Resumo: Devido à importância da teoria dos valores, elaborada por Max Scheler, este artigo tem a finalidade de descrever a essência e originalidade da fundamentação moral, mostrando a absoluteidade que lhe é inerente, para erigir uma ética de valores morais absolutos. Feito, isto, encontraremos de fato, fundamentos axiológicos capazes de evidenciar os princípios que permeiam e tornam a base da vida ética e moral das pessoas repleta de valor e sentido, dentro da respondente e responsável causalidade de suas ações e decisões que emanam desta capacidade humana e, que está latente em sua essência.
Palavras-chave:MoralMoral,ValoresValores,PessoaPessoa,AgirAgir.
Abstract: Due to the importance of the theory of values, elaborated by Max Scheler, this article aims to describe the essence and originality of the moral foundation, showing the absolute nature inherent to it, to erect an ethics of absolute moral values. This done, we will find, in fact, axiological foundations capable of showing the principles that permeate and make the basis of people's ethical and moral life full of value and meaning, within the responsive and responsible causality of their actions and decisions that emanate from this human capacity and, that is latent in its essence.
Keywords: Moral, Values, Person, Act.
Artigos
Originalidade, princípio e ápice dos fundamentos morais no crivo da teoria dos valores de Max Scheler
Originality, principle and apex of moral fundamental in Max Scheler theory of values
Recepção: 29 Dezembro 2020
Aprovação: 10 Abril 2021
A teoria dos valores foi elaborada pelo filósofo (fenomenólogo) alemão, Max Ferdinand Scheler (1874-1928). Está situada na sua obra principal que tem como título: Der Formalismus in der Ethik und die materiale Wertethik3. .O Formalismo na Ética e a Ética Material dos Valores) elaborada de 1913-1916 e considerada como um novo ensaio de uma Fundamentação Ética Personalista. Por meio desta obra, é proposta não propriamente uma ética dos valores entendida como uma nova ética, mas sim uma fundamentação da ética em uma teoria dos valores (PALACIOS, 2001 apud SCHELER, 2001, p. 15).
Segundo Max Scheler: “[...] os valores [...] formam o autêntico a priori material para a nossa intuição [...].” (2001, p. 173). Ainda sobre a noção de a priori material, Max Scheler (2001, p.110) faz a seguinte afirmação:
A priori, "material" é todo conjunto de proposições que, em relação a outras proposições a priori, por exemplo, as da lógica pura são válidas para uma esfera mais especial de objetos. Mas também é possível pensar em conexões aprióricas entre essências que só ocorrem em um objeto individual e estão ausentes, geralmente, em todos os outros objetos4 ..
O intuito de Max Scheler é estabelecer a ética sobre a ideia de um princípio de leis a priori provindas do sentir e do preferir intencional, e, da hierarquia objetiva dos próprios valores. E ainda que o caráter a priori dos valores e das exigências morais esteja inscrito nos dados fenomenais, não é preciso confundir-se a respeito do sentido deste a priori. Pois é um a priori material e existencial, e não formal. Desta maneira M. Scheler preconiza ter encontrado um caminho alternativo para a reflexão ética, de modo que evite os reducionismos exacerbantes do impasse advindo dos respectivos paradigmas racionalistas, de um lado o formalismo e, por outro lado, o relativismo (CANTO-SPERBER, 2013, p. 415).
Os critérios utilizados, por Max Scheler, para estabelecer uma hierarquia de valores são: duração, indivisibilidade, fundamentalidade, satisfação e grau de relatividade. Assim, quanto mais duráveis e indivisíveis são, os valores se tornam mais elevados. Quanto mais profunda for a satisfação que produzem, mais alto são os valores. “Além disto, o valor que funda é, evidentemente, mais elevado que o valor fundado. Por fim, há valores relativos a determinadas esferas, como, por exemplo, os valores vitais, e há valores absolutos, isto é, independentes de determinada esfera, [...] como, os valores morais” (MONDIN, 1980, p. 189). Por isso, é fundamental para esta pesquisa elaborar a seguinte questão-problema: Qual a inferência dada por esses critérios para a elaboração de uma fundamentação ética que não esteja sujeita ao relativismo moral (ou politeísmo axiológico5.) que permeia a sociedade?
A obra de Max Scheler é influenciada por uma experiência fenomenológica e evidencia uma abordagem eidética de livre acesso. Trata-se de um objetivismo ético, fundamentado em um mundo objetivo de valores atingidos por um intuicionismo. Isto é, a maneira que Max Scheler examina as intencionalidades da consciência e obtém delas a única via segura para uma plena objetividade, levando em conta também as razões emocionais ou intuitivas. A ética trata de elaborar regras a partir da moral, o que o filósofo faz é exatamente identificar de forma objetiva os fundamentos da moral, através de sua teoria dos valores, criando por meio deles um objetivismo ético.
A obra do filósofo Max Ferdinand Scheler apresenta de início uma originalidade, que constitui um modelo, uma referência para a atualidade, e nos possibilita compreender a realidade atual, obtendo assim, entendimento para nos depararmos com os problemas que emergem no âmbito da ética. O nosso filósofo vai trazer justamente uma fundamentação da ética em valores absolutos, questão que certamente toca a vida das pessoas. Vivemos em função de um sentido, somos sustentados por princípios que dão sentido aos nossos atos. Costa (1996), relata que M. Scheler foi um dos revitalizadores do pensamento filosófico contemporâneo, especialmente no campo ético com o personalismo ético e axiológico. No âmbito acadêmico atuou de forma genuína, contribuindo em diversas áreas, a saber: a Metafísica, a Política, a Biologia, a Psicologia, a Cosmologia; o que contribuiu para a diversificação do seu pensamento. Criou duas disciplinas: a Antropologia Filosófica e a Sociologia do Conhecimento que até o momento fazem parte dos currículos das universidades. O filósofo se destaca como um dos grandes mestres da antropologia filosófica contemporânea. Vemos deste modo que o pensamento de Max Scheler é objetivo, se mostra necessário, é peculiarmente rico em fundamentos.
Além do mais, as suas obras exercem grande influência no campo da filosofia moral e jurídica. A classificação dos valores considerada mais aceitável ainda é a dele, e está situada em sua obra mais importante, “O Formalismo na Ética e a Ética Material dos Valores”, obra escolhida para a realização deste trabalho. Nesta mesma obra o autor apresenta sua própria concepção fenomenológica intuicionista, versada em uma abordagem eidética na ética. Sua fenomenologia foi sem dúvida polêmica e de grande impacto, provocando discussões acirradas entre filósofos do prestígio de E. Husserl, Nicolai Hartmann e muitos outros. Independentemente disso, a sua genialidade era conhecida por seus contemporâneos, como, por exemplo, Dietrich von Hildebrand, Erich Rothacher, Henrich Lützeler, Edith Stein. Seu pensamento também inspirou outros muitos pensadores de diferentes áreas como Viktor Frankl, neurologista e logoterapeuta; E. Mounier personalista; Karol Wojtyla; E. Levinas; José Ortega y Gasset filósofo espanhol; Hans-Georg Gadamer; X. Zubiri; M. Heidegger; Martin Buber; Jean Paul Sartre; Karl Jaspers; Gabriel Marcel; Merleau-Ponty; Paul Ricoeur; Miguel Reale, jurista brasileiro, entre outros.
Portanto, diante da realidade crítica expressa pelo mundo, precisamos em nossos dias de algo que nos oriente, por isso vale a pena, com certeza, voltar-se à concepção ética filosófica de Max Scheler. Ele não é por acaso considerado o axiólogo máximo do século XX.
Com efeito, a análise fenomenológica da experiência moral realizada por Scheler, a partir da perspectiva axiológica foi das mais férteis do pensamento contemporâneo. Mediante a elaboração da ética dos valores, na qual se reivindica para estas entidades uma dimensão ontológica que evita todas as ameaças do psicologismo, Scheler subtrai a moral daquelas visões subjetivistas ou positivistas que foram moda no fim do século passado: nominalismo, psicologismo, pragmatismo, formalismo kantiano, ideologismo neokantiano, positivismo [...] Scheler define os valores como “objetos autenticamente objetivos, dispostos em ordem eterna e hierárquica”. Portanto, sua axiologia se caracteriza como realista e como hierárquica (por força da própria definição dos valores que ele oferece) e, além disso, como personalista e teocêntrica (MONDIN, 1980, p.189). [grifo do autor]
De acordo com Matheus (2002), foi de grande importância a influência da obra de Max Scheler nas primeiras décadas do século XX. No desenvolvimento da sociologia do conhecimento, como também da filosofia e da ética que chegou a ser tema de tese acadêmica6. de Karol Wojtyla, posteriormente Papa João Paulo II, o Sumo Pontífice, reconhecido pela Igreja Católica como santo, um homem à nível de debater com qualquer intelectual do mundo. Max Scheler foi um dos pensadores que mais colaboraram para o desenvolvimento da reflexão sobre as relações entre o pensamento e a realidade social. Ele empreendeu uma extensa e profunda obra, na qual há importantes inovações e descobertas para a história das ideias. Seu pensamento aborda questões que estão presentes no debate filosófico atual. Ainda de acordo com o autor, para o filósofo tudo era motivo para indagação e reflexão, pois pensava, questionava e vivia filosoficamente. Max Scheler estava sempre à procura da natureza oculta das coisas e das pretensões humanas. Na sua trajetória como homem de pensamento, vida e razão eram inseparáveis. Por isso, sua reflexão era impulsionada pela busca do sentido da vida e do lugar do homem no mundo.
De acordo com Palacios (2001 apud SCHELER, 2001) seu principal objetivo é a fundamentação da ética em uma teoria dos valores. Diz ainda Huisman (2000) que o autor questiona os fundamentos da ética tradicional. O próprio M. Scheler (2001, p. 30), deixa claro que a base desta concepção se realiza a partir de um “intuitivismo moral” ou “apriorismo material” que se estabelece dentro de um objetivismo e absolutismo ético. Isto significa que o filósofo propõe uma fundamentação da ética em um centro absoluto e objetivo, isto é, os valores. Estes são essências atingidas a partir de um intuicionismo emocional, na visão de Max Scheler, um contato intuitivo imediato com os objetos. Os atos de perceber sentimental são atos intencionais pelos quais o valor se dá de modo imediato para o espírito. A consciência intelectiva somente tem acesso ao valor de modo mediado. O saber emocional ou afetivo é anterior ao conhecer intelectivo. É o que dá a este seus objetos.
Vale também ressaltar que todo universo de valores possíveis das coisas, organizações e comunidades ainda que impessoais, dependem de valores pessoais. “No decorrer da história o modelo mais sistemático e influente na esfera eidética na ética foi realizado por Max Scheler” (CANTO-SPERBER, 2013, p. 415).
2.1 Origens da fundamentação da ética em uma teoria dos valores
As origens da fundamentação da ética em uma teoria de valores provem, segundo Max Scheler (2001), do seu objetivo de elaborar uma ética material dos valores sobre a mais ampla base da experiência fenomenológica. O filósofo procura esclarecer suas próprias teses positivas. E por este motivo abre uma crítica ao formalismo na ética, e principalmente aos argumentos produzidos pelo filósofo I. Kant que identifica o a priori como formal. Embora de acordo com Palacios (2001 apud SCHELER, 2001) o pensamento kantiano foi fonte de grande admiração de M. Scheler. E foi a partir da filosofia de I. Kant que M. Scheler sentiu-se provocado a fundamentar a ética em uma teoria dos valores, isto é, um objetivismo ético. Rejeitando sem reservas toda ética formal de I. Kant. Afirma o filósofo que:
erroneamente equipara os bens com os valores e acredita que os valores devem ser considerados como abstraídos dos bens. Mas antes de chegar a essa falsa comparação e opinião, devemos enfatizar que Kant rejeita com pleno direito, como de antemão, todas as Éticas de bens e de fins (SCHELER, 2001, p. 53)7. .
No entanto para M. Scheler (2001, p. 56) “[...] toda ética material deve ser necessariamente Ética de bens e de fins”8 .. Pois afirma ainda o filósofo (2001, p. 67) que nos bens e somente nos bens os valores se tornam reais. Sustenta Reale e Antiseri (1991) que para M. Scheler não é o dever que estabelece o conceito fundamental da ética, e sim o valor. E diz que I. Kant não distinguiu os bens dos valores. De acordo com Sciacca (1968) o objetivismo ético de M. Scheler procede de uma derivação autêntica da fenomenologia de E. Husserl. Que evidência um mundo real e objetivo de valores ou essências eternas que são captadas por intuição emocional.
M. Scheler sustenta um a priori que, para ele, é um dado objetivo, em que toda vida espiritual e não apenas a vida racional tem conteúdo a priori. Que exprime valores, não uma mera atividade do sujeito, mas é material e existencial, e não formal, uma ética a priori de valores absolutos como o bom, o belo e o verdadeiro, que são intraduzíveis em termos racionais. Diz respeito a um a priori enquanto extratemporais e necessários, independentes da experiência, históricos, pois se manifestam nos eventos. Do mesmo modo, como afirma M. Scheler, somente nos bens os valores se tornam reais. Ainda de acordo com Sciacca (1968) a resolução dos valores são os bens, isto, por exemplo, observamos em uma pintura artística, que é um bem, uma determinação do valor universal do belo.
Mas para compreender o porquê e a origem da fundamentação da ética em uma teoria dos valores faz-se necessário levar em conta o seguinte: o valor é independente do suporte. Embora “[...] no plano dos valores sensíveis a união entre as qualidades axiológicas e seus suportes é a mais íntima possível” (COSTA, 1996, p. 40). Isto é, os valores podem estar vinculados a pessoas ou objetos, sua existência, no entanto, independe desses, seu fundamento último é a priori. O que Max Scheler construiu com enorme destreza foi o “objetivismo ético, um mundo real e objetivo de valores que são essências eternas, captadas pela intuição emocional” (PADOVANI; CASTAGNOLA, 1964, p. 427).
Outro dado importante a respeito da teoria dos valores é que todos os valores têm como causa os valores positivos e negativos9., isto é essencial na compreensão dos valores. Ainda sobre a temática dos valores é essencial destacar a relação entre valor e dever. Segundo M. Scheler (2001, p. 146)10,
Há, em primeiro lugar, o princípio de que todo dever funda-se em valores, isto é, somente os valores devem ser e devem não ser; bem como os princípios que dizem que os valores positivos devem ser e os negativos não devem ser. [...] Em segundo lugar, as conexões de essências que valem a priori para a relação de ser e dever ser ideal, e que regulam suas relações no que diz respeito a ser justo e injusto. 11
Esta afirmação implica que o valor antecede a norma, ou seja, somente tem sentido seguir a lei se há um reconhecimento do valor que a fundamenta. Neste sentido, depreende-se que a moral não se origina da obrigação de obedecer a regras, mas de corresponder ao apelo que os valores fazem à consciência humana. Este é o motivo de M. Scheler tomar a iniciativa de elaborar a ética material dos valores dos bens e não dos bens em si mesmos.
Os valores, segundo Max Scheler, são importantes porque representam o conteúdo da perfeição moral. O valor do bem é apreendido através da percepção sentimental. Amor, pessoa, espírito e a ideia de Deus são também elementos significativos porque completam a percepção sentimental dos valores.
Para melhor entendermos a ética material dos valores proposta aqui pelo nosso filósofo analisaremos seus princípios rudimentares que são: A) a distinção entre ética e moral, B) os fundamentos Axiomáticos, C) a noção de Ethos e D) a discrição scheleriana de Deus.
2.1.1 Distinção entre ética e moral
Segundo Costa (1996), para o autor existe duas vertentes, a conduta moral e a ética filosófica. De modo peculiar a ética é constituída por princípios, e adquire uma natureza absoluta, dispõe de um caráter filosófico, e tem o papel de nortear. Isto é, de fazer juízo sobre os conjuntos e disposições presentes no conhecimento moral. Os valores objetivos permitem fazer a descrição entre conhecimento e conduta moral e também sobre o estado ético filosófico. Toda via é o intuitivismo emocional “que realiza atos não dependentes do pensamento racional nem da sensibilidade, mas que alcançam o estatuto do conhecimento a priori, característico do conhecimento moral” (CORTINA; MARTÍNEZ, 2005, p. 11). Que de acordo com Costa (1996) permite a conexão com a esfera dos valores éticos que por sua vez resultara no conhecimento moral que dará a possibilidade de adequação do indivíduo a está conduta.
Conforme com Canto-Sperber (2013, p. 415), Max Scheler realiza uma abordagem eidética na ética, diante dele a investigação fenomenológica do agir e da ética muda de identidade, pois assume uma perspectiva pascaliana e defende as “razões do coração” frente à lógica, evidenciando a importância dos sentimentos na prerrogativa dos valores. A partir desta compreensão, abre a ética para a filosofia da religião, fazendo da noção pessoal de Deus a classe axiológica máxima e o amor de Deus um ato fenomenológico indispensável. O grande objetivo de Max Scheler foi estabelecer a ética em um sistema de leis a priori que decorre do sentir e do preferir intencional e da divisão objetiva dos próprios valores.
Deste modo o autor observa que está estabelecida uma nova via de compreensão que previne o empecilho do formalismo kantiano e do relativismo nietzschiano. A definição dada por Max Scheler (2001, p. 129) entre o que é a ética em analogia a moral consiste no que segue: ética é a formulação segundo as leis que compreendem tudo aquilo que é presente no âmbito do conhecimento moral. E se intitula filosófica quando se limita ao conteúdo a priori do que é evidenciado pelo fato no conhecimento moral. Wojtyla (1993, p. 17) sintetiza: “Trata-se na ética do que é bom ou mau, do próprio bem ou mal moral como tal [...] não indutivamente o bem e o mal a partir dos dados empíricos, razão pela qual – como afirma Scheler – devem dar-se a priori”.
A moral por outro lado relata Costa (1996) assume uma relatividade em seu caráter histórico, cultural e até mesmo individual. A expressão máxima da moral são os fatos e por isto existe a possibilidade de uma compreensão científica da mesma, que tem como objeto as formas históricas de apreensão e conduta moral. Cada padrão de moral usa da pretensa de que suas bases são o nexo primoroso das exigências éticas. Outro fator importante nessa perspectiva de M. Scheler (2001) é que toda conduta moral é baseada na intuição moral, e o conhecimento moral tem em si relações a priori, desta maneira toda ética deve voltar-se aos fatos do conhecimento moral. Adela Cortina e Martínez (2005, p. 11-12) afirmam que a intuição emocional proposta por Max Scheler atinge o estatuto do conhecimento a priori que é um atributo do conhecimento moral e salienta que em cada indivíduo existe uma estimativa moral capaz de captar os valores já hierarquizados. Max Scheler (1994) diz que diante da ética absoluta, observa-se uma diversidade moral em que os relativistas éticos são de fato absolutistas do presente em que atuam, mesmo diante da realidade efetiva da vida. Para bem esclarecer o que é moral na percepção do autor é pertinente trazer a sua literal expressão afirma que:
Uma “moral” é um sistema de regras de preferência entre os valores mesmos, um sistema que só se pode descobrir por detrás das avaliações concretas da época e do povo, enquanto sua “constituição ética”, e que por seu lado pode perfazer uma evolução que, devido à crescente adaptação da avaliação e da lida sob o domínio de uma moral dada, não tem nada a ver com a alternante realidade da vida! Não apenas os diferentes modos de lidar e pensar, os diferentes tipos humanos etc., foram apreciados desta ou daquela maneira a partir da mesma moral [...] mas as morais mesmas se alteraram primária e independentemente a partir daqui e diante de toda mera adequação (SCHELER, 1994, p. 87-88).
Diante da distinção entre ética e moral consideramos que o filósofo evidencia uma relação profunda entre ambas, em que cada pessoa realiza a partir dos valores um discernimento da conduta que deve seguir primariamente pelos valores, sobretudo pelo crivo moral que capta imediata e intuitivamente, dentro da circunstância que se encontra, dentro de seu contexto de leis e deveres. Com efeito, “a exemplaridade moral de uma pessoa é superior a dois outros veículos muito conhecidos de crescimento moral: a ‘obediência’ e a ‘vontade’ de se tornar bom” (FRINGS, 2012, p. 73-74) 12. Dessa maneira seguimos agora para as bases axiomáticas da ética filosófica elaborada por nosso filósofo.
2.1.2 Fundamentos axiomáticos
Max Scheler (2001) em sua elaboração dos fundamentos da ética nos apresenta uma estrutura de axiomas que dispõe de leis de preferência objetivas que estão entre os valores materiais. Existem determinações para cada uma dessas classes de valores. A ética material apresentada por ele baseia-se nos seguintes axiomas:
I. 1. A existência de um valor positivo é, por sua vez, um valor positivo.
2. A não existência de um valor positivo é, por sua vez, a existência de um valor negativo.
3. A existência de um valor negativo é, por sua vez, um valor negativo.
4. A não existência de um valor negativo é, por sua vez, a existência de um valor positivo.
II. 1. Na esfera da vontade, o bem é o valor vinculado à realização de um valor positivo.
2. Na esfera da vontade, o mal é o valor vinculado à realização de um valor negativo.
3. Na esfera da vontade, o bem é o valor vinculado à realização de um valor mais alto (ou mais elevado).
4. Na esfera da vontade, o mal é o valor vinculado à realização de um valor mais baixo (ou do mais inferior).
III. Nesta esfera, o critério do bem (e do mal) consiste na coincidência (ou oposição) do valor intentado na realização com o valor que foi preferido, ou, respectivamente, na oposição ou coincidência ao valor que foi diferido (SCHELER, 2001, p. 74) 13.
De acordo com o filósofo, existe uma ordem hierárquica entre os valores que desponta de uma ordenação, que parte dos valores mais baixos (inferiores) até os mais elevados (superiores). Que estão enumerados deste modo: 1º Valores Sensoriais (alegria-tristeza, prazer-dor); 2º Valores Pragmáticos “ou da civilização” (útil-danoso); 3º Valores Vitais (nobre-vulgar); 4º Valores Intelectuais “culturais ou espirituais” – estéticos (belo-feio), ético-jurídicos (justo-injusto), especulativos (verdadeiro-falso); 5º Valores Religiosos (sagrado-profano); estas posições de valores aqui apresentadas fazem parte da esfera extramoral (SCHELER, 2001). O bem e o mal não estão inseridos nesta ordem de valor aqui relatada, mas são identificados como valores morais. Por isso faremos a descrição do mesmo: de início vimos que a primeira característica evidenciada é que o bem e o mal não são objetos de escolha voluntária. Embora o fato de deseja-los ou não pode está relacionada à moral, outro fator é que a essência e natureza neles apresentada são simplesmente temporais, isto é, o bem que preza pela virtude e o mal em posição contrária, estão ligados aos fatores de desenvolvimento e aprimoramento moral do indivíduo inserido em uma esfera temporal comunitária. Porque um valor positivo quando é livremente preferido, é como se a própria bondade moral incorporasse à pessoa enquanto ela efetivasse esse valor. Da mesma maneira o mal se acentua sobre a pessoa que segue uma ação que recusa um valor superior. O bem ou o mal em disposição da moral reflete a disposição da pessoa ao efetuar naturalmente um valor, pois são construções passivas e não se incluem por essência a dados intencionais ou de conteúdo do pensamento, isto é, da consciência (CANTO-SPERBER, 2013, p. 930).
Para Max Scheler todos possuem em si uma ordem do amor, o ser humano é por essência um ser de amor. Por este motivo cada indivíduo se sente atraído aos valores superiores. A experiência emocional dos valores é imprescindível, visto que a essência do ser humano não é completamente racional e nem inteiramente volitiva, mas age segundo uma lógica do coração. De certo, quando Max Scheler descreve o fato de preferir os valores positivos, não se implica no ato da opção totalmente determinada por eles. A ação de preferir é pré-racional, e permite com que livremente a pessoa seja conduzida e atraída para um valor positivo. Um simples exemplo é uma criança que deixa a brincadeira que está fazendo e decide colher uma bela rosa para sua mãe; o valor que a mãe representa é, sem deliberação, imediatamente “preferido” (CANTO-SPERBER, 2013, p. 930).
Ainda sobre isto Max Scheler (2001) vai dizer que somente se encontra uma conexão entre o ato de realização da vontade “boa ou má” em virtude do “bem e do mal” na qualidade da realização de valores “extramorais”. É nesse momento que se evidencia o bem ou mal “morais” de tais ações. Toda realização extramoral segue possíveis atos de preferência. Outro dado importante é que existe uma diversidade de ações que não são de modo algum atos da vontade, não obstante são depositários de valores morais. Por exemplo, perdoar, obedecer, ordenar, prometer, entre outros. É o valor que fundamenta a ética e atribui significado material a ação formal. Wojtyla (1993, p.19) afirma que os “[...] valores são objeto de experiência, pois dão base à essência da experiência ética vivida. Dizer que determinado ato é eticamente bom ou mau é definir seu valor [...]. Na realização do ato o valor é experimentado”. Embora tenhamos discorrido sobre os fundamentos axiomáticos da ética proposta por M. Scheler, as suas bases não se encerram aqui. Por isso daremos continuidade falando sobre a noção de Ethos.
2.1.3 Noção de ethos
De acordo com a percepção de Max Scheler (2001) o ethos faz parte justamente das variações históricas. Deste modo, é necessário ter noção da maneira que a historicidade conduziu a questão dos valores morais. Para poder desvendar os vestígios que com certeza permitiram evidentes problemas referentes aos parâmetros da relatividade moral em alcance universal. Pois para o autor o ethos é justamente “as variações da percepção afetiva dos próprios valores, (consequente ao conhecimento), bem como a estrutura da preferência axiológica, do amor e do ódio” (SCHELER, 2001, p. 410) 14. O autor sente-se livre para designar esta variação da percepção dos valores como ethos, esta é a primeira observação.
A segunda observação diz respeito às alterações da ética em sua totalidade que está ligada ao campo do juízo e das leis de análise de apreensão dos valores e de sua classe que são expostas em seus empregos e ações, que englobam as oscilações da ética em sentido geral, isto é, uma mutua relação axiológica que ocorre devido aos fatores em que os valores são apreendidos a partir de um sujeito ou da sociedade. O terceiro ponto condiz com as variantes apresentadas em integrações institucionais, bens e procedimentos. Isto é, os bens e os modos de agir que tem suas bases alicerçadas em composições axiológicas de caráter moral. Em que Max Scheler vai trazer como exemplo as seguintes situações: o matrimônio, a monogamia, o assassinato, o roubo, a mentira entre outros. Mas que embora para o mesmo (2001, p. 412) estas “[...] variações do próprio ethosnão tem nada haver com a adaptação do ethos referente ao mundo de mutações de bens da civilização e cultura (mesmo que estes cooperem a condicionar esta constituição) [...]” 15.
A quarta distinção empregada pelo autor e completamente diferente destas variações é a “moral prática”. Que diz respeito ao valor da conduta escolhida pelas pessoas, que parte em princípio das normas que fazem parte da relação de hierarquia dos valores em sua identidade. Para Max Scheler o valor dessas ações práticas é totalmente relativo a cada ethos e não deve ser comparado com o ethos de outra época ou povo. Somente a partir dos dados do ethos e de um conhecimento prévio da integridade moral de uma determinada época é que podemos fazer juízo sobre a conduta e intenção de alguém deste mesmo período.
Por fim, faz-se a distinção das mutações da moralidade, as que estão intimamente ligadas com os hábitos e costumes. Que se sustenta integralmente pela tradição cujo mesmo caráter não pode se desvincular a não ser por um ato volitivo (SCHELER, 2001). Para bem esclarecer a noção de ethos é oportuno enfatizar o seguinte:
Scheler denomina ethos o conjunto dos valores presentes na vida emocional dos indivíduos e sociedades. Os diferentes indivíduos e as sociedades possuem sensibilidades diferentes frente aos valores. São as mudanças no ethos, afirma Scheler, que geram as mudanças aparentes na ética. Essas mudanças não implicam, de modo algum, mudanças nos próprios valores ou em sua hierarquia, mas na abertura e no acesso que temos aos valores (DIAS, 2017, p. 82).
Os elementos que fundamentam a ética scheleriana não se encerram por aqui. Por fim discorreremos sobre a noção de Deus também empregada como fundamento da ética material dos valores elaborada por Max Scheler.
2.1.4 Descrição scheleriana de Deus
Max Scheler (1980, p. 34) 16 afirma que nas “investigações acerca do divino constitui-se uma opinião única de todos os grandes teólogos que é uma relação emocional com Deus “o amor a Deus”, é sentir sua presença como “summum bonum” (ou sumo bem)”. O filósofo é desta mesma tendência, quando o mesmo afirma que (1961, p. 84) 17 “[...] o ato de amor é, em toda a hierarquia de valores o veículo autêntico para o avanço no mundo de valores [...] no santo, o amor de Deus se torna criativo para o dado conteúdo contemplativo [...] penetrando mais profundamente na essência da divindade [...]”. Max Scheler segue relatando que o homem ao querer elevar-se a participar daquilo que é essencial procura seguir um centro concreto de atos que tem como meta uma união imediata entre seu “ser” e o “Ser” daquele que é essencial.
Para Max Scheler a finalidade do homem é chegar a este correlato central de atos de toda essencialidade possível. E define que o centro dos atos tem que essencializar-se e eternizar-se a si mesmo. E a própria essência do indivíduo tem que se transformar a exemplo da personalidade daquele que é essencial e, consequentemente, a ideia de um centro “infinito” pessoal de atos, que envolve toda classe e categoria possível de essências, com uma determinação fundamental se identifica com a ideia de Deus, que é o centro (ou exemplo) universal de atos que com sua força é o impulso objetivo de ser de todas as coisas, cujo na perspectiva scheleriana também é o que conduz para uma atitude filosófica.
Este modelo infinito de atos está intimamente relacionada com a conduta ética e moral do homem. Sobre isto podemos afirmar que o exemplo é o vínculo que influencia a pessoa em sua conduta, e a moral não se origina da obrigação de obedecer a regras, mas de corresponder ao apelo que os valores fazem. O filósofo vai dizer que toda atividade espiritual superior está inserida no grupo de valores designado em sua “Ética” 18. Como “valores espirituais” eles estão inseridos na esfera da atividade científica, filosófica, estética, artística, religiosa e moral. Em todos estes exercícios existe um mundo circundante de valores que engloba todos os sujeitos singulares e coletivos (povos, raças e culturas) e todos os graus de organização da vida. São o ponto de partida comum do homem, e o possibilita atingir qualquer âmbito axiológico da essência dos valores supravitais que constituem a conduta objetiva (SCHELER, 1980).
Ainda de acordo com Max Scheler (1980) é a atuação conjunta e ordenada dos atos morais do homem, e somente eles, que conduzem a pessoa espiritual como sujeito de possível participação por intermédio do conhecer. Além da esfera do mundo circundante e fora de toda possível relatividade do ser, e da esfera mundana que o rodeia que o homem é capaz de ir em direção do “ser absoluto”. Assim dirá o autor (1980, p. 45):
O amor ao valor “ao ser absoluto” rompe a fonte, existente no homem, da relatividade do ser de todo o mundo circundante. É a humilhação que quebra o orgulho natural e constitui a suposta moral de despojamento simultâneo e necessário para o conhecimento filosófico [grifo nosso].
Max Scheler (1960) 19 em sua obra “Metafísica da Liberdade” continua elencando algumas ideias expressas sobre Deus e em relação à conduta humana. O mesmo segue dizendo: “As ações de um homem não podem jamais ser mais livre que ele mesmo” 20. Isto nos dá a entender que a liberdade da pessoa consiste em escolher os valores mais elevados, que o conduzam a uma verdadeira liberdade moral em relação ao exemplo de Deus como modelo perfeito de atos.
O filósofo ainda relata que “a pessoa em concreto é muito mais livre quanto mais é determinada por Deus como Pessoa das pessoas” 21. Isto é, Deus é o exemplo perfeito de conduta moral e de pessoa ao assumir a condição humana em seu Filho Jesus Cristo, e evidentemente, segundo Max Scheler (1961) 22 “[...] há uma comunicação divina da substância de Deus (Cristo) [...]”; e enfatiza esta afirmação nos relatos de sua conduta, segundo o qual, Cristo é um mestre por excelência. De acordo com Canto-Sperber (2013) os exemplos importantes de modelos empíricos de personalidade moral imprescindível são os mestres de uma cultura ou santos. Jesus Cristo é o Santo e o Mestre por natureza. Sobre isto afirma Wojtyla (1993, p. 30) que “Tal gênio religioso-ético – e o maior gênio “do coração” – é, segundo Scheler, precisamente Jesus Cristo [...]”. Ao criar os dez mandamentos, Deus institui toda uma conduta moral, Deus segue a lógica do amor. Um exemplo é o primeiro e maior dos mandamentos e que resume toda a sua lei que é “Amar a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a si mesmo”. Max Scheler por ser cristão Católico é intensamente influenciado e segue esta mesma coerência. Padovani e Castagnola, afirmam que segundo o autor:
Na escala dos valores o lugar mais importante é ocupado pelos valores morais e religiosos, encontrando-se no vértice dessa hierarquia o sagrado, o divino [...] e reconhece o Deus do catolicismo como valor supremo, escreveu [...] sobre o amor cristão, que ele chama o verdadeiro amor (1964, p. 427).
No entanto Wojtyla (1993, p.142) fundamenta que “a experiência religiosa e a experiência ética aparecem no sistema de Scheler como dois sistemas separados”. Como já fora ressaltado, o topo da hierarquia axiológica é assumido pelos valores morais e religiosos, o parâmetro que está em destaque o sagrado e o divino, e o reconhecimento de Deus como valor supremo. Ainda sobre isto faz Wojtyla (1993, p.142) uma distinção, dizendo: “Na experiência religiosa se manifesta o valor do divino ou o valor do sagrado, enquanto na experiência ética [...] reduz-se ao momento da percepção afetiva intencional dos valores éticos [...]”.
Max Scheler (1960) vai expor que todos os valores positivos estão localizados na ideia de Deus, em emoção e vivência. Mas nem mesmo com todas estas premissas que foram neste tópico apresentadas “[...] não podemos captar de nenhum modo o valor religioso do ato ético, porque elas não nos permitem descobrir o valor religioso dentro da experiência ética” (Wojtyla, 1993, p. 142). Max Scheler vai ressaltar que o ser seja ele quem for e que procure ir além de si mesmo e procure buscar a Deus, seja qual for sua aparência é um “homem”, e evidencia que Deus não é senão a essência do homem, contudo, de forma infinita. O homem é em si o único acesso a Deus e, por isso, uma aposta ativa e pessoal do homem em relação a Deus é o devir de sua autorrealização. Aqui compreendemos mais uma vez Deus como valor supremo e o homem como este único acesso a este êxito de sua autorrealização.
Segundo Max Scheler durante a história nem a ética, regras ou normas de conduta moral foram capazes de melhorar a condição moral geral da humanidade. Ainda de acordo com o autor, nada tem o efeito maior de melhoramento de uma pessoa de maneira direta instantânea e indispensável, do que a intuição manifesta de uma pessoa boa em sua amabilidade. O fato de tornar-se bom e melhorar moralmente têm sua gênese no exemplo moral que uma pessoa, um “mestre”, um “líder” pode dar a outras pessoas (CANTO-SPERBER, 2013, p. 930). Tal exemplo de mestre e líder por excelência para Max Scheler é Jesus Cristo.
Ademais é importante salientar que neste capítulo destacamos a intenção principal de nosso filósofo que nasce da experiência fenomenológica: a fundamentação da ética em uma teoria dos valores. Depreendemos que esta apreensão é possível através de um intuicionismo emocional, que se realiza antes do ato cognoscitivo do intelecto. O ato intuitivo emocional é o que apresenta as essências ao mesmo. A origem da fundamentação da ética em uma teoria dos valores parte da rejeição de criticar o formalismo na ética e o a priori formal kantiano. M. Scheler realiza a elaboração de um objetivismo ético. Diante disso toda a análise de ação do sujeito muda de sentido, porque passa a ser observada a partir da mediação dos valores e não de normas que norteiam a partir da razão a conduta do sujeito, isto é, toda ação da pessoa procede dos valores captados pela intuição sentimental.
Em seguida destacamos a relação entre valor e dever, e a questão de que todos os valores procedem de valores positivo e negativo (Cf. 2.1.2 fundamentos axiomáticos). Seguimos elencando os fundamentos da ética axiológica e seus respectivos aspectos e diferenças. Em primeiro lugar discorremos sobre a distinção entre ética e moral na concepção M. Scheler. Compreendemos que a ética é a enunciação precisa que se segue a partir das normas que exemplificam o que está presente no âmbito da ciência moral. Por este motivo também se faz necessário que toda ética tenha que se organizar segundo os fenômenos apresentados pela moral que são constituídos pelos valores, pois a conduta moral é fruto da intuição moral, e o conhecimento moral tem em si relações a priori. Em segundo lugar abordamos o fundamento axiomático (Cf. tópico 2.1.2).
Em terceiro lugar foi descrita a noção de ethos que está intimamente ligada com a questão da historicidade e da variação cultural em que emerge. Podendo assim influenciar as normas éticas a partir das variações acerca dos fundamentos morais que são resultados das “interferências sofridas na captação emocional dos valores”, isto é, o ethos que sofre mutações em diversas épocas, povos e culturas. Por fim, observamos a descrição scheleriana de Deus que, na compreensão de Scheler, é um correlato central de atos que é a finalidade pela qual o homem tem que alcançar para configurar a sua personalidade ao impulso de ser objetivo de todas as coisas. Portanto, nesta ótica, Deus é o exemplo perfeito de conduta moral e de pessoa.
Ante ostensiva análise, entre leituras e interpretação, chega ao seu cume a presente proposta de trazer a reflexão sobre os fundamentos da moral segundo a teoria dos valores de Max Scheler, em busca de uma fundamentação ética que não esteja sujeita ao relativismo moral (ou politeísmo axiológico) que permeia a sociedade. Através desse estudo, constatamos que foi possível a partir do pensamento de Max Scheler descobrir, ou melhor, trazer à tona a sua grande atualidade e contribuição para o campo científico.
Neste sentido nos empenhamos sobre as reflexões de nosso filósofo que, sobretudo, está comprometido com o problema do homem em sua essência, o que o envolve numa realidade metafísica e fenomenológica. Todas as ações propostas neste presente trabalho se resumem em trazer o homem à reflexão da responsabilidade diante de si mesmo e do meio em que está inserido, isto é, diante de sua consciência que o provoca à vivência e realização de valores absolutos.
Ao observarmos as dificuldades das sociedades democráticas liberais de reconhecer os autênticos valores dentro da sociedade, ou seja, na democracia se relativiza quase tudo. Diante disso verificamos que o relativismo moral instaurou grandes problemas que são indícios de uma má compreensão dos valores, isto é, do valor dos valores. No entanto a capacidade de acessar os valores o ato genuíno de transcender é universal a cada pessoa, é a descoberta da interioração à aderência às ordens do coração que superam a razão lógica do mundo e dos fatores do relativismo moral.
Penso que uma das melhores contribuições de M. Scheler com relação à nossa sociedade pluralista e que vivência um utilitarismo relativista, é a de nortear a sociedade oferecendo princípios universais, como podem ser o reconhecimento dos valores superiores. Que consequentemente quebram toda tendência e atitude de quem vive exclusivamente para si, fechado em um egocentrismo em uma visão da vida puramente oportunista e individualista que reduz tudo ao próprio interesse, prazer e comodismo, pois o significado de viver está em doar-se por algo que vale a pena e os valores nos provocam a isso.
Portanto faz-se necessário uma verdade objetiva e definida em que se encontre um sentido pleno e total, pelo qual vale a pena viver, uma ideia clara da vida de si e dos outros. Isso tudo não se obtém simplesmente recorrendo a moral, é necessário indicar os fundamentos dela, indicando porque é mais digno ao homem e a sociedade através de sua consciência e intuição emocional, viverem de certa maneira e não de outra. Sem a extensão desses critérios até a religião fica em grau relativo.
A fé e a religião são uma fonte de certezas morais e também um aspecto importante para uma sociedade verdadeiramente democrática e livre, porém o relativismo rejeita os valores verdadeiros e absolutos. Portanto encontrar valores superiores e universais evitaria a relativização da busca pela verdade e da própria vida. Nosso filósofo entende que a moral não se origina da obrigação de obedecer a regras, mas de corresponder ao apelo que os valores fazem a consciência humana. Os valores, segundo Max Scheler, são importantes porque representam o conteúdo da perfeição moral. Não é o dever que estabelece o conceito fundamental da ética, e sim o valor.
As interrogações sobre o sentido da vida em nossos dias é uma grande provocação de inquietude e sofrimento principalmente entre os jovens. Existe uma crise humana e existencial que atravessa a história da humanidade o homem em busca de sentido. Desta preocupação peculiar inerente a condição humana brota uma possibilidade nova de compreensão do Cristo como modelo de força vital. Visto que o topo da hierarquia axiológica é assumido pelos valores morais e religiosos que na concepção de nosso filósofo estão em interdependência entre si, nesta ordem destaca-se o sagrado e o divino, e o reconhecimento de Deus como valor supremo.
Afirma M. Scheler que as ações de um homem não podem jamais ser mais livres que ele mesmo. Isto nos dá a entender que a liberdade da pessoa consiste em escolher os valores mais elevados, que o conduzam a uma verdadeira liberdade moral em relação ao exemplo de Deus como modelo perfeito de atos. O filósofo ainda relata que a pessoa em concreto é muito mais livre quanto mais é determinada por Deus como Pessoa das pessoas. Isto é, Deus é o exemplo perfeito de conduta moral e de pessoa ao assumir a condição humana em seu Filho Jesus Cristo. O aperfeiçoamento moral em suas raízes consiste no exemplo moral que uma pessoa pode dar a outras pessoas.
Por fim, diante de todo o percurso que fizemos chegamos à conclusão, de que é possível sim uma fundamentação ética que não esteja sujeita ao relativismo moral (ou politeísmo axiológico) que permeia a sociedade. Está possibilidade surge da fundamentação da ética em uma teoria dos valores, que demonstra que o homem através da intuição imediata dos valores que apelam a sua consciência é capaz de realizar valores absolutos e positivos que fogem do impasse do relativismo, por está via também é possível ao homem chegar a sua autorrealização que está ligada ao ato de amor a Deus. Em toda a hierarquia de valores o veículo autêntico para o avanço no mundo de valores é o ato de amor o sentir a presença de Deus reconhecer o Sumo Bem. Depois disso o homem pode contemplar que suas ações se tornam repletas de sentido, o homem descobre o sentido da vida quando descobre o valor dos valores ao fazer a experiência fenomenológica de Deus.
Tradução nossa do original em espanhol: Hay, en primer lugar, el principio de que todo deber ha de fundarse en valores, es decir, solamente los valores deben ser y deben no ser; así como los principios que dicen que los valores positivos deben ser y los negativos no deben ser. Hay, en segundo lugar, las conexiones de esencias que valen a priori para la relación del ser y del deber ser ideal y que regulan sus relaciones respecto al ser justo y ser injusto.