Dossiê
Fissuras da modernidade: a cidade como referência do pecado
Fissures of modernity: the city as a reference to sin
Fisuras de la modernidad: la ciudad como referente del pecado
Fissuras da modernidade: a cidade como referência do pecado
Revista NUPEM (Online), vol. 15, núm. 35, pp. 155-178, 2023
Universidade Estadual do Paraná
Recepción: 14 Febrero 2023
Aprobación: 24 Abril 2023
Resumo: Este artigo faz um diagnóstico da emolduração da cidade do Rio de Janeiro na escrita de Nelson Rodrigues como referência do pecado, revelando toda a fissura da modernidade no Brasil republicano. Nesse contexto, os valores da família carioca estão em processo de reformulação frente às mudanças dos anos dourados em contraposição à belle époque. Desse processo, emergem conflitos e problematizações nos espaços urbanos, os quais Nelson Rodrigues absorveu ou seja, o que se esperava dos habitantes da urbe pulsante e o que realmente se praticava nos ambientes de sociabilidades. Ainda é perceptível, nesse universo, um clima de intensa reconfiguração da cultura urbana moderna, o que ocasiona embates na esfera privada e atinge a esfera pública. Por fim, resta evidente que as fissuras do projeto de modernidade são sintomas de inconformismo do escritor no presente e de sua leitura íntima da cidade enquanto expiação do pecado.
Palavras chaves: Modernidade, Cidade, Anos dourados, Belle Époque, Pecado.
Abstract: This article makes a diagnosis of the framing of Rio de Janeiro’s city in Nelson Rodrigues’ writing as a reference to sin, revealing all the modernity fissures in republican Brazil. In this context, the values of the Carioca family are in the process of being reformulated in the face of changes in the golden years as opposed to the belle époque. From this process, conflicts and problematizations emerge in the spaces of the city and Nelson Rodrigues absorbed, that is, what was expected of the inhabitants of the pulsating city and what was actually practiced in sociability environments. It is still perceptible, in this universe, a climate of intense reconfiguration of modern urban culture, which causes clashes in the private sphere and extrapolates to the public sphere. Finally, it remains evident that the cracks in the modernity project are a symptom of the writer’s nonconformity in the present and his intimate reading of the city as an atonement for human sin.
Keywords: Modernity, City, Golden years, Belle Époque, Sin.
Resumen: Este artículo hace un diagnóstico del encuadre de la ciudad de Río de Janeiro en la escritura de Nelson Rodrigues como referencia al pecado, revelando todas las fisuras de la modernidad en el Brasil republicano. En este contexto, los valores de la familia carioca están en proceso de reformulación ante los cambios de los años dorados frente a la belle époque. De ese proceso surgen conflictos y problematizaciones en los espacios de la ciudad y Nelson Rodrigues absorbió ese desajuste de valores, es decir, lo que se esperaba de los habitantes de la ciudad palpitante y lo que se practicaba en realidad en los ambientes de sociabilidad. Todavía es perceptible, en este universo, un clima de intensa reconfiguración de la cultura urbana moderna, que provoca choques en el ámbito privado y se extrapola al ámbito público. Finalmente, queda en evidencia que las grietas en el proyecto de la modernidad son síntoma del inconfor-mismo del escritor en el presente y de su lectura íntima de la ciudad como expiación del pecado humano.
Palabras clave: Modernidad, Ciudad, Años dorados, Belle Époque, Pecado.
Introdução
A cidade do Rio de Janeiro aparece nos contos-crônicas de Nelson Rodrigues como um lugar social em que os tipos sociais estão inseridos numa relação direta com a sua cultura. Estes sujeitos anônimos do social estabelecem com os leitores da cidade um reconhecimento dos espaços de onde o autor cria suas histórias. Desse modo, o escritor oferece uma relação dinâmica com seus leitores, a fim de informá-los de suas mazelas, inconformidades e resistências frente ao vivido.
A referência à cidade, enquanto objeto literário de cronistas, mestres da ficção, escritores de literatura, aparece com frequência nas produções intelectuais nas diversas formas de pensar a realidade social a partir do ponto de vista do indiferente, do transeunte e do marginal. Esse plano de reflexão permite obter com exatidão permanências e rupturas nos costumes da cultura. Essa presença se deu:
Desde pelo menos a metade do século XIX, momento de expansão do capitalismo, a cidade contemporânea surge como um dos temas centrais do pensamento ocidental. Literatos, artistas, filósofos e cientistas sociais tomaram a cidade não somente como meio ambiente, como entorno, mas também como algo que internaliza nos indivíduos, constituindo estilos de vida específicos do mundo urbano moderno (Facina, 2004, p. 150).
A partir do pensamento de Facina (2004), observa-se que estes espaços utilizados pelo jornalista-escritor são: a esquina Viveiros de Castro, a Quinta da Boa Vista, o Pão de Açúcar, o Maracanã, a Tijuca e, principalmente, o bairro de Copacabana, o qual é o lugar mais citado em seus contos-crônicas. Mas há também os ônibus, as sessões de cinema, as repartições públicas que são tidas como lugares de passagem e, principalmente, espaços onde ocorrem as aventuras amorosas e as traições.
Nesse sentido, a cidade revela-se como endereço do pecado, do vício, da danação, do imoral e das transgressões, onde os desejos eram satisfeitos ou mesmo frustrados, as paixões resolvidas ou perdidas e os amores encontrados ou roubados. Tal representação da cidade, na memória social de Nelson Rodrigues, é carregada de conflitos sociais delicados, envolvendo casais, namorados e amantes. Em suma, não se pode separar Nelson Rodrigues do universo da rua de onde ele parte e baseia suas reflexões.
Ademais, a constituição histórica da região do subúrbio deve ser levada em consideração, pois faz parte da própria história da cidade do Rio de Janeiro. As reformas urbanas, no início do século XX, intensificaram o surgimento de subúrbios como espaços que foram sendo forjados ao mesmo tempo em que a cidade se preocupou em se urbanizar. É nesse espaço que Nelson Rodrigues é apresentado à sociedade carioca e cria sua identidade como escritor:
O projeto republicano de transformar a capital numa cidade moderna estava associado ao ordenamento do espaço urbano, de modo que a população pobre fosse deslocada dos locais mais urbanizados e civilizados, verdadeiras vitrines do progresso, para regiões mais distantes e também mais precárias em termos de serviços urbanos. Essa população vai sendo cada vez mais impelida a construir as suas habitações nos morros ou nas áreas mais periféricas da cidade, os subúrbios (Facina, 2004, p. 59).
Tendo por base a observação de Facina (2004), é válido ressaltar que os subúrbios eram locais de sociabilidades diferentes do resto da cidade. Nos subúrbios o controle era mais forte, os vizinhos sabiam de tudo o que ocorria nas ruas. Entretanto, as condições familiares dessa região não eram as mais satisfatórias, por isso viviam em situações de dificuldades econômicas e os habitantes desse local cometiam muitas práticas de adultério. Esse era o “mundo” onde Nelson Rodrigues se tornaria escritor, com a oportunidade de compor inúmeras redações, sempre fazendo de sua trajetória um sucesso. O maior deles, pela ampla repercussão social, foi sem dúvidas:
“A vida como ela é...” estreou em 1951 e em pouco tempo era um grande sucesso popular. Como o melhor jornalismo, falar direto ao público; como a literatura mais sofisticada, fazia tremer suas convicções. Sob as manchetes, o leitor encontrava, pela primeira vez em letra de forma, ciúme, e obsessão, dilemas morais, inveja, desejos desgovernados, adultério e sexo. Diagramados, estava ali o céu e o inferno das tradicionais famílias dos subúrbios cariocas afrontadas pela emergente classe média de Copacabana (Rodrigues, 2012, p. 9).
Muito do que Nelson Rodrigues sabia acerca da cultura do Rio de Janeiro absorveu na infância e juventude, quando sua família saiu do Recife. O subúrbio se tornou a sua morada inicial e o fez perceber o “jeitinho” carioca de ser. Foi aos poucos se aperfeiçoando em entender o mundo à sua volta, diante das suas adversidades e transformações. Sabe-se que muito da vida pessoal de Nelson Rodrigues é revelada na sua relação com sua família, numa vida de altos e baixos, o que lhe deu noção do valor da vida e da morte. Daí em diante, sua trajetória confundiu-se com a cidade em reconstrução e ele quis entender a sociedade do ponto de vista mais delicado em sua moralidade e sexualidade, fatores que influenciam diretamente a vida das pessoas.
Para a realização deste estudo, foi empregada uma metodologia para visualizar as fontes documentais, método que pode ser pensado a partir do paradigma indiciário de Carlo Ginzburg, no sentido de perceber os detalhes reveladores dos aspectos culturais que são notados na escrita de Nelson Rodrigues. Esse meio permite perceber “o valor epistemológico do ‘detalhe revelador’, visto que as pequenas coisas, as singularidades e mesmo as discrepâncias e anomalias podem ter força heurística e cognitiva” (Vieira, 2014, p. 13).
“A mulher do próximo”
No conto “A mulher do próximo”, o personagem Gouveia era acostumado a jogar sinuca, mas há tempos que não aparecia, principalmente quando era sexta-feira, dia da semana em que Gouveia desaparecia e ninguém sabia do paradeiro dele. O que todos sabiam é que ia se encontrar com a mulher do despachante. Arlindo, que estava no bar numa sexta-feira e que também era despachante consentia com os amigos que eram frequentes suas saídas. Para ele:
Esse único e escasso encontro semanal era sagrado para o Gouveia. Largava negócios, largava compromissos, largava outras mulheres, para se meter num apartamento, em Copacabana, que um amigo lhe emprestava, ou, antes, que um amigo alugava, numa base de duzentos cruzeiros por vez. Mas como era um big apartamento, com geladeira, vitrola, banho frio e quente, vista para o mar, o Gouveia reconhecia:
- Vale as duzentas pratas e até mais [...] o romance do Gouveia com a mulher do despachante começava, às sextas-feiras, às quatro horas da tarde. Mas a partir das sete da manhã o Gouveia já não atendia nem telefone, a pretexto de que o amor exige uma concentração prévia e total (Rodrigues, 1992, p. 35).
Gouveia, no mesmo dia, aparece na sinuca, às onze horas da noite, e lá estava Arlindo a sua espera. Os dois começam a conversar e Gouveia se sente pressionado a contar que mulher seria essa com que tinha um caso escondido e encontrava todas as sextas-feiras. Depois de muito insistir, Arlindo revela o jogo e diz que a mulher com que se encontrava era sua mulher. Em um tom de raiva, falou a Gouveia: “Ontem, dormindo, ela falou num nome. Era o teu. Fui beijado como se fosse você. Então, descobri que a tal mulher do despachante era a minha. E que o despachante sou eu” (Rodrigues, 1992, p. 37).
Arlindo, irritado, avisou que, dali em diante, todas as vezes que encontrasse com Gouveia dar-lhe-ia umas boas cusparadas na cara, para sempre se lembrar de sua vingança. Gouveia, muito indignado, não aguentou a situação. Mesmo em um velório de um amigo, Arlindo não se intimidou em reagir. Para Gouveia, “era demais. Alucinado, Gouveia correu de lá. Mais tarde, em casa, meteu uma bala nos miolos” (Rodrigues, 1992, p. 38).
Esses tipos de encontros amorosos se davam, na maioria dos casos, de forma vespertina, como este, às quatro horas da tarde, para que ninguém ficasse sabendo ou desconfiasse do que poderia estar ocorrendo e, normalmente, em apartamentos emprestados pelos amigos. Isso denota a vigilância social advinda da preocupação com seus padrões de moralidade. Relações amorosas fora do casamento eram abomináveis e incompreensíveis pela sociedade carioca, mas aconteciam, sem deixar pistas ou evidências de tais práticas.
Nelson Rodrigues contribuiu para a construção de um imaginário sobre a cidade do Rio de Janeiro, contrapondo o imaginário oficial da época. A cidade é “despida” e os sujeitos são possuídos por um forte desejo de perversidade. Essa cidade que não guarda mais a sua inocência disfarçada, perdida, luta diariamente para reconfigurar-se no tempo. O autor vê com desconfiança a modernização dos espaços públicos, os costumes morais em atrito com a rua. Nesse interim, toda a sua narrativa jornalística tem um movimento que é antagônico à própria vida presente.
O rompimento das visões sobre a cidade, movimento inerente a Nelson Rodrigues, é oriundo de sua memória social sobre o subúrbio. No pensamento de Nelson Rodrigues, existiam várias cidades dentro de uma só, com formas diferentes de se lidar com a moralidade. A zona sul e o centro são marcados pelas tendências modernas e liberalizantes, enquanto a zona norte, da infância, imóvel, estática, não acompanhou esse processo. Esse espaço, apresentado na memória individual de Nelson Rodrigues, serve de parâmetro e medida para pensar o processo de urbanização do resto da cidade. Nesse contexto, o subúrbio fica cristalizado nas reminiscências da vida e se intensifica em suas memórias na medida em que os tipos sociais se entrecruzam com os moradores do resto da cidade. O resultado é a incompatibilidade de sentimentos e sensibilidades sobre o vivido, de estilos de vida e olhares sobre o presente, que se manifestam em desordem, mudança e quebra de sentido.
“Cheque de amor”
No conto-crônica “Cheque de amor”, Vadeco era um tipo que não tinha responsabilidades. Depois da falta de paciência do pai, o qual arrumou um emprego para ele em sua empresa, passaram a trabalhar juntos. É nesse ambiente que aparece seu amigo de farras na noite, Aristides. Além das aventuras externas, vivia de casos com as funcionárias no trabalho. Num dia deparou-se com uma funcionária nova, Arlete, mas era noiva e muito séria. Vadeco disse sentir atração por mulheres sérias e, por ser rico, acreditava tornar-se irresistível para as mulheres. Mas a moça resistia e, por isso, chegou a nomeá-la como sua secretária, para se aproximar mais dela.
Para Vadeco, o dinheiro comprava tudo, até o amor de uma mulher séria. Tentou de todas as formas suborná-la para que passasse um dia em seu apartamento. Arrumou um cheque e entregou a Arlete, porém ela se desculpava dizendo ser noiva e que se casaria no mês que vem. Mas a insistência do encontro foi maior e ele marcou um encontro para o outro dia, às dez horas, em um apartamento. Depois de tudo marcado, Vadeco ficou numa ansiedade sem tamanho:
Mas no dia seguinte, pela manhã, Arlete, que não dormira, levantou-se transfigurada. Jamais uma mulher se vestiu com tanta minúcia e deleite. Escolheu sua calcinha mais linda e transparente. Ela própria, diante do espelho, sentiu-se bonita demais, bonita de uma maneira quase imoral. Aristides marcara uma hora matinal, de propósito, para evitar suspeitas. E foi assim, bem cedinho, que ela tocou a campainha do apartamento, em Copacabana. Antes que Vadeco, maravilhado, a tocasse, Arlete fez a exigência mercenária:
- O cheque!
O rapaz apanhou o talão na carteira e entregou. Arlete leu ainda uma vez, verificou a importância, assinatura, data, etc. E, súbito, numa raiva minuciosa, rasgou o cheque em mil pedacinhos. Vadeco ainda balbuciou: “Que é isso? Não faça isso!”. Ela o emudeceu, atirando os fragmentos no seu rosto, como confete. Petrificado, ele a teria deixado ir, sem um gesto, sem uma palavra. Ela, porém, na sua raiva de mulher, esbofeteava-o, ainda. Depois, apanhou, entre as suas mãos, o rosto do rapaz, e o beijou na boca, com fúria (Rodrigues, 1992, p. 132).
É válido ressaltar que as mulheres representadas por Nelson Rodrigues têm as mais diversas facetas, desde mulheres sérias, consideradas fiéis, mas que se sentem desprestigiadas pelos maridos, até aquelas levianas, que se envolvem em casos amorosos na cidade. Essas mulheres encontram na cidade o que não estava disponível a elas no âmbito da casa. A ilusão de um casamento feliz, somado à fragilidade da autoridade do marido em dotá-las de uma felicidade conjugal “perfeita”, acaba por fazê-las optarem por suas escolhas fora do mundo da casa.
Percebe-se, assim, que a moralidade carioca que resguardava uma vida de resignação à mulher e uma ampla liberdade sexual ao homem está nos contos-crônicas de Nelson Rodrigues em via de mudança. O imaginário social da época realizava um amplo controle sexual das mulheres, tanto na esfera doméstica, quanto pública. Contrariamente a essa realidade, as representações femininas de Nelson Rodrigues expõem a fragilidade da moralidade burguesa.
Por causa da vigilância constante da cidade, qualquer deslize que quebrasse as normas era prejudicial, principalmente, às mulheres, tornando o casamento o destino de todas elas, com o vestido de noiva, a promessa de felicidade obtida com um bom parceiro e o consentimento dos pais. Além disso, na cidade, não havia motéis e os relacionamentos proibidos eram vivenciados em apartamentos em horários pela volta do dia. A vida íntima das mulheres dentro de casa era rigidamente controlada pelos pais ou maridos, mas fora as coisas eram bastante diferentes. Havia flertes, encontros, piscadelas, assovios, olhares entrecruzados. Mas nada de ir além disso, esse mundo da rua era reservado apenas para os homens.
Na maioria das vezes, o que se percebe é que os desejos, as paixões, os amores tornam-se inconfessos, repentinos, voláteis e insaciáveis. A mulher representada em sua escrita e aquela exposta ao mundo para além do lar e revelando o que realmente ocorria, as infelicidades rotineiras e comuns, mostrando como as mulheres rompiam a moralidade e chegavam ao espaço público para se satisfazerem com outros homens. Assim, estão disponíveis as representações femininas de Nelson Rodrigues as quais se revelam revolucionárias para a sua época.
“Apaixonada”
O conto-crônica “Apaixonada”, apresenta o noivado de Jamil e Ivone. Ele, na noite em que decidiram se casar, insiste em saber de Ivone se realmente gostava dele de verdade. E ela afirma gostar muito dele. O irmão de Jamil estava no momento em que foi oficializado o noivado e, de repente, decide beijar a noiva de seu irmão na testa. Jamil não notou problema algum, afinal era seu irmão. Estava se sentindo o homem mais feliz do mundo.
No dia seguinte, ao pedido de noivado, Jamil estava em seu trabalho quando Ivone liga de forma desesperada chamando-o para ir ao seu encontro, disse que não ia dizer nada pelo telefone. Jamil vai ao encontro de sua noiva. No caminho, pensava mil coisas acerca de uma conversa tão repentina e nada habitual. Chegando ao local, percebe Ivone aos prantos dizendo:
- Meu anjo, nosso casamento é impossível, ouviu?
- Impossível como? Que piada é essa? E por que impossível?
Ivone assoa-se num lencinho: eu gosto de ti, mas também gosto de outro, oh, meu Deus! Nunca pensei que se pudesse gostar de duas pessoas ao mesmo tempo. Mas pode-se, agora eu sei que pode! (Rodrigues, 1992, p. 72).
Jamil, por um instante, não havia entendido nada, ficou andando de um lado para o outro, buscando entender o que a noiva acabará de dizer de forma escancarada. Ele pensou que seria impossível uma pessoa gostar de duas ao mesmo tempo. Ela não quis entender e concordar, apenas afirmou que “pode ser, sim. Hoje eu já acho que qualquer mulher pode gostar de dois, três, quatro, cinco, ao mesmo tempo. Ou de duzentos, sei lá!” (Rodrigues, 1992, p. 72).
Para ele nada era entendível naquele momento, pois tinha um terrível medo de perdê-la e logo quis saber quem era esse outro do qual ela estava gostando. Ivone não quis revelar, preferiu esconder e não responder. Ficaram horas discutindo, Jamil queria a todo custo saber o nome, ela decidiu entregar os pontos e falou que era o seu cunhado, Everaldo. Jamil não se conforma em saber de algo tão drástico e terrível. De tantos homens possíveis, foi escolher justo o irmão de seu noivo? Ela disse não ter traído, apenas foi um beijo e pronto. Jamil continuou a não querer entender a história contada e reiterou que não viveria sem ela. Ela chorava, debatia-se e, por fim, atirara-se numa cadeira. Para ele, isso era doença, tara. Ainda bem que a família da noiva não estava em casa, e ninguém ouviu o que os dois tinham conversado.
Durante dois dias seguidos, Jamil tinha desaparecido de tudo, casa, emprego e principalmente do irmão. Ivone, para ele, não passava de uma cínica:
No terceiro dia, com barba por fazer, um ríctus de crueldade, aparece diante da noiva. Ela, que o abraçara, sente o volume do revólver. Jamil respira fundo:
- Eu tenho três caminhos a escolher: ou mato o meu irmão; ou mato você; ou me mato.
Estavam num banco de jardim público. Atônita, Ivone ergueu-se. Quase sem voz, diz para si mesma: “Matar?... Morrer?...”. Senta-se, de novo, ao lado do noivo. Crispa a mão no seu braço e vai dizendo fora de si:
- E se morrêssemos, todos? Eu, tu e ele? - Pausa e continua, num delírio de palavras:
- Já que este amor é impossível, que nos importa a vida?
Jamil deixa-se contagiar. Vira-se, numa fascinação: “Queres morrer comigo? Queres?”. Estão falando quase boca a boca. Ela responde:
- Contigo e com teu irmão. Os três! Eu sei, ouviu? Sei que ele vai querer, há de querer!... E morreremos amigos os três, juntos... (Rodrigues, 1992, p. 73-74).
Pois bem, a ideia foi levada adiante por ambos, menos Everaldo que não sabia de nada. Jamil tinha arrumado um apartamento em Copacabana que era de um amigo seu. Tinha escolhido um veneno. Restaria à Ivone convidar o Everaldo para que ocorresse tal desfecho. No dia em que reservaram, estavam lá os três. Para ela, tudo poderia se resolver ali, com o suicídio voluntário dos três:
O próprio Jamil apanhou os três copos e foi enchê-los, lá dentro. Voltou pouco depois. Deu a cada um o copo que lhe cabia e ficou com o seu. Baixou a voz: “Vamos beber ao mesmo tempo”. Antes, Ivone beijou um e outro, chamando a ambos de “meu amor”. Em seguida beberam tudo. Mas aconteceu o seguinte: o único que caiu, com as entranhas em fogo, foi Everaldo. Ivone estava em pé, com o copo vazio na mão, assombrada: “Não estou sentindo nada!”. Então, enquanto Everaldo agonizava no tapete, Jamil agarra a noiva:
- O único que bebeu o veneno foi ele... Nós tomamos sal de frutas. Ivone recua. Quer gritar, mas Jamil, mais rápido, fecha-lhe a boca com um beijo sem fim. Quando a larga, a noiva pede:
- Beija outra vez, beija!... (Rodrigues, 1992, p. 74).
Mais uma vez, o final trágico toma conta das histórias de Nelson Rodrigues e, nesse caso, associa-se aos pactos de morte que tanto gostava de ler na infância. Nesse tempo, passou a ler de forma a admirar os pactos de morte entre jovens namorados, o que acabou influenciando sua narrativa futura “A vida como ela é...”. Interessante notar a característica da personagem Ivone que, ao contrair um noivado, acaba revelando seu amor proibido com o irmão de seu noivo. Jamil entra em desespero e Ivone também, pois seus pais não iriam gostar desse fato. Além do mais, quando Ivone pede para que todos morram juntos, é necessariamente pela idade de temer o julgamento social, caso ficasse com Everaldo. O noivado era esperado por muitas moças da época, a escolha do pretendente era um momento muito marcante em suas vidas.
Ivone tem medo de ser condenada pela sociedade e por seus pais, caso tivesse que dissolver o seu noivado. Assim, de forma drástica, a única ideia que lhe vem à cabeça é morrer, suicidar-se, evitando a opinião alheia e o medo da pecha de mulher leviana.
Mais uma vez, Copacabana aparece como lugar das perdições sociais em sua Coluna. Jamil tinha arrumado o apartamento de seu amigo, já que eram poucos que tinham condição social de ter um apartamento em Copacabana, bairro da zona sul de grande status social, como evidencia a importante investigação de Julia O‘Donnell em “A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940)”. A motivação da construção dessa análise baseou-se em uma discussão de duas mulheres por causa de uma vaga de automóvel nas ruas de Copacabana, nos seguintes dizeres: “Não tem cacife para morar na Zona Sul? Volta para o subúrbio então, que lá e o seu lugar!”. Ali, nessa expressão, está todo o simbolismo de uma cidade de contrastes onde, na visão de uma das mulheres, morar em Copacabana era sinônimo de riqueza e ostentação devido à construção histórica e simbólica da região no início do século XX como espaço de diferenciação social do resto da cidade.
Antes, na fase de sua construção, enquanto lugar social, o referido espaço era inspirado nos projetos públicos de embelezamento da urbanidade internacional ditados pela aristocracia da cidade. Com o processo de crescimento de Copacabana, houve uma integração daquele lugar ao lazer noturno, aumentando significativamente o adensamento populacional naquela região. O crescimento da população do Rio de Janeiro ocasionou, consequentemente, a alteração do caráter de sua fisionomia inicial. Aos poucos, Copacabana foi perdendo aquele seu clima restrito e de prestígio social para abrigar novas visões, mais heterogêneas, de modos de vida ali implantados com o processo de urbanização da cidade.
Copacabana, nas suas virtudes e nos seus vícios, nas suas obviedades e nas suas contradições, ora era é vista como metonímia do Rio de Janeiro, ora como um lugar sui generis dentro da cidade. Aparece ainda, não raro, como símbolo de uma melancólica decadência, enquanto, por vezes, persiste como objeto de desejo em determinados projetos de ascensão social. Nos seus múltiplos significados e nas suas não menos múltiplas territorialidades, Copacabana tem no imaginário urbano carioca pertencimentos variados em relação à cidade como um todo quanto, sobretudo, eu diria, com relação à chamada “Zona Sul” (O‘donnell, 2013, p. 14).
Nos contos-crônicas de Nelson Rodrigues, Copacabana aparece como lugar onde as transgressões são possíveis e realizáveis. Por sua vez, esse espaço é pensado também como oposição ao subúrbio, ao conservadorismo e tradicionalismo da zona norte, com seus vizinhos e os seus discursos moralizantes. Nesse sentido, pode-se afirmar que a zona sul é o lugar em que os personagens de Nelson Rodrigues podem transitar sem serem notados pela moralidade do subúrbio. Ao mesmo tempo, Copacabana é vista com desconfiança por Nelson Rodrigues, tendo em vista que ali acontece o choque de culturas de uma cidade heterogênea em suas territorialidades e os valores morais são relativizados e colocados em questionamento pelo olhar da urbanidade.
Da mesma forma Copacabana aparece como metonímia do Rio de Janeiro e como sinônimo da cultura urbana em transformação. Nesse interim, Nelson Rodrigues também pode ser pensado como cronista da cidade, de suas contradições morais, históricas e atuais, sobretudo quando enuncia suas representações sociais dos tipos urbanos em trânsito pela cidade, fato causador do choque cultural entre os tipos da família suburbana e a permissiva zona sul:
As relações familiares e de vizinhança, valores e costumes antigos, mostravam-se dilacerados em face do individualismo que pautam os novos comportamentos [...] as personagens circulam, e em geral, a Zona Sul aparece como área de pecado, onde as mulheres casadas vão encontrar com seus amantes em apartamentos arranjados (Facina, 2004, p. 174).
A visão desagregadora das relações humanas e familiares possibilita uma leitura social da cidade em ebulição de valores e sentimentos em relação ao amor. A habilidade do jornalista-escritor em perceber essa dinâmica social associa sua imagem aos dramas amorosos dos Anos Dourados. Essa representação da cidade cristalizada em sua memória e, portanto, construída pelo próprio autor, faz dele um crítico social da modernidade:
Uma delas diz respeito ao passado, ao período que vai da belle époque ao entreguerras e que se confunde parcialmente com a infância do autor na Aldeia Campista, Zona Norte do Rio de Janeiro. Essa representação da cidade como ela era remete, algumas vezes, ás lembranças de sua infância e, outras, a um período que Nelson só conheceu nos livros e da pesquisa em periódicos. Nessa representação há, de modo geral, a nostalgia de um tempo em que as relações sociais eram ordenadas, as hierarquias em bem mais definidas, os moços respeitavam os mais velhos e as mulheres se vestiam com mais roupas (Facina, 2004, p. 154).
Está aí a luta de representações sociais tão característica em sua obra, com modelos de cidade e padrões de sociabilidades distintos. O Rio, antigo memorial da belle époque, aparece constantemente em contraste com uma cidade moderna e pujante dos anos dourados. A cidade (i)moral torna-se, no presente de escrita da Coluna, laboratório existencial do mundo. O jogo de valores sociais, sexuais, reveste os diálogos das personagens da Coluna “A vida como ela é...” que trazem à tona a incapacidade do projeto civilizador proposto pela cidade que não abarcou todos os seus estratos sociais.
A classe média suburbana que Nelson Rodrigues tanto pensou em seus contos-crônicas representa essa própria inviabilidade de integração aos padrões burgueses da elite. Esse paradoxo é plenamente experimentado pelas mulheres na cidade. Estas se sentem “sufocadas” pelos padrões e, já que o mundo do subúrbio é a prisão, a zona sul é a liberdade. Contudo comprar essa liberdade é sempre perigoso e difícil de alcançar. É essa dificuldade de inserção das mulheres nos espaços considerados públicos que Nelson Rodrigues mostra. No contexto pós-guerra:
Houve uma intensa industrialização e um grande crescimento dos centros urbanos, como o Rio de Janeiro e São Paulo, de cujos cenários começaram a fazer parte carros, rádio, televisão, grande circulação de jornais, outdoor, cinemas, bares e cafés. A ascensão da classe média nesse período trouxe para o mundo do trabalho as atividades urbanas dos profissionais liberais, empresas e repartições públicas. A vida nas grandes cidades começou a mudar comportamentos e valores, modificando as formas de sociabilidades na medida em que a cidade proporcionava mais locais de lazer, propiciando os encontros e dificultando a vigilância (Zechlinski, 2007, p. 405).
É essa realidade que Nelson Rodrigues pensa para sua escrita ficcional, um universo cercado de mudanças estruturais que desembocam na efervescência de cidades, como a do Rio de Janeiro. Mas, por outro lado, tais alterações rivalizam com a tradição, com os valores de família, como virgindade, fidelidade, amor romântico e casamento ideal. A cidade muda sua forma de lidar com o espaço público, mas ainda mantém relações de dominação na esfera do lar. O trabalho, a ordem, a moralidade e a honra tinham que ser mantidas pelo masculino. Isso dependia do exímio comportamento das mulheres e, caso elas quebrassem esse acordo, o homem era o grande culpado, a ele cabia assegurar a plena garantia de sua autoridade no âmbito familiar.
“Sem caráter”
Outros espaços também são notados como locais de absorção da liberdade feminina na cidade, como no caso do cinema. No conto-crônica “Sem caráter”, Geraldo, depois de ter realizado com Jandira vários encontros, percebe um anel em sua mão. Ele, até então, não sabia que ela era noiva e iria se casar em maio. Quando descobriu acerca do noivado ficou pensativo e muito envergonhado com a situação. Ele “conhecera a pequena numa saída de cinema, em fim de sessão. Sentindo-se olhado, animou-se. A pequena podia não ser nenhum deslumbramento. Era, porém, jeitosa de rosto e de corpo” (Rodrigues, 1992, p. 52). Geraldo tinha se interessado por Jandira e ela disse a ele que gostou muito da primeira impressão que dele tivera. Ele ficou deslumbrado com os encantos da moça e, aos poucos, esqueceu o anel em seu dedo. Para ele, não fazia diferença nenhuma.
No quinto encontro que tiveram, Jandira levou um belo retrato de seu vestido de noiva. Geraldo, surpreso, lançou uma pergunta direta para ela, se não tinha compaixão do que estava fazendo com o noivo. Jandira respondeu que ele era muito sério. Na mesma noite, Geraldo buscou ajuda de alguém, precisava desabafar e, dentre os seus amigos, escolheu Antunes. Este, depois de ouvir o caso de amor entre os dois, não conseguiu entender como uma mulher pode trair um homem. O romance continuou e Geraldo só pensava na condição do noivo enganado. Ela disse que ele nem havia a beijado na boca e que sempre dizia que tudo tinha que ser deixado para depois. Jandira, no calor do momento, havia-lhe pedido um beijo e ele, sem pestanejar, obedeceu. Num dia qualquer:
Pela primeira vez a vê, com o noivo, num cinema. Parecia amorosa e feliz ao lado do outro. Geraldo ainda resistiu uns quinze minutos a vinte minutos. Acabou não aguentando. Levantou-se, abandonou o cinema e no meio do filme, indignado. Nessa noite não dormiu. Das onze horas da noite até às sete horas da manhã fumou dois maços de cigarros. Subitamente compreendia, com uma dessas clarividências inapeláveis, que amava essa menina até onde um homem pode amar uma mulher. Apertando a cabeça entre as mãos, refletia: “Eu também sou traído. Ela me trai com o noivo!” (Rodrigues, 1992, p. 54).
Diante da situação de um triângulo amoroso, Geraldo quis que Jandira fizesse sua escolha, ou ele, ou o noivo. Ela tinha prometido desmanchar o noivado para se casar com ele. Mas, pensando bem, Jandira não queria acabar o seu noivado. Para ela, poderia ficar naquela situação de sempre, mas Geraldo não aceitava de forma alguma. Ele estava incomodado com a condição de amante. Achava que ser o seu futuro marido era a melhor coisa naquele momento. A cada encontro, Geraldo exigia o término do noivado e sempre Jandira postergava a situação, irritando ainda mais o amante. Chamou-a de cínica, ameaçou dar-lhe um tiro. Queria ser o seu marido a todo custo e foi assim que “um ano depois, casaram-se. No civil e no religioso, Geraldo viu, entre os presentes, o ex-noivo, num terno azul-marinho, de cerimônia” (Rodrigues, 1992, p. 56).
O primeiro aspecto a destacar é a respeito ao vestido de noiva. Essa indumentária, revestida de um simbolismo muito forte para a época, era o sonho das moças de família. Sua importância cultural era fundamental para o destino desejado de toda mulher de boa família. Sobre seu papel cultural:
Durante o século XX, o casamento, sobretudo o católico, com a noiva vestida de longo, branco, com grinalda de flores na cabeça e véu, seja ele curto ou longo parece representar uma imagem sacra, comparada com a senhora maior do cristianismo. Pensando pelo ponto de vista católico, entende-se que o vestido de noiva busca uma aproximação com a Virgem Maria, Mãe de Deus, Santa do culto cristão católico. Maria se estabeleceu no entendimento latino e, mais precisamente, no modo de pensar brasileiro, como símbolo de meiguice sagrada, um ideal a ser seguido pelas mulheres que buscavam ou já tinham se tornado donas do lar, mães de família. Torna-se claro que o propósito maior é fortificar o suposto puro, imaculado, virtuoso, bem como a ideia da maternidade, repulsa das coisas profanas e do cuidado com a virgindade, um cânone a ser seguido por todas as mulheres, “moças de família”. As roupas neste contexto cumpriam papéis de conexão entre corpo e alma, entre o mundo moral e o mundo físico (Schneid; Michelon, 2014, p. 5).
Casar-se de véu e grinalda não era apenas um sonho de mulher, mas o alcance de um status social reconhecido pela sociedade e pela família. A personagem Jandira deixa, de forma bem clara, a sua subjetividade idealista de usar o vestido. O vestido também pode ser pensado pelo imaginário cristão ao se comparar a mulher com a Virgem Maria. Cabia à futura esposa toda a doçura e mansidão a serem perseguidas no seu futuro lar, sendo assim, a virgindade era um rito de passagem para a vida conjugal e o ápice desse processo era o casamento, portando o vestido de noiva.
Outro segundo aspecto a ser levado em consideração é a existência do cinema que despontava também junto com o rádio num importante atrativo cultural nas grandes cidades. No caso brasileiro, há a preocupação de entender a realidade nacional, indo ao encontro de temáticas populares, ressaltando, acima de tudo, a nossa identidade. No caso do cinema estrangeiro, hollywoodiano, há a imagem de Marilyn Monroe que se tornou um grande ícone da indústria cinematográfica da época. Expunha seu lado feminino, erigindo-se como símbolo sexual e de consumo. Sua imagem pode ser articulada como o desejo de independência da mulher na vida social. Os meios de comunicação agiam diretamente nesse ciclo de urbanidade pelo qual as cidades passavam, pois o consumo era cada vez mais frequente. Mas o que se pode verificar nos anos 50 é que:
Na maioria das produções da época, a mulher ainda era vista encaixada nas normas que regiam a sociedade, uma mulher que renunciava seus próprios desejos em favor do desejo do homem. Além disso, o prazer da mulher não passava das barreiras do domesticável; vários filmes encenavam a felicidade da mulher preocupada com a educação dos filhos, cuidando da casa, preparando o café da manhã para a família e claro, dando a última ajeitada na gravata do marido antes da jornada no trabalho. A personalidade das mulheres estava resumida a dois pontos: carência - sempre necessitando de um homem forte para reparar suas fragilidades - e vulnerabilidade financeira - dependência da figura do homem provedor. Era conveniente para os homens deixarem a mulher nessa condição (Santos; Ferreira, 2013, p. 5-6).
Nota-se ainda a presença, nos anos dourados, do imaginário social transposto para as telas do cinema, de mulher submissa, obediente, resignada aos mandos do marido. Essa representação subserviente acabou por dominar as produções cinematográficas do período. Mas, em relação à imagem de Marilyn Monroe, já era diferente:
Marilyn Monroe trazia uma imagem diferente da mulher de sua época. A década de 50 foi considerada um momento difícil para as mulheres por ser extremamente conservadora e regida por regras, mas os papéis da atriz nos filmes iam em direção contrária aos bons costumes do ser mãe, dona de casa e “mulher para casar”. Ela teria sido uma faísca para as mulheres com pleno domínio sobre os homens, o que seria mais tarde chamado de femme fatale. Suas personagens sempre estavam inseridas no mundo que pertencia ao masculino e traziam uma nova mulher sedutora, elegante e desinteressada na padronização da feminilidade (Santos; Ferreira, 2013, p. 8).
Marilyn Monroe poderia ser uma das criações de Nelson Rodrigues quanto ao espírito de liberdade que essa personagem ditou nas telas do cinema. Isso pelo fato que não se pode afastar a presença de um imaginário alternativo de mulher-homem para a época, sem pensar no que aciona essas representações destoantes: a presença do urbano, influenciando a escrita ficcional. Esta é uma das grandes qualidades estéticas, quando pensamos nas criações jornalísticas, a cidade revela-se nas maneiras de se lidar com o humano. Um exemplo temático que se aproxima do universo rodrigueano é João do Rio que, no mesmo ato de escrita e genialidade, retratou o ambiente da cidade a partir de suas ruas, esquinas e becos.
“Um chefe de família”
No conto-crônica “Um chefe de família”, Anacleto ouviu dizer do amigo de uma suposta admiradora, que não tirava os olhos dele. Queria saber se realmente a informação procedia. Por coincidência, estavam juntos no mesmo bonde e Anacleto se sentou de frente para Netinha, e todos percebiam o comportamento tendencioso de Anacleto com a moça. Daí em diante, conheceram-se mais, andavam sempre de bonde. Ele, muito interessado, queria vê-la todos os dias. Mas ela logo advertiu que seu pai não iria permitir. Netinha tinha um pai muito sério. Disse que poderiam estar juntos às terças, quintas e aos sábados. Anacleto, então:
foi-se se embora descontente. Desabafou com os amigos: “Não devia existir sogro. Nem sogra. São as maiores empatas do mundo”. No dia seguinte, porém, experimentava uma nova e amarga decepção. Planejava ir com Netinha ao cinema, à Quinta da Boa Vista, ao Pão de Açúcar. Netinha, porém, o dissuadiu: “Nem brinca!”. O pai era contra namoro em portão, esquina. Vivia dizendo: “Nada de rua. Quero namoro em casa, na sala!” (Rodrigues, 1992, p. 140-141).
Namoravam em casa, gozavam de plena liberdade, sem a interferência dos pais. Mas ficava insatisfeito de ver Netinha apenas três dias por semana, embora fossem as regras do pai da moça. Certo dia, um amigo chegou a Anacleto e abriu seus olhos:
Queres saber por que só te deixam ver a pequena às terças, quintas e sábados?. Anacleto virou-se: “Fala”. O outro baixou a voz:
- Pelo seguinte: porque, ás segundas, quartas e sextas, vai outro em teu lugar. Percebeste o golpe? A marmelada? Sujeira e das grossas! (Rodrigues, 1992, p. 142).
Num instante de raiva, acusava seu amigo de mentiroso. Mas, ainda que perplexo com a notícia, Anacleto teve uma ideia de ir à casa de Netinha para saber quem era o outro de que ela gostava. No dia seguinte, estavam os dois espionando a casa. Aparece um homem, num grande automóvel, depois de entrar, espera ainda por quatro horas, o homem desce com Netinha. Avançou em direção à casa, começou a falar aos gritos, o sogro aparece e Anacleto foi expondo a situação, como sua filha podia ter dois namorados de uma vez. O pai da moça foi direto:
Você fala de barriga cheia! Pois fique sabendo que ele dava muito mais que você! O triplo, ouviu? O triplo! - E berrou a importância: - Mil e quinhentos cruzeiros, todo mês. Você nunca passou dos quinhentos! Suma-se da minha vista! Suma-se! Foi corrido daquela casa aos berros de “Pão-duro! Unha-de-fome! Mendigo!” Muito tempo depois, em casa, em meio à solidariedade da mulher e das filhas, aquele chefe de família, ainda excitado, ainda heroico, resmungava:
- Desaforo!... (Rodrigues, 1992, p. 143).
Este conto-crônica revela a falta de caráter do pai por oferecer a filha a dois namorados ao mesmo tempo, pensava apenas no que ambos poderiam oferecer à sua família. Mais uma vez, o cinema aparece como lugar para encontro dos amantes, além da Quinta da Boa Vista, que consiste em um parque municipal localizado no Bairro de São Cristóvão, na região da zona norte do Rio de Janeiro, e o famoso cartão postal da cidade localizado no bairro da Urca, o Pão de Açúcar. Nesse caso, também percebemos a importância da situação financeira do pretendente da moça, já que aquele que fosse mais rico e bem-sucedido teria mais vantagem e possibilidades de casamento.
Nesse sentido, vale ressaltar que “A alma encantadora das ruas” é uma espécie de “A vida como ela é...” às avessas, na semelhante atitude analítica que João do Rio teve em relação ao Rio de Janeiro na belle époque. Já Nelson Rodrigues, absorveu os anos dourados, embora seja perceptível que a belle époque ilumina os passos do autor no olhar perspicaz da década de 50. Muito do que Nelson Rodrigues vê e lê na sociedade carioca, ao mesmo tempo, com o olhar retrospectivo de um menino, tenta relacionar o tempo passado com o presente, o que gera um produto antagônico e divergente.
Nelson Rodrigues ficou conhecido por dar voz às ruas, aos sinais, aos indícios, às pistas de uma cidade à beira de um abismo moral. Ele flagrou cenas de amor, ciúmes, desejos e traições no cotidiano carioca de forma a produzir um capítulo da modernidade carioca.
Nesse interim, tanto Nelson Rodrigues como João do Rio utilizaram da crônica para registrar o presente, buscando situações corriqueiras, banais, que transcendem o espaço público, o irrepetível, e revelando o que ninguém nota, sempre a fotografar a cena agitada e decodificar o que ninguém quer saber ou faz de conta que sabe. Os traços jornalísticos de ambos os escritores se fazem presentes a partir do ponto de vista crítico na maneira de olhar o presente com desconfiança.
Além disso, a efemeridade da cidade é resgatada nas visões da produção jornalística, a qual prioriza os sujeitos fora do círculo da classe dominante. Estes, por sua vez, buscam burlar a ordem instituída e tornam-se protagonistas na Coluna “A vida como ela é...”, num processo de evocação de todas as dores da cidade em transição. Sob o ponto de vista marginal, tais construções estabelecem uma visão do humano na cidade, buscando compreender a sua atuação e perpetuação de padrões de moralidade:
Caracterizados pelo ambiente urbano das grandes cidades os contos de “A vida como ela é...” narram encontros furtivos no meio das ruas, nos bares, cafés, sorveterias, nos ônibus e bondes, nos escritórios e repartições públicas. Outra característica importante é a utilização de uma linguagem cotidiana que, através de expressões como “batata”, “carambolas”, “não amola”, “ora pílulas”, criavam esse universo urbano das personagens [...] Os protagonistas eram jovens desempregados, funcionários de repartições públicas e de pequenas empresas, donas-de-casa e algumas mulheres que trabalhavam por necessidade. Eles moravam na Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro e iram ao centro trabalhar (Zechlinski, 2007, p. 407).
Para além do contexto marginal, Nelson Rodrigues quer entender o assunto de família a partir da ótica do urbano, do passageiro, do movimento social, do efêmero que, por meio de sua Coluna, torna-se impresso no jornal, ou seja, passa a ser duradouro. Por isso, é:
Impossível pensar em Nelson Rodrigues sem situá-lo no Rio de Janeiro. De fato poucas obras, em nossa cultura, manifestam ligação tão visceral, com a cidade, sua história, cacoetes e paixões [...] trata-se do ponto de vista do homem comum, do homem ordinário, como patamar de generalização dos saberes e vivencias particulares daquele que escreve. Quando o trivial, o ser como todo mundo, torna-se a fonte da experiência produtora do texto (Dias, 2005, p. 101).
Esta condição que garante a aglutinação de um resíduo de temporalidade histórica em sua escrita está na forma como o escritor lida com as tramas morais e sexuais de uma cidade que não se cansa de se readaptar e reinventar. O Rio de Janeiro dos anos dourados não guarda mais a mesma mentalidade civilizadora e disciplinar, abrindo espaço para o individualismo na década de 50. Esse clima de permissividade adentra pelas relações sociais amorosas, pelo proibido, pelo escondido, irrompe em sua escrita e a (i)moralidade revelada torna-se uma afronta ao imaginário social vigente burguês.
Sob esse viés, destaca-se que a relação íntima de Nelson Rodrigues com a cidade, como produto de sua criação jornalística, confere o título de grande cronista da modernidade, com sua visão enriquecida e pluralista do social a qual alcança notável originalidade e vontade de persuasão nos leitores. Ademais, as representações de um novo imaginário social urbano conferido à família implicam na criação de uma cartografia moral e afetiva da cidade. O sentimento de desencantamento dos valores morais está presente a todo momento, exposto em seus contos-crônicas, no que concerne à participação do sujeito histórico, reprodutor de uma cultura moralista, burguesa e carregada de aparências sociais. Desse modo, sob a máquina de escrever, o jornalista cumpre seu papel de tornar “a vida como ela é...” um projeto histórico de fissura da modernidade.
Em sua produção jornalística, uma velha moralidade vai se definhando por entre lugares e espaços da cidade do pecado. Essa é a habilidade forte do cronista, reconhecer a instantaneidade do cotidiano, sem perder a durabilidade da vida, do momento histórico sobre o qual ele escreve e medita. Entendemos que, historicamente:
Nos dois mundos antagônicos do Rio se forjaram dois estilos de vida totalmente diversos... A Zona Sul, que começa propriamente no Flamengo, é a civilização do apartamento, e das praias maliciosas, do traje e dos hábitos esportivos, da boîte e do pecado à meia luz, dos enredos grã-finos, do pif-paf da família, dos bonitões de músculos à mostra e dos suculentos brotinhos queimados no sol... O Rio cosmopolita está na Zona Sul, onde uma centena de nacionalidades se tropicaliza à beira das praias. A Zona Norte é Brasil 100%. A gente mora largamente em casa (muitas vezes com quintal) e a casa impõe um sistema diferente de vida, patriarcal, conservador. Vizinhança tagarela e prestativa. Garotos brincando na calçada. Reuniões cordiais na sala de visitas... Menos água, mais calor. Diversão pouca, nada de boîte e night-clubs. Noite vazia de pecados e de passos boêmios e sortilégios. Vida menos agradável aos homens, mais abençoada pelos santos. Zona Sul - Zona Norte, paraíso e purgatório do Rio. Sair do purgatório e ganhar o paraíso é aspiração de quase todos, mas há quem prefira, sinceramente, a vida simples e provinciana dos bairros e subúrbios do norte. Para muitos a Zona Sul não é o paraíso, mas o inferno da perdição, onde Copacabana dita a imoralidade, o aviltamento dos costumes, a frivolidade e a boemia (O‘donnell, 2013, p. 229).
Nessa passagem do cronista Luís Martins, exposta na Revista Cruzeiro, em 1954, está clara a intenção social da obra de Nelson Rodrigues, seja enquanto dramaturgo, seja como jornalista do cotidiano. Muito além da luta de representações humanas, tipos sociais estão em constante disputa numa cidade em mutação. Em seus textos, aparece um Rio de Janeiro provinciano na zona norte, contra uma cosmopolita zona sul em ascensão. Nelson Rodrigues é cidadão do mundo, aculturado na zona norte, suburbano por opção e por destino e, acima de tudo, de coração e alma. Apaixonado pela cultura urbana carioca, sua obra é uma enciclopédia das formas do carioca deparar-se com as suas relações amorosas.
“Marido fiel”
O conto-crônica “Marido fiel” inicia-se com a discussão de Rosinha e Ceci acerca da fidelidade masculina. Rosinha acreditava muito em seu marido Romário. Ceci alertou para que não acreditasse de forma tão convicta assim na fidelidade de um homem e, como exemplo, baseou-se nela mesma e na sua vida de casada. Romário tinha uma conduta exemplar, casado há três anos, tratava a mulher de forma como se fossem eternos namorados. Rosinha sempre ressaltava que seria mais fácil trair Romário do que ele a traísse. Comentou da conversa que teve com a vizinha e ele foi bem taxativo: “- Mas oh! Parei contigo, carambolas! Tu vais atrás dessa bobalhona? A Ceci é uma jararaca, uma lacraia, um escorpião! E, além disso, tem o complexo da mulher traída duzentas vezes por dia. Vai por mim, que é despeito!” (Rodrigues, 1992, p. 145).
Daí em diante, o ceticismo tomou conta de Rosinha. Para ela o companheiro era muito ocupado, vivia indo para o trabalho e, de volta para casa, não teria tempo de se envolver com uma possível amante. Ceci achava Rosinha, julgando-a a pior cega que vivia num mundo de ilusões e colocava o marido como se fosse santo, indefeso e puro. Em um domingo, na hora do almoço, Ceci aparece na casa de Rosinha, para bater aquele papo de sempre. Era uma vizinha que gostava de bisbilhotar a vida alheia, inclusive a de Rosinha. Romário não estava em casa, tinha saído para acompanhar uma partida de futebol no Maracanã. Ceci novamente entrou no assunto da fidelidade do marido e até chegou a duvidar de que Romário estivesse no futebol. Afirmava que poderia ser um possível pretexto para se encontrar com outra mulher.
Rosinha, já muito nervosa, nem poderia imaginar uma suposta traição de seu marido. Mas Ceci queria tirar tudo a limpo, deu a ideia de ir ao estádio do Maracanã e chamar o marido no alto falante. Aí saberia se estava lá mesmo, ou se estaria nos braços de uma mulher. Foi terrível para Rosinha encarar a situação de frente, ter que duvidar de seu marido. O pior era como iria lidar com uma possível traição. Como encarar o desgosto de ser uma mulher traída:
Quando chegaram no estádio, Ceci, ativa, militante, tomou todas as iniciativas. Entendeu-se com vários funcionários do Maracanã, inclusive o speaker. Rosinha, ao lado, numa docilidade de magnetizada, deixa-se levar. Finalmente, o alto-falante do estádio começou a chamar: “Atenção, senhor Romário Pereira! Queira comparecer, com urgência, à superintendência!” O locutor irradiou o aviso uma vez, duas, cinco, dez, vinte. Na superintendência do Maracanã as duas esperavam. E nada de Romário. Lívida, o lábio inferior tremendo, Rosinha pede ao funcionário: “- Quer pedir para chamar outra vez? Por obséquio, sim?”. Houve um momento em que a repetição do apelo inútil já se tornava penosa ou cômica. Rosinha leva Ceci para um canto; tem um lamento de todo o ser: “Sempre pedi a Deus para não ser traída! Eu não queria ser traída nunca!” (Rodrigues, 1992, p. 147-148).
As especulações, sem terem provas contundentes, vieram na mente de Rosinha e, enlouquecida, daria tudo para morrer sem saber de nada, indignada de ser uma esposa traída. Para Ceci, a mulher nasceu para ser traída, não havia outra saída. Naquele momento, Rosinha sentiu um inconformismo tremendo, uma angústia profunda, o estádio, para ela, era o símbolo do luto, do sentimento de amor perdido. Certa de que Romário não estava e que agora seu casamento não passava de uma mentira:
Ao sair do estádio, ela repetia: “Eu não precisava saber! Não devia saber!”. Ao que a outra replicava, exultante e chula: “O bonito da mulher é saber ser traída e aguentar o rojão!”. Neste momento, vão atravessar a rua. Rosinha apanha a mão da amiga e, assim, de mãos dadas, dão os primeiros passos. No meio da rua, porém, estacam. Vem uma lotação, a toda a velocidade. Pânico. No último segundo, Rosinha se desprende e corre. Menos feliz, Ceci é colhida em cheio; projetada. Vira uma inverossímil cambalhota no ar, antes de se esparramar no chão. Rosinha corre, chega antes de qualquer outro. Com as duas mãos, põe a cabeça ensanguentada no próprio regaço. E ao sentir que a outra morre, que acaba de morrer, ela começa a rir, crescendo. Numa alucinação de gargalhada, como se estivesse em cócegas mortais, grita:
- Bem feito! Bem feito! (Rodrigues, 1992, p. 148).
Nesse caso, Ceci é o exemplo claro do papel dos vizinhos e sua influência na vida das pessoas, dos casais. As fofocas, as conversas sobre a vida alheia, são destaque nos contos-crônicas de Nelson Rodrigues. Isso se deve à presença da memória social de Nelson Rodrigues obtida na zona norte, onde a vizinhança sempre ficava olhando de perto o passo dos outros, as intrigas, o cotidiano das ruas, os fatos, sempre querendo participar dos assuntos de terceiros. Rosinha é uma das representações divergentes com as da maioria das mulheres destacadas pelo autor, nota-se o ideal de mulher da belle époque, fiel, esposa dedicada, que acredita na fidelidade do marido acima de tudo e de todos.
Ceci reproduz o discurso sobre o papel do masculino de ser normal e banal trair. A história deixa em aberto a possível traição de Romário, pois não se verificou, de fato, o flagrante, além de apresentar mais um desfecho trágico de Ceci que, para consolo de Rosinha, foi até aliviante, como se tivesse afastado o mal que pudesse recair sobre ela, de criar pensamentos de desconfiança sobre o marido.
Outra característica a mencionar é o estádio do Maracanã, situado na zona norte, inaugurado em 1950, para sediar a Copa do Mundo no Brasil. Ele representou a construção de um monumento para o esporte nacional, pois as dimensões estruturais do estádio eram, para a época, inéditas no mundo. O nome oficial do estádio “Mario Leite Rodrigues Filho” confere uma homenagem ao irmão de Nelson Rodrigues que foi decisivo para a construção do estádio. Apaixonado por futebol, Nelson Rodrigues era frequentador assíduo, torcedor fanático pelo Fluminense, o que o fez escrever diversas crônicas inspiradas sobre futebol, com seu olhar apaixonado pelo esporte:
A Copa do Mundo seria o palco para que o país se apresentasse como um novo poder. Isso explica a escolha por um estádio nas dimensões do Maracanã, cuja lotação máxima era definida para 150.000 espectadores, o que o faria, na época, o maior estádio do mundo. O Maracanã deveria ser um monumento do qual brasileiros deveriam se orgulhar. Uma evidência dessa grandeza seria o tempo recorde de dois anos no qual o estádio foi erguido. Os trabalhadores se tornaram símbolos dessa capacidade de trabalho e superação do ócio, que o carioca deveria mostrar. Foram divulgadas reportagens e fotonovelas cujos heróis eram os bravos trabalhadores que superavam algum perigo ou obstáculo durante a obra. Dessa forma, o Maracanã se tornou o símbolo de uma missão disciplinadora que enaltecia o trabalhador brasileiro. Corcovado, Pão de Açúcar e Baía da Guanabara eram obras da natureza, mas o Brasil queria ser reconhecido como uma civilização capaz de construir suas próprias obras (Spörl, 2012, p. 59-60).
Por fim, ressalta-se que o Maracanã foi idealizado na época como um espaço democrático, onde ricos e pobres poderiam amplamente frequentar o templo do futebol, tornando-se, assim, um forte símbolo da capital federal na época. O projeto do estádio seria abarcar toda a população sem criar um espaço destinado apenas para um público específico.
“O delicado”
No conto-crônica “O delicado”, o casal Macário e D. Flávia tiveram, ao todo, sete filhas. Queriam muito um filho homem e eram obstinados por isso. Depois da sétima filha, ainda queriam tentar mais uma vez e deu certo. No dia destinado para o parto, Macário estava muito nervoso e aflito, pois o filho tão esperado, até que enfim, tornou-se realidade:
Assim nasceu o Eusebiozinho, no parto mais indolor que se possa imaginar. Uma prima solteirona veio perguntar, sôfrega: “Levou algum ponto?” Ralharam:
- Sossega o periquito!
O fato é que seu Macário atingira, em cheio, o seu ideal de pai. Nascido o filho e passada a dor da chapa dupla, o homem gemeu: “Tenho um filho homem. Agora posso morrer!”. E, de fato, quarenta e oito horas depois, estava almoçando, quando desaba com a cabeça no prato. Um derrame fulminante antes da sobremesa. Para d. Flávia foi um desgosto pavoroso. Chorou, bateu com a cabeça nas paredes, teve que ser subjulgada. E, na realidade, só sossegava na hora de dar o peito. Então, assoava-se e dizia à pessoa mais próxima:
- Traz o Eusebiozinho que é hora de mamar! (Rodrigues, 1992, p. 40).
Eusebiozinho foi crescendo no seio de sua família, sob a proteção da mãe, irmãs, tias e vizinhas. Na ausência da figura do pai, sempre era apegado às companhias femininas. Cresceu rodeado de mulheres, não brincava com meninos, até se afastava de qualquer presença masculina. Até que chega seu tio em sua casa e pergunta ao menino se ele tinha namorada e recebe resposta negativa.
Foi o bastante. O velho quase pôs a casa abaixo. Assombrou aquelas mulheres transidas com os vaticínios mais funestos: “Vocês estão querendo ver a caveira do rapaz?” Virou-se para d. Flávia:
- Isso é um crime, ouviu?, é um crime o que vocês estão fazendo com esse rapaz! Vem cá, Eusébio, vem cá!
Implacável, submeteu o sobrinho a uma exibição. Apontava:
- Isso é jeito de homem, é? Esse rapaz tem que casar, rápido! (Rodrigues, 1992, p. 41).
Quando o tio foi embora, a família começou a rever os problemas de criação no menino, criado desde pequeno como se fosse mais uma menina da casa. A partir daquele instante, pensavam que o menino deveria se casar, ou mesmo pensar nessa possibilidade um dia. Muito calado diante da situação, falou: “Casar pra quê? Por quê? E vocês? - Interpela as irmãs: - Por que vocês não se casaram? A resposta foi vaga, insatisfatória: - Mulher é outra coisa. Diferente” (Rodrigues, 1992, p. 41). Começaram, então, a procura de uma moça para namorar com Eusébio. Ele nem foi notificado sobre sua possível pretendente de nome Iracema, de dezessete anos, mas que aparentava uma mulher mais velha de corpo. Ele ficou assustado, ao ver aquela mulher, pois não estava acostumado à presença de uma imagem estranha em sua casa, ainda mais convidada pela família:
E começou o idílio mais estranho de que há memória. Numa sala ampla da Tijuca os dois namoravam. Mas jamais os dois ficaram sozinhos. De dez a quinze mulheres formavam uma seleta e ávida assistência do romance. Eusebiozinho, estatelado numa inibição mortal e materialmente incapaz de segurar na mão de Iracema. Está, por sua vez, era outra constrangida. Quem deu remédio à situação, ainda uma vez, foi o inconveniente e destemperado tio. Viu o pessoal feminino controlando o namoro. Explodiu: “Vocês acham que alguém pode namorar com uma assistência de Fla-Flu? Vamos deixar os dois sozinhos, ora bolas!” Ocorreu, então, o seguinte: sozinha com o namorado, Iracema atirou-lhe um beijo no pescoço. O desgraçado crispou-se eletrizado:
- Não faz assim que eu sinto cócegas! (Rodrigues, 1992, p. 42).
E os preparativos para o casamento foram sendo realizados de forma muito rápida. Iracema estava muito feliz, sonhava com seu vestido de noiva. Um dia foi mostrar o modelo na página de uma revista para Eusébio, ele ficou deslumbrado com a beleza, achou uma maravilha sem igual. A própria mãe e a irmã ficaram responsáveis por confeccionar o vestido, Eusebiozinho era o mais interessado “sentava-se, ao lado da mãe e das irmãs, num deslumbramento: ‘Mas como é bonito! Como é lindo!’. E seu enlevo era tanto que uma vizinha, muito sem cerimônia, brincou: - Parece que até que é Eusebiozinho que vai vestir esse negócio!” (Rodrigues, 1992, p. 42-43).
Com o vestido pronto, há poucos dias antes do casamento, Eusebiozinho queria ser ele a própria noiva. Um dia se passou e o vestido tinha desaparecido:
“Desapareceu o vestido da noiva”. Foi um tumulto de mulheres. Puseram a casa de pernas para o ar, e nada. Era óbvia a conclusão: alguém roubou! E como faltavam poucos dias para o casamento sugeriram à desesperada Iracema: “O golpe é casar sem vestido de noiva!” Para quê? Ela se insultou:
- Casar sem vestido de noiva, uma pinóia! Pois sim!
Chamaram até a polícia. O mistério era a verdade, alucinante: quem poderia ter interesse num vestido de noiva? Todas as investigações resultaram inúteis. E só descobriram o ladrão quando dois dias depois, pela manhã, d. Flávia acorda e dá com aquele vulto branco, suspenso no corredor. Vestido de noiva, com véu e grinalda - enforcara-se Eusebiozinho, deixando o seguinte e doloroso bilhete: “Quero ser enterrado assim” (Rodrigues, 1992, p. 43).
Mais uma vez, Nelson Rodrigues demonstra seu cuidado em relação aos espaços da cidade em seus contos-crônicas. Neste último, temos a Tijuca, um importante bairro nobre da zona norte do Rio de Janeiro, um dos mais antigos, tradicionais e com um alto índice populacional na cidade. Podemos analisar a história, primeiramente, na imagem criada de Eusébio, que é revestido de delicadeza na narrativa, seu nome é apontado no diminutivo, criado pela família e na ausência da figura masculina. Eusebiozinho, na contramão da decisão da família, começa um namoro, mas suas atitudes remetem à sua criação, o desejo por tudo que é do universo feminino, inclusive o vestido de noiva.
No final, ele comete suicídio, portando o vestido de noiva e ainda querendo ser enterrado daquela maneira. Indo mais além na interpretação das personagens, podemos inferir na presença da constatação da homossexualidade nesse conto-crônica. E também na presença do machismo por parte do tio em dotar o menino das qualidades de um homem e de destiná-lo, de forma irreversível, ao casamento. Nelson Rodrigues trata de assuntos polêmicos com uma carga de humor em sua narrativa, deixando que o leitor tire suas próprias conclusões finais que podem ser as mais variadas possíveis.
A questão da homossexualidade é notada de modo explícito nesse caso, de forma a levar o leitor a perceber onde o autor quer chegar com o desfecho, mas sem assumir a condição de Eusebiozinho. Contudo, o que se pode concluir é que Nelson Rodrigues toca na questão do ser homossexual na figura do personagem delicado e com atitudes de moça, numa época, em que sua morte se tornou a única saída para assumir a sua condição, certamente com medo das imposições e pressões sociais. A função da crônica nisso tudo está em:
discutir assuntos graves e propor uma reflexão que compreenda a própria condição humana em meio a tais problemas. Em outras palavras, percebemos que não se debate o macro das relações e decisões humanas, mas sim, o micro, aqueles pequenos atos que juntos constituem a pessoa humana como ela é [...] Debater assuntos sérios de modo descompromissado com um olhar específico e sustentado por comentários do cronista, torna a crônica um dos gêneros mais simples e acessíveis a uma grande massa de leitores se comparado ao alcance de um romance volumoso; e tal abrangência é de suma importância para manter vivas discussões sobre assuntos sérios que, talvez, em outros gêneros e de modo sisudo, não tivessem o mesmo alcance (Barata, 2013, p. 324).
A crônica revela esse papel, informar de forma a deixar o assunto o mais agradável possível e ameno ao olhar social, delegando e transferindo o julgamento para a opinião pública. E, nesse contexto, Nelson Rodrigues vai ao encontro da cidade, observando e tomando cuidado com o julgamento de suas histórias, pois, na maioria das vezes, deixam abertas várias interpretações possíveis nos contos-crônicas.
Outra problemática passível de ser vislumbrada é a presença da homossexualidade na cidade do Rio de Janeiro na década de 1950, um período em que a mulher redefinia seus espaços de atuação na cidade, ainda regida pelos padrões de moralidade impostos pela República. Outra situação de mudança está na participação das identidades sexuais no contexto das grandes cidades onde toda uma vida noturna e formas de sociabilidades foram sendo incorporadas ao universo homossexual. Esses indivíduos também participaram da disputa pelos padrões de moralidade na década de 1950. Assim, percebe-se que
Novas noções de identidades sexuais e de gênero surgiram, colocando em cheque a polaridade entre homens “verdadeiros” e bichas efeminados. As opções da vida noturna ampliaram-se e bares exclusivamente para gays foram inaugurados. Os homossexuais passaram a ocupar novas áreas das maiores cidades brasileiras. Os fãs-clubes dos cantores de rádio constituíram outro meio para criar e integrar os homens nessa subcultura em ebulição. A participação nos concursos anuais de beleza para a escolha da “Miss Brasil” permitia demonstrações públicas camp, além de oferecer a oportunidade de avaliar e desafiar as noções tradicionais de beleza, moda, e do glamour femininos. Apesar da oposição de certos machões, que tentaram afastar as bichas das praias, uma faixa de Copacabana, tornou-se território homossexual. Os bailes de carnaval que aceitavam a participação dos gays recebiam ampla cobertura da imprensa, e travestis glamorosos surgiam desses bailes para atuar nas produções nas produções teatrais tradicionais que atraiam o grande público (Green, 2000, p. 253).
Como fica evidenciado, a vida noturna de Copacabana favorecia a sociabilidade de outras identidades sexuais. A classe média carioca sonhava em morar em Copacabana e a especulação imobiliária era uma prática cada vez mais constante e perceptível. Cada vez mais, havia um confronto espacial e cultural com o imaginário homem-mulher, abrindo espaço para outros sujeitos alternativos pudessem expressar suas condições sexuais. Por isso, Copacabana se tornou alvo para esse público, pois ali se desenhava um estilo de vida mais aberto às práticas sociais e mais atento aos comportamentos liberais. Entretanto, nem tudo era avanço nesse sentido:
Embora Copacabana, com seus edifícios de frente para o mar e estupendas vistas de montanhas ao redor do Rio, tivesse uma reputação internacional como um lugar moderno e excitante para se viver, também havia seus detratores, que criticavam o modo de vida imoral e a permissividade sexual de seus moradores. Um artigo de 1952 na revista Manchete advertia os turistas brasileiros sobre os perigos da área. A visão do jornalista acerca da existência de um modo de vida sórdido em Copacabana centrou-se na homossexualidade como um dos muitos vícios do bairro. Numa linguagem um tanto obscura, ele escreveu: “Pelas ruas de Copacabana, turista desprevenido, você encontrará tipos que não poderão deixar de surpreendê-lo. O vício - principalmente sexual - domina livre nos apartamentos escassamente iluminados. Uma multidão de assexuados, desajustados, viciados profissionais e vítimas de desarranjos glandulares, enfrentam-se, agridem-se, sofrem, lutando coletivamente pelo mesmo objetivo... Mas de qualquer maneira, não é preciso mais de uma semana para compreender como é verdadeira a afirmação do Comissário Padilha: ‘a maioria de Copacabana vive de sexo’”. As figuras dominadas pelo vício com desarranjos glandulares eram, obviamente, homossexuais, que, como o autor afirmava, viviam profissionalmente da prostituição (Green, 2000, p. 257-258).
Entende-se que a moralidade da época vivia de olhos desconfiados acerca desse novo discurso, dos conservadores, sobre o clima de imoralidade que agitava o bairro de Copacabana. A prática de relacionamentos homossexuais representava um perigo para aqueles que desconheciam o lugar, por exemplo, turistas, estrangeiros e demais visitantes. Sob o olhar atento do moralismo, o lugar mostrava-se dinâmico, moderno, agitado, muitas vezes associado ao progresso. Por outro, a cidade era espaço de encontros e modos de vida desregrados, imorais, pervertidos, da decadência moral.
Nessa perspectiva, podemos realizar uma leitura da época, acerca da moralidade e seu olhar vigilante, sobre a contribuição do filósofo Michel Foucault (1926-1984), a partir da noção de poder disciplinar como forma de adestrar os corpos e a vida cotidiana de acordo com os mecanismos de poder vigentes. Isso significa que, para além das individualidades, existem estruturas de poder, regulamentos, que devem ser organizados pela sociedade a fim de adestrar os corpos sociais: “O poder disciplinar é [...] um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem como função maior ‘adestrar’: ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor. Ele não amarra as forças para reduzi-las; procura ligá-las para multiplicá-las e utilizá-las num todo. [...] ‘Adestra’ as multidões confusas” (Foucault, 2005, p. 143).
Dessa maneira, onde esse poder se manifesta e se incorpora, faz-se presente nos micropoderes sociais, pequenas esferas sociais, por exemplo, na família e na cidade. A família estabelece a tarefa de disciplinar suas ideias acerca de homem-mulher, o ambiente da casa, e suas funcionalidades. A partir da leitura foucaltiana, podemos depreender que a função da cidade, por meio dos seus agentes, está em monitorar os comportamentos sociais e, assim, influenciar por meio de discursos “os corpos” a agirem de acordo com o padrão de moralidade vigente, classificando pejorativamente os sujeitos transgressores a essa moral.
Conclusão
A narrativa rodrigueana está inserida nos micropoderes, onde a casa, a rua, a cidade e os seus moradores estão a todo o momento sujeitos às normas e conceitos do poder disciplinar. Aqueles que não se enquadram nesses perfis são tidos como sujeitos que devem ser “apartados” e passíveis de constante preocupação pelo olhar regulador, normalmente o Estado, que se infiltra nas instituições e nos lugares sociais. Nesse sentido, a cidade está, a todo o momento, sob esse ponto de vista constantemente sendo alvo de disputas entre o moral versus imoral. O público homossexual, por exemplo, insere-se nesse palco de disciplinarização da vida, tidos constantemente como ameaçadores da ordem e dos bons costumes numa cidade moderna, mas que ainda não aprendeu a conviver com as diferenças que dela se manifestam. Constantemente vigiados e “punidos”, simbolicamente, pelo poder disciplinar:
A disciplina não é uma instituição, nem um aparelho de Estado. É uma técnica de poder que funciona como uma rede que vai atravessar todas as instituições e aparelhos de Estado. Este instrumento de poder que atua no corpo dos homens usará a punição e a vigilância como principais mecanismos para adestrar e docilizar o sujeito, pois é a partir deles que o homem se adequará às normas estabelecidas nas instituições como um processo de produção que, a partir de uma “tecnologia” disciplinar do corpo, construirá um sujeito com utilidade e docilidade (Diniz; Oliveira, 2014, p. 149-150).
A cidade do Rio de Janeiro, na representação de Nelson Rodrigues, formula e reproduz o poder disciplinar sobre seus habitantes. Todos estão atentos e afrontados à vigilância social e também individual, dos vizinhos, familiares etc. Na maioria dos contos-crônicas, percebemos a atuação das sogras, mães, tios, vizinhos que rondam o mundo da casa, percebendo aí contradições e possíveis desavenças. Estes sujeitos são vítimas dos instrumentos do poder disciplinar, participam da regulação da vida coletiva, espalhando códigos morais e atuando como mediadores de ações de conflito.
Na verdade, o que vemos também é o rompimento do poder disciplinar nos tipos sociais rodrigueanos, pois várias personagens contestam, destoam do próprio sistema de vigilância e as consequências dessas atitudes, na maioria das vezes, conduzem ao erro, arrependimento, liberdade ou mesmo à morte. A cidade é lugar daqueles que burlam a ordem, ao mesmo tempo em que criam novas normas de convívio social. O que permite essa liberdade é a troca de vivências, costumes, pessoas, espacialidades de uma cidade vista por quase todos como imoral:
O subúrbio e a Zona Norte aparecem então como palco privilegiado para a encenação da miséria humana, considerada universal, por nosso autor. As relações familiares e de vizinhança, valores e costumes antigos, mostram-se dilacerados em face do individualismo que pauta os novos comportamentos. No entanto, como já foi dito, o universo suburbano está sempre relacionado com outras duas regiões da cidade: o Centro e a Zona Sul. As personagens circulam, em geral, a Zona Sul aparece como área do pecado, onde as mulheres casadas vão se encontrar-se com seus amantes em apartamentos arranjados (Facina, 2004, p. 174).
Em suma, a cidade rodrigueana ficou materializada no tempo e imortalizada no presente por meio de sua escrita que representa uma fonte de testemunha ocular no tocante às formas de se entender o amor na década de 50. Trata-se, portanto, de uma verdadeira enciclopédia carioca, onde a cidade é protagonista ativa, um organismo vivo a modelar ações e práticas sociais e humanas.
Referências
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