Resumo: Objetiva-se discutir as características e a estruturação do Setor Agropecuário no contexto da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros. Foram realizadas pesquisa bibliográfica e em bases de dados do IBGE. Os resultados sinalizam a perda de participação do VAB Agropecuário no VAB Total; presença relevante de minifúndios e modesta atuação governamental na distribuição de terras; predominância da agricultura familiar na geração de ocupações; uso incipiente de aportes tecnológicos na produção; difusão da eletrificação rural e presença marcante de recursos hídricos. Conclui-se que, a Agropecuária perdeu importância econômica, permanece com uma estrutura fundiária incompatível, tem mais de 80% de estabelecimentos familiares, apresenta baixa capacidade técnica e tecnológica para realizar a produção e mesmo assim gera quase 40 mil ocupações.
Palavras-chave: Características produtivas, Estrutura fundiária, Geração de ocupações, Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.
Abstract: The objective is to discuss the characteristics and structuring of the Agricultural Sector in the context of the Immediate Geographic Region of Pau dos Ferros. Bibliographic research was carried out in IBGE databases. The results indicate the loss of participation of the Agropecuary VAB in the Total VAB; relevant presence of minifúndios and modest governmental action in the distribution of land; predominance of family farming in the generation of occupations; incipient use of technological contributions in production; dissemination of rural electrification and marked presence of water resources. It is concluded that Agriculture has lost economic importance, remains with an incompatible land structure, has more than 80% of family establishments, has low technical and technological capacity to carry out production and even so generates almost 40,000 occupations.
Keywords: Productive characteristics, Land structure, Generation of occupations, Immediate Geographic Region of Pau dos Ferros.
Resumen: El objetivo es discutir las características y la estructuración del Sector Agrícola en el contexto de la Región Geográfica Inmediata de Pau dos Ferros. La investigación bibliográfica se realizó en bases de datos del IBGE. Los resultados indican la pérdida de participación del VAB Agropecuario en el VAB Total; presencia relevante de minifúndios y modesta acción gubernamental en la distribución de la tierra; predominio de la agricultura familiar en la generación de ocupaciones; uso incipiente de aportes tecnológicos en la producción; difusión de la electrificación rural y marcada presencia de recursos hídricos. Se concluye que la Agricultura ha perdido importancia económica, se mantiene con una estructura de suelo incompatible, cuenta con más del 80% de establecimientos familiares, tiene baja capacidad técnica y tecnológica para llevar a cabo la producción y aun así genera casi 40.000 ocupaciones.
Palabras clave: Características productivas, Estructura del terreno, Generación de ocupaciones, Región Geográfica Inmediata de Pau dos Ferros.
Características e estruturação da agropecuária na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros: notas a partir do Censo Agropecuário de 2017
Characteristics and structuring of agriculture in the Immediate Geographic Region of Pau dos Ferros: notes from the Agricultural Census of 2017
Características y estructuración de la agricultura en la Región Geográfica Inmediata de Pau dos Ferros: notas del Censo Agrícola de 2017
Recepción: 02 Marzo 2022
Aprobación: 29 Abril 2022
A formação econômica do Rio Grande do Norte (RN) é marcada pelo legado colonial, em que a agropecuária desempenhou papel relevante na reprodução econômica. Destarte, observa-se que o Setor tem apresentado uma participação modesta na economia potiguar no período mais recente (BARRETO FILHO, LIMA JÚNIOR, 2020).
A agropecuária2 foi o vetor que permitiu a dominação do sertão potiguar, tendo a pecuária desempenhado papel central na implantação das fazendas para criação de gado e a pequena agricultura de subsistência servindo como sustentáculo alimentício para os desbravadores do território. A implantação das fazendas se deu, inicialmente, nas áreas mais propícias, como as margens do Rio Apodi e nos locais que dispunham de algum tipo de nascente (áreas serranas e entornos), inclusive as concessões de sesmarias já sinalizam que o principal objetivo das doações das terras realizadas pela Coroa portuguesa era a criação de gado bovino (BARRETO FILHO, LIMA JÚNIOR, 2020).
A partir do século XIX a cotonicultura ganhou destaque na economia do sertão potiguar, sendo responsável pela ampliação da circulação monetária, pela instalação de empreendimentos de descaroçamento em várias cidades do sertão do Rio Grande do Norte e, consequentemente, pelo adensamento das atividades comerciais e de serviços. A cotonicultura só perdeu relevância em função de inúmeras dificuldades que a atividade passou a enfrentar a partir da década de 1970, destacando-se: a) abertura do mercado às importações, implicando em maior acirramento da concorrência; b) vários períodos de secas nas décadas de 1970 e 1980; c) defasagem tecnológica e crescente descapitalização dos produtores; d) desorganização e inviabilização das cooperativas; e) redução das possibilidades de obtenção de crédito, com a falência de cooperativas de crédito, maiores exigências para concessão de crédito através do sistema bancário e diminuição do volume de crédito na década de 1980 e; f) em virtude da praga do bicudo, que determinou a drástica redução da produtividade e a consequente inviabilidade econômica do plantio de algodão (BELTRÃO, 2003; BARRETO FILHO, LIMA JÚNIOR, 2020).
A partir da derrocada do algodão, verifica-se a perda de relevância econômica da agropecuária para os municípios do sertão potiguar, pari passu, cresce a importância do Setor de Serviços, com destaques para o comércio a para a acentuada dependência em relação ao Setor Público.
Pelo exposto, tem-se como objetivo discutir as características e a estruturação do Setor Agropecuário no contexto da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros. Para consecução do trabalho foi realizada pesquisa bibliográfica e levantamento dos dados disponibilizados nas bases do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com foco nos dados provenientes do Censo Agropecuário realizado em 2017.
Além desta introdução, o trabalho conta com quatro seções. A seção 2 traz uma descrição do Setor Agropecuário no RN, com ênfase no período mais recente. A seção 3 traz os resultados e discussão, e, são apresentadas as conclusões.
A maior parte do estado do Rio Grande do Norte (RN) está inserido na área formalmente reconhecida do Semiárido3, com 147 municípios, excluindo-se a faixa litorânea oriental (20 municípios). Assim, apenas alguns municípios das Regiões Geográficas Imediatas de Natal e de Canguaretama não estão na área do Semiárido. Todas as demais regiões têm todos os municípios na área do Semiárido, sendo a Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, com 34 municípios, aquela com o maior número.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), até 20174, utilizava a divisão regional em mesorregiões e microrregiões, em que o estado do RN foi dividido em quatro mesorregiões, conforme apresentado (mapa1)e 19 microrregiões.
Para Malvezzi (2007), a região do Semiárido brasileiro é a que apresenta maior índice médio anual de pluviometria, com 750 mm/ano, dentre as demais regiões semiáridas do planeta. Em função do elevado índice pluviométrico, verificou-se que a região do Semiárido brasileiro tinha a maior capacidade de armazenamento de água do mundo entre as áreas com clima semiárido. Entretanto, conforme Malvezzi (2007), existem alguns fatores que comprometem a utilização das águas provenientes das chuvas:
1) os reservatórios armazenam água a céu aberto, facilitando a evapotranspiração;
2) a gestão dos reservatórios também deixa a desejar, uma vez que não realiza a manutenção periódica para desassoreamento5 e nem faz a recuperação de matas ciliares para diminuir os efeitos cumulativos do vento na evaporação da água;
3) a constituição do solo, com 70% de solo cristalino, compromete a infiltração e faz as águas das chuvas escoarem mais rapidamente para os rios intermitentes e, posteriormente, desaguando no mar ou evaporando antes de chegar ao litoral.
Os dados da economia potiguar indicam uma participação modesta e razoavelmente estável do Setor Agropecuário na estrutura produtiva estadual. No período de 2002 a 2006, observa-se (gráfico 1), a referida estabilidade dos setores na composição da economia estadual.
Os dados (gráficos 1 e 2), para os anos iniciais do século XXI, demonstram modestas participações dos setores Agropecuário e Industrial, reafirmando-se uma economia de serviços, com elevada participação do Setor Público na economia potiguar, mais ainda, nos municípios de pequeno porte.
As séries históricas dos censos agropecuários, com dados relativos ao RN, para o período de 1970 a 2017, indicam uma tendência de declínio do setor nos últimos levantamentos realizados. No gráfico 3 são apresentados os dados relativos ao número de estabelecimentos por tamanho da área.
Verifica-se que o número de estabelecimentos com até 100 hectares aumenta nos quatro levantamentos que ocorreram de 1970 até 1985, caindo substancialmente nos seguintes, de 1995 a 2017. Aliás, é bem sugestiva a queda do número total de estabelecimentos rurais no RN a partir do levantamento ocorrido em 1995: em 1970, o RN tinha 103.532 estabelecimentos rurais; passando para 104.819 em 1975; 106.416 em 1980; 115.736 em 1985; caindo para 90.976 em 1995; com outra diminuição em 2006 para 78.674 e; em 2017, chegando a 63.452 estabelecimentos rurais.
Vale destacar que a maior redução do número de estabelecimentos rurais, considerando apenas os dois últimos censos, ocorreu no grupo com área total de até 10 hectares, apresentando redução de 13.702 estabelecimentos. Aventa-se que a ampliação dos perímetros urbanos seja uma das causas prováveis para a redução de minifúndios, também sendo plausível o abandono, ainda que provisório, de parte dos estabelecimentos em decorrência do longo período de seca que assolou o Semiárido no período de 2012 a 2017, coincidindo o último de seca com a realização do censo.
A seguir (tabela 1) são apresentados dados da produção agrícola potiguar a partir de alguns dados selecionados dos dois últimos Censos Agropecuários realizados.
Em relação as lavouras temporárias selecionadas, considerando-se os recortes temporários de 2006 e 2017, verifica-se que as três culturas mais tradicionais da agricultura potiguar (milho, feijão e mandioca) tiveram reduções de áreas colhidas e de quantidade produzida. É provável que as reduções mais acentuadas nas áreas destinadas ao cultivo e das quantidades produzidas de milho e feijão tenham relações diretas com a longa seca que assolou a região Nordeste, inclusive alcançando a categoria de “seca excepcional” em praticamente toda a extensão do Semiárido (LIMA, SOUTO, BARRETO FILHO, 2020).
A área destinada ao cultivo de cana-de-açúcar se manteve, praticamente, a mesma nos dois anos em que os Censos foram realizados. Saliente-se que os dados do Censo Agropecuário de 2017 apontam a existência de 513 estabelecimentos rurais com áreas de cultivos de cana-de-açúcar no RN6, com concentração espacial na Região Geográfica Intermediária de Natal, 82,07%, seguida pela de Mossoró, com 15,20%, e a de Caicó com 2,73% de estabelecimentos rurais com cultivos de cana-de- açúcar (IBGE, 2017). A concentração espacial da atividade numa área menos suscetível a ocorrência de secas pode contribuir para explicar a manutenção da área destinada ao cultivo, o aumento da quantidade e os ganhos de produtividade.
Os cultivos de abacaxi, melancia e melão têm características distintas dos cultivos tradicionais, especialmente, por serem realizados em áreas de irrigação e conduzidos por empresas que dispõem de capital para estruturação da produção, prioritariamente, voltada ao atendimento de mercados distantes da área de cultivo, inclusive para exportação. As três atividades selecionadas apresentaram expansão da área colhida, com destaque para o cultivo de melão, cuja área foi ampliada em 286,79% e também de quantidades produzidas, com a produção de abacaxi aumentando em 156,89%. Em relação a produtividade, verifica-se que a de melão e de melancia caíram, -48,71% e -24,16%, respectivamente, e a de abacaxi aumentou 58,50%.
As áreas de cultivos da lavoura permanente foram ampliadas, destacando-se a de coco-da-baía com expansão de 78,41%, também aumentaram as quantidades produzidas, excetuando-se a de manga, apresentando queda de -17,98%.
Em relação a produtividade das lavouras permanentes selecionadas, observa- se que apenas a de coco-da-baía teve ganhos de produtividade, com 19,69%. Já a maior perda ocorreu na produção de castanha de caju, com -74,42%. Vale destacar que a produção de castanha e do pseudofruto do caju é bem difundida no meio rural potiguar, sendo encontrada em 4.331 e 3.350 estabelecimentos, respectivamente. A Região Geográfica Intermediária que concentra o maior número de estabelecimentos rurais com produção de castanha é a de Natal, com 1.714, seguida pela de Mossoró, com 1.577 e de Caicó, com 1.040 estabelecimentos. Já a produção do pseudofruto do caju, por Região Intermediária, é a seguinte: Natal, com 1.385 estabelecimentos, Caicó com 1.036 e Mossoró, com 929 estabelecimentos (IBGE, 2017).
Os dados abaixo (tabela 2) permitem comparar a evolução dos principais rebanhos da pecuária potiguar, considerando os anos de 2006 e 2017.
O dado mais emblemático apresentado (tabela 2) é o da redução do tamanho do rebanho bovino em 16,39%, isso por que a pecuária bovina se faz presente em 38.097 estabelecimentos rurais, representando pouco mais de 60% do total do RN (IBGE, 2017). A liquidação de quase 150 mil cabeças de bovinos, considerando a variação entre o ano de 2006 e 2017, tem potencial para gerar um acentuado impacto econômico no setor, uma vez que o valor médio de uma cabeça de gado é alto e o tamanho do rebanho só é menor do que o de galináceos.
Ainda em relação a evolução dos rebanhos, destacam-se a redução de -42,48% no plantel de asininos9 e os crescimentos dos rebanhos de ovinos e suínos, com 29,78% e 32,10%, respectivamente. A tabela 3 apresenta dados selecionados sobre a produção de origem animal.
A importância econômica da criação de bovinos já foi mencionada, mas também merece consideração a relevância que tem para a segurança alimentar das famílias de produtores e como fonte de obtenção de renda, através da comercialização do leite in natura e de derivados.
Em função dessas características de servir como fonte de alimentação, fonte de renda para os produtores, além de alguns esforços institucionais feitos pelo governo estadual para aquisição do produto de pequenos produtores, compreende-se o crescimento da produção de leite no RN, mesmo tendo em conta a ocorrência da seca prolongada de 2012 a 2017.
A tabela apresenta também o crescimento da produção de ovos de galinhas, mesmo num cenário de redução do rebanho de galináceos, -6,86% (Tabela 2). Verifica-se acentuado crescimento da produção de ovos de galinhas, 102,25%. Também se observa um tipo de produção com ampla difusão geográfica, estando presente em 31.312 estabelecimentos rurais, sendo 15.300 na Região Intermediária de Mossoró, 10.840 na Região Intermediária de Natal e 5.172 na Região Intermediária de Caicó (IBGE, 2017).
Em relação a redução da produção de leite de cabras, -55,90%, pode-se considerar que a produção do leite de cabras contou com o apoio institucional do governo estadual através da compra direta aos produtores, apresentando bons resultados, inclusive econômicos, até meados da primeira década do século XXI, porém, a partir de tal período, já sinalizava para a redução da margem de lucro e para a necessidade de reajustamento dos preços praticados pelo governo potiguar, conforme observado por Nobre e Andrade (2006).
A queda da produção de mel de abelhas, -85,46%, quando considerado os anos de 2006 e 2017, foi muito acentuada e mantem relação com a seca de 2012 a 2017. De acordo com Vidal (2018), o Nordeste apresenta condições favoráveis de clima e vegetação para a produção apícola, além de grande potencial para a produção orgânica. O autor salienta que a atividade apresentou forte crescimento na década de 2000 e foi a que teve maior redução a partir de 2011, tendo a seca como a causa do declínio.
Em relação ao cenário mais recente, o Setor Agropecuário do Nordeste apontava para um crescimento de 0,4% em 2020, menor do que o crescimento esperado para o setor no país, da ordem de 2,3% (CARNEIRO, 2020, p. 1). De acordo com o autor, as previsões para os estados da região indicavam que:
[...] Ceará deverá registrar queda de 8,9%, seguido de Rio Grande do Norte (-2,7%) e Pernambuco (-1,8%), sendo essas três Unidades Federativas importantes produtores de frutas para exportação. Em contrapartida, Maranhão (+5,9%), Piauí (+8,3%) e Bahia (+0,4%) obterão expansão em seus setores agropecuários. Referidos Estados são importantes produtores regionais de grãos. Paraíba (+6,6%) e Alagoas (+1,6%) apresentarão desempenhos mais favoráveis em suas respectivas produções agropecuárias. (CARNEIRO, 2020, p.1). (Destacamos).
Observa-se que o declínio esperado para o RN era o segundo maior da região Nordeste, mesmo se tratando de um ano com chuvas regular
A regionalização oficial do Rio Grande do Norte adotada pelo IBGE dividia o estado em quatro mesorregiões e 19 microrregiões. A partir de 2017 passou a vigorar uma nova regionalização, em que o RN foi dividido em três Regiões Geográficas Intermediárias, Natal, Caicó e Mossoró, e 11 (onze) Regiões Geográficas Imediatas, sendo a Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, constituída por 34 (trinta e quatro) municípios, a área estudada (mapa 2).
Os municípios que integram a Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros10 são: Água Nova; Alexandria; Almino Afonso; Antônio Martins; Coronel João Pessoa; Doutor Severiano; Encanto; Francisco Dantas; Frutuoso Gomes; João Dias; José da Penha; Lucrécia; Luís Gomes; Major Sales; Marcelino Vieira; Martins; Olho-d'Água do Borges; Paraná; Patu; Pau dos Ferros; Pilões; Portalegre; Rafael Fernandes; Rafael Godeiro; Riacho da Cruz; Riacho de Santana; São Francisco do Oeste; São Miguel; Serrinha dos Pintos; Taboleiro Grande; Tenente Ananias; Umarizal; Venha-Ver e Viçosa, com população total de 226.272 habitantes, sendo 151.559 residentes nas zonas urbanas e 74.713 de moradores nas zonas rurais dos referidos municípios (IBGE, 2010).
Em relação a economia da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, observa-se que a participação dos setores não se alterou muito no período de 2003 a 2014 (gráfico 4).
A característica marcante das economias nos municípios potiguares de pequeno porte é a proeminência do Setor de Serviços, com destaque para a participação do Setor Público, além de modestas participações da Indústria e do Setor Agropecuário. O Setor Agropecuário padece com as sucessivas secas, em função da baixa produtividade associada às práticas arcaicas adotadas, com a descapitalização dos agricultores familiares e a oferta crescente de alimentos produzidos pelo agronegócio, que tem chegado aos mais longínquos rincões com preços mais competitivos.
Não obstante, o Setor Agropecuário da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros apresenta um grande número de estabelecimentos rurais (gráfico 5), porém com modesta participação na área (gráfico 6).
Verifica-se que o RN tinha 63.452 estabelecimentos agropecuários, em 2017, sendo que a Região Geográfica Intermediária de Mossoró contava com 44,9% do total estadual e a Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros contava com 18,1% do total estadual e 40,3% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró.
Levando-se em consideração a condição legal das terras, tem-se a seguinte distribuição percentual referente à Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros:
a) estabelecimentos agropecuários próprios: 46% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 20,7% do total estadual;
b) estabelecimentos agropecuários em terras ocupadas: 61,4% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 36,1% do total estadual;
c) estabelecimentos agropecuários em terras em regime de comodato: 32,9% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 11,9% do total estadual;
d) estabelecimentos agropecuários em terras em regime de parceria: 68,7% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 39,2% do total estadual;
e) estabelecimentos agropecuários em terras arrendadas: 56,3% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 24,3% do total estadual;
f) estabelecimentos agropecuários em terras concedidas por órgão fundiário ainda sem titulação definitiva: 1,1% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 0,5% do total estadual.
Verificam-se percentuais altos de estabelecimentos agropecuários em terras em regime de parceria, em terras ocupadas e em terras arrendadas, porém com participações ínfimas de estabelecimentos agropecuários em terras concedidas por órgão fundiário ainda sem titulação definitiva, sinalizando a inoperância de ações governamentais para assegurar a distribuição de terras, bem como, provavelmente, denotando a desarticulação de movimentos sociais que lutam pela distribuição de terras frente ao poder da elite fundiária da área estudada.
Verifica-se que os estabelecimentos agropecuários, em 2017, ocupavam uma área total de 2.723.148 hectares, sendo que a Região Geográfica Intermediária de Mossoró contava com 45,1% da área do total estadual e a Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros contava com 11% da área do total estadual e 24,4% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró.
Considerando-se condição legal das terras, tem-se a seguinte distribuição percentual referente à Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros:
a) área de estabelecimentos agropecuários próprios: 26,5% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 12% da área do total estadual;
b) área de estabelecimentos agropecuários em terras ocupadas: 28,6% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 15,2% da área do total estadual;
c) área de estabelecimentos agropecuários em terras em regime de comodato: 28% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 12,2% da área do total estadual;
d) área de estabelecimentos agropecuários em terras em regime de parceria: 21,9% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 11,2% da área do total estadual;
e) área de estabelecimentos agropecuários em terras arrendadas: 13% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 4,7% da área do total estadual;
f) área de estabelecimentos agropecuários em terras concedidas por órgão fundiário ainda sem titulação definitiva: 0,5% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró e 0,2% da área do total estadual.
As tabelas 4 e 5 apresentam detalhamentos referentes aos estabelecimentos rurais não familiares e familiares da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.
É interessante observar que boa parte dos estabelecimentos rurais não familiares da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros é constituída por minifúndios, em que 37,6% dispõem de menos de cinco hectares (cerca de 1,0% da área total das terras da agricultura não familiar) e que 75,2% dos estabelecimentos rurais têm até 50 hectares. Por outro lado, apenas 58 estabelecimentos rurais da agricultura não familiar, 2,75% do total, concentram 37% da área total das terras da agricultura não familiar.
Quase metade, 47,9%, dos estabelecimentos rurais da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros tem menos de cinco hectares, com área média inferior a 1,9 hectares (cerca de 5,5% do total da área da agricultura familiar na região pesquisada), sugerindo grandes dificuldades para obtenção de excedentes comercializáveis e até mesmo para produzir para o sustento familiar. A exiguidade da base fundiária é uma realidade para 90,2% dos estabelecimentos da agricultura familiar, dispondo de estabelecimentos rurais com áreas de menos de 50 hectares, detendo, conjuntamente, 50,6% do total de terras da agricultura familiar. Por outro lado, 8,8% dos estabelecimentos da agricultura familiar detêm 49,3% do total de terras da agricultura familiar.
A tabela 6 traz dados sobre a geração de ocupações a partir da tipologia da agricultura na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.
A agricultura familiar é predominante na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, presente em 81,6% dos estabelecimentos rurais, gerando ocupações para 78,3% das pessoas ocupadas, porém detendo apenas 50,6% da área total dos estabelecimentos agropecuários.
O tamanho médio dos estabelecimentos rurais da agricultura familiar é de 16,2 hectares, enquanto o da agricultura não familiar é de 70,1 hectares. A agricultura familiar gera, em média, 3,2 ocupações por estabelecimento e 0,2 ocupação por hectare11, enquanto que a agricultura não familiar gera, em média, 3,9 ocupações por estabelecimento e 0,06 ocupação por hectare12. Fica evidenciado que a agricultura familiar tem gerado mais ocupações, por hectare, do que a agricultura não familiar na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.
Outro ponto que merece destaque em relação aos tamanhos médios dos estabelecimentos agropecuários na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros é que apresentam tamanhos médios menores do que aqueles observados no RN. Segundo Aquino et al (2020), o tamanho médio dos estabelecimentos rurais da agricultura familiar no estado é de 19 hectares e aqueles da agricultura não familiar alcançam, em média, 139 hectares. Assim, na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, o tamanho médio dos estabelecimentos rurais da agricultura familiar é 13% menor e o da agricultura não familiar é 49,7% menor do que o observado para o estado.
O gráfico 7 traz dados selecionados sobre a existência de irrigação, realização de rotação de culturas, utilização de agrotóxicos e existência de energia elétrica nos estabelecimentos rurais da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, considerando as tipologias da agricultura familiar, não familiar e total do Setor Agropecuário.
A irrigação é utilizada por apenas 6,3% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, estando presente em 8,2% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 5,9% nos da agricultura familiar. Aquino et al (2020) afirmam que a irrigação é utilizada em 13,9% dos estabelecimentos rurais da agricultura familiar potiguar, principalmente nos vales do Açu e Apodi, portanto, apresentando um percentual muito acima do que ocorre na região pesquisada.
A energia elétrica se encontra presente em 91% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, estando presente em 90% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 91,2% nos da agricultura familiar. Aquino et al (2020) afirmam que 90% dos estabelecimentos da agricultura familiar potiguar dispõem de energia elétrica, compatibilizando-se com os percentuais existentes na região e demonstrando que as medidas para difusão da eletrificação rural foram bem sucedidas.
Em relação a realização de rotação de culturas, verifica-se que 25,4% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros adotam essa prática, estando presente em 30,8% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 24,2% nos da agricultura familiar. Sobre a utilização de agrotóxico, observa-se que 39,6% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, estando presente em 38,8% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 39,7% nos da agricultura familiar. Os percentuais de utilização de agrotóxicos na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros se situam um pouco acima do que foi verificado por Aquino et al (2020) em relação aos estabelecimentos rurais da agricultura familiar no RN, com 35,3%.
O gráfico 8 apresenta dados selecionados sobre a existência de orientação técnica, realização de pousio de terras, existência de tratores, poços e cisternas nos estabelecimentos rurais da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, considerando as tipologias da agricultura familiar, não familiar e total do Setor Agropecuário.
Verifica-se que 27,6% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros realizam o pousio de terras como estratégia, sendo adotada por 26,5% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 27,8% nos da agricultura familiar. Aquino et al (2020) verificaram que a estratégia do pousio de terras é adotada por 21,9% dos estabelecimentos da agricultura familiar potiguar.
Constata-se que a utilização de tratores por parte dos agricultores da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros não é prática difundida, encontrando-se apenas em 1,5% dos estabelecimentos rurais da região, sendo 4,2% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 0,9% nos da agricultura familiar.
Os dados indicam a existência de algum tipo fonte hídrica (poço e/ou cisterna) em 89,4% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, estando presente algum tipo de fonte em 91% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 89% nos da agricultura familiar.
A existência de apenas cisterna alcança 70% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário, 66,6% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 68,7% nos da agricultura familiar. Os percentuais da existência de cisterna na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros se compatibilizam com os dados apontados por Aquino et al (2020) em relação aos estabelecimentos rurais da agricultura familiar no RN, com 67%.
Já a existência de apenas poço alcança 33% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário, 41% dos estabelecimentos da agricultura não familiar e 31,2% nos da agricultura familiar. Aquino et al (2020) apontam que 36,1% dos estabelecimentos rurais da agricultura familiar potiguar dispõem de poços, percentual um pouco maior do que o observado nos estabelecimentos rurais da agricultura familiar da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.
A conquista do sertão potiguar pela Coroa portuguesa se deu pela implantação de fazendas para criação de gado, inicialmente, ocupando as terras mais próximas ao curso do rio Apodi e áreas com disponibilidade de nascentes de água, como as serras e seus entornos.
Ao longo do processo de ocupação-dominação-exploração de um espaço geográfico é potenciada a capacidade de transformação do espaço natural, dados o aprendizado e acumulação de excedentes que podem ser, cumulativamente, utilizados para extração de mais recursos naturais, processamento e consumo. As atividades produtivas viabilizadoras dessa estratégia na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros foram a criação de gado bovino, a produção de algodão, os cultivos de feijão, milho, mandioca e, com menor difusão espacial na região, a cana-de-açúcar e a cajucultura.
Assim, as atividades do Setor Agropecuário foram determinantes para a constituição de povoados e vilas e asseguraram o processo de territorialização do capital mercantil, muito embora, no caso da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, condicionado pelas características fisiográficas e pelas condições edafoclimáticas existentes, notadamente a semiaridez.
O processo histórico da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros evidencia a relevância das atividades do Setor Agropecuário, contudo, com a derrocada da cotonicultura13, especialmente a partir da década de 1980, consolida-se uma dinâmica econômica puxada pelo Setor de Serviços, com acentuada participação do Setor Público. Essa configuração pode ser constatada pela tendência declinante da participação do VAB da agropecuária no VAB total, situando-se próximo aos 5% a partir do início da década de 2010.
As características do Setor Agropecuário da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros apontam que a rotação de culturas é utilizada por 25,4% dos estabelecimentos rurais, a adoção do pousio de terras ocorre em 27,6% dos estabelecimentos, o acesso para receber orientações técnicas é limitado, a irrigação é utilizada por apenas 6,3% e número reduzido de tratores, sugerindo dificuldades para a obtenção de excedentes comercializáveis.
Constata-se ampla difusão da eletrificação rural, presente em 91% dos estabelecimentos rurais do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, a existência de algum tipo fonte hídrica (poço e/ou cisterna) em 89,4% dos estabelecimentos rurais, utilização de agrotóxicos acima da média estadual, sugerindo riscos de contaminação de solos, mananciais, da produção e dos agricultores, tornando-se a utilização ainda mais arriscada em função do serviço de extensão rural não ser capaz de oferecer orientações técnicas de forma ampla.
Quanto a estrutura do Setor Agropecuário na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros, verifica-se que a quantidade de estabelecimentos rurais alcançava 18,1% do total estadual e 40,3% do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró, bem como, a predominância da agricultura familiar, presente em 81,6% dos estabelecimentos rurais.
Constata-se que os estabelecimentos rurais da Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros correspondiam a 11% da área do total estadual e 24,4% da área do total da Região Geográfica Intermediária de Mossoró, predominantemente com estabelecimentos rurais de até 50 hectares, em que 47,9%, têm menos de cinco hectares.
Mesmo considerando que a estrutura fundiária do Setor Agropecuário da região não seja adequada, em razão de grande número de estabelecimentos dispor de pouca terra e pequeno número de muita terra, considerando também a insuficiência de ações governamentais para enfrentamento dessa incompatibilidade, verifica-se que o setor foi responsável pela geração de quase 40 mil ocupações, sendo 78,3% das ocupações provenientes da agricultura familiar.
Por fim, vale assinalar que a agricultura familiar gera, em média, uma ocupação por cinco hectares, enquanto a agricultura não familiar gera, em média, uma ocupação em 16,6 hectares, portanto, não se justificando a apatia demonstrada pelo Poder Público na distribuição de terras na Região Geográfica Imediata de Pau dos Ferros.