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Os desafios da sorte epistêmica e uma possível solução por meio da epistemologia das virtudes
João Victor Rosauro
João Victor Rosauro
Os desafios da sorte epistêmica e uma possível solução por meio da epistemologia das virtudes
The challenges of epistemic luck and a possible solution through the epistemology of virtues
Griot: Revista de Filosofia, vol. 23, núm. 1, pp. 278-295, 2023
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
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Resumo: Conhecimento e sorte parecem dois conceitos excludentes, isto é, em ordem de atribuirmos conhecimento a alguém, tal sucesso cognitivo deve excluir elementos de sorte da aquisição intelectual. Entretanto, desde o artigo de Edmund Gettier “Is Justified True Belief Knowledge?” (1963), tem se reconhecido cada vez mais a envergadura que elementos de sorte assume no conhecimento, a ponto de chegarmos a uma conclusão cética no campo epistemológico. A questão que fica, então, é como solucionar a atribuição de conhecimento, com fatores de sorte praticamente onipresentes. Dito isso, o objetivo do trabalho será dois: (i) primeiro, irei expor os desdobramentos do debate da sorte epistêmica, ou seja, mostrar sua amplitude, classificações, conceituação e algumas respostas ao problema. Após (ii) pretendo argumentar sobre as vantagens de se abordar a sorte epistêmica fora do campo proposicional a partir de uma abordagem da epistemologia das virtudes que foque em outros bens epistêmicos além da crença verdadeira.

Palavras-chave: Sorte Epistêmica, Epistemologia das Virtudes, Edmund Gettier, John Greco, Duncan Pritchard.

Abstract: Knowledge and luck seem to be two antagonist concepts, that is, to grant knowledge to someone, such cognitive success should exclude luck from their process. However, since Edmund Gettier’s article “Is Justified True Belief Knowledge?” (1963), the spread of luck elements in knowledge acquisitions has been increasingly recognized until the point of generating skeptic conclusions in the epistemological field. The question, then, is how to resolve knowledge attribution together with factors of luck practically ubiquitous. So, I intend to cover two objectives: (i) I will show the extension in the debate of epistemic luck, that is, its ramifications, classifications, concepts and, some answers. After, (ii) I intend to argue about the advantages of approaching epistemic luck outside the field of propositions within the virtue epistemology focusing on other epistemics goods besides truth belief.

Keywords: Epistemic Luck, Virtue Epistemology, Edmund Gettier, John Greco, Duncan Pritchard.

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Os desafios da sorte epistêmica e uma possível solução por meio da epistemologia das virtudes

The challenges of epistemic luck and a possible solution through the epistemology of virtues

João Victor Rosauro1
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Brasil
Griot: Revista de Filosofia, vol. 23, núm. 1, pp. 278-295, 2023
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Recepción: 29 Agosto 2022

Aprobación: 30 Enero 2023

Introdução

Desde a publicação do seminal do artigo de Edmund Gettier intitulado “Is Justified True Belief Knowledge?” (1963), o campo da epistemologia reconheceu com mais clareza os problemas que fatores de sorte ocasiona em nossas atribuições de conhecimento. Esse fenômeno que choca tentativas de cristalizar a resposta à pergunta “O que é o conhecimento?” com elementos de sorte, recebe a nomenclatura de “sorte epistêmica”. No artigo de Gettier, basicamente se mostrou que a concepção clássica de conhecimento dada por Platão, e endossada por grande parte da tradição da epistemologia, isto é, conhecimento como crença verdadeira e justificada (Teeteto, 202 b-c), não conseguia excluir a participação da sorte na aquisição desse sucesso cognitivo.

Mas qual o problema da sorte e da aquisição de conhecimento andarem lado a lado? De modo inicial, se tivemos auxílio da sorte em nosso conhecimento, parece que não temos méritos por ele, foi uma questão de acaso. Logo, uma teoria que responda à questão “O que é conhecimento?” deve se esforçar em preservar uma contribuição genuína do agente nessa aquisição, excluindo a sorte do jogo, pois, como veremos ao longo do artigo, temos uma intuição epistêmica de que o conhecimento tem que ser fruto de um esforço cognitivo relevante do agente, e não fruto da sorte.

O desafio de excluir a sorte do conhecimento se torna mais desafiador na medida que percebemos a onipresença desses fatores em nossas conquistas epistêmicas. Pensemos, por exemplo, que o mero fato de estarmos expostos a uma determinada evidência, vivermos em um tempo com facilidade de informação, vivermos em um país livre, nascermos com alguns talentos naturais, etc., são fatores de sorte que influenciam no conhecimento que adquirimos, consequentemente, nossa contribuição genuína para a aquisição cognitiva estaria ameaçada.

O que percebemos, então, é que o problema da sorte identificado por Gettier pode tomar grandes proporções céticas nas tentativas de atribuirmos conhecimento, isto é, se o conhecimento deve excluir a sorte, mas no final das contas tudo é questão de sorte, então, o conhecimento torna-se inviável.

Dito isso, com bases nos desafios que a sorte epistêmica levanta para o conhecimento, meus objetivos nesse artigo são basicamente dois: (i) destacar mais propriamente o fenômeno da sorte epistêmica e (ii) pontuar uma perspectiva diferente para abordar o problema com uma possível solução por meio da epistemologia das virtudes. E para atingir esses objetivos o artigo será dividido nas seguintes partes: (2) tratarei sobre as condições da tripartite de Platão para o conhecimento ser garantido pelo agente. Tal posição é de importância para o debate devido ao tempo em que ela demonstrou relevância nas discussões epistêmicas e também devido as suas pretensões antissorte. A partir de tal concepção, veremos as objeções levantadas por Gettier ao modelo de tripartite do conhecimento, sobretudo para evidenciar como tal proposta não está imune a sorte, deixando os debates epistêmicos instáveis. Como consequência, após as objeções de Gettier, veremos (3) o surgimento propriamente dito da sorte epistêmica e como lapidar melhor o fenômeno com definições, categorizações e abrangência. Após (4) irei analisar algumas respostas que visam defender nossa intuição antissorte, superando os casos de Gettier. E por fim, (5) irei brevemente sugerir como o problema da sorte na epistemologia pode ser abordado por uma ótica fora do conhecimento proposicional e com uma solução pela epistemologia das virtudes2.

Considerações Iniciais sobre a Sorte Epistêmica

Antes de partirmos para o fenômeno, é preciso denotar que o tipo de conhecimento em que o problema da sorte epistêmica ganha corpo no debate contemporâneo é o conhecimento proposicional (saber que/know-that). Uma proposição, entendida aqui, seria “o que é afirmado por uma sentença que diz que algo é o caso” (PRITCHARD, 2006a, p.4), ou seja, o conhecimento proposicional é quando o sujeito S sabe que p (onde “p” é qualquer proposição). Pense, por exemplo, em conhecimentos que temos sobre a seleção brasileira ser penta campeã mundial, sobre Sócrates ser grego, sobre à Terra orbitar em torno do Sol, sobre baleias serem mamíferos, etc., tais conhecimentos são tomados como conhecimentos proposicionais. Então, quando a pergunta “o que é conhecimento?” surge nesse contexto, ela está endereçada ao que queremos dizer quando alguém diz que sabe alguma proposição, quais as condições que um sujeito tem que atingir para atribuirmos conhecimento a ele sobre a proposição em questão e por aí vai. Entretanto, é válido notar que o conhecimento não se reduz ao tipo proposicional, podemos ter conhecimento por familiaridade (know by acquaintance) “o sujeito S conhece o sujeito X”, conhecimento prático (know-how) “o sujeito S sabe como fazer bolos de chocolate vegano”, ou conhecimento de localização (know-where) “o sujeito S saber onde ele está”, etc. (ICHIKAWA; STEUP, 2017).

Nesse contexto situamos a teoria do conhecimento de Platão, denominada tripartite. Platão basicamente argumenta no Teeteto (202 b-c) que para uma pessoa poder ser creditada como conhecedora, ela precisa ter uma crença verdadeira e justificada. Esse tripé do conhecimento garante importantes ganhos intuitivos, como veremos, de modo que quando algumas dessas partes está ausente, nós não atribuímos conhecimento ao agente.

Sobre essas três partes, considere primeiro a condição da crença, que será tomada como uma atitude que temos em relação a uma proposição (SCHWITZGEBEL, 2019). Por exemplo, suponha que você acredite que Shakespeare escreveu Don Quixote, ao que outra pessoa lhe mostre que quem escreveu Don Quixote foi Cervantes. Após essa constatação você afirma “mas eu sabia que quem escreveu Don Quixote foi Cervantes”. Evidentemente, esse cenário parece muito estranho, pois não haveria como afirmar que você sabe algo se não tinha uma crença sobre tal hipótese. Ainda neste exemplo literário, o agente falharia em ter conhecimento sobre a autoria de Don Quixote, pois sua crença é falsa. O que nos leva a segunda parte da tripartite, a verdade. O critério de verdade adotado aqui tem apenas propósitos metodológicos, por isso será genérico e sem comprometimentos. Tomarei a verdade como correspondência, ou seja, conferimos se há uma correspondência entre os fatos e nossa crença (GLANZBERG, 2018). Logo, crenças do tipo “Shakespeare é o autor de Don Quixote”, “todos os mamíferos voam”, “a fórmula química da água é CH4”, não se constituiriam como conhecimento, pois são crenças falsas, e são falsas porque não há correspondência entre elas e os fatos. Pritchard ressalta:

Duas coisas sobre a qual todo epistemólogo concorda é que o pré-requisito para possuir conhecimento é que a pessoa deve ter uma crença sobre a proposição relevante, e que essa crença deve ser verdadeira. Então se você sabe que Paris é a capital da França, você deve acreditar que esse é o caso, e sua crença deve ser também verdadeira (PRITCHARD, 2006a, p.5).

E se a crença for verdadeira, poderíamos atribuir conhecimento ao agente? Parece que não, pois, suponha, por exemplo, um agente que jogue cara ou coroa para decidir os times que irão ganhar as próximas partidas de futebol da liga nacional de seu país. Como resultado de seu método, acaba que todos os times que ele apostou que iriam ganhar, ganharam de fato. Nosso agente tinha conhecimento dos palpites? Intuitivamente diríamos que não. Isso ocorre pelo fato de o agente ter atingido a verdade de sua crença por um palpite de sorte. Consequentemente, como vimos acima, o que falta na equação da crença verdadeira para se tornar conhecimento é a justificação, isto é, o agente precisa ter boas razões para defender sua crença verdadeira, é preciso que ela seja adequada. Ou, dito de outra forma, é preciso um esforço cognitivo do agente em sua crença verdadeira, algo que fica ausente em palpites de sorte, superstições, etc.

Assim, entender o conhecimento como Platão sugere, nos dá os ganhos intuitivos de que o conhecimento deve excluir a sorte e que deve apresentar um empenho cognitivo significativo.

Entretanto, a aparente robustez da teoria da tripartite do conhecimento de Platão foi desafiada por Edmund Gettier em seu artigo “Is Justified True Belief Knowledge?” (1963). Gettier mostra que mesmo um agente tendo uma crença verdadeira e justificada, a sorte ainda pode desempenhar um papel fundamental, tornando intuitivamente inviável atribuirmos a ele conhecimento pelo seu sucesso cognitivo.

Para além dos exemplos de Gettier, que são mais extensos, há outros casos igualmente clássicos (Gettier-style) como as variações do exemplo de Bernard Russell sobre o relógio parado (2009, p. 91). Nesse caso, suponhamos que um trabalhador chegue em casa após o serviço e verifica em seu relógio que são 7 horas da noite. Seu relógio tem um histórico positivo de pontualidade e confiança. Mas, sem seu conhecimento, ocorreu que o relógio parou de funcionar às 7 horas da manhã, dando a sorte do trabalhador chegar em casa as exatas 7 horas da noite. Supondo que o trabalhador formou uma crença de que eram 7 horas da noite, percebemos que essa crença é verdadeira, porque de fato eram 7 horas da noite, e é justificada, porque seu relógio sempre mostrava a hora certa. Todavia, temos resistência em atribuir conhecimento ao agente, pois sua crença verdadeira e justificada ainda é fruto da sorte.

Ainda em exemplos mais tradicionais, Roderick Chisholm (1989, p.66) sugere o seguinte caso: imagine que uma pessoa veja que há uma ovelha no campo e forme a crença de que há uma ovelha no campo. As condições de tal observação são tão boas a ponto de que outras pessoas naquela posição também acreditariam ver uma ovelha. Entretanto, o que individuo está realmente vendo no campo é um cachorro, não obstante, em outra parte do campo há uma ovelha. Logo, sua crença sobre ter uma ovelha no campo é verdadeira e justificada, mas ainda lhe negaríamos conhecimento sobre essa proposição.

Como sintetiza Engel (2011), então, sorte epistêmica “[...] é uma noção usada para descrever uma variedade de maneiras que uma crença verdadeira possa ser acidental, coincidência ou fortuita”. Ademais, Pritchard ressalta que a sorte epistêmica gera um problema a partir do momento que ela “[...] infecta a principal relação epistêmica entre um agente e uma proposição verdadeira que é pivô na possessão de conhecimento” (2005, p.146).

Esse mapeamento do fenômeno da sorte epistêmica apresenta consequências céticas a partir do momento que percebemos todas as instâncias de sorte que há em nossas aquisições cognitivas. Vejamos alguns exemplos menos óbvios em que a sorte desempenha um papel no conhecimento.

Considere Nikola Tesla, famoso engenheiro eletricista, mecânico e inventor do século 19/20. Tesla relatava sofrer com flashes de luzes e imagens que interferiam em sua visão real em momentos de excitação, esses fenômenos continham imagens, retratos, cenas, destacavam ideias que estavam recém surgindo em seu pensamento, etc. Primeiramente, essa capacidade de projetar imagens acontecia somente com objetos que ele já tinha visto, mas após certa idade as imagens projetadas também se estenderam para coisas que ele imaginava. Tal habilidade facilitava a concepção de objetos que ele concebia na sua imaginação, já que não precisava reproduzir eles manualmente, ficando tudo a cargo do modo como seus pensamentos surgiam nessas imagens espontâneas. Consequentemente, como evidenciado pelo próprio inventor, esses métodos de invenção visual o ajudaram em diversas de suas criações. Não obstante, além desses dons de concepção, Tesla também tinha memória fotográfica, o que lhe proporcionava lembrar de livros, relações entre problemas, fórmulas, etc3. Sabendo que Tesla não tinha controle sobre seus dons, facilmente identificamos a sorte epistêmica em suas descobertas, mais especificamente, a concepção de suas crenças, suas justificações, bem como algumas de suas capacidades intelectuais (como a memória fotográfica), por mais que não estivem sobre seu controle, o ajudaram a chegar em uma séria de crenças verdadeiras e justificadas. Logo, se há casos em que a sorte epistêmica elimina facilmente a possibilidade de conhecimento, há casos, como o de Tesla, que nós resistimos a ideia de lhe retirar os créditos intelectuais de suas conquistas, mesmo a sorte estando envolvida.

Ainda no caso de descobertas científicas, há mais exemplos que nos ajudam a entender melhor o quanto o problema da sorte epistêmica é desafiador para nossas atribuições de conhecimento mais seguras. Por exemplo, a descoberta acidental da penicilina feita por Alexander Fleming, que saiu de férias esquecendo as culturas da bactéria Staphylococcus aureus abertas em seu local de pesquisa. Ao voltar de suas férias, se deparou com as culturas da bactéria fungadas, entretanto, o cientista observou que ao redor dos fungos não havia atividade da bactéria. Fleming percebeu que nos locais onde havia mofo, poderia também haver uma substância bactericida. Assim, como é sabido, o fungo fruto do descuido, pertencente ao gênero Penicillium, foi descoberto ser capaz de exterminar uma série de bactérias. Como nos casos de Gettier, Fleming chegou a uma crença verdadeira por sorte, entretanto, como no caso de Tesla, nós resistimos em lhe desmerecer os méritos do conhecimento.

Por último, há o caso de Edward Jenner, descobridor da vacina da varíola. Jenner observou que trabalhadores que exerciam suas funções próximas às vacas, eram menos suscetíveis a apresentarem quadros de varíola, sendo que a hipótese levantada para tal diagnóstico era que a varíola bovina, frequentemente adquirida por quem fazia o manejo com vacas, gerava imunidade a varíola contraída por humanos. Até que um dia Jenner recolheu o pus da ferida de uma ordenhadeira de vaca e esfregou no braço de um garoto, que teve o desconforto da varíola bovina, mas se curou. Tempos depois, Jenner colocou o garoto novamente em contato com a varíola, dessa vez a que afligia seres humanos. Como resultado, o garoto não foi contaminado pela varíola humana, e a técnica de vacinação foi descoberta. Graças as técnicas de vacinação inúmeras vidas são salvas, e doenças são prevenidas ao redor do mundo, e certamente atribuímos muitos créditos ao médico Jenner. Todavia, é possível identificar alguns fatores de sorte no conhecimento de Jenner, primeiramente, ele tem sorte de estar exposto a uma circunstância favorável à sua descoberta, a saber, estar no campo e ter contato com a observação da rotina de pessoas do interior. Assim, como ele tem sorte de não haver um comitê de ética rigoroso em seu tempo, pois sua conduta com o garoto foi certamente perigosa. O terceiro fator de sorte, não mencionado, é o de que Jenner foi aprendiz de John Hunter, famoso cirurgião de seu tempo e especialista em anatomia. Logo, apesar de Edward Jenner chegar a uma crença verdadeira justificada, é possível elencar uma série de situações favoráveis para sua descoberta, desde um ambiente propício a evidências favoráveis e manutenção de suas práticas, até sua constituição como médico.

Algumas Classificações da Sorte Epistêmica

Como foi visto, a sorte epistêmica cobre vários aspectos do conhecimento, desde alguns mais triviais, como possibilitar um ambiente de fomento para crenças e justificações, até alguns mais problemáticos, como tornar uma crença verdadeira. Logo, nesse cenário amplo de possibilidades, tentativas de classificação são válidas para sabermos melhor como lidar com o problema. A respeito das tentativas de classificação, irei expor como dois autores se aventuram nessa tarefa, a saber, Duncan Pritchard e Daniel Statman.

Começando por Pritchard, uma das motivações do autor na classificação da sorte epistêmica se dá com o intuito de avaliar quais são as categorias do fenômeno que são perigosas para o status de conhecimento dos agentes, e quais são as inofensivas. Entretanto, para um maior entendimento sobre o conteúdo e significado dos tipos de sorte epistêmica de Pritchard, é fundamental ter em mente seu conceito de sorte per se, a saber:

Um evento que realmente ocorre é um evento de sorte na medida em que falha em acontecer em mundos possíveis próximos onde há as mesmas condições iniciais relevantes para que o evento continue a ocorrer. Em particular, quanto mais próximo o mundo possível, e o evento falhar em ocorrer relativa as mesmas condições iniciais, maior a sorte do evento4 (2019, p. 116).

Sabendo o conceito de sorte propriamente dita, Pritchard (2005, p.133-144) cita uma primeira classificação, juntamente com Peter Unger (1968)5, sobre tipos de sorte epistêmica que não são problemáticas para o conhecimento, são elas: sorte no conteúdo (content epistemic luck), sorte pelas capacidades (capacity epistemic luck), sorte nas evidências (evidential epistemic luck) e sorte doxastica (doxastic epistemic luck).

O primeiro tipo de sorte epistêmica, a do conteúdo, trata a respeito da “sorte da proposição ser verdadeira” (PRITCHARD, 2005, p.134). Dito de outra forma, algum acidente, ou fator de sorte, pode gerar um evento x, e algum agente S pode vir a ter conhecimento a partir desse fator x, mas isso não quer dizer que esteja errado afirmar que o agente S está certo que x. Por exemplo, imagine que haja um acidente de carro, tal acidente é um fator de sorte, agora imagine que você presencie o acidente e forme a crença de que houve um acidente de carro com base na proposição. Mesmo que o evento seja fruto de sorte, você ainda tem conhecimento sobre ele. Para Unger (1968, p.159), “[...] quando um carro colide com um caminhão, uma testemunha que observa o que aconteceu, pode muito bem saber que o carro colidiu com o caminhão, e acidentalmente fez isso”.

O segundo tipo de sorte epistêmica nominado por Pritchard, sorte pelas capacidades, é conceituado como sendo fator de sorte que “o agente seja capaz de conhecimento” (2005, p.134). Por exemplo, nossa existência ser acidental não anula as várias coisas que conhecemos em decorrência de estarmos vivos. Imagine que o sobrevivente do acidente de carro do exemplo anterior se torne um astronauta e descubra que o Sol é maior que a Terra. Apesar de ser um acidente ele estar vivo, o conhecimento decorrente, ou possibilitado por este acidente, não é anulado6. Para Unger (1986, p. 160), “Assim, pode não ser de todo acidental que uma pessoa esteja certa sobre algum assunto, mesmo que seja muito acidental que ela esteja exista ou esteja viva”.

O próximo tipo de sorte epistêmica, relativa às evidências, Pritchard conceitua da seguinte forma “é questão de sorte que o agente adquira as evidências que tem em favor de sua crença” (2005, p. 136). Para ilustrar melhor essa categoria do fenômeno, suponha que você esteja em uma locadora de filmes e veja um cartaz escrito “Titanic, dirigido por James Cameron”, com base no cartaz, você sabe que quem dirigiu Titanic foi James Cameron, mesmo que seja um fator de sorte ter as evidências disponíveis para tal conhecimento. Entretanto, Pritchard (2005, p.137-138) aponta que esse tipo de sorte epistêmica pode igualmente implicar numa sorte doxástica, ou seja, é um fator de sorte, também, que o agente veio a formar a proposição sobre a direção de Titanic7.

Ademais essas primeiras clarificações sobre os tipos de sorte epistêmica benignas para o conhecimento, já nos ajudariam a acomodar algumas intuições sobre a atribuição de conhecimento nos exemplos vistos mais acima, como nos casos de Tesla e Jenner. Primeiramente, é razoável encaixarmos as imagens e clarões que Tesla tinha, e sua memória fotográfica, como sendo um caso de sorte pelas capacidades. Já Jenner se enquadraria na sorte por evidências, a respeito de sua posição rural privilegiada, e é razoável enquadrá-lo também na sorte pelas capacidades, por ter tido sorte em sua instrução profissional. E, talvez, atribuiríamos conhecimento a Fleming com base em sua sorte por conteúdo.

Como vimos, apesar desses casos de conhecimento terem a sorte em sua composição, isto é, eventos que ocorreram no mundo real, mas falharam em ocorrer na maioria dos mundos possíveis próximos, eles ainda não excluem a possibilidade do conhecimento. Como afirma Unger (1968, p.159): “Em minha análise do conhecimento humano fatual, uma completa ausência do acidental é defendida, [...] mas somente no que diz respeito a certa relação entre a pessoa e o fato”, e como vimos, tais casos não comprometem a relação epistêmica entre o agente e o fato, pelo menos para os autores vistos.

Já no grupo das sortes epistêmicas problemáticas para o conhecimento, Pritchard (2005, p.145-178) identifica dois tipos que prejudicam de modo mais significativo a relação entre o agente e o fato que são: sorte veritativa (veritic epistemic luck) e sorte reflexiva (reflexive epistemic luck).

Primeiramente, começando pela sorte veritativa, Pritchard (2005, p.146) a conceitua como: “É questão de sorte que a crença do agente seja verdadeira”8. Os exemplos do estilo Gettier, como o de Smith, do relógio parado e da ovelha falsa, são típicos casos dessa categoria, e como vimos, intuitivamente negamos conhecimento em todas essas situações. Nesses casos, a crença que os agentes tinham, todas elas eram verdadeiras por questão de sorte, ou seja, elas aconteceram no mundo real, mas teriam falhado em ocorrer na maioria dos mundos possíveis próximos, dadas as mesmas condições iniciais relevantes. E nos casos em que a crença verdadeira é questão de sorte, a relação epistêmica entre o agente e o fato é prejudicada. Consequentemente, se conclui que o conhecimento é incompatível com a sorte epistêmica veritativa. Para Pritchard:

Um suporte mais aprofundado para essa hipótese [de que o conhecimento é incompatível com a sorte veritativa] vem do fato que a sorte veritativa é a que está em questão nos contraexemplos da abordagem clássica da triparte do conhecimento que foi avançada por Edmund Gettier (1963). De acordo com a triparte do conhecimento, a condição epistêmica relevante que transforma uma crença verdadeira em conhecimento é entendida como uma condição internalista de conhecimento. O ponto de Gettier, assentado em termos da sorte veritativa, era que o agente poderia ter uma crença verdadeira que cumpre sua condição de justificação internalista, mas que não é conhecimento devido a crença verdadeira cair na sorte veritativa (2005, p.148).

Com esse novo esclarecimento, agora fica mais fácil identificar porque os exemplos clássicos de Gettier têm um forte apelo ao negar o conhecimento ao agente em questão. Entretanto, ainda há uma segunda sorte problemática para o conhecimento, a saber, a reflexiva. Esse tipo de sorte é abordada a partir do seguinte raciocínio: sabendo a posição reflexiva do agente, é questão de sorte que sua crença seja verdadeira (PRITCHARD, 2005, p.173-175)9. Nesse caso, mesmo que a crença do agente não caia na categoria de sorte veritativa, ela ainda pode cair na sorte reflexiva, minando a atribuição de conhecimento apropriada ao agente. Por exemplo, pense em um fazendeiro que saiba o sexo dos pintinhos com tamanha facilidade que ele apenas precise segurá-los, entretanto, tal fazendeiro tem uma crença falsa sobre como ele sabe disso, e também se fosse perguntado a ele como sabe o sexo dos pintinhos ele não saberia defender sua justificativa como sendo confiável. Segundo Pritchard (2005, p.174-175), falta algo epistemologicamente importante para o fazendeiro, que não cai na sorte veritativa, já que ele tem um procedimento para atingir sua crença verdadeira, de modo que na maioria dos mundos possíveis próximos organizados de modo padrão ele atinja o resultado desejado. Entretanto, tal crença verdadeira falha em ocorrer em mundos possíveis próximos não-padronizados, ou seja, organizados a partir das coisas que o agente pode saber sozinho por reflexão. O que falta para o fazendeiro é ter boas bases para reflexão de sua crença verdadeira e é preciso que essas bases sejam acessíveis, ou seja, é preciso uma noção de justificação internalista. A dificuldade em atribuir conhecimento nesse caso está em que o agente, apesar de ter uma crença verdadeira e justificada, inclusive com certo procedimento e sucesso, está no fato de parecer que ele não tem ideia de como está conseguindo atingir esses resultados, ele está atingindo seus resultados sendo reflexivamente sortudo. Para Pritchard:

O problema não é que tal conhecimento é alvo da sorte epistêmica no modo que, por assim dizer, as crenças verdadeiras nos casos de Gettier são alvo da sorte epistêmica (ou seja, sorte veritativa), mas, mais especificamente, que abordagens externalistas de conhecimento permitem que a posse do conhecimento co-exista com certo tipo de sorte reflexiva que é epistemologicamente problemática (2005, p.177).

Com base nas distinções de Pritchard entre sortes epistêmicas problemáticas e não-problemáticas para o conhecimento, já fica possível identificar melhor como o fenômeno é categorizado e posicionarmos mais facilmente os exemplos que surgiram nas primeiras considerações.

Seguindo nas tentativas de categorizar a sorte epistêmica, Daniel Statman (1991) oferece categorias de divisão do fenômeno que são análogas às classificações da sorte moral. Para situar o leitor, a sorte moral é um fenômeno da moralidade em que fatores aleatórios ao controle do agente exercem participação na moralidade por meio dos resultados das ações (sorte resultante), circunstâncias que o agente enfrenta (sorte circunstancial), de sua constituição (sorte constitutiva) e causas antecedentes a sua ação (sorte causal)10. Tal analogia é feita no intuito de tentar aproximar os dois fenômenos e esclarecer as duas esferas, para tanto, diferentemente de Pritchard, Statman aborda o conceito de “sorte” como ausência de controle, definição mais comum no debate da sorte moral (ver nota 3 acima).

Com essa pretensão destacada, as duas categorias que vão surgir são: a sorte epistêmica situacional (análoga a sorte moral causal, circunstancial e constitutiva), e a sorte epistêmica resultante (análoga a sorte moral resultante). A sorte epistêmica situacional trata da “Sorte nas causas ou circunstâncias que acarretam em algum sujeito S acreditar em p, ou ser tal pessoa que acredita em p”, enquanto a sorte epistêmica resultante trata da “Sorte a respeito de p ser verdadeiro ou falso” (STATMAN, 1991, p.148). De modo mais específico, o que está em jogo na primeira categoria são “os fatores culturais, psicológicos e históricos” (1991, p.148). Pensemos nos casos vistos anteriormente de Tesla, Fleming e Jenner, em tais cenários, identificamos facilmente fatores de sorte epistêmica situacional. Primeiramente, há as questões psicológicas que possibilitaram a Tesla ter uma facilidade maior com seus projetos, tais fenômenos começaram a acontecer depois de Tesla ter sido muito influenciado pela morte de seu irmão. Logo, supomos que se Tesla fosse submetido a outros eventos, não teria desencadeado suas visões e flashes. Alexander Fleming teve a sorte circunstancial de suas colônias de bactérias encontrarem condições climáticas adequadas para que o desenvolvimento de fungos fosse compatível com o término de suas férias. Já Jenner também teve fatores epistêmicos situacionais em seu favor, tendo em vista que era possível ele crescer em uma comunidade mais urbana, ou ter sido influenciado a perseguir outro tipo de carreira, até mesmo ter nascido em uma época de avanço dos protocolos de ética em experimentos. Essa categoria de sorte cobre uma grande gama de situações, passando pelas evidências que a situação possibilita para o agente formar suas crenças, pelas informações disponíveis, pelo modelo político em que se vive, pelas teorias científicas dominantes em sua época, pelos aparelhos tecnológicos descobertos, e também por questões de gênero, classe, religião, etc.

Statman (1991, p.149) vai mais longe e trata do que estaria epistemologicamente por trás de cada subcategoria de sorte situacional. A sorte epistêmica causal poderia receber uma abordagem reducionista afirmando que nossas crenças são redutíveis a processos causais de atividades químicas ou físicas do corpo. Na sorte epistêmica constitutiva, elencamos alguns fatores hereditários ou capacidades intelectuais do agente, como por exemplo, ter boa memória, QI alto, bom raciocínio lógico, ser curioso, dogmático, etc., todos esses fatores constitutivos irão influenciar em como o agente forma ou mantêm crenças. Já na sorte circunstancial, Statman destaca sua influência por dois flancos, a saber, pelo desenvolvimento de conceitos e em situações enganadoras. No primeiro caso pensemos em alguém que nasce em um tempo que o conceito de raças étnicas está em pleno vigor, ou nasça em um tempo que a depressão era tomada como melancolia, ou que a homossexualidade era tida como doença. Todos esses casos retratam como conceitos tem um efeito amplo na formação de crenças. No que diz respeito a situações enganadoras, imaginemos alguém que nasceu em uma ditadura e tem todas as informações e fatos, que são divulgados pela mídia e pela educação formal, controlados pelo governo. Há também casos mais cinematográficos, como o filme O Show de Truman (1998) (The Truman Show) em que o protagonista, Truman, desde os seus primeiros dias de vida passou a viver em uma cidade totalmente orquestrada, com atores e enredo, de modo que formou durante sua vida uma série de crenças falsas, em decorrência de um mundo falso que criaram para ele com o fim de entretenimento para as pessoas do mundo real.

Sobre a sorte epistêmica resultante, Statman apresenta certo receio em enquadrá-la como sendo a representante dos casos de Gettier, mas, em uma nota de rodapé, se mostra mais inclinado a essa possibilidade. Assim, também acredito que não teríamos dificuldade em enquadrar os casos de estilo Gettier, como o do relógio parado e da ovelha falsa, como sendo questão de sorte a crença do agente vir a ser verdadeira11.

Com base nos dois tratamentos que a sorte epistêmica recebe por parte de Pritchard e Statman, é possível abordar o fenômeno com mais precisão e clareza, o que, como veremos a seguir, também facilita na hora de se propor uma solução.

Possíveis Soluções ao Problema da Sorte Epistêmica

Após o breve esclarecimento da dimensão que a sorte epistêmica toma em nossas atribuições de conhecimento, é produtivo investigarmos algumas linhas de propostas que visam solucionar o problema. Mas antes de partir para esse objetivo, esclarecerei duas limitações da presente seção. A primeira diz respeito ao escopo do problema da sorte epistêmica, pois, como foi visto anteriormente, diferentes autores categorizam e escolhem diferentes categorias de sorte para solucionar, logo, manterei o foco em como algumas teorias visam resolver apenas os problemas de estilo Gettier. Essa primeira limitação se justifica na medida em que este é um problema canônico na epistemologia contemporânea, fazendo com que qualquer teoria do conhecimento se veja obrigada a superar. A segunda limitação diz respeito as propostas epistêmicas analisadas, que serão: o modelo da epistemologia das virtudes antissorte, de Pritchard, e o modelo de conhecimento como crédito de John Greco. A escolha dos dois autores se dá por ambos defenderem a importância de componentes da virtude em suas teorias epistêmicas que, como veremos no decorrer do artigo, é uma estratégia bastante promissora na temática.

Sabendo as delimitações da seção, partirei agora para a solução de Pritchard aos casos de Gettier (os casos de sorte veritativa, em sua terminologia). Primeiramente, é importante ter em mente a preocupação de Pritchard em oferecer o que ele chama de um projeto analítico do conhecimento (2005, 2009, 2012, 2017). Tal projeto estaria comprometido com uma concepção de conhecimento que seja informativo e não-circular. Dito isso, uma dificuldade iminente de seu projeto é lidar com os casos de sorte epistêmica problemáticas para o conhecimento que foram oferecidos por Gettier, pois, como vimos, tais exemplos fragilizam nossas concepções intuitivas de conhecimento. Pritchard, então, ao analisar os casos de Gettier, identifica que o projeto analítico deve lidar de modo independente com dois princípios que são exigidos em prol da eliminação desse dilema, a saber, um princípio antissorte e um princípio de habilidades.

Segundo o autor, em tal categoria de sorte, o agente mostra um sucesso cognitivo (crença verdadeira) e ainda assim não tem conhecimento, pois seu sucesso se dá pela sorte e não pelas suas habilidades cognitivas que deveriam rastrear o sucesso. Esse resultado é notável nos casos da ovelha falsa e do relógio parado, pois, em todas as situações os agentes adquirem uma crença verdadeira, mas ela é fruto de sorte e não é derivada de um esforço cognitivo dos agentes em questão. O que o autor também pontua, é que apesar do aspecto da justificação em teorias do conhecimento tentar resolver o problema do princípio de habilidade e antissorte, fazendo o agente ter um esforço cognitivo significativo e, garantindo que o sucesso não seja arbitrário, os casos de Gettier mostram que a justificação sozinha não dá conta dessas pretensões. Em suas palavras:

O que os casos ao estilo Gettier mostram, contudo, é que a condição de justificação na maioria das vezes acomoda apenas o princípio de habilidade, e não lida com o princípio antissorte. Reconhecer esse ponto é importante para os prospectos de responder ao problema analítico, já que isso destaca o sentido em que os dois princípios impõem demandas distintas para uma teoria do conhecimento (2017, p.59-60).

Pritchard parte, então, para a elaboração de uma teoria do conhecimento que dê conta de satisfazer as duas intuições ordinárias. Assim, para satisfazer o princípio antissorte, o autor defende uma Condição de Segurança:

Condição de Segurança: “a crença de S é segura se, e somente se, na maioria dos mundos possíveis próximos (most near-by) em que S continue a formar a sua crença sobre a proposição em questão do mesmo modo que no mundo real, e em todos os mundos possíveis muito próximos em que S continue a formar sua crença sobre a proposição em questão do mesmo modo que o mundo real, sua crença continua a ser verdadeira” (2009, p.34).

Entretanto, preocupado com a interdependência da intuição antissorte e da intuição de habilidade, Pritchard pondera sobre a possibilidade de haver uma crença verdadeira e segura que ainda não fosse conhecimento, pois a relação entre a crença do agente e o fato poderia estar enviesada ou ser problemática, mesmo que o agente assegurasse o sucesso cognitivo na maioria dos mundos possíveis próximos e em todos os mundos possíveis muito próximos. Com base nessa preocupação, nosso autor adiciona uma cláusula sobre as virtudes do agente, elaborando uma epistemologia das virtudes antissorte:

Conhecimento: “S sabe que p se, e somente se, o sucesso cognitivo seguro de S for a manifestação das habilidades cognitivas relevantes de S, onde esse sucesso cognitivo seguro é em um grau significante creditável a manifestação das habilidades cognitivas de S” (2017, p.64).

Mas o que seria, mais propriamente dito, uma habilidade cognitiva? Segundo Pritchard (2012, p.12), seriam disposições para formar crenças que conduzem ao conhecimento, sendo que para essas disposições serem qualificadas para conduzirem ao conhecimento, tem de serem confiáveis (reliable) e adequadas (suitable).

Com a teoria do conhecimento de Pritchard, identificamos como seriam solucionados os casos ao estilo Gettier. Primeiramente, argumentaríamos que em exemplos como o de Smith, da ovelha falsa e do relógio parado, em todas as situações os agentes não atingiriam nem a condição de segurança. Tome, por exemplo, os agentes do caso do relógio parado e da ovelha falsa, poderíamos facilmente conceber que se os agentes formassem suas crenças em mundos possíveis próximos como eles formaram no mundo real, eles não teriam tido uma crença verdadeira na maioria deles, ou seja, o sucesso cognitivo é inseguro. Ademais, suas crenças verdadeiras também não são creditáveis a manifestação de suas habilidades cognitivas, pois seu sucesso cognitivo parece se dar ao acaso, e não ser fruto de uma manifestação relevante de suas capacidades intelectuais.

Logo, como vimos, em casos de sorte ao estilo Gettier (sorte veritativa) os agentes falham em ter conhecimento porque não cumprem os requisitos necessários de segurança (antissorte) e também não cumprem os requisitos da epistemologia das virtudes (princípio das habilidades).

Visto como Pritchard se posta diante dos problemas epistêmicos levantados por Gettier, vejamos a abordagem de conhecimento de John Greco (2003, 2010, 2012), que defende o conhecimento como sendo um sucesso cognitivo de S, que seja atribuível às habilidades cognitivas de S. Greco, como será visto melhor no decorrer da explicação, defende uma epistemologia das virtudes para os problemas do conhecimento. Segundo o autor, focar no princípio de habilidade resolve, por extensão, também o princípio antissorte. Logo, diferentemente de Pritchard, que toma essas duas intuições do conhecimento de modo independentes, isto é, que fazem demandas distintas, Greco as toma como dependentes, pressupondo que uma teoria do conhecimento que parta da intuição de habilidade resolve também a intuição antissorte12.

Considerando que o conhecimento seja um sucesso cognitivo de S, atribuível a S, Greco se propõe a analisar o que estaria em jogo nessa relação de atribuição entre o sucesso cognitivo e as habilidades cognitivas do agente. O que estaria por trás dessa relação seria uma relação pragmática13, ou seja, as competências de S contribuem de modo correto para que S tenha uma crença verdadeira, sendo que “de modo correto” significa que serve aos propósitos relevantes, denotando a abordagem pragmática do conhecimento. Nas palavras de Greco:

Um sucesso é atribuível as habilidades de S somente no caso das habilidades de S contribuírem para o sucesso de modo correto, em que ‘modo correto’ significa ‘de modo que regularmente serviria aos propósitos relevantes’ (2012, p.14).

O lado pragmático fica mais claro na noção de “propósitos relevantes” em que Greco destaca que uma das funções essenciais do conhecimento é sinalizar que a pessoa que possui esse status é um bom informante e tem boas informações sobre uma tarefa prática. Logo, o agente tem conhecimento se suas habilidades contribuem de modo correto para esse sucesso, em que o “modo correto” se dará diante das necessidades informativas da situação em questão.

Outra pergunta restante, para a tese ficar satisfatoriamente explicada e partirmos para os casos de Gettier, é conceituar o que Greco toma como “habilidades cognitivas” exigidas pelo conhecimento. Para o autor elas são: “uma disposição para alcançar uma verdade relevante, em uma circunstância relevante, relativo a um ambiente, com um suficiente grau de confiança” (2012, p.18). O cuidado em generalizar as cláusulas está fundamentado na descrição de algumas condições a serem consideradas na hora de avaliarmos as habilidades dos agentes. Por exemplo, considere a habilidade de um jogador de futebol em chutar uma bola. Em tal caso, não é porque ele falha em chutar uma bola de basquete, em uma rua esburacada, durante a noite e sem a iluminação devida, que ele não tenha habilidades relevantes de um jogador de futebol. Logo, é preciso ter um cuidado na avaliação das circunstâncias e condições em que o sujeito executa sua habilidade para sabermos se ele consegue atingir o sucesso relevante e com confiança suficiente. Esse cuidado está fundamentado, como já foi visto, nas necessidades de informação que a tarefa exige, sendo que essas necessidades devem ser locais e globais.

Com essas considerações, fica mais fácil entender o conceito de conhecimento de Greco, formalizado a seguir:

Conhecimento: “S sabe que p se, e somente se, S acreditar que p for produzido por um exercício de habilidade intelectual (do tipo certo*), e a crença de S produzida contribui (de modo correto+) para S ter uma crença verdadeira.

* = do tipo certo que regularmente serviria as necessidades informativas relevantes, locais (reais) e globais (típicas e/ou prováveis).

+ = de modo correto que regulamente serviria as necessidades informativas relevantes, ambas local e global” (2012, p.19)14.

Agora estamos prontos para avaliar como esse modelo responderia às objeções da sorte epistêmica de Gettier. O que notamos nos casos da ovelha falsa e do relógio parado, é que a crença que é produzida pelas habilidades intelectuais, sejam elas a visão, memória, audição, etc., não contribuem de modo correto para os agentes terem os sucessos cognitivos que têm. Aprofundando o diagnóstico, as habilidades cognitivas dos agentes em casos de estilo Gettier não podem ser regularmente exploradas, pelo menos não confiavelmente. Esse aspecto parece minar a função pragmática do conhecimento, que é sinalizar um bom informante, uma boa fonte, boa informação, etc., de modo que supra as necessidades informativas práticas de uma determinada tarefa com confiabilidade. Logo, se o conceito de conhecimento serve para sinalizar boas informações e fontes, se segue que o agente que pretende cumprir esse papel deve conectar esse resultado corretamente com suas virtudes, caso contrário, não será objeto de conhecimento. Para Greco:

Em casos de Gettier [...]. S acaba com uma crença verdadeira, e suas habilidades contribuem para isso, mas não de um modo que pode ser regularmente explorado, não de modo dependente ou confiável. [...] Em todos os casos, S acredita com base em uma habilidade que contribui para S acabar com uma crença verdadeira – em todos os casos, o exercício da habilidade é parte da estrutura causal total que leva ao efeito desejado. Mas em casos de Gettier a rota da habilidade para a verdade é anormal. Em outras palavras, não é o tipo de rota que pode ser regularmente explorada para propósitos relevantes (2012, p.17).

Por fim, acredito que consegui expor duas teorias que usam de elementos das virtudes intelectuais para resolver um grupo específico de sorte epistêmica, a saber, os casos do estilo Gettier. Como extensão, vimos algumas respostas formalizadas que visam defender nossas intuições mais sólidas quando se trata de atribuir conhecimento.

Sorte Epistêmica fora do Modelo Proposicional e a Epistemologia das Virtudes

No decorrer do capítulo vimos o desafio que a sorte epistêmica põe para o conhecimento de modelo proposicional. E diante das tensões vistas para defender algumas intuições que tínhamos em casos ao estilo Gettier, até casos mais clássicos das ciências, também vimos algumas propostas para ajudar a dar fundamento a estas nossas convicções mais profundas sobre quando negar, e quando atribuir conhecimento aos agentes. Logo, após esse caminho de familiarização com o problema, irei expor minha sugestão de abordagem para tratar o problema da sorte epistêmica, também a partir da epistemologia das virtudes.

Comecemos com a investigação sobre epistemologia das virtudes que, apesar de já ter aparecido nas abordagens de Pritchard e Greco, vistas na seção acima, ainda é preciso contornar melhor essa área epistemológica. Sendo assim, no que consiste a epistemologia das virtudes? De modo geral, a epistemologia das virtudes estabelece uma relação entre o conhecimento e virtudes epistêmicas apresentadas pelo agente. Essa definição geral se deflagra em diversas abordagens diferentes, como por exemplo, os confiabilistas (reabilism) e os responsabilistas (responsabilism). A grande diferença entre os confiabilistas e os responsabilistas está em como ambos caracterizam as virtudes epistêmicas. Por um lado, os confiabilistas tomam tais virtudes como faculdades epistêmicas, por exemplo, capacidades visuais, auditivas, memória, introspecção, intuição, etc. Nesse campo encontramos autores como Greco, Pritchard e Sosa. Enquanto responsabilistas tomam as virtudes epistêmicas como traços de caráter, por exemplo, ter a mente aberta, ter amor ao conhecimento, ser corajoso e autônomo. Nesse campo temos autores como Zagzebski, Roberts e Wood, Lorraine Code e Miranda Fricker (TURRI; ALFONSO; GRECO, 2017). A reflexão de Lorraine Code elucida melhor as diferenças entre as posições:

Eu chamo a minha posição de ‘responsabilista’ em distinção a posição ‘confiabilista’ de Sosa, pelo menos quando a discussão se dá sobre o conhecimento humano. Isso porque o conceito de ‘responsabilidade’ pode permitir uma ênfase sobre a natureza da atividade com agente que conhece/acredita que o conceito de ‘confiança’ não pode. Em minha visão, o agente que tem conhecimento/crenças tem um importante grau de escolha a respeito dos modos de estrutura cognitiva e é responsável (accountable) por essas escolhas. Um agente confiável pode simplesmente ser preciso, mas relativamente passivo, gravando experiências. Nós poderíamos falar de um computador confiável, mas não de um computador responsável (1984, p.39-40).

Dito de outra forma, pelo modelo responsabilista, cobramos e exigimos do agente certa conduta responsável, sua escolha e aperfeiçoamento da conduta. Há aqui um paralelo mais forte com as virtudes morais e intelectuais do modelo aristotélico. Exigimos que o agente não seja dogmático, que ele tenha a mente aberta e mantenha a curiosidade epistêmica, exercitando essas virtudes com a finalidade de ter uma vida intelectual melhor. Já pelo modelo confiabilista, fica mais difícil exigir que o agente tenha uma boa visão, audição ou outras faculdades perceptuais. Ao mesmo tempo que é mais difícil treinar e exercitar essas faculdades. Se formos pensar em termos de censura epistêmica, reagimos mais severamente com alguém que é dogmático do que com alguém que tem uma visão ruim. Assim, julgo a abordagem responsabilista mais promissora exatamente por fornecer uma relação mais forte com a conduta do agente, isto é, o quão comprometido estava ele com seu desempenho epistêmico e quanto podemos cobrar dele.

O problema está em que a visão responsabilista, pelos modelos tradicionais que vimos, ainda é fortemente ligada ao conhecimento proposicional, o que deixa os raciocínios sobre o agente e sua vida epistêmica demasiadamente engessados. Felizmente, é possível identificar subgrupos dentro da epistemologia das virtudes responsabilista. Jason Baehr (2008) oferece uma clarificação sobre as diversas vertentes que surgiram entre os defensores de virtudes intelectuais clássicas no conhecimento. Segundo o autor, os responsabilistas se destacam em quatro subgrupos: conservadores radicais e moderados, e autônomos radicais e moderados. O que caracteriza os conservadores está no papel que dedicam as virtudes epistêmicas no conhecimento, mais precisamente, os radicais irão argumentar que diversos problemas da epistemologia tradicional são resolvidos se dermos as virtudes intelectuais um papel central. Tais problemas vão desde conceitos como justificativa, conhecimento, crença, até os debates do externalismo vs internalismo. Já conservadores moderados acreditam que o papel das virtudes apenas é necessário para o debate, e não suficiente, consequentemente, as virtudes não ocupariam todos os lugares no discurso.

Por outro lado, os autônomos são distinguidos pelo modo como decidem romper com a tradição. Os radicais, por exemplo, defendem que o projeto tradicional do conhecimento, a preocupação central em proposições, justificações, crenças verdadeiras, etc., deveria ser abandonado em prol de um projeto das virtudes. Os moderados, por sua vez, apesar de também defenderem uma independência e relevância de um projeto das virtudes não defendem que tais pretensões devam substituir a epistemologia clássica, apenas trabalhar em paralelo a ela, e até mesmo em complementando. Segundo Baehr, os projetos que um autônomo moderado pode investigar são os seguintes:

[...] (1) A natureza fundamental de uma virtude intelectual [...]; (2) A estrutura fundamental de uma virtude intelectual [...]; (3) Relações entre as virtudes intelectuais [...]; (4) A relação de virtudes intelectuais em outras dimensões ou elementos da vida intelectual, ou do caráter [...]; e (5) A estrutura interna e aplicação de virtudes intelectuais individuais [...] (2008, p.492).

Como visto, os autônomos moderados se concentram em alguns campos de investigação que são distintos do modelo clássico de conhecimento proposicional. Roberts e Wood (2007), por exemplo, consideram o conhecimento proposicional apenas como uma área da epistemologia. Sendo que deveríamos focar a investigação também em uma série de outros bens epistêmicos além da crença verdadeira, como por exemplo, o desenvolvimento de virtudes, o entendimento (understanding), a familiarização (acquaitence), etc. Essa abordagem, com o foco em desenvolver uma boa vida intelectual, é chamada por eles de epistemologia regulativa, que não tem como objetivo desenvolver uma teoria do conhecimento, mas sim um guia para a prática epistêmica através do treino de virtudes. Para ajudar nesse projeto, eles propõem um mapa conceitual descrevendo uma série de virtudes epistêmicas, como por exemplo, humildade, generosidade, prudência, etc.

Acredito que considerar a epistemologia como uma ampla área, que cobre não somente a crença verdadeira decorrente de proposições, mas sim com um escopo maior de bens epistêmicos como a conduta virtuosa, garantiria importantes contribuições para o debate da sorte epistêmica, especialmente por nos dar mais opções de avaliação a uma conduta do que apenas apontar se o agente atingiu, ou não, conhecimento proposicional. Como vimos, a sorte epistêmica é praticamente onipresente, então por que tratar ela apenas pelo seu aspecto proposicional? Por exemplo, quando o agente não consegue atingir um sucesso cognitivo, isto é, uma crença verdadeira, ainda veríamos valor epistêmico em sua conduta ao nos perguntarmos: como se deu o processo epistêmico do agente em direção a seu objetivo? É sabido que há elementos de sorte em diversas situações, logo, uma das bases para nossas avaliações epistêmicas, seria como o agente exerceu um determinado conjunto de virtudes. Considere, por exemplo, os casos de Tesla, Jenner e Fleming, mesmo que seja possível identificar fatores de sorte naqueles casos (como vimos com Statman), nós fundamentaríamos o elogio epistêmico e a responsabilidade que eles têm, com base no grau de exercício de algumas virtudes epistêmicas como a perseverança, a curiosidade, atenção/consciência e por aí vai. Alternativamente, ao pensarmos em grandes figuras históricas das áreas do conhecimento que não obtiveram um sucesso cognitivo por uma má sorte situacional, ainda seria possível avaliar o uso de virtudes intelectuais relevantes e constantes em seus empenhos. E em casos como de Jenner, ao mesmo tempo que elogiamos sua virtude epistêmica de curiosidade e observação perspicaz, poderíamos condenar seu vício epistêmico de excesso de persistência intelectual ao colocar a vida de um garoto em jogo para atingir seu objetivo.

Entretanto, tal resultado parece ser mais facilmente atingível na medida em que não tratamos a epistemologia como sendo esgotada na esfera de crença verdadeira das proposições. Pois, esse método considera a área do conhecimento como um sistema de “tudo ou nada”, e na medida em que queremos acessar graus de responsabilidade, ou excelência, na ação, é mais desejável avaliar condutas, práticas, expectativas, etc., do que propriamente analisar se o agente “sabe que p”. Dito de outro modo, a influência da sorte no conhecimento promocional ainda é relevante, mas podemos abordar também a influência dela na conduta epistêmica de modo geral, ponderando outras avaliações como elogio e censura intelectuais com base no exercício de bens epistêmicos como as virtudes. Tais avaliações ocorreriam em graus, sabendo que o exercício desses bens epistêmicos também se apresenta em graus, elemento que está ausente no conhecimento proposicional.

Outra vantagem implícita nessa última parte é a riqueza conceitual que um discurso das virtudes nos oferece. O tratamento da epistemologia tradicional, trabalhando com conceitos centralizados de “conhecimento”, “justificação” e “crença verdadeira” nos diz pouco sobre o conteúdo de tais termos e menos ainda sobre o agente. Em contrapartida, afirmar que um agente foi corajoso, que foi autônomo, sábio, prudente, etc., nos entrega mais informações sobre a sua conduta, e consequentemente, avaliamos melhor as suas práticas15. Linda Zagzebski reforça esse ponto:

Tais conceitos recém mencionados [de uma linguagem das virtudes] tem um conteúdo muito mais rico. Eles não são apenas termos normativos, transmitindo uma avaliação negativa, mas indicam o modo como o agente agiu de modo impróprio (1996, p. 20).

O que percebemos ao longo dessa última parte, é que considerar o conhecimento como uma área que garante acesso a vários bens epistêmicos, e não somente à crença verdadeira, derivada do foco proposicional, nos oportuniza uma série de benefícios derivados de uma abordagem centrada nas virtudes.

Considerações finais

Ao longo do artigo procurei primeiramente mostrar os desdobramentos da sorte epistêmica. Isto é, desde o artigo de Gettier que iniciou as discussões propriamente ditas, o problema dos fatores de sorte no conhecimento ganhou corpo. Como vimos, os processos de aquisição de conhecimento são influenciados por fatores circunstanciais, constitutivos e causais, apresentando um horizonte ainda mais problemático do que o artigo de Gettier mostrou inicialmente. Por exemplo, ao adquirirmos uma crença verdadeira somos, muitas vezes, auxiliados por evidências, situações e talentos naturais que não escolhemos, ou seja, fatores de sorte.

Mas será que toda a participação da sorte é equivalente e problemática? O que queremos dizer com “sorte”? Essas indagações foram abordadas com as sugestões de classificação e conceituação ofertadas por Pritchard e Statman, que limpam o terreno do fenômeno, possibilitando uma análise mais clara e propicia para tentativas de solução. E a respeito de soluções, vimos as respostas de Pritchard e Greco aos casos clássicos de Gettier, que nos ajudaram a preservar as intuições epistêmicas que temos quando se trata de conhecimento.

Por fim, busquei focar na sorte epistêmica fora do campo proposicional, pois, como vimos, os elementos de sorte acontecem em praticamente todo o processo de aquisição da crença verdadeira. Assim, por meio de uma abordagem responsabilista da epistemologia das virtudes, que busca considerar bens epistêmicos para além da crença verdadeira, seria possível termos uma gama maior de avaliações epistêmicas mesmo em casos de sorte.

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Notas

2 Esse artigo é fruto de um capítulo da minha dissertação de mestrado, apresentada na UNISINOS. A dissertação se intitula: “Sorte moral e epistêmica: uma investigação sobre possíveis aproximações entre os dois fenômenos” (2021).

3 Para mais detalhes sobre esses fenômenos que acometiam Tesla, ver o livro Tesla, man out of time, de Margaret Cheney (1981, p.6-20).

4 Vemos aqui a defesa de Pritchard a um modelo de sorte modal, diferentemente de como Daniel Statman (1991; 2019). Para um conhecimento argumentativo dos dois autores sobre porque a abordagem deles tem mais vantagens sobre outras concepções de sorte, ver o artigo de Pritchard “Modals Account of Luck” (2019, p.115-124) e de Daniel Statman “The Definition of “Luck” and the Problem of Moral Luck” (2019, p.195-205), ambos presentes no livro The Routlegde Handbook of Philosophy and Psycology of Luck editado por Iam M. Church e Robert Hartman (2019).

5 Pritchard parte da contribuição de Peter Unger que em seu artigo “An analisys of Factual Knowlegde” (1968) ofereceu esclarecimentos sobre alguns acidentes no conhecimento dos agentes que não os desqualificam como conhecedores (como os acidentes da sorte por conteúdo e nas capacidades). Mesmo Unger tratando desses casos, não é mencionado uma etimologia para esses tipos de sorte epistêmica, bem como Pritchard identifica mais dois modelos de sorte epistêmica (sorte doxastica e sorte nas evidências) dentro das duas classificações ofertadas por Unger.

6 Apesar de Unger focar na sorte da existência ou de estar vivo, Pritchard destaca que essa categoria de sorte pode se estender as capacidades cognitivas que possibilitam o agente a conhecer (2005, p.134-136).

7 Pritchard (2005, p.138-140) considera em sua conceituação da sorte por evidências e da sorte doxástica que ambas possam acontecer de modo separado, apesar de tais exemplos serem mais controversos e poderem minar a atribuição de conhecimento, sendo dependentes de alguns princípios epistêmicos. Entretanto, o autor decide focar nos casos que as duas sortes estão juntas e, que são menos controversos.

8 Pritchard em seu artigo “Moral and Epistemic Luck” (2006b, p.1-25), dá uma conceituação mais formal da sorte veritativa, a saber, “Para todos os agentes, φ, a verdade da crença de um agente em uma proposição contingente, φ, é do tipo sorte veritativa se, e somente se, a crença do agente que φ é verdade no mundo real, mas falsa na maioria dos mundos possíveis próximos (near-by) em que a crença é formada do mesmo modo que é formada no mundo real” (p.14).

9 Também em seu artigo “Moral and Epistemic Luck” (2006b, p.1-25), Pritchard oferece uma definição mais completa da sorte reflexiva, a saber, “Para todos os agentes, φ, a verdade da crença do agente em uma proposição contingente, φ, é do tipo sorte reflexiva se, e somente se, a crença do agente que φ é verdadeira no mundo real, mas, dado somente o que o agente é capaz de saber sozinho por reflexão, é falsa na maioria dos mundos possíveis próximos (near-by) em que a crença é formada do mesmo modo que é formada no mundo real” (p.17).

10 Para mais detalhes sobre a tema da sorte moral ver o artigo de Bernard Williams intitulado “Moral Luck” (1993) e o artigo de Thomas Nagel também intitulado “Moral Luck” (1993).

11 Importante ressaltar que, diferentemente de Pritchard, Statman não faz um juízo de valor sobre a relevância desses tipos de sorte epistêmica para o conhecimento, se restringindo apenas a dizer que tais possibilidades existem, e que considerações sobre a proximidade desses casos com o de sorte moral, podem ser considerados.

12 Por essa pretensão de Greco, Pritchard o classifica como defensor de uma teoria das virtudes robusta (Pritchard, 2012, 2017).

13 Diferentemente dos trabalhos de Greco como: “Knowledge as Credit for True Belief” (2003) e Achieving Knowledge (2010), em que o autor defende a relação de atribuição como uma função explicativa, em “A (diferente) Virtue Epistemology” (2012), Greco se propõe a analisar essa característica pela sua função pragmática.

14 Greco ainda argumenta que sua tese se mantém neutra a respeito da semântica da atribuição de conhecimento, podendo trabalhar com o invariantismo e o contextualismo. Bem como a respeito das condições de conhecimento, sua tese também se mantém neutra, podendo ser preenchida por teorias puristas (purist) ou teorias de infiltração (encroachment). Para mais detalhes sobre o tema, ver o artigo de John Greco intitulado “A (different) Virtue Epistemology” (2012, pp.1-26).

15 Em seu livro, Virtues of the Mind: An Inquiry into the Nature of Virtue and the Ethical Foundations of Knowledge (1996), Linda Zagzebski (p.1-75) faz diversas considerações sobre as vantagens de aplicar um raciocínio das teorias morais, em teorias epistêmicas.

Material suplementario
Notas
Notas de autor
1 Doutorando(a) em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), São Leopoldo – RS, Brasil. Bolsista do(a): Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES, Brasil.
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