Dossiê
Recepción: 25 Junio 2021
Aprobación: 18 Agosto 2021
DOI: https://doi.org/10.33871/nupem.2022.14.31.74-90
Resumo: Pretendeu-se com este estudo refletir acerca do preconceito étnico-racial em uma escola portuguesa que se localiza na província da Zambézia. A pesquisa de carácter exploratório, descritivo e de natureza qualitativa, contando com a participação de cinco sujeitos: três professores e duas professoras. Como instrumento de recolha de dados foi usada entrevista semiestruturada para professores, aplicando a análise de conteúdo. A pesquisa está fundamentada, principalmente, nas teorias de Bento (2011), Cavalleiro (2004) e Munanga (2005), que colaboraram para a conclusão de que a criança desde muito cedo passa a conviver com o racismo, e que a escola é responsável, em parte, pela construção e disseminação das relações de preconceito étnico-racial.
Palavras-chave: Preconceito étnico-racial, Escola, Racismo, Educação.
Abstract: The aim of this study was to reflect on ethnic-racial prejudice in a Portuguese school located in the province of Zambezia. To achieve this objective, it was adopted an exploratory, descriptive and qualitative research. Five subjects participated in this study: three male teachers and two female teachers. As a data collection instrument, a semi-structured interview for teachers was used, applying content analysis. The research is grounded, mainly, on the theories of Bento (2011), Cavalleiro (2004) and Munanga (2005), who contributed to the conclusion that the child starts to face racism from a very early age, and that the school is responsible, in part, for the construction and dissemination of relations of ethnic-racial prejudice.
Keywords: Ethnic-racial prejudice, School, Racism, Education.
Resumen: El objetivo de este estudio fue reflexionar sobre los prejuicios étnico-raciales en una escuela portuguesa ubicada en la provincia de Zambezia. Para lograr este objetivo se adoptó una investigación exploratoria, descriptiva y cualitativa. Cinco sujetos participaron en esta investigación, incluidos tres profesores y dos profesoras. Como instrumento de recolección de datos se utilizó una guía de entrevistas para docentes. El análisis de las entrevistas realizadas se basó en el análisis de contenido, el cual fue sistematizado. Los resultados de la investigación se obtuvieron a través de los informes de los profesores. La investigación se basa principalmente en las teorías de Bento (2011), Cavalleiro (2004) y Munanga (2005), entre otros, quienes contribuyeron a concluir que el niño comienza a vivir con el racismo desde temprana edad, y que la escuela es responsable, en parte, por la construcción y difusión de relaciones de prejuicio étnico-racial.
Palabras clave: Prejuicio étnico-racial, Escuela, Racismo, Educación.
Introdução
Em Moçambique, apesar de existir uma grande diversidade étnica e cultural, o racismo é algo presente nos mais diversos âmbitos da sociedade. O sentimento de superioridade do branco para com a pessoa negra está enraizado e sempre estará sendo manifestado constantemente nas mais diversas situações. Até mesmo na escola, que é um local de crescimento intelectual e formação humana, se dissemina, embora que camufladamente, essa etnicidade e culturas dominantes. Essa temática precisa ser discutida constantemente no âmbito educacional isto porque se trata de uma prática que, de certa forma, é ocultada como se fosse algo presente apenas no imaginário de alguns indivíduos, vítimas, e não um facto presente no dia-a-dia da população. A escola é referência na construção da identidade de indivíduos e grupos sociais. Entretanto, ela reproduz exatamente a ideologia da classe dominante que em sua maioria é branca. Isto é visível, por exemplo, em muitos livros as imagens de pessoas brancas e não pessoas negras são utilizadas na construção de argumentos relativos aos conteúdos ensinados. Estes acabam tornando normal a prática racista e, introduzindo o racismo no processo educativo, interferindo diretamente no processo de ensino-aprendizagem, contribuindo para o aumento da evasão escolar, analfabetismo dentre outros problemas que interferem na formação dos cidadãos.
O currículo oculto trabalhado nas escolas é um dos importantes fatores de reprodução do racismo. As discriminações raciais na escola não se limitam às relações interpessoais, mas também por meio do material didático, como livros, revistas, jornais, filmes, desenhos, entre outros, o aluno é levado a entender que existe uma raça superior. A violência racial nas escolas é uma prática que atenta contra o presente, modifica o verdadeiro sentido da construção histórica do país, tirando a importância do negro na cultura, ainda restringe as possibilidades, do direito social de igualdade, presente na constituição baseado no critério de “cor de pele” por isso, da mesma forma que os educadores podem influenciar indireta ou diretamente a prática do racismo, eles podem participar de forma relevante no seu combate dentro da escola e, consequentemente na sociedade.
A história africana não é contada como ela, verdadeiramente, aconteceu. Toda a luta, conquista, riqueza cultural são negadas em nome de estereótipos criados para esse grupo social que tanto contribuiu com a formação do povo moçambicano. A escravidão é vista de forma distorcida, de forma negativa e como tatuagem, que ficou impregnada no povo africano e em seus descendentes, e assim, o aluno negro está forçado a rejeitar suas origens, a se autoincriminar e negar sua cor. A escolha do tema “preconceito étnico-racial nas escolas” surgiu durante um episódio de racismo vivenciado pelos autores, que lhes fez atentar para a relevância desta pesquisa. Pois diante de inúmeras situações preconceituosas existentes em nossa sociedade, percebe a gravidade da problemática dentro da sala de aula, no âmbito escolar.
Entende-se que a temática proposta, muito presente em nossa sociedade, surge com mais força na sala de aula, o contato com o preconceito não acontece inicialmente na sala de aula, pois a família é a primeira instituição formadora de valores da criança, sendo assim uma referência muito presente no desenvolvimento identitário da criança. Porém, a escola tem significativo papel nessa formação e o professor faz parte desse processo. Quando sua prática educativa não está pautada na reflexividade, ele não terá condições de intervir em situações racistas, nem tampouco, terá condições de modificar ou adequar o currículo que não está pautado na diversidade, proposto às escolas, para que o conhecimento chegue a todos os alunos de forma justa e democrática.
A segregação de raças é percebida e, o pior, é aceita como normal, até mesmo no material didático trabalhado nas escolas. Os livros, revistas, jornais, filmes, etc. trazem a pessoa branca como referencial central e, suas características raciais são, em sua maioria, positivas, enquanto os personagens negros vêm representando, na maioria das vezes, situações de inferioridade. O preconceito e a discriminação são tratados dentro da escola com naturalização, como se fosse uma condição própria do negro, minimizando o grande problema do preconceito e da discriminação. Facto que internaliza no aluno, branco ou negro, o sentimento de inferiorização da pessoa da raça negra, levando-o a reproduzir, tais atitudes em toda a sociedade. As humilhações sofridas pelos alunos negros, dentro das escolas, são práticas comuns. A linguagem de alunos e professores reforça o preconceito, termos como “negrinho”, “garoto de cor”, entre outros, marcam aspectos negativos do negro, fazendo com que a criança negra, negue a própria cor. Os professores fazem distinção entre alunos, até mesmo, no estímulo e afeto, causando, assim a exclusão do aluno negro do processo de educação.
O que fortalece, ainda mais a condição de desigualdade racial é a falta de referência, ou seja, a falta de profissionais negros trabalhando nas instituições escolares. Para a efetivação dessa pesquisa elaborou-se a seguinte problemática: Como a escola/professor lida com a temática sobre o preconceito étnico-racial e que ações são desenvolvidas para que essa temática seja de facto trabalhada? Para responder a esse questionamento foi definido, como objetivo geral, discutir acerca do preconceito étnico-racial em uma escola privada e como objetivos específicos, verificar como a escola trabalha a temática sobre o preconceito étnico-racial; analisar como os professores lidam com a temática do preconceito ético-racial; identificar em que momento ocorre casos de preconceito étnico-racial na escola. Este artigo teve como referencial teórico, baseado em Bento (2011), Cavalleiro (2004) e Munanga (2005) entre outros que fundamentam as questões raciais vivenciadas no contexto escolar e suas consequências para a vida dos alunos e as raízes que deram origem aos estereótipos criados para o negro.
O racismo em Moçambique: breves considerações
Moçambique é um país multicultural caracterizado pela miscigenação. Aqui estão presentes os mais variados tipos de raças e culturas, cuja sua raiz descende é negra. Ainda assim, observa-se um tipo de discurso de negação quanto a nossa origem, de resistência em entender que o racismo e as desigualdades entre negros e brancos fazem parte da nossa vivência, apenas é camuflado, mas permeiam os mais diversos espaços em nossa sociedade. A imagem do negro vivenciado hoje é associada a diversos estereótipos, que se manifestam a partir de uma ideia preconceituosa, preconcebida erroneamente em relação a um grupo de indivíduos por meio de uma ou mais pessoas (Lopes, 2007). Os estereótipos intensificam cada vez mais o racismo, a discriminação e o preconceito. Ao falar-se de racismo, imediatamente nos remetemos a pessoas negras, por terem maior centralidade quando se trata de racismo em Moçambique. As pessoas negras ainda são apontadas e discriminadas, diariamente pela sua origem, pelo simples fato de terem uma cor diferente dos outras. A sua cor implica em todos os fatores diante da sociedade racista e preconceituosa na qual vivemos, assim, entende-se o racismo como um “comportamento por meio do qual uma pessoa ou um grupo de pessoas manifesta uma ideia preconcebida - ou seja, um preconceito - contra um ou vários indivíduos pertencentes a um grupo de origem diferente e em geral considerada inferior” (Lopes, 2007, p. 12).
A ideia de que alguém possa se sentir superior a outra pessoa pelo fato de perceber que sua cor é diferente, sendo dessa perspectiva a diferença tomada como marcador de hierarquias, denunciando uma sociedade retrógrada e que não reconhece de fato sua origem, além de não perceber que o indivíduo racista gera uma idealização de si mesmo para desvalorizar a pessoa ou grupo que ele considera inferior. Essa idealização resulta de uma impressão mental fixa, numa opinião preconcebida, derivada não de uma opinião espontânea e sim de julgamentos repetidos rotineiramente. Aí, nesses julgamentos, o racista atribui, por “suposição, características pessoais e de comportamentos invariáveis a todos os membros de determinado grupo de pessoas” (Lopes, 2007, p. 13). É notável que o racismo seja a forma mais covarde de discriminação, pois o indivíduo discriminado possui características raciais impossíveis de serem mudadas (Santana, 2005).
O preconceito e a discriminação racial são elementos diretamente associados à prática do racismo, para isso, também, refletir-se-á um pouco mais sobre suas definições, pois a diferenciação desses termos “é essencial para que saiba identificar e combater as variadas formas de manifestação de etnicidade que defendem a ideia de hierarquia entre pessoas” (Santana, 2005, p. 61). É fácil nos deparamos diariamente com os mais variados tipos de preconceitos, nos mais diversos espaços e situações. Este acontece de forma tão naturalizada que mal percebe-se o efeito negativo, chegam até a serem “clássicos” de tanto serem utilizados.
Desse modo, enfatiza-se o preconceito como sendo “uma opinião preestabelecida, que é imposta pelo meio, época e educação. Ele pode ser definido, também, como uma indisposição, um julgamento prévio, negativo, que se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos” (Santana, 2005, p. 62), acabando, deste modo, “julgando o outro, reforçando uma imagem já formada em nossa mente, assim, estes preconceitos, aos poucos, vão se transformando em posições diante da vida, ao se espalharem nas relações interpessoais” (Santana, 2005, p. 63). Por outro lado, se analisar o preconceito no qual se refere ao negro, percebe-se que existem inúmeros estereótipos que sempre classificam a pessoa negra negativamente, que o inferiorizam cada vez mais e são repassados de geração para geração e que estão enraizados na cultura popular, tornando o processo de desmistificação da figura negativa do negro mais difícil.
A discriminação racial ocorre quando excluí-se, segrega-se alguém por ela ser diferente etnicamente de nós. Na Convenção da Organização das Nações Unidas (1966 apud Santana, 2005) que tratava sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial, foi estabelecido que a expressão “discriminação racial” significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência fundada na raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por fim ou efeito anular ou comprometer o reconhecimento, o gozo ou o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos domínios político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio da vida pública. A prática do racismo vem na maioria das vezes acompanhada da ausência do conhecimento sobre a origem de nossos antecedentes negros. É válido destacar-se que a chegada da pessoa negra em Mocambique influenciou fortemente a nossa cultura religiosa, nosso vocabulário, as mais diversas construções como igrejas, casarões, o artesanato, imagens de santos, adornos, ritmos musicais, culinária e tantas outras coisas que reforçam a sua importância social.
Falar da influência do povo negro é falar de sua relevância, de sua significativa parcela para a construção de um Moçambique, em termos sociais, culturais e materiais (Azevedo, 1987). Ainda assim, percebe-se o quanto a pessoa negra precisa, necessita se reafirmar diariamente, para si e para os outros, pois de tantas vezes serem objetos de ataque devido sua cor de pele, não percebem que a culpa não é sua. Ser pessoa negra não justifica maus tratos, o respeito deve prevalecer, a cor da pele não deve implicar na sua condição social e muito menos intelectual, “diferença” deveria ser um factor predominante na perspectiva de agregar, justamente por ser multicultural e não algo que fomente ainda mais as desigualdades sociais. Moçambique é um país marcado pela herança da escravidão, que vive sob o discurso da democracia racial, que sofre com comportamentos discriminatórios, desiguais, mas que permanece lutando para que as políticas públicas realmente se efectivem (Hooks, 2019).
Cultura africana no quotidiano escolar
Atualmente, falar da África é despertar raízes históricas sobre as enormes contribuições desse continente para nosso país. Uma história que na maioria das vezes é desconhecida durante quase toda nossa vida estudantil, que os livros, a escola e a sociedade acabam trazendo uma imagem distorcida de um lugar e de um povo. A visão de um continente devastado pela fome e pobreza prolonga-se até os dias atuais, a ideia do negro escravizado e sem cultura, “deixando fortes marcas nas ciências humanas e, em particular, na antropologia e na historiografia sobre a África” (Hernandez, 2005, p. 17). O olhar lançado sobre a África e a posição dos colonizadores facilitou a formulação da ideologia de superioridade àqueles que faziam parte dessas descobertas, tornando-os assim, superiores, inteligentes, “sendo-lhes, por isso, conferida a tarefa de formular uma nova visão do mundo, capaz de compreender, explicar e universalizar o processo histórico” (Hernandez, 2005, p. 17). Toda essa visão fez da África um continente inferiorizado pelos colonizadores, logo, com a imagem do negro não foi diferente, isso significa que “o saber ocidental constrói uma nova consciência planetária constituídas por visões de mundo, autoimagens e estereótipos que compõe um ‘olhar imperial’ sobre o universo” (Hernandez, 2005, p. 17).
Nos últimos anos, essa história vem sendo redescoberta e tem sido muitas vezes, objeto de estudo por diversos pesquisadores. Fazer com que seja conhecida a real história da África não é tarefa fácil diante de tudo que está enraizado, mas esse trabalho fortalece a construção identitária do negro na sociedade e consequentemente na escola. É válido concordar com as palavras de Reis (2008) quando fala que se torna impossível de quantificar ou mesmo resumir a contribuição dos africanos para nossa herança cultural. Os saberes trazidos da terra natal englobam todos os campos da vida humana: social, religioso, econômico, técnico ou mental. Ainda sobre a identidade da pessoa negra, conforme Munanga citado por Santos e Galvão (2011, p. 82), “a violência é gerada pelo enfraquecimento da identidade negra em nossa sociedade, situação que impacta diretamente na produção de sentidos sobre o ‘eu’, o ‘outro’ e os espaços que estes ocupam”. Mesmo sabendo que o estudo da diversidade cultural é um desafio, deve-se perceber que também foi e é uma grande conquista e que precisa ser trabalhada e vivenciada em todas as escolas.
A realidade é que muitos professores não trabalham a temática étnico-racial por diversos motivos, considerá-la um tabu é um desses motivos, a despreparação profissional também ocasiona à dificuldade de abordar a temática, além do fato de que em diversas ocasiões o professor é o indivíduo que discrimina ou que é discriminado (Souza; Paiva, 2013). O fato de muitas vezes, os professores, por não serem preparados profissionalmente, e até mesmo psicologicamente, faz com que este, não programe e ministre sua aula de forma adequada. Assim, a escola que deveria ser um local onde não se pratica a exclusão e que deveria formar cidadãos críticos e reflexivos, acaba se tornando um espaço excludente, onde se perpetuam as desigualdades raciais por não ter um currículo que trabalhe a temática de forma adequada. É necessário que a escola dê garantias aos alunos negros de ter as mesmas condições de acesso e permanência com sucesso, à aquisição das competências e conhecimentos necessários para continuidade nos estudos e possam se orgulhar de sua história e da sua cultura. E também possibilitar aos demais alunos conhecer a e valorizar a cultura do outro.
A escola é responsável pela socialização dos sujeitos que a ela recorrem e, nesse ambiente, cercado pela diversidade, muitas vezes tornam-se umas das primeiras e marcantes vivências das tensões raciais vivenciadas por alunos e alunas negros/negras. Nesse contexto, a escola que deveria exercer seu papel como um mecanismo de inclusão social, muitas vezes é uma das primeiras a excluir, reforçando ainda mais o preconceito e a discriminação entre os sujeitos.
Assim, Cavalleiro (2004, p. 124) ao falar do negro e da educação, observa que
A omissão dos profissionais da educação sobre esse problema, que atinge diariamente o quotidiano escolar e se mostra eficazmente prejudicial ao grupo negro, deve ser questionada. Silenciar diante do problema não apaga magicamente as diferenças. Mas permite que cada um construa, a seu modo, um entendimento do outro que lhe é diferente.
A escola precisa promover discussões sobre o racismo, o preconceito e a discriminação, lá deve ser um lugar de apropriação de conhecimentos e de promoção de respeito às diferenças. Percebe-se que mesmo diante de tantas conquistas das pessoas negras, o currículo formal apenas associa a imagem das pessoas negras como escravo, negativamente, omitindo de fato a sua real história de lutas e conquistas. A escola promove a cultura do silêncio, de calar o sofrimento e a opinião de muitos alunos. Faz-se necessário estudar a África como um continente base para o crescimento social, cultural do nosso país, porém o ensino que temos hoje pautado em um currículo formal não contribui para uma educação baseada na diversidade. Assim, as escolas que não valorizam um currículo pensado na diversidade cultural reproduzem as desigualdades, além de não favorecerem a aprendizagem dos alunos negros que ali estudam. É necessário que a escola trabalhe para que o aluno não seja excluído, que o auxilie a fortalecer a sua identidade. Nesse sentido, ignorar as relações étnicas no espaço escolar poderá “comprometer o desempenho e o desenvolvimento da personalidade de crianças e de adolescentes negros, bem como estar contribuindo para a formação de crianças e adolescentes brancos com um sentimento de superioridade” (Cavalleiro, 2007, p. 32-33).
A exclusão e até mesmo as desistências escolares desses alunos ocorrem por diversos casos de racismo, de discriminação racial, que acontecem no ambiente escolar, as brincadeiras, estereótipos advindos de outros colegas e até mesmo da própria gestão escolar acaba frustrando esse aluno, levando-o a desistir do ambiente escolar, quando deveria ser ali, naquele espaço, que ele devia aprender que sua cor, sua origem não deve implicar, nem gerar nenhum tipo de discriminação, ao contrário, que esta contribuiu e contribui significativamente para o crescimento nos mais variados aspectos do nosso país. A sociedade e as instituições de ensino não são justas com os negros, não há como o negro concorrer de forma justa, pois a exclusão é um fator que o afeta diretamente, sendo que a violência sofrida acaba influenciando no seu futuro. Não se deve esquecer que as escolas ao trabalharem a real história da África e as conquistas das pessoas negras, não deixem de voltar uma atenção significativa sobre o racismo e o preconceito. Atentar para uma educação diversificada é acreditar no cumprimento efetivo da lei, não só por obrigação, mas por se entender que a escola, por ser uma instituição plural, desempenhe de fato o seu papel formativo, além de reconhecer a legislação existente como instrumento relevante para que a sociedade perceba a importância de nossas raízes e do combate ao preconceito.
O preconceito étnico-racial na escola
A discussão em torno das desigualdades raciais nas instituições escolares ainda é muito precária e ainda um tema desafiante a ser discutido, uma vez que se vive sob a cultura de branqueamento e uma sociedade preconceituosa que ainda não vê o negro como um ser histórico, social, que contribuiu nos mais diversos aspectos no processo de construção da nossa sociedade. A escola como discutiu-se anteriormente, reproduz a cultura do racismo e do preconceito, sendo isso confirmado pela negação de utilização de um currículo que repense uma nova forma de trabalhar a cultura afro-brasileira e as relações étnico-raciais. Partindo desse pressuposto, Arroyo (2019) afirma que o espaço escolar possui diversas formas de propagar o preconceito e o racismo, uma dessas formas são os materiais didáticos, em especial os livros didáticos. Munanga (2005) aborda que esse e outros materiais audiovisuais propagam conteúdos carregados de preconceitos sobre a cultura e povos não ocidentais, fazendo com os mesmos preconceitos permeiem também o quotidiano das relações sociais de alunos entre si e de alunos com professores no espaço escolar. No entanto, alguns professores, por falta de preparo ou por preconceitos introjetados, não sabem lançar mão das situações flagrantes de discriminação no espaço escolar e na sala como momento pedagógico privilegiado para discutir a diversidade e conscientizar seus alunos sobre a importância e a riqueza que ela traz à nossa cultura e à nossa identidade nacional (Munanga 2005).
A disseminação do preconceito nos livros didáticos é clara, entretanto é uma questão tão enraizada que por vezes acaba passando despercebida em algumas situações, visibilizando assim o preconceito. A apropriação da imagem do branco é sempre destacada por personagens, situações que o engrandeça, que reforce a imagem de superioridade. Já se se observar em quais personagens ou situações estão as pessoas negras, de fato constatar-se-á a discrepância em ambas as situações. Assim, Cavalleiro (2007, p. 34) destaca que “esses livros didáticos contribuem para reforçar estereótipos sobre o grupo negro”, propagando uma imagem negativa e errónea. Ainda refletindo sobre o livro didático, Cavalleiro (2007, p. 34) expõe que “os personagens negros aparecem como escravos, humildes, empregados domésticos e pobres, entre outros”. Desse modo, os personagens negros, em comparação com os demais, são os que apresentam o maior percentual de personagens negativos. Até mesmo nos demais meios de comunicação pode-se facilmente perceber que o grupo negro ainda é associado à imagem negativa. Deste modo, é preciso que o professor seja atento para não acabar fomentando essas práticas e que observe a sala de aula para que o preconceito existente no livro não promova os estereótipos e que não seja omisso quanto a falar sobre tais problemas, pois na maioria das vezes o professor e até mesmo a gestão escolar omite casos preconceituosos e racistas ocorridos na escola, ao invés de aproveitar esses momentos excludentes para ajudar o aluno discriminado a não se sentir inferiorizado pelos demais colegas e, por via disso, possa “ajudar esse aluno para que ele assuma com orgulho e dignidade os atributos de suas diferenças, sobretudo quando esta foi negativamente introjetada em detrimento de sua própria natureza humana” (Munanga 2005, p. 15).
É inaceitável o fato de professores perceberem atos racistas e preconceituosos em sala e omitirem, de internalizar que aquela criança não se incomodou ou que ela teve alguma parcela de culpa de ter sofrido preconceito por ser negra. Às vezes, o professor não consegue sequer distinguir uma atitude racista de uma brincadeira devido a falta de preparo profissional por parte do mesmo. Desse modo, Cavalleiro (2007) desenvolve uma pesquisa em que o depoimento de uma professora concorda em ressaltar o estereótipo de que crianças negras possuem dificuldades intelectuais pelo fato de serem negras e que elas desistem da escola por não acompanharem as demais. É inconcebível que um professor ou qualquer outra pessoa pense que uma criança por ser negra possua dificuldades de aprendizagem, esta dificuldade se deve a diversos fatores como o currículo que segrega os alunos negros e os fazem desistir de competir com uma sociedade e uma escola racista. E isto não é culpa do negro, pois a sociedade, nem muito menos a escola é justa na corrida de uma vida bem-sucedida.
A culpa não é do negro quando o professor e a escola permitem que ela sofra preconceito, racismo e discriminação em meio ao espaço escolar. Isso é fruto de uma sociedade preconceituosa e da ausência de discussões em torno dessa questão no seu processo de formação profissional. A escola e os professores precisam se fazer presentes no combate às diversas manifestações de discriminação, de racismo, é seu papel formar cidadãos que consigam distinguir os diferentes tipos de preconceitos, para que assim sejam educados e formados para o respeito às diversidades presentes em nossa sociedade e não a disseminar práticas racistas.
O papel do docente diante do preconceito étnico-racial na escola
O preconceito étnico-racial está presente nos mais diversos sectores da sociedade, causando um tratamento desigual entre pessoas brancas e negras, restringindo o acesso aos direitos sociais com base no critério cor de pele. Esse problema social, ganha uma dimensão bem maior, quando vivenciado dentro da escola, lugar onde o preconceito étnico-racial como prática do cotidiano escolar desde a educação infantil acaba se tornando causa de analfabetismo, evasão escolar e, consequentemente, da desigualdade social, entre diferentes grupos sociais. Não se pode negar que o comportamento racista, muitas vezes explicitamente, ocorre na sociedade em geral, mas é na escola que ele é naturalizado e imposto aos alunos, como modelo natural de tratamento (Pinto, 1985).
Cavalleiro (2004) cita o currículo como principal reprodutor da etnicidade e, como o grupo étnico-racial em sua maioria é composta por brancos, o currículo se apresenta às escolas, “recheado” de uma ideologia racista. Os interesses sociais e políticos sempre fizeram, de forma marcante, parte da história da construção do currículo escolar, deixando em segundo plano ou fora deles fatores relevantes da cultura africana. Qualquer ação no âmbito escolar não possui um carácter neutro ou imparcial, tem sempre uma intencionalidade subjacente ao que se apresenta. Porém, espera-se que os profissionais que atuam na escola tenha uma postura crítica em relação ao currículo, que tenham uma postura reflexiva em relação à condução do trabalho pedagógico, pois embora o currículo seja pensado pela classe dominante, o professor tem a liberdade de adaptá-lo às necessidades dos alunos “a elaboração de um programa curricular que valorize as contribuições de várias culturas de forma explícita dinamiza e potencializa o conhecimento numa perspectiva multicultural e intercultural” (Silva, 2014, p. 30). Não é possível minimizar a importância do professor nas ações educativas. Logo, o professor comprometido com o trabalho pedagógico, e que tenha uma postura crítica em relação às questões étnico-raciais tem condições de analisar, criticamente, o material didático disponibilizado às escolas, no intuito de trabalhar com o que for importante para a formação social dos alunos.
Cavalleiro (2004) traz alguns aspectos referentes ao livro didático, que muitas vezes é naturalizado pelos professores e, também, pelos alunos. As imagens apresentadas nos livros que trazem representações imagéticas de pessoas negras estão, sempre, referindo situações de inferioridade e da grande quantidade de personagens brancos, quase sempre com aspectos positivos, como se a população fosse formada somente por brancos e os negros fossem a excepção. Um fato interessante para ser analisado é referente às cores utilizadas pelas crianças, desde a pré-escola, para colorir os desenhos. Qual a cor do lápis “cor de pele”? (expressão bastante utilizada pelas crianças). O lápis “cor de pele” é um lápis bege, e as crianças são levadas a acreditar que devem representar a pele do personagem, com a cor mais clara da caixa de lápis (Moreira, 2008). O mais absurdo é que os professores alimentam essa ideia desprezando os desenhos coloridos com outras cores.
A lei é uma ação afirmativa, uma política de reparação, de reconhecimento e valorização da história, cultura e identidade do povo negro, que atende ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos, bem como aos compromissos internacionais, durante a Convenção da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) de 1960, objetivando combater o racismo e a discriminação, e pela Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminação Correlatas, promovida em Durban, África do Sul, em Setembro de 2001 (Silva, 2014). A existência das leis1 é um fator primordial para a efetivação das políticas sociais na escola, porém sozinhas não possui poder para mudanças efetivas em nossa realidade escolar. É necessário que o professor e toda a comunidade tenham vontade e subsídio para trabalhar os aspectos das Leis. Faz-se necessária uma mudança nos conteúdos curriculares e a formação dos professores que permita e que viabilize o desenvolvimento de técnicas para trabalhar todas as questões referentes à temática.
Procedimentos metodológicos
Para o desenvolvimento deste estudo, adoptou-se numa abordagem qualitativa por ser adequada a pesquisa uma vez que proporciona uma aproximação importante entre pesquisador e objeto de estudo, na perspectiva de compreender a realidade pesquisada. Esta abordagem foi antecedida pela revisão de literatura, pois, de acordo Minayo (2001, apud Silveira; Córdova, 2009) toda pesquisa é desenvolvida a partir de uma revisão literária que permitiu proceder ao levantamento de conhecimentos acerca do tema aqui abordado e, consequentemente, a organização e elaboração do quadro teórico. No que diz respeito à pesquisa bibliográfica, Mota (2014, p. 27) diz que esta “é realizada a partir de um levantamento de material com dados já analisados, como livros, artigos científicos, páginas de Web sites, sobre o tema que se deseja conhecer”. O processo de coleta de dados foi feito por meio de uma entrevista semiestruturada contendo cinco questões para cinco professores da escola portuguesa que participaram de uma forma voluntária na pesquisa. A entrevista desenvolvida para os professores contém questões acerca do preconceito em sala de aula, sobre aspectos legais referentes às questões étnicos raciais, a forma de atuação dos professores, no que concerne à temática e como essas relações interferem na formação social e humana do aluno.
Para se obedecer às questões éticas de pesquisa não foram revelados os nomes dos participantes. Assim, cada participante foi-lhe atribuído a letra “P” acompanhada por um número (P1…P5).
Resultados e discussão
A discussão dos resultados foi feita baseando-se nos seguintes aspectos: a) percepção dos professores sobre raça e preconceito racial; b) percepções dos professores sobre a forma que as questões étnico-raciais são trabalhadas em sala de aula; c) nível de preparação dos professores em trabalhar com questão étnico-racial e; d) percepção dos professores sobre o papel de formação dos alunos em matéria de preconceito racial na sala de aula e na escola.
Percepção dos professores sobre raça e preconceito racial
Há opiniões diversas entre cientistas e estudiosos acerca do conceito de raça. Essas divergências partem do questionamento acerca da existência de diferenças entre os grupos a ponto de ser chamada de raças, porém é relevante destacar que, se se pensar que existem raças distintas que diferenciam os grupos humanos, estaria colaborando com a disseminação do sentimento de superioridade entre os povos ao qual chamamos de racismo ou preconceito racial (Moura, 1977).
Partindo da compreensão de que raça deve ser uma palavra que ressignifique união e igualdade e não algo que compactue com as diferenças humanas, assim, pode-se concordar com a fala de Bento (2011, p. 41) quando diz que diversas “pesquisas concluíram que não existem diferenças biológicas entre os seres humanos, ou seja, há somente uma raça: a humana”. Pensar de outra forma, em relação aos grupos sociais ou “raças” - assim como muitos definem - e o mais grave é que sendo esse sentimento passado de geração para geração e reproduzido na escola, acaba se tornando uma questão muito difícil de ser extinta da sociedade. A nomenclatura (racismo) vem da palavra raça e surge, devido ao entendimento de que existem diferentes raças, cujas características se diferem. E essas diferenças existentes entre os grupos produzem o sentimento de superioridade e consequentemente dos preconceitos e discriminações. Por isso, há necessidade de se pensar sobre o entendimento do que são raça e racismo na óptica dos professores elaboramos uma questão que patente na segunda coluna do quadro 1 indagava.

De acordo com a maioria dos professores, raça é o conceito atribuído aos grupos étnicos, que se diferenciam por características próprias, e que o racismo vem justamente desse conceito, sendo o sentimento de superioridade de uma raça para com outra. Dois professores responderam acreditar que o preconceito racial está ligado as diferenças entre os povos, porém apresentam definições muito próximas das apresentadas por Bento (2011) citado anteriormente. Pode-se entender através das respostas dos professores o conceito que esses profissionais detêm sobre o que é raça, que leva a um conceito simplista do que é preconceito racial. O que pode conferir aos alunos um entendimento desperceptível acerca desses conceitos, uma vez que os professores podem atuar de modo positivo ou negativo em relação a autor referência que a criança vai desenvolver em relação às questões étnico-raciais. No convívio com os estereótipos negativos, as crianças aprendem a internalizar sentidos positivos ou negativos sobre si mesmas, e a professora é uma das principais pessoas que vai lhes possibilitar “informações” sobre como e o que elas são, e a partir do fornecimento dos principais dados sobre seu desenvolvimento, suas capacidades e habilidades (Silva, 2002).
Percepções dos professores sobre a forma que as questões étnico-raciais são trabalhadas em sala de aula

Por meio da fala dos professores que consta no quadro 2, pode-se perceber que não existe um projeto direcionado às questões étnico-raciais, mas, mesmo não havendo um projeto voltado para temática os professores afirmam que o respeito e a igualdade são trabalhados nas práticas diárias. Para Bento (2011), a escola é um espaço importante na construção da identidade da criança e os professores que atuam diretamente, com essas crianças contribuem significativamente nesse processo.
Nível de preparação dos professores em trabalhar com questão étnico-racial

As respostas apresentadas no quadro 3 demonstram a necessidade de mudança na situação, de um maior conhecimento sobre a lei e também que as políticas voltadas para uma maior capacitação do professor sejam desenvolvidas. Os professores têm consciência de que há uma necessidade de se promover mudança no cenário educativo, no que concernem as questões étnico-raciais, porém o sistema educativo não tem promovido as oportunidades necessárias. O receio do despreparo e a limitação nas respostas dos professores dificulta o enfrentamento para a elaboração de novos meios de aprendizados, pois o professor acaba acreditando que o que tem, é por hora, suficiente. Ainda existe outro ponto, sabe-se que só é possível transmitir aquilo de que se tem amplo conhecimento. O professor vai passar para os alunos, por meio das aulas ou do comportamento, seus valores, suas crenças e tudo aquilo que conhece e acredita (Rauem; Verillo, 1991).
Além disso, para que a ação educativa seja efetiva, é necessário que o professor construa conhecimento sobre as especificidades dos objetos do ensino e sobre as condições didáticas necessárias para que as crianças possam apropriar-se desses objetos (Bento, 2011). Ainda foi notório que os professores reconhecem a importância de trabalhar com as questões étnico-raciais, em todo quotidiano escolar, não somente em momentos isolados. Entretanto, a partir dos relatos acima descritos pode-se entender que, ao mesmo tempo em que reconhece a importância de trabalhar, de fato, com o que manda as leis demonstram que não há ações programadas e direcionadas, sendo efetivado o trabalho de conscientização dos alunos, por meio de conversas. Não se pretende questionar a importância do diálogo em sala de aula, mas queremos chamar a atenção para a importância de ações refletidas e direcionadas por parte dos professores, com vista a proporcionar aos alunos elementos para o entendimento das relações étnico-raciais existentes no país.
Percepção dos professores sobre o papel de formação dos alunos em matéria de preconceito racial na sala de aula e na escola

Nas respostas elencadas no quadro 4, percebe-se que ainda há muito a se pensar no processo de construção das relações em sala de aula e nas práticas educativas. Segundo Cavalleiro (2004) as atitudes comportamentais, do professor em sala de aula, podem produzir nos alunos efeitos psicológicos gravíssimos. Quando o professor faz distinção entre alunos brancos e negros, manifestando carinho, atenção, cuidados diferenciados, mesmo que inconscientemente, pode causar sérios danos a vida dessa criança. Ela acreditará que é inferior e assim se comportará, diante da sociedade. Dependendo da forma como os professores trabalham em sala de aula com seus alunos sobre as questões étnico-raciais, pode disseminar o preconceito e a discriminação e, por via disso, prejudicar o processo de identificação da criança com suas origens. A partir das respostas dos professores, nota-se que quando se fala de atitudes preconceituosas, racismo, discriminação racial sempre são direcionadas para o respeito entre alunos, as diferenças. Assim fica visível que os professores acabam camuflando até mesmo a forma de se expressar. O racismo na escola precisa ser minimizado ou até mesmo erradicado. Para isso, os professores precisam trabalhar na perspectiva de programar propostas metodológicas capazes de propiciar aos alunos o entendimento, a compreensão e sensibilização de que independente das diferenças étnico-raciais, o “ser” faz parte de apenas uma “raça” - a humana, logo, os indivíduos devem cumprir seus deveres e merecem os mesmos direitos, dentre eles, o de ser livres, inclusive de manifestações/comportamento de racismo. Neste sentido, deve-se destacar a necessidade de se formar professores preparados/as para lidar com a diversidade cultural em sala de aula, de se rever materiais didáticos que contenham mensagens depreciativas, mas acima de tudo, viabilizar a utilização de novos currículos, novas abordagens e preparar os docentes para criticar o currículo e suas práticas.
Considerações finais
A pesquisa bibliográfica e de campo possibilitou um levantamento dos dados que compõem a argumentação na qual se insere o objeto da reflexão, qual seja: o preconceito étnico-racial em escolas. Investigar um problema dessa natureza, que afeta uma parcela tão significativa da população africana, e que é ao mesmo tempo, naturalizado, percebe-se a urgência de políticas públicas que possibilite a inclusão (no sentido amplo da palavra), de todos os grupos étnico-raciais de facto, na escola privadas e na sociedade.
A partir dos depoimentos dos professores e dos escritos de autores pesquisados constatou-se que há uma convergência no que diz respeito às práticas racistas e o despreparo do professor para trabalhar com a problemática. Como pesquisadores e educadores, atuantes nas escolas privadas, foi possível observar que a realidade é cruel, pois o sistema educacional falha no cumprimento das leis que asseguram o estudo da cultura africana nas escolas, não prepara os profissionais e não cobra a atuação docente, no sentido de uma educação igualitária.
Através desse estudo pode perceber-se que os inúmeros fatores subjacentes às práticas racistas como o despreparo do professor para efetivar as políticas educativas; o currículo que é trabalhado nas escolas privadas que naturaliza o sentimento de superioridade brancos das pessoas negras em relação ao desconhecimento e consequentemente o descumprimento das leis que asseguram a obrigatoriedade do ensino da cultura e história do africano, fazem com que a escola privada e os professores não trabalhem essas questões de forma crítica, a promover o respeito às diferenças entre os povos.
A formação do povo africano está pautada na diversidade étnica e cultural. As diferenças físicas aliadas a desinformação levam ao preconceito. Constatou-se ainda que a raiz do preconceito racial vem das interpretações erróneas acerca do processo histórico da pessoa negra. Mesmo diante de uma mudança significativa na legislação. Nesse contexto, a escola deve ser um espaço onde a intolerância a atos discriminatórios deva ser percebido, identificado e falado e não entendida como algo sem sentido e prejudicial ao funcionamento da sociedade. O racismo deve ser um assunto, uma temática aberta, que seja estudada diariamente e não tratado como um tabu, pois é falando que se pode mudar, a nós mesmos, a escola e a sociedade.
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Notas