Servicios
Descargas
Buscar
Idiomas
P. Completa
A teoria do destino condicional no Corpus hermeticum 12.5-9
David Pessoa de Lira
David Pessoa de Lira
A teoria do destino condicional no Corpus hermeticum 12.5-9
The theory of conditional fate in the Corpus hermeticum 12.5-9
Griot: Revista de Filosofia, vol. 23, núm. 1, pp. 209-228, 2023
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: O tópico do presente artigo é a teoria da εἱμαρμένη [heimarmenē]. Ele analisa focalmente a relação da teoria da εἱμαρμένη do Corp. Herm. 12.5-9 e de fontes médio-platônicas. Os resultados da análise se limitam a responder as teorias da εἱμαρμένη do hermetismo e do médio-platonismo. No entanto, existem diferentes pontos de vista sobre a teoria da εἱμαρμένη no médio-platonismo. Assim, o escopo envolve principalmente o Corp. Herm. 12.5-9, De Fato de Plutarco de Queroneia, De Doctrina Platonis de Alcínoo e De Platone de Apuleio de Madaura. O presente artigo demonstra, por meio do método filosófico histórico-comparativo, que a teoria da εἱμαρμένη do Corp. Herm. 12.5-9 é predominantemente médio-platônica apesar das incidências das proposições (neo)estoicas. Assim, em particular, este artigo assume que o Corp. Herm. 12.5-9 tem uma combinação da heimarmenologia com a teoria platônica do νοῦς [nous]. Primeiramente, serão apontados os significados de εἱμαρμένη e seus correlatos no Corp. Herm. como um todo em comparação com o platonismo. Depois, discutir-se-á a escolha de ações prudentes e apaixonadas pela alma no Corp. Herm. 12.-5-9. Em seguida, procurar-se-á explicar quais são as implicações da εἱμαρμένη no ἐλλόγιμοι (prudentes) no Corp. Herm. 12.-5-9. Por fim, será demonstrado que este texto é influenciado pela teoria do destino condicional ou hipotético diferentemente de uma doutrina puramente estoica.

Palavras-chave: Médio-Platonismo, Corpus Hermeticum, εἱμαρμένη, Fatum, Destino condicional ou hipotético.

Abstract: The topic of this article is εἱμαρμένη theory. It analyzes focusly the relationship of εἱμαρμένη theory of the Corp. Herm. 12.5-9 and Middle Platonic sources. The results of analysis limits to answer to εἱμαρμένη theory of Hermetism and Middle Platonism. Nevertheless, there are different points of view about εἱμαρμένη theory in Middle-Platonism. Therefore, the study is limited in scope, involving mainly the Corp. Herm. 12.5-9, De Fato by Plutarch of Chaeronea, De Doctrina Platonis by Alcinous and De Platone by Apuleius of Madaura. This article points out, through the historical-comparative philosophical method, that εἱμαρμένη theory of the Corp. Herm. 12.5-9 is predominantly Middle Platonic despite of occurrences of the (neo)Stoic propositions. So, in particular, this paper assumes that the Corp. Herm. 12.5-9 has a combination of heimarmenology with the Platonic theory of the νοῦς. First, one will point out the meanings of εἱμαρμένη and its correlates in the Corp. Herm. as a whole in comparison with Platonism. Afterwards, one will discuss the choice of prudent and passionate actions by the soul in Corp. Herm. 12.-5-9. Then, one will seek to explain what are the implications of εἱμαρμένη in the ἐλλόγιμοι (wise) in the Corp. Herm. 12.-5-9. Finally, it will be shown that this text is influenced by the theory of conditional or hypothetical fate unlike a purely Stoic doctrine.

Keywords: Middle Platonism, Corpus Hermeticum, εἱμαρμένη, Fatum, Conditional or hypothetical fate.

Carátula del artículo

Artigos

A teoria do destino condicional no Corpus hermeticum 12.5-9

The theory of conditional fate in the Corpus hermeticum 12.5-9

David Pessoa de Lira1
Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Griot: Revista de Filosofia, vol. 23, núm. 1, pp. 209-228, 2023
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Recepción: 04 Septiembre 2022

Aprobación: 30 Enero 2023

Introdução

5 — Então, ó pai, o discurso acerca da heimarmenē transmitido anteriomente a mim corre o risco de ser refutado. Pois se tem sido decretado totalmente a este alguém adulterar ou praticar sacrilégios ou cometer algum outro mal, também é punido o que tem cometido a ação pela necessidade e pela heimarmenē? — Todas as coisas são obras da heimarmenē, ó filho, e sem ela não existe nenhuma das coisas corporais: nem coisa boa nem coisa má vêm a existir. E tem sido decretado também sofrer a coisa boa que foi feita; e, por isso, age para que sofra aquilo pelo qual se apaixona porque agiu. 6 Porém <o> discurso do agora não é acerca do vício e da heimarmenē. De fato, em outros [discursos] acerca dessas coisas temos falado; porém agora para nós o discurso é acerca do nous, o que o nous pode ser e como é diferente, nestes homens, mas modificado nos viventes irracionais; e também que nos outros viventes não é benfeitor, mas dissemelhante em todas as coisas, queimando o irascível e o concupiscente, e também é necessário compreender que dentre esses há os homens excelentes e os irracionais, e todos os homens estão sujeitos à heimarmenē, e ao engendramento e à metábole; pois o essas coisas são princípio e o fim da heimarmenē. 7 E, de fato, todos os homens sofrem as coisas decretadas, e os excelentes, dos quais dissemos que o nous os conduz, não sofrem semelhantemente como os outros, mas tendo se livrado do vício, não sendo viciados, não sofrem.

— Como novamente dizes [isso], ó pai? O adúltero não é mau? O assassino não é mau, e todos os outros? — Mas o excelente, ó filho, não sofrerá tendo adulterado, mas como tendo adulterado, nem tendo assassinado, mas como tendo assassinado, e é impossível fugir da qualidade da metábole, assim como do engendramento; e ao que possui o nous é possível se furtar do vício. 8 Por isso, também eu ouvi o Agathos Daimon dizendo sempre, e se tivesse dado por escrito, certamente o gênero humano teria sido devedor; pois somente ele, ó filho, verdadeiramente, como um deus primogênito, tendo visto todas as coisas, proferiu discursos divinos; portanto o ouvi uma vez dizendo que todas as coisas e principalmente os corpos inteligíveis são uma única coisa; e vivemos pela potência e pela energia e pelo Aion; e que o nous desse é bom, assim como também a alma dele é boa. Quando este existe, nada é distante dos inteligíveis; assim, com efeito, é possível que o nous, arconte de todas as coisas e a alma de Deus, faça o que ele quer.

9 Tu, porém, compreende e adscreve este discurso em relação à pergunta que inquiriste a mim nos [discursos] anteriores: digo, [os discursos] sobre a heimarmenē do nous. Se, pois, certamente eliminares os discursos discordantes, ó filho, descobrirás que o nous, a alma de Deus, verdadeiramente prevalece sobre todas as coisas, sobre a heimarmenē e sobre a lei e sobre todas as outras coisas; e nada é impossível a ele: nem [é impossível a ele] colocar a alma humana acima da heimarmenē nem [é impossível a ele] colocar aquela que tem sido negligente, como existe, abaixo da heimarmenē. E sejam ditas essas melhores coisas do Agathos Daimon sobre tal assunto (tradução própria – grifo nosso). 2

O presente artigo trata do conceito de εἱμαρμένη [heimarmenē] no Corpus Hermeticum (Corp. Herm.) 12.5-9. De fato, em geral, esse conceito originou teorias complexas e problemáticas em algumas tradições filosóficas no ambiente greco-romano na Antiguidade tardia, podendo resultar em interpretações dissonantes acerca do Corp. Herm. 12.5-9.

De acordo com Walter Scott o conceito de εἱμαρμένη no Corp. Herm. 12.5-9 parece ser estoico (SCOTT, 1985, v. 2, p. 338, 344-345). No entanto, Nicola Denzey Lewis mostra que uma discussão da εἱμαρμένη na Literatura Hermética não pode progredir “sem abordar desenvolvimentos filosóficos significativos no médio-platonismo (tradução própria)”.3 Ele observa que há, no médio-platonismo, inovações na forma de falar da εἱμαρμένη que tentam resolver o problema da fatalidade e do livre-arbítrio humano com certa perspicácia. Assim, ele se concentrou nas contribuições do platonista Numênio de Apameia (fl. 150–176 EC) (LEWIS, 2013, p. 109).4 Lewis dedicou um capítulo ao médio-platonismo, heimarmenē e Corpus Hermeticum. Sua conclusão sobre o Corp. Herm. 12.5-9 não é a seguinte:

Aqui, a influência das visões estóicas gregas mais antigas é evidente [sic no Corp. Herm. 12]. Enquanto a fonte dominante do ensinamento de Poimandres sobre o destino era o Timaeus de Platão, o autor deste texto discute o destino como uma força cósmica impessoal em termos muito semelhantes aos que encontramos nos escritos fragmentários dos antigos estoicos. Mas novo, aqui - e reflexo das ideias médio-platônicas e dos estoicos romanos - é a ideia de que aqueles que possuem razão estão conectados ao Nous divino, o que lhes permite transcender até mesmo o destino. O sábio, então, permanece essencialmente livre, porque rejeitou o vício e existe puramente no nível da mente. Este ensinamento não é incomum… (tradução própria)5

Segundo André-Jean Festugière, depois que se menciona νόμος [nomos] como uma lei penal de julgamento e castigo in fine do §4, criou-se uma objeção sobre a punição de quem já é predeterminado a agir de uma determinada maneira. As dificuldades em responder gerou a justaposição de duas teorias, a saber: uma estoica na introdução (§5) e uma gnóstica no decurso das sessões (§§ 6-9). De qualquer forma, a solução totalmente fatalística do estoicismo não dá conta do tema central da potência do νοῦς [nous]. Então, a atuação da εἱμαρμένη fica restrita aos aspectos corporais. Para Festugière, o tema central do Corp. Herm. 12.5-9 é o conhecimento da potência do νοῦς. Não é de se estranhar que, no Corpus Hermeticum, amiúde, utilize-se de dogmas filosóficos (como o estoico) como pretexto para proceder a um desenvolvimento de temas místicos (NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 193-195). Assim, a doutrina de fundo dos parágrafos 12.5-9 toca a superioridade do intelecto sobre a fatalidade. De acordo com essa doutrina, de fato, como os inteligíveis são um, nesse sentido, não há distância entre eles porque são incorporais, ou seja, eles se identificam um com o outro. Há, pois, uma identidade entre o intelecto no homem e a alma de Deus, de sorte que o intelecto no ser humano pode fazer o que quiser.6

A influência gnóstica, defendida por Festugière, deve ser levada com certa cautela, uma vez que a doutrina gnóstica do hermetismo não tem relação com aquilo que se costuma rotular gnóstico. O conceito de gnose no Corpus Hermeticum está relacionado a um processo propedêutico que envolve reflexões teológicas, cosmológicas e antropológicas (teoantropocósmica), baseando-se em especulações metafísicas. A diferença entre essa gnose e aquilo que se julga como gnosticismo cristão está no fato de que, no hermetismo, γνῶσις não é um conhecimento quase científico de um lugar que transcende toda experiência humana terrestre (gnōsis tōn hyperkosmiōn). Pelo contrário, nos Hermetica, gnose é uma disciplina de reflexões e especulações sobre Deus, o cosmo e o homem, que culmina na visão mística, ou seja, na deificação theōsis (ϑέωσις) do ser humano (LIRA, 2015, p. 309-318).7

Deveras, o Corp. Herm. 12 é um tratado escrito em forma de diálogo, cuja doutrina predominante é um imanentismo otimista, semelhante à doutrina do médio-estoicismo. Provavelmente foi escrito entre os séculos II e III E.C. A primeira parte deste discurso, isto é, Corp. Herm. 12.1-14a, trata especificamente da doutrina do νοῦς, que tem implicações na concepção da fatalidade (LIRA, 2018, p. 298; LIRA, 2021, p. 312-313).

A priori, a discussão da εἱμαρμένη parece levar à suposição de influência estoica no Corp. Herm. 12.5-9. É bem verdade que a influência do estoicismo platonizante ou do platonismo estoicizante dos escritos herméticos se deu principalmente a partir do surgimento das doutrinas estoicas de Possidônio de Apameia (135-51 a.E.C.). No entanto, a doutrina estoica do Corp. Herm. 12 é de um período posterior, durante a época de Marco Aurélio. A doutrina do νοῦς já se fazia presente pelos espiritualistas médio-platônicos entre os estoicos, embora com algumas limitações ontológicas por parte desses. Se, por um lado, algumas instâncias da doutrina estoica da εἱμαρμένη foram aceitas pelos médio-platônicos, por outro lado, ela foi polemizada por esses, apesar da revisão do determinismo de Crisipo de Soli (c. 280 - 208 a.E.C.) ou da combinação entre estoicismo e platonismo de Possidônio de Apameia.8

As questões focadas na relação entre ação, escolha, νόμος e εἱμαρμένη provavelmente são devidas à doutrina platônica da εἱμαρμένη, uma vez que o autor hermético segue ὁ περὶ τῆς εἱμαρμένης λόγος como interpretado em modo médio-platônico. É possível que ele a tenha derivado, através dos mestres médio-platônicos, dos diálogos de Platão. Esse hermetista provavelmente não seguiu nenhum mestre, mas, como os mestres médio-platônicos, ele tinha diante de si alguns conceitos, e, como eles, aceitou a ideia da εἱμαρμένη (REALE, 2008, v. 7, p. 269-317; SILVA, 2012, p. 127-131).

O presente artigo defende que a teoria da εἱμαρμένη do Corp. Herm. 12.5-9 é médio-platônica, demonstrando que esta passagem tenta resolver a aporia entre a coerção do destino e a liberdade noética através da doutrina médio-platônica do νοῦς. Este artigo tem como objetivo apontar semelhanças e diferenças entre as duas teorias da εἱμαρμένη, para que se possa avaliá-las. Para proceder heuristicamente a esta pesquisa, o método de procedimento que será empregado é o histórico-comparativo,9 com foco em uma análise ideológico-conceptual. Por análise ideológico-conceptual, entende-se executar um estudo acurado da história dos conceitos, ideias e motivos, indagando pela origem, pelo sentido e pela aplicação de tais conceitos e ideias incidentes no texto. Por meio de cotejamento ou comparação entre o Corp. Herm. 12.5-9 e textos médio-platônicos, procura-se evidenciar ou salientar as correlações histórico-filosóficas. Como se trata da análise de textos antigos, faz-se necessário proceder de acordo com a história da filosofia e de uma leitura filosófica dos textos.10

Deveras, há muitos pontos em comum entre as heimarmenologias hermética e médio-platônica. O médio-platonismo não tem uma síntese dogmática nem tampouco o hermetismo. Existem diferentes pontos de vista sobre a teoria da εἱμαρμένη no médio-platonismo. Sendo assim, não faz parte do escopo, aqui, considerar todos esses pontos de vista. Não obstante, diferente de Nicola Denzey Lewis, o propósito aqui não é tratar do Corp. Herm. 1 (embora se faça referências), com o qual facilmente se pode estabelecer paralelo com o platonista Numênio de Apameia (fl. 150–176 EC) (LEWIS, 2013, p. 109).11 Infelizmente, ele só empregou uma única fonte de comparação. Destarte, aqui escopo envolve principalmente o Corp. Herm. 12.5-9, De Fato por Plutarco de Queroneia (46-119 E.C.), De Doctrina Platonis de Acínoo (II E.C.) e De Platone de Apuleio de Madaura (c. 124 – após 170 E.C.). Assim, a comparação não é restritiva, mas também não propõe a analisar todas as visões sobre a teoria da εἱμαρμένη no médio-platonismo

A priori, faz-se necessário conhecer os elementos componentes e constituintes e sua proporcionalidade no produto final conglomerado do Corp. Herm. 12.5-9, levando em consideração o hermetismo e suas fontes finais, no seu último estrato. Sendo assim, é pressuposto conhecer diferentes vertentes supostamente influentes que teceram uma rede e teias multicoloridas no hermetismo. No entanto, para isso, convém se assenhorear de uma dúzia de ideias e crenças que refletem mundos de pensamentos diferentes (WILLOUGHBY, 1929, p. 202-203).

Percebe-se que o problema central não está nos supostos elementos traditivos estoicos e platônicos, mas qual é a proporcionalidade ou a incidência desses elementos no quadro geral do hermetismo. Como se pode notar com a afirmação de Festugière, quatro quinto do Corp. Herm. 12.5-9 está envolvido com a relação do νοῦς com a εἱμαρμένη. Isso pressupõe a influência majoritariamente mística e espiritualista que, aqui, entende-se como médio-platônica. Não há dúvida de que o hermetismo surgiu em um ambiente sincrético ou eclético que representa um amálgama de várias correntes e vertentes filosófico-religiosas. Naquele contexto, o sincretismo caracterizou-se pelo encontro de religiões orientais e ocidentais, a helenização de cultos orientais e uma tendência a orientalizar cultos gregos. Na filosofia, a ordem do dia se expressou pelo ecletismo entre várias escolas e pelo amálgama entre religiões e filosofias diferentes (WILLOUGHBY, 1929, p. 203-204).

Como será visto, nas proposições filosóficas não materialistas, o hermetismo aceita o estoicismo. Na mística e espiritualidade de fundo, ele se desenvolve com base no médio-platonismo (NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 193-195; REALE, 2008, v. 7, p. 314).

1. As acepções de εἱμαρμένη e seus Correlatos no Corpus Hermeticum

Deve-se salientar que se pode encontrar a noção de εἱμαρμένη em Platão, mas seu desenvolvimento é escasso. Ele frequentemente se baseia em uma ideia popular de εἱμαρμένη. Por exemplo, em Gorgias 512e, “… πιστεύσαντα ταῖς γυναιξὶν, ὅτι τὴν εἱμαρμένην οὐδ’ ἂν εἷς ἐϰφύγοι (… acreditando nas mulheres que ninguém pode escapar do que tem sido determinado (tradução própria))”.12 Platão também usa o termo εἱμαρμένη para descrever o tempo designado de encarnação das almas ou convocação das almas para encarnar (Phd. 113a, 115a).13

Embora Platão continue empregando εἱμαρμένη para descrever o processo de encarnação e reencarnação das almas, ele se refere ao destino como, em Ti. 41e, νόμοι εἱμαρμένοι (leis determinadas)14 ou como, em Leg. 904c, “ἡ τῆς εἱμαρμένης τάξις ϰαὶ νόμος (a ordem e a lei do que tem sido determinado (tradução própria))”.15 Segundo Platão, em Leges 904c-905d, εἱμαρμένη é limitada às atribuições de ações (PLATO, 1926, v. 2, p. 366-371; POHLENZ, 1967, v. 1, 205-206).

Nota-se que Platão emprega algumas palavras com sentido de destino, tais como χρόνοι, νόμοι, νόμος e τάξις nas expressões εἱμαρμένοι χρόνοι, νόμοι εἱμαρμένοι e ἡ τῆς εἱμαρμένης τάξις ϰαὶ νόμος. Em todo caso, εἱμαρμένοι indica aquilo que é designado, determinado, fixado e que dificilmente poderá ser alterado. Ao que tudo indica, a concepção platônica da εἱμαρμένη diz respeito a algo fixado pré-existencialmente, antes mesmo dos nascimentos dos viventes (εἰς τὰς τῶν ζῴων γενέσεις). O nascimento e a mudança (morte) são algo fixo e determinado. Certamente, o hermetismo concorda que é “impossível fugir da qualidade da metábole, assim como do engendramento (ποιότητα μεταϐολῆς ἀδύνατόν ἐστι διεϰφυγεῖν, ὥσπερ ϰαὶ γενέσεως)”, mas a teoria do fado hermético não aceita uma predeterminação amplamente para todos os acontecimentos: “ao que possui o nous é possível se furtar do vício (tradução própria)” (Corp. Herm. 12.7).16

É justamente a partir da ideia de εἱμαρμένη como lei e ordem (ἡ τῆς εἱμαρμένης τάξις ϰαὶ νόμος) e das atribuições de ações que o médio-platonismo desenvolverá melhor sua heimarmenologia. O hermetismo não se baseia diretamente em Platão, mas na reinterpretação médio-platônica da εἱμαρμένη. Sendo assim, o presente artigo defende que, no Corp. Herm. 12.5-9, o hermetista interpreta a teoria da εἱμαρμένη ao longo de ideias que poderiam muito bem ter sido seguidas por um filósofo médio-platônico, sem, contudo, depender diretamente de Platão.

Os herméticos acreditavam em um mundo além de um mundo corporal e mortal, o qual não está submetido ou sujeito à εἱμαρμένη. Logo, o νοῦς é incorporal. O homem em cuja alma o νοῦς governa vive em um mundo noético onde as forças corporais e físicas não têm implicações e consequências (ἐχομένη αἵρεσις τῶν ϰαϰῶν πλησιζει τῇ σωματιϰῇ φύσει, διὰ <τε> τοῦτο τῷ ἑλομένῳ εἱμαμένη δυναστεύει - Stob. Hermit. Exc. 18.3).17 Tal homem pode escapar da influência da εἱμαρμένη, permitindo que apenas seu corpo esteja submetido à vontade dela (ϰαὶ ἐᾶν τὴν εἱμαρμένην ϑέλει ποιεῖν τῷ ἑαυτῆς πηλῷ, τουτέστιν τῷ σῶματι – Fragmenta Hermetica 21).18

A εἱμαρμένη, segundo os autores herméticos, é a regência dos deuses astrais (ἡ διοίϰησις αὐτῶν εἱμαρμένη ϰαλεῖται - Corp. Herm. 1.9).19 O ser humano, por estar abaixo da εἱμαρμένη, é escravo, dominado e sofre as coisas mortais (διπλοῦς ἐστιν ὁ ἄνϑρωπος, ϑνητὸς μὲν διὰ τὸ σῶμα, ἀϑννατος δὲ διὰ τὸν οὐσιώδη ἄνϑρωπον [...] τὰ ϑνητὰ πάσχει ὑποϰείμενος τῇ εἱμαρμένῃ - Corp. Herm. 1.15).20

O astralismo influenciou as compreensões herméticas sobre a εἱμαρμένη. Os autores herméticos geralmente afirmavam que o homem adquiriu as sete paixões ou afeições da alma quando ele desceu até o nível ou o mundo sublunar, tomando cada paixão de cada um dos deuses astrais (dos astros). Outro exemplo sobre a influência do astralismo é a visão de que o Zodíaco gera ou produz doze tormentos de paixões. A demonologia hermética se fundamenta justamente nesse tipo impasse moral. Os daimones exercem a influência sobre os homens naquilo que corresponde às irracionalidades humanas e não na sua parte racional (ANGUS, 1929, p.324- 325; PESSOA DE LIRA, 2011, p. 95).

Sendo assim, o objetivo hermético é uma ascensão a Deus, o qual vive acima do fatum, ou seja, ascender acima do mundo sensível, o qual é dominado pela εἱμαρμένη, com a finalidade de encontrar o mundo inteligível. Em todo caso, os autores herméticos expressam a εἱμαρμένη como uma sucessão de resultados estabelecidos por atos iniciais causados por todos os que vêm a ser existentes. Assim sendo, no Corp. Herm., o liberum arbitrium só é possível em consonância com o nous, pois esse é o único órgão capaz de fazer o que quer.21

No Corp. Herm., a palavra μοῖρα incide apenas duas vezes, a saber, no Corp. Herm. 3.3, 3.4. Para se referir a destino ou fado, amiúde, no Corp. Herm., emprega-se a expressão ἡ εἱμαρμένη (μοῖρα). Já a palavra εἱμαρμένη ocorre quinze vezes no Corp. Herm. e sete vezes no Asclepius (Ascl.). Essa palavra é o perfeito particípio médio-passivo feminino do verbo μείρομαι. Assim, como adjetivo, o particípio εἱμαρμένη precedido de artigo é empregado substantivamente na expressão ἡ εἱμαρμένη, não havendo a necessidade de empregar a palavra μοῖρα.22 Em todo caso, a palavra μοῖρα significa denotativa e conotativamente porção de terra ou de país; divisão de pessoas; partido político; lote, porção, partilha; patrimônio, herança, herdade; porção na vida, destino, lote, adjudicação, sorte; aquilo que é reto e justo. Da mesma raiz vem o verbo μείρομαι, o qual, dentre várias acepções, significa: receber (como) uma porção, obter uma parte; dividir; obter a partilha; tomar o que é devido. Não obstante, o perfeito de μείρομαι, a saber, εἵμαρμαι (mais-que-perfeito εἱμάρμην, infinitivo perfeito εἵμαρϑαι, particípio perfeito masculino εἱμαρμένος) significa ser loteado, ser decretado pelo destino. Muitas vezes emprega-se de forma impessoal: εἵμαρται (está decretado pelo destino). Em tempos tardios, foi usado o perfeito μέμορται, o infinitivo perfeito μέμορϑαι e o particípio perfeito μεμορμένος. Ademais, há o adjetivo verbal εἵμαρτος (decretado pelo destino ou fado). No Corp. Herm., μείρομαι incide nas formas perfeitas: εἵμαρται duas vezes (Corp. Herm. 12.5) e εἱμαρμένα (Corp. Herm. 12.7) uma vez (HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 176; DELATTE; GOVAERTS; DENOOZ, 1977, p. 115).

Nesse caso, εἱμαρμένα expressa as coisas decretadas pelo destino assim como, no Ascl. 39, εἱμαρμένη designa as coisas destinadas ou decretadas pelo destino ou fado (fata). A palavra latina fatum é o particípio passado neutro do verbo for (fari, fatus), o qual denota falar, dizer, confessar, declarar. Como substantivo, o fatum é profecia, decreto dos deuses; decreto do destino, morte, futuro; destino, fado, limites da vida; expectativa de vida; fado enquanto força dos eventos. A palavra fatum ocorre uma única vez no Asclepius.23

Os deuses astrais compartilharam com o Ἄνϑρωπος [anthrōpos] na catábase. Isso é subentendido pelas características descritas durante a ascensão ou individuação, no Corp. Herm. 1.24-25 e no Corp. Herm.13.7-10: falsidade, avareza, audácia, orgulho, desejo, gula e poder de crescimento etc. Trata-se claramente de uma crença popular acerca da influência astral no temperamento e na característica humana (lunar (lunático), mercurial, venusiano, solar, marcial, jovial, saturnino).24 Os autores herméticos acreditavam que essas características estavam associadas à potencialidade de disposições do mal. De fato, são πάϑη [pathē] do mal que se ligam ao Ἄνϑρωπος em sua descida. Em outras palavras, os astros regentes são ἐμπαϑείς [empatheis]25 e o Homem Primevo, ao se associar com eles, recebe de cada um deles um tipo especial de πάϑος [pathos] que pertence exclusivamente a ele (DODD, 1954, p. 154; SCOTT, 1985, v. 2, p. 40).

Assim, do ponto de vista hermético, os astros são responsáveis por compelir energeticamente os seres humanos e outros viventes através de características que se pode chamar de instintivas, por exemplo, violência, luxúria, ostentação, oscilação etc. (Corp. Herm. 1.24-25; 13.7-10; 16.10-19) (HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 15-16; t. 2, p. 203-205, 235-238). Mas não é só a intervenção astral que provoca isso. É necessário que haja concordância ou o assenso. A heimarmenē forma uma rede que se tece por meio de ações (Corp. Herm. 12.5-9) (HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 175-177). Na Antiguidade, a εἱμαρμένη era chamada de coerção, coação (ação em conjunto) compulsão astral, compulsão estelar, compulsão das estrelas maléficas ou necessidade (REITZENSTEIN, 1978, p. 64-65, 322-323, 415). Pode-se ainda descrevê-la como potencialidade de disposições ou ἐμπάϑεια. Jung afirma que os astros ou astros regentes atuam aí como originadores de instintos, estando o ser humano abaixo de sua regência: a heimarmenē. Assim, em termo junguianos, a εἱμαρμένη, aqui, seria como o inconsciente coletivo, a soma de instintos (energia dos deuses astrais ou celestes, dos regentes) e de seus arquétipos correlatos (deuses astrais, deuses celestes ou regentes) sob formas de objetos naturais (os astros) e abstratos (as esferas). Os instintos, sendo físicos, são reflexos de ação. Assim como o inconsciente coletivo, a heimarmenē é herdada, de natureza impessoal e universal, não incidindo unicamente a partir de uma única pessoa. Como viventes mortais, os humanos são regidos pela heimarmenē, resultado de ações em conjunto com uma compulsão astral ou daimônica. Mas, o homem está nessa condição apenas instintivamente, não no νοῦς.26

2. A Escolha das Ações Prudentes e Passionais pela Alma no Corp. Herm. 12.-5-9

O Corp. Herm. 12.5-9 é precedido pela seção § 4, que trata das almas humanas que não têm o νοῦς como comandante (οὐϰ ἔτυχον ϰυϐερνήτου τοῦ νοῦ). Esta seção menciona que elas sofrem o mesmo que as almas de seres vivos irracionais.27 O νοῦς se torna cooperador com elas e as abandona às concupiscências. Assim, elas tendem à irracionalidade, vindo a ser irracionalmente iradas e desejando fervorosamente sem cessar e se satisfazendo com luxúrias:

4 E se tais almas humanas não ganharam o nous como comandante, sofrem a mesma coisa que aquelas [almas] dos viventes irracionais; pois vindo a ser cooperador com elas e deixando à sorte das concupiscências, para as quais são levadas pela veemência do apetite, tendendo ao irracional e como os irracionais dentre os viventes, irracionalmente sendo encolerizados e irracionalmente desejando ardentemente, não cessam, nem têm saciedade das coisas viciosas; pois o acesso de cólera e as concupiscências são os vícios irracionais superiores; e, como uma punição e correção, Deus fixou a lei para essas [almas] (tradução própria – grifos nosso).28

O autor hermético emprega ϑυμοὶ ϰαὶ ἐπιϑυμίαι (citado acima) como Plutarco expressa quando menciona (De Fato 571D):

e o que [está] sob nosso controle é dito [estar] segundo a pré-escolha. E o que [está] em nosso poder é o mais fortemente geral; pois tem duas espécies, a que compreende ações provenientes da paixão, raiva ou desejo; a outra, ações que procedem de cálculo ou pensamento, que, de fato, agora alguém pode falar ‘de acordo com uma pré-escolha’ (tradução própria). 29

Para Plutarco, tanto ϑυμοὶ quanto ἐπιϑυμίαι são ações que procedem da paixão (πάϑος). Segundo ele, a escolha da ação “está em nosso poder (depende de nós)”: seja ações provenientes da paixão (raiva ou desejo) seja ações provenientes do cálculo ou do pensamento. De qualquer forma, o que está em nosso poder (o que depende de nós) é uma questão de escolha ou pré-escolha (προαίρεσις).30 Da mesma forma, tudo indica que o texto do Corp. Herm. 12 está invectivando justamente aqueles que priorizam as paixões e escolheram as luxúrias.

Para Festugière, a fraseologia “Εἱμαρμένης γὰρ πάντα τὰ ἔργα (Corp. Herm. 12.5)” é uma reprodução fiel do estoicismo. Ou seja, todos os atos humanos, assim como todas as coisas exteriores, e todas as coisas que dizem respeito aos corpos, são produtos da εἱμαρμένη (do determinado). Segundo ele, o autor quer precisar mais efetivamente que tanto as ações (ποιήσαντα) quanto as consequências dos atos (παϑεῖν) são predeterminados (εἵμαρται) (NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 194). O próprio Festugière afirma que existe uma ideia restritiva da influência da εἱμαρμένη, a saber, οὐδέν ἐστι τῶν σωματιϰῶν, o que para ele seria uma preparação para uma resposta mais gnóstica. Em todo caso, se é restritiva, logo, o §5 não é amplamente e fielmente estoico. Essa restrição é obra justamente do médio-platonismo.

Destarte, é importante considerar que a equação do fazer ou agir - ποιέω (δράω) - e do sofrer - πάσχω (de πάϑος) - resulta nas coisas determinadas (τὰ εἱμαρμένα) como consequência.31 O escritor hermético claramente quer dizer (Corp. Herm. 12.5) que a ação é a causa de um resultado inexorável e inelutável. Ele está de fato alinhado com alguns pensadores do médio-platonismo ao apontar uma causa no centro daquilo que tem sido determinado (εἱμαρμένη): “— Todas as coisas são obras da heimarmenē, ó filho, e sem ela não existe nenhuma das coisas corporais: nem coisa boa nem coisa má vêm a existir. E tem sido decretado também sofrer a coisa boa que foi feita; e por isso, age para que sofra aquilo pelo qual se apaixona porque agiu (tradução própria)”.32 Segundo Acínoo, a alma racional (ψυχὴ λογιϰή) não age, exceto através do corpo (De Doctrina Platonis 2.2):

A contemplação, então, é a atividade do intelecto inteligindo os inteligíveis, e a ação é aquela atividade de uma alma racional que, por meio do corpo, ocorre. E a alma contemplando o divino e se diz que os pensamentos do divino padecem alegremente, e este padecimento dela é chamado ‘sabedoria’, que alguém pode afirmar como não diferente da semelhança com do divino. Por esta razão, para tal padecimento seria de prioridade, valioso, mais desejável e mais apropriado para nós, livre de impedimentos, posto dentro de nosso poder, e causa do fim que nos é proposto. Por outro lado, a ação e a vida ativa, através do corpo, sendo perseguidas, podem ser impedidas e poderiam praticar coisas demandadas, as quais, em relação com a vida contemplativa, vêm a ser visíveis (tradução própria).33

Portanto, a consequência da ação será cumprida de acordo com o que tem sido determinado (εἱμαρμένη) (De Doctrina Platonis 26.2), já que se sofre corporalmente a compulsão do fatum:

A alma, portanto, não possui mestre, e está em seu poder agir ou não, e não é obrigada a isso, mas as consequências da ação serão cumpridas de acordo com o destino. Por exemplo, do fato de que Paris roubará Helena, sendo esta uma ação voluntária dele, seguir-se-á que os gregos irão à guerra por causa de Helena. Afinal, foi assim que Apolo disse a Laio: "Se você gerar um filho, essa descendência o matará" (Eurípides, Ph. 19). Aqui, no oráculo, Laio e sua geração de um filho são tomados como premissas, e a consequência está predestinada (tradução própria).34

As consequências das ações são coisas que não se tem controle. Escolher as ações, sim, tem-se controle, mas não o que se segue daí. Alcinnoo expressa sobre a liberdade da alma escolher como agir e suas consequências: “A alma, portanto, não possui mestre, e está em seu poder agir ou não, e não é obrigada a isso, mas as consequências da ação serão cumpridas de acordo com a heimarmenē (De Doctrina Platonis 26.2)”. 35

De igual modo, Apuleio menciona que “sed virtutem liberam et in nobis sitam et nobis voluntate adpetendam; peccata vero esse non minus libera et in nobis sita, non tamen ea suscipi voluntate (mas a virtude livre está situada em nós e deve ser buscada por nós por nossa vontade; [mas] os pecados verdadeiramente não são menos livres nem menos localizados em nós, mas não os aceitamos de bom grado (tradução própria - De Platone II. 11. 236))”.36

Quando o hermetista menciona que “ϰαὶ οὐδὲν αὐτῷ ἀδύνατον, οὔτε εἱμαρμένης ὑπεράνω ϑεῖναι ψυχὴν ἀνϑρωπίνην οὔτε ἀμελήσασαν, ἅπερ συμϐαίνει, ὑπὸ τὴν εἱμαρμένην ϑεῖναι (nem é impossível a ele [o nous] colocar a alma humana acima da heimarmenē nem é impossível a ele colocar aquela que tem sido negligente, como existe, abaixo da heimarmenē) (tradução própria - Corp. Herm. 12.9)”, ele efetivamente pretende afirmar que o νοῦς (o self) está acima da εἱμαρμένη, não a alma.37 O νοῦς não atua em consonância com o corpo sem ter o invólucro anímico ou psíquico (Corp. Herm. 10.16-17: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 1210-121). Se a compulsão da εἱμαρμένη é apenas corporal, ela não pode prevalecer sobre o νοῦς, já que esse faz o que quer (ὡς οὖν δυνατὸν νοῦν, ἄρχοντα πάντων ϰαὶ ψυχὴν ὄντα τοῦ ϑεοῦ, ποιεῖν ὅπερ βούλεται - Corp. Herm. 12.8).38 O νοῦς age antes de qualquer coisa determinada. Seguir apenas as paixões ou o νοῦς constitui uma questão de escolha da alma. A alma, por sua vez, pode preferir o corpo padecendo os prazeres corporais determinados por ele.

3. As Implicações da εἱμαρμένη nos ἐλλόγιμοι (sensatos) no Corp. Herm. 12.-5-9

O ἐλλόγιμος [ellogimos], ἔλλογος [ellogos] aqui é sinônimo de ἔννους ἄνϑρωπος [ennous anthrōpos].39 O termo ἔννους significa literalmente o que tem νοῦς, aquele que tem o νοῦς em, aquele com νοῦς, ou seja, o prudente, o sensível ou sensato (com sensus),40 o que pensa e reflete, o pensante, o intelectual.41 Os autores herméticos, amiúde, costumam empregar expressões para designar a parte do homem que se relaciona com o νοῦς e o torna imortal, a saber, ἔννους ἄνϑρωπος (Corp. Herm. 1.18), οὐσιώδης ἄνϑρωπος [ousiōdēs anthrōpos] (Corp. Herm. 1.15; 9.5), τέλειοι ἄνϑρωποι [teleioi anthrōpoi] (Corp. Herm. 4.4), ὄντως ἄνϑρωπος [ontōs anthrōpos] (Corp. Herm. 10.24) e ἐνδιάϑετος ἄνϑρωπος [endiathetos anthrōpos] (Corp. Herm. 13.7). No entanto, às vezes, os autores herméticos empregam aparentemente essas expressões para designar uma subespécie ou hipônimo do gênero humano (hiperônimo).42 O Corp. Herm. 4.3-6a não descreve a superioridade do homem em relação ao mundo e aos irracionais (ἄλογοι), e, sim, a categorização da humanidade em duas classes ou grupos - aqueles que receberam o νοῦς (os τέλειοι) e os que apenas possuem o λόγος (os λογιϰοί).43

Assim, a imortalidade conferida pelo νοῦς apenas diz respeito a essa parte simples, noética e essencial do ser humano. Os autores herméticos fazem uso dessas expressões que descrevem o homem essencial, interior, essencialmente humano, com a finalidade de evidenciar o νοῦς em termos psicológicos no próprio homem. A gnose do νοῦς imortal é, deveras, o reconhecimento (ἀναγνώρισις [anagnōrisis]) da imortalidade do si-mesmo (do self, do Selbst).44

Há quem defenda que a fraseologia “...que o sensato reconheça a si mesmo como sendo imortal... (...ἀναγνωρισάτω <ὁ> ἔννους ἑαυτὸν ὄντα ἀϑάνατον...) (Corp. Herm. 1.18)”45 é influenciada pela máxima délfica γνῶϑι σεαυτόν [gnōthi seauton] ou γνῶϑι σεαυτόν [gnōthi seauton] — conhece-te a ti mesmo. No oráculo de Delfos, o sentido da inscrição γνῶϑι σεαυτόν é um convite programático (de πρόγραμμα — da inscrição) oracular para vir conhecer aquilo que estaria reservado pela vida ou pelo destino a cada pessoa.46 A mesma máxima, expressa de maneiras diferentes nas obras platônicas, designa conotativamente um conhecimento do homem em sua humanidade com todas as implicações de contingências e limitações. O autoconhecimento, no Corp. Herm. 1.18 e nos parágrafos subsequentes, expressa-se conotativamente um (re)conhecimento do homem não apenas humano, mas também divino e, por isso, ilimitado. O autoconhecimento é o objetivo reconhecidamente presente nos tratados herméticos (Corp. Herm. 13.22: “νοερῶς ἔγνως σεαυτὸν ϰαὶ τὸν πατέρα τὸν ἡμέτερον - conheceste intelectualmente a ti mesmo e o nosso pai”).47 Em todo caso, o Corp. Herm. 12.5-9 explica que os ἐλλόγιμοι, aqueles dotados de razão e guiados por νοῦς, não sofrem como os outros porque são libertos, livres do mal ou dos vícios. Em outras palavras, o ἐλλόγιμος, agindo segundo o λόγος e seguindo o νοῦς, não sofre os efeitos determinados (εἱμαρμένη) da ação da mesma forma que a alma negligente sofre.

Mas, enquanto a alma humana habita o corpo, trata-se de uma questão de escolha priorizar o πάϑος ou o νοῦς. É claro que os herméticos propõem mais do que isso, a saber, uma regeneração da natureza que libere a alma, pelo menos, dos efeitos psíquicos das paixões ou dos efeitos patológicos. É evidente que o corpo continua sujeito ao que tem sido determinado (εἱμαρμένη), podendo a alma incorrer em erro por uma escolha equivocada, mas o ἐλλόγιμος (sensato ou prudente) não terá o mesmo efeito turbulento do fatum.48 Assi, ele é regido por uma providência divina diferente da εἱμαρμένη, sendo as paixões irrelevantes para ele, valorizando a justeza de acordo com os primeiros bens, com a prudência, providência ou previdência.49

Destarte, os ἐλλόγιμοι são aqueles que empregam, além do ânimo, intelecto e memória, a prudência ou a previdência (ou providência) para conhecimento e contemplação das coisas divinas (illis uero partibus quattuor animi, sensus, memoriae atque prouidentiae, quarum ratione cuncta diuina norit atque suspiciat (Ascl. 11)).50 Embora o Corpus Hermeticum pouco se refira à πρόνοια [pronoia], sabe-se que ela atua para ordem da matéria e do mundo através da εἱμαρμένη e em companhia da ἀνάγϰη [anankē]. A incidência da πρόνοια, na literatura hermética, não necessariamente tem relação com o estoicismo, mas com o fundamento (médio) platônico, a qual ganha ares de espiritualismo e transcendentalismo. Pode-se falar que um forte desenvolvimento do conceito de πρόνοια diz respeito à busca pela liberação de uma compulsão planetária por meio da salvação de uma divindade, sem que a πρόνοια assuma o lugar da εἱμαρμένη, mas sendo sua contraparte, diferente de uma Fortuna nefaria, casus infestus.51 A πρόνοια, assim como a εἱμαρμένη, determina todas as coisas desde o princípio.52 Em termos práticos, a πρόνοια é uma previsão, previdência, providência ou presciência que muitas vezes se confunde com a prudência ou meditação antes de qualquer atitude (LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996, p. 1491). Segundo Festugière, a εἱμαρμένη é conjunta à ἀνάγϰη. O que tem sido determinado vem primeiro. A ἀνάγϰη permanece seu efeito nas coisas que foram iniciadas pelo fado. Essas duas forças têm por consequência a ordem. A fatalidade, a necessidade e a ordem não são senão os instrumentos da vontade divina. Essas forças não têm qualquer iniciativa própria, elas observam o decreto da eternidade imutável (FESTUGIÈRE, 2014, p. 499). Essa compreensão é baseada em Ascl. 39. Nos Stob. Herm. Exc. 7.3, 8.6-7, 13, 14.1-2, incide uma certa inconsistência dessa distinção, que, possivelmente, venha dos próprios estoicos ou de qualquer interpretação equivocada do estoicismo.53

Pode-se confundir a necessidade com destino ou fado, justamente porque a ἀνάγϰη é algo determinado (εἱμαρμένη) pela irracionalidade. Por isso, algumas vezes, são palavras com sentido intercambiável. Cf. Corp. Herm. 16.11: “...ἀνάγϰῃ, ἣν ϰαλοῦμεν εἱμαρμένην (...por necessidade que chamamos heimarmenē (tradução própria))”.54 Em Jambl., de myster. 8.7: “...ἀνάγϰης ἣν εἱμαρμένην ϰαλοῦμεν (...da necessidade que chamamos heimarmenē (tradução própria))”.55 Não obstante, a necessidade é determinante para estabelecer o destino. Plutarco menciona que Adrasteia, Lachesis e Moira são as filhas da Necessidade (Ἀδραστεία Ἀνάγϰης ϑυγάτηρ... Λάχεσις Ἀνάγϰης ϑυγάτηρ... Μοῖρα Ἀνάγϰης ϑυγάτηρ... (De sera numinis vindicta 564E; De Fato 568D, 591B), mas são diferentes (PLUTARCH, 1959, v. 7. p. 278-279, 310-311, 312-313, 468-469).

Na Literatura Hermética, em geral, a ἀνάγϰη é diametralmente relacionada ao estado da irracionalidade. A εἱμαρμένη, por sua vez, age segundo as ações corporais. Mas a πρόνοια é regida pela racionalidade que escolhe se seguirá a natureza do corpo ou não. O prudente pode perguntar se a própria necessidade não exigiria uma reflexão racional sobre o que de fato é necessário e determinante na vida do ser humano. O que se julga como ἀνάγϰη pode ser algo racionalmente desnecessário e não tão determinante para a vida. Daí resulta que os imprudentes (ἄλογοι) podem transformar o vício (ϰαϰία) em necessidade. Nota-se essa distinção em Stob. Herm. Exc. 8.5-7:

5. Portanto, a substância inteligível, vindo a estar perto de Deus, tem a autoridade de si mesma e do salvar o outro salvando a si mesma, já que essa substância subjacente à necessidade, e tendo sido deixada por Deus, escolhe a natureza corporal e sua escolha segundo a providência, e vem a ser deste mundo.

6. mas todo irracional se move para alguma racionalidade 7. E, por um lado, [move-se] a racionalidade segundo a providência, por outro lado, o irracional de acordo com a necessidade, e as coisas que acontecem ao redor do corpo [movem-se] segundo o que é destinado. E este é o discurso das coisas segundo a providência, <segundo> a necessidade e de acordo com o fado (tradução própria).56

Claramente, o Corp. Herm. 12.5-9 está se referindo aos ἐλλόγιμοι como aqueles que não estão sujeitos à compulsão da εἱμαρμένη. Trata-se de seres humanos espiritualizados, místicos, iniciados em uma gnose, os quais se distanciam dos peccata, em termos apuleianos (De Platone II. 11. 236),57 embora não isentos de cometer algum erro (REITZENSTEIN, 1978, p. 415, 520). A preocupação dos ἐλλόγιμοι não é o que se sucede ao corpo, logo eles não são influenciados pelas paixões que têm sua origem e implicações corporais. Destarte, eles, assim como seu verdadeiro si-mesmo, são livres da dominação e compulsão da εἱμαρμένη (SCOTT, 1985, v. 2, p. 346). Ao contrário do que se possa imaginar, isso não significa algo absolutamente racional, mas místico. Em todo caso, toda essa espiritualização tem um sentido prático, a saber, estimular uma meditação ou reflexão prévia antes de qualquer atitude precipitada que resulte em uma situação inexorável, inelutável e fatalista.

Em última análise, outrossim, não se trata de uma apatia ou mortificação do corpo. Os herméticos, assim como os escritores médio-platônicos, não valorizam a ascese da ἀπάϑεια [apatheia] (indiferença às emoções) nem valorizam excessivamente a racionalidade em detrimento da paixão. Pelo contrário, há uma certa evocação de uma μετροπάϑεια [metropatheia] médio-platônica (moderação das emoções) a fim de alcançar as virtudes.58

4. O Fado Hipotético e Condicional do Médio-Platonismo no Corp. Herm. 12.-5-9

De Doctrina Platonis 26.1: Todas as coisas, diz ele [sic Platão], estão na heimarmenē, mas nem todas as coisas têm sido predeterminadas. A heimarmenē, de fato, tendo a ordem de uma lei, não como se diz que isto fará essas coisas, e que isto sofrerá aquelas coisas [...] Mas que, se uma alma escolhe um determinado tipo de vida e pratica tais e tais coisas, tais e tais coisas irão com ela (tradução própria). 59

De Fato 570C-D: ...mas se, como também se mostra por todos os meios, a [expressão] ‘em conformidade com a heimarmenē’ significa não todas as coisas, mas apenas a consequência a ela; não se deve dizer que todas as coisas estão ‘de acordo com a heimarmenē’, nem se todas as coisas [estivessem] ‘em conformidade com a heimarmenē’. (tradução própria).60

De Fato 570E: e somente os consequentes dos antecedentes [são] ‘fadados’ e ‘em conformidade com a heimarmenē’ na designação divina. Como a heimarmenē, então, inclui todas as coisas que vêm a ser, e muitas dessas estão nela, exceto tantas quantas antecedem; não é correto dizer [que essas últimas estão] ‘em conformidade com a heimarmenē’. (tradução própria).61

O λόγος e o νοῦς estão no poder do ἐλλόγιμος, dentro da esfera (corporal) do que pode ser determinado (εἱμαρμένη), mas não pré-determinado (ϰαϑειμάρϑαι). Isso significa que o Corp. Herm. 12.5-9 não leva o fatalismo às últimas consequências, ou seja, ninguém está fadado a agir de uma determinada forma, sofrendo algo pré-determinado. Embora todas as coisas estejam sob a esfera de certo determinismo (εἱμαρμένη), isso não significa que todas as coisas estejam de acordo com isso ou fadado a ser de tal forma. Apuleio, em De Platone I. 11. 205, explicita: “divinam legem esse fatum, per quod inevitabiles cogitationes dei atque incepta conplentur (que o destino é uma lei divina pela qual os inevitáveis ​​pensamentos e projetos de Deus são cumpridos (tradução própria))”. 62 No entanto, amiúde, os hermetistas e os médio-platônicos nomeiem εἱμαρμένη de lei, mas é uma lei consequente. Eles rejeitaram qualquer ideia de uma lei pré-fixada ou predestinada.

Pode-se considerar que a sentença, a saber, “Ἀλλ’ ὁ ἐλλόγιμος, ὦ τέϰνον, οὐ μοιχεύσας πείσεται ἀλλ’ ὡς μοιχεύσας, οὐδὲ φονεύσας ἀλλ’ ὡς φονεύσας... (Mas o excelente, ó filho, não sofrerá tendo adulterado, mas como tendo adulterado, nem tendo assassinado, mas como tendo assassinado...)”.63 explicita uma reflexão condicional de “e se...” ou “como se...”. Nota-se que o ἐλλόγιμος sofre hipoteticamente se caso ele tivesse escolhido praticar tal ação, mas ele não pratica de fato. Ademais, claramente se pode notar uma condição comparativa de modo eventual (RAGON, 2012, p. 260; FREIRE, 2001, p. 233, 234-235). Em outras palavras, não por ter adulterado ou assassinado que o ἐλλόγιμος sofrerá as consequências, mas caso ele viesse a praticar. Trata-se de uma reflexão prévia para que não resulte em uma situação ou estado inelutável e inexorável em decorrência de escolhas e ações.

Isso leva a crer que a teoria médio-platônica do fado condicional ou hipotético foi aceita pelo autor do Corp. Herm. 12,5-9. De fato, o ἐλλόγιμος está em uma situação de antecedência-como-se (ὡς μοιχεύσας, ὡς φονεύσας), não de consequência (οὐ μοιχεύσας, οὐδὲ φονεύσας). Se εἱμαρμένη está intrinsecamente ligada às ações, seu status de lei opera hipoteticamente, ou seja, pela teoria do destino condicional ou hipotético. Não é predeterminado que alguém aja de tal maneira e sofra por isso. Pelo contrário, se alguém escolhe uma vida de tal maneira, e consequentemente age de uma determinada maneira, os resultados seguem daí, de suas ações. Para o ἐλλόγιμος, diante da necessidade (ἀνάγϰη), prevalece o νοῦς. Só existe algo determinado, a saber, o resultado das ações. Daí, a lei da εἱμαρμένη e suas implicações são estabelecidas (sobre teoria do destino condicional ou hipotético, cf. DILLON, 1995, p. 160-164).

Assim, a εἱμαρμένη é uma consequência inexorável e inelutável de ação que foi escolhida livremente. Trata-se praticamente de um erro anunciado, cujo resultado, para quem comete sob as influências das paixões ou compulsões, é sentido e sofrido. Para o ἐλλόγιμος, a prudentia ou meditatio (πρόνοια) opera como uma prouidentia (πρόνοια), alertando as consequências inexoráveis e dificilmente irreversíveis. A ação do ἐλλόγιμος é estabelecida pela hipótese: se eu escolher e fizer tal coisa, as consequências serão estas, essas ou aquelas.

Como supramencionado, tudo depende de uma escolha ou pré-escolha (προαίρεσις). A προαίρεσις é uma escolha ou opção moral fundamental, que foi defendida tanto pelos médio-platônicos quanto pelo neoestoico Epicteto (PLUTARCH, 1959, v. 7, p. 332; REALE, 2008, v. 7, p. 99-104). Há uma decisão como agir e o que fazer. As implicações surgem dessa pré-escolha. Em suma, pode-considerar que a sentença do Corp. Herm. 12.7 supramencionada 64 é um exemplo do fado hipotético ou condicional. O autor hermético expressa iconicamente aquilo que Plutarco e Acínoo discorrem entimematicamente ou abstratamente. John Dillon evita postular qualquer influência de Alcínoo em autores herméticos, mas fala de uma fonte comum do neopitagorismo entre eles (DILLON, 1995, p. 105). Como já foi mencionado, o autor provavelmente não seguiu nenhum mestre, mas, como os mestres médio-platônicos, ele tinha diante de si alguns conceitos, e, como eles, aceitou a ideia da εἱμαρμένη.

Conclusão

Pode-se concluir que a teoria da εἱμαρμένη do Corp. Herm. 12.5-9 é predominantemente médio-platônica. O estoicismo do tratado em questão é da vertente romana, que, na época, já havia sido influenciado por outras correntes filosóficas. A incidente doutrina do νοῦς não é inspirada diretamente em Platão, mas nos médios-platônicos (REALE, 2008, v. 7, p. 117), embora esteja no âmbito do estoicismo do tratado. Assim, essa escola filosófica está abrindo caminho de passagem para um fluxo maior ou predominante do platonismo de sua época, inclusive, perdendo sua autonomia em detrimento desse (REALE, 2008, v. 7, p. 109-128).

Daí, pode-se perceber que a εἱμαρμένη está subjacente ao νοῦς, o que implica em um estado de felicidade divina e plena em Deus. Obviamente, isso se contrapõe a um materialismo de fundo do próprio estoicismo, já que correntes espiritualistas de inspiração platônica incidiram sobre essa tendência materialista estoica (REALE, 2008, v. 7, p. 126). A bipartição estoica de corpo e πνεῦμα (sopro) dá lugar à tripartição que inclui corpo, alma e νοῦς, sendo esse uma fagulha divina. Seria muito difícil permanecer no materialismo diante dessa tripartição que inclui um elemento transcendente no próprio ser humano. Destarte, a εἱμαρμένη só incide no próprio corpo, uma vez que a alma é livre e o νοῦς divino (REALE, 2008, v. 7, p. 115-122). Quando se iniciaram a platonização do estoicismo e o estoicização do platonismo contra o ceticismo, no séc. I a.E.C. (LIRA, 2015, p.), houve certamente algumas instâncias de acomodação, mas, a posteriori, elas se ampliaram e sobrepujaram as doutrinas materialistas do Pórtico (REALE, 2008, v. 7, p. 126).

Não obstante, o hermetismo não manteve, assim como o neoplatonismo posteriormente, proposições que estavam diametralmente a favor do materialismo e contra os pressupostos espiritualistas. O Corp. Herm. 12 foi escrito entre os séc. II e III E.C. Sendo assim, o estoicismo já passava por um processo de dissolução (REALE, 2008, v. 7, p. 125-126). As proposições estoicas que o tratado manteve como dogmas filosóficos estoicos serviram apenas para desenvolver os temas místicos (NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 193-195). Em suma, o presente artigo demonstrou justamente que, independentemente de algumas proposições, instâncias de acomodações e instâncias da doutrina estoica da εἱμαρμένη, o Corp. Herm. 12.5-9 manteve as polêmicas médio-platônicas sobre a liberdade e o fado (REALE, 2008, v. 7, p. 314).

Em última análise, é importante considerar as afirmações sobre o fado em conexão com a ação, pois elas serviram de base para a reformulação das teorias heimarmenológicas estóicas em um estágio posterior, culminando também em concepções herméticas.

Referências

ALCINOOS. Enseignement des Doctrines de Platon. Texte introduit, établi et commenté par John Whittaker. Traduit par Pierre Louis. Paris: Les Belles Lettres, 2002. 213p.

ALCINOUS. The Handbook of Platonism. Translated with an introduction and Commentary by John Dillon. Oxford: Clarendon Press, 1995. 222p. (Claredon later anceint philosophers).

ANGUS, S. The Religious Quests of the Graeco-Roman World: A Study in the Historical Background of Early Christianity. New York: Charles Scribner’s Son, 1929. 444p.

APULEI PLATONICI MADAURENSIS. De Philosophia Libri. Recensuit, edidit Paulus Thomas. Leipzig B. G.Teubner, 1921. v.3. 199p.

APULEIUS. Metamorphoses. Books 1-6. Edited and Tranlated by J. Arthur Hanson. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 1996. v. 1. 307p. (Loeb Classical Library).

APULEIUS. Metamorphoses. Books 7-11. Edited and Tranlated by J. Arthur Hanson. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 1996. v. 2. 307p. (Loeb Classical Library).

BELTZ, Hans Dieter. The Delphic Maxim ΓΝΩΘΙ ΣΑΥΤΟΝ in Hermetic Interpretation. The Harvard Theological Review, Cambridge (MA): Published by Cambridge University Press, v. 63, n. 4, Oct. 1970, p. 466-468.

BERTOLINI, Marco. Sul Lessico Filosofico dell' "Asclepius". Annali della Scuola Normale Superiore di Pisa. Classe di Lettere e Filosofia, serie 3, v. 15, n. 4, p. 1151-1209, 1985.

BOBZIEN, Susanne. Determinism and Freedom in Stoic Philosophy. Oxford: Oxford University Press, 2004. 441p.

COPENHAVER, Brian P. Introduction. In: HERMETICA: The Greek Corpus Hermeticum and the Latin Asclepius in a New English Translation, with Notes and Introduction - Brian P. Copenhaver. New York: Cambridge University Press, 2000. p. xiii-lxi.

COPENHAVER, Brian P. Notes. In: HERMETICA: The Greek Corpus Hermeticum and the Latin Asclepius in a New English Translation, with Notes and Introduction - Brian P. Copenhaver. New York: Cambridge University Press, 2000. p. 93-260.

CORPUS Hermeticum. Edizione e commento di A.D. Nock e A.-J. Festugière. Edizione dei testi ermetici copti e commento di Ilaria Ramelli. Testo greco, latino e copto a fronte. Milano: Bompiani. Il pensiero occidentale. 2005. 1627p.

DELATTE, L.; GOVAERTS, S.; DENOOZ, J. Index du Corpus Hermeticum. Roma: Edizioni dell’Ateneo e Bizzari, 1977. 359p. (Lessico Intellettuale Europeo, 13).

DILLON, John. Commentary. In: ALCINOUS. The Handbook of Platonism. Translated with an introduction and Commentary by John Dillon. Oxford: Clarendon Press, 1995. p. 49-211.

DODD, C.H. (Charles Harold). The Bible and the Greeks. 2. impression. London: Hodder and Stoughton, 1954. 264p.

DODD, C.H. (Charles Harold). The Interpretation of the Fourth Gospel. Reprinted Paperback Edition. Cambridge: Cambridge University Press, 2005. 478p.

ELIADE, Mircea. História das crenças e das ideias religiosas: De Gautama Buda ao Triunfo do Cristianismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. v. 2. 465p.

FERGUSON, Everett. Background of early christianity. Grand Rapids: W. B. Eerdmans, 1990. 515p.

FESTUGIÈRE, André-Jean, La Révélation d’Hermès Trismégiste. Paris: Les Belles Letres, 2014. 2062p.

FESTUGIÈRE, André-Jean. Ermetismo e mística pagana. Traduzione de Luigi Maggio. Genova: Il Melangolo, 1991. 379p.

FILORAMO, G. Hermetism. In: DI BERARDINO, Angelo. Encyclopedia of the Early Church. Cambridge: James Clarke, 1992. v.1. p. 377-378.

FOWDEN, Garth. The Egyptian Hermes: A Historical Approach to Late Pagan Mind. Princeton: Princeton University Press, 1993. 244p.

GLARE P.G.W. (Ed.). Oxford Latin Dictionary. 2. ed. reprinted with corrections. Oxford: At the Claredon Press, 2015. 2v. 2344p.

GRESE, William C. Corpus Hermeticum XIII and Early Christian Literature. Leiden: Brill Archive, 1979. 228p.

HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. 2t. 404p. (paginação contínua entre os dois tomos). (Collection des Universités de France).

HERMÈS TRISMÉGISTE. Fragments Extraits de Stobée (XXIII -XXIX); Fragments Divers. Fragments Extraits de Stobée (xxiii -xxix) Texte établi et traduit par A. J. Festugière; Fragments Divers. Texte établi A. D. Nock et traduit par A. J. Festugière. Paris: Les Belles Lettres, 1954. t. 4. 149p. (Collection des Universités de France).

HERMETICA: the ancient Greek and Latin writings which contain religious or philosophical teachings ascribed to Hermes Trismegistus. Introductions, texts and translation edited and translation by Walter Scott. Boston: Shambala Publications, 1985. v. 1. 549p.

HERMETICA: the ancient Greek and Latin writings which contain religious or philosophical teachings ascribed to Hermes Trismegistus. Volume II: Notes on the Corpus Hermeticum by Walter Scott. Boston: Shambala Publications, 1985. v. 2. 482p.

HERMETICA: The Greek Corpus Hermeticum and the Latin Asclepius in a New English Translation, with Notes and Introduction - Brian P. Copenhaver. New York: Cambridge University Press, 2000. 404p.

IAMBLICHUS. De mysteriis. Translated with an Introduction and Notes by Emma C. Clarke, John M. Dillon and Jackson P. Hershbell. Atlanta: Society of Biblical Literature, 2003. 377p. (Series: Writings from the Greco-Roman world, v. 4).

JOHNSON, Luke Timothy. Among the Gentiles: Greco-Roman Religion and Christianity. New Haven; London: Yale University Press, 2009. 461p. (The Anchor Yale Bible Reference Library).

LEWIS, Nicola Denzey. Cosmology and fate in gnosticism and Graeco-Roman Antiquity: under pitiless skies. Leiden; Boston: Brill, 2013. 206p. (Nag Hammadi and Manichaean studies; 81).

LIDDELL, Henry George; SCOTT, Robert. A Greek-English lexikon. Revised and Augmented by Henry Stuart Jones with the Assistance of Roderick McKenzie with the Cooperation of many scholars. With Revised Supplment. Oxford: At the Claredon Press, 1996. (2042p. + 45p. + 320p. + 31p. = 2438p.).

LIRA, D. P. A influência dos aforismos sapienciais no mito cosmogônico do Ἱερὸς Λόγος Hermético. CLASSICA (SAO PAULO), 29(2), 99—118, 2016.

LIRA, D. P. Glossário dos Hermetica Græca: pesquisa bibliográfica das ferramentas e das fontes secundárias de tradução. CLASSICA (SÃO PAULO), v. 34 (2), 1—35, p. 2021.

LIRA, D. P. O argumento das artes mânticas no Corpus Hermeticum 12.19. GRIOT, v.17 (1), p.283 - 303, 2018.

LIRA, D. P. O bilinguismo greco-romano na tradução latina do ΛΟΓΟΣ ΤΕΛΕΙΟΣ: enfoques sociolinguísticos na análise do Asclepius Latinus. CLASSICA (SAO PAULO), 31 (1), p.113 - 136, 2018.

LIRA, D. P. O Corpus Hermeticum e o Problema Gnóstico: A γνῶσις [gnōsis] hermética como sentido da vida. MELANCOLIA, v.6, p.32 — 44, 2021.

LIRA, D. P. O Mito da Gênese e da Catábase do Homem: Uma Análise Eliadeana do Corpus Hermeticum 1, 12-15. Revista Nufen, 2020, v. 12, n. 1, p. 106-22.

LIRA, D. P. O λόγος noético: análise da lógica proposicional e dos conceitos lógico-dialéticos no Corpus Hermeticum 12.12-14a. GRIOT, v.21 (2), p.311 - 331, 2021.

LIRA, D. P. Recepção, tradução, influência e sucesso do Corpus Hermeticum. NUNTIUS ANTIQUUS, v.13 (1), p.149 - 170, 2017.

LIRA, David Pessoa de. O Batismo do Coração no Vaso do Conhecimento: Uma Introdução ao Hermetismo e ao Corpus Hermeticum. Recife: Editora UFPE, 2015. 360p.

LOUTH, Andrew. Pagans And Christians on Providence. In: SCOURFIELD, J.H.D. (Ed.). Texts and Culture in Late Antiquity: Inheritance, Authority, and Change. Swansea: The Classical Press of Wales, 2007. p. 279-297.

MAHÉ, Jean-Pierre. Hermès en haute-Egypte: Le Fragment du Discours parfait et les Définitions Hermetiques Arméniennes. Québec: Presses de l’Université Laval, 1982. t. 2. 565p. (Bibliothèque Copte de Nag Hammadi, 3, 7).

MAHÉ, Jean-Pierre. Hermes Trismegistos. In: JONES, Lindsay (Ed.). Encyclopedia of Religion. 2. ed. Detroit: Thompson/ Gale, 2005. v. 6. p. 3938-3944.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica.7. ed. São Paulo: Atlas, 2010. 297p.

MEYER, Susan Sauvé. Chain of causes: What is Stoic Fate? In: SALLES, Ricardo (ed.), God and Cosmos in Stoicism. Oxford: Oxford University Press, 2009. p. 71-90.

MORESCHINI, Claudio. Hermes Christianus: the intermingling of Hermetic piety and Christian thought. Turnhout, Belgium: Brepols, 2011. 306p.

MORWOOD, James; TAYLOR, John (eds.). Pocket Oxford Classical Greek Dictionary. Great-Bretain: Oxford University Press, 2002. xii, 449p.

NOCK, Arthur Darby; FESTUGIÈRE, André-Jean. Appendice E, XII 5-9: Fatalité et libre arbitre. Préface et Introduction. In : HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. t. 1. p. 193-195.

NOCK, Arthur Darby; FESTUGIÈRE, André-Jean. Apparat Critique. In : HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. t. 1 e 2.

NOCK, Arthur Darby; FESTUGIÈRE, André-Jean. Notes du Traté XII. In : HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. t. 1 p.174-192.

NOCK, Arthur Darby; FESTUGIÈRE, André-Jean. Préface et Introduction. In : HERMÈS TRISMÉGISTE. Corpus Hermeticum. Texte établi par A.D. Nock et traduit par A.-J. Festugière. 2. ed. Paris: Les Belles Lettres, 2011. t. 1 e 2, p. I-LIII, 259-295.

PEREIRA, Isidro. Dicionário Greco-Português e Português-Grego. 8. ed. Braga: Apostolado da Imprensa, 1998. 1054p.

PESSOA DE LIRA, D. A Demonologia no Ambiente do Novo Testamento: Uma Análise Ideológico-Conceptual da Palavra daimon no Corpus Hermeticum. Protestantismo em Revista, v. 5, p. 87-98, 2011.

PLATO. Charmides, Alcibiades I & II, Hipparchus, The Lovers, Theages, Minos, Epinomis. Edited by W.R.M. Lamb. London: William Heinemann; New York: G. P. Putnam’s Sons, 1927. v. 8. 490p. (Loeb Classical Library).

PLATO. Euthyphro, Apology, Crito, Phaedo, Phaedrus. With an English Translation by Harold North Fowler. Introduction by W. R. M. Lamb. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 2005. v. 1. 583p. (Loeb Classical Library).

PLATO. Laches, Protagoras, Meno, Euthydemus.With an English Translation by W.R.M. Lamb. Cambridge (MA): Harvard University Press; London: William Heinemann Ltd, 1952. v. 4. 508p. (Loeb Classical Library).

PLATO. Laws: Books 1-6. With an English Translation by R.G. Bury. Cambridge (MA): Harvard University Press, London: William Heinemann, 1961. v. 1. 501p. (Loeb Classical Library).

PLATO. Laws: Books 7-12. With an English Translation by R.G. Bury. London: William Heinemann; New York: G. P. Putnam’s Sons, 1926. v. 2. 582p. (Loeb Classical Library).

PLATO. Lysis, Symposium, Gorgias. Edited by W.R.M. Lamb. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 1925. v. 3. 536p.

PLATO. Timæus, Critias, Cleitophon, Menexenus, Epistles. With an English translation by The Rev. R. G. Bury. Cambridge (MA); London: Harvard University Press, 1929. v. 9.

PLUTARCH. Moralia VII. 523c—612b. With an English Translation by Phillip H. De Lacy and Benedict Einarson. Cambridge (MA): Harvard University Press; London: William Heinemann, 1959. v. 7. 618p. (Loeb Classical Library).

POHLENZ, Max. La Stoa: Storia di um movimento spirituale. Presentazione di Vittorio Enzo Alfieri. Firenze: La Nuova Italia, 1967. 578p. (Il Pensiero Filosofico 3,1).

POSIDONIOS. Die Fragmente. Herausgegeben von Willy Theiler. Berlin; New York: Walter de Gruyter, 1982. 436p. (Texte und Kommentare; Bd. 10).

RAGON, E. Gramática grega. Inteiramente reformulada por A. Dain, J.-A. de Foucault, P. Poulain. Tradução de Cecilia Bartalotti. São Paulo: Odysseus, 2012. 331p.

REALE, Giovanni. História da Filosofia Grega e Romana. ed. corr. São Paulo: Loyola. 2008. 8 v.

REITZENSTEIN, Richard. Hellenistic Mystery-Religions: Their Basic Ideas and Significance: Translated by John E. Steely. Eugene (OR): Pickwick Publications, 1978. 572p.

ROSSETTI, Livio. Introdução à Filosofia Antiga: premissas filológicas e outras “ferramentas de trabalho”. São Paulo: Paulus, 2006. 440p.

SCOTT, Walter. Introduction. In: HERMETICA: the ancient Greek and Latin writings which contain religious or philosophical teachings ascribed to Hermes Trismegistus. Introductions, texts and translation edited and translation by Walter Scott. Boston: Shambala Publications, 1985. v. 1. p. 1-111.

SCOTT, Walter. Notes on the Corpus Hermeticum. In: HERMETICA: the ancient Greek and Latin writings which contain religious or philosophical teachings ascribed to Hermes Trismegistus. Volume II: Notes on the Corpus Hermeticum by Walter Scott. Boston: Shambala Publications, 1985. v. 2. p. 1-482.

SCOURFIELD, J.H.D. (Ed.). Texts and Culture in Late Antiquity: Inheritance, Authority, and Change. Swansea: The Classical Press of Wales, 2007. 346p.

SEGAL, Robert A. Poimandres as Myth: Schorlarly Theory and Gnostic Meaning. Berlin; New York; Amsterdam: Mouton de Gruyter, 1986. 214p.

SILVA, Semíris Corsi. Magia e Poder no Império Romano: A Apologia de Apuleio. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2012. 213p.

STOICORVM VETERVM FRAGMENTA: Chrysippi Fragmenta Logica et Physica. Collegit Ioannes Ab Arnim. Stuttgart: B. G. Tenbner Verlagsgesellschaft mbH, 1964. v. 2.

STOICORVM VETERVM FRAGMENTA: Quo Indices Continentur. Collegit Ioannes Ab Arnim. Conscripsit Maximilianvs Adler. Stuttgart: B. G. Tenbner Verlagsgesellschaft mbH, 1964. v. 4.

STOICORVM VETERVM FRAGMENTA: Zeno et Zenonis Discipuli. Collegit Ioannes Ab Arnim. Stuttgart: B. G. Tenbner Verlagsgesellschaft mbH, 1964. v. 1.

TRÖGER, Karl-Wolfgang. Mysterienglaube und Gnosis in Corpus Hermeticum XIII. Berlin: Akademie-Verlag GmbH., 1971. 186p.

Notas

2 5 – Ἐνταῦϑα, ὦ πάτερ, ὁ περὶ τῆς εἱμαρμένης λόγος ὁ ἔμπροσϑέν μοι ἐξεληλυϑὼς ϰινδυνεύει ἀνατρέπεσϑαι. εἰ γὰρ πάντως εἵμαρται τῷδέ τινι μοιχεῦσαι ἢ ἱεροσυλῆσαι ἢ ἄλλο τι ϰαϰὸν δρᾶσαι, ϰαὶ ϰολάζεται [ἢ] ὁ ἐξ ἀνάγϰης τῆς εἱμαρμένης δράσας τὸ ἔργον; – Εἱμαρμένης γὰρ πάντα τὰ ἔργα, ὦ τέϰνον, ϰαὶ χωρὶς ἐϰείνης οὐδέν ἐστι τῶν σωματιϰῶν· οὔτε ἀγαϑὸν οὔτε ϰαϰὸν γενέσϑαι συμϐαίνει. εἵμαρται δὲ ϰαὶ τὸ ϰαλὸν ποιήσαντα παϑεῖν, ϰαὶ διὰ τοῦτο δρᾷ ἵνα πάϑῃ ὃ πάσχει ὅτι ἔδρασε. 6 τὸ δὲ νῦν ἔχον οὐ περὶ ϰαϰίας ϰαὶ εἱμαρμένης <ὁ> λόγος. ἐν ἄλλοις μὲν περὶ τούτων εἰρήϰαμεν· νῦν δὲ περὶ νοῦ ἔστιν ἡμῖν ὁ λόγος, τί δύναται νοῦς ϰαὶ πῶς ἐνδιάφορός ἐστιν, ἐν μὲν ἀνϑρώποις τοιόσδε, ἐν δὲ τοῖς ἀλόγοις ζῴοις ἠλλαγμένος· ϰαὶ πάλιν ὅτι ἐν μὲν τοῖς ἄλλοις ζῴοις οὐϰ ἔστιν εὐεργετιϰὸς ἀλλ’ ἀνόμοιος ἐν πᾶσι, τό τε ϑυμιϰὸν ϰαὶ τὸ ἐπιϑυμητιϰὸν σϐεννύων, ϰαὶ τούτων τοὺς μὲν ἐλλογίσμους ἄνδρας δεῖ νοεῖν, τοὺς δὲ ἀλόγους, πάντες δὲ οἱ ἄνϑρωποι εἱμαρμένῃ ὑπόϰεινται ϰαὶ γενέσει ϰαὶ μεταϐολῇ· ἀρχὴ γὰρ ϰαὶ τέλος ταῦτα εἱμαρμένης. 7 ϰαὶ πάντες μὲν ἄνϑρωποι πάσχουσιν τὰ εἱμαρμένα, οἱ δὲ ἐλλόγιμοι, ὧν ἔφαμεν τὸν νοῦν ἡγεμονεύειν, οὐχ ὁμοίως τοῖς ἄλλοις πάσχουσιν, ἀλλὰ τῆς ϰαϰίας ἀπηλλαγμένοι οὐ ϰαϰοὶ ὄντες πάσχουσι. – Πῶς πάλιν λέγεις, ὦ πάτερ; ὁ μοιχὸς οὐ ϰαϰός; ὁ φονεὺς οὐ ϰαϰός, ϰαὶ οἱ ἄλλοι πάντες; – Ἀλλ’ ὁ ἐλλόγιμος, ὦ τέϰνον, οὐ μοιχεύσας πείσεται ἀλλ’ ὡς μοιχεύσας, οὐδὲ φονεύσας ἀλλ’ ὡς φονεύσας, ϰαὶ ποιότητα μεταϐολῆς ἀδύνατόν ἐστι διεϰφυγεῖν, ὥσπερ ϰαὶ γενέσεως· ϰαϰίαν δὲ τῷ νοῦν ἔχοντι διεϰφυγεῖν ἔστι. 8 διὸ ϰαὶ τοῦ Ἀγαϑοῦ Δαίμονος ἐγὼ ἤϰουσα λέγοντος ἀεί, ϰαὶ εἰ ἐγγράφως ἐϰδεδώϰει, πάνυ ἂν τὸ τῶν ἀνϑρώπων γένος ὠφελήϰει· ἐϰεῖνος γὰρ μόνος, ὦ τέϰνον, ἀληϑῶς, ὡς πρωτόγονος ϑεός, τὰ πάντα ϰατιδὼν ϑείους λόγους ἐφϑέγξατο· ἤϰουσα γοῦν ποτε αὐτοῦ λέγοντος, ὅτι ἔν ἐστι τὰ πάντα ϰαὶ μάλιστα <τὰ> νοητὰ σώματα· ζῶμεν δὲ δυνάμει ϰαὶ ἐνεργείᾳ ϰαὶ Αἰῶνι· ϰαὶ ὁ νοῦς τούτου ἀγαϑός ἐστιν, ὅπερ ἐστὶν αὐτοῦ ϰαὶ ψυχή. τούτου δὲ τοιούτου ὄντος οὐδὲν διαστατὸν τῶν νοητῶν· ὡς οὖν δυνατὸν νοῦν, ἄρχοντα πάντων ϰαὶ ψυχὴν ὄντα τοῦ ϑεοῦ, ποιεῖν ὅπερ βούλεται. 9 σὺ δὲ νόει, ϰαὶ τὸν λόγον τοῦτον ἀνένεγϰαι πρὸς τὴν πεῦσιν ἣν ἐπύϑου μου ἐν τοῖς ἔμπροσϑεν· λέγω δὲ περὶ τῆς εἱμαρμένης [τοῦ νοῦ]. ἐὰν γὰρ τοὺς ἐριστιϰοὺς λόγους ἀϰριϐῶς ἀφέλῃ, ὦ τέϰνον, εὑρήσεις ὅτι ἀληϑῶς πάντων ἐπιϰρατεῖ ὁ νοῦς, ἡ τοῦ ϑεοῦ ψυχή, ϰαὶ εἱμαρμένης ϰαὶ νόμου ϰαὶ τῶν ἄλλων πάντων· ϰαὶ οὐδὲν αὐτῷ ἀδύνατον, οὔτε εἱμαρμένης ὑπεράνω ϑεῖναι ψυχὴν ἀνϑρωπίνην οὔτε ἀμελήσασαν, ἅπερ συμϐαίνει, ὑπὸ τὴν εἱμαρμένην ϑεῖναι. ϰαὶ ταῦτα μὲν ἐπὶ τοσοῦτον λελέχϑω τὰ τοῦ Ἀγαϑοῦ Δαίμονος ἄριστα (HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 175-177).

3 “…without addressing significant philosophical developments in Middle Platonism” (LEWIS, 2013, p. 109).

4 Sobre os paralelos entre Numênio e o hermetismo, cf. DODD, 1954, p. 135-136; p. 136, nota 2; 203-204; 244; SCOTT, 1985, v. 2, p. 31-32. Cf. Numenius ap. Euseb. Praeparatio evangélica 11.18. 1-24 em SCOTT, 1985, v. 2, p. 77-87.

5 O grifo na tradução é do autor. Here, the influence of older Greek Stoic views is evident [sic in the Corp. Herm. 12]. Whereas the dominant source for the Poimandres’ teaching on fate was Plato’s Timaeus, the author of this text discusses fate as an impersonal cosmic force in terms very similar to those we find in the fragmentary writings of the old Stoics. But new, here—and reflective of Middle Platonist and Roman Stoic ideas—is the idea that those who possess reason are connected to the divine Nous, which allows them to transcend even fate. The sage, then, remains essentially free, because he or she has rejected vice and exists purely at the level of mind. This teaching is not unusual… (LEWIS, 2013, p. 118-119).

6 FESTUGIÈRE, 2014, p. 536; HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 193-195.

7 Sobre theōsis (ϑέωσις) no hermetismo antigo, cf. RUSSELL, 2009, p. 44-50. GASPARRO, 1993, p. 114-115. Sobre a forma excludente e radical, cf. SEGAL,1986, p. 110-111; MORESCHINI, 2011, p. 16; DODD, 2005, p. 14-17, 97-98., nota 2 na página 20, nota 1 na p. 33; JOHNSON, 2009, p. 85-88; ELIADE, 2011, v. 2, p. 431; COPENHAVER, 2000, p. xxxix, lii; FERGUSON, 1990, p. 250; FILORAMO, 1992, v. 1, p. 378; MAHÉ, 2005, v. 6, p. 3940; MAHÉ, 1982, t. 2, p. 15, 29, 40-43; 314, 441; FOWDEN, 1993, p. 103-104.

8 LIRA, 2018, p. 287-289; HERMETICA, 1985, v. 1. p. 9, 223-231; SCOTT, 1985, v. 2, p. 338, 344-345; HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 174-179; DODD, 2005, p. 10-11; DODD, 1954, p. 138, 201, 234, 244. Sobre o conceito estoico de εἱμαρμένη, cf. Stoic. Vet. Fr. §§ 912-1007: STOICORVM VETERVM FRAGMENTA, 1964, v. 2, p. 264-298; STOICORVM VETERVM FRAGMENTA, 1964, v. 4, 46-47; MEYER, 2009, p. 71-90. BOBZIEN, 2004, p. 44-58; POHLENZ, 1967, p.; 201-2013; RIST, 1969, p. 201-218; LOUTH, 2007, p. 283-284. Sobre o período de Marco Aurélio e o estoicismo da época, cf. REALE, 2008, v. 7, p. 109-128. Sobre a εἱμαρμένη no médio-platonismo, cf. REALE, 2008, v. 7, p. 314.

9 Cf. o método histórico e o método comparativo em MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 88-90, 204-205.

10 ROSSETTI, 2006, p. 252-254.

11 Cf. DODD, 1954, p. 135-136; p. 136, nota 2; 203-204; 244; SCOTT, 1985, v. 2, p. 31-32. Cf. Numenius ap. Euseb. Praeparatio evangélica 11.18. 1-24 em SCOTT, 1985, v. 2, p. 77-87.

12 PLATO. 1925, v. 3, p. 484; LOUTH, 2007, p. 283.

13 Phaedon 113a: αἱ τῶν τετελευτηϰότων ψυχαὶ τῶν πολλῶν ἀφιϰνοῦνται ϰαί τινας εἱμαρμένους χρόνους μείνασαι, αἱ μὲν μαϰροτέρους, αἱ δὲ βραχυτέρους, πάλιν ἐϰπέμπονται εἰς τὰς τῶν ζῴων γενέσεις (PLATO, 2005, v. 1, p. 386; LOUTH, 2007, p. 283).

Phaedon 115a: οὕτω περιμένει τὴν εἰς Ἅιδου πορείαν ὡς πορευσόμενος ὅταν ἡ εἱμαρμένη ϰαλῇ (PLATO, 2005, v. 1, p. 392; LOUTH, 2007, p. 283).

14 Timaeus 41e: …νόμους τε τοὺς εἱμαρμένους εἶπεν αὐταῖς, ὅτι γένεσις πρώτη μὲν ἔσοιτο τεταγμένη μία πᾶσιν... (Plato, 1929, v. 9, p. 90; Louth, 2007, p. 283).

15 Leges 904c: μεταϐάλλοντα δὲ φέρεται ϰατὰ τὴν τῆς εἱμαρμένης τάξιν ϰαὶ νόμον... (PLATO, 1926, v. 2, p. 366; LOUTH, 2007, p. 283).

16 ϰαϰίαν δὲ τῷ νοῦν ἔχοντι διεϰφυγεῖν ἔστι (HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 176-177).

17 CORPUS, 2005, p. 1032; HERMETICA, 1985, v. 1, p. 446; SCOTT, 1985, v. 2, p. 345.

18 CORPUS, 2005, p. 1231; HERMETICA, 1985, v. 1, p. 540; SCOTT, 1985, v. 2, p. 345.

19 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 9.

20 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 11.

21 Corp. Herm. 1.15: HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 11-12; Corp. Herm. 12.5, 7: HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 175-177 ; FOWDEN, 1993, p. 78; PRÜMM, 1968, v.2, p. 216.

22 Cf. sub verba εἵμαρται, μοῖρα, μείρομαι in LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996, p. 487, 1093. HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 45-46; DELATTE.; GOVAERTS; DENOOZ, 1977, p. 56, 119, 208, 210, 217; COPENHAVER, 2000, p. 487, 1093, 1140-1141

23 HERMES TRISMEGISTE, 2011, t. 1, p. 349; DELATTE.; GOVAERTS; DENOOZ, 1977, p. 292, 356; GLARE, 2015, v. 1, p. 746, 791. Cf. também STOICORVM VETERVM FRAGMENTA, 1964, v. 4, p. 171.

24 Segue-se a ordem das esferas no Corp. Herm. 1.24-25. Cf. as notas de Walter Scott em HERMETICA, 1985, v. 1, p. 129; SCOTT, 1985, v. 2, p. 40; DODD, 1954, p. 154.

25 Ou seja, em um estado de emoção. Cf. LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996, p. 921. Cf. também ϰατωφέρεια propensão, tendência para baixo.

26 JUNG, 1976, p. 128-129, § 102; p. 663-664, § 644; DODD, 1954, p. 154; SCOTT, 1985, v. 2, p. 40; LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996, p. 542; SEGAL, 1986, p. 94-96; JUNG, 2020, p. 11-15, §§ 2-8; HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 175-177.

27 O ἄλογος é oposto de ἐλλόγιμος. Cf. REITZENSTEIN, 1978, p. 415, 520.

28 ὅσαι δὲ ψυχαὶ ἀνϑρώπιναι οὐϰ ἔτυχον ϰυϐερνήτου τοῦ νοῦ, τὸ αὐτὸ πάσχουσι ταῖς τῶν ἀλόγων ζῴων· συνεργὸς γὰρ αὐταῖς γενόμενος ϰαὶ ἀνέσας ταῖς ἐπιϑυμίαις, εἰς ἃς φέρονται τῇ ῥύμῃ τῆς ὀρέξεως πρὸς τὸ ἄλογον συντεινούσας ϰαὶ ὥσπερ τὰ ἄλογα τῶν ζῴων ἀλόγως ϑυμούμεναι ϰαὶ ἀλόγως ἐπιϑυμοῦσαι οὐ παύονται, οὐδὲ ϰόρον ἔχουσι τῶν ϰαϰῶν· ϑυμοὶ γὰρ ϰαὶ ἐπιϑυμίαι ἄλογοι ϰαϰίαι ὑπερϐάλλουσαι· ταύταις δὲ ὥσπερ τιμωρὸν ϰαὶ ἔλεγχον ὁ ϑεὸς ἐπέστησε τὸν νόμον (HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 175).

29 ὃ δὴ ἐφ’ ἡμῖν ϰαὶ ϰατὰ προαίρεσιν λέγεται. γενιϰώτερον δὲ μᾶλλον τὸ ἐφ’ ἡμῖν· δύο γὰρ ἔχει εἴδη, τό τ’ ἐϰ πάϑους ϰαὶ ϑυμοῦ ἢ ἐπιϑυμίας τό τ’ ἐξ ἐπιλογισμοῦ ἢ διανοίας, ὅπερ ἤδη ϰατὰ προαίρεσιν ἄν τις εἴποι (PLUTARCH, 1959, v. 7, p. 332).

30 A προαίρεσις é uma escolha ou opção moral fundamental. Esse termo também incide com o estoico Epicteto. Lembrando que Epicteto aceita muito da espiritualidade de sua época, principalmente da transcendência médio-platônica. Cf. REALE, 2008, v. 7, p. 99-104.

31 Os verbos ποιέω, δράω, πράσσω (πράττω), substantivos ἔργον, ἐνέργεια, πράξις, ποίησις são intercambiáveis. Sub verba, cf. LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996; MORWOOD; TAYLOR, 2002.

32 – Εἱμαρμένης γὰρ πάντα τὰ ἔργα, ὦ τέϰνον, ϰαὶ χωρὶς ἐϰείνης οὐδέν ἐστι τῶν σωματιϰῶν· οὔτε ἀγαϑὸν οὔτε ϰαϰὸν γενέσϑαι συμϐαίνει. εἵμαρται δὲ ϰαὶ τὸ ϰαλὸν ποιήσαντα παϑεῖν, ϰαὶ διὰ τοῦτο δρᾷ ἵνα πάϑῃ ὃ πάσχει ὅτι ἔδρασε (HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 178).

33 Ἔστι τοίνυν ἡ ϑεωρία ἐνέργεια τοῦ νοῦ νοοῦντος τὰ νοητά, ἡ δὲ πρᾶξις ψυχῆς λογιϰῆς ἐνέργεια διὰ σώματος γινομένη. Ἡ ψυχὴ δὴ ϑεωροῦσα μὲν τὸ ϑεῖον ϰαὶ τὰς νοήσεις τοῦ ϑείου εὐπαϑεῖν τε λέγεται ϰαὶ τοῦτο τὸ πάϑημα αὐτῆς φρόνησις ὠνόμασται, ὅπερ οὐχ ἕτερον εἴποι ἄν τις εἶναι τῆς πρὸς τὸ ϑεῖον ὁμοιώσεως · ὅϑεν ϰαὶ προηγούμενον ϰαὶ τίμιον ἄν εἴη τὸ τοιοῦτον ϰαὶ εὐϰταιότατον ϰαὶ οἰϰειότατον ἀϰώλυτόν τε ϰαὶ ἐφ’ ἡμῖν ϰείμενον ϰαὶ τοῦ προϰειμένου τέλους ἡμῖν αἴτιον. Ἡ μέντοι πρᾶξις ϰαὶ τὸ πραϰτιϰὸν διὰ τοῦ σώματος περαινόμενα ϰωλυϑῆναί τε δύναται ϰαὶ πράττοιτο ἂν ἀπαιτούντων τῶν πραγμάτων, ἃ ϰατὰ τὸν ϑεωρητιϰὸν βίον ὁρᾶται (ALCINOOS, 2002, p. 2-3).

34 Ἀδέσποτον οὖν ἡ ψυχὴ ϰαὶ ἐπ’ αὐτῇ μὲν τὸ πρᾶξαι ἢ μή· ϰαὶ οὐ ϰατηνάγϰασται τοῦτο, τὸ δὲ ἑπόμενον τῇ πράξει ϰαϑ’ εἱμαρμένην συντελεσϑήσεται· οἷον τῷ Πάρις. ἁρπάσει τὴν Ἑλένην, ἐπ’ αὐτῷ ὄντι, ἀϰολουϑήσει τὸ πολεμήσουσι περὶ τῆς Ἑλένης οἱ Ἕλληνες. Οὕτως γὰρ ϰαὶ ὁ Ἀπόλλων τῷ Λαίῳ προεῖπεν· «εἰ γὰρ τεϰνώσεις παῖδ’, ἀποϰτενεῖ σ’ ὁ φύς.» Ἐν τῷ ϑεσμῷ δὴ περιέχεται μὲν ϰαὶ ὁ Λάιος ϰαὶ τὸ φῦσαι αὐτὸν παῖδα, ϰαϑείμαρται δὲ τὸ ἑπόμενον (ALCINOOS, 2002, p. 51).

35 Ἀδέσποτον οὖν ἡ ψυχὴ ϰαὶ ἐπ’ αὐτῇ μὲν τὸ πρᾶξαι ἢ μή· ϰαὶ οὐ ϰατηνάγϰασται τοῦτο, τὸ δὲ ἑπόμενον τῇ πράξει ϰαϑ’ εἱμαρμένην συντελεσϑήσεται (ALCINOOS, 2002, p. 51).

36 APULEI PLATONICI MADAURENSIS, 1921, v.3, p. 113.

37 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 177; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 186, nota 25; REITZENSTEIN, 1978, p. 520-521.

38 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 177; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 194; REITZENSTEIN, 1978, p. 65, 415.

39 Cf. Corp. Herm. 1.18: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 13; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 194-195. ἐλλόγιμος, ἔλλογος e ἔννους são opostos a ἄλογος (REITZENSTEIN, 1978, p. 48, 415-419, 520; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 184-185 notas 16-17, p. 188, nota 34).

40 O νοῦς, como mens, órgão da gnōsis (γνῶσις), assume a acepção de sensus. Cf. BERTOLINI, 1985, p. 1162-1165, 1177-1181; LIRA, 2015, p. 171; DODD, 2005, p. 25, 28; LIRA, 2021, p.311 – 331.

41 MORWOOD; TAYLOR, 2002, p. 114; PEREIRA, 1998. p. 191; LIDDELL; SCOTT; JONES, 1996, p. 570. Cf. SEGAL, 1986, p. 42-43, 57-58, notas 66 e 67.

42 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 11, 13, 50, 98, 126; t. 2, p. 203; LIRA, 2015, p. 171; LIRA, 2021, p. 325; DODD, 2005, p. 25, 28; SCOTT, 1985, v. 2, p. 53; REITZENSTEIN, 1978, p. 48; BELTZ, 1970, p. 466-468.

43 DODD, 2005, p. 14; COPENHAVER, 2000, p. 132-133; SCOTT, 1993, v. 2, p. 136-139; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 184-185 notas 16-17, p. 188, nota 34.

44 SCOTT, 1985, v. 2, p. 53-54; BELTZ, 1970, p. 468; TRÖGER, 1971, p. 166-170; MORESCHINI, 2011, p. 21. Sobre o significado do si-mesmo, cf. REITZENSTEIN, 1978, p. 515-532.

45 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 13.

46 PLUTARCO, De E apud Delphos, 385B-385D: PLUTARCH, 1936, v. 5, p. 202-205.

47 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 209; Cf. também o Corp. Herm. 4.3-6a (HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 50-51). BELTZ, 1970, p. 466-466; SEGAL,1986, p. 57-58, notas 66 e 67. Cf. Charmides 164D, Alcibiades 1.124A, 129A, 132C, Protagoras 343B, Phaedrus 229E, Leges 11.923A em PLATO, 1927, v. 8, p. 46-47, 172-173, 194-195, 208-209. PLATO, 1952, v. 4, p. 196-196. PLATO, 2005, v. 1, p. 420-421. PLATO, 1961, v. 1, p. 420-421. Cf. TRÖGER, 1971, p. 166-170. GRESE, 1979, p. 196-197.

48 REITZENSTEIN, 1978, p. 65, 415; NOCK; FESTUGIÈRE, 2011, t. 1, p. 194.

49 Cf. Ascl. 11, 38: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 310; REITZENSTEIN, 1978, p. 322-323. Sobre μετροπάϑεια, cf. REALE, 2008, v. 9, p. 167; REALE, 2008, v. 7, p. 316-317.

50 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 310; 367, nota 96; 390, nota 282.

51 Cf. Apuleio, Met. 11.5-6, 15, 25: APULEIUS, 1996, v. 2, p. 244-249, 262-265, 282-285; REITZENSTEIN, 1978, p. 322-323.

52 Cf. Corp. Herm. 1.9; 12.14, 21; 18.6; Ascl. 11, 38: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 13, 179, 182; HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 251, 310, 349; REITZENSTEIN, 1978, p. 322-323; DELATTE; GOVAERTS; DENOOZ, 1977, p. 162, 322; BERTOLINI, 1985, p. 1170-1171; REALE, 2008, v. 9, p. 212-213.

53 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 397, nota 335; CORPUS, 2005, p. 962, 968, 1002, 1006; Stoic. Vet. Fr. §§ 916, 960, 962, 974, 1000: STOICORVM VETERVM FRAGMENTA, 1964, v. 2, p. 265, 279-280, 282-283, 293-294. Sobre ἀνάγϰη, εἱμαρμένη e πρόνοια no estoicismo, cf. REALE, 2008, v. 6, p. 57-64; POHLENZ, 1967, p. 201ss.

54 HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 2, p. 235.

55 IAMBLICHUS, 2003, p. 320-321.

56 5. ἡ μὲν οὖν νοητὴ οὐσία, πρὸς τῷ ϑεῷ γενομένη, ἑαυτῆς ἐξουσίαν ἔχει ϰαὶ τοῦ σώζειν ἕτερον αὑτὴν σώζουσα, ἐπεὶ γ' αὐτὴ ἡ οὐσία ὑπὸ ἀνάγϰην οὐϰ ἔστιν· ὑπολειφϑεῖσα δὲ ὑπὸ τοῦ ϑεοῦ, αἱρεῖται τὴν σωματιϰὴν φύσιν ϰαὶ ἡ αἵρεσις αὐτῆς ϰατὰ πρόνοιαν, τούτου δὲ τοῦ ϰόσμου γίνεται.

6. τὸ δὲ ἄλογον πᾶν ϰινεῖται πρός τινα λόγον 7. ϰαὶ ὁ μὲν λόγος ϰατὰ πρόνοιαν, τὸ δὲ ἄλογον ϰατ' ἀνάγϰην, τὰ δὲ περὶ τὸ σῶμα συμϐεϐηϰότα ϰαϑ' εἱμαρμένην. ϰαὶ οὗτός ἐστιν ὁ λόγος τῶν ϰατὰ πρόνοιαν ϰαὶ ⟨ϰατ'⟩ ἀνάγϰην ϰαὶ ϰαϑ' εἱμαρμένην (CORPUS, 2005, p. 968).

57 APULEI PLATONICI MADAURENSIS, 1921, v.3, p. 113.

58 Sobre ἀπάϑεια e μετροπάϑεια, cf. REALE, 2008, v. 9, p. 23-24, 167; REALE, 2008, v. 7, p. 316-317. Cf. De Doctrina Platonis 27.1-2, 30.6: ALCINOOS, 2002, p. 52-53, 62.

59 Πάντα μέν φησιν ἐν εἱμαρμένῃ εἶναι, οὐ μὴν πάντα ϰαϑειμάρϑαι.Ἡ γὰρ εἱμαρμένη νόμου τάξιν ἐπέχουσα οὐχ οἷον λέγει διότι ὅδε μὲν τάδε ποιήσει, ὅδε δὲ τάδε πείσεται […] ἀλλὰ διότι ἥτις ἂν ἕληται ψυχὴ τοιοῦτον βίον ϰαὶ τάδε τινὰ πράξῃ, τάδε τινὰ αὐτῇ ἕψεται (ALCINOOS, 2002, p. 51).

60 ... εἰ δ’, ὅπερ ϰαὶ μᾶλλον ἐμφαίνει, τὸ ϰαϑ’ εἱμαρμένην οὐχ ἅπαντα, ἀλλ’ αὐτὸ μόνον τὸ ἑπόμενον αὐτῇ σημαίνει, οὐ πάντα ῥητέον ϰαϑ’ εἱμαρμένην, οὐδ’ εἰ ϰαϑ’ εἱμαρμένην πάντα. (PLUTARCH, 1959, v. 7. p. 324-326).

61 μόνα δ’ εἱμαρμένα ϰαὶ ϰαϑ’ εἱμαρμένην τὰ ἀϰόλουϑα τοῖς ἐν τῇ ϑείᾳ διατάξει προηγησαμένοις. ὥστε πάντα μὲν τὰ γινόμεν’ ἡ εἱμαρμένη περιλαμϐάνει, πολλὰ δὲ τῶν ἐν αὐτῇ ϰαὶ σχεδὸν ὅσα προηγεῖται οὐϰ ὀρϑὸν λέγειν ϰαϑ’ εἱμαρμένην (PLUTARCH, 1959, v. 7. p. 326-327).

62 APULEI PLATONICI MADAURENSIS, 1921, v.3, p. 95.

63 Corp. Herm. 12.7: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 176.

64 Corp. Herm. 12.7: HERMÈS TRISMÉGISTE, 2011, t. 1, p. 176.

Material suplementario
Notas
Notas de autor
1 Doutor(a) em Teologia pela Faculdades EST – São Leopoldo – RS, Brasil. Professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife – PE, Brasil.
Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visor de artículos científicos generados a partir de XML-JATS4R por Redalyc