Resumo: O presente trabalho aborda a discussão sobre a utilização da obra cinematográfica O Menino e o Mundo como um recurso detentor de elementos aos quais possibilitam a aprendizagem do conceito de Paisagem, fundamentado em Milton Santos (1988). Tal escolha se deve em razão de ser uma animação brasileira escrita e dirigida por Alê Abreu, dando um caráter lúdico à proposta. Consistindo em uma pesquisa bibliográfica com análise em trechos da obra com enfoque em aspectos da paisagem e suas dinâmicas. Resultando na oportunidade de ampliar o conhecimento e ideias do saber geográfico e produzi-lo coletivamente através de filme. Diante disso, notou-se a riqueza e potencial desta obra cinematográfica para auxiliar no processo de aprendizagem do conceito geográfico em questão.
Palavras-chave:DinâmicaDinâmica,RecursoRecurso,FilmeFilme.
Abstract: This work approaches a discussion about the usage of the cinematographic work Menino e o Mundo as an element's holder resource which enable the learning about Landscape concept, based on Milton Santos (1988). This choice is due to its be a Brazilian animation written and directed by Alê Abreu, setting the proposal as a ludic characteristic. It consists in a bibliographic research with analysis in the work quotes, focusing on landscape aspects and its dynamics. Resulting in opportunities to amplify awareness and ideas about knowledge graphic, and produce it collectively through movies. Thus, we noted the richness and potential of this cinematographic work to auxiliary in learning process of the geographic concept in question
Keywords: Dynamic, Resource, Movie.
Resumen: El presente trabajo discute la utilización de la obra cinematográfica O menino e o mundo como recurso detentor de elementos que posibilitan el aprendizaje del concepto de paisaje fundamentado en Milton Santos (1988). Tal elección se justifica por ser una animación brasileña escrita y dirigida por Alê Abreu y por el carácter lúdico de la propuesta. Consiste en una pesquisa bibliográfica con análisis de extractos de la obra con énfasis en aspectos del paisaje y sus dinámicas, resultando en la oportunidad de ampliar conocimientos e ideas del saber geográfico y producirlo colectivamente través de la película. Así se observó la riqueza y el potencial de esta obra cinematográfica para auxiliar en el proceso de aprendizaje del concepto en cuestión.
Palabras clave: Dinámica, Película, Recurso.
A utilização do filme O Menino e o Mundo como recurso na discussão do conceito de paisagem e suas dinâmicas
Utilizing the movie O Menino e o Mundo as resource in discussion about landscape concept and its dynamics
La utilización de la película O Menino e o Mundo como recurso en la discusión del concepto de paisaje y sus dinámicas
Recepção: 30 Janeiro 2020
Aprovação: 30 Março 2020
Na sociedade hodierna a população se encontra cada vez mais imersa em uma vasta quantidade de informações, diante disso, é importante haver uma seleção e análise apropriada das mesmas para a construção do conhecimento e aprendizagem significativa.
Para auxiliar no processo de mediação de assuntos geográficos e redução da metodologia de ensino aula expositiva,a indústria cultural dispõe de filmes como recurso midiático estratégico para discussão de temas geográficos, a exemplo do conceito de paisagem e suas dinâmicas. Doravante, nem sempre explicações limitadas apenas a oralidade podem ser suficientes para garantir um entendimento significativo sobre determinados temas, com isto, o filme aparece como recurso didático, o qual devemos nos atentar para como este será apresentado, pois caso não haja discussões, explanações e explorações adequadas, tal instrumento pode afigurar como mera ilustração de ideias.
No mais, o trabalho segue como pesquisa bibliográfica (MARCONI; LAKATOS, 2003), pelo contato com materiais já existentes, partindo do objetivo geral de estudar a utilização do filme O Menino e o Mundo para auxiliar no ensino do conceito de paisagem, desdobrando-se nos objetivos específicos, sendo eles: discutir o conceito de paisagem, descrever o enredo do filme, analisar trechos e aspectos referentes ao conceito de paisagem e as dinâmicas desta.
As discussões aqui são provindas de apontamentos de Milton Santos (1988) sobre o conceito de paisagem, a qual, segundo este, é (des)construída com o decorrer do tempo, por meio de suas duas dimensões e sua dinâmica natural e social. Temos também Nídia Nacib Pontuschka, Tomoko Iyda Paganelli e Núria Hanglei Cacete (2009) que auxiliaram sobre a utilização de filme como recurso que contribui na produção de conhecimento e possibilita a aprendizagem de temas geográficos.
Para melhor compreensão do nosso leitor, esta seção do nosso artigo trará 2 (duas) subseções, as quais abordaremos a Conceituação de Paisagem e suas dinâmicas, para que fique visível como esta se faz presente na obra em análise, em seguida temos a Análise e discussão fílmica da obra O Menino e o Mundo como recurso na construção de conhecimento, na qual apresentamos cenas do filme que reforçam os nossos apontamentos e afirmações.
Paisagem é um conceito-chave da Geografia, o qual sofreu diversas mudanças em sua definição, desde a Geografia Tradicional, que é dada grande visibilidade na utilização do mesmo para análise do espaço. Milton Santos, importante nome da Geografia Crítica, trouxe contribuições em seu livro Metamorfoses do Espaço Habitado, fazendo uma diferenciação entre espaço e paisagem e definindo tal conceito como "Tudo aquilo que nós vemos, o que nossa visão alcança, é a paisagem. Esta pode ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é formada apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons etc." (SANTOS, 1988, p.61), sendo assim é tudo aquilo que se configura no espaço e que pode ser percebido principalmente através da visão. Mas que também está atrelado a outros sentidos humanos, de modo que, a partir do visual e outros sentidos pode-se perceber a paisagem em sua totalidade construída sobre o espaço geográfico.
A paisagem necessita de um estudo aprofundado de todo o seu conjunto de elementos dispostos no espaço geográfico, também levando-se em conta seu caráter histórico e geográfico, de modo a ultrapassar a simples apreensão dos elementos, mas a interpretação clara dos componentes. Relacionado à definição atribuída por Milton Santos, sobre sua análise a paisagem poderá apresentar diferentes interpretações ao ser analisada por variados indivíduos, pois cada pessoa percebe a realidade de uma maneira distinta.
A paisagem é um objeto dinâmico e por parte de muitos pensadores é diferenciada em duas dimensões. A primeira refere-se a paisagem natural, que abarca o conjunto de elementos da natureza que não sofreram alterações humanas, por exemplo, a vegetação, solo, rios, relevo. A segunda dimensão é a paisagem artificial ou humanizada, que representa o agrupamento dos elementos que são criados pela sociedade. A dinamicidade da paisagem se apresenta nas constantes mudanças dos componentes que vão sendo apagadas e (re)impressas no tempo sobre o espaço geográfico. Porém,com a evolução das sociedades os elementos artificiais tem se apresentado com maior intensidade devido às alterações realizadas pela humanidade.
As transformações que ocorrem na paisagem são em razão dos ciclos naturais da água, das rochas, estações climáticas dentre outros, gerando movimento e alteração das unidades dispostas no espaço. Além dessas mudanças,a construção do espaço também se dá pela ação do ser humano, a partir das modificações de materiais para a obtenção de objetos que irão ser produzidos a depender das técnicas e do nível ao qual a sociedade se encontra diante determinado momento histórico, de modo que serão contínuas as (des)construções para atender as necessidades da população em seus mais variados âmbitos (culturais, tecnológicos, sociais, políticos, entre outros). Para Santos,
a paisagem tem, pois, um movimento que pode ser mais ou menos rápido. As formas não nascem apenas das possibilidades técnicas de uma época, mas dependem, também, das condições econômicas, políticas, culturais etc. A técnica tem um papel importante, mas não tem existência histórica fora das relações sociais. A paisagem deve ser pensada paralelamente às condições políticas, econômicas e também culturais. Desvendar essa dinâmica social é fundamental, as paisagens nos restituem todo um cabedal histórico de técnicas, cuja era revela; mas ela não mostra todos os dados, que nem sempre são visíveis (SANTOS, 1988, p. 69).
Diante disso, o objetivo principal para o indivíduo ao analisar a paisagem e suas dinâmicas é perceber tais modificações, compreender quais fatores ocasionam as mudanças na paisagem e como tais alterações podem trazer benefícios e malefícios. De modo a possibilitar o sujeito a ter uma visão mais crítica e analítica sobre os componentes presentes nas paisagens em sua individualidade e totalidade. Diante de tais mudanças na sociedade Pontuschka, Paganelli e Cacete (2009, p.263) salientam que na era da globalização novas informações surgem aos sujeitos de forma rápida por meio da rádio, televisão, cinema, vídeo e computador, possibilitando um ganho qualitativo ao professor na utilização de tais recursos para ajudar o aluno a melhor compreender o mundo em que faz parte.
E, ao se trabalhar com a paisagem um dos melhores recursos a ser utilizado é a própria realidade, pois esta apresenta todos os elementos naturais e artificiais em sua melhor forma, possibilitando o desenvolvimento de todas as capacidades e percepções do indivíduo. Entretanto, nem sempre atividades de campo são possíveis de serem realizadas, assim, as produções cinematográficas são instrumentos que podem ser utilizados na exploração de conteúdos da ciência geográfica, em específico a paisagem e suas dinâmicas, de modo a contribuir na aprendizagem dos sujeitos.
As animações por um longo período sofreram perseguições e censuras ocasionadas por buscas de possíveis ideologias comunistas inseridas nas obras durante a Guerra Fria, o que levou a ocorrer mudanças no seu modo de produção, pois:
[...] Alegava-se que os desenhos eram direcionados às crianças, e que por isso as histórias precisavam ser simplistas, num processo de mediocratização da animação. Tal raciocínio se espalhou por outros países influenciados pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria, e por anos condenou a animação a uma condição de inferioridade em relação aos filmes(SATO, 2007, p.32).
Diante de tais eventos as animações tiveram seu valor diminuído, sendo repercutido até os tempos atuais como meros produtos infantis, mas, em razão das intensas produções japonesas e hollywoodianas esse quadro tem se tornado diferente, porém ainda não foi o caso da obra O Menino e o Mundo, que teve baixa bilheteria no Brasil, mas bem aclamado ao ponto de concorrer ao Oscar de melhor animação em 2016.
Apesar do alto consumo deste tipo de produto midiático na indústria cultural, ele ainda é um mecanismo pouco empregado de maneira eficiente em sala de aula no que diz respeito à construção de debates e desenvolvimento do pensamento crítico do aluno. Pontuschka, Paganelli e Cacete (2009, p.261-262) apresentam que:
Diante do avanço tecnológico e da enorme gama de informações disponibilizadas pela mídia e pelas redes de computadores, é fundamental saber processar e analisar esses dados. A escola, nesse contexto, cumpre papel importante ao apropriar-se das várias modalidades de linguagens como instrumentos de comunicação, promovendo um processo de decodificação, análise e interpretação das informações e desenvolvendo a capacidade do aluno de assimilar as mudanças tecnológicas que, entre outros aspectos, implicam também novas formas de aprender.
Dessa forma, a escola e o professor funcionam como entidades com capacidade para selecionar as informações mais prudentes e decodificá-las, mediando tais informações na busca de conhecimento, utilizando-se de ferramentas que melhor alcancem o sujeito e cumpra seu objetivo.
Em complemento, Barbosa (2011, p.112) apresenta que "[...] O papel do filme na sala de aula é o de provocar uma situação de aprendizagem para alunos e professores. A imagem cinematográfica precisa estar a serviço da investigação e da crítica a respeito da sociedade em que vivemos. [...]", porém por vezes as produções cinematográficas são utilizadas de forma solta, sem a devida análise e reflexão sobre o que está sendo apresentado, deixando de garantir uma aprendizagem mais significativa.
Por tais razões durante este tópico será analisado e discutido a utilização do filme O Menino e o Mundo como recurso para produção de conhecimento.
O Menino e o Mundoéum longa-metragem em animação com o roteiro e direção do brasileiro Alê Abreu -cineasta, desenhista e artista plástico -que foi lançado nos cinemas do Brasil em 17 de janeiro de 2014. O filme conta a história de um menino chamado Cuca, que vive em uma aldeia do interior. Certo dia o pai dele parte em busca de trabalho em outro lugar, decorrente das terras em que vivem não demonstrarem a mesma produtividade que outrora. Cuca com saudades do pai vai a procura dele pelo mundo e se depara com situações de pobreza de trabalhadores, exploração da natureza, mas também as lutas, resistências e protestos dos indivíduos em sociedade contra tais situações.
Diferentemente das produções animadas convencionais que buscam deixar o design com características mais próximas da realidade, em O Menino e o Mundo há um tratamento incomum, e os cenários e personagens são construídos com lápis de cor, giz de cera, colagens de figuras e em determinado momento cenas reais, dessa forma,o filme ganha a aparência de rabiscos infantis passando uma infantilidade e provavelmente a visão de Cuca sobre as coisas do mundo adulto, de modo que pode-se notar a personificação humana em seres inanimados, como os carros, navios, trem e helicóptero. Provavelmente tal tratamento com o filme tem o objetivo de alcançar o espectador pela sensibilidade, não só das ações de um menino aventureiro, mas principalmente pelas singelas fotografias. Referente a este, Almeida (1994) citado por Pontuschka, Paganelli e Cacete (2009, p.280-281) diz que:
[...] O que se vê no cinema tem uma semelhança com o real, e às vezes, para a população vinculada principalmente à cultura oral, as imagens passam mensagens com uma configuração próxima da oralidade, o que explica e parte por que os conteúdos das imagens são mais fortes para as pessoas do que o conteúdo de um texto.
Ainda, as conversas entre os personagens do filme apresentam uma característica peculiar, Alê Abreu coloca a reprodução dos diálogos que acontecem em sentido inverso, tornando-os incompreensíveis. De modo a não limitar a atenção apenas ao imagético, há uma simplicidade com os efeitos sonoros, pois quase todos os elementos e ações carregam uma sonoridade (automóveis,ações dos personagens, animais, chuva, objetos, etc.). Para além, até então, todo o filme pode ser utilizado para discutir o conceito de paisagem pelo sentido da visão, conceituado por Santos (1988) como o principal mecanismo de percepção, mas também a partir da audição que mesmo se o telespectador se encontrasse vendado ele possivelmente teria condições de construir as paisagens apresentadas no filme por meio dos sons emitidos.
A discussão em torno do filme pode ser iniciada a partir do próprio título O Menino e o Mundo que deixa marcado a abrangência que tomará a história, apesar de não deixar claro um lugar onde se desenvolverá o enredo. Tal indefinição de lugar é notória por toda a trama que não apresenta uma localização espacial específica, permitindo assim, que se pense em diversos lugares do mundo que adote práticas semelhantes de apropriação da natureza, e ao mesmo tempo cria margem para representar qualquer lugar, até mesmo o lugar de vivência do indivíduo ao qual está sendo apresentada a obra.
Relacionado a isto, o filme abre espaço para a discussão entre a escala geográfica local, regional e global, sobre como ações em uma determinada escala geográfica afetam as demais. Desse modo,a obra é um valoroso recurso de discussão da realidade do lugar em que se encontra, pois apresenta a dinâmica da sociedade, exploração da natureza e como oser humano se apropria e a transforma, desde seu nível local -que é o mais próximo do indivíduo-ao global, mostrando assim, que tudo está correlacionado. E para tal temos:
Se a leitura do mundo implica um processo permanente de decodificação de mensagens, de articulação/contextualização das informações, cabe à escola ensinar o aluno a lê-lo também por meio de outras linguagens e saber lidar com os novos instrumentos para essa leitura. Assim, a escola constitui lugar de reflexão acerca da realidade, seja ela local, regional, nacional ou mundial, fornecendo instrumental capaz de permitir ao aluno a construção de uma visão organizada e articulada do mundo (PONTUSCHKA, PAGANELLI E CACETE, 2009, p.262).
Além de o filme permitir facilmente a exploração e discussão do conceito de paisagem, também possibilita de forma definida o debate sobre as duas dimensões em que tal concepção é dividida. Ao início do filme Cuca é apresentado brincando com alguns objetos e animais e à medida que aumenta sua diversão mais elementos da natureza são acrescentados ao cenário, logo o personagem se vê em meio a uma floresta, com diversas plantas e animais, com os quais fica representado a paisagem natural sem alterações da sociedade, que pode ser vista logo abaixo na imagem 1.
À medida que o filme vai sendo construído e o personagem vai explorando o mundo mais elementos criados pela sociedade vão surgindo, de modo a demonstrar o desenvolvimento técnico, científico e informacional e como o personagem vai se valendo de mais objetos para atender ao seu interesse. Diante disso, o ambiente passa a apresentar mais características humanizadas do que naturais, acrescentando-se aqui as representações da paisagem artificial, como pode ser visto na imagem 2.
A depender do público que estiver sendo trabalhado tal conteúdo é suficiente ou passível de ser estendida a discussão, pois há uma problemática sobre a separação entre paisagem natural e artificial que apresenta contradições no tempo atual, pois pode haver interferências e intenções indiretas pelo ser humano na natureza não tocada diretamente por ele, sobre isso Santos (1988, p.23) afirma:
A paisagem artificial é a paisagem transformada pelo homem, enquanto grosseiramente podemos dizer que a paisagem natural é aquela ainda não mudada pelo esforço humano. Se no passado havia a paisagem natural, hoje essa modalidade de paisagem praticamente não existe mais. Se um lugar não é fisicamente tocado pela força do homem, ele, todavia, é objeto de preocupações e de intenções econômicas ou políticas. Tudo hoje se situa no campo de interesse da história, sendo, desse modo, social.
Também, a partir das cenas já citadas pode-se discutir a atuação do tempo sobre os elementos dispostos na paisagem, que mudam constantemente seja por intervenção da natureza ou sociedade. Sobre esta colocação, a cena em que Cuca se vê na floresta, em uma análise pode representar o homem primitivo que ainda não possuía técnicas para alterar a paisagem, precisando se adaptar a ela na condição de animal passivo. A partir do momento que vão sendo acrescentados mais elementos da cidade ao filme, pode-se representar o momento que o homem começa a se valer de técnicas para controlar a natureza e modificar sua conjuntura paisagística, tornando-a mais heterogênea com componentes naturais e artificiais. Porém, visualizando a imagem 3 percebe-se que a adoção do sistema capitalista fez com que a transformação de materiais em outros se tornasse mais intensa e a paisagem se apresente com mais componentes artificiais do que naturais, além de provocar desequilíbrios em sociedade.
Esta discussão sobre o capitalismo pode ser bastante explorada no filme sobre como ele tem forte influência na alteração da paisagem de seu estado natural ao artificial. Começando pelo pai do personagem principal que viaja em busca de trabalho para trazer renda à família em razão do lugar em que vivem não apresentar boas condições de plantio, talvez por fatores naturais ou intensa exploração do solo. Tal fato se assemelha a intensa migração que havia no Brasil, hoje pouco acentuada, em que a população da região nordeste viajava principalmente para a região sudeste, que apresentava prosperidade na economia, em busca de trabalhos que proporcionassem melhores condições de vida.
Outro ponto a ser destacado do filme é o trabalho da coleta de algodão (setor primário da economia) que apresenta o modo de produção em série, que os indivíduos passam por uma seleção a partir dos padrões impostos pelo empregador que apenas visa o benefício econômico próprio ao invés do coletivo, condicionando assim os empregados a uma vida de necessidades decorrente da falta ou pouca quantidade de capital. Em outro momento é apresentado o algodão coletado sendo transformado em tecidos nas indústrias (setor secundário da economia) com o modo de produção semelhante a que acontece na coleta em que cada indivíduo exerce uma função pré-estabelecida. Estas indústrias, produtoras de tecido, mais a frente, perdem espaço para empresas mais modernas e consequentemente deixam diversas pessoas sem trabalho. Na linha desse processo o filme apresenta a divulgação para a venda das roupas (setor terciário da economia) confeccionadas, setor apresentado com o plano de fundo de forte divulgação e intenso consumo dos produtos, mas também da carência econômica de indivíduos para se inserir no processo.
Chegando próximo ao final do filme acontece o regresso do garoto em meio a um fundo caótico de transição de uma paisagem natural para antropizada pela exploração exagerada dos recursos naturais. Aqui há uma quebra no estilo de imagem do filme que seguia como animação, mas que por alguns minutos passa a exibir cenas reais daextração agressiva de matérias-primas e o resultado danoso à natureza e a vida animal como um todo. Esse momento percebe-se que não haveria forma melhor de mostrar a desgradação ambiental, as quais são realizadas pela sociedade, se não com imagens reais de tais acontecimentos, diante disso pode-se haver um choque de realidade para quem vem acompanhando o filme com características um tanto infantis e agora se deparar com cenas “mais fortes”.
Por fim, animação, mesmo possuindo aspecto diferente do real e não apresentar as paisagens em sua aparência verdadeira, não deixa a desejar e consegue desempenhar uma função tanto de auxiliador na construção de conhecimento quanto para entretenimento. O filme apresenta uma realidade ficcional que dentro traz diversas situações e possibilidades para que o indivíduo telespectador possa perceber a discussão feita sobre o conceito de paisagem e sua dinâmica na realidade, no seu lugar de vivência, tirando o sujeito da rotina e permitindo assim um melhor desenvolvimento da relação professor-aluno e ensino-aprendizagem.
Possivelmente por ter um designer diferenciado dos padrões estéticos de outras obras ou possuir um enredo não tão interessante aos olhos da população, por trazer uma discussão de teor mais social do que meramente de entretenimento, O Menino e o Mundo não alcançou uma visibilidade tão grande frente a produções estrangeiras como: Shrek, A Era do Gelo, Toy Story.Contudo não deixa de ser uma enriquecida produção como já foi apresentado aqui, principalmente para uso como recurso didático a serem explorados diversos temas da Geografia, além do conceito de paisagem.
No presente trabalho fica evidente a importância de se discutir o conceito de paisagem e suas dinâmicas, por meio da utilização do filme animado O Menino e o Mundo,que mostra situações não reais, mas que trazem elementos do cotidiano dos indivíduos, sendo assim, torna discussões interativas e pode garantir uma aprendizagem mais significativa pela proximidade da vivência dos sujeitos.
A utilização do filme se mostra enriquecedor pelo seu caráter audiovisual, principalmente a parte imagética, e proporcionar elementos de afetividade entre personagens e espectador durante a construção da história. Além da questão em que a produção cinematográfica pode proporcionar elementos aos quais o educando pode fazer uso para desenvolver análises sobre o espaço geográfico em que está inserido.
Com base no filme, pode-se fazer uma leitura de crítica ao capitalismo, apresentando mazelas decorrentes desse sistema econômico, desigualdade social, evidenciadas nas paisagens culturais e de conflitos sociais que são gerados por diversos fatores, além de todo o problema ambiental gerado pela intensa exploração da natureza. Este artigo é pequeno para o tanto que se pode explorar do filme além do que foi proposto, fica em aberto para possíveis melhorias e verificação da possibilidade de fazer uso deste filme e obter um retorno gratificante.