Notas de Pesquisa

A influência da anatomia patológica na construção do conhecimento alienista na Corte Imperial – o caso da paralisia geral progressiva (1868-1882)

The impact of anatomopathological knowledge on alienist expertise in Rio de Janeiro – the case of general paralysis of the insane (1868-1882

Giulia Engel Accorsi
Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz, Brasil

A influência da anatomia patológica na construção do conhecimento alienista na Corte Imperial – o caso da paralisia geral progressiva (1868-1882)

História Unisinos, vol. 25, núm. 1, pp. 160-167, 2021

Universidade do Vale do Rio dos Sinos

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Recepción: 27 Noviembre 2019

Aprobación: 11 Febrero 2020

Resumo: A presente nota de pesquisa discute as influências do campo da anatomia patológica na produção do conhecimento alienista no Rio de Janeiro, entre 1868 e 1882, através da análise do processo de enquadramento da paralisia geral progressiva (PGP), doença hoje considerada um tipo de sífilis do sistema nervoso. Baseada em teses de doutoramento e artigos publicados em periódicos médicos do período, evidencio que os referenciais da anatomia patológica estiveram diretamente imbricados no reconhecimento dos aspectos orgânicos desta doença mental e, consequentemente, da conquista de seu status enquanto entidade nosológica independente. Tal processo também permitiu que o alienismo se apropriasse de paradigmas considerados “mais científicos” pela medicina geral do período, quando buscava emergir enquanto campo psiquiátrico na Corte Imperial.

Palavras-chave: paralisia geral progressiva, psiquiatria, anatomia patológica, Rio de Janeiro, neurossífilis.

Abstract: This research note discusses the impact of anatomopathology on the development of psychiatric knowledge in Rio de Janeiro between 1868 and 1882. Through the analysis of medical dissertations and scientific articles about general paralysis of the insane (GPI) I argue that the acceptance of this disease category, considered nowadays a type of neurosyphilis, played an important role in the process through which alienist expertise became psychiatric knowledge. Since it had been significantly oriented by concepts inherited from the terrain of anatomopathology, the GPI framing process allowed the alienist cohort to incorporate concepts and paradigms which were considered ‘more scientific’ by general medicine during this period. Thus, the way GPI was described and developed as a disease entity doubtless favoured the process through which alienists professionalized and gained prestige in Rio de Janeiro.

Keywords: general paralysis, psychiatry, anatomopathology, Rio de Janeiro, neurosyphilis.

A presente nota de pesquisa aborda uma das discussões contempladas em minha tese de doutorado, cujo objetivo mais amplo reside na análise da relação entre o processo de emergência e consolidação do campo alienista/psiquiátrico no Rio de Janeiro, durante a segunda metade do século XIX e as primeiras décadas do século XX, e a produção do conhecimento médico sobre o diagnóstico de paralisia geral progressiva (PGP) – hoje, considerada um tipo avançado de sífilis que atinge o sistema nervoso.

Baseada em propostas teórico-metodológicas provenientes do campo da história das doenças, confiro à paralisia geral progressiva status de “ente” não somente dotado de características sintomáticas, anatomopatológicas e terapêuticas, mas também de significados sociais e culturais. Tal apropriação deriva, sobretudo, da abordagem que autores, como Charles E. Rosenberg (1997), conferem às enfermidades humanas – a saber, encarando-as como categorias que emergirão a partir não somente de referenciais biológicos, mas também socioculturais. Deste modo, considero que o estudo em questão se insira na corrente historiográfica brasileira sobre os “Saberes Psi” delineada por Venancio e Cassilia (2010, p. 26) como detentora de “uma visada cultural” e que busca “explorar mais a articulação da psiquiatria e da doença mental com outras práticas sociais e culturais”.

Neste texto, discuto a articulação entre as influências do campo da anatomia patológica e dos pressupostos da tradição da medicina clínica em voga, no processo de construção do enquadramento dado à PGP pelos médicos que estudavam e/ou atuavam na Corte Imperial, durante 1868 e 1880. O recorte inicial foi estabelecido com base na publicação do primeiro trabalho médico mapeado que versa sobre o assunto em questão, datado do ano de 1868. O período de análise encerra-se em 1882, quando começa a se desenrolar uma série de eventos que culminaram na progressiva institucionalização do conhecimento alienista na forma de campo de estudos psiquiátricos no Rio de Janeiro.

As incipientes iniciativas de busca pelo desenvolvimento e modernização do Brasil, postas em prática de modo mais substancioso a partir da Proclamação da República, teriam suas bases, sobretudo, na crença de que a ciência seria uma das principais ferramentas que viabilizariam a conquista de tais objetivos (Neves, 2010). Mas já no final da década de 1870 fora proposto um novo regulamento que reformaria “o ensino primário e secundário no munícipio da Corte e o superior em todo o Império” (Brasil, 1879). Reconhecido como parte da Reforma Leôncio de Carvalho, o referido regulamento previa que no curso de medicina passariam a constar, entre outras, a Cadeira de Clínica Psiquiátrica. Contudo, o estatuto em questão só seria efetivado a partir da publicação do Decreto nº 8.024, de 12 de março de 1881, o qual também previa que as Cátedras deveriam ser regidas por lentes aprovados por meio de concurso (Engel, 2001). A seleção que escolheria o primeiro catedrático permanente de Clínica Psiquiátrica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (FMRJ) ocorreria apenas dois anos depois, e seu desfecho culminou na aprovação em primeiro lugar de João Carlos Teixeira Brandão (1854-1921)[2], cuja posse, em 1883, marcou o início do funcionamento efetivo da cadeira em questão (Engel, 2001). A nova cátedra abriu espaço para que se avolumassem os estudos acadêmicos sobre a paralisia geral progressiva. Contudo, esses se ocupavam substancialmente de aspectos inerentes à doença que não somente sua caracterização sintomática e anatomopatológica. Tais discussões perduraram durante o final do oitocentos e início do século XX, mas dividiam lugar com debates que articulavam o diagnóstico da enfermidade mental em questão a outros elementos, a exemplo das visões médicas sobre gênero, raça e classe – contendas essas cuja análise vai além do objetivo da presente nota de pesquisa.

Através da análise de teses defendidas no âmbito da FMRJ e de artigos publicados em periódicos médicos durante o período, evidencio que, apesar dos dissensos acerca das características anatômicas da paralisia geral progressiva e de quais seriam seus sintomas fundamentais, seu status de doença autônoma (objeto de muitas controvérsias nos cenários internacionais) não fora questionado pela maioria dos doutos que estudavam e/ou atuavam na Corte Imperial, neste momento. Em meio ao processo de busca por legitimação por parte do alienismo, a PGP, ao mesmo tempo que subsidiou discussões inerentes às tentativas de objetificação dos diagnósticos de alienação mental, foi também apropriada por uma retórica que questionava se as técnicas e preceitos da anatomia patológica seriam mesmo a pedra de roseta para um entendimento mais claro sobre as doenças mentais.

A descrição da “doença de Bayle”

Em inícios do século XIX, médicos que atuavam em instituições de assistência a alienados na Europa, especialmente na França, reportavam a incidência cada vez maior de um quadro clínico de perdas motoras generalizadas e delírios que atingia porção significativa dos doentes internados nesses hospitais. Figuras proeminentes do campo da medicina mental francesa, como Jean-Étienne Dominique Esquirol (1772-1840), acreditavam que tal quadro era ocasionado por complicações derivadas de diferentes tipos de loucura e, portanto, não representava a manifestação de uma doença autônoma. No entanto, discordava dessa concepção Antoine-Laurent-Jessé Bayle (1799-1858), jovem estudante que, após sua entrada como interno no Maison Royale de Charenton, em 1818, começou a estudar os casos de paralisia acompanhados de manifestações delirantes e demência, sob a supervisão do médico alienista francês Antoine-Athanase Royer-Collard (1768-1825). A partir de suas observações, Bayle passou a defender que as desordens mentais e motoras observadas por ele e por outros médicos em uma série de pacientes derivavam de uma doença independente, causada por uma lesão encefálica que chamou de arachnitis chronique (Brown, 1994).

As primeiras publicações que divulgavam as ideias de Bayle foram veiculadas em 1822 e recebidas com bastante hesitação por seus pares. É importante ressaltar que, no momento em questão, a medicina geral já utilizava referenciais considerados mais “objetivos” para o diagnóstico, tratamento e reconhecimento das diferentes enfermidades enquanto categorias mórbidas. Tais referenciais emergiram, sobretudo, com o florescimento dos campos da anatomia patológica e da microscopia, postulando que o estabelecimento de uma relação de causa e efeito entre lesões orgânicas e sintomas clínicos constituía-se, a priori, como um dos principais argumentos para a defesa da existência de uma doença autônoma (Edler, 2015; Goldstein, 1987). Já o alienismo ainda se encontrava, no referido período, em meio à busca de se constituir como campo médico independente na Europa. À margem, neste sentido, o repertório de práticas da medicina mental fundamentava-se, principalmente, nos princípios do tratamento moral[3] e na identificação das diferentes formas de alienação através de técnicas que, a princípio, careciam da objetividade considerada fundamental pelos demais campos médicos, refletida, sobretudo, no uso de instrumentos capazes de quantificar sintomas clínicos, como o termômetro e o estetoscópio (Goldstein, 1987).

Como já mencionado, Antoine Bayle era supervisionado por Royer-Collard, o qual, de acordo com o primeiro, seria um forte adepto da ideia de que a loucura poderia ser, em alguns casos, causada por lesões orgânicas. Além das influências de seu supervisor, é essencial ressaltar que Antoine Bayle mantinha estreitas ligações com dois dos principais precursores da Escola Anatômica de Paris: os médicos René-Théophile-Hyacinthe Laënnec (1781-1826), de quem também foi aluno, e Gaspard Laurent Bayle (1774-1821), de quem era sobrinho (Brown, 1994; Maulitz, 2002). Assim, como adepto dos ideais do campo da anatomia patológica, Bayle chamava atenção não somente para as manifestações físicas e mentais da arachnitis chronique, mas também para os danos histológicos encontrados no cérebro de cadáveres, analisados por ele, que teriam sido acometidos por este mal. O jovem estudante baseava nesta última evidência um de seus maiores argumentos em favor da autonomia da doença, que, no futuro e após seu reconhecimento enquanto tal, ganharia diferentes denominações, como as de doença de Bayle, periencefalite crônica difusa, paralisia geral dos alienados, paralisia geral progressiva e demência paralítica (Davis, 2008; Hurn, 1998). Contudo, muitos dos contemporâneos de Bayle discordavam do primeiro no que dizia respeito à elevação da arachnitis chronique à categoria de doença mental, argumentando que, além de não estarem presentes em absolutamente todos os casos em que se sobrepunham os sintomas da paralisia e dos delírios de grandeza, as lesões observadas por Bayle nada tinham de específico com relação àquelas observadas eventualmente em outros quadros mentais e até em pacientes considerados não alienados (Brown, 1994).

Além disso, alguns alienistas, especialmente na França, começaram a registrar casos de PGP sem distúrbios psíquicos, evento que levantou, especialmente durante as décadas de 1840 e 1850, a proposta de divisão da paralisia geral progressiva entre os tipos “complicada” (com delírios) e “simples” (sem delírios) (Brown, 1994). Em consequência desta lógica, apenas os pacientes com perturbações mentais ficariam sob a jurisdição do campo alienista, o que, provavelmente, contribuiu para que a proposta fosse rejeitada por parte de muitos médicos (Hurn, 1998), inclusive pelos doutos que se formavam e/ou atuavam na Corte Imperial, como veremos. Assim, ao longo das décadas seguintes, e especialmente no âmago dos círculos alienistas franceses, germânicos e britânicos, o quadro mórbido descrito por Bayle passou a ser reconhecido, por grande parte dos médicos, como uma doença autônoma. Em 1858 e 1869, as discussões ocorridas, respectivamente, na Sociedade Médico-Psicológica de Paris e na Medico-Psychological Association consolidaram tal decisão (Davis, 2008; Hurn, 1998; Santiago, 1884, p. 10-11).

Entre as causas principais da já predominantemente denominada paralisia geral dos alienados figuravam os traumas na região da cabeça, os excessos sexuais, o trabalho intelectual ostensivo e o abuso de certas substâncias, a exemplo do álcool. Vale ressaltar que os três últimos eram constantemente associados, por muitos alienistas, aos processos de civilização pelos quais passavam diferentes nações neste período – e no caso específico da Inglaterra, por exemplo, ao desenvolvimento da industrialização (Davis, 2008; Hurn, 1998; Slijkhuis e Oosterhuis, 2014). Como sintomas clínicos típicos da PGP reconheciam-se os delírios (especialmente os de grandeza), problemas na fala e na escrita, tremores nos lábios e na língua e paralisia progressiva generalizada dos músculos (Davis, 2008; Hurn, 1998). Além disso, muitos médicos descreviam um desenvolvimento sistemático para a doença, aspecto já apontado por Davis (2008) como crucial para a legitimação da ideia de que essa se constituía, de fato, como uma enfermidade independente.

No Rio de Janeiro, as discussões sobre os excessos trazidos pela civilização enquanto fatores etiológicos da paralisia geral se intensificaram com o aumento da produção científica sobre a doença, ocorrido, como já mencionado, durante a década de 1880. Assim, até o terceiro quartel do século XIX, a pouca atenção dada ao que ocasionava a moléstia em questão denota que, de fato, o foco das investidas médicas em seu processo de construção enquanto categoria diagnóstica encontrava-se, sobretudo, nos referenciais e enquadramentos apropriados do campo da anatomia patológica, como pretendo evidenciar a seguir (Baptista, 1876; Cruz Junior, 1875; Luz, 1879;Pires, 1878).

A “doença de Bayle” chega à Corte Imperial

A paralisia geral progressiva começa a figurar timidamente nos trabalhos defendidos na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, a partir de 1868, através de duas principais discussões. A primeira dizia respeito à íntima relação que lhe foi estabelecida com inflamações no cérebro, uma vez que, como descrita por Bayle, a doença seria consequência deste tipo de lesão (Silva, 1868). As demais alusões iniciais à enfermidade em questão encontram-se em teses que afirmam pretender estudar as paralisias como manifestações sintomáticas de diferentes moléstias. Seus autores, entretanto, também encontram espaço para ponderar que a PGP não seria apenas mero sintoma da loucura, mas uma enfermidade distinta (Baptista, 1876; Cruz Junior, 1875).

Em Das paralysias, Ricardo Augusto Soares Baptista (?-?) reafirma a relação de dependência entre as lesões encefálicas e a manifestação dos sintomas mentais e físicos da PGP, negando a ideia, advogada por aqueles opostos às concepções de Bayle, sobre a existência de um quadro de paralisia geral sem as primeiras. Soares Baptista admite que a natureza das lesões encefálicas não estava bem estabelecida, o que, entretanto, não parecia abalar a confiança do autor acerca da legitimidade da PGP enquanto categoria nosológica autônoma. É premente ressaltar que os critérios de cientificidade em voga, na segunda metade do século XIX, relacionavam-se, em grande medida, à construção de modelos analítico-causais que associavam a observação dos sintomas do enfermo ao estudo das lesões anatômicas encontradas, na tentativa de se atribuir uma relação de causa e efeito entre as últimas e os primeiros (Edler, 2015; Porter, 1999). Tal lógica, cujo cumprimento, segundo os paradigmas da medicina geral, era imperioso para que uma doença fosse reconhecida enquanto tal, encontra-se presente de modo evidente na retórica de Soares Baptista, que afirma ter autopsiado três doentes de paralisia geral na Casa de Saúde Dr. Eiras[4] (Baptista, 1876).

Também em suas teses de doutoramento, José Carlos Ferreira Pires (1854-1912) (1878) e Americo Gomes Ribeiro da Luz (?-?) (1879) registram, entre os sintomas mais comuns da PGP, os delírios de grandeza e melancólicos; perturbações na motilidade, na fala e na escrita; tremores nas extremidades, língua e lábios. Ambos explicam que, uma vez reunidos, tais sinais forneceriam um diagnóstico absoluto, e que confundir tal moléstia com outras era difícil, exceto quando a primeira se encontrava em período inicial: “Se nenhum desses sintomas tem valor absoluto para individualizar a moléstia, seu conjunto e modo de sucessão são preciosos elementos e uma base sólida para o diagnóstico diferencial” (Luz, 1879, p. 101, grifos meus). No intuito de defender a ideia de que a PGP era de fato uma doença independente, os médicos precisavam lidar com a falta de características exclusivas de tal enfermidade, ideia que também servia de argumento para aqueles que desacreditavam na legitimidade de tal hipótese. Assim, tanto a tese de Ferreira Pires quanto a de Ribeiro da Luz indicam que esta dificuldade suscitou uma flexibilização nos pressupostos geralmente utilizados para o enquadramento e o reconhecimento de uma enfermidade – ao continuarem defendendo a unidade da PGP, ambos os médicos recorriam à evidência não de um, mas de um conjunto de sintomas característicos.

Em 1880, José Custódio Nunes Junior (?-?) também defende a íntima relação entre as manifestações clínicas da PGP e lesões encefálicas, exaltando o papel dos estudos de anatomia patológica nesta constatação. Um dos argumentos que ia de encontro a tal concepção – de que a paralisia geral seria o modelo perfeito de doença que evidenciaria a relação entre sintomas psíquicos e danos cerebrais – era a ausência de lesões visíveis a olho nu em tal órgão. Entretanto, segundo o autor, teria sido a observação de tal inexistência em casos “isolados” “que levou muitos patologistas a considerar [sic] a moléstia consequência ou complicação da loucura” (Nunes Junior, 1880, p. 99). Como contra-argumento, o jovem médico escreve que, apesar da ausência “esporádica” de lesões macroscópicas, os danos microscópicos eram constantes e embasavam o reconhecimento da PGP como doença independente.

Em trabalhos publicados em fins da década de 1870, Nuno Ferreira de Andrade (1851-1922)[5] caracteriza a paralisia geral como uma moléstia cujo diagnóstico, sintomas próprios e classificação estariam circundados por amplas controvérsias. Ao contrário do que pareciam defender os jovens pupilos da FMRJ, o futuro interino da cátedra de Clínica Psiquiátrica argumentava que a PGP não possuía feições exclusivas, podendo apresentar uma amplitude considerável de manifestações psíquicas e, portanto, carecia de uma identidade sintomática e de um curso estabelecido:

Quem já teve ocasião de cotejar dois alienados paralíticos, no mesmo período de moléstia, e de examinar-lhes os sintomas, pasma da facilidade com que se intenta fazer – afecções de gabinete, – sem a comprovação nosocomial e sem a crítica do síndroma (Andrade, 1877a, p. 53).

Andrade sustenta que os distúrbios motores na PGP possuíam características muito diversas e que poderiam, assim como os delírios, manifestar-se igualmente em outras doenças mentais. Além disso, e ao contrário do que defendia grande parte dos médicos do período, Nuno de Andrade considerava pouco eficiente e, portanto, prescindível, o recurso da análise da escrita para o estabelecimento do diagnóstico de paralisia geral. Citando uma observação de Jean-Martin Charcot (1825-1893), o autor escreve que as alterações na grafia do paralítico eram extremamente similares àquelas apresentadas em casos de histeria (Andrade, 1877a). Apesar de admitir que a loucura poderia apresentar alguma relação com alterações no “substrato orgânico”, Andrade afirma que as lesões encefálicas raramente podiam ser atreladas de modo específico aos diferentes tipos de delírios manifestados nos quadros de alienação mental. Assim, conclui que os postulados estabelecidos pela Escola de Paris, de acordo com os quais uma doença deveria ser descrita, sobretudo, a partir da relação entre seus sintomas clínicos e lesões orgânicas específicas, não eram aplicáveis à paralisia geral progressiva por falta de “provas” (Andrade, 1877b).

Em publicação do ano seguinte, Augusto Costa (?-?) começa seu texto se resguardando de possíveis críticas quanto à ausência de observações empíricas sobre a ocorrência dos delírios de grandeza na paralisia geral. O autor afirma que em dois anos clinicando no HôpitalSainte-Anne (França) observou mais de cem casos da doença, e que em “apenas um número infinitamente pequeno, talvez em três ou quatro” não teria registrado alguma forma de delírio (Costa, 1878a, p. 8). Tais constatações seriam corroboradas também pelas observações, ainda que menos numerosas, realizadas por Costa em duas instituições cariocas: a Casa de Saúde do Dr. Eiras e o Asilo de Mendicidade.[6] O médico defende que o fato de o delírio de grandeza não ser exclusivo e nem absolutamente constante na paralisia geral progressiva não seria um bom motivo para que se diminuísse sua importância no diagnóstico de tal afecção. Neste momento, e especialmente na Europa, os estudos alienistas já se avizinhavam à inserção de enquadramentos provenientes do campo da estatística nas discussões sobre diferentes aspectos relativos às doenças mentais, a exemplo da relação entre sintomas clínicos e lesões e da própria incidência dos diferentes tipos de enfermidades da mente (Porter, 2018). A despeito disso, verifico certa falta de sistematicidade na produção e publicização dos dados apresentados nos trabalhos cariocas, situação essa que se modificaria com o aumento da produção de dados desta natureza, ocorrida a partir, sobretudo, do início do século XX (Mathias, 2017;Muñoz, 2018).

Em 1879, Nuno de Andrade teceu, novamente, reflexões sobre a PGP. Em sua memória “Da natureza e do diagnóstico da alienação mental”, apresentada à Academia Imperial de Medicina para obter o posto de membro titular da instituição, o médico critica a reificação do princípio científico anatomopatológico como algo completamente inovador, argumentando que o raciocínio e a lógica sempre haviam feito parte dos diferentes métodos de estudo e que, portanto, não haveria método “novo” ou método “velho” (Andrade, 1879a).

Somos vitalista convicto [sic], não só porque a lógica no-lo ordena, como também porque os organicistas com sua argumentação contraproducente, nos ensinaram a robustecer a crença na vida-princípio.

Além da vida possuímos uma alma; – alma, quer dizer – inteligência, sentimento, vontade.

É ela independente do corpo, isto é, da inércia, da elasticidade, da porosidade, da impenetrabilidade, da extensão, da forma, da cor. Portanto: a assimilação das lesões somáticas às perturbações da inteligência é ilógica e perigosa (Andrade, 1879a, p. 11).

Os pressupostos vitalistas baseavam-se na existência de uma “força ou princípio vital” cujo funcionamento não poderia ser entendido a partir das leis da física, e que, portanto, obedecia a dinâmicas diferentes, ao contrário do que postulavam as correntes mecanicistas, no século XVIII, e as chamadas organicistas, durante o período do oitocentos. Em geral, para os vitalistas, a saúde e a doença eram vistas, respectivamente, como reflexo do equilíbrio ou do desequilíbrio desse princípio vital. Sendo o agente controlador dos processos físico-químicos do organismo, o princípio vital consistiria no grande responsável pelo reestabelecimento da estabilidade do indivíduo no contexto do adoecimento, um processo que, portanto, não era alheio ao corpo, mas produto de uma eventual desarmonia interna. Tal desarmonia, refletida nos quadros mórbidos, era encarada como falta ou excesso do princípio vital e, desse modo, o papel do saber médico, para os vitalistas, era precisamente auxiliar a força vital em questão a reestabelecer seu equilíbrio (Porter, 1999).

O grupo de estudiosos de Montpellier, por exemplo, pensava, assim, que seria pouco frutífero investigar os processos físico-químicos na tentativa de se encontrar respostas para reestabelecer a saúde do indivíduo, pois os primeiros estariam sujeitos à ação do princípio vital, real agente capaz de neutralizar as forças físicas e químicas que estariam causando danos ao organismo. O adoecimento era, portanto, visto pelos adeptos do vitalismo como um desequilíbrio interior, que seria combatido internamente pelo princípio em questão. Assim, os partidários das correntes vitalistas, as quais, é importante ressaltar, já vinham perdendo força ao longo século XIX, não acreditavam ser razoável utilizar os paradigmas provenientes da física e da química na busca por respostas para os estados de sofrimento físico e mental (ou da alma) humano (Porter, 1999). Como bom vitalista que assume ser, Nuno de Andrade considerava, assim, inadmissível que se buscasse explicar os diferentes aspectos inerentes às enfermidades mentais ou, como ele mesmo considerava, às doenças “da alma” lançando-se mão predominantemente de referenciais materiais, como aqueles aos quais se refere em sua fala.

O autor divide as lesões patológicas somáticas em três grupos: vícios de conformação, que seriam adquiridos através da concepção (vindos de um dos progenitores) e/ou da gestação; lesões de nutrição dos tecidos biológicos e traumatismos. Conclui, assim, que os distúrbios mentais não poderiam ser incluídos em quaisquer dos três grupos, uma vez que os primeiros acometiam indivíduos que não haviam sido expostos necessariamente a qualquer um dos fatores descritos. Deste modo, Andrade defende que, mesmo nos casos em que as alterações nas faculdades mentais levavam o médico a encontrar uma lesão no cérebro ou em suas meninges, essas se manifestavam de modo autônomo, independentemente da loucura: “No alienado, as funções da vida orgânica e da vida de relação pode [sic] se achar intactas (*); e um estado de mania franca perturbar profundamente o exercício da inteligência” (Andrade, 1879, p. 13-14).

O asterisco no meio da afirmação do autor remete a uma longuíssima nota de rodapé sobre a PGP, em que, novamente, Andrade chama atenção para a falta de especificidade entre as lesões nervosas e a manifestação dos sintomas psíquicos desta enfermidade. Afirmando que essas e o fenômeno da paralisia poderiam afetar, inclusive, indivíduos que não apresentavam distúrbios mentais, Nuno de Andrade critica a alegada suprema necessidade da aplicação de todos os métodos objetivos de exame ao processo de elaboração do diagnóstico de alienação mental – diz que o termômetro, o estetoscópio, o esfigmógrafo, o hemodinamômetro[7] etc. não teriam utilidade nestes casos.

Conclusão

As fontes aqui analisadas evidenciam a polifonia das discussões sobre os aspectos-chaves do enquadramento da PGP, denotando como o processo de construção dos saberes sobre tal doença foi complexo e permeado por controvérsias e dissensos. Os textos também mostram o lugar central que as concepções e referenciais emprestados do campo da anatomia patológica ocuparam nas discussões acerca da legitimidade da enfermidade em questão. A centralidade dos fenômenos motores e dos delírios para a caracterização e, consequentemente, identificação da paralisia geral também fica clara na maior parte dos escritos examinados, denotando o esforço médico de articular os sintomas físicos e mentais da paralisia geral como consequência de uma lesão orgânica. Assim, admitir que a PGP poderia ocorrer sem a manifestação da loucura provavelmente colocaria em xeque um dos pilares sintomáticos sobre os quais a enfermidade fora edificada desde o princípio – os delírios. Ademais, o reconhecimento de tal ideia, muito provavelmente, implicaria objetar o campo alienista como principal detentor dos conhecimentos sobre a PGP e, portanto, sua jurisdição sobre ela (Hurn, 1998).

Tal hipótese é relevante para o caso aqui analisado, já que identifico, como já mencionado, a resistência de grande parte dos médicos que atuavam e/ou estudavam na Corte Imperial em assumir que os casos de paralisia geral progressiva sem delírios seriam numericamente significativos, implicando o questionamento sobre o valor de tal sintoma no diagnóstico da afecção em questão. Este posicionamento vem à tona justamente no contexto em que o campo alienista começa a buscar autonomia e institucionalização através de diferentes estratégias (Engel, 2001). Uma delas, sem dúvida, passou pela tentativa de evidenciar a existência de uma afinidade com os pressupostos estabelecidos pelas áreas médicas consideradas, então, como “científicas” de fato, e, com isso, demonstrar que o alienismo também era capaz de lançar mão deste arcabouço teórico-metodológico ao produzir conhecimento sobre as doenças mentais (Gonçalves, 2011).

O fato da maioria dos médicos aqui citados reconhecer que a PGP possuía um curso definido e, não um único, mas um conjunto de sintomas específicos, também advoga neste sentido, uma vez que, através deste discurso, tais doutos procuravam evidenciar a capacidade – e, portanto, a importância – do especialista na identificação e no estabelecimento de um prognóstico para os pacientes diagnosticados como paralíticos. A retórica em questão será fortalecida nas décadas seguintes, baseada, principalmente, na constatação, por parte de psiquiatras, do aumento nos índices da paralisia geral no Brasil, bem como no estabelecimento de uma relação etiológica entre a mesma e os processos de civilização e modernização do país.

Deste modo, identifico, assim como Flávio Edler (1996), quando analisa as reflexões médicas acerca do método experimental neste mesmo momento no Brasil, uma combinação de discursos que, a princípio, poderiam ser considerados incompatíveis, mas que, se analisados com minúcia, evidenciam que a forte crença numa tradição clínica da medicina não impedia que os alienistas valorizassem, ao mesmo tempo, técnicas mais objetivas e que eram consideradas mais “científicas” neste momento (Muñoz, 2018). Além disso, é importante ressaltar que o posicionamento de Nuno de Andrade não refletia uma discordância puramente epistemológica entre a visão do mesmo sobre os enquadramentos que deveriam ser dados à alienação mental e aquela manifestada pelos demais médicos.

A despeito das querelas que suscitou, a paralisia geral progressiva foi amplamente aceita enquanto entidade nosológica autônoma pela maior parte dos médicos que se formavam e/ou atuavam no Rio de Janeiro, a partir da segunda metade do século XIX. Tal aceitação foi permeada por debates teóricos que buscavam salientar a relação entre lesões orgânicas encefálicas e sintomas clínicos no enquadramento da PGP, conferindo destaque aos delírios como sua manifestação característica (ainda que não exclusiva), e reconhecer um encadeamento mais ou menos fixo para seu quadro evolutivo. Tais escolhas epistemológicas evidenciavam que o emergente campo de estudo das doenças mentais também era capaz de incorporar referenciais considerados mais objetivos no enquadramento de seus objetos de estudo – as patologias psíquicas. Assim, os debates sobre o enquadramento da paralisia geral progressiva tiveram papel importante no processo de reconhecimento do alienismo enquanto ciência psiquiátrica – processo esse que viveu momento profícuo posteriormente, durante a virada entre os séculos XIX e XX.

Referências

BROWN, E.M. 1994. French Psychiatry’s Initial Reception of Bayle’s Discovery of General Paresis of the Insane. Bulletin of the History of Medicine, 68(2):235-253.

DAVIS, G. 2008. The Cruel Madness of Love: Sex, Syphilis and Psychiatry in Scotland, 1880-1930. Amsterdam, Rodopi, 285 p.

EDLER, F. 2015. Ensino e profissão médica na Corte de Pedro II. São Paulo, Editora UFABC, 199 p.

EDLER, F.C. 1996. O debate em torno da medicina experimental no Segundo Reinado. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, .(2):284-299.

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Notas

1 Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde. Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz. Av. Brasil, nº 4365, Centro de Documentação e História da Saúde, sala 307. Bairro Manguinhos. 21.040-900 Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.
2 João Carlos Teixeira Brandão ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, formando-se em 1877. Em 1880, viajou para a França, Alemanha e Itália a fim de se aprofundar nos estudos em psiquiatria. Após ter sido aprovado em primeiro lugar no concurso para lente da Cadeira de Clínica Psiquiátrica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, foi nomeado para o cargo em 23 de abril de 1883. Em 24 de outubro de 1884, tornou-se facultativo clínico do Hospício de Pedro II, assumindo a direção do serviço clínico da instituição, em 27 de fevereiro de 1887. Logo após a instauração do regime republicano, em 18 de fevereiro de 1890, encarregou-se da direção geral da Assistência Médico Legal de Alienados, criada pelo decreto n. 206A, de 15 de fevereiro daquele mesmo ano, cargo que exerceu até 1899. Teixeira Brandão teve, ainda, atuação importante no campo político, onde se destacou na luta pela aprovação da primeira legislação relativa à jurisprudência e à assistência aos alienados no Brasil (Lei nº 1.132, de 22/12/1903), bem como de medidas pertinentes ao âmbito da saúde, atuando como deputado federal pelo Estado do Rio de Janeiro em diversas legislaturas entre 1903 e 1918. Faleceu na capital republicana em 3 de setembro de 1921 (Fonseca, 2020; Mathias, 2017).
3 O tratamento moral teve como principal precursor o celebre alienista francês Philippe Pinel (1745-1826), e seus princípios fundamentavam-se na ideia de que, nos casos de alienação mental, o cérebro não seria atingido do ponto de vista material. Deste modo, a loucura se caracterizaria por distúrbios na mente, ocasionados por desequilíbrios provenientes de influências nocivas, a exemplo dos vícios alcoólicos e sexuais, vindos do ambiente em que o indivíduo se encontrava. Assim, para os adeptos do tratamento moral, a cura da loucura dependeria de uma terapêutica que reestabelecesse tal equilíbrio, atingido, sobretudo, através do deslocamento do indivíduo considerado alienado do meio “nocivo” para um ambiente no qual estaria livre de tais influências danosas e exposto a condições consideradas moral e fisicamente adequadas de acordo com as concepções do conhecimento alienista em voga, especialmente durante o século XIX.
4 Localizada no bairro de Botafogo, a Casa de Saúde Dr. Eiras foi criada no início da década de 1860, inicialmente com o nome de Casa da Convalescença. A referida instituição, particular, recebia majoritariamente pacientes abastados (Engel, 2001).
5 Nuno Ferreira de Andrade doutorou-se pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1875. Dois anos depois, foi designado como Catedrático Substituto de Ciências Médicas na mesma faculdade e, em 1881, ofereceu-se para reger provisoriamente sem qualquer retribuição a Cadeira de Clínica Psiquiátrica recém-criada naquele estabelecimento de ensino. Exerceu a função de Lente de Higiene de 1884 a 1888, quando, após ser aprovado em primeiro lugar em concurso público, tornou-se Lente da primeira Cadeira de Clínica Médica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, da qual se jubilou em 1908. Em 1881, foi nomeado Inspetor Geral de Saúde dos Portos, cargo que ocupou até 1889. Em 1882, passou a atuar como facultativo clínico do Hospício de Pedro II, assumindo em pouco tempo a direção do serviço clínico da instituição. Contudo, após tecer duras críticas à administração da Santa Casa da Misericórdia, foi dispensado por portaria do provedor do referido estabelecimento, em 4 de maio de 1882. Foi o primeiro diretor-geral da Diretoria-Geral de Saúde Pública (órgão criado a partir da fusão entre o Instituto Sanitário Federal e a Inspetoria Geral de Saúde dos Portos), exercendo o cargo de 11 de fevereiro de 1897 a 23 de março de 1903. Nuno de Andrade foi eleito membro titular da Academia Imperial de Medicina em 1876, assumindo a presidência da instituição (que desde o advento da república passou a designar-se Academia Nacional de Medicina) entre 1900 e 1903. Faleceu em 17 de dezembro de 1922 no Rio de Janeiro (Fonseca, 2020; Mathias, 2017).
6 No referido asilo estavam internados muitos indivíduos, de ambos os sexos, considerados portadores de distúrbios mentais. Com a criação das Colônias de Alienados da Ilha do Governador, em 1890, grande parte deles foi para lá transferida.
7 O esfigmógrafo e/ou hemodinamômetro consistiam em dispositivos mecânicos muito utilizados por médicos, em meados do século XIX, para aferir a pressão arterial. Conjugadas com outros sintomas, as marcações informadas pelos aparelhos em questão podiam ser utilizadas como evidência, ou não, de certos quadros de doença mental.
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