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HISTÓRIAS IMPERTINENTES: MEMÓRIAS POLÍTICAS DE MULHERES NO BRASIL (1978-2014)
Danielle Tega
Danielle Tega
HISTÓRIAS IMPERTINENTES: MEMÓRIAS POLÍTICAS DE MULHERES NO BRASIL (1978-2014)
Impertinent stories: women’s political memories in Brazil (1978-2014)
Historias impertinentes: memorias políticas de mujeres en Brasil (1978-2014)
Fronteiras: Revista de História, vol. 23, núm. 42, pp. 109-133, 2021
Universidade Federal da Grande Dourados
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Resumo: Este artigo apresenta um levantamento historiográfico-descritivo de testemunhos públicos de mulheres que lutaram contra a ditadura militar brasileira (1964-1985). A compilação percorre o período entre as disputas pela anistia no final da década de 1970 até 2014, ano da entrega do relatório final da Comissão Nacional da Verdade. São elencadas cerca de 30 obras, cujos temas envolvem repressão, tortura, militância, clandestinidade e resistência. Possíveis fontes de pesquisa em diferentes áreas das ciências humanas e sociais, esses testemunhos interferem nas lutas políticas passadas e presentes.

Palavras-chave: Ditadura militar, Feminismo, Políticas da memória, Testemunho.

Abstract: This article presents a historical-descriptive research on public testimonies by women who fought against the Brazilian Military Dictatorship (1964-1985). The compilation runs throughout the time in between the struggle for amnesty in the end of the 70's to 2014, when the Brazilian National Truth Commission delivered their final report. Around 30 testimonies about repression, torture, activism, clandestinity and resistance were listed in it. These testimonies influence the political struggles of the past and the present, besides being an important source of research for different areas of Human and Social Sciences.

Keywords: Brazilian military dictatorship, Feminism, Memory policies, Testimony.

Resumen: Este artículo presenta una compilación historiográfico-descriptiva de testimonios públicos de mujeres que lucharon en contra de la dictadura militar brasileña (1964-1985). Las obras recopiladas recorren el período comprendido desde las disputas por la amnistía de fines de los ’70 hasta el 2014, año en el cual se entregó el informe final de la Comisión Nacional de la Verdad de Brasil. Se enumeran alrededor de 30 testimonios, cuyos temas involucran represión, tortura, militancia, clandestinidad y resistencia. Estos testimonios interfieren en las luchas políticas del pasado y del presente, y son posibles fuentes de investigación en diferentes áreas de las ciencias humanas y sociales.

Palabras clave: Dictadura militar, Feminismo, Políticas de la memoria, Testimonio.

Carátula del artículo

DOSSIÊ 18: HISTÓRIAS MARGINAIS, ALTERIDADES E CRÍTICAS EPISTÊMICAS

HISTÓRIAS IMPERTINENTES: MEMÓRIAS POLÍTICAS DE MULHERES NO BRASIL (1978-2014)

Impertinent stories: women’s political memories in Brazil (1978-2014)

Historias impertinentes: memorias políticas de mujeres en Brasil (1978-2014)

Danielle Tega
Universidade Federal da Grande Dourados, Brasil
Fronteiras: Revista de História, vol. 23, núm. 42, pp. 109-133, 2021
Universidade Federal da Grande Dourados

Recepción: 12 Octubre 2021

Aprobación: 14 Diciembre 2021

Palavras iniciais

Em determinado momento de sua autobiografia, a sobrevivente do holocausto Ruth Klüger observa, criticamente, que as mulheres “não têm passado. Ou não têm que ter algum.” Para uma sociedade na qual as narrativas da história ainda pertencem aos homens, as lembranças das mulheres seriam vistas como algo “indelicado, quase indecente” (KLÜGER, 2005, p.13). Em que pese os avanços expressivos trazidos pelos movimentos feministas e pelos estudos de gênero, os debates em torno da memória social, das trajetórias das mulheres e das desigualdades sociais que constroem suas experiências materiais e subjetivas dificilmente serão exaustivos, como têm apontado inúmeras críticas feministas de diferentes perspectivas, sejam anarquistas, socialistas, negras, decoloniais, entre outras. Neste artigo, procuramos contribuir com essas questões a partir das memórias de mulheres que lutaram contra a ditadura militar brasileira (1964-1985), oferecendo um levantamento historiográfico-descritivo dos testemunhos daquelas que tiveram suas vidas, de diferentes formas, atravessadas pela repressão.

Optamos por trabalhar com testemunhos que passaram por um processo de mediação pública, pois tomar a palavra para manifestar publicamente suas memórias possui significados subjetivos singulares e sentidos coletivos, que atuam nas lutas políticas de ontem e de hoje. Nesse processo de elaboração, quem narra suas experiências realiza, no ato de contar-se a si mesma, uma guinada reflexiva capaz de produzir avaliações sobre sua própria trajetória. Além disso, como explica a psicanalista Maria Rita Kehl (2010), a ação de tornar públicas experiências e lutas esquecidas ou recalcadas pela história é indispensável na elaboração de traumas sociais. Ora, não é difícil constatar como as sociedades tendem a repetir aquilo que são incapazes de elaborar – e o resultado da eleição brasileira de 2018 é um exemplo impossível de fugir.

Os estudos sobre testemunhos já ocupam um lugar reconhecido nas pesquisas acadêmicas latino-americanas. Fundados a partir de relatos sobre desigualdades e denúncias da violência estatal, revelaram relações de poder e resistências sociais. Segundo as pesquisadoras argentinas Cláudia Bacci e Alejandra Oberti (2014), tanto os chamados testimonios dos países hispano-americanos, quanto a literatura do testemunho, no caso brasileiro, são obras que estimulam os debates sobre as concepções da política e de seus sujeitos nos próprios projetos revolucionários, sejam passados ou presentes.

No Brasil, o chamado boom de livros testemunhais ocorre no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, período no qual seriam publicados títulos hoje considerados clássicos, como Em câmera lenta de Renato Tapajós, O que é isso, companheiro? de Fernando Gabeira, Os carbonários de Alfredo Sirkis. Nos anos noventa, aparecem livros como Viagem à luta armada de Carlos Eugênio Paz, Memórias do esquecimento de Flávio Tavares, entre outros. Em breve bibliografia comentada sobre a esquerda armada brasileira, o sociólogo Marcelo Ridenti (2010, p. 295-296) destaca aproximadamente 30 testemunhos publicados até 2010 – destes, um único escrito por mulher. Já em investigação mais ampla realizada por Janaína Teles (2011), a historiadora localiza 100 livros testemunhais publicados entre 1977 e 2010, dos quais menos de 10% são escritos por mulheres. Ainda que esses quadros não tivessem a pretensão de serem completos ou definitivos, revelam algo inquietante: mesmo nas “contramemórias”, haveria certa escassez de testemunhos de mulheres sobre suas experiências.

De todo modo, há uma série de pesquisas em diferentes campos das Ciências Humanas que utilizam fontes e metodologias diversas para analisar como as mulheres militaram contra a ditadura, participaram de organizações armadas e grupos clandestinos, resistiram em manifestações artísticas e culturais, fizeram passeatas e trabalhos de apoio, comandaram ações, enfrentaram o machismo dentro de seus próprios grupos. Sobressaem-se a pesquisa em arquivos públicos ou acervos privados, o uso de entrevistas pontuais, a opção pela História Oral, a análise de músicas ou filmes, entre outros contornos metodológicos.1 Apesar da riqueza dessas abordagens, há outro campo fértil a ser acionado enquanto fonte: o material produzido pelas próprias militantes ao longo de suas trajetórias. Diante disso, acreditamos que retomar o tema dos testemunhos não significa competir com outras fontes da mesma importância, mas contribui para analisar as marcas de gênero da memória social sobre a ditadura brasileira, na qual certas produções testemunhais adquirem mais relevância, fazem parte de publicação de grandes editoras, são constantemente alvos de estudos em teses e dissertações, inspiram produções fílmicas etc., enquanto outras são marginalizadas nessas mesmas esferas.

Nossa opção em apresentar o levantamento historiográfico-descritivo, como toda escolha, tem potencialidades e limites. Por um lado, conseguimos situar os diferentes contextos políticos nos quais esses testemunhos surgiram. Desse modo, no primeiro momento do artigo, utilizamos uma das dimensões de gênero nos trabalhos de memória, que se ampara no enfoque tradicional do feminismo em visibilizar aquilo que foi socialmente ocultado.

Por outro lado, essa opção não propicia uma sólida análise das obras elencadas.2 Apesar disso, acreditamos que essa é uma tarefa para futuras pesquisas sobre o tema, que poderão ser desenvolvidas a partir das fontes apresentadas nesta compilação. Assim, no segundo momento do artigo, apontamos possíveis recortes para estudos vindouros, pontuamos questões que aparecem com frequência nos testemunhos e identificamos alguns dos problemas inerentes a esse tipo de produção, relacionados tanto às questões materiais como subjetivas.

Embora não haja uma fronteira rígida entre estas perspectivas metodológicas, podemos dizer que, à diferença do “biografismo” – noção utilizada, por exemplo, pela crítica literária Walnice Nogueira Galvão (2005) – e das “escritas de si” – concepção adotada, entre outras pesquisas apoiadas no pensamento foucaultiano, pela historiadora Margareth Rago (2013) –, trabalhar com a noção de “testemunho” possui suas especificidades. Os relatos testemunhais são, em sua maioria, tentativas de transmitir experiências marcadas pelo trauma, como bem explicam em seus renomados estudos Cathy Caruth (1995), Shoshana Felman e Dori Laub (1992). Quem testemunha se encontra em uma situação comunicativa excepcional, o que gera uma narração ao mesmo tempo singular e, muitas vezes, irregular.

O testemunho não é compreendido, portanto, como um enunciado sobre a verdade, e sim como uma modalidade de acesso àquela verdade, que ambiciona uma dupla transformação: de quem testemunha e de quem escuta e oferece um amparo às palavras que são ditas (ou escritas). Trata-se de uma verdade que, se não é “objetiva” como se espera da ciência histórica ou dos tribunais de julgamentos, é “ativa” em seus sentidos terapêuticos e políticos (TEGA, 2021). A experiência ou o conhecimento que o testemunho transmite não é um resquício anterior nem posterior ao ato de testemunhar: “em si, este conhecimento não existe, ele pode apenas acontecer através do testemunho: não pode ser separado dele”, como explica a crítica literária estadunidense Shoshana Felman (2000, p.64).

Em face dessas questões, o pesquisador Márcio Seligmann-Silva (2008) chega a conclusões semelhantes, acrescentando que o testemunho caracteriza uma condição de sobrevivência para quem voltou de uma situação radical de violência. Dentre outros motivos, um de seus propósitos seria o “desafio de estabelecer uma ponte com ‘os outros’, de conseguir resgatar o sobrevivente do sítio da outridade”. Aqui novamente o enfrentamento do vivido não depende apenas de quem enuncia ou elabora de alguma forma sua dor, mas também do acolhimento das palavras construídas na tentativa de transmissão. Ora, tanto a narração como a acolhida do testemunho encontram-se num campo de disputas em torno do passado, que se atualizam nas lutas políticas do presente.

Ao trabalhar com testemunhos, podemos considerar os diferentes estilos narrativos nos quais as memórias se manifestam, abrindo espaços para incorporar romances, contos, cartas, peças de teatro, entrevistas, autobiografias, além de diferentes linguagens, como o cinema. Com isso, elencamos a seguir mais de 30 obras que seguem ao menos um dos seguintes critérios:

a) escritas ou produzidas por mulheres que integraram grupos armados contra a ditadura militar, mesmo aquelas que não estiveram à frente de operações armadas e realizaram outros tipos de colaboração às organizações guerrilheiras;

b) escritas ou produzidas por mulheres que militaram em movimentos, partidos ou organizações clandestinas que não necessariamente aderiram à luta armada, mas que sofreram perseguições políticas;

c) escritas ou produzidas por mulheres que foram presas políticas ou, em algum momento, desaparecidas políticas, e sobreviveram às experiências traumáticas de cárcere, tortura, estupro e desaparecimento de companheiras e companheiros;

d) escritas ou organizadas por pessoas ou instituições que, mesmo não havendo militado no período em questão, ofereçam como conteúdo principal textos, depoimentos ou entrevistas dessas militantes ou presas políticas.

Para dar conta dessa abordagem, vamos traçar os itinerários dessas “memórias políticas” em diálogo com as “políticas da memória” empregadas pelo Estado brasileiro. Usamos, aqui, a definição de Nora Rabotnikof sobre esses termos, considerando as “memórias políticas” como “as formas e as narrações através das quais os que foram contemporâneos de um período constroem a recordação desse passado político, narram suas experiências e articulam, de maneira polêmica, passado, presente e futuro” (RABOTNIKOF, 2007, p.13) – dentro das quais incluímos os testemunhos. Já as “políticas da memória” são “as formas de gerir ou de lidar com esse passado, através de procedimentos de a) justiça retroativa, b) instauração de comemorações, de datas e lugares, c) apropriações simbólicas de distinto tipo” (RABOTNIKOF, 2007, p.14) – nas quais situamos, entre outras, as políticas de transição e reparação.3 O recorte temporal compreende o período entre as disputas pela Lei de Anistia, de 1979, até a entrega do relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), em dezembro de 2014, marca de uma nova etapa das políticas de memória em nosso país.

Apesar de existirem elementos comuns para as quedas das ditaduras militares na América Latina, fortemente relacionados a crises econômicas e sociais, os modos como elas se encaminharam para a transição foram bastante diferentes. Em contraste com a Argentina, por exemplo, cuja transição se deu por colapso ou ruptura, no Brasil ocorre a chamada “transição pactuada” que, sob o controle militar, não pune os repressores e mantem seu legado autoritário em diferentes domínios. Algumas políticas adotadas posteriormente pelo Estado brasileiro acabaram por oferecer frestas para que certas memórias fossem incorporadas no tecido social. No entanto, não se trata de uma via de mão única: testemunhos públicos também criam tensão nas condições de escuta da sociedade e podem impactar a elaboração de normas. Longe de apresentar um quadro de causa e consequência, o cenário a seguir expõe um possível recorte de processos histórico-sociais que, de forma dialética, produzem e são produzidos por essas experiências.

Anos 1970

O final dos anos 1970 é marcado pelo grande esforço de parte da sociedade brasileira – notadamente familiares de presos e presas políticas e movimentos de direitos humanos envolvidos nos Comitês Brasileiros pela Anistia – pela “anistia ampla, geral e irrestrita”, como dizia o slogan da mobilização. Estavam em pauta a demanda pela localização de pessoas desaparecidas, a apuração dos assassinatos de militantes, o retorno de quem estava no exílio, a libertação de presos e presas políticas, a punição dos responsáveis pela repressão. Contudo, aprovada em 28 de agosto de 1979 e sancionada seis dias após sua aprovação pelo general ditador João Batista Figueiredo, a Lei nº 6.683 foi interpretada de maneira a garantir os interesses do governo militar e a impunidade dos integrantes do aparato repressivo. A ditadura perduraria até 1985, quando, apesar da intensa mobilização social pelas “diretas já”, o civil Tancredo Neves foi eleito presidente do país indiretamente, por um Colégio Eleitoral.

Um ano antes e um após a promulgação da Lei da Anistia, são publicados dois livros com cartas escritas por Flávia Schilling, brasileira que, após o golpe militar de 1964, havia se exilado com a família no Uruguai. Acusada de envolvimento com os Tupamaros, grupo político de guerrilha urbana daquele país, Schilling estava em situação de refém e poderia ser morta a qualquer momento caso considerassem que demais militantes da organização guerrilheira estivessem praticando algum ato contrário ao poder ditatorial uruguaio. Anos depois de sua prisão, realiza-se uma vasta campanha nacional e internacional por sua liberdade a partir de uma iniciativa do Movimento Feminino pela Anistia.

No período em que esteve nas mãos da repressão uruguaia, Flávia Schilling trocou cartas com familiares, que foram parcialmente publicadas no livro Querida família (SCHILLING, 1978). Com correspondência escrita entre dezembro de 1972 e outubro de 1973, o livro foi lançado como parte da campanha pela sua liberdade. Dois anos depois, ao ser finalmente libertada, é publicado o livro Querida Liberdade (SCHILLING, 1980), que amplia as cartas escritas até seu retorno. Em seus escritos, encontramos a esperança de sair do cárcere, a necessidade de narração e transmissão de sua experiência e seu esforço por palavras que transitam entre questões políticas e familiares, como no comentário sobre os nomes de seus sobrinhos: “Devo dizer também que Diego e Maurício (justamente estes nomes, dos dois companheiros que tive) deveriam ser os nomes dos meus filhos, que poderão demorar, mas chegarão, certo?” (SCHILLING, 1978, p.73, grifos da autora). Nessa mesma passagem, podemos observar uma busca pela sobrevivência, que se expressa em planos futuros, como o desejo de ser mãe.

Em 1980, publica-se Memórias das mulheres do exílio, obra coletiva dirigida e editada por Albertina de Oliveira Costa, Maria Teresa Porciuncula Moraes, Norma Marzola e Valentina da Rocha Lima. Trata-se do segundo volume do projeto Memórias do Exílio, cujo primeiro número, com o subtítulo De muitos caminhos, havia sido publicado quase três anos antes sob coordenação de Pedro Cavalcanti e Jovelino Ramos (1978). A apresentação explica os motivos que as levaram a tal publicação: “Por que um volume de mulheres? Tantas maneiras de responder, tantas respostas envolvidas. Talvez porque nem sempre as mulheres se sentiram incluídas quando partiu o convite inicial para que os exilados escrevessem as suas memórias”, e salientam que o novo livro era “a tentativa de recuperar a nossa experiência no que ela tem também de específico, torná-la descritível para transmiti-la” (COSTA et. al., 1980, p.16). A capa do livro externa a proposta de reparar o volume anterior e destacar a particularidade de suas vivências: sobre as palavras “memórias do exílio”, há uma ressalva feita em cor e tipografia diferentes para acrescentar “das mulheres”.

Dois anos depois, Carmen Fischer (1982), militante política presa em 1972, publica o romance Travessia: do sonho à realidade – uma brasileira no exílio, no qual os conflitos pessoais, culturais e ideológicos são vivenciados pela personagem Lisa através de seu envolvimento com a esquerda e seus exílios no Chile e na Suécia.

No mesmo ano, Mariluce Moura, militante da Ação Popular (AP), publica o livro A revolta das vísceras. O romance relata as experiências da protagonista Clara, que conta sua “visão feminina da luta armada no Brasil”, como propõe o subtítulo. A dificuldade de narrar é revelada logo no início: “A pretensão não era pequena. Clara sabia, isso atrapalhava. E havia o sentimento de urgência. A sofreguidão que a possuía quando decidia escrever e que levava a querer dizer tudo, esgotar a alma, de uma única sentada” (MOURA, 1982, p.5). A capa do livro ilustra indícios do paradoxo do testemunho: lábios abertos pintados de vermelho sustentam um arame farpado; da união desses contornos, desenha-se um coração. Contar a experiência causa dor, mas essa mesma dor precisa ser manifestada para que a imagem seja construída – uma imagem mesclada, metade vida, metade farpa. Uma imagem que, como as palavras, não é precisa, nem leve, nem delicada. É uma imagem possível, dentro da impossibilidade de colocar em palavras a experiência traumática.

Anos 1980

Como parte da transição negociada da ditadura para a democracia, em 15 de novembro de 1986 é realizada a eleição para a Assembleia Nacional Constituinte que, instalada em 1º de fevereiro de 1987, promulgaria, 20 meses depois, a atual Constituição. Apesar da descentralização dos poderes e dos importantes benefícios sociais nela previstos, parte dos artigos da chamada “Constituição Cidadã” seriam similares à de 1967, notadamente as “cláusulas relacionadas com as Forças Armadas, Polícias Militares estaduais, sistema judiciário militar e de segurança pública em geral”, conforme explica o cientista político Jorge Zaverucha (2010, p. 41).

Em meio a divergentes interesses, houve ampla mobilização social. Junto ao Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, com os lemas “Constituinte para valer tem que ter palavra de mulher” e “Constituinte para valer tem que ter direitos da mulher”, foi organizada uma grande articulação nacional, envolvendo Conselhos Estaduais e Municipais de Direitos da Mulher, trabalhadoras rurais, grupos feministas, trabalhadoras sindicalizadas etc. Como bem argumenta a pesquisadora feminista Salete Maria da Silva (2016), embora não tenham sido incluídos pontos fundamentais, como a legalização do aborto, significativos avanços foram conquistados.

Em 1988, Ana Maria Machado publica Tropical sol da liberdade (MACHADO, 1988). De família militante, a escritora foi presa pela ditadura militar e deixou o país no final de 1969. Nesse romance, uma jornalista chamada Maria Helena faz um balanço de suas experiências, marcadas pelas manifestações estudantis, pelos momentos mais agudos da repressão política da ditadura militar e pelo exílio.

No ano seguinte, chega ao cinema brasileiro o filme Que bom te ver viva, dirigido por Lucia Murat (1989), militante do MR-8. No roteiro, o filme é descrito como “de grande importância para a história do Brasil, porque pretende resgatar uma parte da memória nacional de difícil assimilação” (MURAT, 1988, s/p). A estreia da película ocorreria em junho de 1989, no Festival de Gramado. A forma fílmica escolhida pela cineasta coloca em primeiro plano temas como a participação política das mulheres na luta contra a ditadura militar e a especificidade da violência por elas sofrida e a proximidade da câmera expande na tela esses sujeitos históricos: quem são, como militaram, como (sobre)vivem (TEGA, 2010). A diretora voltaria a trabalhar com o tema da ditadura em outros filmes, como Quase dois irmãos (2004), Uma longa viagem (2011) e A memória que me contam (2012).

Com um panorama político polarizado, no dia 15 de novembro de 1989, a sociedade brasileira pôde votar pela primeira vez para a presidência da República após o golpe de 1964. Apesar disso, o “fantasma comunista” era ainda propagado nos âmbitos conservadores, que viam na candidatura do ex-metalúrgico e sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), uma ameaça aos seus privilégios de classe. O candidato eleito, Fernando Collor de Mello, do Partido da Reconstrução Nacional (PRN), envolvido em esquemas de corrupção, passaria por um processo de impeachment em setembro de 1992 e renunciaria ao cargo em dezembro do mesmo ano.

Um dos fatos mais marcantes em relação à busca de verdade, justiça e memória nesse período foi a revelação de uma vala clandestina no Cemitério de Perus, que teve como resultado a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara Municipal de São Paulo. Com forte impacto junto à opinião pública, a vala foi aberta em setembro de 1990 e nela foram encontradas mais de mil ossadas de indigentes, presos políticos e vítimas do esquadrão da morte. Dois anos após a abertura da vala, é publicado o livro Meu companheiro: 40 anos ao lado de Luiz Carlos Prestes, de Maria Prestes. A autora conta sua própria história de militância ao descrever a trajetória de Luiz Carlos Prestes, líder do Partido Comunista Brasileiro (PCB), e mescla a vida cotidiana da família às turbulências políticas após o golpe de 1964.

Anos 1990

Uma década após o início do governo civil, a primeira etapa de reconhecimento e reparação dos horrores da ditadura militar é realizada no Brasil. Com o intenso trabalho de grupos e entidades de direitos humanos, notadamente das Comissões de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos, os principais candidatos à Presidência da República nas eleições de 1994, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso, firmaram “um compromisso com as famílias de que reconheceriam, uma vez eleitos, a responsabilidade do Estado no desaparecimento de guerrilheiros e opositores políticos, assim como se esforçariam para encontrar seus restos mortais”, como explica a historiadora Carolina Bauer (2014, p. 206-207).

Com a vitória do sociólogo filiado ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), foi promulgada a Lei nº 9.140, de 4 de dezembro de 1995 (Lei dos desaparecidos), que reconhecia a responsabilidade do Estado no desaparecimento de 136 pessoas e criava uma comissão para pesquisar sobre outros casos que pudessem ser investigados. Apesar da reparação simbólica, observamos uma série de problemas relacionados a essa lei: a) a indenização financeira não era a prioridade para a maioria dos familiares, que buscavam a localização dos corpos e as circunstâncias das mortes; b) o ônus da prova caberia aos familiares, já que o Estado não faria tal investigação, tampouco disponibilizaria os arquivos; c) por fim, não haveria nenhum processo penal contra os acusados, mesmo que fossem encontradas provas contra repressores e torturadores.

É nesse contexto que Lara de Lemos (1997) publica o livro de poemas Inventário do medo, no qual reflete sobre sua experiência como presa política da ditadura brasileira, e a atriz, sindicalista e militante política Lélia Abramo (1997) publica sua autobiografia, Vida e arte: memórias de Lélia Abramo.

No mesmo ano, um grupo de ex-presos políticos formado por Alípio Freire, Izaías Almada e J. A. de Granville Ponce (1997) organiza o livro Tiradentes, um presídio da ditadura, obra que conta com 32 depoimentos, além de fotos de materiais produzidos na prisão, textos acadêmicos e desenhos. Um terço dos depoimentos é de mulheres que militaram em diferentes organizações: Dulce Maia, da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR); Rita Sipahi, do Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT); Elza Ferreira Lobo, da Ação Popular (AP); Eleonora Menicucci de Oliveira, do Partido Operário Comunista (POC); Nair Yumiko Kobashi e Rioco Kaiano, ambas do Partido Comunista do Brasil (PCdoB); além de Maria Aparecida dos Santos, Rose Nogueira, Robêni Baptista da Costa e Márcia Mafra, da Ação Libertadora Nacional (ALN).

Lembrar-se do período em que ficaram no presídio significa lembrar-se dos momentos que antecederam essa ida: as sessões de tortura aplicadas nas delegacias e outros centros de repressão e a especificidade dessas violências ao corpo feminino são citadas em vários relatos, como o de Rose Nogueira. Presa quando seu filho tinha apenas 33 dias, seu corpo ainda produzia leite, o que ganhava um significado específico naquele contexto: “O leite me fazia pensar que, enquanto estivesse ali, brotando, eu estaria ligada ao meu filho”. Para seus torturadores, contudo, o leite adquiria significado: “‘Tá cheia de leite! É a vaca terrorista!’ Eles riam e me beliscavam nas coxas, nas nádegas. Eu gritava e perguntava pelo bebê” (NOGUEIRA, 1997, p.139).

Fechando esse período brasileiro, Wilma Ary (1998) publica uma coletânea de poemas sobre diferentes momentos de sua vida, incluindo a luta contra a ditadura, intitulada Entremelamento: um livro de muitas vidas.

Anos 2000

Em novembro de 2002, o Congresso Nacional aprova pela Lei n° 10.559 a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que havia sido criada em 2001 por meio de medida provisória do presidente reeleito Fernando Henrique Cardoso. Seu objetivo era promover a reparação de violações a direitos fundamentais praticados entre 1947 e 1988, reconhecer a anistia política aos perseguidos e perseguidas políticas e proporcionar, quando pertinente, um ressarcimento econômico. Nesse período, podemos perceber o crescimento de publicações de teor testemunhal produzidas por militantes e ex-presas políticas.

Escrito originalmente em 1994 para um concurso literário, Marlene Soccas publica, em 2000, o livro Como ele veio e ficou, no qual relata sua militância e a repressão que a atingiu. Militante da VPR e da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), além de ter colaborado com a AP, a autora foi levada à Operação Bandeirantes (OBAN) em maio de 1970, onde ficou por doze dias e foi torturada. Ainda que não tenha sido premiado, seu texto não fica trancado na gaveta: passados alguns anos com o material pronto, a autora resolve publicá-lo, pagando a edição com verba própria: “Farei isso também porque muitas pessoas para quem eu relato os acontecimentos durante a ditadura, sempre me perguntam por que eu não escrevo um livro sobre o assunto” (SOCCAS, 2000, s/p).

Nesse mesmo ano, Marília Guimarães descreve, em Nesta terra, nesse instante, um período específico de sua militância na VPR e na VAR-Palmares, compreendido entre fevereiro de 1969 e janeiro de 1970. O livro inicia com sua chegada a Cuba para, depois, retroceder quase um ano e recuperar fatos anteriores que levaram a tal situação. Em um desses momentos, a autora releva os sentimentos ambíguos sobre a clandestinidade, vista, por um lado, como “a expressão mais sofrida e iluminada nesta história. É o obscuro. A noite em plena luz do dia, é estar na multidão tentando se confundir dentro dela. São as estradas sinuosas da minha pátria gentil. São vozes sussurradas no burburinho das ruas. É o medo do nada”. E, por outro, como “o despertar pleno da coragem. É o nascimento. É seguir em frente, sem temores. É ir em busca do encontro definitivo com a liberdade” (GUIMARÃES, 2000, p.54). Oito anos depois, a autora publicaria em Cuba outro livro, que até o presente não teve uma edição brasileira, Nuestros años en Cuba: un exilio entre sinsontes y el sabiá. Permeado de reencontros com camaradas de militância, a autora expõe sua admiração pelo país que a acolhera e por Fidel Castro, a quem dedica o livro (GUIMARÃES, 2008).

Em 2002 é publicado No corpo e na alma, livro de Derlei Catarina De Luca, que militava na AP. As palavras introdutórias em seu testemunho descrevem o difícil processo de escrita da experiência traumática, vivida na clandestinidade e nos órgãos de repressão: “Este livro foi uma catarse. Também foi uma necessidade” (DE LUCA, 2002, p. 21). Tentando juntar diferentes enfoques sobre o mesmo assunto, a autora ilumina sua experiência a partir de várias perspectivas: as memórias de sua militância estão abraçadas por um diário inacabado, por documentos oficiais coletados em arquivos da repressão, por pequenos contos do que veio depois. Seu trabalho de memória é uma severa denúncia da repressão ditatorial: “A primeira noite é indescritível. Arrancam minhas roupas. Sou pendurada no pau de arara, recebo choques elétricos nos dedos, vagina, ouvido, quebram meus dentes. A dor é lancinante. Tão intensa que nem dá para gritar” (DE LUCA, 2002, p.83). Na reavaliação que faz de sua militância e dos caminhos trilhados pela AP, a autora expõe sua contundente crítica à organização, principalmente à direção.

No ano seguinte, mais dois livros são lançados. Martha Vianna publica Uma tempestade como a sua memória: a história de Lia (VIANNA, 2003), biografia de Maria do Carmo Brito, militante da VPR e única mulher a assumir um posto de comando no movimento guerrilheiro. Embora não seja um registro autobiográfico, incluímos nesta relação porque a autora também participou da luta contra a ditadura, militando na AP. É possível observar na narrativa o entrelaçamento das histórias dessas duas mulheres: se, nos testemunhos tradicionais, as autoras falaram de suas experiências para falar, ao mesmo tempo, das vivências de outras companheiras e companheiros, aqui a autora relata a experiência de uma amiga e, ao mesmo tempo, deixa rastros sobre a sua.

Outro livro publicado em 2003 é Geração 60, geração esperança, de Maria Lúcia Resende Garcia. Militante da AP, a autora foi perseguida e presa em 1968 ao participar do XXX Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) e faz, nesse livro, um relato sobre sua vida na clandestinidade.

Sete anos após sua coletânea de poemas, Wilma Ary (2005) publica Trauma do ovo: culpada e/ou inocente, agora num relato entrecortado por diferentes vozes narrativas. Numa das passagens mais fortes do livro, a autora descreve sua profunda agonia com a tortura e morte de um companheiro: “O silêncio de cumplicidade se faz absurdamente, todos compactuaram com esse assassinato. Até eu, que não gritei, que me calei para sobreviver. E eles lá fora falavam em moral revolucionária – ‘que merda!’” (ARY, 2005, p.102).

Outra obra na qual encontramos as trajetórias cruzadas entre autora e sujeito biografado é Um cadáver ao sol: a história do operário brasileiro que desafiou Moscou e o PCB, de Iza Salles (2005). Ao escrever sobre a vida de Antonio Canellas, operário expulso do PCB, a autora, militante da VPR presa e torturada em 1970, faz uma revisão de seu próprio posicionamento político, demonstra sua desilusão com o marxismo-leninismo e faz críticas ao autoritarismo nas organizações de esquerda.

De 2005 é também o livro Estilhaços: em tempos de luta contra a ditadura, da militante da AP e do PCdoB Loreta Valadares. Finalizada um mês antes do falecimento da autora, a obra inclui, em cada capítulo, subtemas intitulados “Olhar de gênero”. Em determinado trecho, explica que “durante toda a minha experiência de militância, prisão e exílio, fui aos poucos adquirindo uma consciência de gênero a princípio difusa e inconsistente. Foi no exílio que me tornei feminista, alcançando arguta consciência da opressão de gênero” (VALADARES, 2005, p.215). A importância da transmissão e do acolhimento das palavras de quem passou por experiências traumáticas são ressaltadas em seu texto, no qual destaca como “a solidariedade das companheiras e dos companheiros, de todos a quem relatei as torturas” foi decisiva para “forjar o espírito e fortalecer a alma” (VALADARES, 2005, p.214).

Em 2007, Yara Falcon publica Mergulho no passado: a ditadura que vivi. Numa linguagem simples e direta, a autora conta histórias de sua militância, prisão e outras formas de luta após seu desligamento das organizações clandestinas. Logo no primeiro parágrafo, expõe os motivos que a levaram a escrever: “Pensava ter enterrado essas recordações nas profundezas da memória. Mas, não foi assim (...). Entendi que tinha de escrevê-las para extravasar os sentimentos controversos dos anos da ditadura” (FALCON, 2007, p.15). Militante da Organização Revolucionária Marxista – Política Operária (Polop) e do POC, a autora tece suas ressalvas em relação aos grupos, questionando o modo pelo qual encaravam questões de fundo sentimental ou temas que fugissem a atos de militância propriamente ditos.

Em 2007, Yara Gouvêa e Danielle Birk publicam Duas vozes, iniciando o livro com uma advertência que diz muito de suas escolhas narrativas. Apesar de passados mais de 30 anos das vivências abordadas, as autoras explicam que “a maioria dos protagonistas, inclusive as próprias autoras, aparecem aqui sob pseudônimo. Questão de distanciamento e tato” pois, de acordo com elas, “o pudor ainda se impõe, a fim de deixar a cada um a possibilidade de se reconhecer – ou não – nos fatos relatados, alguns deles dolorosos ou apenas constrangedores, e de se confrontar com eles de novo, com toda a liberdade” (GOUVÊA; BIRK, 2007, p. 11).

No segundo mandato do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a Comissão da Anistia passa a apreciar os pedidos de anistia em sessões públicas por todo o território nacional. Iniciadas em 2008, as Caravanas da Anistia buscavam especialmente uma dimensão pedagógica ao transferir os trabalhos para praças públicas, escolas, sindicatos, universidades etc., além de lugares nos quais as perseguições, torturas e mortes haviam ocorrido. Cria-se, igualmente, o projeto “Marcas da Memória” que realizou audiências, entrevistas, projetos de preservação e publicações. Esses avanços contribuíram para certo tipo de inscrição do processo ditatorial na sociedade brasileira, contudo, deixaram de lado ações fundamentais, como o julgamento e a punição dos responsáveis pela repressão, mortes e torturas; o esclarecimento das circunstâncias nas quais essas situações ocorreram; e um debate aprofundado sobre as consequências subjetivas dessa impunidade – tópico realizado parcialmente apenas em 2013 com a implementação das Clínicas de Testemunho.

Dentro desse panorama, novos testemunhos são publicados. No livro 1968 – o tempo das escolhas, Catarina Meloni narra sua trajetória no movimento estudantil e na AP, bem como sua prisão e exílio. Permeando os relatos, estão seus questionamentos em relação à própria escrita, como na última página do livro, onde indica que seu testemunho foi aliado à possibilidade de elaboração subjetiva: “Sinto-me com direito à palavra, conquisto assim minha liberdade pela via da livre expressão e não fico remoendo ideias fixas. O passado, já não tenho mais a impressão de o estar carregando como um fardo” (MELONI, 2009, p. 128).

Anos 2010

Em 2010, Solange Silvany Rodrigues Lima publica o livro De pouso em pouso: em busca do repouso prometido. Antiga militante da Juventude Universitária Católica, que deu origem à AP, a autora foi presa na década de 1960. A obra intercala suas memórias de clandestinidade à forte presença da religião católica em sua vida, a qual ganha relevo, além do texto, no crucifixo que figura na capa do livro. Do mesmo ano, vale a pena destacar a publicação Luta, substantivo feminino, de Tatiana Merlino e Igor Ojeda (2010), que reconstrói trajetórias de mulheres mortas e desaparecidas na luta contra a ditadura e contém depoimentos de várias militantes que foram presas e torturadas naquele período.

Já a peça de teatro Diálogo para uma só personagem, de Ana Mércia Silvia Roberts (2011), foi escrita entre 1993 e 1994 e ficou guardada por aproximadamente quinze anos. Em 2008, ao participar do Grupo de Mulheres ex-Presas Políticas, a autora leu seu texto para as demais companheiras que, emocionadas, acolheram seu testemunho e incentivaram sua publicação, pensando coletivamente em estratégias para esse fim. Trata-se de uma manifestação coletiva da memória que assume diferentes modalidades artísticas, seja na escrita da peça, em sua encenação, ou na própria construção do livro, que tem na capa uma aquarela feita por Rita Sipahi, ex-presa política e também uma das participantes do grupo.

No dia 16 de maio de 2012, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff (PT), foi instituída a CNV, criada no ano anterior pela Lei nº 12.528. Os debates para sua criação levaram à formação de muitas outras comissões (municipais, estaduais, sindicais, universitárias etc.), envolvendo amplos setores da sociedade interessados no passado recente brasileiro. Abriram-se espaços para novos depoimentos de militantes e ex-presas e presos políticos, parte dos quais integra o relatório final da Comissão (BRASIL, 2014).

No curto período até a finalização de seus trabalhos, foi publicada a autobiografia da atriz e jornalista Vera Gertal (2013), Um gosto amargo de bala, livro que narra sua trajetória ao lado de militantes e artistas que resistiram à ditadura. A autora descreve suas atividades de apoio à ALN, que tinha como um dos principais líderes seu padrinho, Joaquim Câmara Ferreira, o Toledo. Um dos poucos testemunhos de mulheres publicados em uma grande editora, o livro foi indicado ao Prêmio Jabuti de 2014, ficando em terceiro lugar na categoria Reportagem.

No mesmo 2013, Sylvia de Montarroyos publicou Réquiem por Tatiana: memórias de um tempo de guerra e de uma descida aos infernos, retratando suas memórias como militante trotskista e presa política. Ao ser recapturada após fugir da primeira prisão em 1964, a autora passou por sessões de torturas e foi internada no Hospital Psiquiátrico da Tamarineira, sofrendo duplamente as sevícias do choque elétrico: primeiro, nos quartéis militares, depois, no abusivo tratamento psiquiátrico da época. São mais de 450 páginas de suas memórias, nomeadas nas laudas pré-textuais como “testemunho da primeira mulher a ser torturada pela ditadura militar no Brasil” (MONTARROYOS, 2013, s/p).

Em 2014, Marlene Soccas publica outro livro. Em Meu querido Paulo, a autora apresenta a história de Paulo Stuart Wright, cassado quando deputado pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina e militante da AP. Em várias passagens, observamos o entrelaçamento entre a vida do desaparecido político e da autora: “Meu querido Paulo – há uma questão que quero discutir contigo. Primeiro, porque é um testemunho do que sofri nas mãos dos torturadores. Segundo, é uma autocrítica que desejo fazer, refletindo em cima dos meus erros, de minhas fraquezas” (SOCCAS, 2014, p.218).

No final desse mesmo ano, seria feita a entrega do relatório final da CNV. As imagens que marcaram o início e o término de suas atividades dizem muito sobre o que transcorreu em tão pouco tempo. Na cerimônia de posse de seus integrantes, realizada em 15 de maio de 2012, estavam presentes, ao lado da presidenta Dilma Rousseff, os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso, José Sarney e Fernando Collor de Mello. O tom conciliatório marcava o momento. Menos de três anos depois, e após o país ter atravessado as Jornadas de Junho de 2013, a cerimônia oficial de entrega do relatório final é realizada em 10 de dezembro de 2014, em um salão bem menor e sem a presença dos ex-presidentes. Ocorrida após uma conturbada reeleição, a cena ilustraria a polarização da sociedade brasileira.

A amplitude e a velocidade dos acontecimentos políticos que seguiriam desde então foram intensas, passando pelos protestos de 2015, pelo golpe e deposição da presidenta Dilma Rousseff em 2016, pela chegada da extrema direita brasileira ao governo após a eleição de Jair Bolsonaro em 2018. A centralidade das relações entre memória e gênero é revelada pela posse presidencial do mesmo homem que, quando deputado federal, havia homenageado um torturador ao dizer, em seu voto no processo de impeachment, “Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”. O desmantelamento institucional de comissões e secretarias criadas para promover verdade e justiça, bem como os retrocessos de direitos e negacionismos atuais, demandam novas e amplas pesquisas com as quais acreditamos que este artigo pode colaborar.

Resistências a contrapelo: a construção de espaços de escuta

“Também tenho o que contar, quer dizer, tenho histórias a contar caso alguém pergunte, mas só poucos o fazem”, declara Ruth Klüger (2005, p.13) em sua já citada autobiografia. Essa situação é semelhante à de várias militantes brasileiras, algumas das quais manifestaram publicamente suas memórias. A compilação apresentada acima revela a existência de testemunhos pouco conhecidos e debatidos, mas que podem oferecer importantes materiais para pesquisas históricas, literárias, políticas e sociológicas.

As dificuldades que envolvem a produção, circulação e reconhecimento desses materiais indicam problemas de diferentes campos que não podem ser ignorados, envolvendo condições materiais e subjetivas. Em relação às primeiras, verificamos que grande parte dos livros escritos por essas militantes não foi publicada por editoras de renome; ao contrário, há casos em que as autoras pagaram integralmente pela impressão de seus textos para poder divulgá-los, como é possível notar em alguns relatos e nas chamadas “edições do autor”. Em nossa pesquisa, notamos que boa parte desses livros não é encontrada com facilidade em livrarias ou em sebos – físicos ou virtuais. Alguns tiveram uma circulação restrita. Mesmo estando à margem, foram escritos e publicados. A despeito da qualidade literária que possa ser atribuída a essas narrativas, questão que não foi nosso interesse examinar, são produções culturais que não apenas fazem parte do processo social, como o constituem. Diante dessas dificuldades, é bastante provável que existam obras que não conseguimos localizar. Além disso, o período com o qual optamos por trabalhar não compreende aquelas produzidas a partir de 2015. Isso significa que a lista está aberta à incorporação de outros testemunhos.

Consideremos, agora, algumas questões subjetivas presentes nos testemunhos. Como sugere Márcio Seligmann-Silva (2003, p. 46), a narração de uma experiência traumática está marcada por um paradoxo: de um lado, há uma aflitiva necessidade de narrar a experiência vivida, de transmiti-la; de outro, “a percepção tanto da insuficiência da linguagem diante dos fatos (inenarráveis) como também – e com um sentido muito mais trágico – a percepção do caráter inimaginável dos mesmos e da sua consequente inverossimilhança”. Além disso, a culpa e a vergonha são outros elementos que impedem ou adiam um testemunho – ou, ainda, resultam no silêncio. Constatamos, contudo, a existência de um fator adicional que dificulta o testemunho das mulheres: trata-se da dicotomia de repulsa-atração que esteve presente na situação de tortura, na qual eram vistas pelos torturadores ora como corpos a serem penetrados, ora como corpos a serem repelidos – mas, de todas as formas, humilhados e vilipendiados. Embora pouco trabalhado nos estudos da memória, esse aspecto prejudica o trabalho de elaboração da experiência traumática, pois o estupro e outras formas de violências sexuais dirigidos às mulheres “escapam” dos ambientes usados pelas instituições repressoras ditatoriais e dos tempos em que estas permaneceram no poder. Ou seja, mesmo quando saem dos cárceres e dos centros clandestinos de detenção, as mulheres sobreviventes continuam sendo potenciais vítimas dessas violências, frequentemente objetificadas e desacreditadas em suas denúncias cotidianas. Quando públicos, esses testemunhos permitem questionar as desigualdades de gênero a eles intrínsecas, já que tanto as condições materiais como as subjetivas estão impressas nessas narrativas.

Pela interpretação que fazem de suas vivências, esses testemunhos podem visibilizar questões para as quais não se deu relevância anteriormente, revisitando estratégias de grupos e organizações de esquerda, práticas da repressão e novas possibilidades de resistência. Não se trata simplesmente de preencher as lacunas históricas com esses relatos, mas sim de examinar o que foi dito e o que foi silenciado sobre tais experiências. A diversidade de estilos e linguagens desses testemunhos propicia uma riqueza de recortes e metodologias de análise: é possível fazer um recorte por período de publicação, por grupo de militância, por estilo narrativo etc., bem como escolher uma dessas obras e examiná-la de modo mais detido, analisando todas suas potencialidades, escolhas, tensões, alcances e limites.

Sem nenhuma pretensão de esgotar o debate sobre esse material, uma leitura transversal dos testemunhos permite que identifiquemos alguns assuntos recorrentes. Esses relatos fazem uma forte denúncia de como as mulheres foram submetidas à nudez forçada, a estupros individuais e coletivos, à colocação de objetos e animais em suas vaginas, a cenas de masturbação de seus algozes, a torturas específicas quando se encontravam menstruadas ou grávidas, a abortos por conta das torturas, a serem usadas como instrumento de manipulação. Longe de ser perpetrada por um ou outro verdugo que tenha “ultrapassado os limites”, os testemunhos revelam que a violência de gênero era parte da estrutura repressiva ditatorial.

Em relação à militância, as autoras fazem críticas às organizações que pertenciam, ressaltando o machismo e o autoritarismo de partidos, grupos revolucionários e dirigentes. Destacam as árduas condições de clandestinidade que vivenciaram como escolha dentro de um contexto repressivo bastante específico. Questionam temas como maternidade, cuidado das crianças, separação da família. Ao mesmo tempo, enfatizam a alegria de entregar-se à luta e ao projeto político de transformação social. A partir de suas vivências posteriores, esses eventos são revistos por um novo olhar, no qual as relações de gênero ganham destaque.

A resistência assume várias modalidades nessas obras, como no próprio ato de escrita ou criação fílmica de seus testemunhos, no qual as autoras recuperam agenciamento. À esteira do que propõe o historiador Enzo Traverso (2018) – abertamente inspirado por Walter Benjamin –, entendemos que o “passado” não contém apenas as memórias das “vítimas”, mas também os projetos políticos “vencidos”, que não foram realizados porque a dominação se impôs.4 Nesse sentido, essas obras têm potencialidades de oferecer uma perspectiva histórica na qual suas autoras não sejam apenas “objetos” da violência de Estado, mas “sujeitos” que produziram e produzem projetos emancipatórios, inclusive no ato de narrar e transmitir experiências, pois seus testemunhos desestabilizam a percepção tradicional tanto do passado como do presente. Da mesma forma, é possível encontrar resistência nos relatos de solidariedade e acolhimento recebidos durante a prisão, primeiro momento no qual puderam reconstruir-se subjetivamente.

Independentemente das estratégias de transmissão adotadas nesses testemunhos, percebemos uma mudança significativa de temas de acordo com os processos políticos e movimentos sociais nas disputas em torno do passado. Não são mudanças lineares, uma vez que alguns testemunhos apresentam indícios, nem sempre desenvolvidos, de questões latentes que apenas são exploradas em obras posteriores. Como exemplo, podemos pensar nas cartas de Flávia Schilling: publicadas enquanto ferramenta de luta pela sua liberdade e denúncia da repressão, já traziam vestígios de temas aprofundados nos testemunhos de presas políticas no final dos anos 1990, quando estas enfatizam a importância do acolhimento entre as mulheres e os laços de amizade tecidos entre as companheiras de militância ou cárcere. Outro exemplo é a denúncia do crime de estupro como modalidade política repressiva, nomeado em depoimentos recentes conforme o capítulo específico de violência sexual no relatório da CNV (2014). Mas sua existência já havia sido colocada em cena anos antes: o filme Que bom te ver viva (MURAT, 1989) trazia depoimentos de mulheres narrando as sevícias sexuais às quais haviam sido submetidas.

Acreditamos que essas alterações de abordagem estão vinculadas, entre outros motivos, aos desdobramentos dos movimentos feministas. No decorrer dessas décadas, os feminismos politizaram questões fundamentais relativas ao corpo, à saúde, ao desejo e à sexualidade, e estimularam debates sobre violência de gênero, feminicídio, cultura do estupro, racismo, entre tantos outros temas. Com sua história entrelaçada à das muitas mulheres que lutaram contra a ditadura militar brasileira, esses movimentos construíram e constroem espaços nos quais as vozes dessas e de outras mulheres podem ser socialmente acolhidas.

Considerações finais

Por meio de diálogos e depoimentos, ou através de poesias, peças de teatro, contos, filmes, autobiografias tradicionais ou romances: percorrendo quase quatro décadas de “políticas da memória” implementadas no Brasil, foi possível elencar mais de 30 testemunhos de mulheres sobre suas experiências na luta contra a ditadura militar. As estratégias para a produção desses testemunhos dão conta de diferentes dimensões. Problematizam a experiência e o testemunho de maneira ampla, articulando suas memórias com as de outras companheiras e companheiros; apontam especificidades de gênero na militância, na clandestinidade, nos aparatos repressivos; constroem um espaço próprio como prática de subjetivação. Como trabalho de memória, esses testemunhos reinterpretam vivências e passam a incorporá-las à experiência daquelas que narram.

A tentativa de inventariar essas obras pode ser útil como fonte de outras pesquisas e está aberta para que novas referências sejam incluídas nesta lista. Se, como afirmamos, não podemos apontar um quadro de causa e consequência, isso não significa negar que uma maior presença de produções testemunhais de mulheres tenha ocorrido nos últimos 20 anos, de mãos dadas às (bastante tímidas) políticas de reparação e reconhecimento.

Interrogar os espaços conflitivos em suas estreitas relações com as resistências articuladas na e pela narração permite, ainda, considerar esses testemunhos em suas potencialidades de desestabilizar a cultura hegemônica racista e heterocispatriarcal ao promover novos modelos de subjetividades e refletir sobre intervenções de diferentes vozes que criam tensão nas condições de fala e escuta da sociedade: como acolher falas negras, indígenas, quilombolas, camponesas, LGBTQIA+ e tantas outras, cujos corpos transgressores resistem cotidianamente às repressões estatais?

Nesse sentido, vale destacar outros desafios relacionados aos estudos testemunhais. Um primeiro exemplo pode ser encontrado nas críticas pós-coloniais e decoloniais, que questionam o caráter eurocêntrico de estudos cujas análises oferecem recursos insuficientes para pensar o conceito de trauma em países marcados pelo processo de colonização. Podemos observar esse propósito no livro The Future of Trauma Theory: Contemporary Literary and Cultural Criticism, organizado por Gert Buelens, Sam Durrant e Robert Eaglestone (2014), que reúne uma série de textos para debater novas concepções sobre o tema, como também no belo e forte livro de Grada Kilomba (2019), Memórias da plantação, que relaciona colonialismo, memória e trauma para denunciar o racismo cotidiano.

Para retomar o caso brasileiro, devemos ainda pontuar que as narrativas negras, camponesas e indígenas foram silenciadas no processo de redemocratização – mesmo no relatório final da Comissão Nacional da Verdade, que desconsidera, em sua “contagem oficial” de pessoas mortas e desaparecidas, os cerca de 1.200 camponeses e camponesas e 8.000 indígenas, como assinala a cientista social Adriana Rodrigues Novais (2019). Outro desafio é pensar nos estudos sobre trauma em contextos de violências estruturais, como as denúncias de assassinatos e estupros ocorridos durante a militarização nas favelas do Rio de Janeiro por agentes estatais. A violência racializada está também presente nas constantes mortes e ameaças às populações indígenas em defesa de suas terras.

O debate sobre os testemunhos aqui elencados não é menos desafiador. Diante do atual cenário brasileiro de retrocessos em direitos e negacionismo histórico, a reinserção pública dessas memórias incomoda duplamente: por um lado, revela lembranças e aspectos da militância e da repressão pouco elaborados socialmente; por outro, demonstra que, mesmo contra a corrente, algumas mulheres puderam transmitir suas memórias. Recuperando o trecho de Ruth Klüger citado anteriormente, se o fato de as mulheres terem um passado é algo quase indecente, esses testemunhos materializam tamanha impertinência.

Material suplementario
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Notas
Notas
1 Destacamos o Laboratório de Estudos de Gênero e História (LEGH) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que integra vários projetos relacionados a gênero, feminismos e ditaduras e possui grande acervo de testemunhos e entrevistas de militantes. Outro exemplo é o projeto Intolerância e Resistência: memórias da repressão política no Brasil (1964-1985), realizado pelo Laboratório de Estudos sobre a Intolerância (LEI) da Universidade de São Paulo (USP) em parceria com o Arquivo Edgard Leuenroth (AEL) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) entre 2008 e 2010.
2 As análises de algumas obras aqui elencadas encontram-se em Danielle Tega (2019), livro no qual apresentamos, pela primeira vez, parte do levantamento que ora publicamos.
3 Traduzimos livremente esse e outros trechos retirados de fontes bibliográficas em outros idiomas.
4 Para um estudo nosso a respeito da obra de Enzo Traverso, consultar Deni Irineu Alfaro Rubbo; Danielle Tega (2021).
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