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Escritas sobre as relações com famílias na rede de saúde mental de Belo Horizonte
Writings on relationships with families in the mental health network of Belo Horizonte
Escrituras sobre las relaciones con las familias en la red de salud mental de Belo Horizonte
Revista NUPEM (Online), vol. 16, núm. 37, e2024013, 2024
Universidade Estadual do Paraná

Dossiê


Recepción: 22 Mayo 2023

Aprobación: 14 Agosto 2023

DOI: https://doi.org/10.33871/nupem.2024.16.37.7922

Financiamiento

Fuente: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

Nº de contrato: 001

Descripción del financiamiento: O presente artigo foi adaptado da tese de Doutorado intitulada “Por políticas de multiplicidade entre famílias e equipes de saúde mental” (Lima, 2021), por sua vez realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de financiamento 001.

Resumo: Nas relações entre famílias e equipes técnicas que atuam em serviços de saúde mental, há diversas reproduções e invenções de práticas. Manifestações de poder se materia-lizam nas relações, persistindo práticas baseadas na tutela de quem se encontra em situação de vulnerabilidade. Em investigação baseada na esquizoanálise, foi utilizada como metodologia a cartografia, com uso de diário de bordo e de fragmentos literários contendo descrições de cenas que contribuem para a discussão. Observou-se que a convivência em atividades institucionais e o uso de dispositivos para agenciamentos coletivos permitem aos sujeitos refletir sobre concepções quanto à loucura, à família, às redes de assistência e instituições sociais. São refeitas assim condições para lidar com a desestabilidade que o contato com a loucura provoca e desenvolidas condições para outras formas de existir. Modos de escrever e de articular pesquisas, vida pessoal e prática profissional foram construídos, contribuindo para multiplicidades nos processos de produção de subjetividades na saúde mental.

Palavras-Chave: Saúde mental, Cartografia, Famílias, Esquizoanálise.

Abstract: In the relationships between families and teams working in mental health services, there are several reproductions and inventions of practices. Manifestations of power materialize in relationships, persisting practices based on the guardianship of those in situations of vulnerability. In this investigation based on schizoanalysis, cartography was used as a methodology, together with a logbook and literary fragments with descriptions of scenes contributing to the discussion. It was observed that the engagement in institutional activities and the use of devices for collective agency allow subjects to reflect on conceptions of madness, family, assistance networks, and social institutions, remaking conditions to deal with the destabilization that madness causes and developing conditions for other ways of existing. Ways of writing and articulating research, personal life, and professional practice were built, contributing to multiplicities in the processes of producing subjectivities in mental health.

Keywords: Mental health, Cartography, Families, Schizoanalysis.

Resumen: En las relaciones entre las familias y los equipos técnicos que trabajan en los servicios de salud mental, hay diferentes reproducciones e invenciones de prácticas. Manifestaciones de poder se materializan en las relaciones, persistiendo prácticas basadas en la tutela de aquellos en situación de vulnerabilidad. Esta investiga-ción partió del esquizoanálisis, utilizó la cartografía como metodología, un cuaderno de bitácora y fragmentos literarios con descripciones de escenas que contribuyen a la discusión. Se observó que la convivencia en actividades institucionales y el uso de dispositivos de agencia colectiva permiten a los sujetos reflexionar sobre las concepciones acerca de la locura, la familia, las redes de cuidados, las instituciones sociales, reelaborando las condiciones para lidiar con la desestabilización que el contacto con la locura provoca, y desarrollando condiciones para otras formas de existir. Se construyeron formas de escribir y articular la investigación, la vida personal y la práctica profesional, contribuyendo a las multiplicidades en los procesos de producción de subjetividades en salud mental.

Palabras clave: Salud mental, Cartografía, Familias, Esquizoanálisis.

Introdução a uma cartografia das relações com as famílias na rede de saúde mental de Belo Horizonte

A essência da saúde mental é inventar (Lancetti, 2016, s./p.).

Ah! A Literatura ou me mata ou me dá o que eu peço dela (Barreto, 2017, p. 36).

No momento de escrita deste texto1 estou em percurso de doutoramento em psicologia e revisito minhas primeiras indagações a respeito das escolhas teórico-profissionais que me trouxeram até aqui. Reconstruo minha identificação com o campo da saúde mental a cada instante. Recupero fragmentos de leituras, conversas, análise, orientações, trocas formais e sensíveis, para construir um tipo de pesquisa condizente com a visão de mundo que tenho sustentado. Busco me fazer, simultaneamente, pesquisadora, escritora, trabalhadora, militante, autora e outras pseudo categorias que cabem ora mais, ora menos, naquilo que as instituições de conhecimento têm exigido de nós. Invento modos de narrar e de pesquisar que se coreografam à medida que se desenrolam os encontros da pesquisa sobre relações entre familiares e equipes da rede de saúde mental de Belo Horizonte (MG), apostando na possibilidade de refazermos processos de subjetivação individuais e coletivos.

Em qual passado e presente me localizo? Qual futuro, nesta rede, me constitui?

Eu, estudante de psicologia, fazendo estágio no ambulatório de psiquiatria, pergunto ao colega, aluno-referência-prodígio, favorito do professor responsável: “psicótico deseja?”. Ele responde em sobressalto, sorrindo, “eu sei lá se psicótico deseja!”. Época de expectativa de respostas pela psicanálise e talvez também pela filosofia circundante...

O mestrado em estudos psicanalíticos não se desenvolveu como o esperado. Que tipo de pesquisa estava sendo feita? Quais ganhos ela estava trazendo? As relações acadêmicas estavam gerando quais tipos de trauma? Anos após a conclusão do processo, o que mais retorna à lembrança é o final do texto de dissertação, quando eu, autora, perguntava sobre as condições de estabilização psíquica da paciente acompanhada anteriormente: “chegamos ao final, sem ter respondido à pergunta que desencadeou o trabalho” (Lima, 2011).

Eu, uma psicóloga recém-formada que quer muito trabalhar na rede de saúde mental, mas não sabe como ser contratada, caso não seja via concurso. Estudei muito durante anos mas não tive experiência de estágio na rede de saúde pública. Não sabia sobre a legislação básica da política de saúde, não sabia sobre as atribuições do psicólogo no Sistema Único de Saúde (SUS). Mas tinha certeza da vocação para o trabalho com a loucura. Sofria por uma paixão pela possibilidade de um trabalho no qual a arte se relaciona com o saber da psicologia; e sofria simultaneamente por uma frustração por não ter passado por um curso de formação superior que me desse condições concretas para essa prática. Seguia contatos e descobri a militância da luta antimanicomial como local de aprendizado e fortalecimento coletivo. Nada mais parecia categorizável em “político”, “clínico”, “pessoal”, etc., com rótulos definíveis para conversas e ações. Tudo passou a ser misturado dentro de mim, variando em momentos de ênfase em um ou outro campo da vida.

Trabalhando em um serviço de urgência, eu, psicóloga-aprendiz, atendi um jovem diagnosticado com esquizofrenia e que fazia uso de substâncias psicoativas. A relação com a irmã era muito presente no tratamento, e com frequência ambos chegavam ao serviço solicitando inúmeras intervenções. A demanda por medicação era a mais recorrente. Mas havia também perguntas sobre o uso do dinheiro deles, como dividiriam a renda que tinham, como manejar pagamento de contas, entre outras. Um dos casos que demonstram que sem acolhimento e acompanhamento da/com a família, o tratamento perde o sentido. Desafios cotidianos e que envolvem toda a rede, além da equipe do serviço de referência.

Uma psicóloga-pesquisadora-aprendiz que dança está no metrô, a caminho do campo de pesquisa. Eis que surgem as ideias para um projeto de dança cuja essência é improvisar, fazendo performances em espaços públicos urbanos. Algo lhe dizia: “mas você deveria estar pensando nas entrevistas, como perguntar sobre aqueles temas polêmicos”… e de repente a mente é invadida por inspirações. Momento de vida conturbado, de rompimentos e criação de vínculos. O que representa esse projeto pessoal? Outras formas de habitar a dança, habitar a cidade, construir um corpo apto a improvisar através da valorização da memória e da experimentação de múltiplos estímulos.

O que essas inquietações sugerem? Como olhamos e entendemos o mundo, como tentamos agir sobre ele, como nos sentimos afetados, são condições produzidas e passíveis de serem alteradas. Passando por algumas metamorfoses, decido apresentar-me como alguém formada em psicologia, trabalhadora da saúde mental, empenhada em estudar como as condições sociais influenciam no adoecimento mental e na formação das subjetividades, sem, contudo, abrir mão totalmente do que estudei no âmbito da psicanálise. Alguns autores da filosofia dão embasamento para essa crítica que quer ser sobretudo construtiva.

Entre tantas questões, dúvidas, vontade de construir práticas vivas em um trabalho com condições sabidamente difíceis, destaco a relação com os familiares dos usuários atendidos na rede de saúde mental. Ao mesmo tempo que desconstruo algumas certezas, pretendo analisar com os atores que estão passando pelo calor da vivência com os usuários as formas como serviços e famílias se relacionam. É preciso escutá-los.

Das poucas certezas atuais, trago comigo a paixão capistrano-lancettiana, pela qual aposto em produzir condições para (me) recarregar, incentivar plasticidades psíquicas para promover convivências potentes. Daí começo a pensar em outro modo de investigar, outro modo de articulação da academia com a rede, após uma série de encontros felizes com pessoas que me apresentam outras instituições de ensino e modos de ocupar esses espaços de articulação. Pelas situações de trabalho na rede me vejo motivada a voltar a estudar e inicio o doutorado em psicologia. Escrever sobre uma pesquisa, assim, passa a ser uma maneira de “povoar esta solidão de múltiplas vozes” (Rolnik, 1993, p. 250). Uma tentativa de lidar com muitas marcas impressas em mim. Verdades que se cruzam e desafiam, associadas a aprendizados, às passagens do tempo, a traumas e violências sofridas, ao diálogo com as expectativas sociais e o senso comum. Em emaranhados nos reconstruímos.

Os endurecimentos observados na postura dos profissionais e em mim, pesquisadora, ainda com poucas condições de analisar minha implicação no campo da pesquisa acadêmica e a da militância na saúde mental, estavam em um período de estagnação conceitual e de geração de angústia. As referências teóricas e práticas até então conhecidas faziam com que os impasses nos campos de atuação fossem introjetados, gerando uma espécie de culpabilização de si e traçando um caminho com poucas possibilidades de saída. Entre esses desassossegos surgiu o tema da relação das equipes da rede de saúde mental com as famílias no tratamento de pessoas em situação de sofrimento mental, na rede de serviços substitutivos da cidade de Belo Horizonte, enfocando os processos de subjetivação que emergem.

Escritas dobradas em si

O tempo, morada dos aprendizados que trago da minha experiência de trabalhadora na rede de saúde mental. Li inúmeros textos, ao longo da vida profissional, que dizem sobre a formação que o próprio trabalho de oferta de cuidado nos traz. Tenho diálogos internos intermináveis com as agentes comunitárias de saúde, os colegas dos CERSAM2, os técnicos dos serviços intersetoriais. Mesmo sem estar fisicamente nos serviços da rede me sinto parte deles, devido ao investimento afetivo que nutro pelas relações com os usuários das políticas públicas, à admiração pelos trabalhadores, à sensação de dever político cumprido e responsabilidade coletiva por me dedicar exclusivamente a este trabalho, a esta militância, deixando aflorar a potência dessas práticas na minha vida.

Mesmo no CERSAM em que trabalhei mais tempo, um serviço de urgência e referência para situações de crise, eu me apresentava como psicóloga aprendiz. E lá acompanhava um jovem usuário com diagnóstico de esquizofrenia e/ou transtorno esquizoafetivo - variação conforme avaliação psiquiátrica de cada período - e longo histórico de uso abusivo de substâncias psicoativas diversas, algo em torno de quinze anos. Essas duas associações traziam alguns impasses para os manejos na rede, pois durante algum tempo as equipes discutiam sobre qual das condições seria priorizada como foco de intervenção, o que levaria a determinadas condutas e mesmo a possível alteração da definição do local de acompanhamento. Era uma situação difícil de acompanhar, pelas características desse jovem - restrição de contato verbal, intoxicação frequente, impaciência dele com os acordos da rotina do serviço, etc. - mas também pelo modo como sua irmã participava do tratamento. Ela estava sempre presente. O uso da medicação tinha centralidade nas demandas de ambos: ele por pedir mais, ela por querer nos orientar sobre a restrição do consumo. Com ela atendimentos presenciais programados ou não, telefonemas, troca de emails - pelo endereço eletrônico institucional do serviço - eram recorrentes. Ela se colocava como a principal cuidadora dele, apesar de viverem os dois com a mãe, idosa, todos na mesma casa. Ele autorizava esse modo de participação dela em sua vida, de certo modo.

A família era conhecida na vizinhança, no bairro e por outros equipamentos das políticas públicas. Havia muitas brigas, intervenções policiais, acompanhamento também pelas equipes do Centro de Saúde, do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS3) - esta vinculação, devida a um período de necessidade de proteção à mãe, com suspeitas de ter sido agredida por um dos filhos - e esses serviços da saúde e da assistência social se articulavam para buscar soluções possíveis para melhoria da convivência familiar, utilizando também outros recursos do território. Eu, enquanto técnica de referência do usuário em questão, insistia nessa articulação coletiva, bem como outros parceiros, dentro e fora do CERSAM, entendendo que não era simples nosso envolvimento com o grupo familiar; mais ainda, tendo certeza de que sem acolher devidamente a família - e a irmã, especialmente - não alcançaríamos estabilidade no caso desse usuário, sujeito diagnosticado e em situação de maior fragilidade. Foram inúmeras discussões sobre ampliação dos vínculos sociais e familiares, sobre a inserção em locais de convivência, acesso a trabalhos protegidos e tentativa de garantia de renda, diminuição da centralidade do uso dos medicamentos e demandas por internação que eram feitas frequentemente. Ainda hoje me pergunto sobre o artifício que usávamos ao colocá-lo como usuário. A sensação de pegar seu extenso prontuário, com seu nome completo escrito na parte exterior, me parecia ou erro de foco ou restrição do conjunto de intervenções que fazíamos; quer dizer, pensava que podíamos minimamente escrever seu nome / nome da irmã. Não que o modo como escrevemos sobre nosso trabalho, sobre a história das pessoas que acompanhamos, seja verdadeiramente determinante das ações que fazemos. Mas penso que os documentos que escrevemos podem carregar em si tanto a responsabilidade ética que temos quanto a beleza que a literatura acrescenta ao mundo. Nisso incluo trabalhos acadêmicos, os prontuários e as composições que fazemos e continuaremos fazendo em rede, apesar dos tantos desafios desses nossos dias para atuação nas políticas públicas.

Para percorrer as linhas que se enlaçam na relação das famílias de usuários em situação de sofrimento mental com os técnicos da rede psicossocial, percorro caminhos de reprodução, de endurecimento e de invenções, de possibilidades, tentando criar sentidos para o que investigo. Podemos, assim, afirmar que os trabalhadores da rede de saúde mental, legitimados pelo Estado, correm o risco de manter uma tutela das famílias atendidas, através de atividades com objetivo terapêutico e de reabilitação psicossocial, contribuindo para uma regulação política da vida dos indivíduos (Costa, 1999), ao mesmo tempo em que buscam desenvolver com os mesmos práticas de produção de autonomia e participação ativa nos tratamentos propostos. Este aparente paradoxo permite a proposição de uma cartografia, através de situações e encontros coletivos, para que se faça uma produção sobre os efeitos desses encontros nos participantes e a abordagem dos problemas anunciados. Através da cartografia das relações com os familiares nos diferentes serviços de saúde busco mapear as linhas existentes nos encontros entre esses atores e também comigo, pesquisadora. É uma forma de acompanhar os processos engendrados pelas subjetividades desejantes, tentando dar expressão aos afetos que circulam entre elas. Trata-se, portanto, de uma forma de pesquisa intervenção que se realiza junto com os grupos participantes, por acompanhamentos e intervenções no cotidiano das práticas, referenciadas pela esquizoanálise de Deleuze e Guattari e abordando a realidade por imanência dos planos de formas e forças (Romagnoli, 2014).

A prática do cartógrafo pode ser considerada como micropolítica, tal como indicado por Rolnik (1989), no sentido de uma relação com as práticas de poder e sua dimensão de técnicas de subjetivação. A meu ver, as estratégias de produção de subjetividade se articulam à dimensão da produção e reprodução do sistema social-econômico-político em que vivemos, de maneira imanente e indissociável.

Para a realização desta cartografia foi feita pesquisa de campo na qual habitei unidades de diferentes pontos de atenção, na complexidade da rede de saúde mental existente em Belo Horizonte. Nela os(as) usuários(as) passam por diferentes serviços conforme o momento do tratamento e acredito que em cada um deles há condições diferentes para o trabalho de acompanhamento também com os familiares. Nos CERSAM, serviços de urgência, há uma situação específica pela urgência do sofrimento mental e as situações de crise, que afetam de modo específico o usuário, sua família e o entorno, incluindo as dificuldades com o diagnóstico, a necessidade de tratamento, as reorganizações para a convivência... Na atenção primária à saúde, há outras condições, pela proposta de acompanhamento a longo prazo, a proximidade territorial e o conhecimento das condições de inserção social e relações comunitárias. Nos Centros de Convivência (CC), por sua vez, em sua interseção com a arte e outras expressões culturais, há outras condições de relacionamento com as famílias, a partir de um momento em que a situação de sofrimento está mais estabilizada, com possibilidades mais concretas de retomada das atividades cotidianas.

No CERSAM participei do “Primeiro encontro de familiares” realizado pelo serviço, para o qual chamaram outros pontos da rede. Foi muito potente a vivência proposta com técnicas do Teatro do Oprimido, na qual familiares presentes participaram ativamente. As conversas que se seguiram abordaram a Reforma Psiquiátrica - algo colocado pelas profissionais presentes - e diversas dificuldades do cotidiano e convivência entre os familiares e seus membros: situações de crise, os afetos nas relações, queixas sobre ineficiência da abordagem de equipamentos do poder público nas regiões periféricas e diversas outras experiências pessoais de manejo de conflitos. Momento que incluiu lanche, música e poesia, terminado de modo leve e com indicações para encontros futuros. Os conteúdos apresentados foram retomados em momento posterior, por terem surgido também nos grupos em que participei enquanto pesquisadora-testemunha dos processos em andamento. Encontros que deixaram marcas, indagações, questionamentos, afetamentos...

Diário de Bordo - CERSAM FANON4

Chego um pouco atrasada para a reunião. Serviço cheio, movimentado. Pessoas muito diferentes no mesmo espaço! Observo com interesse enquanto subo ao local da reunião. Começamos. Ao longo da conversa F. intervém diversas vezes, falando sobre os casos acompanhados nesses 17 anos em que está no serviço. São muitos desafios e aprendizados. Da minha parte, mal sigo o material, deixando a conversa mais solta. Menciono minhas impressões sobre a vergonha que os familiares demonstram, relacionada ao estigma do usuário em sofrimento mental, o peso do diagnóstico de esquizofrenia... Acho que essa postura dos familiares se associa ao imaginário social sobre a loucura, mas também a uma internalização que fazem do que dizemos, enquanto técnicos e profissionais dotados de saber. F. parece concordar, e acrescenta “principalmente as mães” parecem se sentir culpadas - e a conversa segue.

Dos casos contados, me chamou muito a atenção a lembrança sobre Clara, com quadro psicótico grave, que ficava trancada em casa, com os pais tomando conta dela. Segundo F., a família mudou-se pra região, saindo de zona mais nobre da Cidade, talvez pela vergonha de ter alguém assim na família. “Ela não falava, grunhia. Tudo na casa tinha grade, correntes. As unhas e os cabelos enormes”... Três dias após a primeira intervenção da equipe, numa visita domiciliar para avaliação do quadro de diabetes da mãe, esta vem a falecer. O pai assume os cuidados em casa, mas pede auxílio ao serviço, e várias melhoras são obtidas, com cerca de um ano de acompanhamento intensivo. Neste recorte, ela fala sobre como o pai fazia para medicar a filha: “preparava um docinho de côco, com o comprimido dentro, e um confete [tipo de bala] colocado por cima com muito zelo; ela jogava fora o confete e comia o doce! Ela gostava muito de doce”. Penso como ela estava atenta ao que lhe ofereciam, apesar da precariedade do contato com o outro, que muitas vezes menospreza o entendimento do usuário. Acho interessante as saídas adotadas, também lembro de algumas situações que acompanhei, enquanto técnica, as quais contribuíram para a formulação do meu problema de pesquisa.

[…] Volto com dúvidas, várias, sobre como prosseguir, nesse campo longe de ser o que me parecia, a princípio... sem idealizar, mas com a sensação de que as atividades com as famílias pareciam mais orgânicas do que têm de fato sido (Lima, 2021, p. 41).

Quando estive no CC pela primeira vez apresentei o projeto para a equipe e retornei para uma segunda apresentação - pois solicitaram para que eu o fizesse mais detalhadamente. Algo que me causou surpresa, já que eu havia preparado uma conversa menos formal / acadêmica, pensando em dialogar com os e as artistas do serviço. Demorei para perceber como eu havia uma expectativa de que a conversa com essa equipe passasse por temas mais amplos, ligados à cultura, como se isso diminuísse um interesse ou necessidade de discussões técnicas e conceituais sobre as relações com as famílias, sobre metodologias de pesquisa. Ou algo em mim imaginava que a equipe nem teria tanta disponibilidade para a conversa, talvez por causa da tradição em que fui formada enquanto psicóloga e militante, posições das quais eu derivaria em uma pesquisadora que respondesse a um padrão de hegemonia científica e em consonância com suposta superioridade do “discurso científico” como forma de conhecimento, em comparação com as artes, por exemplo: assim, teria mais certezas e hipóteses do que questionamentos sobre as práticas e deixaria calar a minha sensibilidade para lidar com o campo e os atores participantes. Isso representou, de fato, um perigo permanente para o qual tive que me atentar a todo momento na realização do percurso cartográfico.

“O intelectual do nosso tempo, pois, não deixa de se endurecer para crescer” (Camus, 2013, p. 344): tal apego identitário leva-o a criar uma camada protetiva para lidar com a realidade de modo a manter-se sempre coeso, consciente, habituado, calejado, endurecido. Pelo peso da tradição acadêmica e por medo da avaliação das pessoas sobre meu comprometimento afetivo e político com todo o campo e todas as pessoas envolvidas, passei por momentos em que sentia, em mim, imobilidade para criar e analisar os dados da pesquisa. Principalmente quando me sentia sozinha em certas passagens desse longo percurso. Talvez pela dificuldade em lidar com a herança da época de graduação e mestrado em psicologia, quando aprendi modos de pesquisa conceituais nos quais as interlocuções com autores e teorias estrangeiros eram mais valorizadas do que as articulações locais com o campo investigado, sobre o qual eu falava, mas sem tê-lo de fato frequentado. Uma das lembranças dessa época é o gosto em ler referências bibliográficas em outros idiomas, enquanto a não compreensão do modo de funcionamento de um serviço substitutivo da rede de saúde mental era estranhamente inobservada. Gostos e lembranças, porém, trabalhados entre os meus próprios impasses, sendo possível reposicionar-me diversas vezes em relação a eles.

Apresentando-me para as equipes enquanto também trabalhadora da rede e para as famílias como também usuária das políticas públicas, criei possibilidades de trocas de experiências que se reverberaram em mim de modo muito potente. Destaco, nesse sentido, os alertas para as discussões sobre o racismo, a descolonização e democracia que a equipe do Centro de Convivência David Capistrano me fez e sobre os quais pude depois aprofundar a investigação. Além disso, pude perceber durante os encontros - sejam com as famílias, as equipes, as festas, os passeios… - e também ao rever minhas anotações, como estar com os coletivos me trazia alegria e motivação para seguir com a proposta. Seguir as pistas para ter condições de manter a pesquisa e os parâmetros éticos colocados para a mesma indicam a necessidade de cuidado com a produção de processos de subjetivação que considerem de modo imanente a recriação permanente de nossos próprios corpos, mesmo quando há forças que os pretendem oprimir e conformar. Estamos, afinal, todas submetidas aos mesmos riscos de assujeitamento e diminuição da nossa potência de viver e agir, mas os grupos demonstram ricas possibilidades de lidar com tais riscos…

Numa sala que serve como ateliê no centro de convivência, estão expostas várias obras de cerâmica, figurinos, fotografias, estandartes, materiais diversos e produtos das oficinas. Uma roda de cadeiras, já cheias de gente, está colocada na sala, e no centro dela há uma mesa com biscoitos, café, água e chá. Algumas mulheres presentes não permanecem sentadas durante todo o encontro. Em alguns momentos se justificam: “preciso ir ao banheiro toda hora, porque tomo remédio para pressão...”, “meu joelho dói muito”, “nem sempre posso vir, sair de casa, porque tenho meus problemas de saúde”... Estamos discutindo as dificuldades de lidar com os familiares, usuários da rede de saúde mental, em função das crises e mudanças cotidianas. Falamos sobre eles, não sobre nós. O “nós”, aqui presente, se divide entre profissionais, pesquisadora - pessoas que parecem saber mais alguma coisa sobre essas questões - e os familiares. Vidas que giram ao redor dos afetados pelo sofrimento que estão em tratamento nos serviços de saúde. O que importa a nós, de certo modo, é o que concerne a eles.

Em algum momento levanto para pegar um chá, mais para tentar criar um movimento, já que ninguém do grupo havia ainda se servido daquilo que estava ali, tão disponível e ao alcance de todos. Depois mais algumas pessoas se servem, timidamente.

Ao final da atividade, conversando com a equipe sobre possíveis ideias de intervenção no(s) próximo(s) encontro(s), fico com vontade de passar uns vídeos, oferecer um alongamento para iniciar a conversa, ver fotografias... ou alguma outra coisa que possa ajudar a amaciar um pouco os corpos ali presentes (Lima, 2021, p. 44).

Frequentei os espaços de ambos os serviços conforme a rotina de cada um: quase semanalmente ao CERSAM, a cada dois meses no CC. Tive oportunidade de realizar entrevistas coletivas com os grupos de familiares de cada um deles: a partir de convites que eu fiz, na presença da equipe e com seu “consentimento” nas atividades de rotina com os familiares, e estando sozinha no dia marcado, conduzindo as conversas. Realizei também entrevistas coletivas com as equipes participantes: no CERSAM com as duas técnicas de referência e a gerente; no CC com a equipe completa, conforme sugestão de uma das pessoas de referência, para que os(as) demais técnicos(as) pudessem contribuir com a discussão.

Em relação aos familiares, os convites para participação na pesquisa foram mediados pelas equipes, no sentido de que fui apresentada aos mesmos em momentos prévios de participação minha nas reuniões já executadas em ambos os locais. Assim, bastava o interesse em conversar sobre o tema, podendo participar qualquer pessoa que se sentisse responsável pelo acompanhamento de seu familiar na rede de saúde mental, independentemente do vínculo e do tempo de tratamento. Os que compareceram nas entrevistas coletivas específicas são pessoas de certa forma já inseridas nas dinâmicas dos serviços. Não posso deixar de expressar quanto sou extremamente grata pelos momentos de conversas que tivemos e por toda a colaboração que disponibilizaram para o projeto.

Chega o dia de eu apresentar o projeto para a equipe do CERSAM. Fico com certa expectativa, por já estar frequentando o serviço sem que parte dos trabalhadores saiba o motivo da minha presença… No caminho de ida, observo a população vulnerável residente nessa região da cidade em que eu não costumava frequentar, local também cheio de estabelecimentos particulares de assistência à saúde. Acho contraditório e triste esse movimento de privatização, ainda mais com a impressão de que as pessoas acham normal pagar para serem atendidas e aguardam pacientemente nas filas, salas de espera, porta de entrada. Tudo isso na rua mesma do CERSAM.

A reunião começa. Muitas questões do serviço. Após o café a gerente me apresenta brevemente e me passa a palavra. Falo do meu percurso profissional e acadêmico, a experiência de trabalho em Belo Horizonte e em Betim, o início do planejamento da pesquisa a partir da minha experiência na ponta, incluindo a atenção primária, onde estava trabalhando até antes de iniciar a pesquisa. Descrevo os objetivos, a metodologia, falo da teoria... Explicito alguns cuidados éticos e políticos que trago comigo. Digo que acho importante questionarmos o que temos feito, com toda a trajetória da reforma psiquiátrica, para avaliarmos os efeitos do que fazemos. Como as famílias avaliam o que a gente faz? Menciono minha preocupação com a conjuntura política, os cortes de verbas, a mobilização que julgo necessária para uma resistência. Acho que a gerente sinaliza com a cabeça, concordando, mas sobre tudo isso pareço falar um pouco sozinha. Não sei se seguindo a tendência do grupo, em geral, naquele momento. Ressalto que os dados serão produzidos em conjunto, por mim e pelos que participarem, e que eu pretendo trazer pedaços de análise para a equipe avaliar e ajudar a construir...

Tudo mal durou uma hora. Saio pensando que a menor atenção à proposta da pesquisa reflete a pouca atenção ao trabalho com as famílias. Feito um primeiro mapeamento das diferentes forças, representadas por esses atores que agora conheço um pouco melhor, posso começar a pensar na continuidade das intervenções (Lima, 2021, p. 45).

As anotações em meu diário de bordo, com os registros de memórias e afetos, foram guias em minha viagem pelo campo de pesquisa. Além da citação de passagens do diário, utilizei também cartas, que se aproximaram de uma escrita diarística, por relatar acontecimentos e deslizamentos emocionais vividos ao longo do período e a partir das intervenções. As interlocutoras das cartas contribuem para situar as reflexões sobre o campo de modo mais próximo, num movimento associado ao distanciamento que fizemos das situações analisadas. São alterações rítmicas na escrita. Metodologicamente representam o rastreamento de deslocamentos subjetivos meus, enquanto pesquisadora; e quando são cartas escritas por outros(as) escritores(as), buscam a potência da articulação do relato da pesquisa com experiências literárias que rastreiam, por si, a vida. Das vivências articuladas buscamos produção de conhecimento sensível comum que auxilie as práticas na saúde mental.

Importante destacar que mantive contato com diferentes atores com a expectativa de apresentar o projeto da pesquisa e propor intervenção na Atenção Primária à Saúde (APS), mesmo que não tivéssemos conhecimento de atividade específica com familiares em andamento. Apesar do interesse de alguns participantes da pesquisa para que a APS participasse, acabei concluindo que não seria possível fazê-lo em tempo hábil. Falei sobre essa dificuldade em várias situações, inclusive nas entrevistas; e a relação com a APS pôde ser, de todo modo, abordada com os coletivos no período que tivemos para construção da análise dos dados.

Em todos os encontros ocorridos procurei intervir para ouvir as famílias sobre os tratamentos de seus familiares (usuários), quando estão em acompanhamento na rede, para analisar as relações que se estabelecem entre elas e as equipes. Não houve pretensão de se definir um modelo ou ideal de família, pois os grupos familiares são complexos, nos quais há vínculos afetivos, de parentesco, de convivência e/ou consanguíneos, atravessados por valorizações sociais e culturais (Brasil, 2013), evidentemente influenciados pelo sistema socioeconômico em que vivemos. No grupo familiar há relações compartilhadas, que podem estar ligadas a funções de cuidado e proteção, alimentação, socialização, representando modos de convivência que não estão sujeitos a nenhum tipo de julgamento de valor quanto às formas pelas quais se manifestam. Apesar das dificuldades que as equipes têm, por vezes, em abordar as famílias, existem inúmeras tentativas para aumentar essa aproximação.

Sendo o objetivo principal de uma cartografia pesquisar a experiência, o uso da entrevista na pesquisa cartográfica busca intervir “na experiência do dizer” (Tedesco; Sade; Caliman, 2016, p. 99), a partir da inseparabilidade de dois planos da experiência: a experiência de vida (o vivido da experiência) e a experiência pré-refletida - planos que funcionam em reciprocidade. Não pretendi focar apenas as representações sobre as experiências de vida, já que não era objetivo da pesquisa fazer somente uma descrição dos conteúdos trazidos pelos participantes; mas intervir com eles, atentando para os momentos de ruptura e mudanças de postura e de fala (Tedesco; Sade; Caliman, 2016). Nas entrevistas tentei acompanhar o conteúdo das falas e os modos de expressão, mantendo cuidado no manejo para lidar com os afetos que porventura atravessassem os encontros. Não interpretar, mas vivenciar com eles o que se passava.

Por esse viés, as entrevistas abordaram o modo de participação das famílias no tratamento dos usuários, tentando rastrear quais os impasses e facilitadores nas relações entre elas e as equipes de referência para os usuários que fazem tratamento. As perguntas se relacionam às mudanças das dinâmicas familiares a partir do adoecimento e subsequente tratamento ao usuário e a como se entende o papel e responsabilidade dos familiares, seja com práticas específicas de cuidado, seja com outras ações que apoiem os usuários identificados. Foi importante, contudo, manter algum grau de indeterminação nas perguntas, para que os entrevistados pudessem discorrer mais livremente sobre os temas, podendo assim expor de modo mais detalhado um saber implícito (Tedesco; Sade; Caliman, 2016). Busquei tratar essas questões levando em conta a produção coletiva do conhecimento sobre o tema da pesquisa e a possibilidade de construção de novos sentidos sobre as experiências vividas.

Ressalto ainda a importância do referencial metodológico esquizoanalítico para a redação da tese e a prática de escrita sobre a atuação na saúde mental. A aproximação dos dados com a bibliografia levantada segue um método rizomático, conforme indicado por Deleuze e Guattari (1995, p. 23), o que permite um apoio em ideias e conceitos prévios a partir de “uma linha de fuga que permita explodir os estratos, romper as raízes e operar novas conexões. Há, então, agenciamentos muito diferentes de mapas-decalques, rizomas-raízes, com coeficientes variáveis de desterritorialização”. Assim, tento desenvolver um raciocínio que contribua para a criação de práticas inventivas na rede assistencial de saúde mental e possíveis atuações e articulações nessa rede, conforme a complexidade dos problemas encontrados nesse campo.

A produção de conhecimento pretendida nesta pesquisa se faz pela indagação das possibilidades de criação e de reprodução nas relações entre atores e instituições pesquisados. O que compreendemos sobre a realidade, nesta perspectiva, é parcial e fragmentado, uma vez que não propomos uma totalização da realidade. Sentimos efeitos também dos nossos próprios processos de subjetivação (Paulon, 2005): meus, enquanto pesquisadora objetivada pela pesquisa; e dos atores participantes, que se auto-engendram ao longo das reflexões e construções de suas práticas. As circunstâncias para que hajam conexões e cortes nesses processos são rastreadas pelo método cartográfico, através de imersão no campo; acompanhamento das atividades instituídas nos serviços, que ocorrem com diferentes regularidades; entrevistas coletivas com familiares; entrevistas coletivas com técnicos das equipes; escrita e análise do diário de bordo.

Pensando no estatuto híbrido descrito por Penido (2015), de profissional e pesquisadora, julguei ser necessário, até mesmo como preceito ético e metodológico, analisar as formas de relação que assumi com as instituições que ocupo. Passei a utilizar de uma escrita diarística (Penido, 2015) sobre a pesquisa, podendo assim analisar minhas próprias implicações com a academia - enquanto local assumidamente prioritário de produção de conhecimento - com o campo de atenção em saúde mental e com a militância e a vinculação ao movimento social organizado. Pertencimento este, aliás, meu e de muitos dos meus pares, colegas e trabalhadores(as) participantes ou não desta pesquisa. Através dessa escrita pude entender melhor minhas motivações e expectativas com a pesquisa e com tais instituições, além de ressignificar, ao mesmo tempo, posicionamentos particulares na minha vida pessoal, alcançando, para minha surpresa, uma integração entre os movimentos da pesquisa e da vida individual e coletiva.

Muitos dos aprendizados que tive com os participantes ficaram mais claros também à medida que eu escrevia e revia tais escritas, as quais passei a compartilhar com alguns deles - especialmente com as pessoas de referência para a atuação com os familiares no campo - e com grupos de estudo e convivência à parte da pesquisa, com quem mantenho práticas de escrita como experimentações de si, numa metodologia que se tece a cada ciclo que vivemos juntos, seguindo tanto nossos afetos quanto as regras formais para tais produções. O que chamo de diário de bordo, portanto, trouxe à luz elementos que indicam endurecimentos, reproduções e possibilidades de outras ações, tanto dos problemas que se colocam no campo de modo explícito, quanto de outros que não são verbalizados ou abordados mas compõe, ainda assim, o campo de forças nas interações entre nós, diversos atores envolvidos nesta investigação.

O conceito de implicação, conforme abordado pela Análise Institucional (AI), nos serve como referência, portanto, através do que ele indica como a inclusão da “subjetividade de quem pesquisa como categoria analítica” (Paulon, 2005, p. 19). Esta autora apresenta as concepções de subjetividade que orientam o tipo de investigação inspirado na AI, nos permitindo considerá-la como algo produzido socialmente por formas múltiplas ligadas ao contexto cultural, e não como estritamente individual e associado a um sujeito fechado em si mesmo. Podemos considerar a implicação como “dispositivo de produção de conhecimento e de transformação” (Romagnoli, 2014, p. 50), e ainda como conceito que permite criar heterogeneidades, rastreando os processos pesquisados ao mesmo tempo em que consideramos nosso próprio posicionamento político. Fazendo dessa postura epistemológica uma característica enquanto agentes sociais implicados(as).

Com a aposta metodológica via pesquisa cartográfica, assim delineada, importa-me resgatar uma posição em relação aos jogos de poder existentes na realidade que se guia por um compromisso ético-estético, articulando proposições da esquizoanálise e da análise institucional. Busco analisar minha implicação de pesquisadora “com a instituição do saber científico, e sua abertura para criar zonas de indagações, de desestabilização que possam favorecer ao coletivo aflorar” (Paulon; Romagnoli, 2010, p. 96). E assim colocar em análise as relações que estabelecemos com o que nos constitui, do que nos situa nas instituições, nas redes de poder nas quais estamos inseridos. Não é exagero dizer como o processo, conduzido desta forma, provocou inúmeros deslocamentos em mim, em tal posição, a partir dos questionamentos e construção de outros modos de análise dos problemas colocados. Tanto o contato com o campo de pesquisa atual quanto minhas memórias de atuação na rede de saúde mental e na militância retornam com frequência, buscando modos de expressão que possam ultrapassar um “não dito” ligado ao período cronológico em que ocorreram. Ou seja, pude rever e repensar os significados das minhas ações também enquanto profissional e militante, associando-as às instituições em questão e aos posicionamentos dos meus pares nos diversos contextos. Reconheço, assim, outro modo de articular a pesquisa acadêmica com a vida em seus outros campos.

Em momentos em que senti dores e enrijecimentos no meu corpo, que refletiam modos como várias das minhas relações pessoais e profissionais aconteciam. Houve uma época em que eu tinha vergonha de falar sobre minha dedicação à dança, que pratico há mais de 25 anos, porque eu julgava que a julgavam como coisa supérflua, e no fundo trazia comigo uma espécie de ordem de que deveria “tratar as coisas sérias como coisas sérias”. Essa classificação faz do corpo, do sensível, um lugar hierarquicamente inferior e o conhecimento, o saber, como algo transcendente, que determina formas e que teria em si maior importância. Contrariamente a este tipo de classificação, temos como referência um uso de diferentes linguagens e disciplinas que se cruzam, de modo a considerarmos a ciência, a filosofia e a arte como formas de pensamento, objetos mentais que nos constituem como sujeitos (Deleuze; Guattari, 2010). Assim, dançar passou a ser experiência re-significada e valorizada como processo de criação e fruição do saber que o corpo tem sobre si e sobre o que nos afeta no mundo. Não que seja uma atividade idealizada. Ela se beneficia de um questionamento sobre como é conduzida, sobre como me relaciono com a mesma. Mas é algo que ajuda a criar espaço e condição para um devir em que eu advenha como outra pesquisadora, outra psicóloga, outra dançarina, outra militante, em formas-porosas inéditas que se criem a partir das condições vividas, pesquisadas e experimentadas.

Em um contexto de precariedade social de diversos grupos populacionais, com os quais lido no trabalho, especialmente, era como se eu não pudesse “perder tempo” com esse tipo de atividade. Eu estava, no fundo, e sem me dar conta, criando condições para o meu próprio adoecimento e um modo de subjetivação que não me deixava criar. A pesquisa, ao abordar saúde mental e direitos humanos, me permitiu estender a análise sobre minha própria forma de expressão artística, condizente com o movimento por uma libertação de um certo “desejo de manicômio”, no sentido de um desejo que procura controlar, hierarquizar, oprimir e controlar os movimentos da vida (Machado; Lavrador, 2001). Isso representa um deslocamento subjetivo com o processo, pois pude explorar a indissociabilidade entre desejo, luta, dança e pesquisa em seus atravessamentos, multiplicidades e intercessões entre diferentes planos, na busca por uma realidade com potencial criador. E a despeito das desestabilizações ocorridas neste percurso.

Esses aspectos me levam a refletir sobre os desafios que a convivência cotidiana com a loucura impõe. Seja em um contexto de trabalho, em partilha de vida familiar, ou onde for, é necessário estarmos abertos a interações não definidas por protocolos, com possibilidades de questionamento de práticas convencionais, de modo a não reproduzirmos lógicas autoritárias e coercitivas, para além da instituição ou papel social que representamos. As formas de controle e tutela para com os usuários das nossas políticas públicas talvez se relacione por formas semelhantes que mantemos conosco mesmos, em outras esferas da nossa sociabilidade. O que “implica analisar até que ponto se quer ou se pode encarnar esses desejos não manicomiais e esses desejos de direitos humanos em nossas vidas. Ou até que ponto somente se está sendo politicamente correto ao abraçar essas lutas” (Machado; Lavrador, 2001, p. 45). Assim, práticas e discursos baseados em estereótipos sobre a loucura levam a modos de relação que envolvem submissão das partes com menor poder, diminuindo as possibilidades de outras construções subjetivas menos culpabilizadas e mais potentes. Trata-se, portanto, de fazer das reflexões ferramentas sobre nossas práticas, considerando, porém, o pensamento como criação, “não vontade de verdade” (Deleuze; Guattari, 2010, p. 67). E assim ir criando cabimentos para os cotidianos compartilhados e suas infinitas multiplicidades afetivas.

Importante destacar, no entanto, que as mudanças na macropolítica brasileira, com a retirada da presidente Dilma Roussef, eleita em 2016, a partir de um golpe parlamentar; com as eleições de grupos políticos não ligados a causas sociais, à defesa das políticas públicas, e menos ainda, às demandas da saúde mental organizada na estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS); com as indicações de gestores pertencentes a grupos de disputa e interesses no campo da saúde pública e da saúde mental - tudo isso trouxe, entre 2016 e 2022, uma série de ameaças ao projeto da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e da luta antimanicomial, conforme demonstrado por Amarante e Nunes (2018). Ouvi inúmeras declarações recorrentes das pessoas militantes desta luta sobre a sensação de verem ser destruído o que lutaram tanto para construir.

As medidas legislativas e de financiamento do período citado resultaram na desconstrução das redes alternativas ao modelo hospitalar. Tendo sido possível constatar o desenvolvimento das mesmas, a partir dos primeiros anos da década de 1990 e com especial avanço no começo dos anos 2000, com ampliação do acesso e da cobertura da atenção primária, incremento de ações intersetoriais; nos últimos sete anos, no entanto, observamos mudanças macropolíticas, em que as orientações governamentais indicaram retorno à lógica de internação e de assistência com ênfase em ambulatório de especialidades, com previsão de aumento de financiamento para internações hospitalares e para dispositivos não mais territorializados, com propostas que privilegiavam isolamento e frequentemente a fé religiosa como cura (Onocko-Campos, 2019; Revadam; Scartezini, 2020; Delgado, 2019). Essa foi a conjuntura da pesquisa e da rede de atenção psicossocial brasileira, diante da qual considero importante refletir sobre suas condições de continuidade e a defesa do modelo substitutivo anteriormente proposto. Apesar de mudanças anunciadas a partir da eleição de um novo governo federal com início de gestão em 2023, há condições nas políticas que requerem mais tempo para terem outra organização e investimento.

Muitos(as) os(as) trabalhadores(as) são também militantes pela saúde mental e têm sentido na pele, ainda, as condições de trabalho tornadas mais difíceis. Com cortes de verbas, redução de insumos, não reposição de profissionais que saem de licença médica, licença maternidade, ou por aposentadoria, precariedade de contratos - pois são muitos os que não são servidores efetivos - cobranças de produtividade da gestão, alta demanda pela qualidade dos serviços e tantas outras dificuldades, comuns aos trabalhadores de outras regiões do País, que se relacionam à precarização do trabalho em diversos locais. Ocorre que, neste contexto, vemos novamente a dificuldade de propor uma análise das práticas, para pessoas que consideram arriscada a elaboração de uma crítica sobre como temos trabalhado, já que assim deixaríamos espaço e força para opositores ao nosso modelo, declaradamente antimanicomial e defensor do tratamento da loucura em liberdade. Vasconcelos e Paulon (2014) demonstraram bem como essas posturas têm gerado efeitos de cronicidade no movimento antimanicomial e como as práticas muitas vezes se colam à identidade da militância, sem espaços para questionamentos sobre os modos como temos nos relacionado: nós, trabalhadores, usuários, gestores e familiares que convivemos em coletivos e dispositivos diversos.

Eu tendo a pensar que o referido mal estar na militância se relaciona, também, aos modos como pesquisadores ligados à academia estiveram presentes no campo da saúde mental em momentos anteriores. Muitas foram as resistências em falar sobre as experiências passadas, quando pude conversar com diversos desses atores. Provavelmente devido à atribuição de problemas a pessoas específicas, personalizando as relações, de modo a nos cegarmos para as interferências que as instituições provocam em nós. Assim, são naturalizados os conflitos entre o campo da assistência em saúde mental e a academia, através de falas como “aquele(a) professor(a) é interessante, mas não sabe nada como funciona um CERSAM”; ou “mas a pesquisadora nunca trabalhou na rede” - que indicam, no mínimo, dificuldades de diálogo entre eles, quando não recusa explícita a situações de co-produção de conhecimento ou construção de espaços propositivos de discussão.

Nesse contexto de desqualificação generalizada sobre o fazer do outro - colegas de outros serviços da rede, coordenadores, estudantes, professores, pesquisadores, organizações políticas diversas - e de dificuldade extrema de articulação em defesa de um projeto comum, me vi, ao longo do percurso desta pesquisa, assumindo uma responsabilidade de realizá-la de modo crítico, desafiador, e com expectativa de contribuir para uma aproximação mais produtiva entre esses campos. Para isso faço uso de aporte teórico e metodológico que propõe análise dos planos da realidade de modo imanente, atrelando pesquisa e vida; associando o ato de pesquisar às marcas feitas em meu corpo e pela produção e mobilização para que ele se deixe vibrar (Liberman; Lima, 2015), na busca por outros modos de sentir e pensar as relações na rede de saúde mental.

E nesse percurso ocupo espaços diversos sem me identificar a nenhuma de suas funções específicas: na academia, sem pretensão de seguir carreira acadêmica; no trabalho na gestão municipal, priorizando o estudo; no movimento social, de modo distante, sem seguir discursos e práticas dominantes; no campo da pesquisa, ora ao lado de familiares, ora como trabalhadora, muitas vezes me misturando aos usuários... Sendo da rede sem vinculação única, específica. Em reuniões do Conselho da categoria profissional, a princípio para representar o movimento social, mas discutindo também conceitos filosóficos e sobre colheitas de jaboticabas. Procuro, assim, agir de modo diverso, conforme as situações e locais que frequento, enquanto desenvolvo ferramentas para cartografar os processos em andamento, me refazendo com vistas a construções coletivas potentes para mim e para os atores com quem componho tais relações.

Processos de subjetivação e modos de existência

Querida Adelaide. Só agora posso responder-te a carta que recebi há quase duas semanas. Justamente quando ela me chegou às mãos, acabava de ser ferido, ferimento ligeiro é verdade, mas que me levou à cama e trar-me-á uma convalescença longa. Que combate, minha filha! Que horror! Quando me lembro dele, passo as mãos pelos olhos como para afastar uma visão má. Fiquei com horror à guerra que ninguém pode avaliar… […] Ninguém compreende o que quero, ninguém deseja penetrar e sentir; passo por doido, tolo, maníaco e a vida se vai fazendo inexoravelmente com a sua brutalidade e fealdade (Barreto, 1983, p. 144).

Ter uma inspiração cartográfica é abordar também a subjetividade em seus movimentos e em sua complexidade. Pelo ponto de vista da esquizoanálise consideramos os modos de subjetivação como processos formados por componentes políticos, coletivos, individuais, institucionais e dinâmicos, produzidos por multiplicidades de componentes. A subjetividade é influenciada por dimensões históricas e sociais indissociadas, sem uma dimensão que se sobreponha a outra de modo hierárquico (Guattari, 1991). Esta é uma concepção que considera a subjetividade de modo ampliado ao que se convencionou na disciplina da psicologia, tradicionalmente, sem oposição de algo que seria individual versus algo da dimensão social. E assim temos definido certo modo de relação com o corpo, no sentido de considerá-lo a partir de seu poder de afetar e ser afetado por outros corpos; bem como uma consideração do desejo como produção.

Em um interessante percurso sobre as alianças conceituais entre a filosofia da diferença - destacadamente nas obras de Gilles Deleuze e a filosofia de Nietzsche e Espinosa -, Silva (2013) apresenta relações entre corpo e pensamento de modo a considerar um desenvolvimento correspondente entre as potencialidades do corpo e da mente. As ideias, no registro mental, se referem aos efeitos do que outros corpos, exteriores ao nosso, repercutem em nós. O pensamento é desejante e o corpo pensa (Silva, 2013), afetados que somos pelo que se passa entre as dimensões e por diversos agenciamentos e associações de planos que compõem a realidade. Esta, por sua vez, é “abordada por imanência e exterioridade, e o ‘meio’ emerge como a dimensão que sustenta os devires, que vai produzir agenciamentos fazendo eclodir o novo” (Romagnoli, 2014, p. 46).

Nesta pesquisa tenho visto como têm se realizado os modos de produção de subjetividade na rede de saúde mental, campo este que pode se beneficiar de uma análise das confluências entre a subjetividade e a cultura na criação dos mundos e micro universos dos atores envolvidos, favorecendo a criação de dispositivos que contribuam para a invenção de subjetividades polifônicas e mutantes: “Não há subjetividade sem uma cartografia cultural que lhe sirva de guia; e, reciprocamente, não há cultura sem um certo modo de subjetivação que funcione segundo seu perfil. A rigor, é impossível dissociar estas paisagens” (Rolnik, 1997, p. 28). Tais noções implicam em modos específicos de abordarmos os problemas da pesquisa, para darmos ênfase aos fluxos que atravessam os sujeitos ao mesmo tempo que produzem efeitos neles. Em nós.

Destaco também como os aparatos institucionais, com sua materialidade e sua simbologia ligada ao nosso universo cultural, têm funcionado, respondendo ao modo capitalista de produção e às formulações das políticas públicas correntes, ao mesmo tempo que geram determinadas condições para os modos de relacionamento entre os atores citados: familiares, trabalhadores, usuários, pesquisadores. Somos atravessados pelas instituições que representamos e por valores mais ou menos estabelecidos, para além de nós, influenciando nossas práticas de acordo também com o momento histórico que vivemos. Costa-Rosa (2013) indica, nesse sentido, uma leitura das instituições como lógicas de funcionamento, que têm a capacidade, no entanto, de contrapor práticas e discursos dominantes. Podemos constatar como as ações têm sido percebidas pela população, na avaliação dos participantes desta pesquisa, com a intenção de contribuirmos para uma discussão ética relacionada ao paradigma psicossocial que defendemos. Ainda sobre os processos de subjetivação, concordo com o autor, ao afirmar que “quando se trata do sofrimento psíquico, não se pode fazer disjunção entre ‘produção de saúde’ e produção de subjetividade” (Costa-Rosa, 2013, p. 68).

Alguns fragmentos literários atravessam o texto sobre a pesquisa de modo quase imprevisto. Diante de tantas leituras, tornou-se inevitável a indiscernibilidade entre “estados de afetação como experimentação do intensivo e multiplicação de alegrias ativas cujos efeitos são a produção de essências singulares” (Almeida, 2010, p. 13), tantas vezes provocados pela literatura ampla percorrida e pelos exercícios de escrita. Sustentar um dispositivo de pesquisa é feito, portanto, de várias estratégias, associadas a como vemos os sujeitos e as relações. Assim, usamos diferentes estratégias: entrevistas, idas a campos, diário de bordo, análise da implicação, metodologia cartográfica, discussões informais sobre o tema da pesquisa com companheiros e militantes da saúde mental - incluindo usuários da rede e trabalhadores - experimentações no grupo de estudos em filosofia, escritas experimentais sobre si, na busca de encontros e composições que aumentem a potência de agir e pensar, a favor da pesquisa e, reciprocamente, a favor da vida.

Tais dispositivos podem favorecer a construção de um corpo apto a cartografar, que possa se sustentar para as variações de forças e formas acompanhadas durante a pesquisa, sem perder de vista os objetivos desta: “O trabalho do cartógrafo é assim um trabalho de produção permanente de si, na experimentação de um corpo que, continuamente, se configura nos encontros com outros corpos” (Liberman; Lima, 2015, p. 190). Procedimentos que nos acompanharam na trama tecida entre as famílias, a política pública de saúde mental, as equipes, dentre outros. Complexidades desveladas no corpo da tese que derivou deste percurso. Sementes que querem se espalhar para hibridizar tantos campos quanto for possível, se campos, vetores e sementes assim intencionarem, conjuntamente. Enquanto seguimos buscando outros modos de escrita sobre o que nos acomete, sobre nossas existências.

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Notas

1 O presente artigo foi adaptado da tese de Doutorado intitulada “Por políticas de multiplicidade entre famílias e equipes de saúde mental” (Lima, 2021), por sua vez realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de financiamento 001.

Notas

2 Centros de Referência em Saúde Mental: como são chamados os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) em Belo Horizonte. Compõem a Rede de Atenção Psicossocial no Município.
3 Equipamento de referência do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), política pública que faz parte da organização estatal para prover seguridade social, conforme previsto na Constituição Brasileira de 1988.
4 O nome do serviço e os nomes próprios citados são fictícios, conforme sugerido pelos parâmetros éticos vigentes e pactuado com as pessoas participantes, as quais preferiram ter suas identidades não nomeadas.


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