Dossiê
Recepción: 29 Marzo 2021
Aprobación: 10 Agosto 2021
DOI: https://doi.org/10.33871/nupem.2021.13.30.214-234
Resumo: Desde março de 2020, a pandemia do novo coronavírus acarretou impactos nos ritos de morte e na vivência do luto no Brasil. Com a publicação do “Manual de manejo dos corpos” pelo Ministério da Saúde, expressões ritualizadas da morte foram abreviadas e certas fases do rito suprimidas. Neste artigo apontamos características dos ritos funerários e argumentamos que a interferência no ciclo ritual acarreta desdobramentos para os enlutados e a coletividade, sendo mais intensos quanto maior o distanciamento do modelo vigente no contexto urbano. A interferência nos conteúdos e fases dos rituais voltados aos mortos pode lançar os sobreviventes em um processo de luto desordenado, gerando a possibilidade de repercussões futuras.
Palavras-chave: Morte, Ritos fúnebres, Luto, Covid-19.
Abstract: Since March 2020, the new coronavirus pandemic has had an impact on death rites and the experience of mourning in Brazil. From the publication of the “Dead body management manual” by the Ministry of Health, several ritualized expressions of death have been abbreviated and certain phases of the rite have been suppressed. In this article, we point out characteristics of the funerary rites and argue that the interference in the ritual cycle can have consequences for the mourners and for the community, being more intense the greater the distance from the model practiced in the urban context. The interference in the contents and phases of rituals for the dead can throw the survivors into a disorderly mourning process, generating the possibility of future repercussions.
Keywords: Death, Funeral rites, Mourning, Covid-19.
Resumen: Desde marzo de 2020, la nueva pandemia de coronavirus ha tenido un impacto en los ritos de la muerte y la experiencia del duelo en Brasil. Con la publicación del “Manual de manejo de cuerpos” por parte del Ministerio de Salud, se abreviaron las expresiones ritualizadas de muerte y se suprimieron ciertas fases del rito. En este artículo señalamos características de los ritos funerarios y argumentamos que la interferencia en el ciclo ritual provoca consecuencias para los enfermos y la comunidad, siendo más intensa cuanto mayor es la distancia del modelo actual en el contexto urbano. La interferencia en los contenidos y fases de los rituales dirigidos a los muertos puede arrojar a los supervivientes a un proceso de duelo desordenado, generando la posibilidad de repercusiones futuras.
Palabras clave: Muerte, Ritos funerarios, Dolor, Covid-19.
Introdução
A partir de março de 2020, a pandemia do novo coronavírus acarretou modificações nos ritos de morte e nas vivências dos processos de luto. No Brasil, com a publicação do “Manual de manejo dos corpos” pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2020b), obrigatoriamente há redução ou ausência da possibilidade de realização de tradicionais cerimônias de despedida com liberdade para manifestações de sentimentos nos rituais fúnebres. Neste artigo apresentamos as características de ritos funerários e do processo do luto, de maneira a ressaltar que as interferências nos ritos comprometem o processo de luto. Tais mudanças propiciam dificuldades de elaboração das perdas, com repercussões futuras para os enlutados.
A análise foi realizada com base em revisão bibliográfica a respeito das teorias de ritual, num aporte conceitual que entende as cerimônias fúnebres como práticas que visam ressignificar a morte, inserindo o morto numa nova condição social e dando aos vivos um espaço-tempo de compartilhamento das emoções. A metodologia consiste na análise de três casos de morte divulgados em reportagens da imprensa a partir dos quais são realizadas denúncias dos impactos dos protocolos de manejo dos corpos dos mortos da Covid-19. Nas reportagens é possível perceber de que forma o impedimento de aproximação e cuidado com os cadáveres, a impossibilidade de realização dos cerimoniais de velório e outras específicas dos respectivos ritos fúnebres são lamentados e atingem brasileiros e brasileiras com práticas funerárias distintas. Argumentamos que o abreviamento ou a supressão de fases e etapas dos ritos de morte, acarretado pela adoção das diretrizes de biossegurança pandêmicas, afeta não só a realização dos ritos funerários, mas também a continuidade da vida social, na medida em que priva os sobreviventes de costumeiros mecanismos simbólicos para o apaziguamento do luto e o posterior retorno ao cotidiano.
O artigo está dividido em três seções: na primeira apresentamos um panorama do surgimento da pandemia do novo coronavírus, com foco em dois casos. O primeiro refere-se à aplicação da normativa para sepultamento de adeptos do Candomblé, e o segundo é concernente ao desespero de mães Yanomami, em face do falecimento de seus filhos. Na segunda seção apresentamos as características dos rituais de morte, para enfocar na terceira seção a abreviação e supressão de fases nos rituais de morte, na vigência da pandemia de Covid-19 no Brasil. Por fim, nas considerações finais abordamos uma experiência familiar de morte no universo urbano com tentativa de recomposição ritual apontando as prováveis consequências das modificações impostas pelo protocolo biossanitário, indicando possibilidades de atenção e elaboração do luto em tais condições.
Iniciamos esta reflexão com a análise dos rituais de morte no Brasil contemporâneo a partir de dois casos polêmicos ocorridos no contexto da pandemia de Covid-19.
Morte, cosmologia e ritualização: exame de dois casos
Em 3 de abril de 2020, duas semanas após as primeiras mortes por Covid-19 no Brasil, a reportagem de Marina Hortélio divulgou a ação da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-ameríndia (AFA) junto ao Ministério Público do Estado da Bahia (MPE/BA) e ao Ministério Público Federal (MPF), solicitando normativa referente ao respeito à tradicional prática de sepultamento de adeptos do Candomblé. Tratava-se de prevenir a cremação de um seguidor dessa crença morto pelo coronavírus, se houvesse norma oficial de incineração dos mortos pela doença. Embora os índices de óbitos no Brasil estivessem em seu início, a iniciativa da AFA foi motivada pelo temor da cremação compulsória, a exemplo do que se passou na Itália1, pelo colapso do sistema funerário. A medida também proibia o sepultamento em gaveta (Hortélio, 2020).
Segundo Leonel Monteiro, presidente da AFA, a mobilização baseou-se na crença de que após a morte de um iniciado, o corpo deve ser enterrado no chão, para “fechar o ciclo da vida de forma correta”. Cremar o corpo é “violação grave” do preceito de depósito do morto na terra, para que seu espírito “siga o seu caminho” (Hortélio, 2020, s./p.). Obaluaê, orixá senhor da terra, “é o responsável por transformar o corpo em nova matéria e entregar o espírito do morto à Iansã” (Hortélio, 2020, s./p.). O não cumprimento deste preceito pode causar problemas espirituais e psicológicos para familiares do iniciado. Ainda segundo Monteiro, a cremação de um sacerdote “pode trazer problemas para toda a comunidade pelo desequilíbrio do Axé” (Hortélio, 2020, s./p.), pois uma etapa do rito não é cumprida. O mesmo motivo orienta que o corpo não seja depositado em gavetas2.
A base dessas crenças é compartilhada há séculos por seguidoras e seguidores do Candomblé no Brasil, que acreditam em dois planos da existência, o Aiê dos vivos e o Orun dos deuses, espíritos e mortos (Prandi, 2005; Ziegler, 1977; Santos, 1984). O corpo material se decompõe com a morte, é reintegrado à natureza; o que justifica a inumação em terra (Prandi, 2005), como forma de aproximação do sepultamento em florestas, nos antigos reinos africanos (Ziegler, 1977). Segundo o presidente da AFA, os estudiosos do Candomblé e das práticas fúnebres de matriz africana argumentam que, nessa cosmologia, o sentido dos ritos funerários é desfazer vínculos para liberar o espírito, o Egun, das obrigações com o mundo do Aiê, inclusive com a própria religião. Nesse processo, os laços e compromissos construídos na iniciação são desfeitos, promovendo a liberação das partes espirituais da pessoa. Os objetos sagrados do morto são desfeitos, desagregados, quebrados e despachados (Prandi, 2005; Ziegler, 1977; Santos, 1984). Os Orixás vinculados à morte e aos mortos ocupam lugar de destaque nessa concepção, especialmente Iansã, guia encarregada de conduzir os mortos para o Orun (Prandi, 2005). Para o iniciado, a morte não significa a extinção total ou o aniquilamento do ser, mas a mudança de plano de existência e status (Santos, 1987).
Para o presidente da AFA, no caso da inumação, o desequilíbrio do Axé, pela queima de etapa do rito funerário, pode ser compreendido no âmbito dos interditos da cosmologia. Concebida como tabu, a cremação é rejeitada. Segundo o mito fundador, a terra foi a matéria para criação do ser humano por Olorun. Como Iku é o único capaz de levar a Olorun a lama usada para modelar o homem, a ele foi determinado que a reposicione a qualquer momento, conduzindo-o de volta. Nesse mito fundador, Iku é associado à morte, considerada como retorno e devolução de cada pessoa à terra, origem da vida (Santos, 1987; Oliveira, 2012).
O desequilíbrio do Axé pode ser interpretado como perturbações, doenças, alergias, desentendimentos, angústias e sofrimentos que se instalam em uma comunidade do Candomblé, quando um preceito é rompido. Pode se manifestar no corpo de um iniciado, por se tratar do principal elemento de ligação entre o ser humano e o sagrado, concebido como morada do orixá e porta de comunicação entre humanos e divindades. Na cosmovisão dos adeptos do Candomblé, ele é o local propício para a transmissão de Axé, energia vital. Ao mesmo tempo, também é local de manifestação do desequilíbrio do Axé, por desconfortos, perda de equilíbrio e doenças (Niel; Pereira, 2019; Mandarino; Gomberg, 2013).
A mobilização judicial da AFA no Estado da Bahia indica a importância atribuída pelos membros do Candomblé ao mito fundador, e o temor das consequências do não cumprimento do interdito. Francesca Bassi (2012, p. 171) cita o “encosto dos espíritos” como uma contaminação por energia negativa, nessa concepção. Mary Douglas escreveu que para determinada coletividade, a infração de comportamentos proibidos provoca uma situação de impureza em certas etapas da vida social e ritual, o que possibilita um entendimento dessas crenças (Douglas, 2012). Para Bassi (2012, p. 171), esta teoria pode ser “aplicável à concepção do povo de santo sobre a necessidade de manter estados de pureza temporária em certas condições de fragilidade marcadas por mudanças existenciais ou por indefinição simbólica”. Portanto, é preciso preservar o equilíbrio do Axé e evitar contaminação pelas energias negativas associadas à violação de um interdito.
A medida adotada pela AFA se refere a um ato de antecipação, para evitar traumas entre enlutados, ocasionados pela quebra de preceitos dos ritos fúnebres do Candomblé. A seguir analisamos outro caso, concernente a uma situação ocorrida em outro grupo social. Trata-se do drama vivido em maio de 2020 por um grupo de mães Sanöma, da etnia Yanomami, publicizado pela jornalista Eliane Brum, em junho de 2020. Habitantes da aldeia Auaris, em Roraima, fronteira com a Venezuela, três mulheres que não falam português e seus bebês foram levadas da aldeia para a Casa de Saúde Indígena (CASAI) em Boa Vista, por suspeita de pneumonia dos filhos. Elas foram contaminadas pelo coronavírus na clínica, junto com os bebês, que morreram e foram sepultados no cemitério da cidade. Não havia tradutor, ocorreu falha na comunicação das autoridades com as indígenas, para esclarecer a localização dos corpos dos bebês. As mulheres não entenderam a razão do sepultamento dos corpos de seus filhos mortos. Elas se desesperaram, pois não conseguiram saber onde eles estavam. As autoridades não aventaram a ideia de levar os corpos para a aldeia, para os rituais fúnebres. O desespero frente à dificuldade de localização dos corpos pelas autoridades se justificava por que, para os Yanomami, os mortos não devem ser enterrados, mas cremados (Brum, 2020).
Entre os Yanomami, os ritos fúnebres duram cerca de um ano, que é o tempo de cultivo da banana, ingrediente principal na cerimônia funerária. Quando ocorre uma morte, o pai, irmão ou filho do morto inicia o trabalho de roça, para plantação de bananas. Quando os cachos crescem, as outras aldeias são convidadas a participar da cerimônia fúnebre na aldeia enlutada, com a meta de ingestão de um mingau da banana contendo as cinzas do falecido, num banquete com muitos alimentos (Ramalho, 2008).
No intervalo de tempo entre a plantação de bananas e a colheita dos frutos há etapas intermediárias, que incluem: início do luto com lamentações junto ao cadáver após a morte; exposição do corpo para despedida e choro de parentes e afins, inclusive de outras aldeias; manutenção do corpo em posição fetal, em um cesto produzido para a ocasião, em local elevado no alto de um jirau, para que não seja devorado por animais, pelo tempo necessário para as carnes apodrecerem; separação dos ossos dos restos da carne (sepultada longe da aldeia, em um lugar em que não se volta mais); guarda dos ossos em um cesto preparado especialmente, até a cerimônia do banquete. Quando as bananas estão prontas para colheita, são enviados os convites para membros afins de outras aldeias, para participação na última etapa da cerimônia fúnebre, que também conta com caça e mandioca para acompanhar o mingau. Antes deste momento os ossos são cremados. Após seu esfriamento, são pilados até se tornarem cinzas; guardadas em recipiente e local especial na aldeia, para consumo no grande banquete, com longa duração e convidados. No dia seguinte, os visitantes retornam às suas aldeias e os parentes e afins do morto encerram o luto. A partir de então não há mais choro por quem faleceu e seu nome não deve mais ser pronunciado, sob risco de seu “espírito” assombrar a coletividade (Ramalho, 2008; Guimarães, 2010).
Para os Yanomami, o sentido da cremação, enquanto prática de despojo do morto, não responde apenas à necessidade de extinção física e biológica de alguém. Antes, trata-se de um processo de dissolução do “ser social” inserido naquela comunidade. A morte marca um “tempo forte”, é especialmente elaborada, tanto do ponto de vista social como no plano simbólico, no longo e complexo ritual fúnebre, que possibilita o desligamento entre vivos e mortos, para uma retomada da vida cotidiana. Sem o corpo, vertido em cinzas, não é possível fechar esse ciclo. Assim, famílias e comunidade são afetadas em seu cotidiano, por acreditarem que “o espírito” do morto permanece entre os vivos, com a capacidade de prejudicá-los. Considerado o ponto alto dos ritos funerários, a ingestão das cinzas é etapa fundamental. Na mitologia Yanomami, a morte3 é resultado de agressão ou predação (humana ou não), como devoração, uma forma de canibalismo entendido como condição para “salvação” dos mortos, e o estômago é a sepultura última (Ramalho, 2008). Não por acaso, o ritual funerário Yanomami é concluído após a cerimônia de ingestão das cinzas.
Tais elementos explicam o desespero das mães Yanomami. Segundo o líder Yanomami, Dario Kopenawa, afirmou Eliane Brum, o sepultamento dos bebês Yanomami sem prévia consulta às suas mães é um “enorme desrespeito”. Nem ele, como líder, foi informado sobre o local de sepultamento dos corpos, o que impediu a tentativa de desenterrá-los, para reconduzi-los para sua aldeia, onde vivem seus parentes. Kopenawa afirmou entender a necessidade dos protocolos de biossegurança, mas, ao mesmo tempo, precisava receber informações sobre os procedimentos adotados pelas autoridades, como: o tempo de sobrevivência do vírus no corpo, para esclarecer a comunidade. O desconhecimento acarretou a demanda de um protocolo indígena para os mortos por Covid-19. Ainda que não fosse possível higienizar os cadáveres após o óbito, para levá-los em segurança para a aldeia, que ao menos pudessem cremá-los na cidade, para condução das cinzas à comunidade, para os rituais funerários. Entretanto, não há crematório em Boa Vista (Brum, 2020).
Os casos analisados demonstram como a morte, os rituais e o processo do luto consistem em eventos imbricados, que dependem do contexto e das condições sociais. Tal associação não ocorre somente em comunidades com determinada crença, vinculada a uma cosmologia ou a certos mitos fundadores. Os nexos também estão presentes nas zonas urbanizadas de cidades contemporâneas, como veremos adiante. Portanto, não se trata de fenômeno específico e sensível para determinados grupos étnicos ou populacionais. A não realização de funerais é relevante, no que tange à possibilidade de dificuldades de elaboração individual e coletiva de perdas. No próximo item enfocaremos aspectos elementares dos rituais de morte, com base em alguns teóricos do rito.
Rituais de morte: aspectos gerais e fases
Os rituais de morte consistem em procedimentos individuais e coletivos, mais ou menos padronizados e codificados, por meio dos quais vivenciamos a finitude. Por intermédio de seus mecanismos e conteúdos buscamos entendimento e elaboração individual e coletiva da perda, o que possibilita imaginar o fim da própria existência. Esses rituais envolvem expressões corporificadas (verbais, gestuais ou posturais), tais como fórmulas, cantos, lamentos, gestos, gritos, choro, orações (Mauss, 1921). Os ritos funerários também provocam uma produção e expressão de variados sentimentos (Mauss, 2003). Eles se desenvolvem a partir de um “contexto de costumes sociais, práticas históricas, e rotinas do dia a dia” (Bell, 1992, p. 71) e são acionados por um único fator, em um momento no tempo e no espaço. Os ritos de morte são “universais da humanidade”4 (Bendan, 1969).
Embora variem significativamente entre as distintas culturas, os rituais de morte contam com três objetivos principais (Thomas, 2000). Em primeiro, se dirigem tanto aos vivos quanto aos mortos. É por intermédio dos rituais funerários que os vivos externalizam os sentimentos diante da perda, e efetuam procedimentos para integrar os mortos em um lugar social. Se a morte é uma passagem, apenas morrer não é suficiente para ultrapassar a fronteira entre o mundo dos vivos e o dos mortos. É preciso que os sobreviventes aceitem a nova condição do falecido. Um segundo aspecto é que os rituais funerários permitem aos sobreviventes uma expressão emocional vinculada ao morto e à morte. Em terceiro lugar, o ritual fúnebre serve à coletividade, que perdeu um membro e está fragilizada. O ritual é uma ferramenta contra o poder invencível da morte pelo qual, para diferentes culturas, o falecido não desaparece, renasce (Bussières, 2007).
Para alguns autores, foi o enfrentamento da morte que propiciou nossa constituição enquanto humanos, quando nossos antepassados cruzaram a fronteira da natureza para a cultura5 (Tylor, 2005 [1871]; Morin, 1970; Rappaport, 1999). Controvérsias evolucionistas à parte, embora o conceito de ritual não se restrinja contemporaneamente àquelas práticas associadas à repetição e ao padrão6 (Segalen, 2002), vivência coletiva da finitude se dá a partir de “trilhas de sentido”7, específicas em cada universo cultural. A partir desta compreensão, podemos elencar algumas características dos ritos de morte, para indicar que a retirada de elementos, o abreviamento ou a supressão de etapas durante a pandemia do coronavírus no Brasil têm propiciado aos sobreviventes uma experiência fúnebre desorganizada e frustrada.
O que dá início a um rito fúnebre é a decretação da morte. No entanto, “se a morte é universal, as formas de vivenciá-la variam enormemente” (Borgstrom, 2017, p. 1). Chamamos atenção para a variedade de formas culturalmente distintas de demarcação do momento e do modo como acontece uma morte. Algumas vezes, a morte social8 (Sudnow, 1967; Borgstrom, 2017) é decretada antes da falência do corpo - como no caso de doentes terminais ou com doenças neurológicas degenerativas (Sudnow, 1967; Menezes, 2006) -, quando os ritos de despedida são iniciados antes da morte biológica. O desaparecimento completo do morto do convívio com os viventes pode ser reconhecido somente depois da morte biológica - como no caso da “desfeitura do santo” no Candomblé, em que o rito funerário é realizado em um ciclo com duração de semanas. O corpo do morto deve ser reintegrado à terra (Cruz, 1995; Prandi, 2005). Já na alteridade radical indígena bororo, por exemplo, o funeral começa com o moribundo ainda convalescente, recebendo as “marcas clânicas9”, ao passo que para os Yanomami, a decretação da morte só ocorre com a ingestão das cinzas do morto, cujo nome não deve mais ser pronunciado (Novaes, 2006; Ramalho, 2008).
Como experiência coletiva, os rituais de morte são iniciados a partir do momento em que os vivos tomam conhecimento da morte e sentem-se culturalmente impelidos a seguir aquelas “sensibilidades” e orientações aprendidas em experiências anteriores de término da vida (Van Gennep, 1977). Segundo Randall Collins (2004), um ritual tem quatro condições iniciais: duas ou mais pessoas estão fisicamente juntas no mesmo lugar e se afetam mutuamente por sua presença corporal; os participantes do ritual sabem quem está inserido ou excluído; estão com a atenção voltada para um objeto ou atividade comum (foco mútuo); e buscam uma experiência emocional. É a vivência como “drama social”10 que caracteriza os ritos de morte como ritos repetitivos, cujos cerimoniais são delimitados (Turner, 1957).
Os rituais de morte contam com etapas. Embora os ritos fúnebres sejam compreendidos como processos complexos, com formas e intensidades variáveis, a passagem pelas fases é coletiva, conduzindo à compreensão do grupo acerca das mudanças após a conclusão de uma vida. Para Van Gennep (1977), as fases dos ritos são três: separação, margem, agregação. Nos rituais de morte, a etapa inicial é aquela em que os sobreviventes iniciam procedimentos a partir dos quais constroem e elaboram um novo status para o falecido - o que se prolonga na fase de margem. No último período do ritual, o processo de agregação do morto é finalizado, quando os sobreviventes são desobrigados de qualquer atividade referente ao morto. A passagem pelas fases propicia uma aceitação da mudança provocada pelo falecimento. Um ritual tem duas grandes partes: na primeira, o corpo do morto é central. A transformação da matéria pela decomposição exige providências imediatas, como: inumação, cremação, antropofagia. A segunda grande fase diz respeito aos sobreviventes próximos ao morto, quando há um trabalho de recomposição de suas posições sociais, assim como dos sentimentos associados à perda - são os ritos de luto (Van Gennep, 1977).
No Brasil contemporâneo urbano, apesar da existência de múltiplas possibilidades criadas pela diversidade cultural, as fases dos ritos de morte foram englobadas por mecanismos burocráticos do Estado11. Em geral, o corpo deve ser levado do hospital à cova em prazo restrito, geralmente de vinte e quatro horas (Mattedi; Pereira, 2007). No último meio século, outros fatores também influenciaram a formatação dos ritos urbanos, principalmente em ambientes metropolitanos, processando uma espécie de “sequestro da experiência de morte”12 (Stanley; Wise, 2011, p. 3). Um intenso processo de hospitalização e de intervenção médica, com um crescimento de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e da medicalização da morte, que prolonga o último período de vida, com uso de recursos medicamentosos e tecnológicos (Menezes, 2004). A disseminação de agências funerárias contribuiu para uma retirada progressiva da gestão dos rituais pelas famílias, e pela inserção de uma lógica comercial nas relações de morte (Neves; Damo, 2016; Veras, 2015). Apontamos, ainda, a redução da mortalidade infantil e o aumento da expectativa do tempo de vida, fatores que geraram um progressivo distanciamento da ideia da morte e do morrer, no século XX (Ariès, 1949; Elias, 2001).
Com os procedimentos burocráticos do Estado, a especialização das áreas e a diversidade cultural, um rito funerário urbano se divide nas fases de: cerimonial, procissão e enterro/cremação13. Os ritos preliminares são marcados por dois aspectos: a manipulação do corpo e a reunião dos enlutados. Nesta primeira etapa, os vivos veem o cadáver (quando exposto) ou o caixão, e materializam a finitude daquela pessoa. É quando são realizadas intervenções no corpo, e há seu processo de decomposição14 (Neves, 1998; Cruz, 1995). Nestes cerimoniais, os enlutados se despedem do falecido e se reúnem, expressando sentimentos. Ficar perto do corpo, contar histórias, chorar, lamentar, reclamar, escarificar-se. Embora as ações e emoções concernentes ao morto variem, a convivência por algum tempo com a matéria sem vida propicia uma elaboração da metamorfose daquele com quem se conviveu.
Há então um cerimonial, quando os vivos se expressam formalmente em relação ao morto: culto evangélico, missa católica, desfeitura do santo no Candomblé. Na cerimônia há ordem, palavras adequadas, músicas, orações e encomendações. Aquele que jaz é o personagem que sai do convívio, cuja morte é coletivamente elaborada. Alguns cerimoniais são finalizados diante do cadáver, enquanto outros são prolongados (Cruz, 1995; Vilaça, 1998; Novaes, 2006).
Nas metrópoles contemporâneas, a procissão ou o cortejo até a sepultura, na inumação, corresponde à condução do defunto ao destino final, para que desapareça. O modelo mais praticado de despojo no Brasil é o enterramento, com um crescimento do número de crematórios e gavetas no século XXI15. Na procissão, os sobreviventes permanecem próximos, para reordenação do vazio social produzido pelo falecimento. A procissão oferece aos vivos a oportunidade de confronto com o espaço da morte - seja mata, cemitério, rio ou crematório. Assim, aquele que viveu deixa definitivamente o convívio com os vivos. O ato de conduzir o morto propicia um processo de materialização daquela morte que se iniciou no velório seja consolidado. Aproxima-se a despedida final.
No despojo do corpo há uma agregação do morto à nova condição (Alves, 2016). É o instante final de despedida e a última oportunidade de visualização daquele corpo. Seja para ser enterrado, cremado ou engavetado, o enlutado sabe que este é o último momento daquela convivência corporal (Cavalcanti, 2004)16. No local em que o corpo será depositado são faladas as últimas palavras, cantadas músicas, mensagens reveladas e rezas proferidas. Jogar terra, flores, pipoca, milho cozido e/ou outros alimentos/objetos sobre o caixão constituem algumas formas de despedida.
Após os ritos de inumação, resta aos sobreviventes passar pela fase de luto. O processo de luto - como formulado por Freud (2011) - envolve duas modalidades de configuração: uma elaboração bem-sucedida, com passagem pela dor da perda; ou a melancolia, permanência de sentimento de tristeza. Estudos posteriores à produção freudiana evidenciam a existência de múltiplas possibilidades de condução do processo de luto (Parkes, 1998; Kübler-Ross, 1969). Segundo profissionais da saúde mental especialistas neste processo, no luto, os laços com o defunto são reconfigurados de modo permanente, sem regras universalmente válidas. Durante os ritos de luto, os sobreviventes podem ser submetidos a obrigações para sua separação, purificação e incorporação a um novo estatuto (Hertz, 1905). A literatura sobre o tema aponta procedimentos considerados como manifestações de luto, que incluem afastamentos entre vivos e mortos (Pinezi, 2009) ou comunicações efetivas, iniciadas tanto pelos enlutados quanto pelos que morreram (Reesink, 2003; Soares, 1990; Cavalcanti, 2004). Assim, a morte, a inumação e o luto são processos interligados, que finalizam um ciclo. A supressão ou redução de uma etapa pode acarretar consequências para os enlutados.
O ritual de luto tem duas dimensões (Colín, 2005; Di Nola, 2007). A primeira é externalizada por diversas expressões, como cantar e chorar o morto, visitar parentes para condolências, isolamento por um período, vestimentas de cores específicas por um tempo determinado17. A segunda dimensão dos ritos de luto é subjetiva e vivenciada mais intensamente pelos familiares e próximos do morto, na elaboração da perda. Após um período de duração variável, o luto é finalizado e os enlutados são reintegrados ao cotidiano social.
No entanto, não se deve reduzir a dimensão subjetiva do luto ao aspecto psicológico ou afetivo (Colín, 2005), pois a subjetividade é um constructo dependente da posição social da/o enlutada/o e da/o morta/o; intimamente conectada às formas de fala, pensamento e interpretação do mundo, além da intrínseca relação com o grupo de pertencimento. Portanto, o luto tem componentes sociais e sua conclusão não depende somente da psique individual.
Nos rituais de luto é fundamental uma construção de caminhos para uma superação daquela morte, conservando a memória do falecido e possibilitando sua transformação de status em antepassado (Di Nola, 2007). Quando esse processo é finalizado, a/o enlutada/o retoma suas atividades. Algumas áreas de sua vida podem sofrer transformações marcantes, com a ausência do morto e das recomposições imprescindíveis, desdobramentos desta morte. Por vezes, há dificuldades para o retorno à normalidade, quando a imagem ou a lembrança do morto ultrapassam os limites culturalmente impostos pela morte. Essa situação é considerada por profissionais de saúde mental como “luto patológico” ou “complicado”, passível de desestabilizações do enlutado, com emergência de enfermidades, desestruturação familiar, alterações da vida profissional, repercussão em projetos de vida (Freud, 2011; Parkes, 2009; Kübler-Ross, 1969; Santos, 2017; Machado; Menezes, 2018).
Essa manifestação de luto patológico acontece quando alguma etapa associada aos rituais de morte não é realizada conforme esperado. Como as fases do ritual estão interligadas (Van Gennep, 1977), não realizar alguma etapa pode acarretar que o ciclo do rito não se conclua. Um motivo principal para falha do rito é o não acionamento das redes de relações sociais. Faltar à exposição do morto, como o velório ou não o realizar pode ser traumático para os sobreviventes - como no caso das mães yanomamis, sem ver os corpos dos filhos, ou da psicóloga que não velou o filho. Sem uma presença corporal, os detalhes da experiência, como posturas ou expressões emocionais não são percebidos (Goffman, 1967). Quando os vivos não conseguem se despedir do falecido ou quando as relações não são finalizadas satisfatoriamente há frustração. O atual contexto pandêmico da Covid-19, demandou a elaboração de protocolos de biossegurança com vistas e evitar a propagação da contaminação, que implicaram significativas alterações sobre a realização de rituais funerários ao controlar ou suprimir as cerimônias fúnebres de despedida.
Abreviação das fases e supressão de conteúdos nos ritos de morte
A “Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus” (Brasil, 2020a)18 foi decretada no Brasil em fevereiro de 2020. A gestão da pandemia ficou sob responsabilidade do Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública que, em fins de março de 2020, publicou o “Manual de manejo de corpos no contexto do novo coronavírus Covid-19” (Brasil, 2020b). O manual estabeleceu protocolos para evitar contaminação de profissionais de saúde.
Entre as medidas prescritas pelo manual, algumas afetam diretamente os ritos de morte. Dois aspectos dizem respeito aos cadáveres e reuniões de enlutados. As diretrizes da Saúde Pública na gestão da pandemia acarretaram supressão e encurtamento de fases dos rituais de enfrentamento da morte. Diante dessa condição, os esquemas habituais seguidos pelos sobreviventes após um óbito foram interditados; o que lançou os enlutados em uma experiência desordenada.
A manipulação do corpo é elemento central em rituais de morte. A falência física demarca o início do ritual, responsável pelo processo de desaparecimento e encaminhamento dos restos mortais, ao mesmo tempo em que reserva outro lugar social para o falecido. Diversos estudos, como o de Menezes e Gomes (2011) comprovam a centralidade dos corpos nas exéquias. Segundo distintos sistemas simbólicos, produzem uma transformação do status de quem viveu. Em determinados grupos sociais estudados, os ossos e a carne do defunto devem ser cuidadosamente separados (Hertz, 1907), o corpo deve ser enterrado (Cruz, 1995), queimado (Chaunu, 1978; Ramalho, 2008; Guimarães, 2010) ou ingerido (Vilaça, 1998; Ramalho, 2008; Guimarães, 2010). A variação das formas de cuidado do corpo é extensa. Buscamos aqui chamar atenção ao fato que, ao retirar dos familiares a convivência e os cuidados com o corpo, as diretrizes da Saúde Pública inviabilizaram processos de significação complexos, responsáveis por decretar uma morte.
Há também que se chamar atenção para as normas da Organização Mundial de Saúde (OMS), no Guia de “Prevenção e controle de infecções para o gerenciamento seguro de um cadáver no contexto do Covid-19” (OMS, 2020), que afirmam que o cadáver não é fonte de transmissão de contaminação19. Todavia, o manual brasileiro impõe um distanciamento rigoroso entre os vivos e os corpos dos mortos por Covid-19, restringindo a visualização do cadáver, interditando toques no morto e aproximação dos vivos com seus mortos. Acrescente-se a prescrição de envolvimento do cadáver em três camadas de plástico. Nas diretrizes brasileiras, a especificação é sobre o fornecimento de explicações aos familiares sobre o trato dos corpos (Brasil, 2020b), e o impacto pela não aproximação, toque e visualização do cadáver é notável.
A única oportunidade de visualização do corpo descrita no documento é no hospital, quando ocorre o óbito. Os restos mortais podem ser reconhecidos por um familiar. O documento sugere que o reconhecimento seja por fotografia. Esta determinação atingiu as possibilidades de expressão e entendimento das circunstâncias associadas à morte. Afinal, o ato de observar o cadáver possibilita aos vivos uma consciência sobre a morte do familiar. Visualizar e analisar o defunto, comentar sua aparência, imaginar como sentiu seu último suspiro dá materialidade ao desaparecimento de um membro da comunidade (Reesink, 1995). O encontro com o cadáver consolida o padrão de separação que será permanente. Nos mortos por Covid-19 no Brasil, é permitido a um parente aproximar-se para confirmação do óbito. Aos outros enlutados resta ouvir o relato.
Após o reconhecimento e ainda no hospital, o corpo é acomodado em três camadas isolantes. A urna é lacrada e segue ao cemitério. No manual há recomendação expressa de que, após lacrada, a urna não seja reaberta. Impedir a abertura do caixão para visualizar o morto suprimiu possibilidades de expressões ritualizadas. Não poder ver nem tocar o falecido provoca sensações nos enlutados. Para a família de Alexandre foi preciso “refazer” o ritual após a cremação, quando recebeu as cinzas. Talvez tal condição tenha dado corporeidade ao morto, apaziguando emoções dos familiares enlutados, segundo a matriarca. Além de impossibilitar uma aceitação do novo status do falecido20, acarretando um processo vivido a partir de uma sensação de irrealidade, houve situações em que os enlutados duvidaram da identidade do corpo. Neste caso, familiares abriram caixões para certificação de quem era o morto21.
Em outro tópico do manual, “sugere-se que não haja contato direto entre o familiar/responsável e o corpo mantendo distância de dois metros entre eles” (Brasil, 2020b, p. 7). Toques, abraços, beijos, cortes de cabelo, conversas com o morto, orações, choro, debruçar para confidências e declarações de amor, pedidos de perdão - foram proibidos. Estas formas de expressão de sentimentos visam prover aos vivos a ideia de uma boa passagem aos mortos. Tais demonstrações se tornaram impossíveis, com o advento da pandemia e a publicação do manual.
Detalhes técnicos concernentes à contenção e tratamento dos fluidos corporais são mencionados como fonte de perturbação para os enlutados. Segundo o manual, o corpo do infectado pelo coronavírus não deve ser submetido à tanatopraxia - serviço que envolve adorno, maquiagem e embalsamamento. Muitos estudos de ritos de morte demonstraram, em diferentes épocas (Rodrigues, 1997) e distintas culturas, que a preparação do corpo, adorno com flores e provimento de acessórios, escolha da roupa, maquiagem, arrumação dos cabelos são fundamentais para uma elaboração individual e coletiva do processo do luto. Da mesma forma, em alguns rituais, o morto deve receber certos objetos para obter boa passagem. Ao suprimir a possibilidade de “construir o corpo” (Rodrigues, 1975; Vilaça, 1998), as diretrizes do manual inviabilizam formas socialmente legitimadas de ritualização.
Tais aspectos dificultam a reunião de enlutados, para produção de um cerimonial de despedida. De forma contida (Vicente da Silva, 2011), com gritos e choros (Ramalho, 2008), músicas, procissões (Cruz, 1995), rezas (Reesink, 2016), juntos, os vivos empreendem um conjunto socialmente constituído, para um reconhecimento da transformação social do falecido. A morte é um evento individual e coletivo. É coletivo, pois o morto deve ser reconhecido enquanto tal por seu grupo de pertencimento. Conforme Reesink (1995, p. 124), o ritual de despedida precisa ser anunciado, para que haja “presença do público no privado”.
No subítem seis do Manual de Manejo dos corpos há instruções aos familiares (Brasil, 2020b). A primeira é a explicitação de que não é recomendada a realização de velórios e funerais de mortes suspeitas ou confirmadas pelo coronavírus no período de isolamento social e quarentena. No entanto, diferentemente do que ocorre na prática, o manual deixa em aberto a possibilidade de ocorrência de cerimoniais, com as recomendações: urna fechada, evitando contato com o corpo (toque/beijo); urna disponibilizada em local aberto ou ventilado, evitando a presença de pessoas do grupo de risco, como idosos, gestantes, lactantes, portadores de doenças crônicas ou imunodeprimidos; cerimônia de sepultamento sem aglomeração, com distância mínima de dois metros entre as pessoas. Indica-se o número máximo de 10 pessoas no enterro, pelo risco de contágio entre elas (Brasil, 2020b).
Embora o manual permita velórios com restrições, os noticiários informam, além das entrevistas com enlutada/os22, que essa etapa fundamental dos ritos de morte foi majoritariamente suprimida. Os interlocutores relatam que o corpo foi colocado em urna lacrada no hospital e seguiu diretamente para o cemitério em carro da funerária, com enterro imediato23. A supressão do velório inviabilizou as últimas homenagens, o choro dos vivos em coletividade, cantos e recitação de histórias. A homília dos mortos não foi realizada.
Por vezes, a urna foi disponibilizada fechada aos familiares, em tendas improvisadas nos pátios dos cemitérios, enquanto se aguardava o momento do enterro24. O tempo do velório improvisado foi associado ao tempo do trabalho dos sepultadores e em seguida o corpo é enterrado. Em algumas situações, caixões lacrados permaneceram longo tempo em carros frigoríficos, e os vivos não tiveram tempo para uma aproximação do falecido. Nesses casos, a reunião de pessoas no entorno do morto foi reduzida ou vedada, impossibilitando um compartilhamento da experiência coletiva da morte.
Considerações finais
Os rituais de morte, como outros rituais de passagem, são processos interacionais que, quando finalizados, concedem aos sobreviventes uma sensação de dever cumprido. Assim, é possível afirmar que um ritual “tem sucesso” (Collins, 2004) quando seus participantes desenvolvem práticas e sentimento de solidariedade entre o grupo social, compartilham emoções e memórias. Num ritual há símbolos essenciais, tratados com respeito, que podem ser palavras, gestos ou ícones, aprendidos e incorporados nos processos de socialização, que representam valores de cada grupo social. No ritual esses símbolos são acionados, reativando emoções, e a experiência processada nos ritos reforça o sentido de comunidade. Portanto, um ritual finalizado pode gerar um sentimento de moralidade, determinando uma sensação de aderência ao que é correto e respeitoso segundo a cultura vigente (Collins, 2004). Ao finalizar as fases de um ritual de morte, o sobrevivente pode sentir que honrou seu ancestral, ao mesmo tempo em que projeta esta experiência para seu futuro despojo.
A importância atribuída aos ritos e às tentativas de garanti-los durante a pandemia também pode ser identificada em áreas urbanizadas de metrópoles brasileiras. O caso citado por Carla Martins (2020) é exemplar, sobre a decisão de uma família, sem pertença a religião ou crença definida, de criar novos rituais de luto na pandemia, frente às restrições estabelecidas, para substituir a ausência de contato com o ente querido, com velório e acompanhamento do cadáver junto ao túmulo, por questões de segurança sanitária.
O caso narrado por Martins diz respeito ao modo como a família da psicóloga Marília Gabriela, residente em área urbana, decidiu criar um ritual alternativo a partir da morte por Covid-19 de Alexandre, 39 anos, saudável e ativo, em abril de 2020. Após ingressar na emergência de um hospital, não foi possível ter contato com ele, que morreu no dia seguinte. O drama ocorre pela impossibilidade de contato e despedida dos familiares, uma vez que o corpo estava envolto em três camadas de saco plástico, antes de depósito em urna lacrada, com a determinação legal de velório curto e funeral sem aglomeração.
A família optou pela cremação, mas a cerimônia restrita “não foi suficiente para aplacar o rompimento inesperado do vínculo que o jovem filho, irmão, amigo tinha com os seus” (Martins, 2020, s./p.). Inconformada com a impossibilidade de realizar o velório como desejava, pelas restrições impostas pelo protocolo, a matriarca seguiu os conselhos de psicólogos especializados em atendimento ao luto, como de Maria Helena Pereira Franco (2021), coordenadora do Laboratório de Estudos sobre o Luto (LELu). Para a psicóloga, é importante criar um ritual, pela impossibilidade dos ritos costumeiros. Após um velório virtual, a família realizou outra cerimônia, quando foram depositadas as cinzas em uma praça, ao lado da casa em que viveu com Alexandre. Ali, os familiares e amigos plantaram uma muda de árvore. O plantio foi acompanhado por orações. A matriarca relata que passear ali com a cachorra do filho e cuidar do canteiro proporcionam “calma”, permitindo “fechar” um ciclo. Apesar da permanência da dor, sente de modo diferente (Martins, 2020).
Para Elaine Alves, pesquisadora da área de “Psicologia de Emergências e Desastres do Laboratório de Estudos sobre a Morte” da Universidade de São Paulo (USP), a decisão dessa família de criar um ritual possível foi importante, pois a ausência de certos ritos, como o velório, pode dificultar a elaboração do luto pelos sobreviventes, de forma considerada por psicólogos como satisfatória, pois não visualizar o corpo dificulta a tomada de consciência da morte. Quando o processo do luto não é “bem vivido”, pode ocorrer o que os especialistas nomeiam de “luto complicado” (Martins, 2020, s./p.). Trata-se de um conceito concernente a um processo de luto angustiante e debilitante (Machado; Menezes, 2018), quando as reações dos enlutados não seguem o padrão esperado. A ideia de luto complicado está associada à noção de disfuncionalidade, pela inabilidade de adaptação à perda e, portanto, sem condições de conclusão satisfatória do processo de luto (Machado; Menezes, 2018).
Após a morte de Alexandre, a decisão de depositar as cinzas em local próximo à residência propiciou uma sensação de conforto para sua mãe - ainda que não tenha sido possível realizar o rito tradicional. Assim, houve redução da dor, com a criação de um ritual para honrar o filho morto. No caso das mães Yanomami, o sepultamento de seus bebês impediu a conclusão do rito tradicional. Para além de tais restrições, o desconhecimento linguístico, a ausência de capacidade de alteridade das autoridades oficiais, além das restrições sanitárias pela pandemia impediu suas vivências do luto. Cabe aqui mencionar a argumentação de Judith Butler (2015), sobre a existência de vidas não passíveis de luto, em determinados contextos, como no Brasil.
O sentimento de dever cumprido diante dos ancestrais provocado nos vivos pelos rituais mobiliza a realização de ritos. Nesse sentido, a ação da AFA é relevante. Cada história mencionada apresenta uma faceta do impacto da pandemia sobre a realização de rituais de morte. As restrições sanitárias para evitar contaminação, tanto no nível nacional quanto internacional, acarretaram mudanças individuais e coletivas.
Não podemos deixar de fazer referência ao surgimento de reações às impossibilidades de ritualização na vigência da pandemia do Covid-19. Sabemos que muitas delas estão sendo experimentadas pelo país afora - como forma de ritualização da morte e de minimizar os impactos da ausência dos ritos tradicionais dirigidos aos mortos. A partir do conhecimento destas restrições, pensando nas possíveis consequências de um processo de luto complicado, pessoas reúnem-se para formar diferentes grupos de apoio aos enlutados, sem qualquer conotação profissional. Um desses grupos é a “Rede de Apoio às Famílias de Vítimas Fatais de Covid-19 no Brasil (2020)”, uma rede emergencial formada por voluntária/os, profissionais e pessoas solidárias às famílias de vítimas no país. Uma das frentes iniciais do trabalho de assistência foi a criação do “Memorial das Vítimas do Coronavírus no Brasil” (2020). Trata-se de um portal no qual estão registradas informações sobre os mortos da pandemia. O portal é alimentado por voluntárias/os que buscam preservar a memória das vítimas e oferecer aos familiares um espaço para elaboração da perda.
A partir da leitura detalhada do manual, seu cotejamento com as fases dos rituais fúnebres na pandemia de Covid-19 no Brasil concluímos que a decretação do estado de pandemia interferiu na vivência da morte e de sua elaboração individual e coletiva de um número significativo de brasileiros e brasileiras, visto que a pandemia já produziu mais de quinhentos e cinquenta mil mortes no país em agosto de 2021 (G1, 2021). É possível que haja outras consequências possíveis das interdições aos rituais fúnebres, que somente poderemos apreender após certo tempo, mediante o acompanhamento de casos, análise e reflexões sobre tais condições. Sem dúvida, serão sentidas por toda a coletividade. A experiência da morte de pessoas próximas, a ausência de compartilhamento em rituais, a frustração pelo velório não realizado, a não materialização da morte, o sentimento de imortalidade são algumas possibilidades enunciadas por especialistas na assistência ao luto (Machado, 2021; Sales; Stevinho, 2021).
A abreviação ou supressão dos ritos de morte também está associada à disseminação de teorias negacionistas vinculadas à pandemia. Afinal, aquilo que não é visto e não é performado dificilmente é elaborado individual e coletivamente. Resta aos sobreviventes, cerca de sete a dez pessoas para cada falecimento, a solidão do sofrimento ou a invenção de novos modos de ritualização.
Algumas formas de ritualização são performadas por familiares e amigos, na busca de conforto diante da perda. Tivemos notícias de uso de tecnologias por meio de videoconferências em homenagens e despedidas aos mortos, carros de funerárias que se desviaram de seu trajeto para permitir que idosos se despedissem dos seus parentes, colocação de flores, bilhetes e placas de homenagem nos túmulos, dias após o enterro do familiar, criação de altares domésticos (Vicente da Silva, 2020). No entanto, estas iniciativas e a criatividade associada não substituem o impacto da não realização dos ritos, tal como foram aprendidos e eram esperados. Somente teremos condições de avaliar tais impactos após certo tempo de pandemia e de seu término, com pesquisas dirigidas às vidas, sentimentos e interações entre os atingidos pela pandemia Covid-19, sejam os que adoeceram, sejam aqueles que vivenciaram processo de luto, por suas perdas.
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Notas