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O conceito de direito em Immanuel Kant: positivismo radical ou não-positivismo superinclusivo?
Immanuel Kant’s concept of law: radical positivism or super-inclusive non-positivism?
O conceito de direito em Immanuel Kant: positivismo radical ou não-positivismo superinclusivo?
Griot: Revista de Filosofia, vol. 17, núm. 1, pp. 354-376, 2018
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
Recepção: 14 Fevereiro 2018
Aprovação: 04 Maio 2018
Resumo: O objeto de estudo desta investigação é a filosofia do direito de Immanuel Kant, com ênfase na controvérsia acerca da natureza do conceito de direito por ele formulado. Assim, são analisados, em um primeiro momento, os conceitos centrais da filosofia moral de Kant que estão em conexão com sua ideia de direito e, em um segundo momento, os aspectos mais importantes do pensamento filosófico-jurídico kantiano. Busca-se, com isso, uma definição a respeito da melhor forma de entender a filosofia do direito de Kant, se representante de um positivismo radical ou de um não-positivismo superinclusivo.
Palavras-chave: Immanuel Kant, Filosofia do direito, Positivismo radical, Não-positivismo superinclusivo.
Abstract: The object of this research is Immanuel Kant's philosophy of law, more specifically, the controversy over the nature of Kant’s concept of law. Thus, the central concepts of Kant's moral philosophy, which are in connection with his idea of law, and, secondly, the most important aspects of Kant's thought regarding legal philosophy, are analyzed. It aims a definition of the most appropriate way to understand Kant's philosophy of law, whether it represents a radical positivism or a super-inclusive non-positivism.
Keywords: Immanuel Kant, Philosophy of law, Radical positivism, Super-inclusive non-positivism.
Introdução
Na catedral da antiga cidade alemã de Königsberg (atual Kaliningrado, Rússia), encontra-se localizado o túmulo do filósofo Immanuel Kant. Seu epitáfio, reproduzindo uma famosa passagem da “Crítica da Razão Prática”, diz: “duas coisas me enchem o espírito de crescente admiração e respeito, veneração sempre renovada quanto mais intensa e frequentemente a reflexão delas se ocupa: o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim.” A referência à lei moral não poderia ser mais oportuna; em suas derradeiras obras, Kant ocupou-se sobretudo da filosofia moral, elevando-a a patamares até então desconhecidos, com decisivas repercussões em sua filosofia do direito, indissociável daquela.
Todavia, apesar do grande interesse que a filosofia de Kant vem despertando há mais de duzentos anos, dúvidas acerca da natureza de seu conceito de direito, um ponto extremamente importante no interior daquele sistema filosófico, ainda não puderam ser eliminadas. O prestígio de que desfruta o pensamento de Kant nos dias atuais parece recomendar o preenchimento de semelhante lacuna de compreensão. Não se trata de uma tarefa simples, dado o tratamento aparentemente vacilante e contraditório que o filósofo dispensa à sua doutrina do direito; a presente investigação, ciente dos desafios impostos por seu objeto, buscará realizá-la.
O sistema filosófico kantiano é conhecido por seu rigor conceitual. Em vista disso, e considerando a íntima conexão entre a filosofia do direito de Kant e sua filosofia moral, a primeira parte deste estudo, após um breve intróito dedicado à demarcação do lugar ocupado pelo tema na divisão da filosofia, será voltada à exposição minuciosa dos conceitos centrais do pensamento kantiano acerca do direito e da ética: em uma apertada síntese, a lei moral, o imperativo categórico, a liberdade como único direito inato e a própria definição kantiana de direito.
Esses conceitos servirão de base para a investigação e serão retomados na segunda parte, na tentativa de situar o pensamento filosófico-jurídico de Kant no quadro maior da filosofia do direito. Assim, o foco será direcionado, em um primeiro momento, para o problema central da filosofia do direito, qual seja, a relação entre o direito e a moral, com uma breve exposição das correntes fundamentais do pensamento filosófico-jurídico, o positivismo e o não-positivismo. Na sequência, colocar-se-á a questão acerca da natureza do conceito de direito kantiano, se positivista ou não-positivista, com a indicação dos elementos que falam a favor ou contra cada possibilidade. Por fim, tomar-se-á posição diante do problema, conduzindo-se o argumento sobretudo através da decomposição dos elementos da definição de direito elaborada por Kant. Nessa derradeira parte, serão expostas contribuições doutrinárias de diferentes autores que se ocuparam do sistema filosófico-jurídico kantiano, com particular ênfase sobre os conceitos oriundos da teoria do filósofo do direito alemão Robert Alexy.
A investigação compõe-se, assim, de duas partes bem definidas, sendo a primeira mais filosófica que jurídica e a segunda, mais jurídica que filosófica. Metodologicamente, ela buscará confrontar diferentes possibilidades de interpretação do sistema filosófico-jurídico kantiano, tomando, ao final, posição diante delas, mediante a análise de argumentos contrários e favoráveis a cada uma. Espera-se que, ao seu final, o leitor possa não apenas ter uma visão de conjunto da filosofia do direito de Kant, mas também possa considerá-la de um modo livre de pré-juízos potencialmente equivocados.
Bases para o estudo do conceito de direito kantiano
Dos filósofos modernos, cuja importância ainda se pode notar no pensamento contemporâneo como um todo, pode-se dizer que a figura de maior destaque tenha sido a do prussiano Immanuel Kant (1724-1804). Professor de filosofia na Universidade de Königsberg., Kant desempenhou um papel crucial tanto no desenvolvimento da Aufklärung germânica quanto no avanço da abordagem dos principais temas tratados ao longo do período que hoje consideramos ser a filosofia moderna. Notável, sobretudo, foi seu empreendimento crítico - principalmente em sua filosofia após o ano 1781, quando da publicação de sua obra magna, a Kritik der reinen Vernunft. (doravante KrV), após um longo período de gestão filosófica. Kant é amplamente estudado atualmente não apenas por conta de sua relevância no contexto histórico-filosófico dos séculos XVIII e XIX, mas também por conta de seu rigor e amplitude filosóficos. Seu sistema filosófico, a chamada “filosofia crítica” (também “criticismo”), representou toda uma revolução no modo como se fazia filosofia à sua época, e, seja na filosofia teórica, seja na filosofia prática, apresenta tanto uma densidade argumentativa quanto uma impressionante coerência interna.
Tomando esse contexto em consideração, pode não parecer tão evidente onde se situa o estudo do conceito de direito em Kant. Fatidicamente, o filósofo de Königsberg não dedica muito de suas principais obras críticas ao estudo do direito - além de KrV, também Kritik der praktischen Vernunft (doravante KpV) (1788) e Kritik der Urteilskraft (1790) -, não obstante possa-se apontar para ocorrências de um vocabulário jurídico, sobretudo em KrV, como a própria ideia de um “tribunal da razão” [Gerichtshof der Vernunft] (KrV, A XI-XII) pode sugerir por si própria. Em todo caso, a obra que Kant dedica para tratar das questões do direito não pode ser menosprezada.: sua ilustre Metaphysik der Sitten (doravante MS) (1797). Considerada uma obra tardia de Kant - dado que as principais obras críticas foram escritas e publicadas entre as décadas de 70 e 80 do século XVIII -, MSse divide em duas principais partes, a Rechtslehre (doravante RL) e a Tugendlehre (doravante TL), precedidas por uma introdução geral a ambas e introduções particulares a cada. O direito é o objeto de estudo da primeira parte, como o próprio nome “Doutrina” [Lehre] do “Direito” [Recht] sugere. Antes de apresentarmos as principais noções e argumentos kantianos concernentes ao conceito de direito, faz-se necessário lançar um primeiro olhar a questões tratadas por Kant em anos anteriores, principalmente em sua Grundlegung zur Metaphysik der Sitten (doravante GMS) (1785) - que abre caminho para os estudos no âmbito da filosofia prática.
O lugar da metafísica dos costumes na divisão da filosofia
Kant (GMS, AA 04: 387-390) abre GMS retomando a divisão da Filosofia., tal qual considerada pela tradição de sua época: em física, ética - que, em textos pós-GMS, será tomada como a moral - e lógica. Kant faz uma primeira distinção dos modos de conhecimento filosófico, entre conhecimento material e formal: “todo conhecimento racional é ou material, e considera um objeto qualquer; ou é formal, e ocupa-se meramente com a forma do entendimento e da razão ela própria, e das regras universais do pensamento em geral, sem distinção dos objetos”. (GMS, AA 04: 387). A física e a ética seriam conhecimento material, ao passo que apenas a lógica seria conhecimento formal. Da filosofia material, nesses termos, temos que ela será “dupla” [zwiefach], justamente por conta de considerar tanto a física quanto a ética. Nesse sentido, temos que a primeira trataria das leis da natureza (sendo, por isso, a doutrina da natureza), enquanto a segunda trataria das leis da liberdade (enquanto doutrina da liberdade).
Kant faz também uma segunda distinção, entre filosofia empírica e filosofia pura: “Pode-se chamar toda filosofia, na medida em que ela se estriba em fundamentos empíricos, de empírica, mas àquela, que apresenta unicamente a partir de princípios a priori suas doutrinas, de filosofia pura”. (GMS, AA 04: 388). A lógica é inteiramente pura, mas tanto a física quanto a ética têm partes empíricas e puras. Sobretudo ao considerarmos a ética, temos que sua parte empírica seria a antropologia prática, ao passo que sua parte racional seria a moral propriamente dita. Considerando que a filosofia pura seria aquela cujos princípios não repousam na experiência, ela é metafísica, se restrita a objetos determinados pelo entendimento. (GMS, AA 04: 388). A metafísica, assim, também seria dupla, dividindo-se em metafísica da natureza (com relação à física), e metafísica dos costumes (com relação à ética). Tal metafísica dos costumes seria
[...] indispensavelmente necessária, não meramente por um motivo de especulação, a fim de inquirir a fonte dos princípios práticos situados a priori em nossa razão, mas porque os costumes eles próprios permanecem sujeitos a todo tipo de corrupção, enquanto faltar aquele fio condutor e norma suprema de seu ajuizamento correto. (GMS, AA 04: 390).
Pode-se dizer que a “metafísica dos costumes” à qual Kant se refere no prefácio, mas também em todo o percurso argumentativo de fundamentação em GMS, em linhas gerais, é a mesma metafísica dos costumes que temos na obra de 1797. Apesar da não-continuidade direta do projeto pós-1785 - se considerarmos que a próxima grande obra à qual Kant se dedicou tenha sido a continuação do projeto crítico, tendo como objeto a razão prática, em KpV -, a “fundamentação” elaborada por Kant em GMS serve de base para o que viria a ser tratado depois tanto em sua Rechtslehre quanto em sua Tugendlehre. Tal fundamentação se direciona, em maior medida, à busca do “princípio supremo da moralidade” [oberstes Prinzip der Sittlichkeit] -, que Kant, após seu percurso argumentativo na primeira e segunda seção de GMS, entende como a autonomia da vontade, enquanto “a qualidade da vontade pela qual ela é uma lei para si mesma (independentemente de toda qualidade dos objetos do querer)”. (GMS, AA 04: 440). A busca pelo princípio supremo parte, sobretudo, da pergunta “o que eu devo fazer?” [was soll ich tun?] (KrV, A 805, B 833; LOG, AA 09: 25), já presente em KrV, enquanto a grande questão a ser considerada no contexto de uma filosofia prática. A fim de responder tal questão, seria necessário encontrar uma resposta que fosse tanto universal quanto necessária, sendo ambas universalidade e necessidade os indícios da validade de um conhecimento a priori (KrV, B 4) - com os quais Kant se ocupa em sua tarefa crítica.
Principais noções fundamentais da filosofia moral kantiana
A autonomia da vontade se refere, assim, à lei que eu mesmo me dou, e que eu mesmo devo seguir; tal lei é a lei moral [moralisches Gesetz], que em nós, seres racionais sensíveis - notadamente, homens [Menschen]. -, se apresenta como um imperativo, apontando para um dever [Pflicht.Sollen]. Uma vez que tal lei não é dada meramente partindo de um raciocínio hipotético como “para atingir X, é preciso executar a ação Y”, mas sim está, ela própria, vinculada à nossa natureza racional como seres, apesar de sensíveis, racionais, a lei moral se expressa em nós como um imperativo categórico .kategorischer Imperativ] - apontando para um curso universal e necessário de ações a serem realizadas ou deixadas de serem realizadas. O imperativo categórico é, basicamente, um procedimento de verificação da viabilidade moral de nossas ações. Kant expõe três formulações principais de tal imperativo, bem como variantes para a primeira e terceira formulações, totalizando cinco formulações.. A primeira - e, podemos dizer, mais conhecida - formulação reza: “Age apenas segundo a máxima pela qual possas querer simultaneamente que ela se torne uma lei universal”. (GMS, AA 04: 421). Uma máxima, para Kant, seria um princípio subjetivo do querer [subjektives Prinzip des Wollens] (GMS, AA 04: 400, nota) adotado por um sujeito agente - como, por exemplo, “sempre procuro ajudar alguém em necessidade quando este se encontra à minha frente”. Se uma máxima pode ser universalizada - qualquer outro ser humano poderia adotá-la, sem que contrariasse, com isso, o que a lei moral ordena -, então ela é considerada moralmente boa.
Um outro modo de interpretar os mandamentos da lei moral é analisar aquela que é comumente considerada a segunda formulação do imperativo categórico - a “Fórmula da Humanidade” [Menschheitsformel]: “Age de tal modo que uses a humanidade, tanto em tua pessoa quanto na pessoa de qualquer outro, em todo momento simultaneamente como um fim, e jamais meramente como meio”. (GMS, AA 04: 429). A nossa humanidade, nesse sentido, não deve ser entendida como um conceito antropológico (empírico), mas sim como um conceito racional, que aponta para a nossa própria natureza racional. [vernünftige Natur] - que é o que nos confere, enquanto seres racionais (apesar de sensíveis), um “valor absoluto” [absoluter Wert] na condição de “fim em si mesmo” [Zweck an sich selbst]10. Somos seres dotados de uma natureza racional, e, de fato, de uma razão prática - nossa vontade, enquanto “faculdade de determinar a si mesma a agir de acordo com a representação de certas leis”. (GMS, AA 04: 427). Enquanto seres humanos, somos dotados de uma natureza racional; e tal natureza racional possui um valor absoluto, como fim em si mesma; esse valor absoluto pode ser entendido como uma dignidade [Würde], que se distingue de um mero preço; como seres dotados de dignidade, não podemos ser tratados como meros meios, mas devemos respeitar e ser respeitados como fins em si mesmos. Esse argumento só é possível à luz da autonomia da vontade como princípio supremo da moralidade: porque a nossa própria razão nos dá a lei a ser seguida, possuímos dignidade; e, como autônomos, somos seres livres (do ponto de vista prático).
O argumento kantiano, em GMS, buscando provar a validade da vinculação entre moralidade e liberdade, é intrigante, por mais que tortuoso e comumente criticado pela tradição de interpretações de comentadores. Em linhas gerais, Kant busca possibilitar a reciprocidade entre liberdade e lei moral mediante a dupla cidadania do ser humano nos mundos sensível (enquanto ser sensível) e inteligível (enquanto ser racional) (GMS, AA 04: 451; 454-455), na medida em que, como agente de ambos os mundos, ele estaria vinculado à ação por meio do mundo inteligível, uma vez que considerado seu eu inteligível como “o eu verdadeiro” [das eigentliche Selbst]. (GMS, AA 04: 457). Tal argumento apresenta problemas internos - que, apesar de intrigantes, demandariam demasiado desvio no presente trabalho -, de modo que se pode conjecturar que o próprio Kant tenha se dado conta de sua insuficiência, ao abandonar sua estratégia justificativa de GMS (de uma dedução do princípio supremo da moralidade) ao apresentar a noção de “factum da razão” [Faktum der Vernunft] em KpV. Em todo caso, é na noção de autonomia da vontade e conceitos relacionados que estamos aqui interessados, uma vez que estes servem de base para o estudo do conceito de direito em RL - e para a MS como um todo.
A liberdade como o único direito inato
Como apresentamos anteriormente, o ser humano, como autônomo, deveria ser entendido como livre em um sentido peculiar - livre no sentido prático. Tal sentido prático se distingue do sentido teórico, que não pode ser provado. Na terceira antinomia da dialética transcendental de KrV (A 444/B 472 – A 451/B 479), Kant já apontara para a possibilidade de se pensar a ideia da liberdade, embora sem poder ter dela conhecimento teórico; qualquer uma das duas teses (de que há liberdade no mundo, e de que não há) não poderia ser provada, uma vez que em nenhuma das duas o objeto referente se encontra na nossa sensibilidade. Não obstante, por mais que não se possa prová-la teoricamente, pode-se pensá-la por meio da faculdade do entendimento; e justamente isso abre caminho para o uso prático do conceito de liberdade. Como seres autônomos, ou potencialmente autônomos, somos livres; e como tais devemos ser tratados. De que eu tenha um dever moral de ser tratado como um ser livre (não meramente como um meio, mas sim como um fim em si mesmo), Kant tira um dever jurídico- “o direito inato é apenas um único”, que é, assim, a liberdade. Tal liberdade, no caso do direito, é caracterizada como “liberdade (independência de um outro arbítrio que obriga), na medida em que ela pode coexistir com a liberdade de todo outro segundo uma lei universal”, sendo “este direito único, originário, pertencente a todo ser humano por força de sua humanidade”. (MS/RL, AA 06: 237). Assim, pode-se conceber o direito como uma estrutura de relações simétricas entre indivíduos livres e iguais, na qual a dominação e a assimetria de poder estão excluídas. (KERSTING, 2004, p. 49.)
A liberdade como independência de um outro arbítrio que obriga [Unabhängigkeit von eines anderen nötigender Willkür] se trata da mesma liberdade entendida já em GMS, por mais que tomada por um sentido diferente. Enquanto em GMS - mas também em KpV - a liberdade se encontra considerada referentemente à vontade de um sujeito agente (sendo que uma vontade autônoma é uma vontade livre), esse primeiro sentido de liberdade é entendido como um sentido interno: do agente poder determinar, por meio de sua própria vontade (enquanto razão prática11), a máxima que deve colocar como lei. Uma vez que todo ser racional sensível - ser humano - deve ser entendido como possuindo uma vontade livre, que não pode ser provada pela razão especulativa, mas deve ser tomada pela razão prática, o tratamento de seres humanos como meros meios em uma cadeia causal de eventos é moralmente vetado. Para Kant, tanto o âmbito da ética quanto o do direito possuiriam uma e mesma base: a própria moralidade. Deste modo, os conceitos analisados em GMS - sobretudo a autonomia da vontade - devem valer para ambos; em ambos, uma vez que se trata da moralidade, há deveres, que podem ser deveres éticos ou jurídicos (MS/RL, AA 06: 218-221); a ética fica encarregada da parte motivacional da ação (interna ao agente), enquanto o direito considera tais deveres em sua externalidade.
A liberdade, como direito inato, é uma liberdade externa - na medida em que nenhum ser humano tem o direito de tratar outro como um mero meio, isto é, impondo sobre o arbítrio de outro seu próprio arbítrio (entendendo “arbítrio” [Willkür] como a capacidade de escolha). Todos os seres racionais sensíveis têm um dever ético de respeitar a condição de outros (e de si mesmos) como autônomos, e justamente por isso há também um dever jurídico. Não é possível controlar, externamente, a motivação de agentes visando a não violação da liberdade externa de outros; isso cabe exclusivamente à ética, sendo uma questão do sujeito agente consigo mesmo. Entretanto, é possível obrigar tal respeito - e isso acontece mediante o conceito de direito, que está vinculado ao conceito de coerção. Da independência (não ser obrigado por outros mais do que reciprocamente os podemos obrigar), implica-se a qualidade do ser humano enquanto “seu próprio senhor” [sui iuris.sein eigener Herr] (MS/RL, AA 06: 237-238) - noção esta estritamente vinculada à autonomia de um sujeito moral -, e a de ao mesmo tempo ser um “homem íntegro” [iusti]; implica também a faculdade de fazer aos outros aquilo que não os prejudica no que é seu, se eles não o quiserem tomar como tal. Kant cita alguns exemplos para ilustrar tal faculdade: comunicar o próprio pensamento, contar ou prometer algo, ser verdadeiro e sincero ou falso e dúplice, uma vez que recai sobre os outros o fato de querer - ou não - acreditar no interlocutor.
O conceito kantiano de direito
Na introdução à RL, Kant apresenta cinco pontos do conceito de direito . O primeiro consiste em uma definição de Doutrina do Direito [Rechtslehre]: “O epítome das leis, para as quais uma legislação externa é possível, se chama Doutrina do Direito (Ius)”. (MS/RL, AA 06: 229). Segundo Kant, tal legislação externa seria o direito positivo, sendo o jurisconsulto [Iurisconsultus/Rechtsgelehrte ou Rechtskundige] que é conhecedor das leis externas e de sua aplicação chamado de jurisperito [Iurisperitus/rechtserfahren]. Deste modo, é jurisprudência [Iurisprudentia/Rechtsklugheit] o conhecimento do epítome das leis, assim como de sua aplicação; na falta de ambas essas condições, resta mera jurisciência [Iurisscientia/Rechtswissenschaft], que diz respeito ao conhecimento sistemático da doutrina do direito natural [Iusnaturae/natürliche Rechtslehre].
O segundo ponto apresenta uma definição de direito, sendo que Kant reconhece a dificuldade de tentar formulá-la. Traçando um paralelo com a indagação “o que é a verdade?” para um lógico, também o jurisconsulto deveria tomar as devidas precauções para não cair em tautologia. Não seria possível definir o direito considerando as leis de um determinado tempo ou lugar, uma vez que faltaria ainda o conhecimento do critério geral [allgemeine Kriterium] para determinar o justo tanto como o injusto [iustum et iniustum.Recht sowohl als Unrecht] em tais leis. De modo similar, a definição também não poderia ser alcançada através do direito positivo, posto que é uma doutrina empírica, logo, incompleta (sobre esse ponto, Kant traça uma comparação com a cabeça de madeira da fábula de Fedro, que, não obstante seja positivamente bela, falta-lhe o cérebro). Assim sendo, o conceito de direito estaria vinculado a uma obrigação correspondente a ele (o conceito moral de direito), levando em conta três pontos: (a) a relação externa e prática de uma pessoa com outra, na medida em que suas ações possam ter influência (direta ou indireta) entre si; (b) tal relação envolve tão-somente o arbítrio [Willkür], e não as relações de um arbítrio com a mera aspiração; e (c) não se leva em conta a matéria (o fim que cada um tem em mente como objeto de seu desejo) do arbítrio, mas sim sua forma, já que o arbítrio é considerado meramente como livre, e a ação de alguém pode ser conciliada com a liberdade de outrem, em conformidade com uma lei geral. Kant usa o exemplo de alguém que compra mercadorias para seu próprio uso comercial, ao qual não é indagado se lucrará com a transação ou não. Desse modo, o direito é definido como “a totalidade das condições sob as quais o arbítrio de um com o arbítrio de outro pode ser unido em conjunto segundo uma lei geral de liberdade”. (MS/RL, AA 06: 230).
O terceiro ponto dá-nos o princípio geral do direito: “Uma ação qualquer é justa, que ou segundo cujas máximas a liberdade do arbítrio de cada um pode coexistir com a liberdade de todos segundo uma lei geral”. (MS/RL, AA 06: 230). Kant desenvolve aqui o que havia tratado já no segundo ponto; temos, assim, que toda ação que impõe um obstáculo à liberdade de um indivíduo é contrária ao direito, uma vez que não se faz possível uma coexistência de tal impedimento com a liberdade segundo leis gerais. Não obstante, não se pode exigir que esse princípio de “todas as máximas” (o princípio geral do direito) seja minha máxima (que eu converta em máxima de minha ação), uma vez que “tomar como máxima agir em conformidade com o direito é uma exigência que me coloca a ética”, e não o direito. Evidencia-se aqui a distinção feita por Kant entre ambas as legislações, a ética (que faz da ação um dever e simultaneamente desse dever um móbil) e a jurídica (que não inclui na lei o dever e que, consequentemente, admite um móbil diferente da ideia do próprio dever), de maneira que leva à distinção entre legalidade e moralidade12. Na sequência, Kant apresenta a lei do direito geral [das allgemeine Rechtsgesetz]: “age exteriormente de tal modo que o uso livre do teu arbítrio [Willkür] possa coexistir com a liberdade de todos segundo uma lei geral”. (MS/RL, AA 06: 231). Notadamente, percebe-se que o conceito, o princípio universal e a lei universal de direito estão conectados, por mais que não sejam estritamente coincidentes.
O quarto ponto tem por título “O direito está unido com o poder de coagir” [Das Recht ist mit der Befugnis zu zwingen verbunden]. De acordo com Kant, tudo aquilo que não é conforme ao direito seria um obstáculo à liberdade segundo leis gerais. Desse modo, temos que, se um uso da liberdade é, ele próprio, um obstáculo à liberdade segundo leis gerais (isto é, não conforme ao direito [Unrecht]), a coerção que se opõe a ele, como impedimento de um obstáculo à liberdade, está de acordo com a liberdade (é conforme ao direito [Recht]). De acordo com o princípio de não-contradição, deve estar ao mesmo tempo associada ao direito uma faculdade de coagir aquele que lhe causa prejuízo.
No quinto ponto, por fim, temos que “o direito estrito pode ser também representado como a possibilidade de uma coerção recíproca, sem exceção, concordante com a liberdade de todos segundo uma lei geral”. (MS/RL, AA 06: 232). O direito não pode ser concebido como composto de dois elementos (a obrigação segundo uma lei e a faculdade daquele que obriga outros mediante seu arbítrio de coagi-los a isso), “mas sim que podemos situar diretamente o conceito de direito na possibilidade da associação da coerção recíproca universal com a liberdade de todos”. (MS/RL, AA 06: 232). O objeto do direito, deste modo, é o que é exterior nas ações (fundamentos externos de determinação do arbítrio), o direito estrito (que não inclui a dimensão ética). Diz Kant: “Direito estrito (restringido) só pode, portanto, chamar-se o completamente externo”. (MS/RL, AA 06: 232). O direito externo, deste modo, fundamenta-se na consciência da obrigação de cada um segundo a lei, por mais que, para determinar o arbítrio em conformidade com ela, não possa nem deva apelar a tal consciência como móbil (mas sim ao princípio da possibilidade de uma coerção exterior, que pode coexistir com a liberdade de cada um segundo leis universais). Dito isso, temos que “direito e faculdade de coagir significam, assim, uma e a mesma coisa”. (MS/RL, AA 06: 232). Kant dá o exemplo de um credor que, tendo o direito de exigir do devedor o pagamento de sua dívida, não o possa persuadir de que sua própria razão o obriga ao pagamento, mas que uma coerção (compelindo todos a fazer isto) poderia coexistir com a liberdade de cada um. Ainda no quinto ponto, Kant traça um paralelo entre a lei de coerção recíproca e a possibilidade dos movimentos livres dos corpos, que se dá por meio de uma lei de ação e reação. Tanto o primeiro quanto o segundo conceitos são construídos - e não deduzidos - partindo de intuições puras a priori. O objetivo de Kant é, deste modo, buscar uma doutrina do direito tão precisa quanto a matemática (no caso, mais especificamente, a geometria).
Sobre direitos e deveres jurídicos, é notável a exposição feita por Kant ainda na introdução à RL. Kant estabelece três fórmulas de deveres jurídicos, seguindo a divisão de Domitius Ulpianus. A primeira fórmula é: “Sê um homem honesto (honeste vive)” [Sei ein rechtlicher Mensch]. Kant afirma que a honestidade jurídica (honestas iuridica/rechtliche Ehrbarkeit) consiste em afirmar o valor próprio enquanto ser humano na relação com os outros. Desse modo, temos a seguinte proposição: “não transforme os outros para ti em mero meio, mas seja para eles, simultaneamente, finalidade”. (MS/RL, AA 06: 236). Tal dever é, como bem assinala Kant, uma obrigação decorrente do direito da humanidade na nossa própria pessoa13. A segunda fórmula é: “Não faça injusto a ninguém (neminem laede)” [Tue niemandem Unrecht]. É importante ressaltar ainda que, segundo Kant, o cumprimento desse dever deve ocorrer “mesmo que para tal te tenhas de desligar de todo vínculo com outrem e evitar toda sociedade”. (MS/RL, AA 06: 236). Por fim, a terceira fórmula estabelece: “Entra em um estado no qual a cada um pode ser assegurado o seu contra cada outro (lex iustitiae)”14 [Tritt in einen Zustand, worin jedermann das Seine gegen jeden anderen gesichert sein kann].
Em paralelo à divisão dos deveres jurídicos, Kant apresenta a divisão geral dos direitos. Acerca de tal divisão, podemos entender os direitos dos seguintes modos: (1) enquanto doutrinas sistemáticas - os direitos se dividem em (a) direito natural [Naturrecht] e (b) direito positivo (estatutário) [positive (statutarische) Recht], sendo que o primeiro se assenta em princípios puros a priori, enquanto o segundo provém da vontade de um legislador; (2) enquanto faculdades morais de obrigar os outros - os direitos se dividem aqui em (a) direitos inatos e (b) direitos adquiridos, sendo que o primeiro tipo é o direito relativo, que cabe a cada um por natureza (independente de qualquer ato jurídico), e o segundo tipo requerendo, por sua vez, um ato jurídico. Diz Kant: “O meu e o teu inato pode chamar-se também o meu e o teu interno (meum vel tuum internum); pois o que é exterior tem de ser sempre adquirido”. (MS/RL, AA 06: 237).
Em linhas gerais, estas são as noções centrais referentes ao conceito de direito na Rechtslehre kantiana. Por mais que se possa abarcar inúmeras discussões sobre as implicações que Kant tira dessas15, nosso objetivo no presente trabalho foca-se em uma análise mais apurada dessas mesmas noções centrais, sobretudo o modo como o conceito kantiano de direito deve ser entendido - em maior medida, se a filosofia do direito de Kant deveria ser considerada como um tipo de positivismo radical ou um não-positivismo superinclusivo.
A natureza do conceito de direito em Kant
Este capítulo é dedicado à discussão do pensamento kantiano em relação ao direito, mormente no que tange à natureza e aos elementos do conceito de direito por ele formulado. Antes, porém, é necessário um olhar, ainda que breve e superficial, sobre a grande questão da filosofia do direito em geral, de modo a possibilitar que a concepção de Kant seja contextualizada nela.
O problema central da filosofia do direito: a relação entre direito e moral
Nas célebres palavras do jurisconsulto romano Celsus, “o direito é a arte do bom e do justo” (ius est ars boni et aequi). Essa definição do direito, ao lado de sua simplicidade e de sua beleza, guarda uma importante característica: ao colocar o direito, a lei positiva, como a arte voltada à prática daquilo que é bom e justo, ela estabelece de forma particularmente nítida a vinculação entre aqueles elementos cuja relação constitui o impasse fundamental da filosofia do direito, impasse já presente séculos antes de Celsus e cuja complexidade sua definição lacônica de direito permite vislumbrar, não, porém, apreender em sua totalidade.
Com efeito, a solução do problema da relação entre direito e moral nunca foi pacífica entre os grandes nomes da filosofia jurídica. Pode-se dizer, em síntese, que a divergência entre positivistas, de um lado, e não-positivistas, de outro, diz respeito à inclusão da correção moral no conceito de direito. Positivistas tendem a ver no direito apenas os elementos da decretação de acordo com a ordem e da eficácia social; negam, portanto, que a correção moral tenha nele qualquer papel a desempenhar. Não-positivistas, por sua vez, aceitam os dois elementos descritos pelos positivistas, mas agregam a eles um terceiro, ao sustentar que o direito necessariamente abrange a correção moral. (ALEXY, 2010b, p. 116-117). A própria ideia de justiça, cuja imagem é tão frequentemente associada ao direito, é vista de modo distinto no positivismo e no não-positivismo; questões de justiça são, em essência, questões morais relativas à distribuição e à compensação. Dessa forma, a querela entre positivistas e não-positivistas representa simultaneamente uma discussão acerca do papel da justiça no direito. (ALEXY, 2017, p. 20).
“Positivismo” e “não-positivismo”, assim, designam duas diferentes maneiras de abordar o fenômeno jurídico. Evidentemente, contudo, ambas as categorias englobam variantes muito diversas entre si. Quanto às posições positivistas, pense-se no positivismo exegético, no positivismo normativista e no realismo jurídico; quanto às não-positivistas, pense-se no jusnaturalismo clássico, no direito como integridade e no direito discursivo. Trata-se, portanto, de algo muito mais complexo do que o retratado na antiga dicotomia entre positivismo jurídico e jusnaturalismo16. De qualquer modo, com a definição dos elementos do conceito de direito, ou, mais especificamente, com a divergência acerca do papel desempenhado pela correção moral nesse âmbito, está estabelecido o núcleo das duas posições fundamentais17.
Seria Kant um positivista ou um não-positivista?
Na filosofia de Kant, a relação entre positividade do direito e correção moral é exposta de modo complexo e aparentemente contraditório. A esse respeito, Norberto Bobbio (2006, p. 151-152) sustenta que a obscuridade e as repetições presentes na derradeira obra de Kant, “Metafísica dos Costumes”, onde ele desenvolve sua filosofia do direito, podem ser atribuídas às dificuldades impostas pela própria condição do filósofo, que a escreveu em idade bastante avançada18. Em direção semelhante, Wolfgang Kersting (2012, p. 17), que empreendeu um grande esforço para a reabilitação da filosofia do direito kantiana, salienta que a mencionada obra, volumosa, quebradiça e frequentemente desprezada como o produto de um espírito envelhecido, não permite que o leitor, por carecer de uma arquitetônica argumentativa clara, encontre um apoio consistente para ela no quadro maior dos fundamentos do sistema filosófico de Kant. É lícito pensar que essa impenetrabilidade tenha contribuído para o ostracismo da filosofia do direito kantiana, que permaneceu durante longo tempo relegada a um segundo plano pelos estudiosos da obra do filósofo prussiano19.
O primeiro ponto digno de apreciação diz respeito ao fundamento do direito positivo em Kant20. Trata-se de um fundamento não-positivo (mais especificamente, jurídico-natural ou jurídico-racional)21, o que resta claro da sua distinção entre leis externas naturais e positivas. Segundo ele, as leis vinculativas que admitem uma legislação externa são, de modo geral, leis externas (leges externae); incluídas nesse grupo estão aquelas que podem ser reconhecidas como vinculativas mesmo sem legislação externa, ou seja, a priori, mediante a razão. Essas são, em última análise, leis externas e, ao mesmo tempo, naturais. Por sua vez, as leis cujo caráter obrigatório não existe sem uma efetiva legislação externa (que, em última análise, só são leis em virtude dessa circunstância) correspondem às leis positivas. Quanto a essas leis, é possível conceber uma legislação externa que as contenha exclusivamente; ela, todavia, deveria ser precedida por uma lei natural que servisse de fundamento à autoridade do legislador, ou seja, a faculdade de obrigar outros mediante o seu arbítrio. (MS/RL, AA 06: 223).
Dessa forma, o fundamento de validade do direito positivo pode ser buscado em uma lei natural, do que, segundo Kant, decorre um dever moral de obediência ao direito. Com efeito, ele mostra-se categórico ao dizer que a máxima de agir segundo o direito é uma exigência posta pela ética22. (MS/RL, AA 06: 231).
A fundamentação jurídico-natural da validade do direito positivo, contudo, não diz nada sobre o conteúdo possível desse direito. Aqui, dificuldades apresentam-se. Kant, por um lado, sustenta ser impossível que o legislador venha a cometer uma injustiça contra alguém, já que ele representa a vontade unida do povo; trata-se, portanto, do povo decidindo sobre si mesmo, o que conduz a um dever incondicionado de obediência ao legislador, com a consequente supressão de qualquer direito de resistência legítima por parte dos súditos. (MS/RL, AA 06: 313-320). Pode-se designar isso como o “postulado da sujeição incondicionada ao direito positivo”. (ALEXY, 2017, p. 14). É imperioso deduzir disso que o direito positivo pode ter qualquer conteúdo, já que, na formulação de Kant, esse dever de obediência não encontra restrições materiais23.
Por outro lado, Kant sustenta também que o único fundamento possível da lei positiva deve ser encontrado na razão, cujos princípios possibilitam que aquilo que a lei diz em circunstâncias específicas de tempo e lugar seja considerado justo ou injusto. Metaforicamente, ele diz que uma doutrina do direito que negligencia essa questão corresponde a uma cabeça que, como aquela da fábula de Fedro, até pode ser bela, mas é lamentavelmente desprovida de cérebro. (MS/RL, AA 06: 229-230; ver supra, item 1.4). Tomando-se isso como uma exigência de conformidade da lei positiva aos princípios reconhecidos pela razão, torna-se evidente a contradição com a ideia de uma sujeição incondicionada à vontade do legislador.
Como superar esse impasse24? Há, segundo Robert Alexy (2005, p. 193-194), duas distintas possibilidades. A primeira consiste em aceitar que Kant, ao enlaçar o dever moral de obediência ao direito com a sujeição incondicionada à vontade do legislador, defende um positivismo moralmente fundamentado. Adotando-se essa concepção, Kant converte-se em um positivista radical, um positivista ainda mais forte que aquele cuja teoria viria a ser, séculos mais tarde, considerada o paradigma do positivismo jurídico, Hans Kelsen. E isso porque a noção kelseniana da validade jurídica, cristalizada em sua norma fundamental, não engloba qualquer obrigação moral de obediência ao direito positivo25.
Um segundo caminho pode ser trilhado ao se afirmar que a ideia de um dever moral de obediência ao direito, independente do conteúdo por ele apresentado, não se coaduna com os princípios mais importantes da filosofia kantiana e que, portanto, sua filosofia jurídica não pode ser entendida dessa forma; deve-se, antes, procurar compatibilizá-la com aqueles princípios. Esse caminho parece ser sugerido pela suposição de que Kant, ao construir seu pensamento acerca do direito, não seguiu puramente as bases de seu sistema filosófico, mas deixou-se influenciar pela ideologia autoritária reinante na Prússia de seu tempo. (ALEXY, 2005, p. 193-194).
Trilhando-se o primeiro caminho, Kant deve ser tomado como o representante de um positivismo radical, um positivismo segundo o qual o direito não apenas pode apresentar qualquer conteúdo, mas também está assegurado por uma obrigação moral de obediência àquilo que prescreve. Esse positivismo radical é, sem dúvida, extremamente problemático quanto a seus efeitos práticos; ele levaria à legitimação moral do direito posto por absolutamente qualquer regime, mesmo o mais despótico deles. Quem envereda por esse caminho, todavia, pode concordar com isso, mas, ao mesmo tempo, afirmar que essa construção deve ser criticada apenas com base em elementos estranhos ao sistema kantiano, não a partir de fatores que podem ser encontrados dentro dele26. (ALEXY, 2005, p. 193).
Considerando-se a filosofia do direito de Kant em uma perspectiva mais ampla, essa não parece ser a melhor solução. O próprio conceito de direito kantiano, quando observado de modo analiticamente rigoroso, permite uma conclusão contrária a um positivismo radical.
A união entre direito positivo e direito não-positivo no conceito de direito de Kant
Eis o conceito de direito em Kant: “O direito é, pois, a totalidade das condições sob as quais o arbítrio de um com o arbítrio de outro pode ser unido em conjunto segundo uma lei geral de liberdade”. (MS/RL, AA 06: 230; ver supra, item 1.4). Apesar de sua pouca extensão, esse é um conceito extremamente denso, intimamente ligado não apenas à filosofia do direito de Kant, mas também à sua filosofia moral; assim, dentre os seus elementos, apenas aqueles que se mostram pertinentes do ponto de vista da finalidade aqui perseguida serão abordados.
O primeiro ponto a ser salientado é o de que esse não é um conceito de direito puramente descritivo. A definição kantiana tem um caráter deontológico, ou seja, não exprime o direito como ele é, mas como ele deveria ser. E como o direito deveria ser? Segundo Kant, como um instrumento voltado à realização de um valor: a liberdade27. (BOBBIO, 2006, p. 139-140). Isso é reforçado pela concepção kantiana da liberdade como o único direito original que cabe a todo e qualquer homem em virtude de sua humanidade. (MS/RL, AA 06: 237; ver supra, item 1.3).
Permanece em aberto, contudo, o modo pelo qual esse valor pode ser realizado. Uma solução para esse problema deve ser buscada nos outros elementos da definição kantiana. A exposição a seguir toma por base essencialmente o trabalho de Robert Alexy, o qual, por sua vez, baseou-se no pensamento de Ralf Dreier acerca da filosofia do direito de Kant.
Quando Kant faz alusão à “totalidade das condições”, ele está a se referir à totalidade de leis exteriores. Aqui, alguns aspectos da dicotomia interior/exterior devem ser considerados. Essas leis exteriores são leis que, simultaneamente, regulam o uso exterior da liberdade e não dependem de uma mola propulsora interna (no caso, a noção do dever); nisso diferenciam-se das leis interiores, as leis da virtude, aquelas que regem o uso interior da liberdade e cuja ideia do dever constitui a sua mola propulsora. (ALEXY, 2010a, p. 141; ver supra, item 1.4). “Para atuação jurídica basta obediência legal exterior, moralmente atua a pessoa, ao contrário, somente quando ela atua por causa do dever”. (MAYER, 2010, p. 210).
Mais além, a dicotomia interior/exterior remete à validez normativa, que, em Kant, pode ser de dois tipos: a dação de leis interior, relativa às normas postas a priori pela razão, e a dação de leis exterior, relativa às normas estabelecidas pela arbitrariedade de outrem. Uma dação de leis interior que tenha leis exteriores por objeto corresponde ao direito natural (ou, mais especificamente, ao direito racional, já que, no sistema de Kant, o direito natural descansa sobre puros princípios a priori, ou seja, sobre a razão pura). De outra forma, uma dação de leis exterior que se ocupe de leis exteriores equivale ao direito positivo, ou seja, ao direito posto por dação de leis estatal. O conceito de direito kantiano abrange todas as leis exteriores, independentemente do fato de elas serem válidas em virtude de dação de leis interior ou exterior. Isso significa que, em Kant, direito natural e direito positivo estão unidos no conceito de direito; assim, o problema da relação de tensão entre direito e moral converte-se em um problema situado no interior desse conceito. (ALEXY, 2010a, p. 141-142).
Dito de modo mais preciso: leis exteriores são leis que regulam o uso exterior da liberdade, em oposição à ética, que regula o uso interior da liberdade. Sua fonte pode ser a dação de leis interior ou a exterior; leis exteriores que decorrem de dação de leis interior, ou seja, uma dação de leis da razão pura, correspondem ao direito natural, enquanto leis exteriores que decorrem de dação de leis exterior, ou seja, o direito posto por vontade estatal, são leis positivas. (DREIER, 1986, p. 12).
Um último aspecto da dicotomia interior/exterior a ser analisado diz respeito à coerção. O direito positivo (como visto, leis exteriores postas através de dação de leis exterior) é dotado de coerção exterior, ao contrário do que ocorre com as leis interiores postas por dação de leis interior (as leis da ética), que dispõem apenas de coerção interior (consistente na própria ideia do dever). Quanto ao direito natural, que representa um intermediário entre essas posições extremas (vale dizer, leis exteriores provenientes de dação de leis interior), a coerção é, a exemplo do que ocorre no direito positivo, exterior, pois ele não depende de positivação para ser feito valer28. (ALEXY, 2010a, p. 142-143).
O próximo elemento do conceito de direito kantiano é o da “conciliação de arbitrariedades”. Trata-se, em essência, da possibilidade, a todos conferida, de adotar ou não uma determinada atuação. Tomando-se a liberdade como o uso exterior da arbitrariedade (uma liberdade exterior, portanto), pode-se dizer que o conceito de direito kantiano abrange a totalidade das leis exteriores (tanto provenientes do direito natural quanto do direito positivo) sob as quais a liberdade de cada um pode ser unida com a liberdade de todos os demais. (ALEXY, 2010a, p. 143-144; ver supra, item 1.3).
Concluindo o rol dos elementos da definição kantiana, diz-se nela: “segundo uma lei geral de liberdade”. Nesse ponto, assume relevo o uso jurídico do imperativo categórico, ao qual se pode reconduzir uma lei jurídica geral, como segue: “atue segundo normas do direito positivo e do direito natural externamente de modo que o uso livre de tua arbitrariedade com a liberdade de cada um possa existir em conjunto segundo uma lei geral”. (ALEXY, 2010a, p. 146-147; ver supra, item 1.2). Com isso, o conceito de direito de Kant pode ser formulado, em outras palavras, assim: “direito é a totalidade das leis exteriores pelas quais a liberdade de cada um possa ser unida em conjunto com a liberdade de todos os outros de uma forma passível de universalização.” (DREIER, 1986, p. 15).
Embora todos esses elementos deixem questões em aberto, o mais importante deles, do ponto de vista da determinação da natureza da definição kantiana, é o da “totalidade de condições”. Sobre ele deve, portanto, recair uma atenção especial.
Poder-se-ia pensar que o conceito de direito kantiano, ao abarcar tanto o direito positivo quanto o direito não-positivo, estabelece a necessidade de uma ponderação entre os valores fundamentais que cada um deles representa, ou seja, a segurança jurídica, do lado positivista, e a justiça, do lado não-positivista. Embora isso pareça esbarrar na já mencionada obrigação incondicional de obediência ao direito positivo, o problema pode ser solucionado ao atentar-se para a forma através da qual ela é descrita por Kant, qual seja, uma “ideia do princípio da razão prática”. (ALEXY, 2010a, p. 148-149).
Em Kant, ideias práticas são aquelas que estabelecem uma aproximação, tão grande quanto possível, à perfeição, enquanto ideias reguladoras que servem a um propósito prático. Correspondem a “modelos” ou “arquétipos” da pura razão, que, no mundo dos sentidos, somente podem ser realizados de modo aproximativo. (DREIER, 1986, p. 16). Aplicada à concepção kantiana do direito, essa ideia permite a recondução a um conceito de direito perfeito, no qual a relação de tensão entre segurança jurídica e justiça estaria anulada em face da correspondência do direito positivo ao direito natural. Isso significa que tanto as exigências de um quanto as de outro são unidas na medida máxima possível. O conceito de direito kantiano converte-se, assim, em um conceito que, como ideia, exige a realização ótima de princípios concorrentes. (ALEXY, 2010a, p. 150).
Pode-se dizer, nesse sentido, que a filosofia de Kant conhece a diferença entre princípios práticos, cuja estrutura corresponde a de mandamentos de otimização, exigindo a realização, em medida máxima possível, de princípios colidentes, e regras práticas, que se caracterizam por determinar uma consequência jurídica imediata (um mandamento, uma proibição ou uma permissão) quando seu tipo é preenchido. (DREIER, 1986, p. 17).
Há, certamente, uma discrepância entre a ideia do direito perfeito e o direito como ele é na realidade; isso, todavia, é algo inerente à natureza das ideias, às quais somente se pode pretender uma aproximação. Ao remeter a um direito perfeito, ideal, a definição kantiana parece estar em uma relação de absoluta oposição com o direito real, faticamente existente. Em Kant, contudo, não se trata disso, pois a ideia do direito perfeito repercute decisivamente no âmbito do direito imperfeito, real; a mais importante dessas repercussões está na pretensão de correção que o direito necessariamente promove. Essa pretensão de correção, resultante da interpretação do conceito de direito kantiano como ideia, inclui uma pretensão de justiça. A pretensão de correção representa, assim, o elemento de união entre idealidade e faticidade no âmbito do direito. (ALEXY, 2010a. p. 150-151).
Do ponto de vista da relação entre direito positivo e direito natural, a ideia da pretensão de correção tem importantes consequências. Kant, sem dúvida, nega que o direito positivo, em todos os casos possíveis de contradição com o direito natural, deva ser considerado inválido. Contudo, ao abarcar com o seu conceito de direito tanto um quanto o outro, ele diz que o direito positivo é direito juridicamente vicioso, embora sem perder sua validade. (ALEXY, 2010a, p. 151). Trata-se de uma diferença sutil, embora extremamente importante. Ela toma por base a ideia de uma conexão qualificadora entre direito positivo e direito não-positivo, contraposta à ideia de uma conexão classificadora29.
Pode-se dizer, assim, que Kant, ao enlaçar todos esses elementos aparentemente contraditórios (de um lado, a sujeição incondicionada ao direito positivo e a negação do direito de resistência; de outro, a necessária conformidade do direito positivo aos princípios da razão e o abarcamento tanto do direito natural quanto do direito positivo em seu conceito de direito), que devem ser combinados de modo a atingir-se um ponto arquimédico, defende, usando-se a expressão de Alexy, um não-positivismo superinclusivo, ou seja, um não-positivismo que, não obstante pressuponha a correção moral como um dos elementos do direito, afirma a impossibilidade de uma perda da validez jurídica de normas do direito positivo em virtude de defeitos morais. Aqui, a conexão qualificadora revela-se de modo particularmente claro: no não-positivismo superinclusivo, a viciosidade jurídica de uma norma maculada por defeitos morais existe, mas não é suficiente para a perda da validez jurídica30 31.
É possível, contudo, ir um pouco mais além. Considerando-se, sobretudo, a união entre direito positivo e direito não-positivo no conceito de direito kantiano, ou, de modo mais específico, a concorrência entre os princípios que cada um deles representa (segurança jurídica e justiça), não parece de plano descartável a possibilidade de que o sistema de Kant seja compatível com a perda da validez jurídica de uma norma em caso de injustiça extrema. A filosofia do direito kantiana, assim considerada, aproximar-se-ia da de Gustav Radbruch, que, séculos depois de Kant, defenderia a perda do caráter jurídico de normas extremamente injustas, tese amplamente aceita na Alemanha após o colapso do regime nacional-socialista32.
Trata-se de uma possibilidade admitida, embora não expressamente defendida, pelo próprio Alexy33. Assim interpretado, contudo, o conceito de direito kantiano deixaria de pertencer ao âmbito do não-positivismo superinclusivo; a negação do caráter jurídico de normas (de sua validez, portanto) é característica do não-positivismo inclusivo34. Em relação ao sistema de Kant, parecem falar a favor dessa interpretação tanto as inconsistências do postulado da sujeição incondicionada ao direito positivo, inconsistências essas que aliviam o peso da positividade nesse sistema35, quanto o viés deontológico de sua definição de direito36.
Em conclusão, pode-se dizer que a filosofia do direito de Kant, durante muito tempo desprezada, constitui um objeto de estudo que, analisado mais de perto, revela uma amplitude colossal de possibilidades, muitas das quais extremamente pertinentes para o debate acerca da definição e da natureza do direito. A presente investigação não esteve sequer nas cercanias de esgotar esse objeto, embora tenha oferecido caminhos que levam à sua melhor compreensão e apreciação. Restam, contudo, muitas regiões a desbravar. Assim, o pensamento de Kant acerca do direito mostra-se, nas palavras de Alexy (2010a, p. 152), “tão vivo como no primeiro dia”.
Conclusão
Esta investigação, por meio da cuidadosa análise dos conceitos centrais da filosofia do direito de Immanuel Kant, demonstrou que, ao contrário do que uma leitura apressada e superficial da MS poderia sugerir, o pensamento kantiano não se coaduna com o positivismo radical que parece residir nas noções de sujeição incondicionada à vontade do legislador, vedação à resistência legítima e obrigação moral de obediência ao direito positivo. Semelhante conclusão somente poderia ser obtida com a desconsideração de elementos cruciais do pensamento filosófico-jurídico kantiano, a começar pelo próprio conceito de direito, no qual direito positivo e direito não-positivo estão unidos idealmente. A análise global dos elementos díspares que compõem a filosofia do direito de Kant parece falar a favor do não-positivismo, ou, mais especificamente, de um não-positivismo superinclusivo. Preservar-se-ia, dessa forma, a coerência do pensamento kantiano em relação ao direito, com a ponderação de seus elementos de idealidade e positividade: o direito positivo real, faticamente existente, é, se injusto, juridicamente vicioso, sem, todavia, que perca sua validade por essa circunstância. A solução do não-positivismo superinclusivo pode ser a que permite o maior equilíbrio entre os elementos da filosofia do direito kantiana; essa, porém, não deve ser a última palavra. Certo é que Kant, ao defender a sujeição incondicionada à vontade do legislador, estava a reproduzir uma noção corrente no pensamento iluminista de seu tempo, a da lei como expressão infalível da vontade geral, devida sobretudo ao gênio de Jean-Jacques Rousseau. Sob esse aspecto, Kant revelou-se um rousseauniano; não parece ter-lhe ocorrido a hipótese de que o legislador, investido naquele poder, pudesse cometer contra seu próprio povo a mais brutal das injustiças. Esse belo sonho iluminista foi, contudo, impiedosamente abalroado pela história. É lícito pensar que Kant, se viesse a ser confrontado com a barbárie dos regimes totalitários do século XX, negaria peremptoriamente o caráter jurídico das leis por eles produzidas. A presente investigação demonstrou que essa conjectura encontra apoio em elementos centrais de sua filosofia do direito. Afinal, dignidade, autonomia e liberdade do homem enquanto ser racional não podem ser compatibilizadas com a opressão e a tirania.
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Contribuição dos autores:
Emanuel Lanzini Stobbe redigiu a primeira seção. Leonardo Simchen Trevisan redigiu a segunda seção. Ambos os autores participaram das discussões, problematização e revisão do artigo. A versão final do texto foi aprovado pelos dois autores.
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Autor(a) para correspondência: Leonardo Simchen Trevisan, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Daculdade de Direito, Av. João Pessoa, 80 - Centro Histórico, CEP 90040-001, Porto Alegre - RS, Brasil. leonardo_tapes@hotmail.com.