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UMA REFLEXÃO SOBRE A QUALIFICAÇÃO NA FORMAÇÃO EM TURISMO: RELEVÂNCIA DA MICRO E PEQUENA EMPRESA PARA O DESTINO TURÍSTICO*

A REVIEW ON THE QUALIFICATION TRAINING IN TOURISM: THE RELEVANCE OF THE MICRO AND SMALL ENTERPRISE FOR THE TOURIST DESTINATION

Thiago Duarte-Pimentel
Universidade Federal de Juiz de Fora, Brazil
Sara Conceição de Paula
Universidade Federal de Juiz de Fora, Brazil
Marcela Costa Bifano de Oliveira
Universidade Federal de Juiz de Fora, Brazil

UMA REFLEXÃO SOBRE A QUALIFICAÇÃO NA FORMAÇÃO EM TURISMO: RELEVÂNCIA DA MICRO E PEQUENA EMPRESA PARA O DESTINO TURÍSTICO*

Turismo y Sociedad, vol. 18, pp. 159-177, 2016

Universidad Externado de Colombia

Recepção: 28 Abril 2015

Revised document received: 14 Setembro 2015

Aprovação: 16 Outubro 2015

Resumo: Este artigo visa identificar os principais desafios e tendências de qualificação e formação do turismólogo, bem como sua inserção profissional no contexto de um destino turístico (DT) majoritariamente formado por Micro e Pequenas Empresas (MPE'S). Com base na literatura especializada sobre MPE e sobre qualificação profissional em turismo, realizou-se uma pesquisa quali-quantitativa de cunho exploratório aplicado aos responsáveis pela contratação das organizações ligadas às Atividades Características do Turismo - ACTS. Após pesquisa bibliográfica e análise de dados secundários, a coleta foi baseada na técnica de amostragem particionada optando pelas organizações de maior representatividade do setor. Os resultados indicam, por um lado, que as MPES representam 92 % do trade turístico e, de outro, que é baixíssimo o índice de contração de pessoal qualificado em turismo, o que tende a impactar na capacidade e qualidade de elaboração de produtos turísticos. Ademais, identificou-se significativo desconhecimento das funções do turismólogo por parte das MPE'S e um despreparo deste em apresentar habilidades e competências aplicáveis a elas. Assim, conclui-se que há duplo desafio, estrutural e sistémico, no sentido de qualificar as MPE'S, mas estas, por sua vez, precisam das habilidades e competências dos turismólogos, que todavia não estão plenamente desenvolvidas.

Palavras chave: Micro e pequena empresa, qualificação profissional em turismo, habilidades e competências, produto turístico.

Abstract: This paper aims to identify the main challenges and trends of the training and professional education in tourism, as well as their employability in the context of a tourist destination (TD) mainly formed by Micro and Small Enterprises (MSES). Based on the specialized literature on SME and professional education in tourism, we carried out a qualitative and quantitative exploratory study applied to those firms with Features Activities of Tourism - ACTS responsible for hiring at the TD. After literature review and analysis of secondary information, we proceed to the data collection which was based on the partitioned sampling technique choosing the most representative firms of the sector. The results indicate, first, that MSE'S account for 92 % of the tourist trade and, second, it is very low the rate of the tourism qualified personnel hired in by these SME, which tends to impact the capacity and quality development of tourism products. In addition, it was identified significant lack of tourism specialist functions by the SME and a lack of skills and competencies by the employees to apply to them. Thus, it is concluded that there are two, structural and systemic, major challenges: to qualify the SME, but these, in turn, need the skills and competencies of the tourism qualified personnel, which however are not fully developed.

Keywords: Micro and small enterprise, tourism professional education, skills and competences, tourist product.

Introdução

O turismo emergiu como uma das maiores indústrias e de mais rápido crescimento em todo o mundo no século XX. A partir dos anos 1980, sobretudo, houve uma rápida e intensa expansão nas atividades deste setor. Ela é uma das atividades económicas de maior geração de divisas em nível mundial. O out put mundial do turismo em 2005 seria de 6.2 trilhões dólares, o que representaria 10,6 % da produção económica do mundo, e 221 milhões de empregos em turismo, que representa cerca de 8,3 % de empregos em todo o mundo. Estimativas apontam ainda que até 2015 a taxa de crescimento real da produção será de aproximadamente 4,6 %, atingindo 10,7 trilhões de dólares (Hong, 2008).

Em termos de resultados produtivos, "o setor do turismo tem sido um dos poucos setores que trouxe uma boa notícia para muitas economias. [...] [pois] tem mostrado uma notável capacidade de se adaptar às novas condições de mercado para promover o crescimento e a criação de emprego em todo o mundo, apesar dos desafios económicos e geopolíticos persistirem" (OMT, 2010, s/p). Estima-se que esteja entre os três tipos de atividade de maior faturamento e lucratividade do mundo, competindo nesse ranking, com a indústria do petróleo, a automobilística e a farmacêutica.

Além da contribuição económica, o turismo contribui também significativamente para a questão social. Segundo Oliveira (2002) o desenvolvimento deve resultar do crescimento económico acompanhado de melhoria na qualidade de vida, ou seja, deve melhorar os indicadores de bem-estar económico e social (pobreza, desemprego, saúde, educação, moradia e alimentação). Para o desenvolvimento da atividade é preciso que ela seja planejada, de forma professional e efetiva, gerando assim resultados que possam contribuir para a diminuição da pobreza, inserindo pessoas no mercado de trabalho, trazendo melhorias de infraestrutura necessária (estradas, saneamento básico, comunicação, energia elétrica, etc.), entre outros aspectos.

Guardadas as devidas proporções, apenas para efeitos de ilustração, o México, que apresenta similaridades com o Brasil em termos de tamanho, grau de desenvolvimento e, sobretudo, nos desafios enfrentados, somente no ano de 2013 recebeu 23.7 milhões de turistas, quase o mesmo montante de toda a América do Sul e cinco vezes mais do que o Brasil. Todavia, no cenário brasileiro, além de recente, a formação professional em turismo é desproporcional entre os diferentes níveis, desde o técnico ao de pós-graduação, bem como sua qualidade e efetividade são, majoritariamente, questionáveis.

Neste contexto, para Leal e Padilha (2008) qualificação da força de trabalho é um dos fatores elementares que marcam as diferenças entre o turismo nos países centrais e periféricos. E também, autores como Ruschmann (2002), Ansarah (2001), Figueiró Degrazia (2006), Masetto (2003), e Airey (2008) também fazem referência à importância da qualificação como elemento central para o turismo. Entre eles, alguns ainda colocam a qualidade da formação como fator primordial para a utilização do turismo como articula-dor do desenvolvimento social, através de uma capacidade de intervenção efetiva na realidade.

Concomitante a sua relevância, a qualificação dos turismólogos também é o fator de maior tensão. De forma geral, apesar dos incrementos quantitativos de oferta de cursos, a formação profissional em turismo foi - e ainda é - taxada como deficiente. Hoerner e Sicart (2003), tomando como partida o contexto francês e europeu, afirmam que cerca de 80 % dos egressos dos cursos de turismo não trabalham na área. No Brasil, segundo Mota (2007, p. 43), há um "[...] contra-senso existente entre a carência de profissionais qualificados, a ampla oferta de cursos superiores de turismo e o comum cenário de desemprego entre os profissionais da área".

Ao mesmo tempo em que é uma das ativida-des económicas de maior geração de divisas em nível mundial, com estimativas de crescimento real da produção em de aproximadamente 4,6 %, atingindo 10,7 trilhões de dólares (Hong, 2008), há em contrapartida, uma retração nos cursos e dificuldade de em-pregabilidade de egressos. Uma das possíveis razões que justificam este fenómeno segundo Pimentel e Paula (2014C) é a existência de diferenças de expectativas em relação aos diferentes atores que, de algum modo, se relacionam com a atividade turística, a saber: as instituições de ensino, o mercado de trabalho, e os alunos cursando o curso de turismo e os futuros profissionais da área. Ou seja, a formação superior em turismo possui desafios na consolidação do perfil profissional principalmente no que tange a emergência de áreas e transformações do ambiente do turismo globalizado por essência.

Entre os desafios que a formação enfrenta relaciona-se à qualificação para atuação nas MPE'S. Estas possuem crescente significação no cenário mundial e representam grande parte da oferta de serviços dos destinos turísticos. As MPE'S tornaram-se foco de atenção devido representatividade no cenário económico dos países e na manutenção da ordem do capital. No Brasil, segundo Castor (2009), 99,2 % das empresas nacionais se enquadram na categoria de micro e pequenas empresas e nelas, cerca de 14 milhões de pessoas trabalham. Os valores não inserem o mercado informal que resultaria em um aumento representativo de trabalhadores.

Frente esta relevância quantitativa, se faz necessário uma discussão que relacione a qualificação do turismo no contexto das MPE'S quanto ao planejamento e gestão. Para que este alcance resultados significativos é importante a concepção que no turismo o cliente é tanto parte do input quanto do output. Ou seja, assim como a maioria das operações, fundem-se os produtos e os serviços. Kotler e Armstrong (2012) afirmam que esta peculiaridade do processo traz responsabilidades específicas aos ofertantes do produto turístico 1 pois neste ambiente é aumentada a capacidade de avaliação feita pelo cliente tanto para fins positivos quanto para negativos.

Diante disso, este artigo visa identificar os principais desafios e tendências de qualificação e formação do turismólogo, bem como sua inserção profissional no contexto de um destino turístico (DT) majoritariamente formado por Micro e Pequenas Empresas (MPES). Para alcançar este objetivo a pesquisa se debruçou em um estudo de caso na Cidade de Juiz de Fora, no Estado de Minas Gerais (Brasil), utilizando uma abordagem metodológica mista, com destaque para a técnica de análise quali-quantitativa de uma amostragem não probabilística particionada. Como instrumento de coleta de dados produziu-se um questionário semiaberto, que foi aplicado às empresas ligadas as Atividades Características do Turismo - ACT'S conforme a Organização Mundial (MTur, 2011) mais representativas do setor turístico e seus sub-setores. Os entrevistados foram gerentes, diretores ou responsáveis pela contratação de profissionais do ramo turístico.

Espera-se com isso, além de evidenciar a relevância da MPE'S no cenário objeto de estudo e suas expectativas sobre os desafios do trade turístico local, fornecer elementos para a intervenção e modificação do ciclo vicioso entre: 1) baixa capacitação dos turismólogos; 2) não reconhecimento e não utilização desses profissionais pelas MPE'S; 3) inefetividade na geração concepção e geração de produtos turísticos, em quantidade e qualidade, e 4) baixo grau de desenvolvimento turístico.

Os principais resultados obtidos referem-se grande representatividade das MPE'S no trade turístico que representa mais de 80 % da amostra. A qualificação operacional dos contratados, a não contratação de turismólogos exceto estagiários, o desconhecimento das habilidades potenciais do turismólogo que geralmente era atribuído à guia turístico e a um descontentamento por parte da distância entre universidade e trade, entretanto, carregada de uma acomodação de esforços de caráter unilateral.

Referencial teórico

A relevância das MPES para sociedade

Segundo o Sebrae, as MPE'S brasileiras representam 99,2 % das empresas nacionais e quase 14 milhões de pessoas trabalham nelas (Castor, 2009), 52,3 % das pessoas economicamente ativas do país, estão empregadas nas MPE'S, distribuem cerca de 39,4 % da massa de remuneração dos empregados, mas respondem, aproximadamente por apenas 20 % do PIB brasileiro (Daher, Mineiro, Damasco & Boas, 2010).

No período de 2002 a 2012 houve uma expansão de 30,9 % no total de MPE'S, no mesmo período criaram 6,6 milhões de empregos de carteira assinada (Sebrae, 2013). Ou seja, uma das maiores contribuições para o desenvolvimento e crescimento no país é o grande índice de empregabilidade que as micro e pequenas empresas proporcionam (Oliveira & Oliveira, 2006), contudo não se reflete em produtividade já que a participação dessas empresas no produto interno bruto não é a ideal.

Nesse sentindo, na Revista Sebrae,Spínola (2007, p. 40) acredita que as micro e pequenas empresas possam contribuir significativamente no desenvolvimento do país:

[...] por meio do fortalecimento de suas atividades, têm o potencial de contribuir em temas cruciais da agenda nacional, como o combate à pobreza pela geração de trabalho, a criação de empregos e a melhor distribuição da renda, a redução da informalidade e o fortalecimento do tecido social e económico do País. São notórios, ainda, por propiciar a interiorização do desenvolvimento.

Portanto são muitos os desafios encontrados pelas micro e pequenas empresas para se manterem no mercado. Segundo Sebrae, a metade delas fecha antes de completar dois anos de operações (Sebrae, 2013). Para a permanência dessas no mercado é fundamental a existência de estratégias bem concebidas e bem executadas. Pensar estrategicamente é pensar nos problemas empresarias e suas múltiplas dimensões económicas tecnológicas, culturais, políticas ou ambientais. Para tanto é preciso fazer um planejamento estratégico, o qual será aplicado aos recursos e às circunstâncias de uma determinada empresa em particular (Castor, 2009).

Esse planejamento estratégico recai sobre as responsabilidades da função gerencial. Portanto as empresas de pequeno porte devem profissionalizar efetivamente sua gestão (seus gerentes). O Sebrae, em parceria com a Fundação Universitária de Brasília (FLJBRA), publicou os resultados de uma ampla pesquisa indicando quais os principais fatores condicionantes da mortalidade das MPE'S. E as principais causas do fracasso encontradas estão relacionadas a falhas gerencias na condução dos negócios, causas económicas conjunturais, logística operacional e políticas públicas e arcabouço legal. Outro fator encontrado foi o tipo de conhecimento necessário para a empresa sobreviver no mercado e póde-se perceber que existe uma grande falta de habilidade gerencial, ou seja, pouco conhecimento do mercado. Dessa maneira fica claro que a falta de competência gerencial, sua baixa capacitação e a falta de experiência profissional são os grandes fatores para a mortalidade das MPE'S (Ésther & Melo, 2006).

De uma forma genérica o sucesso das MPE'S, na sociedade atual, está diretamente relacionado com as competências do gerente, o qual deve possuir o papel de líder. E para tanto deve possuir algumas habilidades específicas, segundo Motta (1995, apudÉsther & Melo, 2006) essas habilidades são: ter domínio do contexto, habilidade de comunicação e interação e qualidades pessoais. Torna-se necessário o conceito de competência, que para muitos autores ultrapassa o conceito de qualificação, pois pressupõe a capacidade de um indivíduo ir além do prescrito, de desenvolver inteligência prática, devendo ser capaz de dominar novas situações (Fleury & Fleury, 2001, apud Ésther & Melo, 2006).

MPE'S e o turismo

No universo do turismo as micro e pequenas empresas também representam a maioria dos empreendimentos. Ou seja, elas que são responsáveis pela produção e venda dos produtos e serviços turísticos. A atividade turística depende de uma relação entre diversos atores para seu desenvolvimento de uma forma harmónica. O trade turístico é um dos atores de grande importância já que é responsável pela geração de vários empregos. Além dos atrativos naturais é necessário uma infraestrutura eficiente, serviços e produtos de qualidade, que garantam a estabilidade do destino no mercado competitivo. É de fundamental necessidade para a existência de um destino turístico: as redes hoteleiras, restaurantes, agências de viagens, lojas de suvenir, empresas de transportes, entre outros.

No turismo, as MPE'S influem diretamente no produto turístico. Quanto maior for a potencialidade de um destino turístico maior será a necessidade da presença desses atores, são eles que irão atender as necessidades dos visitantes, satisfazendo suas expectativas, e quanto maior a qualidade desses serviços e produtos melhor o perfil traçado pelos turistas daquela cidade.

Na seção anterior foi possível identificar que as MPE'S possuem grandes desafios quanto a sua estabilidade no mercado em relação as competências e profissionalização de seus gerentes, e no turismo esse fator influencia diretamente na qualidade do produto turístico, já que esse é composto pelas empresas que o produzem. Segundo Vieira (2007) o número de MPE'S é sempre expressivo e importante, porque elas empregam a grande massa de pessoas que estão no mercado de trabalho e não são absorvidas pelas MPE'S, diminuindo assim o nível de desempregos e contribuindo para a diminuição da pobreza. Mas por outro lado as micro e pequenas empresas absorvem pessoas desqualificadas prejudicando seu sucesso.

Portanto, as empresas dos destinos turísticos dependem da qualificação profissional do perfil do turismólogo. Sua profissionalização de qualidade irá permitir sua inserção no mercado, que necessita dos conhecimentos específicos do profissional de turismo. Para Leal e Padilha (2008) qualificação da força de trabalho é um dos fatores elementares que marcam as diferenças entre o turismo nos países centrais e periféricos. E também, autores como Ruschmann (2002), Ansarah (2001), Figueiró Degrazia (2006)Masetto (2003), e Airey (2008) também fazem referência à importância da qualificação como elemento central para o turismo. Entre eles, alguns ainda colocam a qualidade da formação como fator primordial para a utilização do turismo como articulador do desenvolvimento social.

Porém, a formação profissional em turismo foi - e ainda é - taxada como deficiente. Hoerner e Sicart (2003), tomando como partida o contexto francês e europeu, afirmam que cerca de 80 % dos egressos dos cursos de turismo não trabalham na área. No Brasil, segundo Mota (2007, p. 43), há um "[...] contra-senso existente entre a carência de profissionais qualificados, a ampla oferta de cursos superiores de turismo e o comum cenário de desemprego entre os profissionais da área".

Uma das possíveis razões que justificam este fenómeno segundo Pimentel e Paula (2014a) é a existência de diferenças de expectativas em relação aos diferentes atores que, de algum modo, se relacionam com a atividade turística, a saber: as instituições de ensino, o mercado de trabalho, e os alunos cursando o curso de turismo e futuros profissionais da área. Ou seja, a formação superior em turismo possui desafios na consolidação do perfil profissional principalmente no que tange a emergência de áreas e transformações do ambiente do turismo globalizado por essência.

Portanto a falta de qualificação dos turismólogos, e a falta de contratação de gerentes qualificados pelas MPE'S, trazem um déficit em relação ao desenvolvimento de destinos turísticos, as empresas ficam desqualificadas no atendimento de seus consumidores, refletindo diretamente na sobrevivência das micro e pequenas empresas, responsáveis por grande parte da indústria turística e pelo desenvolvimento dos destinos turísticos.

Metodologia

Este trabalho é resultado de um programa de pesquisa realizado pelo Observatório Económico e Social de Turismo financiado pelo CNPq/uFJF, onde se se desenvolveu uma pesquisa, mais ampla2, e integrada, envolvendo de forma global os diferentes atores envolvidos no setor turístico, tomando como referência o modelo de estudo de caso na cidade de Juiz de Fora - Minas Gerais, a saber: os estudantes e futuros profissionais (alunos em curso, em diferentes períodos de formação, e egressos), a instituição de ensino, através da análise dos docentes do curso de Turismo da Universidade Federal de Juiz de Fora e o mercado de trabalho local, através das empresas que compõem o trade turístico local. Nos resultados discutidos neste artigo nos debruçamos especificamente sobre a categoria trade turístico3. Um resumo da pesquisa geral, donde se observa a categoria trade turístico, em particular, pode ser visualizado no quadro abaixo.

A pesquisa realizada, de caráter quali-quanti -tativo, pode ser separada em dois momentos. O primeiro diz respeito à etapa Survey, ou seja, o levantamento dos dados alusivos a três categorias principais de atores concernentes ao campo turístico em uma realidade concreta, que teve lugar na cidade Juiz de Fora/MG. Cada tópico será tratado de forma descritiva, apresentando um arcabouço de estudos transversais (cross-sectional) a fim de retratar o cenário de perspectivas de cada uma das categorias envolvidas.

O segundo momento se refere à reconexão dos atores comparando suas expectativas e percepções com relação à formação turismó-loga. Esta etapa, crucial aos efeitos contributivos da pesquisa, apresenta as comparações entre: o perfil dos atores, competências e pontos de interação com o trade, hábito estudantil e mercadológico, características do curso de turismo e conhecimento sobre a turismologia.

Devido à amplitude da pesquisa e à variabilidade e complexidade do objeto social em estudo, cada categoria de agentes desse campo e suas subcategorias específicas receberam um tratamento estatístico peculiar apropriado à contribuição para análises fidedignas da realidade e a viabilidade do projeto de pesquisa.

A pesquisa exploratória utilizou da abordagem mista quali-quantitativa onde se aplicou a identificar a percepção do trade turístico concentrado primordialmente na parte central da Cidade de Juiz de Fora dando destaques a empreendimentos referência, representativos dos setores objetos de estudo. Os entrevistados selecionados eram gerentes, diretores ou responsáveis pela contratação de profissionais do ramo turístico. Após uma pesquisa bibliográfica e levantamento de dados secundários, foi desenvolvido uma classificação do trade com base na ACT - Atividades Características do Turismo - que utiliza a metodologia de Contas Satélites do Turismo conforme a Organização Mundial do Trabalho. Estas categorias constituem a base para a avaliação do mercado de trabalho do Turismo, a partir dos dados da Relação Anual de Informações Sociais - RAIS (Ministério do Turismo, 2011).

Tabela 1
Atores e respectivos tratamentos estatísticos.
Atores e respectivos tratamentos estatísticos.

Entretanto foram desconsiderados os segmentos de "Transporte" e "Aluguel de transporte" (MTur, 2011).

O questionário semiaberto foi aplicado, no período de novembro de 2012 a fevereiro de 2013. A uma amostra particionada obtendo 72 questionários conforme a tabela 2.

Tabela 2
Amostragem particionada.
Amostragem particionada.

As empresas foram classificadas com relação ao número de colaboradores que possui no quadro de funcionários segundo o critério utilizado pelo IBGE classificação do porte das empresas que obedece às quantidades: para micro empresas, até 9 funcionários; para pequenas de 10 a 49 funcionários. Empresas de Médio porte de 50 a 99 funcionários, e de Grande, mais de 100 funcionários.

Com relação ao trade juizforano, 47,22 % eram micro empreendimentos e 45,83 % pequena. Assim, os dados apresentaram que 93 % das organizações do setor turístico podem ser classificados como MPE'S o que representa uma significância quantitativa na ordem de definição de perfil do destino turístico como também no aspecto económico que envolve a quantidade de serviços prestados e oferta de emprego. E, 6,94 % e 1,38 % média e grande respectivamente.

Tabela 3
Distribuição das empresas segundo seu tamanho.
Distribuição das empresas segundo seu tamanho.

Com relação ao tempo de mercado, apresentam a seguinte distribuição: 60,3 % possuíam mais de 10 anos; 9,6 % possuíam de 6 a 10 anos; 19,2 % de 2 a 6 anos e 11,1 % possuíam menos de 2 anos. Portanto, se pode afirmar segundo os dados que o trade é formado de MPE'S com mais de 10 anos. É constituído principalmente pelo ramo de alimentação, agencia e hotelaria.

Resultados e Discussão

Contextualizando o Lócus de estudo: a cidade de Juiz de Fora e seu trade turístico

Juiz de Fora está a 255 km da capital Belo Horizonte, com uma população de 516.247 habitantes e 1.257 km2 de extensão territorial, o município possui um PIB de R$ 8.314.431.000,00 e PIB per capita de R$ 16.054,99, segundo dados do IBGE (2010). A cidade de Juiz de Fora é uma das cidades brasileiras com melhores índices de qualidade de vida. A expectativa de vida é de 78,4 anos, uma das mais altas do Brasil. Ainda destaca-se por ser referencia regional na saúde e educação. Foi classificada pelo IBGE (2010) como um dos 100 maiores municípios com relação ao Produto Interno Bruto e como o 5° munícipio que mais contribui para a o PIB do estado de Minas Gerais. Sua economia movimentada pelo setor de serviços que tem participação de mais de 60 % do PIB do munícipio (Sebrae, 2013).

No que tange ao turismo, Juiz de Fora faz integra o circuito turístico Caminho Novo, juntamente com os municípios de Matias Barbosa, Santana do Deserto, Santos Dumont e Simão Pereira. Os principais segmentos turísticos são Turismo de Negócios e Eventos e Turismo Cultural, e os principais atrativos verificados durante a pesquisa de campo, são Parque do Museu Mariano Procópio, Parque da Lajinha, Cine Theatro Central, Museu de Artes Murilo Mendes, além dos eventos programados: Congresso Nacional de Laticínios e Festival Internacional de Música Colonial e Antiga.

O município conta ainda com uma importante tradição cultural, que vai desde a arquitetura até o teatro, a música e o esporte. A cidade possui um belo conjunto de patrimônio ar-quitetônico e histórico com boas condições gerais de preservação e que representam períodos importantes da arquitetura brasileira. (Plano Municipal de Turismo, 2004).

Juiz de Fora foi identificada pela Secretaria de Turismo do Estado de Minas Gerais como cidade indutora de Turismo para fazer parte do Estudo de Competitividade Turística. Neste estudo, que mensurou os aspectos ligados ao turismo do destino, entre eles social, ambiental, econômico, e indicar o nível de competitividade através do índice geral de competitividade, que se refere à soma ponderada das 13 dimensões avaliadas. Enquanto a média Brasil (índice referencial da competitividade nacional) atingiu 56,0 pontos; a média geral do estado e Minas Gerais alcançou 54,5 pontos; e a de Juiz de Fora foi de 63,7 ficando, portanto, acima das médias estadual e nacional e melhorando sua posição em relação ao ano anterior, quando alcançou a nota de (60,7).

Diante dos critérios para a seleção desses destinos, dois deles são possuir infraestru-tura básica e turística, incluindo os atrativos turísticos qualificados e ter produtos comercializados pelo mercado. Nesse contexto é possível afirmar que Juiz de Fora é reconhecida, pelo Estado, como destino indutor por sua capacidade de captar e distribuir fluxo de visitantes significativos para seu entorno, por possuir infraestrutura básica e turística e, em relevância a esse estudo, por possuir atrativos turísticos qualificados (Plano Municipal de Turismo, 2004).

Em 2004, o Plano Setorial de Turismo aponta que Juiz de Fora dispõe de 4.879 empresas do setor de alimentos e bebidas, mas que desse total apenas 238 são destacados como de interesse para o turismo e 87 deles se encontram na área central. (Plano Municipal de Turismo, 2004). Ainda nesse raio estão localizadas 35 galerias interligadas, com mais de 315 lojas, 9 Shopping Centers e 7 empreendimentos ligados ao comércio turístico, superando um total de mais de 1.500 estabelecimentos comerciais. Já m 2010, segundo o Indice de Competitividade dos Destinos Turísticos de Minas Gerais, a cidade de Juiz de Fora conta com uma oferta de serviços e equipamentos composta por 71 meios de hospedagem (RAIS), 1.025 estabelecimentos de alimentação (RAIS) e 7 guias de turismo cadastrados (CADASTUR).

Por outro lado, deve se assinalar que Juiz de Fora é uma cidade com potencial para o turismo receptivo, entretanto não comporta um planejamento turístico de suas ações de forma macro e estrutural. A cidade possui como motor indispensável de sua economia o setor de serviço (IBGE, Cidades). O que permitiria a ela a condição de receber maior contingente populacional oferecendo uma estrutura de recebimento satisfatória. A ausência de um planejamento turístico que promova a cidade como um polo turístico, pode incorrer na ausência de competitividade das empresas relacionadas no setor e na estagnação da qualidade de seus serviços (CLAIT).

No que diz respeito ao porte das empresas que compõem a cadeia produtiva do turismo na cidade de Juiz de Fora 93 % delas se caracterizam como micro ou pequena, sendo que desses números 47,22 % se caracteriza como micro e 45,83 % como pequena. E, 6,94 % e 1,38 % média e grande respectivamente. Segundo a classificação do IBGE referente ao porte de empresas (Pimentel & Paula, 2014).

Com relação ao tempo de atuação das empresas no mercado, 60,3 % das empresas estão a mais de 10 anos no mercado, no entanto, estas empresas, em maioria, não desenvolvem a gestão com pretensão de crescimento, competitividade e desenvolvimento de novos produtos de serviço. Os restantes das empresas estão distribuídos da seguinte forma: 9,6 % estão de 6 a 10 anos, 19,2 % de 2 a 6 anos, e 11,1 % a menos de 2 anos (Pimentel & Paula, 2014). Ainda segundo Pimentel & Paula (2014) essas empresas são constituídas principalmente pelo ramo de alimentação, agência e hotelaria.

A Desafios quanto à qualificação do turismólogo nas MPE'S

Tomando as MPE'S como representativas da maioria do trade turístico (93 %), aplicou-se a pesquisa visando identificar e descrever desafios e problemas relacionados à quanto à qualificação do turismólogo neste segmento. A suposição inicial era a de que o baixo nível de empregabilidade dos profissionais egressos da carreira de turismo estaria associado ao caráter estrutural deste tipo de empresa (pequeno porte, forma de gestão amadora, sem intensa diferenciação de ati-vidades que justificasse a existência de um profissional com essa especificidade) aliada ao desconhecimento por parte dos próprios empresários das competências e habilidades desses profissionais.

A proporção do trade que nunca contratou um turismólogo representa 51 % da amostra. Esta é representada significativamente por áreas mais indiretamente relacionadas às atividades turísticas, como por exemplo pequenos estabelecimentos de alimentação e empresas de transporte ou prestação de serviços em geral. Nestes ramos, a maior parte dos responsáveis pela contratação desconhece as atividades que podem ser desenvolvidas pelo profissional turimólogo no setor. Cabe ressaltar, entretanto, que nestes 51 % estão incluídos elementos até de ramos mais tradicionais do turismo como agencia e hotelaria.

Contudo, pela própria distribuição dos empreendimentos, segundo seu tamanho, mais concentrada em micro e pequenas empresas, observou-se que as micro empresas (57,2 %) são as que mais contratam ou contrataram algum profissional formado em turismo, seguida pelas pequenas empresas (34,3 %). As médias e grandes empresas, devida a sua baixa incidência no destino analisado, concentram apenas 8,5 % dos contratados em turismo, sendo 5,7 % em médias empresas e 2,8 % em grandes empresas. Tais números corroboram a influência significativa, em geral, do tipo de configuração do setor -concentrado em MPE'S - sobre o processo de contratação, assim como da relação entre o tamanho e incidência de contratação.

Tabela 4
Distribuição das empresas que contratam ou já contrataram profissionais formados em turismo.
Distribuição das empresas que contratam ou já contrataram profissionais formados em turismo.

Algumas das principais razões para a não contratação podem ser vistas nos fragmentos abaixo:

Os estudantes deveriam fazer estágios não só em poucos tipos de hotéis. Mas em hotéis de diferentes portes e em várias categorias de hotéis. (Entrevistado 15).

Não tenho turismólogo porque trabalhamos com pessoas que vem a trabalho. Já tive um, mas não o contratei para esse fim. [...] Como disse, não tenho clientes que usam este serviço. O que poderia ser aprimorado é aumentar o interesse nas pessoas para virem à cidade fazer turismo. (Entrevistado 14).

Outro aspecto relevante sobre os postos de trabalho é que, segundo a pesquisa, 34 % dos turismólogos contratados são estagiários, cuja característica fundamental é a oferta de uma força de trabalho mais barata, porém menos qualificada. Este dado pode ser relevante para compreender a defasagem na qualificação do produto turístico na cidade objeto de estudo. Relacionado a esta prática, algumas instituições entrevistadas reclamam a respeito dos estagiários e funcionários do ramo, pela falta de profissionalismo, desconhecimento efetivo do trabalho do setor que deverá ser realizado. E, consequentemente, a ausência do conhecimento sobre as possibilidades para acréscimos na rentabilidade da prática empresarial ou a incapacidade de propor medidas que modifiquem o engessamento do turismo local.

No que tange a esse aspecto - a falta de conhecimento, habilidades e competências - plenamente desenvolvidas durante sua trajetória formativa na universidade, os entrevistados, foram peremptórios ao afirmar essa lacuna em termos de vivencias e práticas profissionais.

Falta entender mais da gestão geral de uma empresa. (Entrevistado 17).

O profissional sai com amplo conhecimento do trade turístico, porém pouco aplicável na prática. [...] Profissionais na área de administração podem exercer as mesmas funções com treinamento interno. (Entrevistado 18).

[A formação poderia oferecer] um entrosamento entre as faculdades e empresas. Só contratei um estagiário porque era conhecido. Minha empresa é pequena e simples, diferente de alguns hotéis em Juiz de Fora. (Entrevistado 22).

Já tive, mas não tenho mais, pois não me trazia retornos significativos. Não compensava. (Entrevistado 2).

Não sai do facebook. Diz que tem experiência, mas não tem nada. (Entrevistado 10).

Os responsáveis pela contratação das organizações foram classificados em quatro grupos quanto ao seu posicionamento frente a formação em turismo.

O quadro parece corroborar a ideia de que mais elevada concentração empregadores dos profissionais turismólogos (91,5 % em PME) está, porém, associada a um tipo de empre-gabilidade de baixa qualificação e inserção no mercado de trabalho, donde se supõe um subaproveitamento das competências destes profissionais. Isto porque a principal incidência semântica em termos de razões para a contratação é relativa a uma percepção pouco profunda dos empregadores sobre o que esses profissionais fazem, assim como do próprio setor turístico, em geral. Igualmente esse nível de informação e formação dos empregadores, aliado ao porte predominante das empresas, sugere um tipo de gestão ainda muito pessoal, informal e pouco profissionalizado em termos de conhecimentos, processos de gestão, formalização, etc. Ou seja, uma lógica próxima a das empresas familiares em seus primeiros estágios.

Por outro lado, parece haver também, por parte daqueles que conhecem melhor a ati-vidade turísticas seus diferentes tipos de profissionais, um certo questionamento em relação ao tipo e qualidade de formação dos profissionais nível superior existentes no destino turístico. Ainda de em forma de ex-ceção algumas empresas (4,2 %) contratem esse profissional visando suas habilidades de gestão e planejamento como algo diferencial - fundamentalmente grandes empresas públicas, que se incumbem dessa atividade - a maioria (23,9 %) daqueles que contratam de forma consciente quanto as capacidades desses profissionais o fazem, no entanto, mais pela experiência prática do candidato do que pela sua formação em si.

Dos responsáveis pelas empresas que contratam turismólogos (49,7 % da amostra), cerca de 57,5 % não tem como necessidade primordial a graduação em turismo. Ao invés disso, afirmam que sua contratação se dá mais por fatores pessoais - habilidades comunicacionais, por exemplo - ou casuísticos - necessidade de preencher uma vaga, do que pela necessidade de um profissional com esse tipo de formação.

Não foi necessária [a graduação], mas esses profissionais são mais oportunos. (Entrevistado 1).

No fundo do coração, não tem nada a ver com turismo. Meu diferencial são as experiências que eu vivi. (Entrevistado 9).

Todavia, cotejando esses dados com as afirmações qualitativas onde os empregadores expressam os motivos pelos quais contratam, pode-se depreender que uma parcela significativa o faz por questões de legislação e/ou oportunidades de mercado, já que são profissionais com menor remuneração em relação a outras categorias já estabelecidas. No caso especifico das organizações do trade que contratam profissionais do turismo para nível gerencial (17,3 %) esta se caracteriza pela multi funções e planejamento. Geralmente gerida por um turismólogo, o empregador estabelece uma forte relação entre o diferencial de sua organização frente às demais e formação em turismo.

A formação do conhecimento é muito importante para que o mercado seja cada vez mais profissional. Porque sou formada em turismo e acredito na formação profissional para trabalhar na área de agenciamento. (Entrevistado 4).

São profissionais dedicados e se adequam rapidamente as práticas do agenciamento na área do intercâmbio. (Entrevistado 13).

Tabela 5
Percepção das MPE's sobre a formação em turismo.
Percepção das MPE's sobre a formação em turismo.

Cabe ressaltar, entretanto, que pouca parcela dos profissionais contratados do turismo desempenham as funcionalidades de gestão e planejamento da organização; 9,3 % para a gestão; 6,7 % para multi funções e 1,3 % para o planejamento. Todos os outros se aplicam na área operacional.

Percepção do empregador sobre a formação profissional em turismo

Foram colocados aos entrevistados afirmações nos quais eles avaliariam o grau de concordância com a sua prática de gestão de seleção de profissionais em sua organização. Os gráficos abaixo devem passar pelo crivo que não necessariamente os responsáveis pela contratação possuíam conhecimento sobre as efetivas atividades realizadas por um turismólogo e que 51 % da amostra total nunca contrataram nenhum profissional do turismo. A sigla NA significa Não Avaliado e corresponde aos responsáveis pelas empresas que optaram por não responder as afirmações por desconhecer o contexto ou a profissão turismóloga.

Conforme Gráfico 1, 28 % dos entrevistados concordam com a afirmação: 'Possuo uma definição clara sobre as atividades que um turismólogo pode desempenhar na minha empresa". Na aplicação do questionário percebeu-se, no entanto, que a maioria dos profissionais responsáveis pela seleção desconhecem tanto os produtos turísticos que podem ser oferecidos como também a efetiva funcionalidade do turismólogo. Alguns não percebiam ao menos o próprio desconhecimento e partiam de um julgamento equivocado ou limitado da profissão o que ocasionava em um desconforto por parte do gestor ao responder o questionário por não ver aplicabilidade do turismólogo no seu setor. Este fenómeno foi presenciado com pouca frequência nos ramos mais tradicionais do turismo, tais como agencias, hotelarias, setor público e Organizações não governamentais relacionadas com o turismo.

Conhecimento da profissão turismóloga.
Gráfico 1
Conhecimento da profissão turismóloga.
Fonte: Elaboração própria.

A respeito das habilidades e competências que o profissional - independente de sua formação - deva apresentar para ser contratado por uma MPE'S, foi questionado aos entrevistados as vantagens dos formados em turismo frente aos demais profissionais. As respostas selecionadas foram das organizações que não nunca contrataram ou não possuem atualmen-te em seu quadro de funcionários um turis-mólogo. Agrupadas em blocos semânticos através do método de análise de conteúdo (Gil, 2008), os resultados estão dispostos na tabela abaixo:

Tabela 6
Relações sobre a não e competências.
Relações sobre a não e competências.

Conforme os dados apresentados na pesquisa, 93 % da amostra é composta por organizações classificadas como MPE'S conforme a classificação do IBGE. O que aponta a uma prática de trabalho e competência que pode estar distante da compreensão formativa das faculdades. A pesquisa destaca que a maioria das pequenos empreendimentos, inclusive em áreas mais tradicionais como a hotelaria, desconhecem o papel e ações cabíveis de um turismólogo.

Segundo alguns entrevistados, o profissional oriundo das faculdades desconhece a realidade da micro e pequena empresa e seus desafios na gestão. Segundo entrevistados, o perfil do turismólogo de média e grande empresa é diferente do profissional para pequeno empreendimento. E são exatamente estas organizações que dão corpo ao destino turístico juizforano e também corresponde ao segmento mais representativo que pode ofertar vagas de trabalho.

Entretanto, este segmento está cercado por impasses que afetam o próprio desenvolvimento e profissionalização do destino turístico. Os entrevistados também destacam a dificuldade do turismo receptivo na cidade o que faz dela eminentemente emissora e reduz a ação das agências para outro tipo de mercado. Nesta área de mercado, salvo as situações em que o turismólogo é proprietário da agencia, a maioria dos postos de trabalho são operacionais.

Considerações finais

Considerando o objetivo inicial deste - de identificar os principais desafios e tendências de qualificação e formação do turismólogo, bem como sua inserção profissional no contexto de um destino turístico (DT) majori-tariamente formado por Micro e Pequenas Empresas (MPE'S) - podemos observar 3 (três) elementos centrais que caracterizam a dinâmica no contexto turístico analisado: 1) uma elevada taxa (51 %) de não contratação dos profissionais em turismo, por parte do setor; 2) a predominância quase que exclusivamente MPE'S e a elevada dependência, em termos de empregabilidade, dos profissionais formados em turismo em relação a esse tipo de empresa; 3) uma percepção rasa por parte dos empregadores em relação ao que é a atividade turística em si e também ao tipo de trabalho que o profissional turismólogo realizado, suas habilidades e competências.

Assim, o ciclo para começar e (ser retroali-mentado) por um inadequado entendimento, por parte do setor privado da atividade turística, das distintas atividades profissionais realizadas pelos turismólogos assim como da atividade turística em geral; percepção essa que encontra sua disseminação em um meio muito homogêneo em termos de tamanho (93 % de PME'S) e provavelmente em termos de nível de profissionalização das empresas, através de processos de formalização, qualificação dos funcionários e adoção de práticas gerenciais formai e sistemáticas (questão essa, porém, para se verificar num futuro estudo).

Neste contexto, parecem existir fortes entraves, desafios e problemas quanto à qualificação do turismólogo como elemento essencial para o seu desenvolvimento, assim como para a própria dinâmica de profissionalização e desenvolvimento do destino turístico como um todo. Os principais desafios dizem respeito à qualificação das MPE'S relaciona-se ao desenvolvimento de competências e habilidades para a gestão cabível a este cenário e o combate à contratação subutilizada como força de trabalho barata e ainda não qualificada dos estagiários. O caminho alternativo seria a procura de outras vias formativas que dariam acesso ao aluno em formação da realidade do micro e pequeno negócio e estratégias para o desenvolvimento deste segmento.

O cenário brasileiro do setor turístico, em sua maioria, não difere da prática do mercado juizforano caracterizado como descompassado da competitividade da Indústria do Turismo internacional. O setor turístico de Juiz de Fora não se insere na dinâmica da competitividade, e em alguns casos, resiste à profissionalização do setor. Classifica-se como explorador dos recursos naturais, sem mão de obra qualificada e sem medidas de promoção de desenvolvimento no curto, médio e longo prazo que sejam efetivas.

Juiz de Fora é uma cidade com potencial para o turismo receptivo, entretanto, representa um destino turístico formado essencialmente de organizações de MPE'S que, em muitos casos, desconhecem o profissional de turismo e não consegue estabelecer relações entre este e sua organização. Além disso, há também uma intensificação no contrato com estagiários por causa dos custos reduzidos, intensificando assim um ciclo vicioso de não qualificação do produto turístico.

A pluralidade do trade e o desconhecimento das potencialidades da gestão turística inibe o desenvolvimento da prática de planejar o destino turístico potencializando o desenvolvimento regional que não seja essencialmente exploratório e unilateral. A cidade possui como motor indispensável de sua economia o setor de serviço (IBGE, Cidades). O que permitiria a ela a condição de receber maior contingente populacional oferecendo uma estrutura de recebimento satisfatória. A ausência de um planejamento turístico que promova a cidade como um polo, pode incorrer na ausência de competitividade das empresas relacionadas no setor e na estagnação da qualidade de seus serviços.

Cabe o questionamento da relevância formativa do turismólogo para estas organizações. Os resultados podem indicar que o descompasso da não absorção da força de trabalho formada nas instituições de ensino esteja relacionada com a não aplicabilidade do conhecimento à realidade das MPE'S.

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Notas

Para citar el artículo: Duarte, T., Conceição S., Costa, M., Uma Reflexão Sobre a Qualificação na formação em Turismo: relevância da micro e pequena empresa para o destino turístico. Turismo y Sociedad, XVIII, pp. 159-177. DOI: http://dx.doi.org/10.18601/01207555.n18.09
1 Não há unanimidade na definição de produto turístico. Ivars (2003, p. 27) identifica vários enfoques distintos: um primeiro enfoque, de carácter descritivo, é aquele a oferta turística é concebida como um conjunto de ofertas de bens e serviços de grande variedade cujo denominador comum é sua orientação ao consumo da demanda turística; um segundo enfoque é baseado no processo de produção turística no qual se considera que o único produto suscetível de identificar-se como turístico é o plano o programa de deslocamento de ida e volta que se propõe a levar a cabo um indivíduo; e u terceiro enfoque que identifica a oferta turística como um produto global que se constitui de um conjunto inter-relacionado de bens e serviços turísticos que determinam a satisfação da experiência turística do viajante. Aqui assumimos a definição de Quintero Santos (2014) para quem um produto é entendido como um amalgama de prestações, tanto tangíveis como intangíveis, que são oferecidos ao mercado com o objetivo de satisfazer aos desejos e as expectativas dos turistas e do qual formam parte diferentes elementos que configuram sua natureza particular.
2 Tentando responder à questão de quais as expectativas dos diferentes atores envolvidos (mercado de trabalho, instituições de ensino e alunos) quanto à formação profissional e qualificação em turismo, esta pesquisa identificou as expectativas de cada uma das três categorias analisadas, bem como a estratificação distintiva das expectativas interna a categoria da mão de obra em turismo. Pode-se constatar que em ambos os casos elas são destoantes, o que nos indica a inexistência de um consolidado perfil profissional do turismólogo no que diz respeito à atividade, competências e remuneração.
3 Para consultar a discussão relativa as outras categorias da pesquisa ver: Pimentel, Thiago D. & Paula, Sara C. (2014). A inserção profissional no mercado de trabalho face às habilidades adquiridas na formação superior em turismo. Revista de Turismo Contemporâneo - RTC, v. 2, p. 49-73. Pimentel, Thiago D. & Paula, Sara C. (2014). Autodiagnose da Formação Superior e Qualificação Profissional em Turismo: pistas para uma (necessária) reorientação? Revista Turismo & Desenvolvimento (Online), v. 1, p. 275-285, 2014. Pimentel, Thiago D. & Paula, Sara C. (2014). Desenvolvimento de um protocolo de avaliação do desempenho de recursos humanos em instituições de ensino superior/lES: notas para a gestão acadêmica a partir do caso do Curso de Turismo/UFJF - Brasil. Revista Gestao Universitaria na America Latina - GUAL, v. 7, p. 243-265. A versão completa da pesquisa, embora não publicada, encontra-se em Pimentel, T. D. (2013). Formação Superior e Mercado de Trabalho em Turismo. Relatório Final de Pesquisa. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/CNPq. Universidade Federal de Juiz de Fora/UFJF. Juiz de Fora. Uma versão reduzida foi publicada em Pimentel, Thiago D. & Paula, Sara C. (2014). Divergência de Visões e Expectativas entre os Atores sobre a Formação Profissional e o Mercado de Trabalho em Turismo: implicações para identidade profissional e empregabilidade. In: VI Congreso Latino Americano de Investigación Turística/ CLAIT, 2014, Neuquén, Patagonia, Argentina. Libro de actas.... Neuquén, Patagonia, Argentina: EDUCO: Universidad Nacional del Comahue, v. 1. p. 1-22.
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