DOSSIÊ 19: HISTÓRIA, MEMÓRIA E PRÁTICAS DAS PERIFERIAS BRASILEIRAS, AFRICANAS E LATINO-AMERICANAS: CIDADANIA, INVISIBILIDADE SOCIAL E SILÊNCIO
O CORDEL DE LEANDRO GOMES DE BARROS: UM RETIRANTE NA CAPITAL PERNAMBUCANA, UM POETA ENTRE DOIS MUNDOS 1
The cordel of Leandro Gomes de Barros: a migrant in the capital of Pernambuco, a poet between two worlds
El cordel de Leandro Gomes de Barros: un migrante en la capital de Pernambuco, un poeta entre dos mundos
O CORDEL DE LEANDRO GOMES DE BARROS: UM RETIRANTE NA CAPITAL PERNAMBUCANA, UM POETA ENTRE DOIS MUNDOS 1
Fronteiras: Revista de História, vol. 24, núm. 43, pp. 107-125, 2022
Universidade Federal da Grande Dourados

Recepción: 12 Mayo 2022
Aprobación: 16 Junio 2022
Resumo: O presente artigo traz uma análise da obra do poeta Leandro Gomes de Barros, que publicou seus cordéis em folhetos a partir da cidade de Recife, no início do século XX. Marginalizado e pensado como de menor importância, entre os cânones literários, sua obra pode ser observada de outro modo, de forma que a investigação se propõe a compreender a riqueza de sua literatura, colocando-o como um “poeta em trânsito”, transitando entre o antigo e o moderno, entre o interior e a capital, entre o oral e o escrito, entre os ricos e os pobres, entre os letrados e os iletrados. Para tal, buscou-se situá-lo socialmente, compreender as conexões entre a vida e a obra, assim como aproximar-se do público com o qual dialogava, compreendendo, deste modo, a riqueza de sua produção literária, uma janela para vislumbrar diferentes segmentos da sociedade pernambucana e brasileira no início do século.
Palavras-chave: Cordel, Leandro Gomes de Barros, Circularidade.
Abstract: This article presents an analysis of the work of the poet Leandro Gomes de Barros, who published his cordéis in pamphlets from the city of Recife, at the beginning of the 20th century. Marginalized and thought of as less important, among the literary canons, his work can be observed in another way, so that the investigation proposes to understand the richness of his work, placing him as a "poet in transit", transiting between the ancient and the modern, between the countryside and the capital, between the oral and the written, between the rich and the poor, between the literate and the illiterate. To this end, we sought to situate him socially, understand the connections between life and work, as well as approach the public with whom he dialogued, thus understanding the richness of his literary production, a window to glimpse different segments of Pernambuco and Brazilian society at the beginning of the century.
Keywords: Cordel, Leandro Gomes de Barros, Circularity.
Resumen: Este artículo presenta un análisis de la obra del poeta Leandro Gomes de Barros, quien publicó sus cordéis en folletos de la ciudad de Recife, a principios del siglo XX. Marginada y pensada como menos importante, entre los cánones literarios, su obra puede ser observada de otra manera, por lo que la investigación se propone comprender la riqueza de su literatura, ubicándolo como un "poeta en tránsito", transitando entre lo antiguo y el moderno, entre el campo y la capital, entre lo oral y lo escrito, entre los ricos y los pobres, entre los letrados y los analfabetos. Para ello, buscamos situarlo socialmente, comprender las conexiones entre la vida y la obra, así como acercarnos al público con que dialogaba, comprendiendo así la riqueza de su producción literaria, una ventana para vislumbrar diferentes segmentos de la sociedad pernambucana y brasileña a principios del siglo.
Palabras clave: Cordel, Leandro Gomes de Barros, Circularidad.
Natural de Pombal, município no interior da Paraíba, o poeta Leandro Gomes de Barros nasceu em 19 de novembro de 1865, na Fazenda Melancia.2 Filho de José Gomes de Barros Lima e Adelaide Gomes de Barros Lima, aos nove anos de idade mudou-se junto à mãe e irmãos para Vila do Teixeira, no mesmo estado, em decorrência da morte de seu pai. Passaram a morar juntos ao tio materno, Padre Vicente Xavier de Faria, que viria a se tornar o tutor da família e da herança deixada.
Essa mudança, possivelmente, foi o primeiro elemento a contribuir para a sua formação poética. Vila do Teixeira, na década de 1870, era um “local de significativa importância para a poesia popular no Brasil” (SILVA, 2007, p. 19), agrupando importantes nomes da poesia oral brasileira.3 Tal ambiente foi de grande importância e influência na arte e aptidão de versejar desenvolvida por Leandro Gomes de Barros, uma vez que lhe garantiu a oportunidade de crescer ouvindo alguns dos maiores nomes da literatura oral da região, ao passo que recebia algum tipo de educação formal de seu tio, pároco e professor de Latim e Humanidades.
Os escassos dados biográficos de Leandro Gomes de Barros dão um salto para o ano de 1890, quando se muda para Vitória de Santo Antão, no Pernambuco, aproximando-se cada vez mais de Recife, uma das principais cidades da região. Por volta de 1892, casa-se com Venustiniana Eulália Aleixo, com quem tem quatro filhos: Rachel, Erodildes (Didi), Julieta e Esaú Eloy (MENDES, 2009, p. 62-63).
Após morar em Jaboatão, mudou-se para Recife no ano de 1907. Sem informações que nos possibilitem cravar as motivações para as mudanças, é possível conjecturar que, provavelmente, sua transferência estivesse ligada às facilidades para viver exclusivamente de sua poesia, visto que garantia melhores condições para tal, apresentando mais habitantes – consequentemente, mais potenciais consumidores de sua poesia –, mais tipografias disponíveis para impressão dos folhetos e linhas de trem que o interligaria a diversos pontos do estado e da região, possibilitando uma ampliação das possibilidades de venda.
Leandro Gomes de Barros, um dos principais poetas de cordel e membro da primeira geração de cordelistas – aqueles que segmentaram o formato deste gênero literário –, pode ser considerado, portanto, um homem urbano. Nascido no interior, em zona sertaneja, experenciou a vida adulta em cidades, até chegar em Recife, uma das maiores do Brasil. Os caminhos de sua vida irão se misturar com os rumos da capital pernambucana, que terá expressiva influência sob sua obra e consciência criativa.
O cordel, gênero literário deste poeta, pode ser entendido como um artefato poético de baixo custo de produção e venda, com fins de leitura/audição coletiva, com forte teor oral, estando o texto escrito em relação de dependência com a oralidade. Surgido no Brasil, mais precisamente na região hoje conhecida como Nordeste, entre o final do século XIX e início do século XX, é, de algum modo, herdeiro das cantorias orais – tanto dos povos nativos, quanto dos africanos e ibéricos – que aconteciam na região e, consequentemente, tem a oralidade como elemento constituinte de seu estilo literário, o que garante a predominância de seu uso coletivo.4 Leitura realizada em grupo, onde um leitor, em voz alta, apresenta o texto para ouvintes atentos à narrativa.
Comumente associada, na bibliografia tradicional sobre o tema, a uma literatura de escritores semialfabetizados e consumida por um público com semelhante ou inferior nível de escolaridade, é inserida como representante de uma cultura popular. Sua característica eminentemente oral contribuiu para cristalizar esta noção. Tais concepções apresentam problemas de interpretação e estão sendo, atualmente, questionadas e revistas, ampliando o horizonte de visão sobre o cordel.5
Estas leituras operacionalizam o conceito de cultura popular em oposição à cultura erudita, trazendo consigo a ideia de oposição entre povo – entendido como os privados de bens econômicos, sociais e culturais – e elite. Essa percepção, extremamente frágil, baseada na dicotomia popular/erudito, transforma a cultura em algo estático, inviabilizando o conceito de circularidade cultural – perceptível no cordel, que faz uso de elementos da cultura letrada e iletrada, simultaneamente, para se construir enquanto objeto cultural (BURKE, 2010, p. 20-22).
De modo evidente, portanto, a associação do cordel com uma literatura popular parte do pressuposto de que esta não faz parte dos cânones literários, da poesia erudita. Seria, portanto, uma literatura de segunda categoria, sem preocupações estéticas e literárias, posto que seria escrito por e para analfabetos ou semialfabetizados, com um público prioritariamente ouvinte. Por certo, visão preconceituosa que caminha para ser superada.
Poesia popular – associação iniciada com os folcloristas ainda na virada do século XIX para o XX – seria, portanto, o inverso da poesia culta. Concepção que possui íntima ligação com a constituição do Brasil, manifestando caráter elitista, excludente e definidor do que é ou não considerado arte. O cordel – sem o termo “literatura de” o precedendo – é uma modalidade poética, em formato específico, de modo que seu caráter literário já se encontra intrínseco (SANTOS, 2012).
Seguramente, o público de cordel, em seu princípio, poderia ser identificado como majoritariamente de baixo grau de alfabetização, sem que isso fosse propriamente por conta do gênero literário em si. Os altos índices de analfabetismo formavam, no Brasil, um público literário de não leitores, mesmo nas camadas mais ricas da sociedade. O público literário era, desse modo, composto por leitores e leitores-ouvintes.
Deste modo, asseguramos, o poeta Leandro Gomes de Barros escrevia para um público heterogêneo. Provavelmente, desde o início, essas narrativas circulavam entre diferentes classes sociais. A pluralidade temática, a existência simultânea de folhetos com preços diversificados, uma cultura oral presente em diferentes segmentos sociais, bem como os locais de venda e divulgação indicam um público financeiramente heterogêneo, perpassando as diferentes classes sociais em seu período de publicação. Trata-se de um público, portanto, predominantemente urbano, ainda que nostálgico da vida sertaneja, formado por leitores/ouvintes com diferentes níveis de escolaridade, circulando entre analfabetos e sujeitos com maior nível de acesso à educação, assim como entre diferentes classes sociais. Esse parece ter sido o universo múltiplo de leitores/ouvintes com quem Leandro Gomes de Barros dialogava para construir a sua obra.6
Leandro Gomes de Barros era, deste modo, um poeta em trânsito. Transitava para vender seus folhetos, nas linhas de trem da capital para o interior; transitava, também, entre mundos distintos: o interior e a capital; o oral e o escrito; o antigo e o moderno; os pobres e os ricos; os letrados e os iletrados. Marginalizado e pensado como de menor importância, entre os cânones literários, sua obra demonstra o contrário. Para compreendê-la, torna-se essencial inseri-la no tempo e no espaço.
Em 1907, quando chegou à cidade, o estado de Pernambuco estava consolidando o processo de acomodação da oligarquia Rosa e Silva; por outro lado, a cidade de Recife, especificamente, vivenciava um expressivo crescimento populacional, uma crise sanitária e um processo de modernização da cidade, com fins de aproximá-la das cidades europeias. É neste contexto que o poeta estará envolvido.
No início do século XX Recife vivia um crescimento populacional exponencial; em 1872, a cidade possuía cerca de 100 mil pessoas, saltando, em 1910, para 200 mil habitantes (ARRAIS, 1998, p. 42). Segundo Arrais, o massivo êxodo rural, ocorreu, principalmente, em decorrência de uma modernização da indústria da cana e as esporádicas, mas constantes, secas do sertão.
As usinas de açúcar, com o apoio do regime republicano, empreendiam uma modernização da produção açucareira na região, levando, no interior de Pernambuco, à formação de uma nova elite canavieira, com caráter mais industrial e empreendedor que, com apoio estatal, passou a superar, em produção, os engenhos tradicionais (CAMPOS, 2001, p. 40-42). Esta, por sua vez, contribuirá para a diminuição dos pequenos proprietários, os quais não conseguiam concorrer no mercado frente aos grandes latifúndios e se transformavam em pequenos fornecedores de cana-de-açúcar para a elite local. Com o tempo, quando endividados, perdem suas terras, tendo assim que emigrar para as cidades, sendo Recife um dos principais locais de chegada dos retirantes advindos do interior.
O outro elemento responsável pelo êxodo rural, e consequente crescimento populacional de Recife, foram as secas que atingiam o sertão – sendo as principais, na segunda metade do século XIX, as dos anos de 1877-1879, 1888-1889, 1898 e 1900. Ao longo das décadas, diversas famílias emigraram para outros locais, buscando sobreviver em condições mais favoráveis (ARRAIS, 1998, p. 42-43).
A cidade que Leandro Gomes de Barros encontrou, quando definitivamente foi morar em Recife, não só crescia em números, mas também em problemas sociais. Segundo Arrais:
Na primeira década do século as mudanças eram visíveis no novo quadro social da cidade: o aumento da população, a extensão das manchas de mocambos e pensões insalubres nas áreas residenciais da cidade, a mendicância, o abandono dos menores nas ruas, o recrudescimento das condições sanitárias, os altos números da mortalidade. (ARRAIS, 1998, p. 43).
Ganhava destaque a questão habitacional e a proliferação de mocambos, local de moradia daqueles que não tinham condições econômicas para um lugar melhor: “ocupando áreas de mangue, alagados, praia, beira mar e marés, os mocambos do Recife compunham um total de 16.347 habitações, segundo estimativas do recenseamento de 1913 – representando 43,3% do total de edificações da cidade” (SILVA, 2014, p. 33-34).
Nesse contexto, os mocambos passam a ser alvo do higienismo médico local, como evidenciado no Congresso Médico em Pernambuco, onde se indicou que estas habitações e seus habitantes eram questão de “salubridade pública”. Passa-se a construir, no início do século XX, um projeto político de modernização da capital, com o propósito de transformá-la, deixando-a aos moldes das cidades europeias,7 sendo necessário a implantação de transformações urbanas e culturais a fim de torná-la “civilizada”.8 Para aplicar tais transformações que levariam Recife a essa “sonhada europeização civilizatória”, um dos focos principais era a higienização pública, grande problema nos debates do início do século e, para obter êxito em tal empreitada, prédios – sejam eles pensões, oficinas ou casas –, considerados empecilhos, eram demolidos. Todos aqueles que “(...) não se enquadravam nos referenciais dos novos tempos” (SILVA, 2007, p. 34) deveriam, assim, ser varridos para os arredores da cidade, longe do centro, criando extensas regiões periféricas, destino para aqueles que migravam em direção à capital.
Essas regiões periféricas, resultantes desse processo de higienização, geralmente eram o destino dos que migravam em direção à capital. Edivania Alexandre da Silva seguiu, em sua dissertação, o itinerário das casas onde o poeta Leandro Gomes de Barros fixou residência, todas na zona periférica de Recife, o que, segundo ela, aponta que ele era um desses retirantes, “(...) mais um desses sujeitos ‘indesejáveis’ na urbe” (SILVA, 2007, p. 34-35). Morou de aluguel, sempre em casas simples, sofrendo todos os problemas vividos por seus vizinhos, tais como falta de saneamento básico, altos impostos, falta de iluminação etc.
Apesar de conseguir viver exclusivamente da venda de seus folhetos, isso não era, para Leandro Gomes de Barros, garantia de obtenção de grandes lucros. Além de morar de aluguel em bairros periféricos, o folheto O cometa9 nos deixa indícios da vida cotidiana, quando o poeta, em primeira pessoa, narra a sua chegada em casa após uma de suas viagens de trabalho:
Chego em casa muito triste,
Achei a mulher trombuda,
Perguntei: filha o que tem?
Respondeu-me, carrancuda:
Ora a 18 de Maio,
O mundo velho se muda.
Perguntei: tem jantar promto?
Venho com fome e cançado,
Desde hontem, respondeu-me,
Que o fogão está apagado,
Devido a esse cometa
Não querem vender fiado.
(...)
Fui fallar um fiadinho,
Que eu estava de olho fundo,
O marinheiro me disse:
Já por alli, vagabundo.
Eu disse: venda Seu Zé
Que eu pago no outro mundo. (BARROS, 1910).
Na narrativa, após chegar de viagem pelas cidades do interior, onde vendia ele mesmo seus folhetos, chega a sua casa sem que haja comida e dinheiro suficiente para poder ir às compras, tendo que buscar “um fiadinho” nos comércios da redondeza. Considerando seus locais de moradia, junto às informações apresentadas no excerto acima, é possível afirmar que o poeta garantiu o sustento de sua família por meio da venda de folhetos, sem que conseguisse, no entanto, adquirir fortuna ou estabilidade financeira através de seu ofício.
Vivia de sua poesia, mas sem grandes rendimentos. Como sujeito social era, portanto, inserido no grupo dos excluídos da modernização urbana, expelidos para as zonas periféricas que se constituíram junto ao projeto de higienização pública. Nestas regiões, morava de aluguel em casas simples, com problemas de estrutura básica para a existência. Defendemos a tese, no entanto, que, mesmo assim, era um escritor não circunscrito à esta realidade; Leandro Gomes de Barros era um escritor em trânsito, utilizando esta habilidade para possibilitar viver a partir de sua arte. Chegamos à esta conclusão a partir da análise do processo editorial, de distribuição e leitura dos folhetos publicados pelo poeta.
Não é possível cravar a participação exata do poeta no processo editorial. Acreditamos, no entanto, que a função editorial era dividida entre o poeta – quanto a questões relacionadas à construção poética, à venda e ao público – e o impressor – quanto a diagramações e o processo de impressão. A junção destes conhecimentos possibilitou a solidificação de um estilo editorial para o gênero.
Nos folhetos, a primeira observação refere-se à quantidade de páginas dedicadas às narrativas em cada um. Em quase 63%, 44 dos folhetos analisados, encontramos páginas destinadas a narrativas em múltiplo de 8, indicando racionalização editorial no processo de impressão, com intuito de barateamento dos custos, uma vez que uma única folha imprimia oito páginas do folheto.
A comparação entre as especificidades editoriais antes e depois da morte do poeta apresenta indícios da concepção editorial particular para seus folhetos, e revela-se mais um indicativo de sua participação direta na questão. Defendemos a hipótese de que, em vida, o poeta intuía como positivo aproximar a impressão de livretos de baixo custo com os demais livros que circulavam na sociedade, em diferentes segmentos literários, e por isso deixaria páginas em branco. Neste sentido, baratear os custos não era o único objetivo de Leandro Gomes de Barros; ainda que buscasse racionalizar a impressão, reduzindo despesas, mantinha-se o intuito de apresentar o folheto como um livro.
A poesia de Leandro Gomes de Barros é, em alguma medida, uma filha descendente das cantorias orais, tendo a oralidade como elemento constituinte dela. A poesia oral se manifestava em todos os locais que garantissem aglomeração pública: “nas feiras, festas ou engenhos, em residências particulares” (ABREU, 1993, p. 129). Em outra esfera, “nas estações ferroviárias e nas feiras e patamares de igrejas do sertão” (MOTA, 2002, p. 19), no final do século XIX e início do XX, cegos cantavam quadrinhas com o intuito de ganhar algum dinheiro. Em Recife, os espaços públicos constituíam locais privilegiados para a circulação de manifestações artísticas. Estações de trem, feiras, igrejas, praças, o porto, espaços com grande fluxo de pessoas, transformavam-se em palco para apresentações artísticas variadas, contendo cantadores, cegos, acrobatas e quaisquer outros profissionais da criatividade (SILVA, 2007, p. 130).
Em uma sociedade com estas características, Leandro Gomes de Barros tornou-se mais um a ocupar estes espaços públicos, declamando suas poesias diante da vultosa circulação como estratégia para encontrar o público. “Nas estações, nos trens, eram disputados, por vezes, os pequenos folhetos do vate popular” (JORNAL PEQUENO, 1918). O poeta vendia pessoalmente seus folhetos nesses espaços públicos de Recife, como no Mercado de São José, “(...) conhecido ponto de venda e cantoria daquela cidade” (GRILLO, 2013, p. 5), ou nas redondezas e bares próximos à estação de trem, assim como no “(...) percurso dos trens da linha-sul de Pernambuco” (TERRA, 1983, p. 30).
Parece-nos que a estratégia inicial era apresentar sua poesia impressa, chamando a atenção dos transeuntes para a possibilidade de levar as cantorias e pelejas para seu divertimento privado, a qualquer hora, desde que houvesse um leitor no recinto. Com o desenvolvimento comercial de seu empreendimento, o poeta passou então a desenvolver outros meios de distribuição.
A principal parece ter sido a venda em sua residência. O indicativo de venda em sua própria casa, na capa ou no interior do folheto, ocorre desde o princípio, aparecendo em quase 90% dos folhetos analisados, indicando que foi uma prática constante. Estipular um local físico para a venda estimulava quem já comprou, a partir de uma apresentação pública, saber onde poderia encontrar mais, caso quisesse.
A partir de 1913 uma nova forma de venda passa a ser mencionada: pelo serviço dos correios. Nas folhas finais dos folhetos, o autor passou a indicar que “em nossa biblioteca particular encontra-se sempre vinte e tantas qualidades de folhetos deste autor. Remete-se pelo correio mediante a importância qualquer quantidade, para qualquer Estado” (BARROS, 1913-1914). Em um universo de 31 folhetos, aproximadamente 55% contaram com informações semelhantes à apresentada anteriormente, diversificando os meios de distribuição de suas obras.
Possivelmente, a venda pelos correios possui ligação com revendedores autorizados pelo poeta, em diferentes cidades de Pernambuco e região. Em 1907, dois folhetos – Genios das Mulheres e o Os Dezreis do Governo – apresentam quatro revendedores oficiais, em cidades pernambucanas.10 Essa prática, no entanto, só volta a aparecer entre os anos 1913 e 1914, junto à venda pelos correios, desaparecendo novamente. O poeta passa a contar com até nove agentes revendedores, que espalhavam suas narrativas pelos estados de Pernambuco, Paraíba, Acre e Amazonas.11
Há indícios de que livrarias também eram locais de venda dos folhetos. Neste período, as livrarias vendiam produtos diversos ligados ao mundo dos livros e das letras, como indica o folheto publicado por Pedro Batista após a morte de Leandro Gomes de Barros.12 Os folhetos do poeta também estavam no meio destes produtos diversos vendidos na livraria. Ainda em vida, o poeta mencionava a Livraria Popular Editora como local para compra de suas obras (BARROS, 1917).
O conto O Relapso (Contos incontaveis, fulminantes e um pouco relapsos), publicado no Jornal do Recife (1914), e assinado por Xico Laranja, dá indícios de que a Livraria Nogueira também vendia folhetos do poeta. A narrativa apresenta o encontro do autor com o personagem Pinga Fogo – o relapso – na saída da Livraria. O contista teria ficado surpreso com aquela figura ter adentrado uma livraria. Ao final, descobre-se que o livro recomendado por outrem a Pinga Fogo era uma Gramática da Língua Portuguesa; antes, no entanto, as obras citadas como as possíveis de serem compradas pela relapsa e desleixada persona incluíam A Donzela Teodora, de Leandro Gomes de Barros e Obras completas de Leandro Gomes, o que aponta, fora os preconceitos explicitados, para a existência desses títulos no interior de uma das maiores e mais importantes livrarias da cidade de Recife no período, a Livraria Nogueira.
Diversas eram, portanto, as formas de comercializar os folhetos: presencialmente, em locais de grande fluxo; na própria residência do poeta; pelos correios; por meio de agentes revendedores; e em livrarias. Múltiplas, também, eram as formas de divulgar, fazer propaganda das obras a serem publicadas. A publicidade, para o empreendimento de Leandro Gomes de Barros, era elemento de máxima importância.
Uma das estratégias, que pode ser entendida como forma de publicidade, pode ser encontrada nos próprios folhetos, quando o poeta revelava a publicação futura ou continuação de uma determinada narrativa. É o que ocorre na capa de Todas as lutas de Antonio Silvino, onde, na parte inferior, vê-se “Depois deste sahirá História da Donzela Teodora toda completa e rimada” (BARROS, 1910-1912), assim como após o último poema, em A ressureição dos bichos, informa-se que “Brevemente sahirá – O Testamento de Cancão de Fogo” (BARROS, 1911), ou em Affonso Penna¸ com indicação de que o romance A Orphã continuará no folheto O azar e a feiticeira (BARROS, 1906). Anúncios publicitários na própria obra poderiam cativar o público para buscar comprar novamente os folhetos de Leandro Gomes de Barros.
Em outra esfera, totalmente distinta, os periódicos recifenses também divulgavam suas obras. Ao que parece, o poeta possuía relativo trânsito nas edições dos jornais13 e fazia uso deste trânsito para garantir um espaço publicitário para suas obras,14 chegando, com isto, ao público leitor dos diários da capital, o que pode ser visto a seguir:
O conhecido e apreciado repentista sertanejo Leandro Gomes ofereceu-nos um exemplar de seu novo folheto Exclamações de Antonio Silvino na Cadeia.
É avultada já a collecção de historia, em versos, contados por esse poeta popular, a quem agradecemos a gentileza do oferecimento. (JORNAL DO RECIFE, 1914).
A propaganda, distribuição e comercialização dos folhetos parecem ter sido um objetivo que o poeta percorreu incansavelmente, utilizando-se da criatividade para vencer as limitações financeiras. Conseguiu, com isso, inserir sua obra no interior das práticas de leitura da sociedade em questão. Um tanto artesanal, seu empreendimento parece ser fruto de um esforço pela literatura.
Mas quem lia/ouvia suas poesias? A materialidade dos folhetos nos possibilita uma aproximação das características gerais deste público leitor/ouvinte do poeta Leandro Gomes de Barros. Para tal, buscaremos desmistificar a concepção amplamente expressa de que os consumidores desta modalidade, desde seu início, fossem residentes rurais, analfabetos ou semialfabetizados e pobres. Interpretações que se aproximam do exposto anteriormente deslizam, de certo modo, na proximidade existente entre as cantorias orais e os folhetos impressos.15 Ainda que aproximações possam ser levantadas, as especificidades da modalidade impressa devem ser ressaltadas.
A primeira delas é o fato de que a poesia impressa derruba a característica efêmera e incerta da poesia oral, possibilitando a releitura da mesma poesia diversas vezes. A segunda, e não menos importante, possui relação com o espaço que a produz: as cantorias se desenvolveram em pequenas vilas e povoados, marcados pelo cotidiano rural (GOMES, 2012, p. 83); a literatura impressa em folhetos de baixo custo, por sua vez, está ligada à cidade e, no caso de Leandro Gomes de Barros, a Recife. Em outra esfera, a terceira relaciona-se com a alfabetização; é possível afirmar que as cantorias se encontram fincadas na oralidade, enquanto a literatura impressa é uma mediadora entre o oral e o escrito, de modo que as habilidades requeridas para cada uma das mesmas não são as mesmas. Por fim, a afirmação, que acompanha à do analfabetismo, de que se tratava de “um público pobre” (ABREU, 2017), não é realizada levando em consideração onde e quando, generalizando uma ideia para algo extremamente amplo.
Acreditamos que esta definição do público, assim como a associação entre cantorias e folhetos impressos, está ligada à leitura feita por Silvio Romero sobre a poesia popular brasileira, essencialmente em Estudos sobre a poesia popular brasileira, publicado originalmente em 1888, onde afirma que o local privilegiado para enxergar o popular são “as populações rurais e incultas” (ROMERO, 1977, p. 38). Esta leitura foi sendo, durante o século XX, ressignificada, atualizada diante das circunstâncias, mas mantida, em grande medida, sem questionamentos ou análises profundas, chegando a um número considerável das pesquisas contemporâneas.16
O contato com a literatura de Leandro Gomes de Barros, no entanto, possibilita questionar estes pressupostos. Temas ligados à vida rural aparecem em sua obra, como O boi misterioso (BARROS, 1910-1912), mas não é o mote principal de sua literatura, sendo as questões urbanas que se fortalecem. Narrativas sobre acontecimentos públicos, como a visita de um presidente à Recife, como Affonso Pena (BARROS, 1906) ou o pleito eleitoral que levou à vitória de Dantas Barreto ao governo estadual, como em A voz do povo pernambucano (BARROS, 1910-1912), por mais que chamassem a atenção dos habitantes de pequenas vilas ou zonas rurais, apresentam relação tão forte com o acontecimento que pressupõe uma leitura no calor dos fatos, como uma crônica sobre o ocorrido. Levando em consideração as condições de distribuição, que não garantiam disseminação rápida, tem-se a impressão de que alguns folhetos eram feitos para serem vendidos de forma rápida, essencialmente na capital.
O tema da carestia da vida, extremamente presente em sua bibliografia, não está relacionado diretamente às secas e más plantações, por mais que existam casos (BARROS, 1915-1916). Na maioria das vezes, a carestia aparece na discordância com o governo, tecendo fortes críticas aos impostos e sua relação com a fome, por dificultar a vida das pessoas (BARROS, 1917). Assim, a carestia como mote poético assume um caráter urbano, ligado às políticas públicas e sua interferência prática na vida.
Por sua vez, as inovações urbanas, símbolos da modernidade esperada nos grandes centros e que desafiavam uma pretensa “moral tradicional”, são pano de fundo profícuo para narrativas “moralizantes”, abordando a quebra de costumes relacionados aos papeis sociais esperados para mulheres e homens (BARROS, 1911) ou a prática de enganar os outros para benefício próprio (BARROS, 1915). Tais inovações, propostas pela modernidade urbana, desafiavam uma cultura compartilhada entre poeta e público, um código de honra, com fortes traços de uma religiosidade não oficial.
O fato de os temas urbanos prevalecerem em sua poesia parece indicar a importância do público recifense para sua obra. Recife, como dito anteriormente, apresentava números elevados de alfabetização, em comparação com as regiões interioranas, significando um potencial mais amplo de leitores e, consequentemente, de vendas, o que garantiria o sustento do poeta e de sua família. Mesmo quando olhamos para os revendedores autorizados, veremos regiões com certo grau de urbanização e alfabetização.17 Centros urbanos garantiam locais com grande circulação, como mercados, feiras e estações, palcos privilegiados para o poeta, oralmente, apresentar sua poesia e tentar chamar a atenção do público.
Corrobora a nossa hipótese de prevalência do público urbano enquanto leitores/ouvintes de Leandro Gomes de Barros, ainda, a menção de venda em livrarias – seja na Livraria Nogueira, como deixa escapar o conto o Relapso, assinado por Xico Laranja, ou na Popular Editora, de Francisco das Chagas Baptista –, ambiente tipicamente urbano e antenado à modernidade proposta no período, assim como a permanência da moradia do poeta como local de venda e a existência da publicidade em periódicos recifenses.
A preponderância do caráter urbano dos leitores/ouvintes de Leandro Gomes de Barros caminha junto à questão do nível de alfabetização dos mesmos. Recife, por exemplo, possuía, segundo os dados do recenseamento de 1920, mais habitantes que sabiam ler do que não sabiam; no que lhe diz respeito, a oralidade constituinte da poesia produzida pelo poeta não fazia com que apenas a sua literatura fosse alvo de leitura coletiva; por sua vez, o indício de venda de folhetos em livrarias aponta para a inserção da obra do poeta nos círculos letrados. Tais informações, em linhas gerais, desmistificam a noção de que os leitores/ouvintes eram analfabetos ou semialfabetizados.
Os periódicos recifenses são capazes de nos fazer enxergar um pouco mais sobre a questão. O Diário de Pernambuco, certa vez, anunciou que Leandro Gomes de Barros, o “inspirado vate popular que faz as delicias da gente rude e ingenua” (DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 1914), acabara de publicar um novo folheto. A gente rude e ingenua não era, propriamente, o público do periódico, o que deixa inquietação quanto às motivações para tal espaço de propaganda.
O obituário do Jornal Pequeno, dedicado ao poeta, ajuda-nos a responder tal questão, ao afirmar que “no meio de gente inculta, os versos de Leandro eram lidos com geral apreciação e os seus livrinhos guardados com religioso carinho” e que “nos meios mais cultos, Leandro Gomes si não conseguio prender pela arte ou pela forma das suas quadras, era, entretanto, elogiado pela facilidade e expontaneidade de rima” (JORNAL PEQUENO, 1918). As posições explicitadas pelos periódicos, portanto, apresentam a visão que os círculos letrados tinham do poeta, como uma arte menor. No entanto, deixa pistas de que, mesmo sem julgar como arte conforme os padrões hegemônicos, os círculos letrados, de alguma maneira, também desfrutavam da leitura de sua obra, pelo prazer que poderia produzir.
O poeta parece ter percebido esta situação e, de algum modo, tentando aparecer como artista que produzia não só para a “gente rude”, “ingênua” e “inculta”, buscando fazer uma poesia que, usando as palavras escritas no obituário de A Província, obedecesse à “metrica e estylo exigidos pela arte” (A PROVÍNCIA, 1918). Esta percepção decorre da presença de dois sonetos, A urucubaca (BARROS, 1915) e Chromo (BARROS, 1917), presentes no interior de sua obra.
Este desejo em demonstrar erudição não é característica única de Leandro Gomes de Barros, estando presente em cantorias orais, com pausa para declamações de outras modalidades poéticas (ABREU, 1993, p. 169-170). Ratifica, por sua vez, a necessidade de repensar a concepção de literatura popular, destinada aos folhetos e cantorias, revelando a circularidade existente entre diferentes segmentos produtores de cultura em uma sociedade (GINZBURG, 2006, p. 15).
Em outra esfera, a preocupação editorial em fazer os livretos assemelharem-se com os livros destinados a pessoas com maior grau de instrução, apontada anteriormente, parece indicar uma preocupação estética que visa atingir grupos sociais acostumados com a materialidade destes outros livros, o que só é justificável pela existência desses leitores produzindo, de modo consciente ou não, tal exigência.
Questão que nos leva ao último ponto levantado. Tanto o elogio dos mais cultos, como escrito no obituário do Jornal Pequeno, como as adequações editoriais pela exigência de um público acostumado com um tipo de materialidade livresca, quanto à hipótese de venda em livrarias parecem indicar a circulação da obra do poeta em um segmento social com maior capacidade financeira e de acesso aos bens culturais.
O baixo preço dos folhetos, que poderia indicar o consumo por pessoas de baixa renda, pode ser interpretado de outra forma. Ao vender a preços baixos, o poeta ao invés de delimitar um grupo específico, amplia a gama de possíveis consumidores. Na parte final de sua carreira, interrompida com sua morte, Leandro Gomes de Barros passou a vender folhetos longos, chamados de romances, juntando poemas anteriormente vendidos de modo fragmentado ou lançando novos em fascículo único. Em O governo e a lagarta contra o fumo é possível ver este recado:
ROMANCES COMPLETOS EM VERSOS A 1$000 RS (...). Alem destes Romances, Leandro Gomes de Barros tem mais de 500 qualidades de Folhetos de versos a 200 rs. que vende em grosso com grande abatimento, na caza de sua residência á Rua do Motocolombó n. 28 em Afogados arrabalde do Recife. (BARROS, 1917).
Enquanto folhetos eram vendidos a 200 rs., os romances eram vendidos a 1$000 rs., cinco vezes mais. Acreditamos ser provável que os romances possuíam uma saída menor, por conta do preço, sendo, possivelmente, itens específicos para colecionadores – pessoas com maior possibilidade de capital –, uma vez que se tratava de estórias consagradas e reeditadas pelo poeta.
Vinte romances equivaliam ao preço de um mês de aluguel (HATA, 1999, p. 39), de modo que inviabilizava – ou ao menos dificultava – a compra dos romances por pessoas com baixa renda, indicando a existência de possíveis compradores dos folhetos de Leandro Gomes de Barros entre sujeitos com maior capacidade financeira. Provavelmente, suas narrativas circulavam em diferentes classes sociais há muito tempo e, uma vez consolidado enquanto poeta, decidiu criar um item específico para “colecionadores”, angariando mais uma fatia de consumidores.
Sendo assim, é possível afirmar que o público leitor/ouvinte do poeta possuía, como características gerais, a predominância urbana, ainda que nostálgicos de uma cultura e moral ligada às zonas rurais, circulando entre diferentes níveis de alfabetização, assim como em classes sociais. Um público predominantemente urbano, heterogêneo em escolaridade e condição financeira. Um poeta que transitava em diferentes segmentos da sociedade, constituindo um público amplo para sua poesia.
Considerações Finais
Leandro Gomes de Barros deixou seu nome na história da literatura brasileira. Afirmação que pode ser feita ao compreender a pessoa e a obra, de maneira simultânea. Compreendê-lo como um poeta em trânsito, rompendo fronteiras e delimitações estanques, é chave de leitura enriquecedora. Percorrer caminhos diversos, saber transitar fora de seu habitat seguro, metamorfosear a si e sua produção literária, são essas algumas das principais qualidades que o fizeram estar entre os grandes poetas.
Circulava entre diferentes espaços. Um retirante na capital, vinha do interior e trazia consigo uma bagagem cultural deste lugar; mas é na realidade cosmopolita que escreve e experencia sua existência, de modo que sua vida e sua obra, deste modo, trafegam entre o interior e a capital. Em outra esfera, vivenciou cantorias e a poesia oral na infância, assim como nos locais de grande circulação de pessoas, propícios às apresentações culturais; sua obra, entretanto, sem perder vínculo com a oralidade, manifesta-se em modo escrito, inserindo-se no mundo dos livros e, como tal, circulando entre o oral e o escrito. Morador das regiões periféricas da capital, poeta sem grandes rendimentos, ousou e alcançou circulação entre letrados e de melhor condição de acesso aos bens econômicos e culturais; atravessou, desse modo, diferentes classes sociais. Trazia consigo a característica de ser a simbiose entre o antigo e o moderno, o amálgama de realidades diversas.
Um poeta em trânsito, um escritor entre dois mundos. Possivelmente, esta habilidade é que o tornou “popular”, posto que foi e ainda é muito lido, um best-seller de sua época e de seu gênero. Câmara Cascudo fala em uma publicação aproximada de 1000 folhetos e 10.000 edições, em vida. Após sua morte, evento que força o encerramento de sua produção literária, passou a ser publicado pelo genro Pedro Baptista, em Guarabira-PB e, posteriormente, os direitos autorais foram vendidos, em 1921, pela viúva, Venustiniana Eulália Aleixo, ao poeta João Martins de Athayde. Ainda hoje, mais de 100 anos após sua morte, suas histórias são reeditadas e lidas. Escritor da periferia, um retirante na capital, Leandro Gomes de Barros rompeu barreiras e ultrapassou fronteiras.
Fontes
BARROS, Leandro Gomes de. A alma de um fiscal, 1913-1914.
BARROS, Leandro Gomes de. A crise actual e o augmento do sello, 1915.
BARROS, Leandro Gomes de. A cura da quebradeira, 1915.
BARROS, Leandro Gomes de. A mulher na rifa, 1917.
BARROS, Leandro Gomes de. A ressureição dos bichos, 1911.
BARROS, Leandro Gomes de. A secca do Ceará, 1915-1916.
BARROS, Leandro Gomes de. As saias calções, 1911.
BARROS, Leandro Gomes de. Historia de João da Cruz, 1917.
BARROS, Leandro Gomes de. O fiscal e a lagarta, 1917.
BARROS, Leandro Gomes de. O governo e a lagarta contra o fumo, 1917.
BARROS, Leandro Gomes de. Todas as Lutas de Antonio Silvino, 1910-1912.
Jornal A Província, Recife, ano LXI, nº 64, 7 de março, 1918.
Jornal Diário de Pernambuco, Recife, ano 90, nº 313, 12 de dezembro, 1914.
Jornal do Recife, ano LVII, nº 138, 23 de Maio, 1914.
Jornal do Recife, ano LVII, nº 339, 10 de dezembro, 1914.
Jornal Pequeno, ano XX, nº 55, 7 de março, 1918.
Referências
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Notas