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O direcionamento humano: uma breve contribuição da filosofia e uma leitura do mundo técnico

The human direction: a brief contribution of philosophy and a reading of the technical world

Itamar Soares Veiga 1
Universidade de Caxias do Sul, Brasil

O direcionamento humano: uma breve contribuição da filosofia e uma leitura do mundo técnico

Griot: Revista de Filosofia, vol. 22, núm. 2, pp. 139-155, 2022

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Recepción: 28 Febrero 2022

Aprobación: 28 Mayo 2022

Resumo: :

Este artigo trata sobre a concepção de um “nós” que se constitui a base para um direcionamento mais amplo, diferenciando os humanos frente aos demais seres vivos. Neste sentido, um discurso sobre “nós” necessita de uma base de apoio e, geralmente, aponta para uma direção. Este último aspecto implica, mesmo que minimamente, um direcionamento do ser humano projetado para o futuro. Diante deste contexto, este artigo visa discutir sobre o direcionamento humano e verificar as suas características. Para realizar esta discussão na primeira seção são expostas algumas posições filosóficas por meio de contribuições de Heidegger e Kant. E, na segunda seção, a concepção de um “nós”, será analisada com o foco nos fenômenos recentes do desenvolvimento técnico. A conclusão final aponta que o direcionamento, propiciado pela tecnologia, se adapta bem a certas características já existentes nos humanos em épocas anteriores. Uma solução possível para lidar com o direcionamento tecnológico seria o envolvimento, por parte da filosofia, com certos aspectos já disponíveis sobre o mundo técnico e a fomentação de um espaço de reflexão.

Palavras-chave: Direcionamento humano, Tecnologia, Kant, Heidegger, Cathy O’Neil.

Abstract: :

This article is about the conception of “us” or that identifies the set of humans and highlights them ahead others living beings. Thus, a discourse about “us” always needs a base of support and points in a direction. This point implies, even if minimally, a direction of the human being projected in a future. To discuss about this human direction and would verify as its characteristics, in the first section we expose some opinions of philosophy through contributions of Heidegger and Kant. In the second section, the conception of “us” will be analyzed through the most recent phenomena of technical world. The final conclusion points out that the human direction provided by the technology, adapts well to certain characteristics. A possible solution to deal with technological human direction is the involvement of philosophy with certain aspects of the technical world, already available, and to make the promotion of a space for reflection.

Keywords: Human direction, Technology, Kant, Heidegger, Cathy O’Neal.

Introdução

Os temas de pesquisa da filosofia sobre o ser humano, geralmente, se inscrevem dentro de uma subárea denominada de antropologia filosófica. A antropologia filosófica possui seus próprios problemas e um dos mais famosos é aquele que pergunta sobre a diferença entre humanos e animais não humanos. Trata-se sempre de um discurso sobre humanos e, em seguida, um encaminhamento para dentro do trabalho habitual da antropologia filosófica. Mas, este artigo não vai abordar as relações entre humanos e animais não humanos e, não vai, portanto, tratar de nenhuma das complexidades da diferença específica que poderia distinguir nós dos demais animais. Este artigo vai tratar sobre algo mais básico, e está presente no discurso que percorre todas as áreas da filosofia: área da antropologia filosófica, a área da ética, da filosofia política e outras como a filosofia da arte e a estética. O que seria tão básico que pudesse transpassar todas estas áreas?

A resposta é o “nós”. É o constructo sempre utilizado para fornecer uma base, solo ou ponto específico a partir do qual se desenvolve um discurso filosófico sobre o ser humano. Este ponto específico nem sempre é explicitado e, o discurso subseqüente que ele permite desenvolver é exposto, muitas vezes, sem um deter-se mais demorado em relação ao seu ponto de partida. Este ponto de partida é constituído ou, ao menos, aponta para uma base prévia que é uma determinada concepção do “nós”, ou seja, do conjunto dos humanos.

Esta concepção do “nós”, ou sobre quem seriam os humanos, a respeito dos quais alguém vai desenvolver um discurso, possui determinadas características que se mostram constantes. Estas características são simples e podem ser referidas como respostas a duas perguntas que, aquele que vai desenvolver o discurso sobre o ser humano, possui. Estas perguntas são as seguintes: quem é o ser humano (tomado em conjunto, isto é, subsumido a um “nós”) e para onde está se dirigindo, ou seja, este “nós” está submetido a um direcionamento, mesmo que mínimo.

A filosofia possui diversas concepções sobre quem são os humanos e como se dirigem, ou estão sendo dirigidos (enquanto um “nós”) para uma direção. São variadas as concepções de ser humano, subsumida a um “nós” e o seu direcionamento determinado, além de expressarem, às vezes, repercussões da época em que este filósofo viveu. Por isto, neste artigo, devemos fazer uma escolha e tratar de alguns trechos, não pretendendo dar conta de um panorama vasto. Escolhemos dois filósofos e alguns trechos das suas filosofias para tematizar duas concepções sobre o “nós”. As escolhas foram Heidegger e Kant, ambos devem fornecer uma noção sobre discursos a respeito do conjunto dos humanos, conformando um determinado tipo de perspectiva do “nós”, principalmente, no que diz respeito ao direcionamento a que estão submetidos. Deste modo, procurando responder a pergunta sobre quais são as características do direcionamento ao qual o conjunto dos humanos, ou o “nós”, está submetido? É correto dizer que a resposta pressupõe uma concepção prévia do ser humano, mas nem sempre esta concepção é explicitada, por causa disto nos deteremos mais na própria efetividade que é explicitada: o direcionamento, concebido sob um viés crítico.

Na primeira parte vamos apresentar dois exemplos da concepção de um “nós” dentro da filosofia, por meio de passagens de Heidegger e Kant. Neste sentido, a nossa opção é fazer um recorte a partir de alguns trechos de Heidegger sobre a técnica contemporânea seguidos de um comentário sobre dois escritos de Kant, referente aos anos de 1784. Estes escritos são bem conhecidos: “Resposta à pergunta: Que é ‘esclarecimento’?” e “A idéia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita”.

Na segunda parte, mostraremos alguns elementos da realidade atual que estão vinculados a uma estrutura tecnológica prevalecente. Esta estrutura tecnológica se sobrepõe à complexidade do mundo real, reinterpretando o mundo e intervindo nele ao mesmo tempo. Ela é identificada como a junção entre um recurso recente das últimas duas décadas: o Big Data, seguido pela elaboração de modelos matemáticos e estatísticos. Sob este foco atual e tecnológico, desenvolveremos uma exposição sobre o direcionamento do “nós”, os humanos.

1.Um recorte perante as contribuições possíveis da filosofia

Em determinados momentos da história da filosofia, percebe-se que alguns filósofos realizam uma reflexão direta sobre o mundo em que vivem. Esta reflexão não é apenas a busca de elementos para compor ou para justificar uma base filosófica prévia, mas, expõe as perspectivas de um futuro. Qual futuro? O futuro do homem, da civilização, da espécie etc. Esta fala dos filósofos sobre o futuro não é propriamente uma previsão, mas a expressão de uma crítica ou da própria passagem de uma fase da filosofia para a outra.

Embora remetam ao futuro, isto não significa que os filósofos tenham uma compreensão privilegiada ou integral sobre os fatos que percebem. Os discursos que realizam podem ser identificados como reações a determinados fatos, reações seguidas de uma espécie de alerta. Isto não permite analisar as suas falas sobre o futuro de uma forma rigorosa. A fala sobre o futuro estaria mais próxima das ciências humanas aplicadas. Mas, eventualmente, esta fala dos filósofos está presente e intriga. Ela intriga, porque não se “encaixa” nas funções da filosofia e, não se encaixa nas ciências humanas aplicadas. Mantendo este caráter intrigante, a fala sobre o futuro possui sempre uma característica comum entre os filósofos: ela apela para uma perspectiva do “todo” do ser humano. Este “todo” pode ser expresso com outras palavras, tais como, a civilização, a espécie, etc.

Para fornecer um exemplo que encaminha a análise do tema geral deste artigo, que é o direcionamento ao qual estamos submetidos, citaremos uma passagem na qual Heidegger aborda o impacto da tecnologia na vontade e nas decisões humanas. Ele diz o seguinte:

Quando se tiver conseguido o domínio da energia atômica, e isso será conseguido, começará um desenvolvimento totalmente novo do mundo técnico. As técnicas que hoje conhecemos como do cinema e da televisão, dos transportes, particularmente do transporte aéreo, da informação, da medicina e da alimentação representam provavelmente apenas um grosseiro estádio inicial. Ninguém poderá prever as revoluções que se aproximam. Entretanto a evolução da técnica decorrerá cada vez mais rapidamente e não será possível detê-la em parte alguma. Em todos os domínios da existência as forças dos equipamentos técnicos e dos autômatos apertarão cada vez mais o cerco. Os poderes que, sob a forma de quaisquer equipamentos e construções técnicos, solicitam, prendem, arrastam e afligem o Homem, em toda a parte e a toda a hora, já há muito tempo que superaram a vontade e a capacidade de decisão do Homem porque não são feitos por ele.” (HEIDEGGER, 2000, p.20)

Este trecho faz parte do conhecido discurso sobre a “Serenidade” que Heidegger pronunciou em um evento festivo em 1955. Embora, ele tenha afirmado que “ninguém poderá prever as revoluções que se aproximam”, logo em seguida detalhou uma espécie de revolução em “todos os domínios da existência”. A técnica imporia a sua dominação por meio dos aparelhos técnicos e dos “autômatos” e, com este conjunto, a técnica apertaria “cada vez mais o cerco”.

Alguns anos antes, em um dos seus posicionamentos sobre a vontade de poder em Nietzsche, Heidegger fez, também, uma espécie de projeção a respeito do futuro. Evidentemente, ele tomou como base, para as suas observações, a realidade em que vivia. Neste caso, a época é a metade do século XX, na qual se destacava o progressivo avanço técnico, seguido de uma adaptação do homem a este domínio. Enfim, a palavras de Heidegger são as seguintes:

Chama-se “instinto” a organização de todos os ímpetos possíveis na totalidade do planejamento e da segurança. Essa palavra designa aqui o “intelecto”, que ultrapassa o entendimento limitado dos cálculos do imediato. Ao seu intelectualismo nada, que deva integrar como “fator” o cálculo das equações dos diversos “setores isolados”, pode escapar. O instinto é a sobrelevação do intelecto, que corresponde ao super-homem, rumo ao incondicional de tudo. Como esse cálculo rege pura e simplesmente, parece que perto da vontade nada mais há do que o mero asseguramento da pulsão de calcular. Essa pulsão constitui a primeira regra de cálculo de tudo. O “instinto” valeu até hoje como uma característica do animal que, no âmbito da sua vida, busca o útil e evita o prejudicial, sem aspirar nada mais além disso. A segurança do instinto animal corresponde à sujeição cega ao âmbito da utilidade. Ao poder incondicional do super-homem corresponde a total liberação do sub-homem. A pulsão animal e a razão humana tornam-se idênticas. (HEIDEGGER, 2001, p. 82)

Esta passagem expressa uma ênfase no que Heidegger denomina de “intelecto”, em um contexto em que o intelecto é uma espécie diferente de instinto. Trata-se de um instinto sobrelevado (“sobrelevação do instinto”). E, nesta “sobrelevação” o que mais importa ao homem é que ele continue “rumo ao incondicional de tudo”. Deste modo, o homem do instinto sobrelevado “corresponde ao super-homem” no modo de ser apenas a “liberação do sub-homem”. Na relação entre intelecto e instinto, o intelecto é equiparado àquilo que no animal é a utilidade. Assim, no homem temos o asseguramento de que tudo possa ser calculado, é igualmente submetido a uma utilidade, tornado útil. Heidegger conclui que a pulsão de ambos, animal e homem, são idênticas.

O encadeamento do raciocínio exposto acima pode ser aproximado com as descrições de alguns fenômenos mais recentes, portanto, para além dos anos 50 do século XX. A “pulsão de calcular” sem dúvida alguma persistiu e aumentou a sua abrangência e a sua capacidade de vincular o cálculo com a utilidade ou, mais claramente, ao lucro. No que diz respeito a Heidegger, ele centrou a invenção da bomba atômica como uma espécie de marco histórico, um elemento importante, decisivo, que assinalaria a dominação da técnica se impondo ao planeta.

Mas, na época mais recente, outro contexto mostra de forma mais imediata as evidências fenomênicas de uma “pulsão de calcular”. Um exemplo disto é o aparato tecnológico-digital que cerca a nossa cotidianidade de uma situação pós-pandêmica do século XXI. Não há dúvida de que este aparato se orienta pela “pulsão de calcular” e é efetivado pelo processamento computacional que une matemática e estatística em algoritmos. E, no caso do Machine Learning, estes algoritmos buscam os padrões dos comportamentos humanos dentro de uma massa de dados coletados diariamente. Uma vez encontrados estes padrões, o contratante do serviço informático, seja quem for, pode se beneficiar das informações resultantes na forma de padrões e perfis de comportamento. Entretanto, o efetivo benefício de um trabalho com dados para um contratante, sempre tem em vista a compreensão ou direcionamento de comportamentos futuros dos perfis de indivíduos.

Na comparação entre “pulsão” e “pulsão animal”, na afirmação feita por Heidegger de que o “instinto animal corresponde à sujeição cega ao âmbito da utilidade”, essa “utilidade” é o ponto que aglutina animais e humanos. A utilidade é, também, o ponto central entre humanos e as iniciativas atuais dos produtos artificiais inteligentes. No animal não humano, tem-se o “instinto” que conduz a sujeição orientada pela “utilidade”. No caso dos humanos, tem-se a “utilidade” buscada, em princípio, sem o “instinto”. Resta discutir o que significa a ressalva: em princípio. No contexto de comparação entre animais não humanos e humanos, essa ressalva inserida, assinalaria uma diferença específica entre animal e homem e estabeleceria a possibilidade de não ser conduzido por uma “sujeição cega”. Embora, eventualmente os animais humanos pudessem estar sob este tipo sujeição, aind focada na utilidade. Entre humanos, não há garantias de uma não sujeição.

Pode-se perguntar o que evitaria, ainda que não permanentemente, uma sujeição do humano às suas pulsões? Ou, em outras palavras, o que lhe permitiria não estar focado na utilidade e, por isto, não estar no mesmo âmbito do animal não humano? Este é o tema que discute a existência de uma diferença específica. Os filósofos apresentaram as suas propostas paras as diferenças especificas, geralmente sem fazer muitas ressalvas. Elas são: a racionalidade, a vontade, a autonomia, a virtude, a capacidade política etc. A dificuldade de justificar cada uma das diferenças específicas, pode ser identificada por conter, potencialmente, um regresso ad infinitum que seria contido por uma injunção metafísica e uma afirmação ontológica sobre o que são os humanos.

Mas, o que sobra desta discussão se desejarmos não seguir a linha que regride ad infinitum até uma injunção metafísica? Em outras palavras, se simplesmente não aceitarmos uma injunção metafísica? O que sobra? Sobra o campo anterior de problematização, um campo em aberto. Este campo foi preservado pela pequena ressalva mais acima: em princípio. Ou seja, em princípio, o animal humano não busca a utilidade sob uma sujeição cega, mas eventualmente se submete a este modo cego e se sujeita. Desta parte da problematização, podemos refazer pergunta, atualizando-a: por que, eventualmente, o animal humano segue uma sujeição cega? Ou seja, a ressalva se invalida temporariamente?

É preciso manter a perspectiva de que não se trata de um só indivíduo humano, mas de um grande grupo ou da espécie toda. A pergunta é abrangente sobre a possibilidade de um direcionamento dos animais humanos, um direcionamento que eles seguem e, eventualmente, o fazem de uma forma cega. Quando este problema é visto sob o auspício da técnica e da “sobrelevação do intelecto”, ele se equivale a uma busca do melhor modo de direcionar comportamento, isto será mostrado na segunda seção com o foco na época atual. Portanto, este questionamento: por que, eventualmente, o animal humano segue uma sujeição cega? Deverá aguardar os elementos concretos ou o relato dos fenômenos atuais que serão referidos na segunda seção.

É importante salientar que o tema do direcionamento de comportamento, pode ser depreendido em outros filósofos. Um exemplo pode ser alcançado na produção de Kant em um pequeno período do ano de 1784. Kant escreveu dois pequenos textos: “Resposta à pergunta: Que é ‘esclarecimento?’” (Setembro de 1784) e “Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita” (Novembro de 1784). Vamos analisar alguns trechos destes textos.

O tema do direcionamento pode ser encontrado em “Que é ‘esclarecimento’?” logo no começo, quando se define a “minoridade culpada”: “O homem é o próprio culpado dessa minoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem.” (1784/1974, p. 1002). Esta “direção de outrem” pode ser compreendida como uma forma de direcionamento que é assumido Poe alguém.

Mas, o “direcionamento” não é aplicado para um indivíduo, o que abre uma contrapartida ou complemento da máxima “sapere aude!”. O “direcionamento” é dirigido a um espectro amplo ou a um grande grupo ou população. Assim, o “direcionamento” é explicitado sob dois caminhos. Em um deles a pessoa que conduz este grande grupo (no caso, acentuando os preconceitos) poderá ser a futura vítima deste grande grupo:

O interessante nesse caso é que o público, que anteriormente foi conduzido por eles a este jugo, obriga-os daí em diante a permanecer sob ele, quando é levado a se rebelar-se por alguns de seus tutores, que eles mesmos são incapazes de qualquer esclarecimento. Vê-se assim, como é prejudicial plantar preconceitos, porque terminam por se vingar daqueles que foram seus autores ou predecessores destes. (KANT, 1784/1974, p.104).

No outro caminho temos um tipo de “direcionamento” que pode conduzir o público ao esclarecimento. Este tipo de “direcionamento” é realizado pelo uso público da razão e a base é a liberdade. No contexto de sua época, Kant assinalou uma limitação “por todos os lados” da liberdade. E, após mencionar, estas limitações, modifica o foco e acrescenta:

Que limitação, porém, impede o esclarecimento? Qual não impede, e até mesmo o favorece? Respondo: o uso público de sua razão deve ser sempre livre e só ele pode realizar o esclarecimento entre os homens. [...] Entendo, contudo sob o nome de uso público de sua própria razão aquele que qualquer homem, enquanto sábio, faz dela diante do grande público do mundo letrado. Denomino uso privado daquele que o sábio pode fazer de sua razão em certo cargo público ou função a ele confiado. (KANT, 1974/1784, p.104).

O uso público da razão precisa de uma recepção específica, que é o “público letrado” e, este público se estende aos indivíduos de todas as nações. Nesta ampliação, o uso público da razão continua tendo como eixo a liberdade na forma de uma liberdade de raciocinar. A ênfase no raciocínio explicita uma ação que se subdivide em: (1) seguir uma ordem e não raciocinar, (2) raciocinar mesmo seguindo uma ordem que vise o funcionamento da sociedade. Estes detalhes e a ampliação do uso público podem ser vistos nesta passagem:

Ora, para muitas profissões que se exercem no interesse da comunidade, é necessário certo mecanismo, em virtude do qual alguns membros da comunidade devem comportar-se de modo exclusivamente passivo para serem conduzidos pelo governo mediante uma unanimidade artificial, para finalidades públicas, ou pelo menos devem ser contidos para não destruir essa finalidade. Em casos tais, não é sem dúvida, permitido raciocinar, mas deve-se obedecer. Na medida, porém, em que esta parte da máquina se considera ao mesmo tempo membro de uma comunidade total, chegando até à sociedade constituída pelos cidadãos de todo mundo, portanto na qualidade de sábio que se dirige a um público, por meio de obras escritas de acordo com seu próprio entendimento, pode certamente raciocinar, sem que por isto sofram os negócios a que está sujeito em parte como membro passivo. (KANT, 1784/1974, p.104,106)

O uso publico da razão se desenvolve a partir deste horizonte da liberdade. De modo correlato, há uma ampliação do “público letrado” até os “cidadãos de todo mundo”, sob o ensejo de “uma comunidade total”. Kant exemplifica como acontece este uso da razão. Ele o distingue a partir de funções que são exercidas “mediante uma unanimidade artificial” e com as atividades de raciocinar adequadas a “um sábio”. As suas palavras são:

[...] o uso que um professor empregado faz de sua razão diante da sua comunidade é unicamente um uso privado, porque é sempre um uso doméstico, por grande que seja a assembléia. Com relação a ele, enquanto padre, não é livre e não tem o direito se sê-lo, porque executa uma incumbência estranha. Já como sábio, ao contrário, que por meio de suas obras fala para o verdadeiro público, isto é, o mundo, o sacerdote, no uso público de sua razão, goza de ilimitada liberdade de fazer uso de sua própria razão de falar em seu próprio nome. (KANT, 1784/1974 p.108)

Esta divisão entre o uso privado e o uso público da razão se abre para o tema do direcionamento, notadamente, no ensejo da “comunidade total” de “todos os cidadãos do mundo”. Como acontece esta abertura? Antes é importante deixar claro que o direcionamento existe em ambos os usos da razão, seja no uso privado como o exercício de uma gestão ou governança, seja no uso publico perante um público que, como se viu, tende a se ampliar para a “comunidade total”.

O próximo passo é o fato de que Kant opta por apenas um tipo de direcionamento. O direcionamento referente ao uso público da razão. E, é neste direcionamento que se encontra o esclarecimento possível alcançado na “marcha da humanidade no caminho do aperfeiçoamento”. Cabe ao “sábio” promover este esclarecimento com o uso público da razão mesmo que, eventualmente, adie esta tarefa:

Mas, é absolutamente proibido unificar-se em uma constituição religiosa fixa, de que ninguém tenha publicamente o direito de duvidar, mesmo durante o tempo de vida de um homem, e com isso por assim dizer aniquilar um período tempo na marcha da humanidade no caminho do aperfeiçoamento, e torná-lo infecundo e prejudicial para a posterioridade. Um homem sem dúvida pode, no que respeita à sua pessoa, e mesmo assim só por algum tempo, na parte que lhe incumbe, adiar o esclarecimento. Mas renunciar a ele, quer para si mesmo quer ainda mais para a sua descendência, significa ferir e calcar aos pés os sagrados direitos da humanidade. (KANT, 1784, 1974, p.110).

Os “sagrados direitos da humanidade” integram esta “marcha da humanidade no caminho do aperfeiçoamento” e o homem sábio está direcionado a participar desta marcha, mesmo que a adie por algum tempo. Ele está direcionado dentro de um horizonte de “ilimitada liberdade”, mas este horizonte, correspondente ao uso público de sua razão, está delimitado por esta “marcha” da humanidade. Há um direcionamento, embora este esteja envolvido pela base da “ilimitada liberdade” e na incumbência do “sábio” que pode ser adiada “por algum tempo”, mas deve ser cumprida.

O tema do direcionamento pode ser visto de forma mais evidente em outro texto, o de novembro de 1784, cujo título é “A idéia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita”. O texto é uma explanação de como as ações humanas são determinadas por “leis naturais universais”, tendo a história como pano de fundo. Assim, é necessário, um ponto de vista externo para compreender os desdobramentos dentro deste pano de fundo. Este “ponto de vista” (Absicht) permitiria compreender, a partir da história, a “marcha” da “humanidade no caminho do aperfeiçoamento” conforme a expressão no escrito analisado antes. Neste outro texto, de novembro de 1874, há um “curso regular” que revela um tipo de desenvolvimento denominado de “desenvolvimento continuamente progressivo”, vejamos a passagem:

De um ponto de vista metafísico, qualquer que seja o conceito que se faça da liberdade da vontade, as suas manifestações – as ações humanas –, como todo outro acontecimento natural, são determinadas por leis naturais universais. A história, que se ocupa da narrativa dessas manifestações, por mais profundamente ocultas que possam estar as suas causas, permite todavia esperar que, com a observação, em suas linhas gerais, do jogo da liberdade da vontade humana, ela possa descobrir aí um curso regular – dessa forma, o que se mostra confuso e irregular nos sujeitos individuais poderá ser reconhecido no conjunto da espécie, como um desenvolvimento continuamente progressivo, embora lento das suas disposições originais. (KANT, 1784/1986, p.9).

O “curso regular” é descoberto a partir de “um ponto de vista metafísico” é exemplificado de uma forma interessante. Kant menciona uma espécie de controle ou acompanhamento por países a respeito dos acontecimentos referentes a suas populações. Mas, ao mesmo tempo, ele mantém a diversidade dos fenômenos como um fator complicador do quadro geral. A exemplificação é a seguinte:

Porque a livre vontade dos homens tem tanta influência sobre os casamentos, os nascimentos que daí advém e a morte, eles parecem estar submetidos a nenhuma regra segundo a qual se possa dar de antemão o seu número. E, no entanto, as estatísticas anuais dos grandes países demonstram que eles acontecem de acordo com leis naturais constantes, do mesmo modo que as inconstantes variações atmosféricas, que não podem ser determinadas de maneira particular com antecedência, no seu todo não deixam, todavia, de manter o crescimento das plantas, o fluxo dos rios e outras formações naturais num curso uniforme e ininterrupto. (KANT 1784/1986 p.9-10).

Esta é uma exemplificação do “curso regular”. Mas, o “curso regular” não mostra, por si mesmo, um direcionamento efetivo. Um direcionamento efetivo precisa de uma intenção explícita mais forte do que aquela originada por uma perspectiva do “ponto de vista metafísico” que visualiza o “curso regular” e apela para as “leis naturais constantes”. Uma introdução a este direcionamento efetivo pode ser compreendida nesta passagem da sexta proposição:

Este problema é, ao mesmo tempo, o mais difícil e o que será resolvido por último pela espécie humana. A dificuldade que a simples idéia dessa tarefa coloca diante dos olhos é que o homem é um animal que, quando vive entre outros de sua espécie, tem necessidade de um senhor. Pois ele certamente abusa de sua liberdade relativamente a seus semelhantes; e, se ele, como criatura racional, deseja uma lei que limite a liber­dade de todos, sua inclinação animal egoísta o conduz a exce­tuar-se onde possa. Ele tem necessidade de um senhor que quebre sua vontade particular e o obrigue a obedecer à vonta­de universalmente válida, de modo que todos possam ser livres. Mas de onde tirar esse senhor? De nenhum outro lugar senão da espécie humana. Mas este é também um animal que tem necessidade de um senhor. Seja qual for o começo, não se vê como o homem pode se dar, para estabelecer a justiça pública, um chefe que também seja justo — ele pode pro­curá-lo numa única pessoa ou num grupo de pessoas escolhi­das para isso. Pois todos eles abusarão sempre de sua liberda­de, se não tiverem acima de si alguém que exerça o poder segundo as leis. O supremo chefe deve ser justo por si mesmo e todavia ser um homem. Esta tarefa é, por isso, a mais difí­cil de todas; sua solução perfeita é impossível: de uma madei­ra tão retorcida, da qual o homem é feito, não se poder fazer nada reto. (KANT, 1784/1986, p.15-16).3

Deve-se acrescentar a esta passagem uma exposição breve da tarefa “mais difícil de todas”, Kant a faz em poucas palavras: “uma sociedade na qual a liberdade sob leis exteriores encontra-se ligada no mais alto grau a um poder irresistível, ou seja, uma constituição civil perfeitamente justa, deve ser a mais elevada tarefa da natureza para a espécie humana” (KANT, 1784/1986, p.14). O que será este “poder irresistível?” Ele o problematiza a partir da referida “necessidade de um senhor”. Esta “necessidade” é retrabalhada dentro do “ponto de vista metafísico”, a partir do qual se acessa, também, a história universal e, finalmente, se visualiza o progresso da marcha da humanidade no caminho do seu aperfeiçoamento. Assim, mantém-se a força do “ponto de vista metafísico” dentre os auspícios da historia universal em uma sociedade humana que vai acomodando com sua “necessidade de um senhor”.

O direcionamento mais efetivo está entremeado pela “tarefa mais difícil” a qual contém como pano de fundo a “necessidade de um senhor”. Este tipo de direcionamento é um modo mais concreto, ou o resultado de aprofundamento em direção ao mundo. Tal aprofundamento faz com que o “ponto de vista metafísico” se torne uma orientação mais remota. Sem dúvida, há uma efetividade na busca de resolver esta “tarefa... a mais difícil de todas” que é a de uma sociedade com uma “constituição civil perfeitamente justa”. Como o homem possui a necessidade de um senhor, a tentativa de cumprir esta tarefa, implica uma espécie de direcionamento do ser humano.

Nesta seção vimos apenas algumas contribuições da filosofia ao tema do direcionamento do ser humano em um aspecto amplo. Primeiramente, em Heidegger vimos que, no tempo da vigência do domínio técnico, o homem se aproxima de uma pulsão animal como o “instinto”, mas, em princípio, poderia não ter esta aproximação. Em Kant, vimos que há um direcionamento, orientado pelo um ponto de vista metafísico, que descortina um plano para o aperfeiçoamento da humanidade no percurso histórico. Este direcionamento possui uma efetividade concreta na medida em que se busca cumprir a tarefa de encontrar uma sociedade com uma constituição “perfeitamente justa”, conjugada com a “necessidade de um senhor”. Em ambos os casos há um elemento concreto que complexifica a reflexão filosófica: em Heidegger é a técnica; e em Kant é a tarefa mais difícil da busca de uma sociedade justa. Na próxima seção vamos procurar destacar alguns elementos concretos da nossa época atual. Estes elementos concretos não existiam na época de Kant e não estavam ainda desenvolvidos na época em Heidegger e de seus escritos.

2. O direcionamento humano na nossa época

Nestas duas décadas do século XXI, o “cerco” da tecnologia em relação ao ser humano se realizou de forma concreta. Este “cerco”, mencionado antes por Heidegger, necessita de que o ser humano seja convocado para participar em uma incessante inteiração com a tecnologia. Nesta inteiração, um aspecto do direcionamento atual se destaca: ele não carece mais de ser analisado, ou mesmo de ser visualizado partir de um ponto de vista metafísico. O ponto de vista metafísico, seja qual for, é mais adequado a uma reflexão abstrata. Mas, quando o direcionamento está configurado em uma relação com a tecnologia, é justamente uma perspectiva algorítmica que se apresenta como substituta de quaisquer pontos de partida abstratos. Portanto, o novo ponto de partida agora se encontra nos elementos concretos da realidade que são coletados, classificados e analisados matematicamente por meio de um algoritmo.

Assim, o direcionamento atual pode se desenvolver em vista de objetivos bem definidos. Sendo que, o meio principal para a implantação do direcionamento é o uso de modelos e a elaboração de perfis para classificar indivíduos (clientes, profissionais, eleitores etc.). Pois, estes perfis, elaborados pelos modelos algorítmicos, canalizam a informação e efetivam uma modificação do comportamento humano de uma forma gradativa, que é mais eficiente do que o poder dos discursos edificantes gerais e da leitura de livros do acervo intelectual do Ocidente.

A identificação de padrões já existentes e a intervenção para direcionar o comportamento são acompanhadas por experimentos tecnológicos e sociais que possuem como horizonte os mais diversos tipos de demandas: as demandas econômicas, as demandas políticas etc. E, estes resultados concretos podem ser os mais diversos: aumento das vendas de um produto, a vitória em uma eleição, a polarização da sociedade referente à moral etc. O mais importante é que o trabalho de modelagem algorítmica e o posterior direcionamento do resultado dessa modelagem sobre a atenção e o comportamento humano, não tem como ponto de partida uma posição abstrata sobre “leis naturais universais” ou sobre a racionalidade humana e não há, pois, um alicerce filosófico como no passado. Trata-se de demandas concretas que visam objetivos concretos e estes são perseguidos circunstancialmente.

Neste sentido, o conjunto de elementos com os quais se desenvolve o direcionamento do humano abarca outras áreas de conhecimento que são diferentes da filosofia. E, é a partir destas áreas que podemos encontrar subsídios críticos que nos permitem fazer uma reflexão das relações entre tecnologia e o comportamento humano, dentro desse foco do direcionamento.

Uma destas áreas é o jornalismo, representado pelo jornalista Frank Foer, que escreveu uma série de críticas referentes à migração da mídia impressa para âmbito digital. Em uma das passagens de seu livro de 2017 (data da publicação do original em língua inglesa, publicado em português na data de 2018), Foer descreve um exemplo de experimento realizado por empresas do mundo digital:

Não é muito difícil para um mecanismo de busca influenciar a opinião pública. Um estudo publicado na revista oficial da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos tentou simular o funcionamento do Google. Pesquisadores criaram uma ferramenta falsa, que chamaram de Kadoodle, e simularam eleição com candidatos inventados. No experimento, os autores ficavam o tempo todo reordenando os resultados das buscas e então pediam aos entrevistados que revelassem sua opinião. Ficou claro que a ordem dos resultados num mecanismo de busca faz muita diferença: “Em todos os casos, as opiniões migravam na direção do candidato favorecido nos rankings. As preferências em termos de confiança, gosto e voto mudavam de forma previsível.” (FOER, 2018, p.118).

Esta forma de direcionamento foi antecipada por Eli Pariser, ativista da internet livre, em uma publicação de 20114, explica sinteticamente o processo de acesso à informação, cuja função é prover um campo fértil para o direcionamento da atenção e do comportamento.

Pariser faz uma comparação entre a mídia tradicional e a mídia digital. No caso da uma mídia tradicional, como por exemplo, no jornal impresso, sabemos que algumas das suas partes nós não as lemos, porque não queremos, mas sabemos que elas estão presentes e disponíveis no material impresso que temos à mão. Mas, na mídia digital é diferente: não sabemos das partes que provavelmente não leríamos, pois estas não estão mais disponíveis. Os algoritmos da mídia digital decidem previamente, a partir do nosso histórico de navegação e de outros recursos como perfis e listas, aquilo que vamos ler. Esta decisão pode incluir interesses econômicos e políticos. Em outras palavras, há um filtro algorítmico que age no conjunto das informações que chegam eletronicamente a nós. Assim, nas palavras de Eli Pariser:

Na bolha de filtros, a situação é diferente. Nem chegamos a enxergar as coisas que não nos interessam. Não estamos cientes, nem mesmo de forma latente, de que existem grandes eventos e ideias dos quais não ficamos sabendo. Tampouco podemos examinar os links que estamos vendo e avaliar o quanto são representativos se não compreendemos como é o ambiente mais amplo a partir do qual esses links foram selecionados. Como todo estatístico sabe, é impossível sabermos o quanto uma amostra é parcial se examinarmos apenas a amostra: precisamos de algo com o que compará-la. (PARISER, 2012, p.97).

As possíveis explorações da “utilidade” destes “filtros” são as mais diversas possíveis. Eles podem conduzir a um formato de visão de mundo e, por isto, favorecer o direcionamento humano. Há uma disputa entre diferentes empresas para alcançar um uso mais aperfeiçoado (ou mais “eficiente”) destas “bolhas de filtros”. O centro da disputa tem como foco o engajamento do usuário em uma plataforma on line e os modos como este engajamento pode ser vendido, convertendo-se em lucro. Por causa destes aspectos, a análise do direcionamento humano somente faz sentido se nos aproximarmos dos fenômenos mais recentes, destacando os usos de filtros e as consequências deste uso. Para contribuir com esta aproximação, uma passagem do sociólogo Maurizio Lazzarato menciona algumas empresas e especula sobre o papel que desempenham:

O poder especificamente capitalista da disciplina do local de trabalho, por exemplo, não incide sobre a “culpa e o prejuízo”, afirma Focault, mas sobre a “virtualidade do comportamento”. Intervém de algum modo antes mesmo da manifestação do comportamento. De maneira semelhante, as técnicas biopolíticas agem aonde as coisas vão se produzir “em função de acontecimentos ou séries de acontecimentos possíveis”. O poder consiste exatamente no fato de “tornar possível”. É justamente o discurso das grandes empresas digitais (Google, Amazon, Facebook etc.) do Vale do Silício. Através dos “dados”, elas vão agir sobre os comportamentos possíveis antecipando-os. (LAZZARATO, 2019, p. 74).

As palavras de Lazzarato possuem um alcance mais amplo que implica os temas do poder e da biopolítica, mas para o nosso artigo, o foco é mais específico: a ação sobre “comportamentos possíveis”. Em busca disso, as plataformas on line visam manter os usuários potencialmente em alerta, engajados. Este engajamento pode ser compreendido como uma forma de direcionamento do comportamento, ainda que seja uma preparação necessária para disponibilizar, futuramente, um direcionamento mais acurado para alguém que pague. O conjunto resulta em um efeito que altera uma situação real, seja com um aumento de vendas, seja com uma revolta contra as instituições democráticas, seja outro efeito. Depende dos objetivos do pagante do direcionamento comprado. As plataformas fornecem os dados necessários.

A preparação para um direcionamento futuro significa um trabalho para manter a atenção do usuário e o apego do mesmo dentro nos meios digitais em questão. O direcionamento efetivo, aquele altera uma situação real, fazendo o comportamento passar de virtualmente possível para efetivo, dependerá de uma negociação. Isto significa que o direcionamento do comportamento humano depende dos objetivos dos contratantes em uma comercialização que compra os dados, compra a análise matemática-estatística dos dados e compra o modelo resultante com a menor margem de erro possível. Esta negociação, que vende o comportamento “virtualmente possível” do usuário, ocorre entre empresas de tecnologia, políticos, governos e para quem quiser e puder pagar.

Uma descrição resumida da retenção do usuário, em uma rede social, encontra-se no livro de Giuliano Da Empoli:

O maquinário hiperpotente das redes sociais, suspenso sobre molas mais primárias da psicologia humana, não foi concebido para nos confortar, mas, pelo contrário, veio à luz para nos manter e num estado de incerteza e de carência permanente. O cliente ideal de Sean Parker, de Zuckerberg e de todos os outros é um ser compulsivo, empurrado por uma força irresistível para voltar à plataforma dezenas, centenas, milhares de vezes por dia, fissurado por essas pequenas doses de dopamina da qual se tornou dependente. Um estudo americano demonstrou que, em média, cada um de nós dá 2617 toques por dia na tela do nosso smartphone. Se, dúvida, não é o comportamento de uma pessoa que esteja sã de espírito. Está mais próximo do modo de agir de um junkie em fase terminal [...] (EMPOLI, 2020, p.76).

O Facebook é um exemplo paradigmático do desenvolvimento das redes sociais. A empresa surgiu em 2004 e foi gradualmente saindo do âmbito universitário (e ensino médio) para abranger todas as pessoas que desejassem se tornar usuários. Em 2012 atingiu um bilhão de usuários. Em 2013, um ano depois, Bauman publicou um livro em co-autoria com David Lyon. Ele ressaltou o sucesso das redes sociais (“websites sociais”) e especulou sobre quais seriam as causas deste sucesso:

Ter o nosso ser completo, com verrugas e tudo, registrado em arquivos publicamente acessíveis parece ser o melhor antídoto profilático para a toxicidade da exclusão – assim como uma forma poderosa de manter distante a ameaça de expulsão; é, na verdade, uma tentação a que poucos praticantes da existência social, reconhecidamente precária, se sentiriam com força suficiente para resistir. Creio que a história do recente e fenomenal sucesso dos “websites sociais” é bom exemplo dessa tendência. (BAUMAN, 2013, publicada no original em 2013, p.30).

Bauman fez, também, uma observação que abre a possibilidade de crítica do caráter individual do empreendedorismo. Bauman aponta alguns aspectos que podem ser explorados criticamente, quando menciona a relação entre “mercadoria vendável” e “tarefa individual”. Isto mostra que direcionamento do comportamento humano se atomizou, pois se procura a exatidão mesmo no âmbito individual:

Permita-me repetir: os membros da sociedade de consumidores são, eles próprios, mercadoria de consumo, e é essa qualidade que os torna integrantes legítimos dessa sociedade. Tornar-se e continuar a ser uma mercadoria vendável é o mais poderoso motivo de preocupações do consumidor ainda que quase sempre oculto e poucas vezes consciente, que dirá explicitamente declarado. É por seu poder de aumentar o preço de mercado do consumidor que o poder de atração dos bens de consumo – atuais ou potenciais objetos de desejo que desencadeiam a ação do consumidor – tende a ser avaliado. “Fazer de si mesmo uma mercadoria vendável” é um trabalho do tipo “faça você mesmo”, uma tarefa individual. Observemos: “fazer de si mesmo” não apenas tornar-se, este é o desafio e a tarefa. (BAUMAN, 2013, p.39).

A observação de Bauman ilustra o caminho que foi seguido pela infraestrutura tecnológica em face do desenvolvimento digital5. Aconteceu, então, uma convergência entre a leitura da vida humana por meio de dados e a técnica direcionadora por meio de sugestões para alterar modos de vida de uma forma cada vez mais atomizada ou individual. Portanto, a busca de uma precisão ou de acurácia nas previsões de um modelo foi algo cada vez mais almejado por cientistas de dados.

Um autor mais recente do que Bauman, o filósofo de origem coreana e naturalizado alemão: Byung-Chul Han, doutor em filosofia pela Universidade de Freiburg, agrega alguns insights enriquecedores:

Já o regime de vigilância digital que, nesse meio tempo, adquire traços totalitários, enterra a ideia liberal de liberdade. A pessoa humana é degradada a uma entrada de dados geradora de lucros. O capitalismo se desenvolve, hoje, em um capitalismo de vigilância. Vigilância gera capital. Somos permanentemente vigiados e conduzidos por plataformas digitais. Nossos pensamentos, sentimentos e intenções são lidos e explorados. A internet das coisas amplia a vigilância até a vida real. Os wearables entregam também nosso corpo ao acesso comercial. Somos conduzidos como marionetes por fios algorítmicos. O Big Data como instrumento biopolítico torna o comportamento humano prognosticável e controlável. A psicopolítica digital nos derruba em uma crise de liberdade. (HAN, 2020, p.109-110)

Diante deste contexto, principalmente constatado por Bauman e Han, podemos adentrar em alguns aspectos sobre o tema específico do aprendizado de máquina (Machine Learning). Convém mencionar que antes da pandemia de Covid 19, os algoritmos de aprendizado de máquina (Machine Learning) realizavam o seu trabalho de modelar o comportamento humano, pois é algo que já vem se desenvolvendo desde o início do século XXI.

A tarefa básica dos softwares de aprendizados de máquina é organizar os dados brutos, fornecido por uma fonte, geralmente as redes sociais, os repositórios institucionais, os dados que empresas disponibilizam ou vendem etc. Esta organização dos dados visa um padrão que orientará a construção de um modelo. Uma vez que o modelo seja finalizado, ele servirá para vários propósitos. Por exemplo, um modelo pode emitir uma decisão (output) e o humano fará o trabalho de repassar esta decisão, como no caso de um gerente de banco que repassa a informação ao cliente sobre se este conseguirá ou não um empréstimo. Ou, o modelo pode apenas auxiliar uma decisão que será tomada. Neste caso, ele influi na decisão de um gerente arespeito de um empréstimo ou mesmo de um juiz a respeito de uma sentença, mas não é o próprio modelo que emite a decisão, neste segundo caso, ele é consultado.

As características gerais de um modelo são descritas por Cathy O’Neal em seu livro Algoritmos: armas de destruição em massa (2020). A sua apresentação breve é a seguinte: “[...] modelos são, por sua própria natureza, simplificações. Nenhum modelo consegue incluir toda a complexidade do mundo real ou as nuances da comunicação humana. Inevitavelmente alguma informação fica de fora.” (2020, p.33). Esta informação que “fica de fora” não é integrada ao modelo justamente pelo modo como os dados são trabalhados (ou são “limpos”) durante a construção do mesmo. Esta construção prévia é orientada por objetivos determinados:

Para criar um modelo, então, fazemos escolhas sobre o que é importante o bastante para ser incluído, simplificando o mundo numa versão de brinquedo que possa ser facilmente entendida, e a partir da qual possamos inferir fatos e ações importantes. Esperamos que o modelo lide com apenas um trabalho e aceitamos que irá ocasionalmente agir como uma máquina ignorante com enormes pontos cegos (O’NEAL, 2020, p.33-34).

A própria Cathy O’Neal elaborou e trabalhou com modelos no mercado financeiro antes de se tornar uma ativista. Um modelo depende de um padrão e, os detalhes deste padrão obedecem a determinados filtros que designam as “escolhas” feitas por um programador. Os programadores seguem orientações de escolha conforme os objetivos de quem os contrata. Devido a isto, O’Neal afirma que os “pontos cegos de um modelo refletem o julgamento e prioridades de seus criadores.” (2020, p.34), isto significa que os modelos refletem “objetivos e ideologia” (2020, p.35).

O’Neal se tornou uma crítica de modelos que não são revisados mesmo quando os seus outputs representam uma clara injustiça ou aprofundam um estado de desigualdade social já existente. Neste sentido, ela adverte que, sem uma modificação nas “escolhas”, ou seja, sem modificações algorítmicas internas aos modelos, eles continuarão se aperfeiçoando em decisões que são injustas e aprofundando a desigualdade entre pobres e ricos. Em suma, na concessão de um empréstimo, ou na decisão de elevar o preço de um seguro, os efeitos dos outputs, ou saídas de um modelo (as decisões do “sistema”), podem se tornar cada vez mais destrutivas. E, por que os modelos não são revisados ou modificados? Porque geram lucratividade. Mas, situação problemática do contexto se torna cada vez mais insustentável.

Dentre vários exemplos apresentados por O’Neal, selecionamos um deles para ilustrar o modo como a coleta de dados, submetida a um viés ou desvio (Bias) que deveria ser corrigido, está contido em modelos que orientam negócios, gerando assim situações injustas e absurdas:

Seguros de carros, por exemplo, em 2015, pesquisadores do Consumer Reports conduziram um extenso estudo nacional buscando por disparidades nos preços. Eles analisaram mais de dois bilhões de cotações de preços de todas as grandes seguradoras para clientes hipotéticos de cada um dos 33-419 CEPs dos EUA. O que encontraram foi extremamente injusto e, como vimos no último capítulo, baseado em escores de crédito.

As seguradoras tiram esses escores a partir de relatórios de crédito, e então, usando algoritmo proprietário, criam suas próprias classificações ou e-escores. Mas o Consumer Reports descobriu que os e-escores, que incluem todo o tipo de dados demográficos, muitas vezes valem mais do que o histórico do motorista. Em outras palavras, o modo como você administra dinheiro pode importar mais do que como dirige o carro. No estado de Nova York, por exemplo, uma queda na classificação de crédito de um motorista de “excelente” para apenas “bom” poderia elevar o seguro em US$ 255. E, na Flórida, adultos com históricos limpos de direção e baixos escores de crédito pagam em média US$ 1.552 a mais do que os mesmos motoristas com escores excelentes e com uma condenação por dirigir embriagado. (O’NEAL, 2020, p.255-256).

Retomando o nosso tema central, neste caso o direcionamento do comportamento humano ocorre segundo dois tipos:

(1) com a obediência “cega” aos resultados de um software que recomenda aumentar o valor do seguro para motoristas que são bons condutores, mas possuem um crédito ruim, deixando que um mau condutor (com bom crédito) tenha um seguro mais barato. Neste caso o humano serve como um intermediário entre o resultado oferecido pelo software e quem solicita um seguro. O agente humano apenas repassa. E, a decisão sobre o preço do seguro é feita pelo modelo gerado em uma base de dados (dataset) alimentada por e-escores de crédito e, eventualmente, por outras variáveis (como dados demográficos: localização e classificação do bairro de moradia).

(2) o direcionamento humano ocorre na medida em que os próprios humanos, sejam aqueles que repassam as decisões do modelo, sejam aqueles que recebem estas decisões são submetidos a um processo invisível. Neste caso, o direcionamento alcança um grau um pouco mais além, pois a situação atinge não somente o mero intermediário (o gerente que decide sobre o crédito), mas também o próprio cliente. Esta invisibilidade do processo é generalizada e dificulta uma crítica ao próprio direcionamento, resultando em uma resignação perante as decisões do “sistema” ou do modelo de aprendizado de máquina. E, se há algum efeito colateral como injustiça ou desigualdade, mesmo assim, isto pode não ser levado em conta. O lucro que o modelo proporciona alcança mais destaque.

A conclusão desta seção se estabelece com estes dois últimos aspectos referidos acima. O ser humano é um intermediário que repassa a decisão tomada pelo modelo e há um direcionamento em termos mais amplos, pois sendo intermediário ou não, o ser humano está submetido a um processo de avaliação que lhe é invisível. O direcionamento neste segundo modo, mais amplo, determina um desenho de sociedade. No exemplo, retirado do livro de Cathy O’Neal e mostrado acima, um motorista não precisa ser exatamente um bom motorista para ter um prêmio de seguro mais barato. Ele precisa ser apenas alguém que não tem problemas de crédito. Isto favorece o condicionamento da sociedade como um todo, incluindo um desvio potencial do comportamento e consolidando situações de desigualdade.

Conclusão

Retomemos a pergunta que inspirou a nossa análise e que necessita de uma resposta. Esta pergunta tinha como base o “nós”, ou seja, o conjunto dos humanos, seja como espécie, seja como população. A partir desta base emergiu a seguinte interrogação: quais são as características do direcionamento ao qual “nós”, os humanos, estamos submetidos? Para responder a esta pergunta, foram realizados dois movimentos: um recorte de algumas posições encontradas na filosofia e uma abordagem sobre os fenômenos da época atual.

No que diz respeito à primeira seção, fizemos um recorte da história da filosofia, mediante uma escolha possível entre outras. Esta escolha optou por trechos de Heidegger e Kant. Com Heidegger conseguimos perceber um vínculo mais estrito entre o homem da técnica e o comportamento animal, análogo a um comportamento por instinto. Assim, o homem da técnica, que possui pendente o esclarecimento filosófico da sua diferença específica perante outros seres vivos, apresenta a possibilidade da obediência cega, consignada na pulsão de calcular. Em Kant, temos a ênfase no esclarecimento e no impulso para sair da menoridade culpada. Além disto, no texto “A história universal de um ponto de vista cosmopolita” há a um ponto de vista metafísico que possibilita visualizar um pretenso progresso da humanidade em direção ao seu aperfeiçoamento. Mediante este progresso visualizável e a tarefa subsistente, permanece um elemento complicador: o ser humano possui a necessidade de um senhor. Diante disto, o conjunto da primeira seção mostrou que o homem, no contexto da técnica, pode ter um comportamento de obediência cega e, além disto, o homem tem a necessidade de um senhor na sua dura tarefa de conseguir alcançar uma “constituição civil perfeitamente justa”. Este quadro inicial foi completado pela descrição de fenômenos contemporâneos da segunda seção.

A segunda seção mostrou que o “cerco” da técnica sobre o homem, anunciado por Heidegger, se tornou cada vez mais presente. O homem, vinculado aos dispositivos técnicos atuais, pode ser considerado como uma espécie de “junkie terminal”, tal como se refere Empoli. Neste caso, estão novamente presentes: a obediência cega análogo ao instinto animal (Heidegger) e a “necessidade de um senhor” (Kant). Mas, este contexto de dominação pela técnica se amplia para além de uma ação sobre o indivíduo. Esta ampliação se manifesta nos efeitos dos modelos preditivos algorítmicos que regem as relações da sociedade: relaçãoe econômicas, relações políticas, redes sociais etc. Estes modelos podem conter erros de difícil constatação e, assim, aprofundar a injustiça e favorecer a desigualdade, tal como demonstra Cathy O’Neal. Há, portanto, um grande incremento do universo da técnica em relação ao mundo em que Heidegger vivia e, evidentemente, em relação ao mundo da revolução industrial em que Kant vivia.

Finalmente, a resposta para a nossa pergunta sobre quais são as características do direcionamento a que estamos submetidos é a de que o universo da técnica, ou a simples convivência com os dispositivos técnicos, se ampliou e assumiu um caráter mais efetivo com relação ao direcionar os humanos. No mundo da técnica somos acessados por nossa capacidade de agir por obediência cega como se fosse por instinto. E, no mundo da técnica somos explorados dentro da concepção da uma necessidade de um senhor que, paradoxalmente, se reverte para dentro da interioridade humana, presente como uma auto-cobrança individual, como na mentalidade acrítica que encoraja o empreendedorismo.

Neste contexto, uma solução para o direcionamento ao qual estamos submetidos deve buscada na criação e preservação de um espaço de discussão dentro do qual a filosofia precisa ajudar com os seus procedimentos argumentativos usuais. Este espaço de discussão valoriza os campos da filosofia como ética e filosofia política, mas deve incluir a tecnologia na discussão.

Uma forma de trazer o tópico da tecnologia para dentro do espaço da filosofia seria o reconhecimento de publicações escritas por pessoas que conhecem o mundo da ciência da computação e que, além disso, realizam um trabalho crítico. Exemplos notáveis são as obras de vários autores, tais como Eli Pariser e Cathy O’Neal citados neste artigo. Há também a socióloga Shoshana Zuboff, Jaron Lanier e uma obra mais recente de Rob Reich, Jeremy M. Weinstein, Mehran Sahami: System Error: where big tech went wrong and how we can reboot, 2021, para mencionar outros autores importantes. Estes não foram trabalhados neste artigo, mas devem expostos para estimular a própria filosofia. Enfim, seria importante um envolvimento maior da filosofia em tópicos mais técnicos que dizem respeito ao futuro da espécie humana.

Referências

BAUMAN, Zygmunt. Vigilância Líquida: Diálogos com David Lyon. Rio de Janeiro: Zahar, 2013

EMPOLI da, Giuliano. Os engenheiros do caos: como fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. São Paulo: 2020.

HEIDEGGER, Martim. Ensaios e conferências. Petrópolis: Editora Vozes, 2001

HEIDEGGER, Martim. Serenidade. Lisboa: Instituto Piaget: 2000.

KANT, Immanuel. Textos seletos. Petrópolis: Editora Vozes, 1974, edição bilíngüe.

KANT, Immanuel Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita. São Paulo: Brasilense, 1986. FOER, F. O mundo que não pensa: a humanidade diante do perigo real da extinção do Homo Sapiens. Rio de Janeiro: LeYa, 2018.

PARISER, Eli. O filtro invisível: o que a internet está escondendo de você. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.

LANIER, Jaron. Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2018.

LAZZARATO, Maurizio. Fascismo ou revolução? O neoliberalismo em chave estratégica. São Paulo: N-1 Edições, 2019.

HAN, Byung-Chul. Sociedade Paliativa: a dor hoje. Petrópolis: Editora Vozes, 2021.

O'NEAL, Cathy. Algoritmos de destruição em massa: como o big data aumenta a desigualdade e ameaça a democracia. Santo André: Editora Rua do Sabão, 2020.

ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2021.

REICH, R.; SAHAMI, M.; WEINSTEIN, Jeremy M. System Error: where big tech went wrong and how we can reboot. London: Hodder & Stoughton, 2021.

Notas

2 A edição é bilíngüe, por causa disto a sequência de páginas possui um salto na sequência normal, assim, passando do final da p.104 para a outra correspondente. Sendo que a página 105 é em alemão, então continuação do texto português acontece na página 106.

3 Grifos do autor.

4 Data da publicação do original em língua inglesa.

6 Com a iniciativa de coleta e personalização da Amazon no início do século, o surgimento das redes sociais a partir de 2004 e a personalização do site de buscas do Google desde 2009, houve um desenvolvimento bem sucedido de aplicações de softwares preditivos elaborados por processos de aprendizado de máquina (Machine Learning). Este desenvolvimento foi possível por causa da base de dados gigante que se criou (Big Data). E, algoritmos baseados em matemática e estatística conseguiram encontrar padrões de comportamento nos dados (perfis de comportamento), permitindo a sua exploração para diversos fins pré-determinados.

Notas de autor

1 Doutor(a) em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC/RS), Porto Alegre – RS, Brasil. Professor(a) da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Caxias do Sul – RS, Brasil.
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