Introdução

O presente trabalho é uma continuação inédita da pesquisa apresentada em forma de comunicação "Pluralidade religiosa e tendências em ciências da religião no Brasil" no 28º Congresso Internacional da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (Soter), realizado na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, de 14 a 17 de julho de 2015. Na ocasião, os pesquisadores participantes do Grupo de Trabalho 11 - Pluralidade Espiritual e Diálogo Inter-Religioso (coordenado pelos professores Dr. Gilbraz Aragão, Dr. Roberlei Panasiewicz e Dr. Cláudio de Oliveira Ribeiro) sugeriram a construção de um quadro com o panorama da formação/titulação dos docentes dos Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências das Religiões brasileiros (PPGCRE)².

Dado que os subscritores deste artigo aceitaram a sugestão, tem-se aqui como objetivo a construção de um mapeamento dos PPGCRE no Brasil, um a um, a fim de trazer à luz a relação, sempre intuída, entre a formação acadêmica do corpo docente e a abordagem interdisciplinar que caracteriza o estudo do fenômeno religioso. A interdisciplinaridade é não só uma reivindicação da área acadêmica das Ciências das Religiões no Brasil e outras partes do mundo, como também uma exigência do próprio pluralismo que caracteriza o cenário religioso nacional. O interesse deste trabalho está restrito ao estudo científico da religião no contexto da academia brasileira, mais precisamente no dos PPGCRE associados à Associação Nacional de Pesquisa em Teologia e Ciências da Religião (Anptecre)³.

Como demonstram os estudos aqui utilizados⁴, o surgimento dos PPGCRE no Brasil está estritamente relacionado ao anseio e esforço das igrejas históricas (católicas e protestantes) de compreensão mais adequada do fenômeno religioso. No entanto, tal anseio e esforço não se apresentavam como o desejo de constituir uma nova ciência, como era o caso de alguns países europeus. O contexto do século XX, caracterizado pela multiplicidade metodológica e pela valorização da pluralidade, obrigou os pesquisadores brasileiros da religião a um diálogo colaborativo.

O objetivo era a criação de um espaço acadêmico para o debate, já em franco andamento nas esferas eclesiais e também em algumas áreas do saber, como a sociologia e antropologia, que se dedicavam à compreensão da religião. O momento inaugural dos estudos científicos da religião no Brasil, portanto, tem a ver com uma mudança de mentalidade ocorrida entre 1960 e 1975, que propiciou a inserção das ciências sociais no espaço eclesial em que se buscava solucionar problemas pastorais oriundos da indagação sobre a função social das igrejas. Essa inserção marca o clima de proximidade entre as teologias latino-americanas e as ciências sociais. Sem poder e nem querer entrar em pormenores históricos, assinala-se apenas que teólogos da libertação e cientistas sociais encontram nas Ciências das Religiões um lugar para desenvolver suas investigações, protegidos das ingerências das autoridades eclesiásticas.

Fato curioso é que a construção desse novo cenário do estudo acadêmico da religião no Brasil se deu pela pós-graduação, e não pela graduação, em parte porque os estudos de religião na graduação eram praticamente um monopólio da teologia, que não gozava do estatuto de cientificidade no meio acadêmico. Como os pesquisadores da religião estavam ávidos por se inserir no debate estritamente acadêmico-científico sobre a religião, o caminho trilhado foi o da pós-graduação. Até hoje, existem poucos cursos de graduação em Ciências das Religiões no Brasil: Universidade de Blumenau (FURB), Universidade do Estado do Pará (UEPA), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Universidade Federal de Sergipe (UFS) - das quais, somente a FURB não tem PPGCRE.

Pelo menos dois fatores foram preponderantes para o surgimento dos estudos científicos de religião no Brasil. O primeiro diz respeito ao sentimento de que o estudo da religião estava demasiadamente fragmentado e, ao mesmo tempo, exigia um esforço coletivo em clima de diálogo por parte de pesquisadores de diversas áreas a fim de interpretar um fenômeno de extrema complexidade como é o caso do religioso. O segundo fator aponta para o crescente pluralismo religioso, a exigir um estudo mais específico sobre a religião, colocado para além do estudo teológico da religião ou de uma visão estritamente cristã do fenômeno religioso no Brasil. Isso não significou que a teologia não tivesse mais lugar nos chamados estudos acadêmicos da religião, mas que ela perdera sua hegemonia - o que não é pouco. Assim, o status acadêmico do estudo da religião no Brasil foi paulatinamente se consolidando a partir da pluralidade de compreensões sobre o fenômeno religioso e pela perspectiva do diálogo entre as diversas áreas do saber. A interdisciplinaridade, apesar de nem sempre ser apresentada com toda clareza, constitui-se como caminho obrigatório para a estruturação dos estudos sobre a religião.

A interdisciplinaridade nos estudos em Ciências das Religiões no Brasil

Uma constatação inicial quanto ao caso, sem entrar em detalhes históricos, aponta que as Ciências das Religiões no Brasil surgiram em tempos de interdisciplinaridade, ou seja, num contexto em que se valorizava a colaboração recíproca entre as diversas áreas do saber. Percebe-se que se forjou no Brasil uma clara tendência interdisciplinar nos estudos da religião ou, em outras palavras, uma epistemologia de recorte interdisciplinar. Foi um movimento presidido por uma preocupação com os estudos de religião, distanciados de uma abordagem teológica de recorte metafísico e de uma redução positivista da ciência. Os PPGCRE surgiram no momento em que a discussão sobre a interdisciplinaridade ganhou grande notoriedade, o que favoreceu o intercâmbio entre disciplinas preocupadas com a compreensão do fato religioso, inicialmente a compreensão da relação entre religião e sociedade.

Este estudo não pretende tecer considerações sobre o que vem a ser interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e transdisciplinaridade; foca sua atenção apenas na ideia de interdisciplinaridade, a fim de compreender algumas tendências no estudo acadêmico da religião no cenário nacional. Uma voz comum repousa na ideia de que a aproximação de um fenômeno (neste caso, o fato religioso) é sempre marcada por um contexto específico, num tempo preciso e a partir de um lugar determinado. De modo esquemático: o pesquisador estuda a religião influenciado pelo contexto brasileiro no século XXI e, como teólogo, filósofo, historiador, cientista social etc., lança um olhar a partir do lugar que ocupa, para enunciar uma percepção sobre o fenômeno religioso. Como consequência, e aqui está outra característica fundamental da interdisciplinaridade, o horizonte no qual se desenvolve o estudo da religião é dialogal por excelência, ou seja, colocar-se à disposição para o diálogo parece ser uma marca indelével do estudioso da religião.

A interdisciplinaridade, como se sabe, busca aproximar áreas e especialidades na partilha de objetos comuns de estudo, o que faz dela uma questão central no trabalho científico contemporâneo. No caso concreto das Ciências das Religiões, a pluralidade das áreas de saber que entram em diálogo favorece uma compreensão mais dinâmica sobre o objeto de estudo em questão, a saber, o fato ou fenômeno religioso. Existe a tendência, nos diversos PPGCRE, de reunir a contribuição de diferentes ciências a fim de que cada pesquisador possa se deixar enriquecer pela ampliação dos campos de abordagem do fato religioso. Assim, os estudos da religião no Brasil se veem orientados por procedimentos que utilizam arcabouços teórico-metodológicos de caráter científico em perspectiva interdisciplinar. É a interdisciplinaridade como tendência nos estudos sobre a religião que pontua a configuração dos PPGCRE no Brasil - o que pode ser notado na atual configuração de seu corpo docente, formado por pesquisadores oriundos de diversas áreas do conhecimento e distribuídos por mais de uma dezena de PPGCRE.

A discussão sobre a interdisciplinaridade no contexto acadêmico brasileiro foi o solo fértil que possibilitou o surgimento e o desenvolvimento dos diversos PPGCRE. A peculiaridade do cenário nacional conferiu sua acentuada marca ao estudo da religião: a perspectiva dialogal entre as diversas áreas do saber, que permite a cada qual, de acordo com o lugar que ocupa (Teologia, Filosofia, História, Ciências Sociais, Psicologia etc.), lançar um olhar específico sobre o fato ou fenômeno religioso. O desafio consiste justamente em fazer Ciências das Religiões, e não apenas uma abordagem histórica ou sociológica da religião, por exemplo.

Uma pergunta talvez ajude a pensar o caso, ao mesmo tempo em que desafia os cientistas da religião: em que muda a postura ou a perspectiva do docente pelo fato de desenvolver uma pesquisa em torno do fenômeno religioso em um PPGCRE, e não em um PPG em sua área de origem (Graduação e/ou Pós-Graduação)? Mais uma: de que maneira a interdisciplinaridade tem um papel relevante ou de destaque nas pesquisas? Seja como for, a configuração interdisciplinar dos PPGCRE é uma realidade nas pesquisas acadêmicas em torno do fenômeno religioso. A diversidade dos docentes e dos discentes é o que permite ao documento de área afirmar que "o campo das Ciências da Religião é por excelência um espaço multidisciplinar, que busca analisar o fenômeno, fato ou evento religioso enquanto expressão humana, cultural e histórica" (COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR, 2013, p.38)⁵. É essa interdisciplinaridade que se vê na titulação em pós-graduação dos docentes atuantes nos PPGCRE no Brasil - e que se passa a apresentar em forma de gráficos.

Panorama interdisciplinar da titulação dos docentes do Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência(s) da(s) Religião(ões) brasileiros no Brasil

Para a construção dos gráficos referentes à titulação (doutorado e mestrado) dos docentes dos PPGCRE no Brasil, tanto em números absolutos como percentuais, foram respeitados os procedimentos metodológicos explicitados a seguir:

• -

  Somente foram contadas as titulações dos docentes do corpo permanente de cada PPG - conforme consulta ao site das próprias universidades -, portanto, não foram incluídas as titulações dos professores colaboradores, visitantes e afins;

• -

  Não foram levados em consideração doutorados ou mestrados interrompidos nem aqueles em andamento; os gráficos também não contemplam estágios de pós-doutorado, cursos de extensão ou especializações;

• -

  No caso de um mesmo docente com dois mestrados ou doutorados na mesma área, os títulos foram contados uma só vez.

Além disso, estabeleceram-se os critérios a seguir, com o objetivo de reduzir o número de categorias (ou rubricas) de classificação e, também, agrupar o máximo possível de titulações dentro de cada uma delas:

• -

  Ciências da Religião incorporam também as outras possibilidades de combinação entre o singular e o plural da titulação na área de formação, bem como algumas outras variações, por exemplo, Religious Studies;

• -

  Ciências Sociais incluem as titulações em Sociologia, Antropologia e Política (e variantes como Antropologia Social, Antropologia Cultural e outras); da mesma forma, História agrupa todas as variações que apresentam complementos, como história econômica etc.;

• -

  Master of Arts, no caso específico da área das Ciências das Religiões, foi alocado em Teologia (que agrupa também outras variantes, como Teologia Moral, Dogmática etc.);

• -

  Titulação em pedagogia foi alocada na rubrica Educação.

Apresentam-se a seguir os gráficos, na sequência alfabética das universidades que alocam os PPGCRE no Brasil:

Além dos 11 PPGCRE contemplados acima, no Brasil, a área conta com um curso de mestrado profissional em Ciências das Religiões, oferecido pela Faculdade Unida de Vitória, cujos docentes apresentam a seguinte titulação em sua formação pós-graduada:

Figura 1
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.puc-campinas.edu.br/pos-graduacao/stricto-sensu/programa-de-posgraduacao-em-ciencias-da-religiao— mestrado/docentes/>. Acesso em: 7 fev. 2016.

Figura 2
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.puc-campinas.edu.br/pos-graduacao/stricto-sensu/programa-de-posgraduacao-em-ciencias-da-religiao— mestrado/docentes. Acesso em: 7 fev. 2016.

Figura 3
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.cpgss.pucgoias.edu.br/home/secao.asp?id_secao=&id_ unidade=7. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 4
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.cpgss.pucgoias.edu.br/home/secao.asp?id_secao=&id_ unidade=7. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 5
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e-doutorado/ciencia-da-religiao#corpo-docente. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 6
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e-doutorado/ciencia-da-religiao#corpo-docente. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 7
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e-doutorado/ciencia-da-religiao#corpo-docente. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 8
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e-doutorado/ciencia-da-religiao#corpo-docente. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 9
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.unicap.br/pos/ciencias_religiao/corpo_docente.htm. Acesso em: 10 fev. 2016.

Figura 10
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.unicap.br/pos/ciencias_religiao/corpo_docente.htm. Acesso em: 10 fev. 2016.

Figura 11
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://paginas.uepa.br/ppgreligiao/index.php?option=com_content&view= article&id=19&Itemid=7. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 12
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://paginas.uepa.br/ppgreligiao/index.php?option=com_content&view= article&id=19&Itemid=7. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 13
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.ce.ufpb.br/ppgcr/?secao=14. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 14
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.ce.ufpb.br/ppgcr/?secao=14. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 15
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.ufjf.br/ppcir/corpo-docente/#. Acesso em: 9 fev. 2016.

Figura 16
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.ufjf.br/ppcir/corpo-docente/#. Acesso em: 9 fev. 2016.

Figura 17
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: https://www.sigaa.ufs.br/sigaa/public/programa/equipe.jsf?lc=pt_BR&id= 857. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 18
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: https://www.sigaa.ufs.br/sigaa/public/programa/equipe.jsf?lc=pt_BR&id= 857. Acesso em: 21 fev. 2016.

Figura 19
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://portal.metodista.br/posreligiao/docentes/docentes. Acesso em: 22 fev. 2016.

Figura 20
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://portal.metodista.br/posreligiao/docentes/docentes. Acesso em: 22 fev. 2016.

Figura 21
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://up.mackenzie.br/stricto-sensu/ciencias-da-religiao/corpo-docente/ . Acesso em: 8 fev. 2016.

Figura 22
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://up.mackenzie.br/stricto-sensu/ciencias-da-religiao/corpo-docente/ . Acesso em: 8 fev. 2016.

Figura 23
Titulação dos docentes: doutorado.
Fonte: Disponível em: http://www.faculdadeunida.com.br/site/cursos/mestrado/informacoes-gerais. Acesso em: 5 mar. 2016.

Figura 24
Titulação dos docentes: mestrado.
Fonte: Disponível em: http://www.faculdadeunida.com.br/site/cursos/mestrado/informacoes-gerais. Acesso em: 5 mar. 2016.

Considerações Finais

Os gráficos apresentados acima oferecem dados relevantes para a compreensão da formação e consolidação dos PPGCRE no Brasil. Os dados se apresentam em forma bruta e precisam ser interpretados; como se sabe, toda interpretação é sempre um ponto de vista, ou seja, é olhar a realidade a partir de uma perspectiva ou de um ponto em particular. De resto, a análise compreensiva apresentada a seguir não foge à regra hermenêutica elementar.

Como pressuposto para este artigo, assume-se que, se o campo religioso no Brasil é plural e dialógico, importa que as investigações e pesquisas do fenômeno religioso sejam também interdisciplinares e abertas ao diálogo (não somente entre as disciplinas, mas, se possível, com os próprios objetos investigados). A titulação dos docentes que compõem os PPGCRE no Brasil, como dado objetivo (ou quantitativo), é uma possibilidade - quem sabe, uma garantia - de que a interdisciplinaridade esteja em plena atividade, isto é, que seja concomitante ao desenvolvimento das pesquisas. Para reforçar esse argumento, destaca-se a informação de que todos os PPGCRE atualmente têm pesquisadores titulados em, pelo menos, três áreas diferentes de formação, tanto no mestrado (podendo chegar a oito) como no doutorado (podendo chegar a sete). A pergunta que subsiste em aberto é se tais números podem ser considerados uma configuração própria do caso brasileiro, de um jeito brasileiro de fazer Ciências das Religiões.

Pela titulação doutoral dos professores, pode-se realçar a importância de áreas como a teologia, a filosofia, as ciências sociais e a história na composição do corpo permanente dos PPGCRE no Brasil - o que está relacionado à própria história da fundação dos PPGCRE, notadamente dos três mais antigos no país: PUC-SP, Universidade Metodista de São Paulo (Umesp) e UFJF. É interessante observar, ainda, que outras áreas que isoladamente possuem uma longa tradição de pesquisa em torno do fenômeno religioso - como a psicologia, para ficar num só e forte exemplo - não têm presença tão significativa no quadro geral dos PPGCRE no Brasil. Pelos mestrados dos professores-pesquisadores, fica mais fácil notar a diversidade das áreas que caracterizam a interdisciplinaridade nos PPGCRE brasileiros.

Outro ponto de destaque - e que, de certa forma, problematiza aquela questão anterior quanto à caracterização de uma especificidade brasileira na área - é a ainda baixa incidência da titulação de doutorado (e até mesmo de mestrado) em Ciências das Religiões nos PPGCRE, dos mais antigos aos mais recentes. No caso dos programas mais antigos, somente o da Umesp, por exemplo, possui mais de 50% de doutores em Ciências das Religiões. Aqui, a questão que se apresenta é o porquê de uma porcentagem baixa de doutores em Ciências das Religiões, mesmo depois de décadas de existência dos PPGRCRE no Brasil. Onde estão atuando os doutores em Ciências das Religiões? Por onde andam os egressos dos cursos de mestrado?

Como já mencionado anteriormente, outra tarefa a ser realizada, mas que está para além do objetivo do presente trabalho, é verificar de que maneira a formação de origem (doutorado e mestrado) incide na produção acadêmica dos docentes - ou, até mesmo, se não há incidência nenhuma. Essa análise está obrigatoriamente relacionada a outro ponto aqui já citado de passagem, qual seja, se faz diferença ou não ao pesquisador não titulado em Ciências das Religiões desenvolver suas pesquisas num PPGCRE. Há uma orientação epistemológica a presidir seu pertencimento a uma área distinta daquela de sua titulação formal? Esse aspecto traz novamente à tona a discussão ou desafio de fundo neste artigo: o que significa de fato e na prática a interdisciplinaridade nos PPGCRE brasileiros?

A apresentação de tais questões, sem respostas neste trabalho, pode frustrar as expectativas dos leitores; todavia, o levantamento de dados e sua apresentação podem contribuir para a discussão sobre o papel da interdisciplinaridade nos PPGCRE, bem como instigar novas pesquisas sobre a importância do trabalho multifacetado a ser realizado em torno do fenômeno religioso e a necessidade de garantir ao mesmo tempo a unidade na pluralidade dos trabalhos acadêmicos, em clima estabelecido e reconhecido de diálogo entre as partes.

Referências

COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR. Diretoria de Avaliação: documento de área. Brasilia: Capes, 2013. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/avaliacaotrienal/Docs_de_area/Filosofia_Teologia_doc_area_e_comiss%C3%A3o.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2015.

FERREIRA, A.C.; SENRA, F. Tendência interdisciplinar das ciências da religião no Brasil: o debate epistemológico em torno da interdisciplinaridade e o paralelo com a constituição da área no país. NUMEN: Revista de Estudos e Pesquisa da Religião, v.15, n.2, p.249-269, 2012.

MARQUES, Â.C.B.; ROCHA, M. Memórias da fase inicial da ciência da religião no Brasil: Entrevistas com Edênio Valle, José J. Queiroz e Antonio Gouvêa Mendonça. Rever, v.7, p.192-214, 2007. Disponível em: <http://www.pucsp.br/rever/rv1_2007/p_entrevista.pdf>. Acesso em: 25 de jun. 2015.

Notas

Autor notes

*Rod. Dom Pedro I, km 136, Pq. das Universidades, 13086-900, Campinas, SP, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: W.F. SALLES. E-mail: <waltersalles04@gmail.com>.