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Recepción: 10 Septiembre 2019
Aprobación: 21 Noviembre 2019
Resumo: A Votorantim, um dos principais grupos empresariais atuando na economia brasileira, tem sua origem que remonta ao ano de 1891, quando o banco União de São Paulo criou a Fábrica Têxtil Votorantim no município paulista de Sorocaba. Com a falência do banco União em 1917, a empresa foi leiloada e, nos anos subsequentes, seu controle acionário foi adquirido pelo português Antonio Pereira Ignácio, um importante industrial do setor têxtil paulista e que fez da Votorantim a principal firma do ramo têxtil algodoeiro de São Paulo nas décadas de 1920 e 1930. Todavia, a partir dos anos 1930, o Grupo Votorantim passou a concentrar esforços no setor de bens intermediários – cimento, produtos químicos, alumínio, aço e ferro – através da constituição das seguintes empresas: Fábrica de Cimento Santa Helena (1936), Siderúrgica Barra Mansa (1937), Cia. Nitro-Química (1937) e a Cia. Brasileira de Alumínio (1955). Tendo em vista a escassez de análises sobre como teria se dado a conversão do Grupo Votorantim do setor de bens de consumo finais à indústria de base, o artigo aborda esta guinada realçando: a correlação entre o Grupo e o projeto industrializante do presidente Getúlio Vargas, os recursos produtivos preexistentes e a expertise industrial de seus dirigentes. A pesquisa calca-se em documentação primária constituída de: relatórios da diretoria do Grupo Votorantim, demonstrações de lucros e perdas e balanços patrimoniais. Como resultado, o artigo traz uma contribuição ao debate sobre a formação de grupos econômicos em economias periféricas, ao demonstrar que, no caso da Votorantim, a geração de receitas pelo próprio Grupo foi o instrumento principal de financiamento à criação das novas empresas no setor de bens intermediários do Brasil.
Palavras-chave: Votorantim grupo econômico, têxtil, bens intermediários.
Abstract: : Votorantim, one of the main business groups operating in the Brazilian economy, has its origin dating back to 1891, when the União de São Paulo bank created the Votorantim Textile Factory in the city of Sorocaba. With the bankruptcy of Banco União in 1917, the company was auctioned and, in subsequent years, its shareholding control was acquired by the Portuguese Antonio Pereira Ignácio, an important industrialist of the São Paulo textile sector, who made of Votorantim the leading company in the cotton textile industry. However, from the 1930s onwards, the Votorantim Group began to concentrate its efforts on the intermediate goods sector – cement, chemicals, aluminum, steel and iron – through the constitution of the following companies: Santa Helena Cement (1936), Barra Mansa Steelworks (1937), Nitro-Chemical Company (1937) and the Brazilian Aluminum Company (1955). Given the lack of analysis on how the Votorantim Group’s conversion from the final consumer goods sector to the basic industry took place, the article addresses this shift by highlighting: the correlation between the Group and President Getúlio Vargas’s industrial project, the pre-existing productive resources and the industrial expertise of its leaders. The research is based on primary documentation consisting of: Votorantim Group management reports, profit and loss statements and balance sheets. As a result, the article contributes to the debate on the formation of economic groups in peripheral economies by demonstrating that, in the case of Votorantim, the Group’s own revenue generation was the main financing instrument for the creation of new companies in the sector of intermediate goods in Brazil.
Keywords: Votorantim, business group, textile, intermediate goods.
Introdução
Como resultado, ao final da década de 1970, a Votorantim era o segundo maior grupo econômico do Brasil e o líder no setor industrial. Ao cotejar esta trajetória de 89 anos – entre 1891 e 1980 – evidencia-se o alinhamento do Grupo ao modelo econômico brasileiro que, do predomínio de uma indústria de bens de consumo assalariado até o início da década de 1930 trasladou-se à fase de pesados investimentos nos setores de bens de capital, intermediários e de consumo duráveis, tendo no Grupo Votorantim uma das principais expressões do capital nacional junto ao projeto industrializante do Brasil.
A Fábrica Têxtil Votorantim foi criada na cidade de Sorocaba-SP no ano de 1891, por iniciativa do banco União de São Paulo, o maior banco paulista àquele momento. Em 1918, a firma – uma das cinco maiores empresas têxteis do estado – compunha um rol de ativos do banco União (pequena central hidrelétrica, jazidas de calcário, terrenos em São Paulo e no Paraná, Estrada de Ferro Votorantim) que, por sua vez, encontrava-se endividado e, em processo falimentar, leiloou em janeiro do referido ano estes bens que compuseram seu espólio. Ele foi arrematado por Antonio Pereira Ignácio, Nicolau Scarpa e outros acionistas minoritários, formando doravante o Grupo Votorantim que, já em 1919, tinha seu controle acionário nas mãos do português Pereira Ignácio, que era o diretor-presidente do Grupo.
Em 1925, Pereira Ignácio colocou seu genro, o engenheiro pernambucano José Ermírio de Moraes, dentro dos negócios, fazendo dele diretor-gerente no ano de 1926, cargo que lhe imputava a condução diária dos rumos da Votorantim e no qual ele permaneceu até 1962, quando foi eleito senador pelo estado de Pernambuco. Nestes 36 anos no comando executivo do Grupo, ele empreendeu a grande guinada da Votorantim, que transitou do predomínio produtivo dos têxteis para o ingresso no setor industrial de base, notadamente nos ramos do cimento, siderúrgico, químico, metalurgia e alumínio.
Com a morte de José Ermírio em 1973, seus filhos (Antonio Ermírio de Moraes, José Ermírio de Moraes Filho, Ermírio Pereira de Moraes) e o genro Clóvis Scripilliti (casado com Maria Helena de Moraes) passaram a administrar a Votorantim, mantendo-a como um grupo familiar, de capital fechado e com foco na indústria de base. Em 1978, a Votorantim era o 2º maior grupo empresarial privado brasileiro – atrás somente do banco Bradesco – e era composto de 74 empresas. Esta posição se manteria em 1988, cairia para o 5º lugar dez anos depois e, em 2005, novamente a Votorantim seria o 2º maior grupo empresarial do país (Aldrighi e Postali, 2010, p. 370; Caldeira, 2007; RAVotorantim, 1980).
Segundo o ranking da revista América Economía para o ano de 2017, que se baseia na receita bruta das vendas, a Votorantim é o 55º maior grupo empresarial latino-americano, ficando na 25ª posição entre os grupos brasileiros. Sua atuação se dá no setor de cimento, mineração, metalurgia, aços longos, celulose, suco de laranja, energia e finanças. O Grupo terminou o ano de 2017 com receita líquida consolidada de R$ 27,2 bilhões e Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) ajustado consolidado de R$ 4,8 bilhões. As empresas do Grupo estavam presentes no Brasil e outros 19 países, empregando mais de 40 mil pessoas diretamente e mais 20 mil contratadas de terceiros – em 536 unidades operacionais e administrativas (América Economía, 2018; RAVotorantim, 2017).
Trabalhos anteriores buscaram retratar as figuras representativas da história do Grupo Votorantim, como José Ermírio de Moraes (Scantimburgo, 1986; Marcovitch, 2009; Rago, 2004) e seu filho Antonio Ermírio de Moraes (Pastore, 2013). O trabalho de Caldeira (2007) é uma importante tentativa de sintetizar a trajetória do Grupo, mas esbarra no caráter hagiográfico do texto final. As contribuições de Silva e Dalla Costa (2018a e 2018b) cobriram a fase inicial de estruturação da Votorantim, entre 1891 e 1939, todavia, os trabalhos não avançaram ao período da década de 1940, quando o Grupo passou a concentrar-se no setor de base da industrialização brasileira através da formação da Cia. Nitro-Química (inaugurada oficialmente em 1940) e da Cia. Brasileira de Alumínio (inaugurada oficialmente em 1955). De outra parte, as dissertações de Santos (2008) e Pedrosa (2015), bem como o artigo de Furquim e Meirelles (2012) e Santos (2010), são relevantes contribuições que enquadram a trajetória da Votorantim em meio à formação de grupos empresariais no Brasil[3], tendo como foco o período a partir dos anos 1960 e realçando a sua internacionalização iniciada na década de 1980.
Tendo em vista as lacunas que permanecem mesmo após as evidências trazidas previamente pela bibliografia acima arrolada, o objetivo do artigo será construir uma história do Grupo Votorantim que percorra de suas origens até o final dos anos 1970, quando tornou-se o 2º maior grupo empresarial do Brasil. Para tanto, será utilizada documentação primária (relatórios da diretoria do Grupo, demonstrações de lucros e perdas, balanços patrimoniais) que foi pouco explorada pelos trabalhos prévios, tendo como fio condutor da análise a busca pela compreensão de como se deu a transição de um conglomerado originalmente concentrado no setor têxtil – com a maior unidade de produção de tecidos de algodão nos anos 1920 e 1930 no estado de São Paulo – para seu domínio na indústria de base, convertendo-se no principal grupo econômico a atuar na indústria brasileira ao final da década de 1970, em que liderava alguns dos ramos do setor de bens intermediários, como na produção de cimento.
2 – Da fábrica à sociedade anônima: a formação do Grupo Votorantim e sua liderança no setor têxtil paulista (1891-1929)
Em julho de 1891, o banco União de São Paulo – detentor do maior volume de ativos entre as instituições paulistas à época – inaugurou a Fábrica Têxtil Votorantim, nas terras da fazenda São Francisco, propriedade agrícola na região de Sorocaba (SP) adquirida um ano antes. O banco se valeu das quedas d’água no rio Sorocaba – que cortava a fazenda – para construir uma pequena central hidrelétrica e, por fim, uma ferrovia (Estrada de Ferro Votorantim) – trilhos com 8 km de extensão que se ligavam à Estrada de Ferro Sorocabana – empreendimentos que estavam concluídos no início de 1893 e viabilizaram o funcionamento da unidade têxtil (Silva e Dalla Costa, 2018a).
De uma estamparia de tecidos vindos da Inglaterra – a chita – a fábrica converteu-se em uma grande tecelagem na cidade de Sorocaba. Calcada no papel do banco União como grande financiador da empresa – responsável por mais de 90% do passivo da fábrica nos anos iniciais – a Votorantim se expandiu nos anos 1900, montou uma seção de tecelagem e se colocou entre as maiores têxteis algodoeiras de São Paulo (Balanços FTV, 1894-1896).
Como consta na tabela 1, a Votorantim era a segunda maior firma têxtil algodoeira, porém, ela estava sendo conduzida pela Pereira Ignácio & Cia., empresa do português Antonio Pereira Ignácio que reunia suas várias unidades descaroçadoras de algodão na região de Sorocaba e Piracicaba[4]. Com o banco União em crise de solvência que vinha desde o início do século e se agravou com a fuga de capitais desencadeada pelo início do conflito na Europa em 1914, a solução foi arrendar a Fábrica Votorantim ao seu principal fornecedor de algodão em pluma, a Pereira Ignácio & Cia., e ao sócio no arrendamento, Nicolau Scarpa, que trabalhava com seu pai na F. Scarpa & Filho, casa importadora de gêneros diversos que tinha uma unidade dentro da Fábrica Votorantim responsável por atender aos trabalhadores em Sorocaba (Silva e Dalla Costa, 2018a).
As dificuldades de manutenção da Fábrica Votorantim sob a égide do banco União foram ainda mais aguçadas no ano de 1917, pois, em fevereiro, um incêndio de grandes proporções no interior das instalações sorocabanas havia gerado um elevado prejuízo – o valor do seguro cobria apenas 24% dos prejuízos estimados. Ademais, em junho do referido ano, a fábrica foi paralisada em meio aos movimentos trabalhistas da Greve Geral[5]. Diante de tal conjuntura, o banco União de São Paulo decretou falência ao final do ano e, em janeiro de 1918, leiloou seus bens que atingiram um valor total de 5 mil contos de réis (Dessotti, 2006; SAFV, 1918-1919).
O espólio do banco foi arrematado pelos arrendatários Pereira Ignácio, Scarpa e outros acionistas minoritários. O valor de 5 mil contos de réis que despenderam na operação de compra dos ativos do banco seria, segundo Marcovitch (2009), oito vezes menor do que de fato valeriam tais bens, estando os principais elencados abaixo:
· A Fábrica Votorantim em Sorocaba-SP, que ocupava uma área de 1.070.000 m2, onde se encontravam fusos, teares, motores elétricos, turbinas e outras máquinas – na maioria importada – que se dividiam entre as seções de tecelagem, fiação, estamparia, acabamento, descaroçamento, oficinas, tinturaria, fundição e de caldeiras, além do depósito de algodão;
· A Estrada de Ferro Votorantim, cuja concessão foi feita pela Câmara Municipal sorocabana, atravessava a fábrica e tinha o total de 20 km de extensão, com três estações (Votorantim, Itupararanga e Sorocaba) em que circulavam sete vagões para passageiros e 13 vagões de carga, além de 21 caixões;
· O terreno em Santo Amaro, que ficava na cidade de São Paulo e foi comprado pelo Banco União em junho de 1898, tinha área total de 1.177.107 m2, margeava a linha de bondes da capital e nele possuía olarias;
· A Fazenda do Itupararanga, na cidade de Sorocaba-SP, tinha nas suas terras jazidas de mármore, pedreiras para a extração e fabricação de cal, em uma área de 13.552.000 m2 quadrados (Escritura, 1918, p. 1-13).
Este rol de ativos foram aglutinados, a 15 de janeiro de 1918, sob a razão social Sociedade Anônima Fábrica Votorantim (SAFV), uma sociedade por ações com sede na cidade de São Paulo – onde se dera o leilão – com capital de 5 mil contos de réis divididos em 25 mil ações de valor nominal de 200 mil réis cada uma. A finalidade da SAFV era: 1) indústria de fiação, tecelagem e estamparia de algodão, e outros materiais têxteis na Fábrica Votorantim (Sorocaba-SP), bem como o comércio destes produtos; 2) exploração industrial e comercial das jazidas de calcário nas suas propriedades, as Caieiras de Itupararanga (Sorocaba-SP) e; 3) exploração da Estrada de Ferro Votorantim (Escritura, 1918).
A SAFV foi vista por Pereira Ignácio como a oportunidade de integrar verticalmente seus negócios, que se iniciavam no descaroçamento de algodão e, agora, iam até a produção e venda de tecidos. Então, ele fez uma proposta de compra da totalidade das ações de Scarpa – no valor de 2 mil contos de réis acrescido da cessão da Fábrica de Óleos Santa Helena – e, em 1919, tornou-se detentor de mais de 99% dos papéis da sociedade (Ata, 1922; SAFV, 1923). Dessa forma, como apontam Fernández Pérez e Casanova (2012) e Fernández Pérez e Lluch (2015), o controle acionário e diretivo exercido por Antonio Pereira Ignácio – que era diretor-presidente da empresa – fazia dele o controlador do Grupo Votorantim, exposto na tabela 2.
Na década de 1920, o Grupo Votorantim consolidou sua posição relevante no setor têxtil paulista e nacional, sendo o têxtil o maior setor manufatureiro nacional até o início dos anos 1930 (Franco e Lago, 2012). Segundo a Estatística Industrial do estado de São Paulo, em 1929, a Fábrica Votorantim era a segunda maior firma têxtil paulista – pelo volume do capital investido de 34.921 contos de réis correntes – empregando 2.455 operários, em seus 1.390 teares e 70 mil fusos que produziam chitas, morins, zefires, lenços, gaze, crepes e toalhas (DEIC/SAIC/SP, 1929)[6].
A fábrica têxtil, que recebera novos maquinários naquele período, respondeu por 80% das receitas do Grupo Votorantim na década de 1920. Neste sentido, mostrava-se o Grupo coadunado ao que era o desenvolvimento manufatureiro do Brasil à época, caracterizado pelo domínio dos bens de consumo finais – sobretudo têxteis e alimentícios – na formação do produto manufatureiro nesta fase de crescimento industrial (Mello, 2009; Tavares, 1977). Todavia, mudanças estruturais se dariam na economia brasileira a partir dos anos 1930, e a Votorantim seria um dos protagonistas deste processo.
3 – As motivações e recursos do Grupo Votorantim para adentrar à indústria de base na década de 1930
A década de 1930 abriu-se sob os impactos da Grande Depressão na economia mundial. No Brasil, o governo de Getúlio Vargas (1930-1945) adotou medidas anticíclicas[7] vinculadas à economia cafeeira que resultaram na sustentação da demanda interna e, dadas as dificuldades de importação, esta foi desviada ao consumo de bens nacionais – sobretudo bens de consumo não duráveis – e impulsionou o início do processo de industrialização via substituição de importações assentado no mercado interno, na fase da state-led industrialization (Tavares, 1977; Prebisch, 1962; Schneider, 2010; Guillén, 2000; Bértola e Ocampo, 2012; Ocampo e Ros, 2011; Tavares, 1977; Fishlow, 2013)[8].
No projeto industrializante de Vargas, a manufatura tornou-se vetor do crescimento econômico, posto que a indústria teve expansão anual de 9% entre 1932-1939, ou seja, o dobro da agricultura (Fonseca, 2012a). As fábricas lideraram a retomada do crescimento na economia brasileira, que já em 1932 teve uma expansão de 4,3% do PIB, sendo que a média de crescimento do PIB entre 1932-1939 foi de 6,1% e, englobando o período da II Guerra Mundial (1932-1945), aponta a expansão média do PIB em 4,9%[9].
Presença do Estado, um projeto consciente de ampliação da manufatura no tecido econômico e a busca pela industrialização como caminho mais célere ao desenvolvimento econômico foram os elementos constitutivos da estratégia nacional-desenvolvimentista[10] implementada pelo governo Vargas (1930-1945) e que, a grosso modo, seguiu até 1954, quando findou seu segundo mandato a 24 de agosto. Nesta etapa, a coalizão que liderou o esforço industrializante contava com o Estado – e suas empresas e instituições criadas após 1930 – e a elite industrial nascente, aglutinada em associações de classe como o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP), criado em 1928 na capital paulista, e que teve como primeiro presidente o Conde Matarazzo e, como diretores, Roberto Simonsen, Horácio Lafer, Jorge Street, Antonio Devisate e José Ermírio de Moraes (Fonseca, 2012b; Bresser-Pereira, 2012).
O projeto industrializante de Vargas expressou-se logo ao princípio do decênio: criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio em 1930 – um mês após Getúlio assumir a presidência – a desvalorização da moeda e o monopólio cambial colocado a cargo do Banco do Brasil, que privilegiava a importação de matérias-primas em detrimentos de produtos com suprimento interno estabelecido – caso dos têxteis –; a reforma tributária em 1934 que elevou tarifas específicas em 15%; a criação da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil (CREAI/BB) em 1937. Estas mudanças institucionais materializavam a nova diretriz econômica do país, com a prevalência do mercado interno para sobrepujar a crise internacional e a indução aos grupos econômicos nacionais para que ocupassem maiores faixas na oferta interna de bens e mercadorias (Fonseca, 2012b).
O Grupo Votorantim, originalmente concentrado no tradicional setor têxtil, atinou-se às mudanças de longo prazo que ocorreriam no padrão de acumulação brasileiro e à nova estratégia de desenvolvimento econômico nacional, pautada na transição da agricultura à indústria. Para esta guinada à indústria de base, alguns recursos disponíveis previamente pelo Grupo e, concomitantemente, a correta percepção dos rumos econômicos da nação por seus dirigentes foram de importância fundamental.
Primeiramente, acerca dos recursos disponíveis à Votorantim no início dos anos 1930, a tabela 2 exibiu as empresas que compunham o Grupo e, entre elas, estavam a Fábrica Rodovalho e as Caieiras de Itupararanga, a produzir cimento e cal, respectivamente. Khanna e Yafhe (2010, p. 579) indicam justamente que uma das vantagens dos grupos econômicos, por serem constituídos de várias empresas interconectadas, era a possibilidade de prover recursos produtivos que induziam à diversificação de suas atividades. Além da diluição dos riscos inerentes a um grupo concentrado em poucos ramos, a diversificação gerava novas fontes de acumulação que, no caso do Brasil, estava a principiar um processo de industrialização em que os bens intermediários – como o cimento – teriam grande demanda[11].
De outra parte, o papel desempenhado por José Ermírio de Moraes foi central. Pernambucano, filho de produtores de açúcar – senhores de engenho – na localidade de Nazaré da Mata (PE), ele foi enviado aos Estados Unidos em 1916 para estudar na Colorado School of Mines, onde se graduou como engenheiro de minas em 1921 – além de ter trabalhado em duas empresas de mineração estadunidenses nestes tempos de graduação[12]. Em junho de 1923, atendendo a um pedido de familiares, José Ermírio voltou a Pernambuco para tentar reabilitar a Usina Aliança, localizada em Recife e de propriedade de seu cunhado. Seu diagnóstico apontava a obsolescência da unidade açucareira e a necessidade de compra de maquinários. Tal fato o levou a uma viagem à Europa em 1924, com uma passagem pela Suíça em maio daquele ano, quando conheceu Helena Pereira de Moraes, jovem que acompanhava o pai, Antonio Pereira Ignácio, em viagem da família (Scantimburgo, 1986; Caldeira, 2007).
Após um breve namoro na volta ao Brasil, José Ermírio e Helena casaram-se no dia 18 de maio de 1925. O diretor-presidente do Grupo Votorantim notara a boa formação acadêmica e a experiência profissional de seu genro e, em junho do mesmo ano, ele ingressou no Grupo como diretor-comercial. Na metade de 1926, Antonio Pereira Ignácio designou José Ermírio como diretor-gerente da Votorantim, cargo que ocuparia até 1951 – quando faleceria Pereira Ignácio, e seu genro o sucederia na presidência do Grupo.
Como diretor-gerente, era José Ermírio quem comandava o cotidiano do grupo, suas decisões de curto e, sobretudo, de longo prazo como, por exemplo, os novos ramos a receberem investimentos, as escolhas para a diversificação dos negócios e a maneira de financiá-los. A fim de auxiliá-lo na tomada de decisões, ele valia-se de sua experiência acumulada nos Estados Unidos e Brasil, somadas à noção das fragilidades de longo prazo de um modelo de acumulação pautado essencialmente na agricultura, visto o que acontecera com o empobrecimento do engenho de sua família no Nordeste. Dessa forma, a visão industrializante do diretor-gerente seria um ativo importante para a guinada da Votorantim à indústria de base (Scantimburgo, 1986; Caldeira, 2007)[13].
Segundo Rago (2004), Ermírio de Moraes era um dos principais representantes da burguesia industrial nascente no Brasil dos anos 1930. Ele se caracterizava por uma visão de nacionalismo-industrializante, em que o Estado deveria fomentar o investimento do capital privado nacional, fosse com instituições (CREAI/BB) ou, de forma direta, com subsídios, créditos, juros menores e políticas macroeconômicas que favorecessem a indústria. Dessa forma, evidencia-se uma identificação de interesses entre o líder do Grupo Votorantim e o projeto econômico de Vargas, ambos calcados na prevalência da industrialização de matiz nacional-desenvolvimentista.
A opção estratégica do grupo empresarial Votorantim – de priorizar o setor de base da produção industrial, dirigindo e concentrando esforços na área de cimento, siderurgia ferrosa e não-ferrosa, química e energia – atesta um comprometimento com dada concepção particular de desenvolvimento econômico e de identidade nacional. É a partir deste projeto que podemos buscar a confluência entre os interesses empresariais de José Ermírio de Moraes e o projeto em curso no período Vargas. Isto se evidencia na trajetória do grupo empresarial que, na década de 30, diversificou e ampliou sua produção, ultrapassando a tradicional estrutura produtiva da indústria paulista ao enveredar pela produção de cimento e, posteriormente, pela indústria química, siderúrgica e alumínio no plano nacional (Rago, 2004, p. 94).
Sendo assim, pode-se considerar que a Votorantim, sobretudo na figura de seu diretor-gerente José Ermírio de Moraes, teve a adequada percepção do ambiente econômico ao converter-se de um grupo voltado aos bens de consumo finais (têxtil) para uma estrutura mais vinculada à indústria de base (cimento, ferro e aço, produtos químicos, alumínio, papel e celulose, artigos refratários, como veremos adiante). Para tanto, além da expertise técnica, a coesão da visão industrializante de José Ermírio às diretrizes econômicas brasileiras pós-1930 seria de grande importância, pois gerou dividendos políticos que viabilizaram alguns dos novos estabelecimentos do Grupo.
4 – O Grupo Votorantim e a criação das principais subsidiárias junto ao projeto de industrialização do Brasil (1933-1955)
A guinada da Votorantim começou em 1933, quando a diretoria decidiu utilizar de melhor maneira as jazidas de calcário nas proximidades da Fábrica Rodovalho (São Roque-SP) para ampliar a produção de cimento. As perspectivas no ramo cimenteiro eram alvissareiras, considerando que, no ano de 1930, 81% do cimento consumido em território nacional era de origem importada, incorrendo a oferta em fretes e demais custos de entrada do produto que, para as eventuais companhias brasileiras, se tornariam vantagens competitivas. De outra parte, dada a cisão que havia entre fabricantes de maquinários (altos-fornos) e as firmas cimenteiras, a aquisição de equipamento estrangeiro não se via obstada pelos grandes players do ramo a nível mundial (Prochnik, 1985). Em 1936, após o levantamento de novos prédios e a instalação de um alto-forno vindo da Dinamarca, junto da contratação de engenheiros e técnicos de lá oriundos, iniciou-se a produção do cimento Votoran na Fábrica Santa Helena, unidade que seria a base para que a Votorantim se tornasse a líder no ramo cimenteiro do Brasil (Caldeira, 2007).
No ramo siderúrgico, em que pese o debate travado na Primeira República sobre a necessidade de se erigir firmas nacionais que abastecessem o mercado interno – sobretudo devido aos problemas de abastecimento deflagrados pela I Guerra Mundial – o que se nota, ao final da década de 1920, é a manutenção de dependência frente às importações de aço e laminados (Barros, 2015)[14]. O problema siderúrgico nacional, alvo de manifestações do próprio presidente Getúlio Vargas no início dos anos 1930, seria visto por José Ermírio de Moraes como uma oportunidade de diversificar a atuação do Grupo Votorantim em um setor em expansão – o de bens intermediários – e, principalmente, no ramo siderúrgico (Scantimburgo, 1986)[15].
Para a montagem de uma siderúrgica no Brasil àquela época, algumas questões estruturais deveriam ser levadas em conta: uma ligação com Minas Gerais, fonte das jazidas de minério de ferro; o fornecimento de carvão vegetal aos fornos; viabilizar o escoamento da produção. A cidade fluminense de Barra Mansa, com ligação aos trilhos da Estrada de Ferro Central do Brasil e à Rede Mineira de Viação, foi a localidade escolhida para a montagem da Siderúrgica Barra Mansa, a 2 de abril de 1937, unidade que a princípio produzia ferro-gusa, mas que, a partir de 1943, passaria a produzir também o aço (Dinius, 2011;Caldeira, 2007; Barros, 2015).
Ainda no setor de bens intermediários, o ramo têxtil apresentava, no Brasil e no mundo, o uso do raiom como um de seus negócios em maior expansão ao final da década de 1920. O uso desta fibra artificial, obtida através de processos químicos que envolviam a celulose, induziu o aumento na taxa de crescimento do setor químico paulista – como visto anteriormente – durante a década de 1930, período em que duas novas empresas químicas foram criadas com vistas à produção de raiom: a Rhodia (capital francês) e a Cia. Nitro-Química Brasileira (Suzigan, 2000; Marcovitch, 2009)[16].
A expansão do uso do raiom no Brasil se dava, concomitantemente, à falência e quebra de empresas do ramo nos Estados Unidos, como efeitos da Grande Depressão. Em 1935, os empresários Wolff Klabin e Horácio Lafer, líderes na produção nacional de papel com a Cia. Fabricadora de Papel (São Paulo), foram informados do fechamento da Tubize Chatillon Corporation, empresa química estadunidense que iniciara as atividades há 20 anos na cidade de Hopewell, estado da Virgínia (EUA). As usinas do complexo fabril possibilitavam a produção de: ácido sulfúrico e nítrico, linter purificado, nitrocelulose, éter, sulfureto e sulfidrato de sódio (Marcovitch, 2009).
Dada a necessidade de mobilização de capitais para financiar a desmontagem da fábrica nos Estados Unidos e sua instalação no Brasil, bem como estreitar laços com empresas têxteis demandantes do raiom, os empresários iniciaram os diálogos com o Grupo Votorantim. José Ermírio de Moraes interessou-se pelo negócio e a ele fez agregar a figura do banqueiro Numa de Oliveira (Banco do Comércio e Indústria de São Paulo). Juntos, eles formaram a Cia. Nitro-Química Brasileira, no dia 14 de agosto de 1935 na cidade de São Paulo, firma destinada à fabricação e comércio de produtos químicos e têxteis, derivados e da seda artificial. A divisão acionária da empresa, com capital social de 36 mil contos de réis – divididos em 36 mil ações no valor de 1 conto de réis cada uma – era a seguinte: 18 mil ações à Tubize Chatillon referente ao equipamento da fábrica desmontada e trazida ao Brasil, 8 mil ações ao Grupo Klabin, 5 mil ações de Numa de Oliveira, 4.500 ações do Grupo Votorantim e 500 ações individuais de José Ermírio de Moraes (Caldeira, 2007)[17].
Para a instalação da fábrica foi adquirido um terreno de 1 milhão de m2 no atual distrito de São Miguel Paulista (cidade de São Paulo), localidade próxima ao mercado consumidor da capital paulista e com interligação ferroviária (Estrada de Ferro Central do Brasil), facilitando o escoamento da produção e, sobretudo, a chegada das 18 mil toneladas de equipamentos que foram desembarcadas através do porto de Santos. Aliás, tendo em vista a importância estratégica do empreendimento à formação do setor de bens intermediários no país, o presidente Getúlio Vargas concedeu isenção tarifária para a importação das peças e máquinas vindas do exterior (Caldeira, 2007)[18].
A concorrência na produção de raiom, com práticas de dumping por parte do Grupo Matarazzo – que derrubou seus preços de 45 contos a tonelada do produto para 10 contos – aliada à demanda de modernização de parte do maquinário – que implicou a contratação de algumas dívidas pela Cia. Nitro-Química – fez com que os lucros demorassem a aparecer, sendo o principal motivo da desistência dos sócios estadunidenses em 1939. Porém, com o início da II Guerra Mundial naquele ano, a situação da firma mudaria, a partir do atrelamento da empresa ao esforço de guerra. A Nitro-Química atrelou-se às demandas econômicas conjunturais, recebendo grandes encomendas do setor militar – como nitroglicerina e pólvora – que lhe permitiram tornar-se a maior produtora de raiom do país em 1946 (Marcovitch, 2009; Caldeira, 2007).
Outro bem intermediário estratégico aos militares, bem como à indústria em geral, era o alumínio, extraído à base da bauxita e cujo consumo no Brasil, até o final da década de 1930, era atendido em sua grande maioria por importações. Na década de 1940, duas empresas buscaram valer-se das jazidas nacionais de bauxita: a Eletro Química Brasileira S/A (Elquisa), de Ouro Preto (MG), passou a produzir alumínio no território nacional a partir de 1944 – até ser vendida ao grupo canadense Alcan em 1950 – e a Cia. Brasileira de Alumínio (CBA), vinculada ao Grupo Votorantim, que foi constituída em 1941, mas só conseguiu ser inaugurada oficialmente em 1955 (Caldeira, 2007)[19].
Neste interregno de 14 anos entre a ideia inicial e a inauguração da CBA, vários foram os obstáculos a serem superados. As jazidas de bauxita estavam localizadas em Poços de Caldas (MG), cidade que, de outra parte, apresentava uma escassez de energia elétrica – usada em demasia no processamento do minério para a formação do alumínio – combustível e demais insumos, além de situar-se distante dos grandes mercados consumidores. Por tais razões, o Grupo Votorantim optou pelo aproveitamento das instalações da Fazenda Rodovalho – propriedade próxima a Sorocaba e atual município de Alumínio (SP) – que dispunham de algumas vantagens: interligação ferroviária com a E. F. Sorocabana[20], proximidade à capital paulista, boa oferta de mão de obra e assistência técnica, prédios já construídos, além da extração de cal e obtenção do cimento (Caldeira, 2007; Marcovitch, 2009).
O projeto mostrava-se atrativo aos empresários e ao governo federal que, com aval de Getúlio Vargas, dispôs um crédito de 69 mil contos de réis junto ao Banco do Brasil para a CBA. Dessa forma, a 5 de dezembro de 1941, ocorreu a assembleia de fundação da empresa, que possuía um capital social de 60 mil contos de réis – equivalente ao dobro do capital do próprio Grupo Votorantim. Todavia, as dificuldades para o implante da fábrica nos anos subsequentes afugentaram alguns acionistas e o próprio Banco do Brasil, que diminuiu em 50% o valor de crédito aportado. O principal empecilho era a dificuldade na importação de máquinas e tecnologia em meio à II Guerra Mundial, quando as nações avançadas concentraram seus esforços na economia bélica (Caldeira, 2007).
Terminada a guerra em 1945 e com a vontade dos sócios em se desligarem da CBA, em 1946, o Grupo Votorantim – associado à família Carvalho Dias, donos da fazenda onde ficavam as jazidas de bauxita em Poços de Caldas (MG) – compraram os papéis dos demais acionistas e buscaram viabilizar o empreendimento. No ano de 1948, a partir de tratativas com industriais da Itália que se encontravam em crise, foi estabelecido o contrato para a transferência da Europa ao Brasil de todo o maquinário da fábrica de alumínio – à semelhança do que se deu com a Cia. Nitro-Química (CBA História, 2005)[21].
Todavia, a resolver ainda estava a viabilização energética do empreendimento, dada a grande demanda de eletricidade no processamento da bauxita. A questão não era simples, pois a canadense Light – concessionária de serviços públicos em São Paulo – alegava que o aumento na demanda de energia elétrica no pós-guerra impedia a empresa em se comprometer a fornecer uma elevada capacidade energética ao funcionamento da CBA. A solução foi, como no final do século XIX para a fábrica têxtil, a construção pelo próprio Grupo Votorantim de uma usina hidrelétrica – a Usina do França localizada no município de Juquitiba (SP) – cujas obras se iniciaram em 1952. Três anos depois, a 4 de junho de 1955, era oficialmente inaugurada a Cia. Brasileira de Alumínio, em cerimônia que contou com a presença do então presidente Café Filho e o governador de São Paulo, Jânio Quadros (CBA História, 2005; Marcovitch, 2009).
Exceto pela Siderúrgica Barra Mansa, a formação das outras três subsidiárias do Grupo Votorantim aponta para uma faceta de José Ermírio de Moraes – além do empreendedorismo e da percepção do ambiente – que foi importante à diversificação dos negócios após 1930: as relações com Estado. No caso da Fábrica de Cimento Santa Helena, o cimento Votoran foi utilizado em obras públicas paulistas como: reforma do Viaduto do Chá (1936), construção do túnel Nove de Julho (1936-1937) e construção da arquibancada do Estádio do Pacaembu (1937). Em relação à Cia. Nitro-Química, o governo federal concedeu isenção tarifária ao maquinário importado e, no caso da Cia. Brasileira de Alumínio, a princípio, o Estado se mostrou favorável à concessão de empréstimo (Rago, 2004).
Segundo Guillén (2000) e Leff (1974), esta vinculação entre grupos econômicos e o Estado é característica do ambiente institucional de economias periféricas em meio ao processo de industrialização, pois os grupos buscam os órgãos estatais para suprir falhas institucionais – por exemplo, a carência de fontes de financiamento e a proteção alfandegária contra empresas estrangeiras. No caso do Brasil, a etapa marcada pelo nacional-desenvolvimentismo, sobretudo nos períodos varguistas, denotou uma aliança entre o Estado e o capital privado nacional, posto que as multinacionais ainda não haviam adentrado muitos dos ramos componentes da manufatura nacional, movimento que seria diferente a partir de 1956 (Evans, 1980; Rago, 2004; Bresser-Pereira, 2012).
No interregno 1930-1954, a participação em associações de classe era um chamariz que aproximava alguns industriais das esferas de poder do Estado. O estreitamento entre a Votorantim e o Estado pode ser apreendido pela demanda pública de seu produto (o cimento), bem como pelas isenções tarifárias e a participação via financiamento do Banco do Brasil. Tal vínculo tinha em José Ermírio de Moraes um importante elo, lastreado em sua condição de um dos líderes do capital privado nacional industrial: membro da primeira diretoria da CIESP e que, em 1952, seria vice-presidente da entidade; ele exerceu a presidência da Bolsa de Mercadorias de São Paulo em 1935 e, no ano seguinte, integrou a Confederação Industrial do Brasil (CIB); ademais, em 1937, ele fundou a Associação Brasileira de Cimento Portland e, em 1953, tornou-se o primeiro presidente do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (Scantimburgo, 1986).
5 – Uma análise do financiamento e da diversificação do Grupo Votorantim (1933-1979)
A tabela 3 demonstra a guinada do Grupo Votorantim rumo à indústria de base, constatada, inclusive, pela alteração na razão social do Grupo que, até 1939, chamava-se Sociedade Anônima Fábrica Votorantim e, a partir de 1940, converteu-se em S. A. Indústrias Votorantim (SAIV). A SAIV representava o núcleo original de formação do Grupo, na localidade de Sorocaba e Votorantim, onde permanecia a fábrica têxtil – maior firma do setor de tecidos no estado de São Paulo na década de 1930 e que se manteve em tal posição até os anos 1970 (Silva e Dalla Costa, 2018b; Loureiro, 2007; Pedrosa, 2015).
Em que pesem os negócios têxteis, os rumos adotados pelo Grupo Votorantim corroboram a tese da diversificação de atividades dos grupos econômicos guiada pelos recursos produtivos preexistentes e pela sinergia entre as firmas componentes do Grupo (Delios e Ma, 2010; Khanna e Yafhe, 2010; Khanna e Palepu, 1997). Empreendimentos como a Metalúrgica Atlas (produção de equipamentos pesados) e a IBAR (artigos refratários aos fornos da fábrica de cimento e à siderúrgica) foram organizados no sentido primordial de atender às demandas das empresas do Grupo Votorantim. De outra parte, a experiência na exploração mineral, que vinha dos negócios da CBA (bauxita e alumínio) e Siderúrgica Barra Mansa (minério de ferro), foi importante indutora à aquisição da Companhia Mineira de Metais (exploração de zinco) e da Companhia Níquel Tocantins (exploração de níquel), empresas que ganhariam maior peso na formação das receitas do Grupo Votorantim a partir da década de 1970 (Caldeira, 2007).
Entretanto, foi na produção de cimentos que o Grupo Votorantim se estabeleceu como a maior empresa deste ramo dos bens intermediários no Brasil. O know-how adquirido na exploração das jazidas de calcário pela Fábrica de Cimento Votoran desde o início dos anos 1930, aliado às boas perspectivas em relação ao consumo de cimento no mercado interno – em meio ao processo de industrialização e urbanização intensa – foram determinantes à decisão de construir novas unidades para produção cimenteira. Dados os gargalos na infraestrutura de transportes brasileira, que permaneciam ainda na metade do século XX, o Grupo Votorantim optou em estabelecer unidades próximas aos mercados consumidores: para a região Nordeste (Companhia de Cimento Portland Poty) e na região Sul (Companhia de Cimento Portland Rio Branco, Companhia Catarinense de Cimento Portland e Companhia de Cimento Brasileiro) (Bastos, 2012; Caldeira, 2007)[22].
O gráfico 1 ajuda a compreender como se deu o financiamento da expansão e diversificação do Grupo Votorantim entre a década de 1930 – quando foi inaugurada a Fábrica de Cimento Santa Helena – e meados dos anos 1950 – quando se iniciou a produção na Cia. Brasileira de Alumínio. Tendo em vista que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico foi criado somente em 1952 e ganharia maior relevo a partir do Plano de Metas (1956), Baer (1975, p. 90-91) aponta que grandes empresas no Brasil apoiaram-se em fontes internas – lucros retidos, por exemplo – como meio de financiamento à sua expansão dos anos 1940 até meados dos 1950.
Este caminho, como indica o gráfico 1, foi seguido pela Votorantim entre 1932-1956. No período, o Grupo reforçou uma diretriz que vinha desde a década de 1920: como um grupo de capital fechado e familiar, os acionistas ratificavam a não distribuição de dividendos para agregá-los ao patrimônio líquido, com vistas à formação das novas empresas coligadas, reaparelhamento das já existentes e, eventualmente, precaver-se contra crises conjunturais na economia brasileira (Silva e Dalla Costa, 2018a; Caldeira, 2007)[23].
Este modelo de financiamento com prevalência das receitas próprias contrasta com o aquele adotado por um dos maiores grupos econômicos do período, as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (IRFM). As fontes de financiamento da IRFM nos anos 1950 a 1970 mostram-se mais difusas, contando, de uma parte, com um projeto aprovado pelo BNDE – valor de 33, 9 milhões de cruzeiros – em 1959 no âmbito do Plano de Metas, aportes do banco estatal de desenvolvimento para instalação de uma fábrica de celulose em São José dos Campos-SP em 1966, além de financiamentos junto à Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE): para expansão da Cia. Paraíba de Cimento Portland e à criação da Polynor para a fabricação de poliéster e fibra sintética na Paraíba, ambas nos anos 1970. De outra parte, por ser uma companhia de capital aberto, a IRFM notabilizou-se pelo lançamento de ações preferenciais junto ao público, com a promessa de remuneração anual dos papéis em, no mínimo, 17% por ação (Pedrosa, 2015; BNDES, 1996).
Como um grupo de capital fechado, à Votorantim não se colocava a possibilidade de financiar-se pelo mercado acionário. Todavia, pela robustez do Grupo, sua atuação em setores importantes no projeto industrializante brasileiro – cimento, minerais não-metálicos, aço – e a proeminência de José Ermírio de Moraes na elite industrial dos anos 1950, seria provável que algum projeto endereçado pelo Grupo fosse contemplado junto ao Plano de Metas, fato que não ocorreu. Na realidade, o que vemos é uma pesada crítica do Grupo Votorantim, em seu relatório de atividade do ano de 1956, em que consta:
A Instrução nº 113, ainda em vigor, estabelece uma inferioridade para o industrial brasileiro em relação ao alienígena. Acreditávamos que, no curto prazo deste ano que expira, a mesma seria revogada, de forma a ser criado um ambiente propício à instalação de muitas indústrias que podem e devem ser fundadas no País, e ao desenvolvimento e ampliação das existentes (RAGV, 1957, p. 41).
A Instrução 113 da SUMOC (Superintendência da Moeda e do Crédito do Banco do Brasil), instituída a 17 de janeiro de 1955 no Governo Café Filho e prolongada à presidência de Juscelino Kubitschek (1956-1961), permitia a importação de equipamentos sem cobertura cambial. Esta medida permitiu às filiais estrangeiras no Brasil, sobretudo no ramo automobilístico, introduzirem e ampliarem suas plantas industriais em um cenário de escassez de divisas à importação (Caputo e Melo, 2009, p. 519-530). Mas, sobretudo, é elucidativa da nova forma de aliança no projeto industrializante brasileiro: ao Estado e o capital privado nacional agregava-se a maior presença do capital privado estrangeiro na figura das multinacionais, em uma tríplice aliança que denotava o modelo de desenvolvimento nacional-dependente que seria vigente até o final do período militar (Evans, 1980;Tavares e Serra, 1977; Bresser-Pereira, 2012; Bresser-Pereira, 2019).
A fim de compensar este distanciamento do capital privado na aliança industrializante, José Ermírio de Moraes utilizou como expediente o ingresso definitivo na política. Se, no início dos anos 1950, ele se mantinha como representante de classe, ao ser vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), cargo que lhe conferia uma certa ressonância no debate econômico, todavia, em outubro de 1962, ele concorreu e foi eleito ao Senado pelo estado de Pernambuco – sua terra natal – filiado ao Partido Trabalhista Nacional (PTN) em coligação com o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Ao início do mandato presidencialista de João Goulart, em janeiro de 1963, José Ermírio assumiu o ministério da Agricultura, permanecendo até junho daquele ano, quando da reforma ministerial que o retirou do cargo e fez com que ele assumisse seu mandato como senador até 1970 (Rago, 2004).
Seus discursos senatoriais sempre se pautaram pela defesa da indústria dentro de uma visão nacionalista que, sem antipatizar frontalmente com as multinacionais, era desejosa do Estado como mediador dos conflitos e direcionador das áreas em que o capital privado estrangeiro pudesse atuar, resguardando os nichos à participação das indústrias brasileiras. Neste sentido, José Ermírio posicionou-se como um crítico de importantes medidas econômicas do Governo Militar, como da implementação do Plano de Ação de Econômica do Governo (PAEG), no que concerne às facilidades para ingresso do capital estrangeiro e as liberalidades às remessas de lucro ao exterior, em contraste com uma política monetária e creditícia restritiva que afetava sobretudo as firmas nacionais, que tinham menor acesso ao financiamento externo (Rago, 2004).
Na década de 1970, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) – anunciado na metade de 1974 – representou a resposta da economia brasileira ao primeiro Choque do Petróleo em 1973, significando o esforço final que visava completar o projeto industrializante[24]. No que tange aos bens de produção (capital e insumos), o II PND priorizava investimentos em siderurgia, química pesada, metais não ferrosos e minerais não metálicos. Para tanto, os formuladores inscreveram no plano a necessidade de reforçar a participação do capital privado, tanto nacional quanto estrangeiro, que seriam apoiados pelos empréstimos junto ao BNDE e, no caso das multinacionais, teriam concomitantemente o acesso ao crédito internacional (Hermann, 2005, p. 100; Carneiro, 1989).
Considerando as atividades principais da Votorantim na segunda metade dos anos 1970, havia um alinhamento entre a produção do Grupo e as metas setoriais do II PND para o período 1974-1979: expansão estimada na produção de cimentos (53% no período todo), alumínio (58%), aço (159%), ácido sulfúrico (244%), soda cáustica e barrilha (156%), zinco (76%) e celulose (85%) (Brasil, 1974). Este alinhamento faria prever que projetos da Votorantim fossem contemplados com grandes financiamento do BNDE, todavia, a bibliografia recente que se debruçou sobre a Votorantim (Caldeira, 2007; Pedrosa, 2015) e o II PND (Moraes, 2018; Campos, 2012;Barcellos, 2017 ), bem como os relatórios anuais disponíveis do Grupo para a década de 1970, apontam a inexistência de qualquer grande financiamento do banco estatal a algum projeto da Votorantim.
Ao contrário, o que se nota é uma animosidade do Grupo frente à condução estatal do II PND, pois, como no caso do Plano de Metais e do PAEG, novamente havia uma modelagem que favorecia o capital privado estrangeiro. Neste sentido, Evans (1980) classifica o II PND como um momento de desnacionalização de alguns ramos da manufatura brasileira, como o têxtil, farmacêutico e bens de capital. A Votorantim, em contrapartida, seria a maior representante dos grupos privados do capital nacional, baseada no controle de matérias-primas locais (calcário para o cimento, zinco, alumínio) e no espraiamento pelo território nacional, elementos que lhe possibilitavam uma alta rentabilidade em suas operações industriais e, dessa forma, prescindia de uma aliança com estatais e multinacionais (Evans, 1980)[25].
Um exemplo da discordância entre o Grupo e o comportamento do BNDE em meio ao II PND está no caso da construção das instalações da Cia. Níquel Tocantins, localizada no estado de Goiás. Em 1974, a Votorantim apresentou ao BNDE um projeto solicitando 150 milhões de cruzeiros para a construção de uma usina capaz de produzir 5 mil toneladas de níquel ao ano, equivalente ao dobro do consumo anual do país à época. O banco estatal, por sua vez, fez uma oferta de empréstimo de 1 bilhão de cruzeiros, mas condicionada à elaboração de uma usina com capacidade de produzir 20 mil toneladas anuais de níquel.
Apesar da oferta tentadora, a Votorantim optou por não atender a este chamado do II PND e recusou o empréstimo, alegando o grande risco em uma operação de crédito com tamanho vulto, prazo longo de maturação do empreendimento, pois a produção de níquel na usina iniciou-se apenas em 1981, em meio à crise econômica do governo Figueiredo (1979-1985) e à subida dos juros no exterior e no Brasil. Ademais, o mercado nacional encontrava-se aberto à importação de níquel, fator que não garantia demanda à produção do minério por parte da Votorantim (Caldeira, 2007).
Dessa forma, como aponta o relatório da diretoria do Grupo para o ano de 1980, as diretrizes de reinvestimentos dos lucros à expansão dos negócios e afastamento de propostas com elevado risco – mesmo que advogadas por órgãos estatais – eram os elementos que haviam feito a Votorantim crescer e se colocar entre os maiores grupos econômicos do Brasil e, por isso, deveriam ser continuados.
Nos últimos anos a indústria privada brasileira tem se defrontado com uma série de obstáculos, naturalmente inerentes ao modelo desenvolvimentista governamental, e que histórica e basicamente podem ser assim resumidos: estatização, controle de preços, alto custo dos financiamentos, inflação e desaquecimento da economia [...] Diante deste quadro conjuntural, tendo em vista os inevitáveis desdobramentos que iriam advir – como de fato ocorreu – fixamo-nos ainda mais nos parâmetros fundamentais que vêm caracterizando a nossa administração desde sua primeira geração: intenso trabalho visando um crescimento gradativo, porém real, aliado a uma sistemática política de reinvestimento de lucros e baixo nível de endividamento.
Não tem sido fácil resistir a toda uma série de apelos e propostas, das mais distintas origens, sedutoras em sua aparente grandiosidade, apresentadas sob atraentes fachadas. Todavia, os resultados de mais esse exercício, quando já se pôde vislumbrar com maior nitidez a nossa nova realidade econômico-social, demonstram o acerto e evidenciam a necessidade do prosseguimento dessa diretriz [...] (RAGV, 1980, p. 2, grifos nossos).
Sem contar diretamente com grandes projetos de financiamento dos governos militares e suas instituições de fomento industrial, constata-se que os lucros retidos da Votorantim cresciam de maneira robusta anualmente a partir da vinculação entre os negócios do Grupo e o modelo de desenvolvimento econômico brasileiro que, apesar de dependente e em estreita ligação com as multinacionais, era um modelo essencialmente industrial, que buscava estimular os setores manufatureiros em que também atuavam grupos do capital privado nacional, como a Votorantim (Evans, 1980). A dinâmica do processo de industrialização via substituição de importações majorava a demanda por bens intermediários – como cimento, produtos químicos, alumínio, siderúrgicos e minerais – e, através de barreiras às importações, induzia que a atuação dos grandes grupos se concentrasse no mercado interno (Fishlow, 2013; Tavares, 1977)[26]
Como indica o gráfico 2, a Votorantim consolidava-se como um dos principais grupos econômicos do Brasil nos anos 1970 concentrado em seu core business: o setor de bens intermediários (cimento, alumínio, aço, fibras e produtos químicos, zinco, papel transparente e celulose) como principal gerador de receitas, que cresciam a reboque do modelo de industrialização brasileiro, e foi responsável por 81% do faturamento em 1979 (Santos, 2008, Prochnik, 1985; Pedrosa, 2015)[27]. Com uma estrutura administrativa[28] que lhe permitia atuar por todo o território nacional, o Grupo Votorantim tornou-se um importante player em diversos ramos do setor de bens intermediários: desde o princípio da década de 1960 era o maior produtor nacional de cimento; nos anos 1970, tinha a segunda colocação no setor metalúrgico e, ademais, era uma das cinco maiores empresas têxteis do Brasil (Prochnik, 1985; Caldeira, 2007)[29].
De um lado, a percepção do ambiente de negócios possibilitou aos seus dirigentes fazer uma guinada dos têxteis ao fornecimento de insumos industriais no início dos anos 1930, antecipando-se ao que seria o padrão de acumulação da economia nacional nas décadas precedentes. Por outra parte, a Votorantim mostrou-se reticente, principalmente na década de 1970, aos chamados dos governos militares, em meio ao II Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1979), que poderiam ter conduzido o Grupo a investimentos distantes de seu core e que, possivelmente, teriam enfrentado problemas de solvência quando viesse a crise econômica na década seguinte (Schneider, 2010)[30].
A tabela 4 mostra que a Votorantim era o principal grupo econômico privado atuando no setor industrial brasileiro ao final da década de 1970 e, na classificação geral, ficava atrás somente do banco Bradesco.
Em 1980, o Grupo Votorantim era formado por 30 empresas e 57 fábricas, empregava 49.231 funcionários, tinha uma rede distribuidora com 238 lojas e depósitos, além de possuir 11 hidrelétricas, ativos que permitiram ao grupo auferir um lucro de 38 bilhões de cruzeiros naquele ano. Atuava nacionalmente com suas empresas espalhadas pelo Sudeste, Sul, Centro-Oeste e Nordeste, destacando-se os segmentos de cimento, metalúrgico e químico.
Considerações finais
Ao criar a Fábrica Têxtil Votorantim, em 1891, o banco União de São Paulo estava atinente ao que era o padrão da indústria nascente no período – concentrada no setor de bens de consumo assalariado, principalmente o têxtil. A franca evolução da fábrica Votorantim entre 1891 e 1917 apontava para um investimento com grande potencial se colocada nas mãos administrativas corretas, fato que se deu em janeiro de 1918, quando da falência do banco e o leilão de seu espólio que foi arrematado pelo português Antonio Pereira Ignácio, Nicolau Scarpa e outros acionistas minoritários. Pereira Ignácio adquiriria o controle acionário e se tornaria o líder do Grupo Votorantim que, até o final da década de 1920, teria a maior parte de suas receitas geradas no setor têxtil.
Todavia, a depressão econômica nos anos 1930 abriria um novo momento ao desenvolvimento econômico dos países latino-americanos, em especial ao Brasil. Erigia-se o projeto de industrializar o país constituindo setores nacionais de bens de capital e intermediários, a partir de investimentos – sobretudo estatais – que alavancaram a demanda neste setores, fazendo-os se expandir a taxas maiores que as vistas na agropecuária e, até mesmo, na tradicional indústria têxtil.
Naquele momento, a Votorantim escorou-se nas capacidades gerenciais prévias – notadamente a expertise industrial de seu diretor-gerente, o engenheiro José Ermírio de Moraes – e nos recursos produtivos do Grupo – jazidas de calcário, instalações nas proximidades de Sorocaba – para antecipar-se à demanda que viria dos investimentos na etapa de industrialização brasileira (1930-1979) e adentrar no setor de bens intermediários com a criação de empresas subsidiárias ao Grupo: Fábrica de Cimento Santa Helena (1936), Siderúrgica Barra Mansa (1937), Cia. Nitro-Química (1937) e a Cia. Brasileira de Alumínio (1955).
A partir destas empresas subsidiárias, o Grupo Votorantim atingiu a liderança nacional na produção de cimento bem como de alumínio. Tamanho volume de investimento para a constituição destas empresas, a um tempo que mecanismos de financiamento de longo prazo eram escassos, teve de ser viabilizado pela própria Votorantim, a partir da expansão dos lucros das empresas componentes do Grupo que se traduziu em uma expressiva elevação do patrimônio líquido da Votorantim entre 1932-1956. Estas receitas majoradas, aliadas à política do Grupo familiar de não distribuir dividendos, converteram-se no mecanismo que viabilizou financeiramente a consecução de novos investimentos, sobretudo no setor de base da indústria.
Como resultado, ao final da década de 1970, a Votorantim era o segundo maior grupo econômico do Brasil e o líder no setor industrial. Ao cotejar esta trajetória de 89 anos – entre 1891 e 1980 – evidencia-se o alinhamento do Grupo ao modelo econômico brasileiro que, do predomínio de uma indústria de bens de consumo assalariado até o início da década de 1930 trasladou-se à fase de pesados investimentos nos setores de bens de capital, intermediários e de consumo duráveis, tendo no Grupo Votorantim uma das principais expressões do capital nacional junto ao projeto industrializante do Brasil.
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Notas