Resumo: A Metametafísica é o estudo sobre os fundamentos e a metodologia da Metafísica. Analisaremos neste artigo três metodologias que marcaram as origens da Metametafísica na Tradição Analítica: a de Alexius Meinong, Rudolf Carnap e Willard van Orman Quine. De acordo com Meinong, há uma distinção entre ‘existir’ e ‘haver’ e, para preservar a intuição de que todo ato intencional é direcionado a um objeto, há coisas que não existem. Segundo Carnap, as perguntas em Metafísica podem ser facilmente respondidas por meios empíricos ou inferenciais, desde que adotemos um sistema de referência linguístico (framework) e respondamos às questões internamente a esse framework. Já Quine argumentou que tomar uma entidade com sendo existente é tomá-la como o valor de uma variável ligada. A Metametafísica é relevante porque desambigua o nosso vocabulário e evita que os filósofos e filósofas se envolvam em meras disputas verbais. O nosso objetivo neste artigo não foi explicitar a nossa predileção por alguma dessas metodologias, mas fornecer um ponto de partida para os que não estão familiarizados com essas discussões — de modo que outros pesquisadores e pesquisadoras se engajem com as questões pertencentes à Metametafísica.
Palavras-chave:MetametafísicaMetametafísica,Metodologia da MetafísicaMetodologia da Metafísica,MeinongMeinong,CarnapCarnap,QuineQuine.
Abstract: Metametaphysics is the study regarding the foundations and the methodology of Metaphysics. We’ll analyze in this paper three methodologies that established the origins of Metametaphysics in the Analytic Tradition: that of Alexius Meinong, Rudolf Carnap and Willard van Orman Quine. According to Meinong, there is a distinction between ‘to exist’ and ‘there is’ and, in order to preserve the intuition that every intentional act is directed towards an object, there are things that do not exist. According to Carnap, the questions in Metaphysics can be easily answered by empirical or inferential means once we adopt a linguistic framework and answer these questions internally to this framework. Quine argued that to take an entity as existing is to take it as the value of a bound variable. Metametaphysics is relevant because it disambiguates our vocabulary and makes the philosophers avoid verbal disputes. Our objective in this paper was not to show our preferences to one of these methodologies but to provide a starting point for those who are not familiar with these matters — just so other researchers may engage with the issues that belong to Metametaphysics.
Keywords: Metametaphysics, Methodology of Metaphysics, Meinong, Carnap, Quine.
Artigos
O que é ‘metametafisica’? Uma análise das metodologias de Meinong, Carnap e Quine
What is ‘metametaphysics’? An analysis of Meinong’s, Carnap’s and Quine’s methodologies
Recepção: 19 Abril 2021
Aprovação: 21 Maio 2021
Podemos definir a Metafísica como a área da Filosofia que analisa a natureza da realidade, o que envolve questões como ‘todo evento possui uma causa?’, ‘qual é a natureza da possibilidade e da necessidade?’, ‘quando várias partes compõem uma coisa maior?’, ‘o passado e o futuro existem?’, dentre outras (Cf. MANLEY, 2009; BERTO & PLEBANI, 2011; TAHKO, 2016). Essa é, inclusive, a razão pela qual Amie Thomasson começa a sua investigação sobre a natureza dos objetos ficcionais perguntando não se objetos ficcionais existem, mas “se postulássemos objetos ficcionais, o que eles seriam?” (THOMASSON, 1999, p. 5, tradução nossa): uma tarefa própria da Metafísica. A proposta de Thomasson não demarca apenas o métier da Metafísica, mas também a sua distinção com uma área próxima, que é a Ontologia — a investigação sobre o que existe. Nessa perspectiva, podemos afirmar que a Ontologia trata da pergunta “x existe?”, enquanto a Metafísica pergunta “como é x?”.
No entanto, o presente artigo não é propriamente sobre a natureza da Metafísica, mas sobre a metodologia que é mais apropriada para a condução de uma investigação nessa área: ou seja, sobre Metametafísica. Dada a escassez de trabalhos em língua portuguesa sobre essa nova disciplina filosófica — que tem insurgido debates efervescentes no cenário anglofônico desde a publicação da coletânea Metametaphysics: New Essays on the Foundations of Ontology, editada por David Chalmers, David Manley e Ryan Wasserman em 2009 —, consideramos oportuno analisar as raízes dessa disciplina na tradição analítica a partir das contribuições de Alexius Meinong (seção 2), Rudolf Carnap (seção 3) e Willard van Orman Quine (seção 4). Não explicitaremos a nossa predileção por alguma dessas metodologias, mas apenas mostraremos no que elas consistem e quais são os seus atrativos e seus problemas.
Mas o que é propriamente a Metametafísica? Tuomas Tahko assim estabelece: “Metametafísica =df O estudo sobre os fundamentos e a metodologia da metafísica.” (TAHKO, 2016, p. 5, tradução nossa). Essa delimitação é importante porque assim estaremos em uma posição adequada para estabelecer com um maior grau de precisão quais são os instrumentos teóricos que devemos usar para tratar de um problema metafísico. Podemos então perguntar “o que queremos dizer quando dizemos que x existe?”, “o quantificador existencial (‘∃x’) capta apropriadamente a noção de existência?”, “há alguma distinção entre os verbos ‘ser’, ‘existir’ e ‘haver’?”, “as perguntas metafísicas podem ser respondidas por métodos empíricos ou lógicos?”, etc., antes mesmo de perguntar se algum x existe ou como é x — o que por vezes podem se tornar questões de Metaontologia, apesar de esse termo não ser sinônimo de ‘Metametafísica’3.
Não obstante, como se tornará evidente, defendemos que as três contribuições mais valiosas das investigações em Metametafísica são uma maior clareza sobre a natureza da atividade filosófica, o estabelecimento de um terreno comum para que os filósofos e as filósofas possam discutir e, consequentemente, o impedimento de que os debates filosóficos se restrinjam a meras disputas verbais — uma vez que os debatedores não aplicariam sentidos distintos para os mesmos termos, nem tratariam de uma mesma questão a partir de contextos incompatíveis. Analisemos no que consistem as propostas de Meinong, Carnap e Quine.
Alexius Meinong foi um dos mais destacados pupilos de Franz Brentano e o responsável pelo desenvolvimento da Teoria dos Objetos, apresentada nas obras Sobre as Suposições (Über Annahmen) e Sobre a Teoria dos Objetos (Über Gegenstandstheorie). De acordo com Meinong, a metafísica tradicional possui um pré-juízo em favor do efetivo4, isso é, essa disciplina colocava sob seu escrutínio apenas os objetos existentes e atuais. Em certa medida, a metafísica trataria somente do modo de existência dos objetos materiais, que são aqueles que ocupam um lugar no espaço e no tempo e que conseguem estabelecer relações causais com outros objetos. Contudo, diferentemente das pretensões dos metafísicos, essa não poderia ser considerada uma ciência maximamente universal, na medida em que os objetos efetivos não esgotariam o repertório de objetos sobre os quais pensamos ou representamos, isso é, dos objetos aos quais um ato intencional pode ser direcionado e sobre os quais podemos dizer coisas verdadeiras ou falsas. Nesse sentido, Meinong afirma:
A Metafísica lida, sem dúvida, com a totalidade do que existe. Mas, a totalidade do que existe, incluindo aí o que existiu e o que existirá, é infinitamente pequena em relação a totalidade dos objetos de conhecimento; e que se tenha negligenciado isto tão facilmente tem, bem entendido, o seu fundamento no fato que o interesse vivo pelo efetivo, que está em nossa natureza, favorece esse excesso que consiste em tratar o não-efetivo como um simples nada, mais precisamente, a tratá-lo como algo que não oferece ao conhecimento nenhum ponto de apreensão ou nenhum que seja digno de interesse. (MEINONG, 2015, p. 96).
Apesar de Meinong ter se retido à análise dos objetos matemáticos5, como os números, as equações, as somatórias, etc., uma vez que a relevância da matemática é inquestionável para a condução das pesquisas científicas, a sua teoria dos objetos foi posteriormente expandida para englobar objetos possíveis, impossíveis, completos, incompletos, passados, futuros, além dos objetos mitológicos e ficcionais (Cf. PARSONS, 1980; ZALTA, 1983; PRIEST, 2005; BERTO, 2011).
O objetivo de Meinong, portanto, era desenvolver uma ciência que apreendesse a “totalidade do mundo em sua essência e fundamentos últimos” (MEINONG, 2005, p. 96). Desse modo, uma ciência dos objetos do conhecimento ou uma metafísica dos objetos existentes (que Meinong chama de ‘efetivos’) seriam insuficientes, pois, em termos intencionais, todo pensamento é direcionado a um objeto e, em termos linguísticos, toda frase denotativa refere a um objeto que satisfaz a descrição (PARSONS, 1980, p. 30). Isso mostra que “a Metafísica não teve sempre, e de longe, a visada suficientemente universal para ser uma ciência do objeto” (MEINONG, 2005, p. 96) e, consequentemente, o projeto filosófico de Meinong consiste em “saber qual é de fato o lugar, de qualquer maneira legítimo, do tratamento rigoroso do objeto enquanto tal e em sua generalidade” (MEINONG, 2005, p. 94).
Mas quais mudanças em nosso instrumental conceitual são necessárias para que os objetos ideais (ou seja, não-existentes) possam ser analisados pela Filosofia? O primeiro passo seria perfazer uma separação lógica e semântica entre ‘existência’ e ‘subsistência’. Nessa acepção, a existência (Existenz), que é compreendida por Meinong como um predicado (real) de objetos6, aplica-se exclusivamente aos objetos materiais como, por exemplo, mesas, montanhas e seres orgânicos. Por outro lado, a subsistência (Bestand) se aplica aos objetos ideais que, apesar de não existirem, realmente possuem as propriedades com as quais estão relacionados como, por exemplo, números, montanhas de ouro e círculos quadrados. Diferentemente do que se pode imaginar, a subsistência não é um tipo de existência mais atenuada ou branda. Os objetos ideais têm apenas subsistência (bestehen), mas nenhuma forma de existência (existierien), por não serem elementos de uma efetividade (Wirklichkeit).
Meinong argumenta que essa diferença entre existência e subsistência é marcada por uma distinção mais fundamental, que é aquela entre o seu Ser/Sein (o estatuto existencial da entidade) e o Ser-tal/Sosein (as propriedades que uma entidade possui) (Cf. MEINONG, 2005, p. 99; BERTO & PLEBANI, 2015, p. 100; TAHKO, 2016, p. 20). Qualquer objeto, seja ele existente ou inexistente, pode ter precisamente as propriedades que lhes são predicadas, ou seja, “o ser-tal de um objeto não sofre nenhum interdito pelo não-ser (Nichtsein) deste objeto” (MEINONG, 2005, p. 100). Por exemplo, “as figuras de que trata a geometria não têm existência, como nós sabemos; e, no entanto, suas propriedades, logo, seu ser-tal, podem ser indubitavelmente constatadas” (MEINONG, 2005, p. 100), como é o caso de um quadrado perfeito, que possui a propriedade de ser quadrangular; enquanto o círculo quaprincipio de comdrado, apesar de ser um objeto impossível, possui as propriedades de ser circular e quadrangular ao mesmo tempo. Portanto, “O insight básico por detrás da teoria dos objetos de Meinong é que todo pensamento possui um objeto — independentemente da existência desse objeto” (PARSONS, 1980, p. 30, tradução nossa).
A independência do Sosein em relação ao Sein leva Meinong a se comprometer com o Princípio de Compreensão. Esse princípio consiste na tese de que para cada objeto há, de modo correlacionado, um conjunto de propriedades não-vazio que apenas esse objeto possui (PARSONS, 1980, p. 17). Por exemplo, o Cristo Redentor possui o seguinte conjunto de propriedades: {ser uma estátua, ser art decó, estar localizado no topo do morro do Corcovado, estar a 709 metros acima do nível do mar, ser reconhecido pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade, ...}. Não obstante, o procedimento também ocorre reversamente: para cada conjunto de propriedades que possamos conceber, há um e somente um objeto correlacionado (PARSONS, 1980, p. 17). Por exemplo, a concebilidade do conjunto de propriedades {ser montanha, ser de ouro, ...} está correlacionado ao objeto montanha de ouro, e o conjunto {ser circular, ser quadrangular, ...} está correlacionado ao círculo quadrado, o que signica que “não apenas a célebre montanha dourada é de ouro como o círculo quadrado certamente é tanto quadrado quanto é redondo” (MEINONG, 2005, p. 100).
É, dessa forma, a partir do Princípio de Compreensão, que a metodologia de Meinong pode ser usada para abarcar a totalidade dos objetos, sejam eles existentes ou não (PARSONS, 1980, p. 18). Podemos então entender o seu famoso corolário “quem gosta de paradoxos pode muito bem dizer: há (es gibt) objetos a propósito dos quais se pode afirmar (von denen gilt) que não há tais objetos” (MEINONG, 2005, p. 101) que, apesar de parecer uma contradição em termos, uma vez que se afirma que há e não há um mesmo objeto, pode ser melhor analisada quando separamos os verbos ‘existir’ e ‘haver’ e afirmamos, ao invés disso, que há objetos que não existem.
Temos diversos ganhos conceituais a partir da perspectiva Meinonguiana. Nesse caso, o que é considerado o maior dos ganhos, a constatação de que objetos inexistentes realmente possuem as propriedades que lhes são atribuídas evita um problema em Filosofia da Linguagem que é conhecido como o problema dos nomes vazios — a saber, como sentenças que contêm nomes próprios que não referem a algum objeto existente (portanto, nomes vazios) podem ser significativas e valoradas como verdadeiras ou falsas. Nesse sentido, Parsons (1980, p. 37) apresenta as duas sentenças abaixo:
(1) Pegasus é um cavalo alado da mitologia grega.
(2) Zeus é um cavalo alado da mitologia grega.
As duas sentenças acima são significativas. Na primeira entendemos que há um cavalo alado que se chama Pegasus, enquanto na segunda que há um cavalo alado que se chama Zeus, e que ambos pertencem ao universo da mitologia grega. No entanto, não costumamos tratar ambas as sentenças como sendo verdadeiras. Ao analisarmos a mitologia grega, chegamos à conclusão que Pegasus realmente é um cavalo alado, o que torna a sentença (1) verdadeira, enquanto Zeus é uma divindade com características humanas, ao invés de equinas, o que torna a sentença (2) falsa. Essa é uma valoração que a teoria Meinonguiana consegue preservar, na medida em que há tais objetos como Pegasus e Zeus, sendo o primeiro um cavalo alado e o segundo não, mesmo que esses objetos não existam.
Esse cenário não é preservado pela teoria de Bertrand Russell, o principal interlocutor de Meinong à época. Segundo Russell, sentenças que possuem nomes vazios são sempre falsas, pois ao parafrasearmos a sentença (1) em “existe um x tal que x é um cavalo alado e está presente na mitologia grega”, chegaremos à conclusão de que a paráfrase (que por sua vez expressa a forma lógica da linguagem ordinária) é falsa, afinal, tal x não existe. Não obstante, a partir da perspectiva Russelliana, não temos como preservar a intuição de que a sentença (1) é verdadeira e (2) é falsa, pois ambas as sentenças seriam falsas. Nesse sentido, a teoria Meinonguiana soluciona um problema que tem sido enfrentado desde o diálogo O Sofista de Platão sem apelar às paráfrases, ou seja, preservando a maneira como falamos cotidianamente sobre objetos existentes e não-existentes.
Bertrand Russell, em seu artigo seminal Da Denotação (1905), consagrou-se vitorioso parsono embate contra Meinong em função de duas objeções fulminantes direcionadas à segunda parte do Princípio de Compreensão, isso é, direcionadas à concepção Meinonguiana de que qualquer conjunto de propriedades concebível está correlacionado a um objeto.
Crítica 1: A primeira objeção diz respeito aos objetos que são inconsistentes em função de suas propriedades, como o reiterante círculo quadrado. Segundo Russell, um objeto impossível como esse é um simples contrassenso. Meinong treplica, porém, afirmando que não há uma inconsistência entre as propriedades ‘ser circular’ e ‘ser quadrangular’, uma vez que não há na definição de cada uma dessas propriedades uma exclusão da outra. Mesmo que Meinong esteja correto nesse ponto — apesar de sua tréplica ser controversa —, a crítica de Russell pode ser redirecionada para outras propriedades que porventura sejam atribuídas a um único objeto, como ‘ser dourado’ e ‘não ser dourado’ que, por serem a afirmação e a negação de uma mesma propriedade, geram necessariamente um objeto inconsistente.
Crítica 2: A segunda objeção de Russell se orienta à concepção Meinonguiana de que a existência é uma propriedade de objetos, ao invés de ser um predicado de segunda ordem (de conceitos ou proposições). Concebamos, por exemplo, um conjunto de propriedades como {ser de ouro, ser uma montanha, ser existente, ...}, que está correlacionado a uma montanha de ouro existente. Entretanto, o objeto em questão não existe, posto que não se localiza no espaço e no tempo e, consequentemente, não interage causalmente com outros objetos. Como, dessa maneira, uma montanha de ouro existente pode não existir? Meinong preserva essa consequência indesejada ao afirmar que essa montanha de ouro é existente, apesar de não existir, sendo que a característica de ser existente está relacionada ao ser-tal do objeto, enquanto a propriedade de existir está relacionada ao ser do objeto (PARSONS, 1980, p. 42). No entanto, como Terence Parsons reconhece, essa resposta é arbitrária e insatisfatória: “Russell argumentou de modo muito efetivo contra Meinong. Mas Meinong não forneceu uma resposta persuasiva (PARSONS, 1980, p. 4).
Parsons, embora crítico da resposta de Meinong a Russell, preservou o espírito do argumento Meinonguiano e o tornou mais refinado. Assim, ao invés de falarmos de existência como sendo relacionada ao ser ou ao ser-tal, Parsons separa dois tipos de predicados, que podem ser nucleares ou extranucleares:
Predicados nucleares
‘é azul’, ‘é alto’, ‘chutou Sócrates’, ‘foi chutado por Sócrates’,
‘chutou alguém’, ‘é dourado’, ‘é uma montanha’.
Predicados extranucleares
Ontológico: ‘existe’, ‘é mitológico’, ‘é ficcional’,
Modal: ‘é possível’, ‘é impossível’,
Intencional: ‘é pensado por Meinong’, ‘é venerado por alguém’,
Técnico: ‘é completo’ (PARSONS, 1980, p. 23, tradução nossa).
Os predicados nucleares são predicados de indivíduos, enquanto os predicados extranucleares são predicados de segunda ordem. Além disso, a identidade de um objeto, de acordo com Parsons, é estabelecida pelas propriedades nucleares, ou seja: “Se x e y têm exatamente as mesmas propriedades nucleares, então x = y” (PARSONS, 1980, p. 28). Isto posto, notamos que o conjunto de propriedades {ser de ouro, ser uma montanha, ser existente, ...} não está correlacionado a um objeto, uma vez que ‘existir’ é um predicado ontológico que é apenas atribuído aos objetos que ocupam um lugar no espaço e no tempo — o que não é o caso dessa montanha de ouro.
Paralelamente, Edward Zalta articulou outra alternativa ao problema de Meinong. Ao invés de estabelecer, como Parsons, que há dois tipos de predicados, Zalta argumentou que há dois tipos de predicação: exemplificação (exemplifying) e codificação (encoding). A exemplificação é o tipo de predicação a partir do qual os objetos materiais, isso é, existentes, instanciam as suas propriedades. Por exemplo, o Cristo Redentor exemplifica a propriedade de ser uma estátua.
Por outro lado, “x é abstrato se e somente se x não exemplificar a propriedade de existência” (ZALTA, 1983, p. 12, tradução nossa), sendo esse o axioma que leva Zalta a equacionar os objetos abstratos com os objetos não-existentes. Os objetos abstratos, então, possuem outra maneira de instanciar as suas propriedades, uma vez que “objetos não-existentes não possuem ou exemplificam suas propriedades da mesma maneira como os objetos efetivos o fazem” (ZALTA, 1980, p. 298, tradução nossa). Os objetos abstratos podem tanto codificar quanto exemplificar algumas de suas propriedades. Nesse caso, um objeto abstrato codifica uma propriedade se ela for necessária para que possamos referir a esse objeto se, ao mesmo tempo, esse não for o tipo de propriedade que um objeto abstrato possa exemplificar (Cf. ZALTA, 2004). Por exemplo, a montanha de ouro codifica as propriedades ‘ser uma montanha’ e ‘ser de ouro’ enquanto exemplifica a propriedade ‘ser inexistente’. Portanto, assim como Parsons, Zalta fornece um modo a partir do qual podemos falar dos objetos não-existentes e, após uma qualificação do tipo de propriedade ou do modo de predicação em questão, preservar a intuição de que esses objetos inexistentes possuem ou codificam as propriedades que lhes são predicadas.
Crítica 3: Apesar das perspectivas de Parsons e Zalta terem um alto poder explicativo e, em certa medida, serem imunes às críticas de Russell, notamos que elas explicam as próprias teorias, ao invés do fenômeno a ser analisado. Em outras palavras, como argumenta Lemos (2020), a teoria de Parsons é ad hoc, enquanto a teoria de Zalta, por ser estruturada a partir de axiomas, é um sistema fechado que não corresponde ao mundo empírico. Afinal de contas, em termos linguísticos, o que demonstra que fazemos dois modos de predicação ou que atribuímos dois tipos de predicados aos objetos abstratos? Mesmo Parsons reconhece que a sua distinção entre propriedades nucleares e extranucleares é arbitrária, uma vez que se ancora em um consenso a respeito das propriedades que podemos considerar nucleares ou não, chegando a afirmar que “claro, esse ‘procedimento de decisão’ é bastante imperfeito” (PARSONS, 1980, p. 24, tradução nossa).
O Meinonguianismo tem sido revitalizado no debate contemporâneo e, além de Parsons e Zalta, autores como Graham Priest e Francesco Berto, por exemplo, têm recuperado a metametafísica (ou a Teoria dos Objetos) Meinonguiana, e buscado preservar a intuição central de que há objetos que não existem, e que esses objetos possuem as propriedades que lhes são predicadas — preservando assim a maneira como falamos sobre objetos possíveis, ficcionais, mitológicos, dentre outros.
Rudolf Carnap, um dos principais representantes do Positivismo Lógico do Círculo de Viena, buscou conciliar em seu artigo Empirismo, Semântica e Ontologia (1980) a atividade científica com a postulação de entidades abstratas — como propriedades, classes, relações, números e proposições. Seguindo a tradição empirista humeana, em que tudo que não estiver fundamentado na experiência sensível pode ser atirado às chamas “pois não pode conter senão sofismas e ilusão” (HUME, 2003, p. 222), Carnap se encontrou com o seguinte dilema: dado que, de um lado, os empiristas reconhecem que a experiência é a base para a construção do conhecimento científico e, de outro lado, os objetos abstratos não podem ser experienciados sensivelmente — sendo essa a razão pela qual tendem a adotar uma posição nominalista em metafísica — deveríamos descartá-los de nossa ontologia7? No entanto, se descartarmos os objetos abstratos, como faremos sentido da matemática, na medida em que números, por exemplo, são essenciais para essa atividade? E, se os postularmos, o platonismo seria inevitável?
Segundo Matti Eklund, um dos objetivos de Carnap, ao apresentar a sua concepção sobre ontologia, “é defender que podemos fazer referência, além de quantificar, entidades abstratas tanto na semântica como na matemática, apesar da crítica empirista” (EKLUND, 2011, p. 3, tradução nossa). Em outras palavras, Carnap forneceu um esquema conceitual de acordo com o qual podemos ter um espírito científico, postular entidades abstratas e, ao mesmo tempo, não incorrer em uma perspectiva platônica, desde que adotemos um posicionamento deflacionista em metafísica (Cf. CARNAP, 1980, p. 120).
Mas que tipo de deflacionismo está em questão? Diferentemente de Meinong e, como veremos adiante, também em contraste com Quine, Carnap defende que as disputas metafísicas e ontológicas podem ser respondidas de modo trivial. Ao invés de tratarmos das atribuições de existência de uma entidade em uma acepção séria ou robusta — como a pergunta do metafísico clássico: “tal entidade realmente existe?” — os problemas em ontologia podem ser respondidos ao “refletirmos apenas sobre as nossas preferências semânticas, conceituais ou linguísticas” (TAHKO, 2016, p. 72, tradução nossa); ou seja, em contraste com as descobertas científicas — que trazem novas informações sobre o funcionamento da natureza —, as descobertas em ontologia são inferências dos pressupostos linguísticos, isso é, operam estritamente no âmbito conceitual.
As nossas preferências linguísticas, nesse sentido, são determinadas pelo sistema de referência linguístico (framework) que adotamos para tratar de uma questão de existência específica, sendo que as questões são respondidas de modo interno ou externo a esse sistema de referência, como vemos na citação abaixo:
Em primeiro lugar, as questões de existência de certas entidades do novo tipo no interior do sistema de referência; chamamo-as de questões internas; e em segundo lugar, as questões concernentes à existência ou à realidade do sistema de entidade como um todo, chamadas de questões externas (CARNAP, 1980, p. 120).
Um framework, em uma acepção geral, é “qualquer sistema linguístico (ou um fragmento de linguagem) que é construído para falar sobre novos tipos de entidades” (TAHKO, 2016, p. 28, tradução nossa) ou, ainda, é algo como “um conjunto de termos em uma linguagem, em adição às regras ou ‘modos de falar’ que governam seus usos” (MANLEY, 2009, p. 7, tradução nossa). Portanto, o framework delimita a abrangência das questões e disputas ontológicas, na medida em que estabelece as regras de uso e os significados dos termos empregados. No caso do artigo Empirismo, Semântica e Ontologia, Carnap analisa os sistemas de referência dos números (pp. 122-123), das proposições (pp. 123-125), das propriedades das coisas (p. 125), dos números inteiros e dos números racionais (p. 125), dos números reais (p. 125) e, por fim, do sistema das coordenadas espaço-temporais para a física (p. 126) — que serão mencionados brevemente na medida em que forem relevantes para a nossa exposição.
Tratemos primeiramente das perguntas realizadas internamente a um sistema de referência. Uma vez que adotamos uma linguagem específica, a resposta para uma questão existencial poderá ser fornecida com facilidade, seja por métodos empíricos ou através de inferências lógicas (CARNAP, 1980, p. 120). Se adotarmos o sistema de referência dos objetos materiais, por exemplo, e quisermos saber se um objeto como o Cristo Redentor existe, basta irmos ao Rio de Janeiro e observar se tal objeto está disposto no topo do morro do Corcovado — neste caso, por se tratar de um sistema de referência factual, a resposta pode ser alcançada através de um método empírico. Por outro lado, caso queiramos saber se existem números primos maiores que 100, basta que aceitemos o sistema dos números e, nesse caso, a resposta será positiva e obtida inferencialmente — por se tratar de um sistema de referência lógico8. Não haveria, portanto, qualquer profundidade nas perguntas ontológicas, uma vez que o sistema de referência estipularia as regras de uso e a existência dessas entidades9.
Não obstante, as perguntas sobre a existência de uma entidade também podem ser realizadas externamente a um sistema de referência. Mas que sentido teria uma pergunta sobre, por exemplo, se números existem, se ela fosse realizada de modo externo a um framework, isso é, sem adotarmos um sistema de referência (como o dos números)? Afinal de contas, dado que a função do framework é a de estabelecer as regras de uso dos termos de uma linguagem, como podemos realizar uma pergunta sem adotar regras de uso específicas? A resposta de Carnap evidencia que essas questões, que são aquelas com as quais os metafísicos clássicos têm se engajado desde os primórdios da Filosofia, são na verdade pseudo-questões10. As perguntas externas não são teóricas (na medida em que não possuem um conteúdo cognitivo), mas pragmáticas, isso é, “uma questão de decisão prática concernente à estrutura de nossa linguagem” (CARNAP, 1980, p. 121); uma pergunta externa “é uma pergunta sobre qual sistema de referência é o correto” (EKLUND, 2013, p. 233, tradução nossa). Em outras palavras: uma pergunta externa traz à tona o processo de decisão sobre o melhor framework que podemos adotar para tratar de uma problemática11.
Nesse sentido, um sistema de referência linguístico adequado é aquele que tem a maior “eficiência enquanto instrumento [explicativo]” e estabelece uma “razão entre os resultados alcançados e a quantidade e complexidade dos esforços requeridos” (CARNAP, 1980, p. 134). Portanto, podemos utilizar um sistema de referência não em um sentido dogmático e irrestrito — como se devêssemos aceitar uma e somente uma teoria como a Platônica, Aristotélica ou Meinonguiana —, mas na medida em que um sistema responde de modo satisfatório a um problema específico. É como se o framework, embora conceitual, fosse uma ferramenta como um martelo ou uma chave de fenda, que são instrumentos que escolhemos de acordo com o artefato que desejamos construir. Por exemplo, usamos um martelo para fixar um prego e uma chave de fenda para prender um parafuso, sem com isso assumirmos que quem usa martelos não está legitimado a usar chaves de fenda e vice-versa. Além disso, no caso de nossas vidas cotidianas, adotamos o sistema dos objetos materiais sem estabelecermos uma discussão propriamente filosófica sobre qual sistema devemos aceitar para falar de objetos como mesas e cadeiras; de modo semelhante, adotamos acriticamente o sistema dos números para falar que existe um número específico de cadeiras (como uma, duas, três, etc) diante de nós (Cf. CARNAP, 1980, p. 122).
Essa análise mostra como a maior parte das disputas em metafísica são meramente verbais, ou seja, estabelecidas por interlocutores que adotam sistemas de referência linguísticos distintos e, em função disso, não chegam a um consenso ou dissenso definitivos porque estão adotando regras de uso diferentes para os mesmos termos. Como defende Manley, os filósofos estão apenas “apresentando diferentes propostas sobre como falar” (MANLEY, 2009, p. 16, tradução nossa), como acontece, por exemplo, na seguinte pergunta: números existem? Um platônico forneceria uma resposta afirmativa, uma vez que que os números seriam objetos abstratos imutáveis, necessários e atemporais. Todavia, um nominalista diria justamente o contrário, pois não aceitaria a existência de entidades abstratas ou universais. A posição Carnapiana seria, dessa forma, a de mostrar que ambos estão corretos, ao menos em relação aos seus respectivos frameworks. Ou, contrariamente, que o nominalista está equivocado a partir de um framework platônico, e que o platônico está enganado a partir de um framework nominalista. Essas metodologias são, portanto, não apenas distintas, mas incompatíveis, de modo que nenhuma asserção está sendo feita e nenhuma questão de verdade ou falsidade está em jogo (MANLEY, 2009, p. 16) — sendo essa uma das razões que legitimam as questões metametafísicas (TAHKO, 2016, p. 36)12.
Em síntese, as “perguntas internas são perguntas emolduradas dentro de uma dada linguagem” enquanto as “perguntas externas são simplesmente perguntas sobre qual linguagem devemos falar” (EKLUND, 2006, p. 323, tradução nossa). Essa concepção instrumentalista da teoria Carnapiana indica que a sua postura, além de não ser nominalista (por não rejeitar as entidades abstratas ou universais em uma ontologia), também não é realista13 — ao menos em sentido estrito. Afinal de contas, Carnap não está assumindo que existe um framework que corresponde perfeitamente à estrutura da natureza, e que esse seria o sistema de referência que devemos buscar. Não há, nesse sentido, um framework que nos forneça um ponto de vista privilegiado da realidade, mas apenas aqueles que tratam de um determinado problema de modo mais ou menos adequado e eficiente — ou seja, a questão não é sobre a natureza da realidade, mas sobre o grau de adequação de um sistema de referência linguístico (Cf. CHALMERS, 2009, p. 78). É por essa razão que Carnap afirma que perguntas externas como “x é real ou não?” ou “x existe ou não?” são consideradas sem sentido, pois
Seria errado descrever esta situação dizendo: ‘o fato da eficiência da linguagem das coisas é uma evidência confirmadora da realidade do mundo das coisas’; deveríamos dizer em vez disso: ‘este fato torna oportuno aceitar a linguagem das coisas’ (CARNAP, 1980, p. 122).
Assim, não podemos captar a realidade tal como ela supostamente seria — essa é uma pseudo-questão —, uma vez que ser real é ser um elemento de um sistema de referência, segundo as regras estipuladas (Cf. CARNAP, 1980, p. 121). Esse cenário conceitual levou um grupo de filósofos a considerar a postura Carnapiana uma forma de relativismo (Cf. GALOIS, 1998) ou pluralismo linguístico (Cf. EKLUND, 2011).
André Galois (1998) argumenta que a perspectiva de Carnap é relativista, na medida em que um framework seria não apenas um fragmento de linguagem, mas uma perspectiva ou um panorama (Cf. EKLUND, 2011, p. 5). Nessa acepção, uma proposição — qualquer que seja — não pode ser valorada como verdadeira ou falsa de modo irrestrito ou absoluto, mas sempre em relação ao seu respectivo framework. Por outro lado, Matti Eklund (2011) argumenta que a perspectiva de Carnap é de um pluralismo linguístico, o que quer dizer que há uma ênfase nas diversas linguagens possíveis, e que as proposições possuem sentidos e valores de verdade diferentes de acordo com o framework adotado. Nesse sentido, “o pluralista linguístico ainda enfatiza que a linguagem que usamos ocasionalmente é apenas uma dentre as linguagens possíveis” (EKLUND, 2011, p. 4, tradução nossa).
Crítica: Se a constatação de André Galois não pode ser propriamente interpretada como uma crítica à teoria de Carnap, na medida em que precisaríamos reconhecer que o relativismo seria uma posição filosófica indesejada, certamente a crítica mais fulminante endereçada à posição Carnapiana foi aquela apresentada por Quine no artigo Dois Dogmas do Empirismo (2011b). Se Quine estiver correto, a distinção entre métodos analíticos e sintéticos é arbitrária e infundada, o que consequentemente nos leva a reconhecer que as questões internas a um sistema de referência linguístico não podem ser respondidas trivialmente através de meios experimentais ou inferenciais — o que desmoronaria a elegância e simplicidade da perspectiva de Carnap. Essa é a razão pela qual, ao menos no caso da querela entre Carnap e Quine, é necessário tratar da natureza da analiticidade antes mesmo de assumir um posicionamento nas discussões em Metametafísica (Cf. SOAMES, 2009).
Portanto, em Empirismo, Semântica e Ontologia, Carnap argumentou que apesar de alguns nominalistas considerarem que as entidades abstratas são “um tipo de superstição ou mito, que popula o mundo com entidades fictícias ou pelo menos duvidosas, análogas à crença nos centauros ou demônios” (CARNAP, 1980, p.131), podemos facilmente postulá-las em uma ontologia sem com isso adotarmos uma perspectiva platônica ou anti-científica. As perguntas sobre existência são realizadas internamente a um sistema de referência — e a resposta pode ser fornecida trivialmente por métodos inferenciais ou empíricos, a depender do tipo de framework em análise. Já as perguntas externas não são teóricas, mas pragmáticas, e dizem respeito a qual sistema de referência devemos adotar para tratar de um problema. A postura Carnapiana mostra, então, uma grande tolerância em relação aos frameworks que temos à disposição e sugere que “sejamos prudentes ao fazer asserções e tenhamos uma atitude crítica ao examiná-las, mas sejamos tolerantes ao permitir as formas linguísticas” (CARNAP, 1980, p. 134) — sendo essa uma postura verdadeiramente filosófica.
Se, de acordo com Rudolf Carnap, a ontologia seria uma área desinteressante da Filosofia (na medida em que as perguntas sobre a existência de uma determinada entidade podem ser trivialmente respondidas de modo interno a um framework), como é possível que essa área tenha reflorescido justamente no seio da tradição analítica14? A resposta se encontra na formulação da perspectiva metaontológica de Willard van Orman Quine nos textos Sobre o que Há (1948) e Acerca das Concepções de Carnap sobre Ontologia (1951).
Em Sobre o que Há, Quine constata que os problemas ontológicos são simples, na primomedida em que podem ser formulados com três monossílabos do português: “O que há?”, a o que pode ser respondido com uma simplicidade ainda maior, uma vez que “tudo” existe (QUINE, 2011a, p. 11). Afinal, como argumenta Peter van Inwagen:
Essa tese me parece tão óbvia que tenho dificuldades em perceber como posso sustentá-la. Posso apenas dizer isto: se você pensar que há coisas que não existem, basta que me dê um exemplo. A resposta correta ao seu exemplo será “isso também existe” ou “não existe tal coisa como essa” (INWAGEN, 1998, p. 235, tradução nossa).
Entretanto, como o próprio Quine reconhece, essa tese é pouco informativa, pois “isso é simplesmente dizer que há o que há”, o que significa que “ainda há espaço para desacordo em cada caso” (QUINE, 2011a, p. 11). Quine, no entanto, formulou algo mais robusto do que uma tese trivial ou pouco informativa. Segundo Jonathan Schaffer (2009, pp. 348-349), Quine revitalizou a ontologia na tradição analítica porque desenvolveu uma concepção integrada da disciplina, estabeleceu com clareza a sua tarefa, apresentou um método viável para a sua condução e estipulou os critérios que devem ser respeitados para que possamos nos comprometer com a existência de uma determinada entidade (comprometimento ontológico); o que resultou na concepção de que essa seria uma atividade valiosa, com aspirações de progresso e que, dessa maneira, poderia sobreviver aos ataques realizados pelos filósofos positivistas pertencentes ao Círculo de Viena. Tratemos primordialmente da tarefa da ontologia e, em seguida, dos métodos estipulados.
A tarefa da ontologia, como vimos acima, é dizer o que há. Em outras palavras, um filósofo que se debruça nos problemas ontológicos deve fornecer um catálogo dos objetos que existem. Mas o que queremos dizer com “há tal objeto”? Analisemos as quatro teses apresentadas por Peter van Inwagen (1983) sobre a metaontologia de Quine:
Tese 1: ‘Ser’, ‘haver’ e ‘existir’ têm a mesma função ontológica. Ou seja, diferentemente de uma perspectiva Meinonguiana, não há diferenças entre as sentenças ‘x é’, ‘há x’ e ‘x existe’, pois todas elas indicariam que x está sendo postulado em nossa ontologia. Além disso, novamente em contraste com os Meinonguianos, Quine não concebe a existência como sendo um predicado real de uma entidade15, tendo em vista que
A concepção de Quine sobre o ser ou a existência tem as suas raízes em uma tradição ontológica venerável. Ela se desdobra do famoso motto de Kant: ‘Existência não é um predicado (real)’. A ideia, que também é encontrada em Frege e Russell é que, diferentemente de predicados ordinários como ‘corre’, ‘é vermelho’ ou ‘é um cachorro’, ‘existe’ não expressa um atributo discriminante que algumas coisas têm e outras carecem (BERTO & PLEBANI, 2015, p. 25, tradução nossa).
Tese 2: ‘Ser’, ‘haver’ e ‘existir’ são unívocos. Em outras palavras, esses três termos têm um único valor semântico, na medida em que os seus significados não se alteram caso os termos sejam aplicados a objetos materiais (como na sentença ‘O Cristo Redentor existe’) ou abstratos (como na sentença ‘existem números primos maiores que 100’). Além de os números serem unívocos16, há uma proximidade ontológica entre os três termos elencados acima e a enumeração, já que dizer que algo existe (como, mais uma vez, o Cristo Redentor) implica que há ao menos um objeto desse tipo; enquanto dizer que algo não existe (como a cúpula redonda quadrada da Universidade de Berkeley) implica que o número de objetos desse tipo é igual a zero.
Tese 3: O quantificador existencial (∃x) representa adequadamente o sentido singular de existência. Segundo Peter van Inwagen (1983, p. 69), Quine está correto quando reconhece que o quantificador existencial é melhor compreendido como uma arregimentação dos termos ‘existe’ e ‘há’; isso é, que o ‘∃x’ tem a mesma função dos termos ‘existe’ e ‘há’ quando aplicados em circunstâncias cotidianas17. O quantificador existencial é usado amplamente na lógica de primeira ordem para restringir o domínio das variáveis que estão sendo supostas como entidades. O símbolo ‘∃x’, que é lido como ‘existe um x’, pode ser aplicado em sentenças ordinárias como ‘∃x x é uma estátua’ (que se lê ‘há um x, tal que x é uma estátua), sendo que se a variável ‘x’ for substituída por ‘o Cristo Redentor’, por exemplo, e se tomarmos essa proposição como sendo verdadeira, podemos extrair dessa fórmula um compromisso existencial com o Cristo Redentor — dizer ‘ele existe’18 —, pois “supor algo como uma entidade é, pura e simplesmente, supô-lo como o valor de uma variável”19 (QUINE, 2011a, p. 26, grifos nossos). O quantificador existencial, desse modo, estaria relacionado à ontologia:
As variáveis de quantificação, ‘algo, ‘nada’, ‘tudo’, perpassam toda nossa ontologia, qualquer que seja ela; e estamos presos a uma pressuposição ontológica particular se, e apenas se, o objeto presumido da pressuposição tiver de ser reconhecido entre as entidades que nossas variáveis percorrem para tornar uma de nossas afirmações verdadeiras (QUINE, 2011a, p. 26).
Tese 4: Devemos escolher uma teoria e aceitar em nossa ontologia as entidades que são quantificadas pelas proposições dessa teoria. Se “a única maneira de nos envolvermos em compromissos ontológicos” é pelo “uso de variáveis ligadas” (QUINE, 2011a, p. 26) e se a tarefa da ontologia é fazer uma listagem daquilo que existe, então a pergunta metaontológica, como sugere Peter van Inwagen (1998) é a seguinte: o que estamos perguntando quando perguntamos “o que há?”, ou seja, qual é a metodologia correta que devemos aplicar para conduzir uma investigação em ontologia? Schaffer, nessa esteira, estabelece os cinco estágios do método Quineano:
Estágio 1: “Identificar a melhor teoria (a física, para Quine)”.
Estágio 2: “Identificar a lógica canônica (a lógica de primeira ordem, para Quine)”.
Estágio 3: “Traduzir a melhor teoria para a lógica canônica (em certa medida, para Quine, a paráfrase é permitida)”.
Estágio 4: “Determinar o domínio de quantificação requerido para tornar essa tradução verdadeira (todos os domínios equinúmeros são igualmente satisfatórios, para Quine)”
Estágio 5: “Extrair os comprometimentos com as entidades a partir dos elementos do domínio requerido (com consequências radicalmente eliminativistas, para Quine)” (SCHAFFER, 2009, p. 366, tradução nossa).
A metodologia de Quine nos mostra que devemos escolher uma teoria e tomá-la como sendo verdadeira (Cf. TAHKO, 2016, p. 16; Cf. QUINE, 2011a, p. 26), traduzi-la para a lógica canônica e examinar quais são as entidades que são o valor de uma variável ligada. Essas entidades quantificadas, caso sejam indispensáveis “para que as afirmações feitas na teoria sejam verdadeiras” (QUINE, 2011a, p. 27), serão precisamente as entidades com as quais nos comprometeremos ontologicamente20. Como Inwagen argumenta, por exemplo, se aceitarmos a mecânica gravitacional clássica, e se essa teoria contém uma sentença que pode ser traduzida como ‘∃x x é um número’, então “eu me comprometo a aceitar a existência de ao menos um número” (INWAGEN, 1983, p. 70, tradução nossa). Em outras palavras, Quine apresenta um argumento da indispensabilidade, que tem como forma básica os dois critérios a seguir: “(i) a quantificação sobre Fs é indispensável para a nossa melhor teoria sobre o mundo; (ii) portanto, Fs existem” (EKLUND, 2006, p. 318, tradução nossa).
Além disso, a partir da metodologia Quineana, as entidades postuladas teriam condições de identidade claras. Por exemplo, quando falamos de objetos materiais (que são localizados no espaço e no tempo e que podem se envolver em relações causais), temos que “se a e b são objetos materiais, então a = b se e somente se a tiver a mesma localização espaciotemporal que b” (QUINE, 1975 apud BERTO & PLEBANI, 2015, p. 43, tradução nossa) ou, no caso dos conjuntos, “se a e b são conjuntos, então a = b se e somente se a tem os mesmos membros que b” (BERTO & PLEBANI, 2015, p. 44, tradução nossa). Assim, a ontologia Quinena teria “nenhuma entidade sem identidade”, sendo que as entidades que não possuem condições claras de identidade seriam entidades desregradas ou, nas palavras de Quine: “criaturas da escuridão” (QUINE, 1956, p. 180).
Quine, portanto, está de acordo com Russell na medida em que reconhece que não há coisas que não existem. Mas o que acontece com sentenças como (1) abaixo?
(1) Pegasus é um cavalo alado da mitologia grega.
Se partirmos do pressuposto de que Pegasus não existe, na medida em que não é uma entidade que pode ser encontrada no espaço e no tempo (e, de acordo com Quine, ‘Pegasus’ seria o tipo de entidade que deveria ser encontrada no espaço e no tempo), temos diante de nós o problema da Barba de Platão21, que expressa que
O não ser deve, em certo sentido, ser, caso contrário, o que é aquilo que não há? Essa doutrina emaranhada pode ser apelidada de a barba de Platão; historicamente, ela se mostrou resistente, fazendo frequentemente a navalha de Ockham perder o corte. (QUINE, 2011a, p. 12).
Em outras palavras, mesmo que digamos ‘Pegasus não existe’, parece que estamos dizendo que há tal coisa como Pegasus, e que estamos negando o atributo da existência a esse objeto. Ao mesmo tempo, chegaremos a um resultado indesejado ao assumirmos que a proposição (1) é falsa, uma vez que realmente tomamos como sendo o caso que Pegasus é um cavalo alado da mitologia grega e notamos, por contraste, que ‘Zeus é um cavalo alado da mitologia grega’ seria uma proposição falsa — sendo essas duas das motivações para o desenvolvimento da perspectiva Meinonguiana. Esse problema pode, inclusive, se estender a uma variedade de objetos, como os impossíveis, os possíveis não-atualizados, os incompletos, além dos ficcionais e dos mitológicos. Não obstante, ainda na perspectiva Quineana, há duas maneiras de evitar postular tais supostas entidades que seriam ‘desregradas’: em primeiro lugar, ao se reconhecer que, como vimos, a ‘existência’ não é um predicado de objetos; em segundo lugar, através do método Russelliano da paráfrase.
Voltemos a nossa atenção para a teoria das Descrições Definidas e realizemos o procedimento requerido no caso de (1). Recordemos que “Russell, em sua teoria das chamadas descrições singulares, mostrou claramente como podemos empregar de modo significativo nomes aparentes sem presumir que há entidades supostamente nomeadas” (QUINE, 2011a, p. 17). Assim, de acordo com Quine, partindo do pressuposto de que “alguém pode assumir que a tarefa de uma paráfrase adequada é preservar o valor de verdade, o conteúdo intuitivo, e as implicações da sentença parafraseada” (BERTO & PLEBANI, 2015, p. 38, tradução nossa), podemos reescrever o nome próprio ‘Pegasus’ como “o cavalo alado que foi capturado por Belerofonte” (QUINE, 2011a, p. 19) ou, através de um “truque artificial e aparentemente trivial” (QUINE, 2011a, p. 20) adotar os verbos ‘é-Pégasus’ ou ‘pegaseia’, com o objetivo de identificar exclusivamente esse ‘x’ — sem se confundir com a identificação de outra entidade — e, assim, estabelecermos os nossos comprometimentos ontológicos. Assim temos que:
(1) Pegasus é um cavalo alado da mitologia grega.
(1a) O cavalo alado que foi capturado por Belerofonte é um cavalo alado da mitologia grega.
(1b) ∃x (x é o cavalo alado que foi capturado por Belerofonte e x é um cavalo alado da mitologia grega)
Ao analisarmos a primeira proposição quantificada, “x é o cavalo alado que foi capturado por Belerofonte”, temos que não houve tal cavalo alado — afinal, não faria sentido dizer que Pegasus existe enquanto uma ideia em nossas mentes (QUINE, 2011a, p. 13). Portanto, o número de cavalos alados (consequentemente, de algo que seja Pegasus) é igual a zero. Ou seja, isso implica que o nome próprio ‘Pegasus’ tem significado, mas não nomeia algum objeto — assim sendo, não existe tal coisa como ‘Pegasus’, sendo esse um nome vazio (QUINE, 2011a, p. 22)22. Soames então argumenta que a consequência da paráfrase é que
alguém não estaria comprometido, ele [Quine] diria, com a existência do referente do nome ao meramente usar um nome. Nem estaria comprometido, ao meramente usar um termo significativo, com a entidade que é o seu significado (SOAMES, 2009, p. 426, tradução nossa).
No entanto, mesmo que se adote uma perspectiva realista em relação a objetos mitológicos — digamos que se queira defender, para preservar a intuição de que (1) é uma proposição verdadeira, que há alguma coisa como Pegasus —, Quine também poderia evitar postulá-los através do argumento da indispensabilidade. Uma vez que a quantificação sobre Pegasus é dispensável para a nossa melhor teoria sobre o mundo — por exemplo, os físicos não precisam postular esse cavalo alado mitológico para fazer sentido das leis da aerodinâmica —, segue-se que não precisamos nos comprometer com essa suposta entidade. Assim, Quine evita um catálogo ontológico que seja “superpopuloso”, “desagradável” ou ofenda “o senso estético dos que, como nós, apreciam paisagens desertas” (QUINE, 2011a, p. 15).
Quine revitalizou a ontologia na tradição analítica, portanto, na medida em que estabeleceu com clareza a sua tarefa e a sua metodologia. Como Carnap, Quine apresentou um modo para que os filósofos tenham um “terreno comum para argumentar”, evitando então as disputas meramente verbais, na medida em que “a divergência quanto à ontologia envolve a divergência básica quanto ao esquema conceitual” (QUINE, 2011a, p. 30). E, novamente em consonância com Carnap, Quine defende que “a questão de qual ontologia efetivamente adotar ainda fica em aberto, e o conselho óbvio é tolerância e espírito experimental.” (QUINE, 2011a p. 34).
Se, de um lado, as divergências entre Quine e Meinong são explícitas — especialmente por conta das considerações sobre a univocidade e a semântica dos verbos ‘existir’, ‘haver’ e ‘ser’ —, do outro lado, os projetos de Quine e Carnap possuem diferenças pontuais. Uma delas, para além das críticas de Quine à analiticidade em Dois Dogmas do Empirismo, Quine não apela para qualquer tipo de pluralismo linguístico ou ontológico23, pois a sua perspectiva naturalista e o argumento da indispensabilidade não assumem que qualquer sistema linguístico possa ser adotado, a depender da sua eficácia para tratar de algum problema em ontologia. Quine possui uma predileção por um tipo de sistema linguístico bastante específico: a física; além de uma lógica específica: a lógica de primeira ordem.
Apesar das virtudes teóricas da proposta de Quine, e de sua aparente vitória no debate em Metametafísica, há ao menos três grandes objeções ao seu sistema:
Crítica 1: O naturalismo de Quine, isso é, a predileção especial em relação à física, incorre em um caso de falsa parcimônia. Amie Thomasson (1999, 2007) argumenta que a postulação de entidades abstratas (como os conjuntos e os números) porque são indispensáveis para a nossa melhor teoria científica, enquanto a dispensa de entidades metafisicamente semelhantes aos números, como os objetos ficcionais (como Tom Sawyer) e as entidades sociais (como casamentos e contratos), é um caso claro de falsa parcimônia — ou, poderíamos dizer, de “dois pesos e duas medidas”. Por que não, por exemplo, como argumenta Peter van Inwagen (1977, 1983), aceitar os objetos ficcionais para fazer sentido do discurso da crítica literária? Ou, como Amie Thomasson (1999) e Lynne Rudder Baker (2007) propõem de modo mais abrangente: por que não observar as nossas práticas cotidianas e, a partir delas, estabelecer os nossos comprometimentos ontológicos e a sua metafísica?
Crítica 2: O método da paráfrase apresentado por Bertrand Russell teve bastante sucesso desde a publicação do artigo Da Denotação (1905). Quine faz um uso extensivo desse método justamente para evitar postular entidades supostamente desregradas em sua ontologia. Berto e Plebani reconstroem essa perspectiva:
Há algo como uma forma lógica autêntica das sentenças de nossa linguagem, que se situa abaixo, e às vezes é escondida pela gramática superficial da linguagem. Apenas em tal nível da ‘gramática profunda’ podemos tratar dos problemas ontológicos efetivamente, pois é apenas nesse nível que os fundamentos ontológicos da linguagem se tornam transparentes. Nossa linguagem natural é ontologicamente enganosa na medida em que sua superfície e a sua gramática lógica profunda divergem (BERTO & PLEBANI, 2015, p. 19, tradução nossa).
No entanto, essa pressuposição é uma herança do atomismo lógico de Russell que, quando voltamos ao debate contemporâneo, tem sido fortemente atacada. Nesse sentido, sem o recurso da paráfrase, uma perspectiva Quineana em Metametafísica teria dificuldades em evitar postular entidades supostamente desregradas sem, dessa forma, incorrer em um caso de falsa parcimônia, assim como vimos na crítica anterior.
Crítica 3: Quine assume, como podemos encontrar na Tese 3 proposta por Inwagen, que o quantificador existencial representa adequadamente o sentido singular de existência. Entretanto, se adotarmos uma perspectiva Meinonguiana, ou até mesmo um pluralismo lógico (abandonando então a Lógica de Primeira Ordem e adotando um outro sistema como, por exemplo, a Lógica Livre), não precisamos assumir que o quantificador existencial nos compromete com a existência da entidade quantificada. Para evitar essa confusão, autores como Tim Crane (2013) sugerem que o quantificador existencial seja chamado de quantificador particular; Terence Parsons (1980) propõe um novo símbolo lógico para distinguir os verbos ‘existir’ e ‘haver’; enquanto Mark Sainsbury (2005), mesmo distante da perspectiva Meinonguiana, mostra a partir da Lógica Negativa Livre como podemos quantificar objetos (ficcionais, por exemplo) sem nos comprometermos com as suas existências. Portanto, a relação entre quantificação e existência pode ser fortemente atacada.
Em suma, a Metaontologia Quineana, apesar de não ser imune a críticas, é uma das mais virtuosas e pode ser sintetizada com as seguintes palavras:
Portanto, considero que o comprometimento essencial a entidades de qualquer tipo vem através das variáveis de quantificação, e não através do uso dos supostos nomes. As entidades às quais o discurso nos compromete são as entidades sobre as quais as variáveis de quantificação devem se estender para que as sentenças afirmadas naquele discurso sejam verdadeiras. (QUINE, 1951, p. 67, tradução nossa).
Analisamos três metodologias que podem ser adotadas para a condução de uma investigação em Metafísica: a de Alexius Meinong, Rudolf Carnap e Willard van Orman Quine. Seguindo o uso corrente do debate anglofônico, chamamos esse campo investigativo de Metametafísica. O nosso intuito com este trabalho foi introduzir e disponibilizar para o público lusofônico quais seriam as origens das discussões em Metametafísica e quais são as questões próprias dessa área. Acreditamos que a maior contribuição dessas discussões seja fazer com que os filósofos e as filósofas não se envolvam em disputas verbais mas, ao desambiguar os seus vocabulários e adotar uma metodologia promissora, que os debates na área de Metafísica possam ser mais enriquecedores e tenham alguma perspectiva de progresso. Evidentemente, as questões relacionadas à Metametafísica não foram esgotadas aqui. Há, inclusive, outras metodologias que têm ganhado cada vez mais adeptos no debate contemporâneo, como é o caso da perspectiva Neo-Aristotélica do Grounding — que pergunta não por o que existe, mas estabelece o que é fundamental ou derivativo. Esperamos, porém, ter fornecido um ponto de partida para os que não estavam familiarizados com essas discussões e que outros pesquisadores possam se engajar com as questões da Metametafísica.