Temática Livre

A fragmentação da identidade do sujeito em contos de Cuti

The fragmentation of the subject's identity in Cuti’s short stories

Fragmentación de la identidad del sujeto en cuentos de Cuti

Geovani Augusto Nunes
Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Érica Fernandes Alves
Universidade Estadual de Maringá, Brasil

A fragmentação da identidade do sujeito em contos de Cuti

Revista NUPEM (Online), vol. 13, núm. 30, pp. 251-264, 2021

Universidade Estadual do Paraná

Recepción: 18 Mayo 2020

Aprobación: 13 Agosto 2020

Resumo: O presente estudo tem por objetivo analisar a fragmentação do sujeito negro no contexto atual sob o viés da Teoria Pós-Colonial. Para tanto, escolhemos os contos “Incidente na raiz” e “Boneca”, do escritor Cuti. Nesses contos, observamos as personagens protago-nistas a fim de verificar quais foram as heranças que o passado colonizador deixou nelas. Chegamos à conclusão de que a questão psicológica, que é justamente umas dessas heranças do período da escravidão, ainda é bastante atual e, por meio da literatura pós-colonial, essas questões são evidenciadas e discutidas para que possam, assim, ser superadas. Para tanto, em nossa análise, utilizaremos os estudos de Bonnici (2012), Fanon (2008) e Hall (2006) sobre as teorias de pós-colonialismo e identidade.

Palavras-chave: Literatura pós-colonial, Identidade, Cuti.

Abstract: This paper aims to analyze the black subject’s fragmentation in the present context using the Postcolonial Theory. For this, we chose the short stories “Incidente na Raiz” and “Boneca”, by the writer Cuti. In these short stories, we observed the main characters in order to verify what the legacies the colonizing past left on them were. We have come to the concluded that the psychological issue, which is precisely one of these legacies from the slavery period, is still very current and, by means of Postcolonial Literature, these issues are highlighted and discussed so that they can be overcome. Therefore, in our analysis we will use the studies of Bonnici (2012), Fanon (2008) and Hall (2006) on the theories of postcolonialism and identity.

Keywords: Postcolonial literature, Identity, Cuti.

Resumen: El presente estudio tiene como objetivo analizar la fragmentación del sujeto negro en el contexto actual bajo la perspectiva de la Teoría Poscolonial. Para ello, elegimos los cuentos “Incidente na raiz” y “Boneca”, del escritor Cuti. En estos cuentos, observamos a los personajes protagonistas para comprobar cuáles fueron las herencias que el pasado colonizador les legó. Hemos llegado a la conclusión de que la cuestión psicológica, que es precisamente uno de los legados de la época de la esclavitud, sigue estando muy vigente y, a través de la Literatura Poscolonial, son destacados y discutidos esos temas para que así se puedan ser superados. En nuestro análisis utilizaremos los estudios de Bonnici (2012), Fanon (2008) y Hall (2006) sobre las teorías del poscolonialismo y la identidad.

Palabras clave: Literatura poscolonial, Identidad, Cuti.

Introdução

A literatura pós-colonial tem suas raízes a partir do contato entre o colonizador e o colonizado. Nas palavras de Bonnici (2012, p. 19), essa literatura se configura como “toda a produção literária dos povos colonizados pelas potencias europeias entre os séculos XV e XXI”. Entendemos por colonizados, os povos que tiveram suas vidas transformadas em relação à vontade de outro grupo, como por exemplo os indígenas e os negros que foram escravizados e considerados inferiores pelos europeus.

A teoria pós-colonial surge nos anos 1970 e tem como objetivo estudar as influências que a relação entre colonizador e colonizado têm sobre a forma como os sujeitos que hoje são descendentes do povo colonizado - negros, indígenas - se veem enquanto sujeitos na atual sociedade que, por sua vez, ainda carrega resquícios das relações hierárquicas raciais e de gênero do passado.

Além disso, Bonnici (2012, p. 21) afirma que “a crítica pós-colonial se preocupa com a preservação e documentação da literatura produzida pelos povos degradados como ‘selvagens’, ‘primitivos’ e ‘incultos’ pelo imperialismo”. A crítica pós-colonial também analisa como os sujeitos colonizados ou influenciados pelo processo de colonização expõem suas ideias, além de verificar como eles utilizam o discurso literário como uma forma de resistência para que sua voz seja ouvida.

Ashcroft et al. (2004, p. 222, tradução nossa1) afirmam que: “as questões teóricas levantadas pela teoria pós-colonial: questões de resistência, poder, etnicidade, nacionalidade, língua e cultura e a transformação dos discursos dominantes por pessoas comuns, fornecem modelos importantes para a compreensão do lugar do local em um mundo cada vez mais globalizado”.

Ao passo que as nações antes colonizadas adquirem sua independência, uma gama variada de textos literários produzidos pelos sujeitos outrora colonizados também começa a se espalhar pelo mundo. Se antes suas vozes eram abafadas pelo discurso eurocêntrico hegemônico, aos poucos o mundo passa a escutar suas histórias de vida, suas experiências e discursos de resistência. Além disso, como bem explica Gilroy (2001) em seu “Atlântico Negro”, muito da cultura de África também é dada a conhecer e influencia a cultura de várias outras ações quando os sujeitos africanos são escravizados e forçados a deixar seus lares viajando em navios negreiros.

Nessa perspectiva, a colonização, por um lado, possibilitou, de forma violenta, é bem verdade, que as culturas e tradições tanto dos sujeitos escravizados ou “conquistados”, quanto dos sujeitos colonizadores se espalhassem pelo mundo aprofundando ainda mais a noção que hoje temos do multiculturalismo.

Cabe salientar, entretanto, que a dispersão dos sujeitos africanos no planeta e a inserção de sua cultura não foram e ainda não são tidos como positivos por grande parte das sociedades. Os sujeitos descendentes da herança colonial são, em sua maioria, objetificados e colocados às margens, ocupando cargos menos favorecidos no mercado de trabalho, rechaçados pelos padrões de beleza e/ou vistos como criminosos. As consequências são drásticas. A fragmentação da identidade (Hall, 2006) em um mundo que rechaça a melanina em demasia para o gosto ocidental é perene entre tais sujeitos.

Entretanto, os embates em torno da fragmentação/construção da identidade também fazem emergir a resistência e a resiliência, seja ela violenta, como discute Fanon (1965, p. 19) ao afirmar que “desde o seu nascimento, ele [o colonizado] sabe que esse mundo estreito, cheio de interdições, apenas pode ser remido pela violência absoluta”, ou seja, pelo discurso articulado do qual Ashcroft (2001) versa em “Postcolonial Transformation”.

Diante dessas discussões, nosso trabalho pretende olhar para a identidade dos sujeitos negros em contos do escritor brasileiro Cuti2. As personagens elencadas nesta análise têm suas identidades fragmentadas e nós analisaremos os possíveis motivos que provocaram essa fragmentação, bem como se esses sujeitos buscam formas de resistência, se são assimilados ou integrados na sociedade.

O autor das obras em análise é brasileiro, do estado de São Paulo; Cuti é pseudônimo de Luiz Silva, o autor nasceu na cidade de Ourinhos, formou-se em Letras (Português-Francês) na Universidade de São Paulo, em 1980. Ele é mestre em teoria da literatura e doutor em literatura brasileira. É importante mencionar ainda que Cuti foi um dos fundadores do “Quilombhoje-Literatura”, uma iniciativa que tem como objetivo o incentivo e a visibilidade de textos e autores afrodescendentes. Cuti também é um dos criadores e mantenedores da série “Cadernos Negros”, uma série anual criada em 1978, com mais de 40 volumes até o momento.

A fortuna literária do escritor transita entre a poesia, teatro, contos e ensaios. Dos contos, Cuti escreveu os livros “Quizla” (1987), “Negros em contos” (1996) e “Contos Crespos” (2008). Esse último livro é o objeto de nossa análise, pois contém os contos que analisaremos, a saber: “Boneca” e “Incidente na raiz”.

Nossa metodologia consiste na análise bibliográfica fundamentadas nos estudos de Bonnici (2012), Fanon (2008), Hall (2006), dentre outros, sobre o pós-colonialismo e identidade.

Uma análise da psicopatologia do preto no conto “Incidente na Raiz”

Frantz Fanon, psiquiatra, filósofo e ensaísta envolvido na luta pela independência da Argélia, bem como um influente pensador do século XX sobre os temas da descolonização e da psicopatologia da colonização tece em seu livro “Peles negras máscaras brancas” (2008) algumas considerações sobre as relações sociais estabelecidas entre negros e brancos.

No capítulo intitulado “O preto e a psicopatologia”, ele considera a família como responsável pela forma como o negro adulto pensa e vê o mundo, isto é, como um reflexo de comportamentos vividos na infância: “a tarefa do analista é reencontrar, na nova estrutura psíquica, uma analogia com certos elementos infantis, uma repetição, uma cópia de conflitos surgidos no seio da constelação familiar. Em qualquer dos casos, procura-se considerar a família como objeto e circunstância psíquicas” (Fanon, 2008, p. 127).

Considerando o sujeito branco, podemos perceber que a sua relação com as autoridades da lei é parecida com a que aprende no seio familiar, isto é, os homens da lei, representantes das leis do país, têm para o homem branco, o mesmo papel que do pai teve visto que esse é considerado a autoridade familiar.

No entanto, segundo o autor, um sujeito negro já terá uma relação diferente com as autoridades, pois enquanto uma criança branca normal criada por uma família normal, será um homem normal, “uma criança negra, normal, tendo crescido no seio de uma família normal, ficará anormal ao menor contato com o mundo branco” (Fanon, 2008, p. 129). E isso se dá, certamente por conta da herança da colonização.

Não há como compreender de que maneira o negro sofre com essa herança, pois esses indivíduos, ainda atualmente, ao adentrarem determinados locais, principalmente aqueles majoritariamente frequentados por brancos, se colocam em situação defensiva. Segundo René Ménil (1950, apud Fanon, 2008, p. 130), “a consequência da instauração, na consciência-de-si do escravo, de uma instância representativa do senhor, no lugar do espírito ‘africano’ recalcado, instância instituída nas profundezas da coletividade, que deve vigiá-lo como um exército vigia a cidade conquistada”.

Como o negro foi retratado na história como inferior, descendente de escravos e não de África, como sujeito marginal, as sociedades acabam por incorporar esses valores e reproduzi-los constantemente.

Acreditamos que as literaturas infantis corroboraram muito para que os sujeitos infantis incorporassem a visão deturpada do negro na sociedade. As literaturas, de modo geral, têm o poder de propiciar a expressão do sentimento reprimido de um povo, no entanto, no caso da literatura infantil, responsável grandemente pela formação do leitor, foi majoritariamente escrita por homens brancos e para as crianças brancas, isto é, os vilões, aqueles que representam o mal, eram sempre personagens negros, índios. Como as crianças tendem a identificar-se sempre com o vencedor, com o herói, as crianças negras e indígenas ao lerem tais histórias, começam a considerar o negro como a incorporação do mal e internalizam isso, o que será refletido em seu comportamento adulto.

Dentre as heranças do passado colonizador e escravagista podemos elencar, por exemplo, algumas nefastas consequências como o racismo, o binarismo e o branqueamento. Pimenta (2017), no capítulo intitulado “Entendendo a questão racial: negritude e branquitude em perspectiva”, de sua dissertação, baseia-se em Munanga, especialista em antropologia da população afro-brasileira, no que diz respeito a questões sobre o racismo na sociedade:

Munanga (2009, p. 15) explica que a condição do racista é a de quem crê na existência de “raças” hierarquizadas dentro da espécie humana. Essa crença pressupõe a existência de raças superiores e inferiores. O racismo confere à “raça” sua realidade política e ideologicamente esse conceito funciona como uma categoria de dominação e exclusão nas sociedades multirraciais contemporâneas. Sob esse viés, os negros retêm como traço fundamental próprio a situação de excluídos em que se encontram (Pimenta, 2017, p. 46).

É justamente essa crença equivocada de raças superiores e inferiores que motiva o binarismo racial, isso resulta no que foi um dos sistemas políticos que estiveram em vigor na África do Sul e que exigia a segregação racial, o Apartheid. Sobre esse sistema, Pereira (2008, p. 139-140) afirma que

Na formulação de seus intelectuais e na exploração dos políticos, a história do Apartheid tem início pouco antes de 1948. No entanto, a da segregação antecede essa data em muito, e não são poucos os analistas que localizam suas raízes no século XIX. A ideologia da superioridade branca e da discriminação racial era uma exigência do sistema de exploração agrária a que se dedicavam os afrikaaners, pois praticavam uma agricultura atrasada e pouco lucrativa em comparação com a cultura extensiva que a burguesia inglesa desenvolvia nas províncias do Cabo e de Natal.

O que, ainda segundo o autor, também aconteceu foi que embora para as práticas mercantis britânicas a escravidão não tivesse mais serventia, outrossim, era um obstáculo, ainda assim, os negros enfrentavam barreiras que os impediam de ascender social e economicamente. Outro fator histórico que podemos nos atentar é para a questão de que para a exploração de pedras como o ouro e diamante, os capitalistas europeus aproveitavam da mão-de-obra de operários brancos que tinham algum conhecimento econômico e eram preparados economicamente.

Essas pessoas, na maioria ex-fazendeiros böers que haviam perdido todo o seu capital na guerra de 1899-1902 e também europeus atraídos pela corrida do ouro, faziam exigências e reivindicações trabalhistas, pois conheciam o funcionamento do capitalismo industrial britânico. Os ingleses manipularam habilmente essa situação, prometendo vantagens aos trabalhadores brancos desde que se tornassem cúmplices na exploração de mão-de-obra negra (Pereira, 2008, p. 139-140).

Assim, percebe-se que a separação de raças nada mais era do que uma forma de manipulação dos negros, os quais não tinham representação na política e, muitas vezes, nem sequer o direito à educação, por esse motivo eram explorados. Fanon (1965, p. 86) discute a questão do racismo moderno burguês afirmando que

A burguesia ocidental levantou suficientes barreiras e pontes para não temer realmente a competição daqueles a quem explora e despreza. O racismo burguês ocidental a respeito do negro e do bicot é um racismo de desprezo; é um racismo que minimiza. Mas a ideologia burguesa, que proclama uma igualdade essencial entre os homens, desembaraça-se para permanecer em regra consigo mesma, convidando os sub-homens a humanizarem-se através do tipo de humanidade ocidental que ela incarna.

Além do racismo, outra herança foi a exigência do branqueamento do negro. Para que esse sujeito colonizado fosse aceito na sociedade, ele precisava aprender a língua de seu colonizador, pois sua língua era considerada menor, desse modo, ele se vê obrigado a tornar-se um estrangeiro nas suas próprias terras. “Uma das saídas postas ao negro, nesse quadro de dominação colonial, é assimilar valores culturais do branco, ou seja, embranquecer-se: só assim poderia ser reconhecido” (Pimenta, 2017, p. 50), o que segundo o autor, é um esforço não recompensado, pois mesmo que os negros tenham aprendido a língua europeia, os valores culturais e até mesmo “embranquecido”, esse sujeito continuava sendo excluído dos ambientes de convívio dos brancos.

Essa exigência de branqueamento imposta pela sociedade para com o negro torna-se, de tão intensa, uma necessidade para ele. O próprio negro, entendendo a exigência da sociedade para que se torne branco e, por consequência aceito, procura branquear-se. As indústrias da beleza e da moda ditam as regras, criam produtos milagrosos, como cremes branqueadores para a pele e produtos capilares capazes de “domar” os cachos selvagens do cabelo negro. Desse modo, a burguesia se mantém soberana, criando a falsa esperança de que o negro será aceito desde que se pareça com o branco.

Com isso em mente, analisemos o conto “Incidente na raiz”, presente no livro “Contos Crespos” (2008). As primeiras palavras do conto são as seguintes: “Jussara pensa que é branca. Nunca lhe disseram o contrário. Nem o cartório” (Cuti, 2008a, s./p.). Logo de início, podemos perceber que Jussara, a personagem principal, não é branca, pois é narrado que ela “pensa que é branca”, portanto, é possível concluir que essa tentativa de branqueamento pela qual muitos negros são submetidos a fim de se enquadrarem ao padrão social branco está enraizada no psicológico da personagem, pois ela não se enxerga mais como uma pessoa negra tentando se encaixar, mas sim, como um processo vencido, terminado, como no trecho: “No cabelo crespo deu um jeito. Produto químico e fim!” (Cuti, 2008a, s./p.).

No entanto, algumas situações a impediam de poder, de fato, pôr um fim nesse processo e não ter mais que se preocupar com coisas como, por exemplo, submeter seu cabelo alisado “a uma drástica auditoria no couro cabeludo para evitar que as raízes pusessem as manguinhas de fora” (Cuti, 2008a, s./p.), ou então no nariz, o qual tentava afinar prendendo-o com um prendedor de roupas por horas, resultando em “contusões de vasos sanguíneos” (Cuti, 2008a, s./p.). Para resolver o problema, havia soluções momentâneas como tirar fotos de perfil e uma solução definitiva, com a qual sonhava e guardava dinheiro: a rinoplastia.

Aos poucos o narrador descreve outras formas que Jussara utilizava para negar sua identidade, como podemos perceber no seguinte trecho: “E os lábios? Na tentativa de esconder-lhes a carnosidade, adquirira um cacoete - já apontado por amigos e namorados (sempre brancos) - de mantê-los dentro da boca. Sobre a pele, naturalmente bronzeada, muito creme e pó para clarear” (Cuti, 2008a, s./p.).

Esse trecho apresenta um ponto bastante importante para nossa análise da condição da mulher negra na sociedade. O fato de as pessoas com que Jussara se relaciona serem sempre amigos e namorados brancos nos remete ao que Fanon (2008) fala no capítulo “A mulher de cor e o branco” em “Pele negra, máscaras brancas”.

O autor coloca em discussão a questão de que sempre vai ser impossível haver uma relação de amor verdadeiro, se o sentimento de inferioridade da mulher negra para o homem branco continuar. Fanon apresenta alguns exemplos relacionando como era a interação entre as mulheres negras e os europeus nos países colonizados; para elas, um casamento com um homem branco era uma forma de clareamento de si mesma e consequentemente de sua descendência.

Esse pensamento colonizado estaria presente de tal maneira no inconsciente da mulher negra que para muitas delas, casar-se com um negro seria uma regressão no processo de branqueamento, o que só poderia ser alcançado por meio do casamento com um homem branco. Por esse motivo, muitas mulheres se casavam com homens brancos e eram para eles submissas; o fato de eles serem brancos era tudo o que elas exigiam e também o que bastava. Fanon cita relatos que evidenciam as características desse pensamento por parte das mulheres negras, como diz, por exemplo, um ditado popular nas Antilhas “O importante é não sombrear de novo no meio da negrada, e qualquer antilhana se esforçará em escolher, nos seus flertes ou relações, o menos negro” (Fanon, 2008, p. 57). Em um relato, uma antilhana confessa:

Em cada um de nós há uma potencialidade branca, alguns querem ignorá-la ou mais simplesmente a invertem. Quanto a mim, por nada nesse mundo me casaria com negro Atitudes como essa não são raras, e confessamos nossa preocupação, pois essa jovem martinicana, dentro de alguns anos, formando-se, irá ensinar em algum estabelecimento nas Antilhas. Pode-se adivinhar facilmente o que se passará (Fanon, 2008, p. 58).

Em relação ao comportamento de Jussara, a protagonista do nosso conto analisado, essa tentativa de sempre buscar uma identificação com o branco se dá por conta desse pensamento que é doutrinado pelas gerações:

Compreendemos agora porque o negro não pode se satisfazer no seu isolamento. Para ele só existe uma porta de saída, que dá no mundo branco. Donde a preocupação permanente em atrair a atenção do branco, esse desejo de ser poderoso como o branco, essa vontade determinada de adquirir as propriedades de revestimento, isto é, a parte do ser e do ter que entra na constituição de um ego (Fanon, 2008, p. 60).

Isso nos leva à análise da parte final do conto. A protagonista procura durante toda sua vida uma maneira de ser branca de forma definitiva. A pele negra era clareada por meio de cremes cosméticos, o nariz era afinado com o uso do pregador de roupas. O cabelo era outro problema, uma vez que denotava as origens negras de Jussara, origens essas metaforizadas na palavra raiz. A fim de eliminar esse traço negro, a moça descobre um tratamento químico e resolve utilizá-lo:

Lá um dia, veio alguém com a notícia de “alisamento permanente”. Era passar o produto nos cabelos uma só vez e pronto, livrava-se de ficar de olho nas raízes. Um gringo qualquer inventara a tal fórmula. Cobrava caro, mas garantia o serviço. Segundo diziam, a substância alisava a nascente dos pelos. Jussara deixou-se influenciar. Fez um sacrifício nas economias, protelou o sonho da plástica e submeteu-se.

Com as queimaduras químicas na cabeça, foi internada às pressas, depois de alguns espasmos e desmaios.

Na manhã seguinte, ao abrir com dificuldade os olhos, no leito de hospital, um enfermeiro crioulo perguntou-lhe:

Tá melhor, nêga?

Ela desmaiou de novo (Cuti, 2008a, s./p.).

Vale fazermos algumas considerações sobre essa passagem, como por exemplo o fato de esse “alisamento permanente” (Cuti, 2008a, s./p.) ser para Jussara uma solução para um problema com o qual ela tinha que lidar constantemente, seu cabelo. No início do conto, percebemos que ela se sentia realizada com suas madeixas esvoaçantes, no entanto, esse era o resultado de uma rígida disciplina por sua parte. Esse método inovador prometia acabar com esse problema desde a raiz, para fazermos um trocadilho.

O cabelo afro se configura como uma parte da identidade dos sujeitos negros. O black power, por exemplo, não só foi o nome de um estilo de penteado afro, como virou um símbolo ativista e político em torno dos direitos civis dos negros estadunidenses e, também, brasileiros. Porém, vemos que para Jussara seu cabelo não representa esse poder e essa identificação orgulhosa de sua ancestralidade. Seu cabelo, assim como para várias outras mulheres negras, provoca a fragmentação de sua identidade, pois revela o que ela jamais será: branca.

Mas o que realmente marca nesse conto é o seu final, não o resultado do processo químico pelo qual Jussara foi submetida para alisar seu cabelo, mas sua reação diante da fala do enfermeiro negro: “Tá melhor, nêga? / Ela desmaiou de novo” (Cuti, 2008a, s./p.). Diante dessa reação da personagem, podemos perceber que depois de todo o seu esforço para ser branca, de todo o seu sacrifício, de abrir mão de seu bem-estar e até mesmo de sua saúde, ela ainda é reconhecida como “nêga”. Ao desmaiar, é como se ela se entregasse e compreendesse que não importa o quanto tente, ela nunca será como (a sociedade) quer.

Essa busca de Jussara em se encaixar nesse padrão de beleza europeia, evidencia, conforme vemos na nossa análise, que para ela essa é a única beleza que existe, que qualquer outra aparência deve sempre mudar e buscar estar o mais próximo possível do branco, evidenciando como muitos sujeitos negros assimilaram a noção do branqueamento. Para ela sua beleza natural não existe devendo sempre ser condicionada a processos para se adequar ao padrão de beleza europeu. Sua identidade está circunscrita a um padrão inatingível, isto é, o conto deixa transparecer que a mulher negra jamais poderá adentrar na esfera do padrão de beleza difundido na sociedade.

Analisando o próprio título do conto “Incidente de raiz”, entendemos que a palavra raiz não se refere apenas à raiz capilar da personagem, mas ao fato de a personagem ter raízes negras. Isto é, o título é uma metáfora para a não aceitação dessas raízes negras por parte dos próprios negros, o que é em si, uma prova da psicopatologia desse indivíduo discutida por Fanon (2008). A não aceitação de sua aparência e de sua identidade enquanto sujeito negro por parte do próprio negro se caracteriza como uma forte consequência do aparato colonial que dificulta a total libertação do poder hegemônico, porém, como afirmam Ashcroft et al. (2004, p. 87, tradução nossa3), “o domínio do centro e sua aprovação na experiência devem ser revogados para que a experiência da ‘periferia’ possa ser totalmente validada”.

A tentativa de identificação no conto “Boneca”

Quando falamos em identidade, um dos maiores nomes que utilizamos como referência, é o de Stuart Hall, que, em seu livro “A identidade cultural na pós-modernidade” (2006), discorre sobre o problema das identificações dos sujeitos com determinadas construções identitárias. No capítulo intitulado “A identidade em questão”, o autor inicia nos apresentando as três concepções desse termo pelos quais a sociedade já perpassou.

A primeira, é a do sujeito do Iluminismo, que estava situado em um contexto em que ele era considerado como sendo unificado e centrado, dono de sua razão, tinha um centro, que “consistia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo - contínuo ou ‘idêntico’ a ele - ao longo da existência do indivíduo” (Hall, 2006, p. 11). Ele tinha seu caráter definido já quando nascia e conforme se desenvolvia, seu caráter se propagava junto com ele, jamais sendo mudado ou influenciado pela sociedade na qual estava inserido.

Outra concepção de identidade do sujeito que o autor apresenta, é a do sujeito sociológico, que diferente daquele do iluminismo, sofria influência da sociedade, isso evidenciava a “crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que este sujeito não era autônomo e autossuficiente, mas era formado na relação com ‘outras pessoas importantes para ele’, que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e símbolos - cultura - dos mundos que ele/ela habitava” (Hall, 2006, p. 11).

Segundo essa concepção, o sujeito possui um núcleo ainda, mas nesse contexto, considera-se a influência que a sociedade exerce sobre ele; considera-se que a distância entre o eu e o mundo é minimizada e preenchida pela identidade.

A terceira concepção que o autor apresenta e com a qual trabalharemos, é a concepção de sujeito pós-moderno. Essa visão do sujeito considera que ele não possui mais um núcleo, mas vários; que sua identidade está fragmentada e não é mais algo estável. E essas muitas identidades que ele possui, muitas vezes não coexistem pacificamente, mas entram em conflito. Segundo Hall (2006, p. 13), “se sentimos que temos uma identidade unificada desde o nascimento, até a morte é apenas porque construímos uma cômoda estória sobre nós mesmos ou uma confortadora “narrativa do eu”. A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia”.

Sobre a questão da identidade, analisaremos o segundo conto de Cuti, intitulado “Boneca”, que conta a história de um homem que procura pelas lojas da cidade uma boneca como presente de Natal para sua filha.

Nenhuma! Cansou de tanto andar. Perguntara muito. Ouvira respostas de todo tipo. Algumas vezes, reagira à escassa delicadeza de certos balconistas e mesmo às ironias finas. Em outros momentos fora levado à autocomiseração, depois de ouvir, por exemplo:

Sinto muito! ...

Ou:

Queira nos desculpar... A fábrica não fornece, sabe... (Cuti, 2008b, s./p.).

Ele não conseguia encontrar a boneca, mas continuava procurando, havia colocado isso como uma missão. Observa-se aqui a necessidade de encontrar uma representação de si no brinquedo como que para se auto afirmar enquanto sujeito, conforme salienta Fanon (2008, p. 180), “O homem só é humano na medida em que ele quer se impor a um outro homem, a fim de ser reconhecido”. Finalmente, em uma loja, após esperar ser atendido, uma funcionária pergunta o que ele procura e ele diz que procura uma boneca, mas antes mesmo de ele terminar sua frase, a moça já diz:

Temos várias. Olha aqui a Barbie, a Xuxinha... - e a loirinha foi apanhando diversas bonecas. Colocava-as sobre o balcão, como se escolhesse para si. Olha que gracinha esta aqui de olhos azuis! É novidade. Chegou ontem e já vendeu quase tudo. Chora, tem chupeta, faz pipi... E essa outra aqui? Não é uma graça? - e levou ao colo a ruivinha de tom amarelado, bem clarinha. Mexeu-lhe os bracinhos e as perninhas e indagou: Não gostou de nenhuma?

É que estou procurando uma boneca negra... (Cuti, 2008b, s./p.).

A dificuldade de encontrar uma boneca negra em um país cuja população negra ou parda ultrapassa cinquenta por cento4 denota como a cultura dominante ignora esses números e não permite haver representatividade negra até mesmo nos brinquedos. Seria para não disseminar a ideia de igualdade nas crianças?

A grande variedade de bonecas brancas disponíveis na loja contrasta com a falta de bonecas negras, pois a atendente adentrou a loja e procurou por meia hora. “Tem sim! - o dono da loja dirigiu-se à empregada. Procura melhor, na prateleira de baixo, lá em cima mesmo, perto da pia” (Cuti, 2008b, s./p.). Depois de muita procura, finalmente, uma boneca negra é encontrada:

Em seguida, do alto do mezanino, mostrou o rostinho gorducho, marrom-escuro, de uma boneca. Radiante, a balconista empunhava-a como um troféu. Assim desceu a escada. Mas, descuidando-se nos degraus, despencou-se. Todos se apavoraram. As colegas de trabalho foram em socorro.

Nenhuma fratura. Apenas um susto. O patrão exasperou-se, mas logo conseguiu se controlar, vermelho como pimenta-malagueta. A loja estava cheia. Foi atender o cliente:

Peço desculpa pela demora e pelo transtorno. Espero que o senhor não tenha se chateado. O importante é que encontramos o produto. Está em falta, sabe... (Cuti, 2008b, s./p.).

Em seguida, o patrão argumenta, como que querendo se justificar pela falta de bonecas negras em sua loja:

Eles não entregam. Eu mesmo encomendei a semana passada. Mas o representante disse que a firma está exportando para a África. Está certo, mas aqui também tem freguês que procura, não é? O senhor é brasileiro?

Sim.

Então... - o homem engoliu a frase e preparou a nota (Cuti, 2008b, s./p.).

Com isso, percebemos que para o patrão apenas os africanos podem se interessar por uma boneca negra, e pelo fato de o cliente ser negro, já concluiu que o mesmo era africano. O essencialismo permeia o discurso do patrão. Na sequência,

Já na rua, o pai, entre tantos pensamentos, alguns desagradáveis, lembrou-se da descontração a que fazia jus, depois de suar expectativas naquela manhã de dezembro. Respirou fundo. Contemplou o lindo embrulho de motivações natalinas, em que se destacavam o Papai Noel, crianças louras e muita neve. Seguiu, passos lentos, em direção a uma lanchonete.

Vai uma loura gelada aí, chefe? - pronunciou o balconista ao vê-lo sentar-se junto do balcão.

Sorriu, confirmando com um gesto de polegar.

Ao primeiro gole de cerveja, sentiu-se profundamente aliviado e feliz (Cuti, 2008b, s./p.).

Esse conto, em uma leitura superficial, narra a tentativa de um pai presentear sua filha com uma boneca negra e tem dificuldade para encontrá-la, no entanto, em uma leitura mais crítica, conseguimos identificar algumas semelhanças com a posição do sujeito negro na sociedade. Ashcroft et al. chamam a atenção para o processo de marginalização dos sujeitos colonizados ou que ainda hoje sofrem com os desdobramentos da colonização. Segundo os autores (2004, p. 102, tradução nossa5), “marginalidade é a condição construída pela relação postulada por um centro privilegiado, uma ‘outremização’ dirigida pela autoridade imperial”.

O fato de o patrão pedir para a funcionária procurar a boneca negra na prateleira inferior, perto da pia, mostra metaforicamente que o negro está sempre em lugares secundários ocupando uma posição de marginalidade e não está lá por vontade própria, mas por decisão do outro. A prateleira inferior representa a camada mais baixa da sociedade e a pia indica a função desempenhada pelo negro, no âmbito do trabalho.

O protagonista do conto busca uma afirmação de sua identidade, algum tipo de identificação social por meio da representação da boneca preta, mas o que acontece com a atendente quando finalmente encontra a tal boneca pode ser interpretado como uma representação da sociedade quando o negro tenta buscar seu lugar no mundo, isto é, as coisas saem do controle, da normalidade, inferindo que o negro deve aceitar seu lugar marginal para que a dominação hegemônica e o status quo não sejam afetados.

Isso também nos remete à fala do patrão “O importante é que encontramos o produto” (Cuti, 2008b, s./p.), como se o negro não tivesse o direito de escolha; a sociedade não oferece ao negro as mesmas condições que oferece ao branco, e com isso, impõe que o mínimo que ofereça já seja suficiente, e o negro acaba se submetendo a isso. Ao fim do conto, mesmo tendo se mostrado uma personagem que busca reconhecimento da sua identidade, o pai acaba sentindo-se “profundamente aliviado e feliz” (Cuti, 2008b, s./p.) com o que lhe foi concedido.

Segundo Bernardino-Costa (2016, p. 514), o negro sempre foi invisibilizado por conta dos estereótipos que a ele foram atribuídos pelo colonizador: “É pelo olhar branco que o corpo negro é esvaziado de resistência ontológica e remetido à zona do não-ser. Pelo processo de epidermização da inferioridade, o negro procura embranquecer. Por outro lado, este mesmo corpo pode ser uma agência de resistência e elaboração do conhecimento ao assumir sua visibilidade”.

Para o autor, cabe a esse sujeito se afirmar, é por esse motivo que Cuti insere essa personagem no conto. Ironicamente, o que acontece no final do conto é que quando o pai busca uma forma de alívio, o que lhe é oferecido é uma “loira gelada”. Mesmo que ele tente buscar durante todo o conto pela boneca preta e não interrompe sua busca até encontrá-la, quando chegou ao balcão do outro estabelecimento, a primeira loira que lhe ofereceram (a cerveja) o deixou satisfeito e feliz.

Novamente não há identificação ou representação do sujeito negro nesse novo estabelecimento para onde o pai vai. O conto ironiza o fato de que os sujeitos negros procuram ansiosamente por representatividade, mas o que encontram é a nulidade ou, quando encontram algo, precisam se contentar. A boneca preta localizada na prateleira mais baixa perto da pia, a vendedora caindo da escada, o dono da loja perguntando se o pai era africano e a loira gelada metaforizam o circuito fechado em que o negro está inserido.

A identidade do protagonista pode aparentar estar completa, quando ele aceita de bom grado o pouco que lhe é ofertado, mas é premente sua invisibilidade no fazer social - não há quase brinquedos lhe representando, seu trabalho deve estar circunscrito às funções menos privilegiadas, questionar ou desafiar as lógicas dominantes pode ser prejudicial e desastroso, resta, apenas, se entregar ao mundo do branco. O sujeito pós-moderno, conforme discute Hall (2006), é fragmentado e incompleto.

Considerações finais

A literatura pós-colonial, como vimos, dá voz aos sujeitos que outrora não tinham seu lugar na literatura. Por meio dela, também é possível analisarmos como os sujeitos descendentes dos povos colonizados se sentem frente à sociedade atual, que por sua vez, depois de mais de um século da abolição dos escravos no Brasil, ainda abriga resquícios do período colonial.

É também por meio dos estudos pós-coloniais que podemos entender a razão de muitos sujeitos se sentirem inferiores ainda hoje. Isso não se dá pelo fato de eles terem vivenciado alguma forma de tortura, castigo ou até mesmo de discriminação que os escravos sofriam de seus senhores, mas isso se dá mais por uma questão psicológica que está muito enraizada no pensamento desses sujeitos que foram repassando para seus próximos, de geração em geração, até chegar no tempo atual.

Além disso, os estudos pós-coloniais deixam transparecer que é imperativo para a cultura e política dominantes que o sujeito negro seja assimilado e aceite os valores hegemônicos pois, segundo Fanon (2008, p. 34), “quanto mais assimilar os valores culturais da metrópole, mais o colonizado escapará da sua selva. Quanto mais ele rejeitar sua negridão, seu mato, mais branco será”. A resistência e a busca por representatividade não é algo que o negro deve almejar, uma vez que elas o libertam de sua condição de inferioridade imposta.

Desse modo, esse trabalho teve como objetivo analisar dois contos do escritor Cuti, “Incidente na raiz” e “Boneca”, e por meio deles discutir a questão da identidade por meio dos protagonistas. Cada um tenta se encaixar na sociedade à sua maneira; enquanto Jussara é complacente, isto é, ao invés de tentar se impor enquanto sujeito e assumir sua identidade, ela tenta, sem sucesso, se encaixar ao padrão de beleza que não a pertence; dessa forma sua identidade é fragmentada, pois ela não se aceita como negra e não consegue ser branca. Por outro lado, o pai procura por uma representatividade, apresenta uma forma de agência, mas termina o conto em estado de complacência.

Por meio deste estudo, objetivamos ter um olhar sobre esses dois sujeitos, com o intuito de mostrar que a questão psicológica oriunda de séculos de escravização ainda está intrínseca na forma como o negro se vê na sociedade. Inversamente chamamos a atenção para a escrita de Cuti que constrói essas personagens como uma forma de dar lugar, visibilidade e protagonismo ao sujeito negro. O final desconcertante de cada um dos contos revela que Cuti, escritor pós-colonial brasileiro, enxerga que o caminho até a resistência e a total libertação dos padrões opressivos não se constrói com facilidade.

O fato de esses sujeitos estarem sempre em situações de marginalidade reflete a desigualdade que nossa atual sociedade ainda vivencia. Por meio da literatura pós-colonial, conseguimos expor tais questões a fim de que, estudando-as, possamos agir de modo a contribuir para uma sociedade mais justa, que a princípio, reconheça essa desigualdade social e, naturalmente, vá desfazendo-a, concedendo, assim, o mesmo direito a todos os sujeitos que compõem a sociedade.

Referências

ASHCROFT, Bill. Postcolonial transformation. London: Routledge, 2001.

ASHCROFT, Bill et al. The empire writes back: theory and practice in post-colonial literatures. London; New York: Routledge, 2004.

BERNARDINO-COSTA, Joaze. A prece de Frantz Fanon: oh, meu corpo, faça de mim um homem que questiona. Civitas, v. 16, n. 3, p. 504-521, jul./set. 2016.

BONNICI, Thomas. Aspectos da teoria pós-colonial. In: BONNICI, Thomas. O Pós-colonialismo e a literatura: estratégias de leitura. Maringá: Eduem, 2012, p. 17-53.

CUTI. Incidente na raiz. Cuti: escritor. 2008a. Disponível em: https://www.cuti.com.br/contoscrespos. Acesso em: 07 jul. 2021.

CUTI. Boneca. Cuti: escritor. 2008b. Disponível em: https://www.cuti.com.br/contoscrespos. Acesso em: 07 jul. 2021.

FANON, Frantz. Os condenados da terra. Lisboa: Ulisseia, 1965.

FANON, Frantz. Pele negras máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.

GILROY, Paul. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo; Rio de Janeiro: Editora 34, 2001.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

PEREIRA, Analúcia Danilevicz. Apartheid: apogeu e crise do regime racista na África do Sul (1948-1994). In: MACEDO, José Rivair (Org.). Desvendando a história da África. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008, p. 139-157.

PIMENTA, Fernando Januário. Vozes ignoradas: Cuti e Sérgio Vaz no Ensino Fundamental. 250f. Mestrado Profissional em Letras pela Universidade de São Paulo. São Paulo, 2017.

Notas

1 “the theoretical issues raised by postcolonial theory: questions of resistance, power, ethnicity, nationality, language and culture and the transformation of dominant discourses by ordinary people, provide important models for understanding the place of the local in an increasing globalized world”.
2 Os dados sobre o autor estão disponíveis em: https://www.cuti.com.br/. Acesso em: 02 jun. 2021.
3 “the dominance of the centre and its imprimatur on experience must be abrogated before the experience of the ‘periphery’ can be fully validated”.
4 Essa informação é anacrônica, uma vez que o conto foi escrito antes do censo que revelou tal número, entretanto, serve de base para a quantidade de sujeitos negros e pardos já existentes no país na época da publicação do conto.
5 “Marginality is the condition constructed by the posited relation to a privileged centre, an ‘Othering’ directed by the imperial authority”.
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