de entrevistas, de registros de observação e também por textos já existentes que são produzidos para outros fins, como por exemplo, textos de revistas, jornais, etc. Para análise tipológica do material da pesquisa foi ordenado, classificado por semelhança e por diferença, reagrupando o que foi transmitido nas entrevistas. Esta etapa foi relevante para a elaboração do relatório da pesquisa e construção do texto final.
Além das entrevistas, foram utilizadas outras fontes de dados recorrendo aos arquivos da biblioteca municipal, prefeitura, imprensa local e da empresa por meio de uma pesquisa documental como livros, jornais, revistas da prefeitura e da empresa, relatórios e diagnósticos da SEMDETur e da ADI, relatórios da USIMINAS, Plano Diretor, entre outros. A coleta desse material permitiu complementar informações nas entrevistas semiestruturadas levando em consideração uma análise crítica do contexto histórico e social em que foram elaborados e produzidos na época.
Para garantir o rigor metodológico, validade e confiabilidade na pesquisa foram usadas à técnica da triangulação com o objetivo de olhar a problemática da pesquisa, a partir de mais de uma fonte de dados para superar parcialmente as deficiências que decorrem de uma investigação ou método (CHIZZOTTI, 2010). Os diferentes ângulos usados para confirmar ou refutar o problema da pesquisa foram pautados na fundamentação teórica, entrevistas semiestruturadas e pesquisa documental.
Para conhecer o objeto de estudo é necessário fazer uma breve reconstituição da história da USIMINAS em Ipatinga, sem visar uma exploração minuciosa do seu passado. Convém ressaltar que se faz necessário compreender que a empresa e cidade surgem na conjuntura do modelo nacional-desenvolvimentista. Com Juscelino Kubitschek na Presidência da República de 1956 a 1961 e o lançamento do Plano Quinquenal de desenvolvimento econômico, Minas Gerais consegue realizar o seu sonho de obter uma usina siderúrgica, através do projeto elaborado pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG), pela Sociedade Mineira de Engenheiros, por intelectuais e o governo do estado de Minas Gerais, criando a USIMINAS. Tal projetou acarretou uma série de conflitos existentes entre as classes empresariais do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, cada qual interessada na dinamização de suas regiões (MONTE-MÓR, 1997; PEREIRA, 1984).
A USIMINAS foi fundada em 25/04/1956 por meio de negociações efetuadas com um grupo de japoneses interessados em participar do empreendimento a fim de propagar sua tecnologia internacionalmente. Deve-se ressaltar que o Japão estava recuperando-se da derrota da II Guerra Mundial e buscava uma aproximação política com as nações do mundo ocidental através da demonstração de suas conquistas tecnológicas ao mundo. O Brasil estava adotando uma política econômica propícia à participação de capital externo para os investimentos industriais e precisava de tecnologia estrangeira (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990).
No dia 03/06/1957 consolidava-se o acordo nipo-brasileiro, estabelecendo uma joint venture, em que o capital da empresa correspondia 60% de participação do Brasil (sendo 40% do governo federal e 20% do governo estadual) e 40% de participação do governo Japonês. Neste acordo foram estabelecidos os pontos básicos de uma cooperação técnica entre as autoridades governamentais e grupos privados de ambos os países para a concretização do empreendimento (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990).
A escolha da região para a implantação da empresa, segundo Frizzera (1990) está relacionada com vários parâmetros adotados pela delegação japonesa: a- facilidades de comunicação terrestre com grandes centros e zonas fornecedoras de minério de ferro e carvão mineral, matérias-primas bases para a produção do aço; b- a usina estar próxima a uma das maiores reservas de ferro, o Quadrilátero Ferrífero[2] de Minas Gerais; c- maior facilidade de escoamento da produção para o exterior, através do porto de Vitória no estado do Espírito Santo; c- facilidade de obtenção dos recursos hídricos do Rio Piracicaba, afluente do Rio Doce; d- facilidade de abastecimento de energia elétrica, feita inicialmente pela Usina Sá Carvalho, Usina Hidrelétrica de Salto Grande e posteriormente pela Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG); e- proximidade com outros polos industriais de Minas Gerais, Companhia Siderúrgica Belgo Mineira (CSBM), Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), hoje denominada Vale e a Aços Especiais Itabira (ACESITA), hoje denominada de Aperam South America; f- distâncias dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo; g- topografia apropriada e com possibilidade de expansão; i- malha ferroviária e rodoviária.
O crescimento e o desenvolvimento econômico do distrito que viria a se tornar a cidade de Ipatinga foram radicalmente alterados a partir de 1958, quando a usina siderúrgica começou a ser construída. Pode-se destacar como impactos mais gerais: substituição da incipiente economia agrária de subsistência e a extração de carvão vegetal, atividade predominante na época, para industrial e urbana; intensificação de movimentos migratórios de todas as regiões do Brasil e do Japão; surgimento de um boom imobiliário e de caráter especulativo; construção às pressas de uma cidade com o propósito de abrigar a população trabalhadora; crescimento de uma cidade espontânea com favelamento precoce (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990).
Quando se instalou na região, a USIMINAS teve que construir paralelamente a cidade, para que seus operários tivessem condições mínimas de vida, pois a região era distante de aglomerações populacionais. A empresa assumiu o papel do Estado ao longo desses anos, tendo investido em escolas, habitação, postos de saúde, hospital, zoológico, clubes recreativos, teatro, cooperativas de consumo, hotéis, igrejas, aeroporto, sistemas viários vicinais, ciclovias, construção de diversos bairros, shopping center, etc. O principal objetivo desses investimentos foi atrair e conservar a mão de obra existente, contribuindo para o desenvolvimento social e econômico de Ipatinga e da região do Vale do Aço. Empresa e cidade cresceram juntas e esta sinergia contribuiu para elevar os padrões de qualidade de vida dos cidadãos. Assim, a trajetória histórica da cidade confunde-se com a história da empresa, pois, todo o sistema urbano e a população de Ipatinga se constituiu em torno e para a usina (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990).
Com a emancipação político-administrativa do distrito de Ipatinga em 29/04/1964 e as eleições municipais, em 03/10/1965, a USIMINAS começa a transferir paulatinamente para a Prefeitura Municipal de Ipatinga parte dos serviços executados em seus bairros como a limpeza urbana, manutenção das ruas, saneamento básico, água e energia elétrica. Mesmo assim, a empresa continuou realizando vários investimentos na cidade ao longo desses anos. Após a privatização em 1991, a empresa continuou realizando vários empreendimentos na cidade-região (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990; SOARES, 2002).
O estilo gerencial paternalista da empresa caracterizou como o principal agente social na resolução dos problemas públicos e privados da cidade. Isto provocou dependência do poder local nas relações econômicas, culturais, políticas e comunitárias. A cidade foi concebida durante anos como extensão da atividade industrial, praticamente não se estabeleceu distinção entre a administração da empresa e da cidade (MONTE-MÓR, 1997; FRIZZERA, 1990; SOARES, 2002).
Em 1991 inicia-se a discussão sobre a privatização da empresa é necessário enfatizar que esse processo foi conturbado e marcado por posições radicalmente antagônicas na cidade com vários grupos sociais que deflagraram uma campanha contrária. Em outubro de 1991 a empresa é privatizada trazendo impactos para economia local e regional.
Com relação à privatização da empresa, pode ser visualizado na tabela 1 que a redução do número de funcionários da empresa ocorreu de forma gradativa de 13.413 funcionários no ano de 1990 para 12.460 em 1991, ano que a empresa foi privatizada. Com relação ao processo de enxugamento da força de trabalho está ocorrendo em todos os níveis hierárquicos, os impactos foram menores na cidade-região em virtude do fato que desde a segunda metade da década de 1980, a empresa vinha reduzindo o número de trabalhadores; realizou programas de incentivo à aposentadoria durante o processo de privatização; remanejou os trabalhadores antes da privatização para outras empresas do sistema USIMINAS; a empresa se comprometeu formalmente com o Sindicato dos Metalúrgicos através dos Acordos Coletivos de Trabalho em não realizar dispensas coletivas no decurso da pré e pós privatização.
Observa-se na tabela 1 que em 2006 houve um aumento gradual do número de 8.060 funcionários. Sendo que este aumento está relacionado ao crescimento econômico, resultado tênue à média das expectativas do mercado, segundo a pesquisa do Banco Central que era de crescimento de 2,73%. Não obstante, verifica-se que no decurso dos anos de 2011 à 2016, houve perda significativa de postos de trabalho decorrentes da queda de investimentos no país que afetou o setor siderúrgico e o desligamento de um dos altos-fornos da empresa que gerou impacto na cadeia produtiva.

Na tabela 2, verifica-se que o número de funcionários das empresas que prestam serviços para a USIMINAS na cidade de Ipatinga vem aumentando de forma expressiva após a privatização da empresa. De acordo com os dados apresentados, podem ser tecidas algumas considerações que coincidem com as discussões teóricas de Sabóia (2014), Baltar e Krein (2013) que auxiliam a compreensão da realidade de Ipatinga. Para os pesquisadores, a saída das empresas é descentralizar e deslocar parte de suas atividades para outras empresas resultando da prática da terceirização. O setor siderúrgico vem repassando atividades anteriormente desenvolvidas para as empresas terceirizadas, no caso específico da USIMINAS podemos exemplificar serviços de manutenção e inspeção de equipamentos, logística, fornecimentos de insumos e suprimentos, serviços de informática, entre outros.

Em 2014 o número de funcionários das empresas terceirizadas passou para 7.439. Este aumento do número de funcionários está relacionado com as demissões que a USIMINAS realizou em 2013 em virtude do desligamento de um dos altos fornos. Observa-se através da tabela que a partir de 2015 houve uma redução do número de funcionários devido crise política e o agravamento da instabilidade econômica do país que contribuiu para aumento do desemprego.
Ao comparar os dados da tabela 1 com a tabela 2, contata-se que, enquanto a USIMINAS vem reduzindo o número de funcionários contratados de forma direta, estes estão sendo contratados pelas empresas terceirizadas que, por sua vez, beneficiam-se desta situação já que são trabalhadores qualificados pelo Centro de Formação Profissional instituído pela empresa e são admitidos com baixos salários.
O próximo tópico ressalta que diante da preocupação dos atores locais com o impacto da redução de número de funcionários da empresa sobre a cidade decidem apresentar propostas para realizar parcerias e apresentar propostas de crescimento e de desenvolvimento para ativar a economia local.
No final de 1990, através da realização de um diagnóstico para elaboração do Plano Diretor da Cidade, já se constatava um declínio econômico de Ipatinga em relação a outras cidades do estado de Minas Gerais. Os atores locais, basicamente o empresariado local, questionavam a possibilidade de criar alternativas de trabalho que não estivessem ligadas a USIMINAS devido aos reflexos de demissões decorrentes da privatização em 1991.
Constata-se que o pilar de sustentação da economia da cidade e região do Vale do Aço é o setor siderúrgico, através da geração de empregos, renda e arrecadação com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Diante desta realidade os empresários defendiam buscar alternativas ou descobrir outras vocações econômicas no sentido de criar mecanismos para retomar o crescimento e o desenvolvimento local-regional, a fim de superar a dependência do setor siderúrgico.
Diante desta realidade surgiu em 1991 a ideia de criar o Fórum de Desenvolvimento Econômico, com o setor empresarial das cidades de Ipatinga, Coronel Fabriciano e Timóteo, representados pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais (SEBRAE-MG), Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), Associação Comercial, Industrial, Agropecuária e de Prestação de Serviços de Ipatinga (ACIAPI), Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG) e o Banco de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (BDMG).
Após a realização do Fórum de Desenvolvimento Econômico, em 1991, foi proposta criação de uma comissão com a realização de palestras, reuniões e discussões de experiências de cidade-região como, por exemplo, São Paulo e Porto Alegre que já estavam realizando projetos sobre a questão de desenvolvimento econômico, arranjos institucionais para a governança municipal, incubadoras tecnológicas e cooperativas. A proposta do Fórum foi inserir Ipatinga no âmbito do papel dos governos locais para a busca de novos caminhos e no desenvolvimento local endógeno que passou a contar com a participação dos empresários e gestores públicos da região do Vale do Aço.
Diante deste quadro, foi proposta pela ACIAPI, a CDL e a USIMINAS a criação de uma Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (SEMDE) e também um distrito industrial em Ipatinga. Entretanto, vale salientar que os desentendimentos intrapartidários da primeira gestão PT na prefeitura, Chico Ferramenta/João Magno no período de 1989/1992 com os atores locais, prevaleceram acima dos interesses do crescimento e desenvolvimento local, sendo que o projeto não saiu do papel.
Deve-se destacar que na segunda gestão do PT com João Magno/Djalma Rodrigues que compreende os períodos de 1993/1996, as discussões que foram realizadas no Fórum de Desenvolvimento Econômico foram retomadas. Portanto, as discussões sobre o declínio econômico e a necessidade de diversificação da economia local passaram assumir na agenda do município um papel de destaque de inseri-lo no novo contexto de reorientação dos governos locais para impulsionar o desenvolvimento local endógeno. Diante desta perspectiva, observa-se que as estratégias de desenvolvimento local baseadas em parcerias, participação dos atores locais que ao articular com o Planejamento Estratégico Situacional (PES) passaram a constituir um instrumento para construção de um projeto e de uma proposta de todos os envolvidos organizar ações de desenvolvimento local.
De acordo com os entrevistados, a nova gestão procurou criar mecanismos para fortalecer a governabilidade e a governança local na busca pela participação de todos os atores locais no sentido de manter diálogo. Portanto, ressalta-se que um dos eixos do programa de governo estava concentrado na questão do desenvolvimento econômico e na aproximação da prefeitura com a USIMINAS e os demais empresários.
No cerne desta questão formou-se uma consciência de participação dos atores locais, com o objetivo de propor e consolidar novas alternativas de fomentar o desenvolvimento econômico local. Vale registrar que a ACIAPI, representante dos empresários, procurou o prefeito para realizar um diálogo e propor a criação da SEMDE.
É consenso entre os entrevistados que a partir da reunião começou a estreitar relações sociais entre os atores locais através da construção de parceiras e de alianças, buscando equilíbrio nos diversos interesses em jogo. Aparentemente, este ambiente de coesão social sinalizava a superação das desavenças de caráter suprapartidário de não interferir na alavancagem de desenvolvimento local. O novo estilo de administração adotado pelo prefeito João Magno revela um amadurecimento político e adoção do PES como instrumento de negociação entre os atores locais na busca por articular interesses, reordenar o jogo de poder propondo a construção de um projeto coletivo sobre o modelo de cidade de acordo com as transformações decorrentes de recessão econômica e crises de desemprego.
Na concepção dos entrevistados, diante da preocupação dos atores locais com o cenário pós-privatização da USIMINAS, do intenso processo de reformulação e de mudanças que aconteceram como demissões de funcionários que provocou e vem acentuando repercussão na atividade econômica da cidade e da região do Vale do Aço, é originada a discussão a respeito da implantação da SEMDE no ano de 1993 como meio de promoção ao desenvolvimento local.
Instituída por meio do Decreto nº 3.296 de 21/11/1994 que regulamenta a estrutura administrativa da prefeitura, a SEMDE é órgão de assessoramento do prefeito e de fomento às atividades relacionadas ao desenvolvimento econômico da cidade. Tem como competência realizar projetos e parcerias com diversos atores locais para ativar e desenvolver os setores primário, secundário e terciário, fortalecendo o município como um dos polos regionais mais relevantes do estado de Minas Gerais, assegurando a geração de emprego e renda, de reduzir a dependência econômica da cidade em relação à empresa.
No final da década de 1990, os atores locais iniciaram vários debates sobre a importância do turismo na cidade. A discussão dessa temática na cidade de Ipatinga coincidiu com a ideia de lançamento da política do governo do estado de Minas Gerais em 2001, através do Programa de Regionalização do Turismo de estimular a criação de circuitos turísticos. Em 2013 o turismo foi agregado na secretaria passando a denominar Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo (SEMDETur).
Segundo gestores da prefeitura entrevistados, a SEMDETur viabilizou a realização de vários projetos em parceria com setores públicos e privados, sendo alguns implementados com sucesso e outros estão em fase implantação. Os projetos desenvolvidos pela secretaria são: a Associação Comunitária de Crédito de Ipatinga - Banco Popular, a Feira de Artes e Artesanato (FEIRARTE), distrito industrial, turismo, a Associação dos Apicultores do Vale do Aço (AAPIVALE), cooperativa de doces, a usina de beneficiamento de leite e projeto de palmito pupunha.
O próximo tópico discutirá o contexto em que foi criada Agência de Desenvolvimento de Ipatinga (ADI), os principais atores locais envolvidos na realização das parcerias, destacando suas atribuições para a promoção de desenvolvimento local baseado na potencialização dos recursos endógenos.
A ideia da criação da Agência de Desenvolvimento de Ipatinga (ADI) surgiu por iniciativa da ACIAPI e da USIMINAS, e também, a partir de duas decisões. A primeira decisão está relacionada à missão para aproximar o poder público da USIMINAS, já que a primeira gestão do PT (Chico Ferramenta/João Magno de Moura – 1989/1992) não era favorável a essa aproximação. A segunda decisão está relacionada ao posicionamento da empresa de defender que o município procure diversificar a dinâmica da economia local com empreendimentos diferentes, pois a base econômica do município mais relevante é o setor siderúrgico isso gera uma dependência muito grande em relação à empresa. Diante de um cenário de incertezas sobre a economia mundial, há uma grande preocupação dos atores locais com o futuro do setor siderúrgico e os impactos na cadeia produtiva da cidade-região. Ao observar e analisar a tendência do mercado mundial na área siderúrgica percebe-se que o Brasil perde cada vez mais no índice de competitividade internacional nesse setor com fechamento de postos de trabalho e demissão de funcionários.
O objetivo da ADI é atrair as empresas que prestam serviços à USIMINAS integrando a cadeia produtiva do setor metalmecânico na cidade fazendo com que demais empresas instaladas na região como, por exemplo, a ACESITA na cidade de Timóteo, Celulose Nipo-Brasileira (CENIBRA) na cidade de Belo Oriente, Companhia Siderúrgica Belgo Mineira (CSBM) localizada na cidade de João Monlevade, possam realizar compras, efetuar contratos de fornecimento de materiais e prestação de serviços gerando trabalho, emprego e induzindo o desenvolvimento local e regional.
Deve-se sublinhar que durante as discussões para criar a ADI foi realizado um convênio de nº 179/00 no dia 21/11/1994 entre a prefeitura e a agência, com repasses de verbas e cooperação técnica. A ADI é uma entidade privada de promoção de desenvolvimento econômico, social e ambiental com autonomia para reunir o setor público e privado visando à atração de investimentos para a cidade. Portanto, tem a responsabilidade de promover o diálogo entre os atores políticos e empresários para que sejam gerados empregos e negócios na cidade.
De acordo o gerente da agência, a ADI foi instituída no dia 15 de dezembro de 1994 com a proposta de fomentar ações de desenvolvimento local e articular junto aos atores locais para encontrar soluções eficazes para viabilizar questões de interesse da sociedade local, independente de tendências políticas partidárias, tendo como objetivos precípuos: a- criar condições para instalação de pequenas e médias empresas que em princípio viriam prestar serviços a USIMINAS para se fixarem na cidade; b- promover a geração de emprego e renda; c- ser um instrumento de estimular o desenvolvimento autossustentado.
Para a consolidação da ADI foram firmados convênios de cooperação técnica e material entre a prefeitura, Câmara Municipal de Ipatinga, o SEBRAE-MG, o Sindicato Intermunicipal das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico do Vale do Aço (SINDIMIVA). A agência mantém convênio de cooperação técnica aprovado pela Câmara Municipal de Ipatinga com a finalidade de cobrir parte de custos de manutenção orçamentária da agência.
De acordo com entrevistados representados pelo setor empresarial, desde a criação a ADI vem elaborando vários projetos em parceria com o poder público e privado para promover o desenvolvimento econômico da cidade projetando-a no âmbito nacional e estruturando todo o processo de desenvolvimento junto aos atores locais de modo autossustentável.
De acordo com empresários entrevistados, a Agência viabilizou vários projetos que já foram implementados e outros que estão em fase de implantação como: shopping center, cooperativa de serralherias, projeto que reúne as empresas do setor metalmecânico, zona de Processamento de exportação, cursos de qualificação, capacitação empresarial, diagnóstico setorial, missões a feiras nacionais e internacionais, parque científico e tecnológico do Vale do Aço, Arranjo Produtivo Local (APL) em fruticultura, plano de desenvolvimento do Ipaneminha, porto seco de Ipatinga e APL do setor metalomecânico.
A seguir são apresentadas considerações e reflexões dos atores locais sobre os projetos que vem sendo desenvolvidos pela SEMDETur e ADI. São identificados pelos atores locais, os limites que atrapalham o desenvolvimento local.
Na visão dos empresários da ACIAPI e CDL, dos diretores do sindicato dos metalúrgicos entrevistados, os projetos desenvolvidos pela SEMDETur e ADI estão voltados para a diversificação da economia, entretanto, não foram eficazes para superar dependência ao setor siderúrgico. São projetos de pequeno porte, insuficientes para estimular o desenvolvimento econômico e gerar emprego, quando se faz referência ao nível elevado de desemprego na cidade proveniente do setor siderúrgico. Na visão destes, os papéis das duas instituições deveriam ser de o de promover projetos de dimensões maiores.
Os entrevistados elucidaram alguns fatores que impedem a atração de novos investimentos para o município como, por exemplo: a- duplicação e correção das rodovias 040, 262 e 381; b- falta de proximidade com os polos consumidores, c- melhoria de acesso da área urbana da cidade de Coronel Fabriciano; d- extensão territorial limitada; e- baixo aproveitamento da atividade silvícola; d- grau de dependência fiscal-tributária da prefeitura para com a USIMINAS que é responsável por 80% da receita do município; e- necessidade da prefeitura disponibilizar novas áreas para instalações industriais; f- construção de um terminal intermodal de transportes; g- infraestrutura viária.
Apesar do esforço de desenvolver projetos, existem outras limitações para implantação destes como: burocracia que prejudicam o andamento dos projetos; resistência de apoio por parte de outros órgãos; a aprovação do orçamento dificultando a ação da prefeitura e das instituições relacionadas ao tentar colocar em prática projetos; a morosidade dos processos faz com que os projetos ultrapassem os períodos de gestão dos políticos; a transição de uma administração municipal para outra causando descontinuidade dos projetos; a existência de divergências dentro de um mesmo mandato dificultando o pedido e execução de projetos que envolvem diversas áreas da administração municipal; os conflitos e disputas entre políticos para administrar a prefeitura.
Na visão dos entrevistados, as expectativas em relação à criação de empregos e à geração de novos negócios em Ipatinga estão sendo frustradas pelos conflitos entre os políticos e pela disputa pela ocupação de cargo na prefeitura. Merece destacar que entre as eleições de 2004 a 2016 vem sendo travada uma luta partidária entre PT e PMDB pela sucessão na administração da prefeitura com ataques e acusações nas campanhas eleitorais e pós-eleição entre Chico Ferramenta e Cecília Ferramenta contra Sebastião Quintão, devido a escândalos de corrupção e questionamentos sobre a elegibilidade das candidaturas. Entretanto, ressalta-se que tais desentendimentos políticos individualistas demonstram falta de responsabilidade, respeito com a população e comprometem a promoção de desenvolvimento local da cidade.
Uma questão suscitada durante as entrevistas revela que determinados políticos, no exercício de sua administração da prefeitura, não propiciam a criação de incentivos fiscais ou financiamento subsidiado para as empresas instalarem-se no município. Pela análise das entrevistas, infere-se que se o poder local não propor medidas efetivas no sentido de rever a a cobrança de impostos, conceder incentivos fiscais ou financiamento subsidiado, continuará o atual entrave para o desenvolvimento da cidade. Devido a esta postura dos gestores da prefeitura vem ocorrendo a evasão de algumas empresas deslocando-se de Ipatinga para a cidade de Santana do Paraíso, município adjacente.
Constata-se que os gestores públicos de Ipatinga não adquiriram consciência da competição acirrada entre as cidades, oferecendo, por exemplo doações de terrenos, isenção de tributos e infraestrutura física para atrair capital produtivo e, principalmente, manter as empresas existentes na cidade. Observa-se que a tentativa dos gestores da prefeitura em adotar uma política diferenciada está sendo criticada pelos empresários e diretores sindicais, como a falta em atrair capital produtivo e geração de emprego e renda para outra cidade da região do Vale do Aço.
Diante destas constatações e fatos identificados na pesquisa, surge um questionamento: por que o desenvolvimento local não consegue avançar em Ipatinga? Observa-se que após a emancipação da cidade, os grupos de interesses sempre ocuparam o poder político, embora tenham sido eleitos, nomeados, destituídos e revezando na administração da prefeitura nunca se preocuparam com a questão do desenvolvimento local. É dentro deste quadro de transições de vários prefeitos que se constata poucas intervenções no espaço urbano, pouco resultado para a melhoria da qualidade de vida da população e a omissão de não dar a importância devida a questão de desenvolvimento local endógeno.
Observa-se que as transições e interrupções de mandatos de prefeitos influenciaram e vem influenciando de forma negativa a atuação do poder público municipal no que diz respeito à execução de obras, falta de planejamento e principalmente de pessoas qualificadas para prestar assessoria. As explicações para o poder público não resolver os problemas urbanos estão relacionadas à debilidade organizativa e institucional, pressão de interesses hegemônicos e de práticas políticas relacionadas ao assistencialismo e paternalismo, de dependência com relação a USIMINAS em resolver os problemas públicos. Portanto, estes elementos contribuíram para que o poder público local não se fortalecesse e nem desempenhasse o seu papel que estava reservado, demonstrado fragilidade na solução dos problemas sociais e no desenvolvimento local.
Por meio das entrevistas realizadas, verifica-se que o poder público municipal espera das empresas algo em prol da cidade como a USIMINAS e a sua cadeia produtiva, porém tem pouca predisposição para estruturar parcerias público-privadas no município visando atrair novas empresas. Este fato está relacionado ao path dependence, pois, como citado anteriormente a empresa assumiu o papel de construir a cidade e o apego ao passado limita as escolhas e os caminhos dos gestores públicos em promover o desenvolvimento local endógeno.
Desde a implantação da USIMINAS e mesmo após a emancipação política de Ipatinga, a empresa realizou grandes investimentos na cidade-região. Pode-se notar que, após a privatização, continua comprometida com os investimentos na cidade, saindo de uma posição historicamente paternalista para uma postura fundamentada na troca de ações sociais por antecipação dos impostos. Com o comportamento assistencialista e paternalista, a empresa tornou-se o principal agente social na resolução dos problemas públicos e privados na cidade e isto provocou dependência de todos os segmentos sociais e principalmente dos gestores públicos.
Ao buscar uma resposta para a falta de êxito de desempenho institucional com relação ao desenvolvimento local endógeno em Ipatinga, constata-se a inexistência de uma sociedade organizada, horizontalizada e capital social. Neste sentido, devemos refletir as discussões que Putnam (2000) faz que o contexto social e a história condicionam o desempenho das instituições sociais. Portanto, a cultura política e as tradições cívicas determinam o desenvolvimento socioeconômico de uma cidade-região e capital social. A cooperação, a confiança, a reciprocidade de normas compartilhadas por todos e aberturas de participação social entre Estado e a sociedade são considerados elementos importantes para o funcionamento das instituições políticas e econômicas.
Entretanto, em uma linha convergente, Przeworski (2005) identifica as instituições como fatores determinantes para o desenvolvimento econômico de uma cidade. As instituições não são autônomas, mas condicionadas pelo contexto em que foram criadas e inseridas preservando o poder. Para o neoinstitucionalismo, o path dependency da história é importante porque molda as instituições e estas moldam a economia, no caso específico de Ipatinga constata-se que alguns atores locais ainda permanecem prisioneiros da era fordista da grande empresa que emprega mão de obra e é responsável pelo desenvolvimento local.
A compreensão acerca do desenvolvimento local da cidade de Ipatinga, preliminarmente, partiu da descrição sucinta do contexto histórico das estratégias planejadas de intervenção do Estado brasileiro no processo de desenvolvimento e crescimento econômico do país nas décadas de 1930 a 1970. Neste período, especificamente no final da década de 1970, a política desenvolvimentista veio a ser interrompida e o Estado, compreendendo-se como um agente responsável pelo entrave ao progresso e ao desenvolvimento da economia, passou a se valer do argumento da necessidade de seu afastamento em algumas áreas.
É neste quadro que o poder local principia-se a assumir políticas de atração de investimentos anteriormente reservadas ao Estado. Este evento passou a ser denominado de desenvolvimento local, manifestando-se como resposta associada ao contexto em que diferentes atores locais e regionais buscam alternativas e caminhos para superação da desigualdade e da exclusão social a fim de promover, por meio de parcerias diversificadas, a reconstrução de políticas e de ações vinculadas às potencialidades endógenas do local.
Este contexto histórico-conceitual contribuiu para identificar como foi projetada a ideia de criação da USIMINAS no cenário nacional-desenvolvimentista adotado pelo Estado e as parcerias realizadas pelos atores sociais governo federal, governo estadual e a iniciativa privada para a construção da usina assim como os critérios observados para a escolha de um local adequado para sediar a empresa. Quanto a estes, empenharam-se em identificar e avaliar qual cidade dentre as do estado de Minas Gerais aproximavam-se do tipo ideal de fatores relacionados aos recursos disponíveis para a realização do empreendimento.
Os resultados apresentados na pesquisa demonstram que as mudanças observadas na cidade de Ipatinga vão ao encontro dos apresentados na literatura sobre como os efeitos da privatização da USIMINAS em 1991 estão impactando o desenvolvimento econômico da cidade-região, com repercussão na atividade econômica do município que tem alto grau de dependência em ralação à empresa. Mesmo que haja constante modernização e aumento de produtividade na usina em Ipatinga, a tendência é a redução dos postos de trabalho no futuro e a intensificação de práticas de terceirização e subcontratação.
Desde o início da década de 1990, já se evidenciava um declínio econômico de Ipatinga em relação às demais cidades do estado. Diante desta realidade foi sugerido pelo setor empresarial de Ipatinga a criação de uma Secretaria de Desenvolvimento Econômico e uma Agência de Desenvolvimento no contexto de várias cidades brasileiras que estavam realizando discussões na busca de caminhos para promover o desenvolvimento local endógeno. A proposta das duas instituições são discutir e conciliar alternativas ou descobrir outras vocações econômicas para superação da dependência da cidade-região com o setor siderúrgico. Os dados empíricos revelam que os projetos desenvolvidos estão voltados para a diversificação da economia local, embora, não são suficientes para estimular o crescimento e o desenvolvimento.
Ao retomar as questões na literatura acadêmica sobre a importância do papel dos gestores municipais e a importância da cooperação entre os atores locais, constata-se que a ação do poder público, no que se refere a promover o desenvolvimento econômico de Ipatinga, fugiu aos princípios do que foi discutido no referencial teórico.
O estudo revela vários fatores que estão interligados que limitam as estratégias de desenvolvimento local. Desde a emancipação político-administrativa da cidade em 1964 até as eleições de 2016 constata-se que as transições e interrupções de prefeitos vem influenciando a atuação do poder público municipal no desenvolvimento local.
Portanto, a dificuldade e a incapacidade dos gestores públicos da prefeitura de gerar espaços que permitam articular e empreender o desenvolvimento está relacionado ao path dependence, pois, como citado anteriormente, a empresa assumiu o papel de construir a cidade e o apego ao passado limita as escolhas e os caminhos do poder público em promover o desenvolvimento local endógeno. A respeito do ambiente institucional deve ser levado em consideração a trajetória passada de cada instituição e atuação. O path dependence de cada instituição interfere na atuação do poder local e no desempenho de políticas públicas devido à falta de cooperação e de capital social.
Os dados empíricos mostram que é preocupante o processo de relativo afastamento e distanciamento entre os atores locais e também é incipiente o sistema de governança implementado pelos gestores públicos da prefeitura de gerar espaços que permitam articular e empreender o desenvolvimento. Não obstante, o papel da SEMDETur e da ADI leva a crer que serão articuladores e executores de políticas de desenvolvimento econômico e instituições chaves para intermediar a transição de um novo conceito de gestão urbana voltada para o empreendedorismo.
Através do problema pesquisado motivou algumas sugestões para possíveis pesquisas no futuro. Enfim, são algumas questões que parecem ainda estar em aberto, e que, sem sombra de dúvida, devem nortear as preocupações de futuros pesquisadores. Em primeiro lugar, realizar uma pesquisa para analisar e avaliar os impactos da privatização das duas siderúrgicas (USIMINAS e ACESITA) e a indústria produtora de celulose (CENIBRA) na região do Vale do Aço. Em segundo lugar, realizar uma pesquisa com os trabalhadores da Companhia Siderúrgica Paulista (COSIPA) para avaliar os impactos da entrada no Sistema USIMINAS no que diz respeito à nova filosofia de trabalho já que a USIMINAS desde a sua criação adotou o modelo gerencial toyotista.
É importante mencionar que não foi intenção trazer, através desta investigação, soluções definitivas ou apresentar respostas finais, mas sim, provocar uma reflexão e alguns questionamentos sobre a maneira de atuação dos atores locais, principalmente os políticos da cidade de Ipatinga na promoção do desenvolvimento local endógeno com crescimento econômico.

