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Experiência da mundialização como experiência hermenêutica: Habermas, Gadamer e cosmopolitismo*

The experience of cultural globalization as hermeneutic experience: Habermas, Gadamer and cosmopolitanism

Estevão Bosco
Universidade de São Paulo, Brasil

Experiência da mundialização como experiência hermenêutica: Habermas, Gadamer e cosmopolitismo*

Revista Brasileira de Sociologia, vol. 8, núm. 19, pp. 229-253, 2020

Sociedade Brasileira de Sociologia

Recepción: 15 Octubre 2019

Aprobación: 08 Febrero 2020

Resumo: A questão central que este artigo aborda consiste em saber se as teorias da modernização e do cosmopolitismo formuladas por Habermas nos permitem lidar com os desafios que a mundialização (cultura) coloca para a teoria social crítica. Por meio de uma análise metateórica, argumento que as teorias da modernização e do cosmopolitismo de Habermas estão ancoradas em um conceito de sociedade caracterizado por um auto-referenciamento cultural latente, a rigor, nacional, que nos impede de apreender o papel que o entrelaçamento cultural das sociedades cumpre na reprodução do mundo da vida e nas formas de socialização. Com base em análises sociológicas e antropológicas do cosmopolitismo, formulo uma hipótese hermenêutica interessada sociologicamente, que sustenta que, se partirmos das pré-condições hermenêuticas de nossa experiência do mundo (Gadamer), podemos delinear uma perspectiva complementar a Habermas que abrange a mundialização. Este artigo visa contribuir com os fundamentos ontológicos da teoria social crítica cosmopolita mediante o desvelamento de pré-condições de um tipo intercultural de entendimento mútuo.

Palavras-chave: Cosmopolitismo, Mundialização, Experiência Hermenêutica, Habermas, Gadamer.

Abstract: The primary question this article addresses is whether Habermas’ theory of modernization and cosmopolitanism successfully engages with the challenges to social theory posed by the experience of cultural globalization. Through a metatheoretical analysis, I argue that Habermas’s theory of modernization and cosmopolitanism is based on a concept of society characterized by a latent cultural self-referentialism, which prevents us from grasping the role that cultural entanglements among societies play in the reproduction of the lifeworld and in shaping socialization. Drawing on sociological and anthropological analyses of cosmopolitanism, I formulate a hermeneutical, sociologically-invested hypothesis which claims that Gadamer’s uncovering of the hermeneutical pre-conditions of our world experience can provide the foundations for a complementary perspective to Habermas’, helping cosmopolitan critical sociologists and social theorists better understand cultural globalization. This article aims to contribute to the identification of the ontological features of cosmopolitan critical social theory by disclosing pre-conditions of a concept of intercultural understanding.

Keywords: Cosmopolitanism, Cultural Globalization, Hermeneutic Experience, Habermas, Gadamer.

Introdução

Nos últimos trinta anos, teóricos sociais críticos têm tratado das transformações induzidas pela mundialização/globalização[1] por meio da resignificação da ideia filosófica de cosmopolitismo e de conceitos da sociologia clássica. Apesar da variedade das formulações, o que esses intentos têm em comum é a intuição forte de que a mundialização/globalização é um fenômeno sociológico total, que a vida social não pode mais ser compreendida sem ter o global como pano de fundo. É nesta direção que os trabalhos de Ulrich Beck (2006), Gerard Delanty (2009) e Robert Fine (2007) avançam, ao introduzir uma perspectiva cosmopolita na teoria social crítica

Uma das orientações e dos desafios centrais do projeto cosmopolita diz respeito aos fenômenos da diversidade cultural e do entrelaçamento cultural das sociedades, com seus efeitos sobre a identidade cultural, a reprodução cultural e as formas de socialização, tanto no âmbito histórico (diacronia) como do presente (sincronia). Este artigo aborda o que está fundamentalmente presumido nestes fenômenos, isto é, a existência de um tipo intercultural de entendimento que pré-constitui nossa experiência do mundo. Ao revelar as pré-condições desse tipo de entendimento mútuo, pretendo contribuir com os fundamentos ontológicos do projeto de teoria social crítica cosmopolita.

Neste contexto, é de primeira importância o programa de Jürgen Habermas, em particular sua concepção de modernização e de cosmopolitismo. Sua importância para o projeto cosmopolita se deve ao fato de que, até novo aviso, a fundação da vida social na razão comunicativa é universal e revela-nos que, mediante a práxis argumentativa, somos capazes de aprendizagem e de transcender nossa posição prévia. Contudo, apesar de suas inovações e da solidez da reatualização do pensamento crítico que empreende, argumento que o modelo de modernização como racionalização social, no qual está inscrita sua teoria crítica da sociedade, não nos permite acessar a mundialização/globalização. Num sentido fundamental, esse limite é de natureza interpretativa e se deve à ancoragem desse modelo na pressuposição metateórica de que seria possível deduzir o todo da modernização (global) pelo efeito de racionalização que introduz na parte, esta última assumindo a forma moderna de sociedade nacional. Isso significa que o modelo da racionalização social reduz o horizonte analítico aos aspectos internos da sociedade. A modernização como racionalização, portanto, passa ao largo da relação entre as partes, vale dizer, passa ao largo do entrelaçamento histórico das sociedades invocado pela mundialização/globalização (BOSCO, 2016).

Posto isso, inicio com uma análise metateórica da modernização e do cosmopolitismo na teoria habermasiana da sociedade. Em seguida, volto-me para estudos sociológicos e antropológicos sobre o cosmopolitismo atual que questionam pressuposições empíricas do autor. Num terceiro momento, veremos como a análise social do cosmopolitismo estético-cultural nos revela o entrelaçamento cultural das sociedades nas pequenas coisas do dia a dia. Isso é central para o argumento aqui desenvolvido, pois significa que a mundialização (cultura) ilumina uma abertura fundamental do mundo da vida para tudo aquilo que se nos faz presente.

Uma vez percorrido esse caminho, argumento que a mundialização invoca um conceito sociológico de experiência que esteja em medida de apreender o entrelaçamento cultural das sociedades. Com o propósito de delinear os contornos fundamentais desse conceito, sugiro um retorno à hermenêutica de Hans-Georg Gadamer (1999) e conceber a experiência da mundialização como experiência hermenêutica, tendo como medium um tipo intercultural de entendimento mútuo. Por fim, explicito desdobramentos dessa hipótese com o propósito de reconstruir o caminho de volta, de Gadamer a Habermas. Compreende-se assim que o argumento aqui desenvolvido se propõe a delinear uma abertura da teoria da ação comunicativa para o que análises sociológicas do cosmopolitismo nos revelam[2].

Habermas, cosmopolitismo e modernização como racionalização social: uma análise metateórica

O diagnóstico de época sobre o qual repousa a concepção habermasiana de cosmopolitismo está distribuído entre a democracia na Europa e a ordem mundial[3]. Na esfera europeia, Habermas deriva a tese do déficit democrático nacional das instituições políticas (1996) para a constelação pós-nacional (1998b; 2001; 2013). A crise de legitimação decorrente da desigualdade estrutural do capitalismo, que tende a impedir a realização da igualdade invocada pelos direitos democráticos fundamentais, se vê acrescida dos problemas advindos da globalização.

No plano administrativo e fiscal da política, o neoliberalismo consiste no principal fator de corrosão dos meios para a legitimação democrática. Ao pressionar pela substituição dos serviços públicos por serviços privados, o modelo neoliberal tende a retirar do Estado meios de regulação e de realização de direitos fundamentais. O problema de legitimação que isso provoca é o seguinte: “apenas o poder se deixa democratizar, o dinheiro não” (HABERMAS, 2001, p. 100). No plano cultural e econômico, identificam-se limites funcionais da forma nacional de democracia para lidar com os problemas de integração advindos da pluralização moral do mundo da vida para a formação da vontade (HABERMAS, 1998b, pp. 111-117) e da desterritorialização dos mercados (HABERMAS, 2001, pp. 65-74). A tensão estrutural e histórica entre capitalismo e democracia é levada para a constelação pós-nacional. O autor então advoga pela construção de uma democracia europeia cosmopolita, orientada para maior integração entre os Estados, maior participação da sociedade civil nos processos decisórios (HABERMAS, 2013, pp. 1-70) e ancorada no plano político-cultural em um patriotismo constitucional (HABERMAS, 1998b, pp 117-120), o qual visa assegurar, como um equivalente funcional à ideia de nação, uma referência político-cultural pós-nacional em torno da qual culturas distintas podem reconhecer-se, ainda que fracamente, umas às outras.

Na esfera mundial, a ênfase é dada ao grau insuficiente de normatização das relações internacionais. A desterritorialização do mercado e da sociedade civil permanece o ponto de partida do diagnóstico, mas não é mais pensada no contexto da democracia. Por isso, pode-se dizer que, na esfera mundial, o déficit democrático diagnosticado na democracia europeia se torna, num sentido amplo, um déficit normativo. Trata-se da insegurança jurídica que representa o grau insuficiente de normatização, por exemplo, para a legitimação da política de direitos humanos das Nações Unidas e a baixa eficiência dos arranjos de governança global (HABERMAS, 2003, pp. 37-74; 2006, pp. 113-193). Disso decorre uma ordem mundial pouco eficiente nos planos político, econômico e jurídico.

A constatação de interdependência estrutural crescente permite caracterizar a precariedade normativa das relações internacionais: “No nível internacional, encontramo-nos, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, no estado crônico de uma ordem cosmopolita subinstitucionalizada” (HABERMAS, 2004, p. 60). Diante disso, Habermas sugere a construção de uma ordem mundial orientada pelo respeito aos direitos humanos. Os direitos humanos, argumenta o autor, podem constituir uma ancoragem jurídica, política e normativa para legitimar a atuação das instituições internacionais e ampliar a influência da sociedade civil organizada em escala global sobre os processos de deliberação. Uma ordem como essa pretende apontar caminhos para uma transição do direito internacional clássico para o cosmopolita. Isso deve vir acompanhado de uma transição correspondente na esfera nacional, no sentido de passar de uma política internacional mediada pelo poder para uma política interna mundial (HABERMAS, 2006, pp. 113-193; 2001, pp. 75-142; 1998b, pp. 186-193).

Tanto o diagnóstico de época quanto o horizonte cosmopolita traçados por Habermas estão ancorados em uma representação dicotômica do mundo, que separa o Ocidente do Resto. A construção de uma democracia cosmopolita no nível europeu é possível porque seus cidadãos teriam aprendido coletivamente com a experiência de uma modernidade que foi particularmente marcada por “divisões”, “diferenças e tensões”, cujo resultado, no plano moral, é um “universalismo igualitário” (HABERMAS, 2001, pp. 130-131). Nisto reside a primeira pressuposição empírica do diagnóstico de época elaborado pelo autor.

Na esfera mundial, esse aprendizado permitiria afirmar que as saídas encontradas nessa parte do mundo para problemas mundiais – às vezes também referida como Ocidente – podem direcionar a construção de uma ordem mundial cosmopolita (HABERMAS, 1998b, pp. 186-188; 2006, pp. 176-177). O ponto de partida é a interpretação ocidental dos direitos humanos. Da perspectiva de sua teoria da evolução social (HABERMAS, 1987, v. 2, pp. 131-218; 2004, pp. 31-63), isso se justifica pelo reconhecimento de um Ocidente mais evoluído que o Resto no plano sociomoral, uma vez que seus cidadãos teriam aprendido com os erros nacionalistas do passado, teriam enraizado princípios democráticos e evoluído singularmente na esfera cognitivo-tecnológica, tornando-os mais propensos a desenvolver uma solidariedade de tipo cosmopolita. Habermas pressupõe aqui uma dialética entre evolução na esfera cognitivo-tecnológica e na esfera sociomoral, sem a qual o potencial de destruição liberado na primeira não seria contido – como ilustra o caso do tratado de não-proliferação de armas nucleares. Nisto reside a segunda pressuposição empírica de Habermas: a experiência histórica particular das sociedades ocidentais teria favorecido, diferentemente de outras sociedades, uma solidariedade cosmopolita.

Compreende-se assim que a versão habermasiana de cosmopolitismo trata dos problemas de legitimação da democracia (sistema de direitos) e da ordem mundial (direito internacional) e avança uma pretensão normativa de validade (interpretação ocidental dos direitos humanos) justificada em uma teoria da evolução social (dialética entre as esferas cognitivo-tecnológica e sociomoral). Nessa perspectiva, o Ocidente democrático representaria, por assim dizer, a melhor situação epistêmica possível. Por isso, Habermas não considera problemático ancorar o horizonte da ordem mundial cosmopolita em uma “defesa apologética” da interpretação ocidental dos direitos humanos (HABERMAS, 2001, p. 153), vinculando-os aos princípios de soberania popular e democracia (HABERMAS, 1996, pp. 84-103, 118-131), em oposição a outras interpretações culturais.

No plano estrutural, a dicotomia Ocidente/Resto que orienta a constelação pós-nacional pode ser interpretada como derivação do conceito de sociedade elaborado pelo autor. Habermas define o conceito de sociedade pela imbricação evolutivamente vinculante entre mundo da vida e sistema (1987, v. 2, pp. 168-218). Sociologicamente, a unidade estrutural de sua teoria da sociedade é então definida pela imbricação entre comunidade de cultura e a organização política e econômica que lhe é historicamente particular. A forma moderna dessa imbricação é a sociedade nacional. Do ponto de vista da esfera mundial, isso significa que Habermas formula uma teoria evolutiva da “mônada” cultural: a transformação social seria expressão da experiência antropologicamente auto-referenciada de uma tradição cultural apreendida reflexivamente no acontecer da experiência de erros e acertos, tendendo a modificar, via aprendizagem, os sistemas funcionais (HABERMAS, 1987, v. 2, pp. 131-167).

Um limite interpretativo decorre dessa vinculação interna entre sociedade, evolução social e dicotomia Ocidente/Resto. Ao partir da dedução do todo pela parte, o conceito habermasiano de sociedade está circunscrito aos aspectos internos da imbricação mundo da vida-sistema, passando ao largo do entrelaçamento histórico das sociedades, i.e., da mundialização/globalização. A ancoragem na dicotomia Ocidente/Resto, nesse sentido, parece decorrer do conceito de sociedade elaborado por Habermas. Isso é particularmente evidente nos conceitos de experiência e de situação: mediatizada pela intercompreensão linguística (HABERMAS, 1987, v. 1, pp. 283-334), a experiência está tendencialmente circunscrita à comunidade linguística como processo de aprendizagem, e a situação de vida está restrita à estruturação histórica e sociologicamente particular do mundo da vida e do sistema. Ao definir os efeitos (ilocucionários e perlocucionários) liberados pelo ato de fala como esfera constitutiva da coordenação da ação (HABERMAS, 1998a), a fundação pragmático-formal da ação social tende a restringir o que é sociologicamente relevante àquilo que podemos expressar linguisticamente[4], eo ipso, ao reconhecimento intersubjetivo particularmente forte que caracteriza a socialização entre pessoas que compartilham previamente uma mesma cultura. Há, neste sentido, um auto-referenciamento cultural latente na teoria habermasiana da sociedade. O retorno à hermenêutica de Gadamer, assim argumento, pode auxiliar-nos a corrigir isso.

Em vista do que foi dito até aqui, compreende-se que Habermas universaliza a expressão específica nas sociedades democráticas ocidentais de uma modernização caracterizada por uma racionalização crescente e, entre outros desenvolvimentos e tendências, por um potencial sociomoral cosmopolita. Essa vinculação interna entre modernização como racionalização social e cosmopolitismo comporta duas pressuposições empíricas problemáticas: comparativamente ao Resto, Habermas pressupõe um Ocidente cosmopolita ou potencialmente cosmopolita nos planos da identidade cultural, da reprodução cultural e das formas de socialização; segundo, tende a associar exclusivamente ao Ocidente a existência de práticas sociais cosmopolitas. A seguir, apresento resultados de estudos empíricos sobre o cosmopolitismo realizados dentro e fora da Europa na década seguinte à publicação de A inclusão do outro (1998b [orig. 1996]) e A constelação pós-nacional (2001 [orig. 1998]), os quais invalidam ambas as pressuposições empíricas.

Mundialização e práticas sociais cosmopolitas

O European Values Study realizado pela Comissão Europeia em 2000 mostra que uma mundialização que se manifesta como cosmopolitização desde dentro “caracteriza as orientações dos europeus apenas em um escopo limitado[5]” (PICHLER, 2009, p. 719); no lugar disso, eles “frequentemente desenvolvem orientações exclusivas e locais em resposta a nova realidade social do transnacionalismo” (Idem, ibidem). Podemos ainda citar outros surveys com um recorte geográfico nacional no continente europeu, como os aplicados pelo governo sueco em 1995 e 2003 (OLOFSON e ÖHMAN, 2007), os quais nos mostram que, em relação à cultura e à política, “o número de protecionistas locais e globais [prioridade do que é local ou nacional] aumentou em detrimento do número de abertos locais e globais [pró-globalização]”; os suecos se tornaram, por assim dizer, “menos cosmopolitas” (OLOFSON e ÖHMAN, 2007, p. 889). Por fim, o estudo por grupos focais realizados em 2001 no subúrbio de Londres mostra que há poucas evidências quanto à existência do que seria uma “cidadania global. de orientação cosmopolita (SZERSZYNSKI e URRY, 2002, p. 472). Esses três estudos empíricos permitem concluir que a pressuposição de uma Europa cosmopolita parece precipitada, o que, considerando o que vimos, invalida o protagonismo especial atribuído a essa região ou, em sentido amplo, ao Ocidente, na construção de uma ordem mundial cosmopolita.

O segundo equívoco diz respeito ao “excepcionalismo” ocidental de práticas sociais cosmopolitas. Etnografias realizadas no espaço midiático indígena da Nicarágua (GLYNN E CUPPLES, 2010), em regiões rurais da Índia (GIDWANI e SIVARAMAKRISHNAN, 2003) ou ainda em pequenas comunidades do Oeste da África (PIOT, 1999), por exemplo, sustentam que práticas sociais cosmopolitas existem potencialmente ali onde há a experiência histórica do contato com a diferença cultural. Enquanto prática social, o cosmopolitismo existe de diversas maneiras e em vários lugares e deve ser pensado na dupla dimensão sincrônica e diacrônica da experiência.

Isso implica afirmar a primazia do local sobre o que circula globalmente. Hermeneuticamente, pode-se dizer que há uma primazia da situação hermenêutica em nosso acesso ao mundo (GADAMER, 1999, pp. 400-458). A consequência disso reside em que podemos ser cosmopolitas de diferentes maneiras, mediante incorporações, rejeições e indiferenças frente a conteúdos culturais que, no plano da experiência, não deixam de estar situados antropológica e sociologicamente. O “global” não existe desde o global porque ninguém é capaz de acessar o mundo desde um horizonte que não seja o próprio.

Em vista disso, é empiricamente precipitado atribuir uma circunscrição geo-cultural ao cosmopolitismo. Na multiplicidade de modernidades entrelaçadas e tradições culturais (CONRAD e RANDERIA, 2002), práticas sociais cosmopolitas, por exemplo, podem não estar associadas à democracia ou à razão secular (GIDWANI e SIVARAMAKRISHNAN, 2003, p. 343). Portanto, parece mais apropriado falar em cosmopolitismos, no plural (POLLOCK et al.., 2000; BHAMBRA, 2010), uma vez que a mundialização invoca uma vinculação interna entre localismo e cosmopolitismo (LAMONT e AKSARTOVA, 2002; HANNERZ, 2006; MIGNOLO, 2011).

Os estudos acima referidos e o argumento formulado iluminam três limites interpretativos decorrentes da dicotomia Ocidente/Resto, eo ipso, do cosmopolitismo dela derivado. Primeiro, essa dicotomia repousa sobre a concepção empiricamente problemática de uma modernização que, historicamente, se inicia no Ocidente e se difunde teleologicamente para o Resto, como se este último fosse agente passivo da modernização daquele. Isso se aproxima do argumento que Sérgio Costa (2006, pp. 39-42 e p. 129) contrapõe à constelação pós-nacional. Segundo, tende-se a fundir fronteira geopolítica, que é historicamente contextual, e fronteira sociológica. Considerando esses dois primeiros níveis, podemos delinear um continuumque vai da pressuposição metateórica de dedução do todo pela parte (modernização como racionalização) à dicotomia Ocidente/Resto: a manifestação particular da modernização na parte dominante do mundo (Ocidente) é tida como referência comparativa e horizonte normativo da modernização na parte dominada (Resto). Consequentemente, desconsideram-se os entrelaçamentos históricos que coproduziram o mundo moderno (LÉVI-STRAUSS, 1987; CHAKRABARTY, 2000; RANDERIA, 2002). Por fim, deixam-se também de lado os processos históricos que conferiram um horizonte mundial à modernização, majoritariamente a colonização e o imperialismo (WALLERSTEIN, 1976; BHAMBRA, 2011).

No que tange especificamente à política de direitos humanos, o diagnóstico de Habermas é assertivo ao identificar na mobilização desses direitos um potencial emancipatório frente à ordem nacional. O problema reside na defesa apologética de uma interpretação cultural particular desses direitos. No lugar de abrir-se para a diversidade de significações que esses direitos assumem na luta dos povos e suas experiências históricas particulares, Habermas assume uma posição, por assim dizer, de “batalha argumentativa”. Como fonte de significação que circula mundialmente, os direitos humanos adquirem sentido em diferentes experiências de luta emancipatória, vinculando-se a imagens de mundo e ordens culturais transitivas distintas. Boaventura de Souza Santos (SANTOS, 2003; SANTOS e NUNES, 2003) nos mostra em que medida interpretações culturais distintas dos direitos humanos são algo imanente e não-concorrente. Uma hermenêutica diatópica[6], sugere Santos, nos permitiria identificar incompletudes recíprocas e complementaridades entre elas. Esse procedimento confere ao cosmopolitismo dos direitos humanos um potencial de transformação, na medida em que a abertura reflexiva do self para a perspectiva do Outro amplia potencialmente nossa compreensão do mundo (DELANTY, 2009).

Compreende-se por tudo o que vimos até aqui, que práticas sociais cosmopolitas não podem ser adequadamente identificadas se nos ativermos a aspectos da constituição e reprodução de simetrias (entendimento mútuo) e assimetrias (poder) internos à sociedade – como faz Habermas. Essa dimensão interna deve ser pensada à luz da constituição e reprodução de simetrias e assimetrias externas à imbricação mundo da vida e sistema. Caso contrário, a crítica tende a assumir a forma anticosmopolita de contribuir com a reprodução das assimetrias herdadas do colonialismo.

No âmbito das assimetrias, o estudo de Alexa Robertson sobre os noticiários internacionais é instrutivo. Robertson (2010, pp. 85-100) nos mostra como a representação de acontecimentos mundiais em noticiários televisivos norte-europeus – o 11 de setembro e o tsunami na Indonésia em 2010, por exemplo – promove uma cosmopolitização da vida social “sem sair de casa” e como a construção narrativa da notícia está inscrita em determinada imagem de mundo e reproduz assimetrias de poder mundiais (ROBERTSON, 2010, pp. 19-24). Num primeiro momento, isso quer dizer, afirma a autora, que a situação hermenêutica do jornalista conduz a experiência do “global” que o telespectador tem. Confirma-se aqui a vinculação interna entre localismo e cosmopolitismo. Nesta perspectiva, a dimensão diacrônica da experiência da mundialização invoca a reprodução de assimetrias históricas mundiais na construção da notícia. No plano discursivo, essa reprodução acontece na seleção do que é relevante ou não de ser noticiado, na seleção dos entrevistados, no tempo conferido a cada um deles na reportagem, na distribuição geográfica do noticiário e nos significados associados à palavra “global” (ver também DENCIK, 2013).

Por um lado, isso quer dizer que a simultaneidade da circulação global das notícias estimula tanto sensos de um presente comum (sincronia) como reproduz assimetrias históricas mundiais (diacronia). Por outro, também significa que ali onde encontramos as narrativas midiáticas, que nos abrem para acontecimentos, costumes e paisagens distantes, ocorre uma modificação potencial da maneira como interpretamos o mundo e como vemos a nós mesmos no mundo: conforma-se um tempo e um espaço potencialmente comum e, nesta medida, estimula-se o surgimento de um imaginário planetário que podemos caracterizar como cosmopolita.

No que segue, concentro-me especialmente na dimensão sincrônica da experiência, a qual pressupõe uma simetria fundamental do entendimento mútuo. Isso se justifica pelo fato de que, no plano hermenêutico, a dimensão sincrônica remete às questões da diversidade cultural e do entrelaçamento cultural das sociedades como abertura fundamental ao mundo. Neste contexto, os estudos recentes sobre o cosmopolitismo estético-cultural têm especial interesse, ao nos revelar as dimensões da experiência de um quotidiano culturalmente diversificado e entrelaçado.

Cosmopolitismo nas pequenas coisas do quotidiano: a dimensão estético-cultural

A circulação internacional de produtos culturais (música, literatura, filmes, alimentação, vestimenta, entre outros) introduz no quotidiano uma relação mundana com a diferença cultural e a alteridade, cuja natureza é “primeiramente estética” (CICCHELLI et al., 2016, p. 57). Modificando os referenciais estéticos locais do indivíduo (CICCHELLI e OCTOBRE, 2015, p. 102), a circulação internacional de produtos culturais incide sobre a construção da identidade, o pertencimento cultural e, por conseguinte, sobre as formas de socialização. Vincenzo Cicchelli (2016b, pp. 183-189) distingue quatro componentes de uma socialização cosmopolita que está a emergir, entre as quais interessa especialmente ao propósito aqui definido as componentes cosmo-estética e cosmo-cultural.

Baseado em estudos por amostragem sobre práticas de consumo de produtos culturais entre jovens de 15 a 29 anos na França[7] (OCTOBRE, 2014; CICCHELLI e OCTOBRE, 2015; 2017), a análise do cosmopolitismo estético-cultural chega à conclusão de que a globalização de produtos culturais vem acompanhada de processos de esteticização – no sentido de emoções e de diversificação das práticas e dos gostos vinculadas ao consumo na “definição do self” – e de culturalização da vida quotidiana – no sentido da “banalização” do exotismo e da “aquisição cultural” (CICCHELLI et al., 2016, p. 59). Concentrando-se no tipo banal ou ordinário de cosmopolitismo (ver, por exemplo, BECK, 2006, pp. 83-89; URRY e SZERSZYNSKI, 2002), a dimensão estética acessa a experiência quotidiana de entrelaçamentos culturais enquanto “espírito cosmopolita”, como maneira de vivenciar o mundo (CICCHELLI, 2016b, pp. 197-252).

Três dimensões praxiológicas compõem o conceito: “[i] uma forte atração e curiosidade em relação a práticas culturais e produtos exóticos de outros lugares, tendo ou não referências localizadas - autênticas ou reinventadas; [ii] a hibridização com formas culturais nacionais ou com apropriações individuais localizadas”; e, por fim, “[iii] o desenvolvimento de uma autoafirmação que está ligada ao desejo de compreender o Outro, para melhor entender a si mesmo” (CICCHELLI et al., 2016, p. 60). Enquanto orientação cosmo-estética da experiência, fala-se em compartilhamento de sentimentos, sensações, gostos, habilidades culturais, estilos de vida, imaginários no contexto da relação entre o que é próprio (self) e o que é do Outro. Esses compartilhamentos modificam o repertório cultural intersubjetivamente compartilhado, antes restrito grosso modo ao escopoetno-estético da nação. Não é que a cultura nacional não influa mais sobre a visão de mundo, ela foi resignificada em condições de experiência cada vez mais transnacionalizadas.

Nesse contexto, a distinção entre cosmopolitismo involuntário e cosmopolitismo intencional é relevante. O primeiro se refere à reinvenção ou hibridização (local) do significado de produtos e práticas culturais que ocorre de maneira tácita, pelo simples ato de consumir. Consome-se “cosmopolitamente” sem que isso leve a uma relação reflexiva com o Outro, sem haver engajamento ético, moral ou político. Já o cosmopolitismo intencional diz respeito a uma experiência da alteridade que ativa a reflexividade. Isto é, o cosmopolita intencional transgride “fronteiras convencionais da própria cultura étnica ou nacional” (CICCHELLI et al., 2016, p. 61). Nessa acepção, práticas diversificadas de consumo cultural estimulam, reflexivamente, a imaginação num sentido cosmopolita e podem promover um engajamento ético, moral e político com o Outro.

O caráter involuntário ou intencional do cosmopolitismo sugere que a relação entre consumo e abertura cosmopolita remete a processos ambivalentes de aprendizagem (CICCHELLI, 2016b, pp. 191-196). Ambivalente porque não decorrem de um conhecimento organizado, sendo “um processo enviesado e reversível” (CICCHELLI, 2013, p. 218). Isto é, a relação entre experiência estética e aprendizagem não é linear: por um lado, a experiência estética do consumo não necessariamente gera consciência moral e princípios éticos inclusivos do Outro, mas, por outro lado, quando tal consciência e princípios motivam a ação, pressupõe-se a experiência estética (CICCHELLI, 2016a, p. 9). Desse processo ambivalente de aprendizagem surge o cosmopolita amador, um tipo social cuja relação com a cultura se dá mediante uma dinâmica de compartilhamento, diferenciação e misturas “particulares e efêmeras [...]vinculada a uma socialização horizontal tecida na forma de rede” (CICCHELLI et al., 2016, p. 62).

A pesquisa sobre o cosmopolitismo estético-cultural ainda é incipiente, consequentemente ainda sabemos pouco sobre as implicações normativas do cosmopolita amador e sua incidência sobre a estratificação social. Todavia, as pesquisas já realizadas sugerem que, com a diversificação do consumo cultural na era digital (OCTOBRE, 2014), o cosmopolitismo não está mais restrito às elites: “[quando] as elites esnobes [...] são substituídas por cosmopolitas estéticos, as hierarquias de legitimidade (culturais / sociais / econômicas) tendem a se desvincular, especialmente entre os jovens e em um regime de consumo digital e mediático” (CICCHELLI e OCTOBRE, 2015, p. 108). Isso significa que a correspondência entre estratificação social e cultural (ver, por exemplo, BOURDIEU e PASSERON, 1970; BOURDIEU, 1979) parece ter se complexificado: o cosmopolitismo estético-cultural ilumina uma reconfiguração da relação entre “informação e conhecimento, educação e cultura, experiência e representação” (CICCHELLI et al., 2016, p. 60). Como consequência de uma “tendência para a hibridização dos espaços culturais”, não seria mais possível auferir uma posição social apenas com base no “repertório de gostos e de práticas” (CICCHELLI e OCTOBRE, 2015, p. 108).

Em vista do que precede, compreende-se que o cosmopolitismo estético-cultural situa analiticamente o entrelaçamento cultural nas pequenas coisas do dia a dia. Na medida em que a experiência do não-familiar pode ativar a reflexividade e promover formas de aprendizagem, as dimensões estética e cultural do cosmopolitismo não ficam reduzidas à superficialidade do consumo nem à efemeridade de encontros. A experiência do consumo de produtos culturais estrangeiros vem acompanhada de uma “apropriação linguística, visual ou narrativa” que incide sobre a reprodução cultural (CICCHELLI e OCTOBRE, 2015, p. 103). Ao iluminar os contornos de uma socialização cosmopolita que está a tomar forma entre os jovens, o cosmopolitismo estético-cultural invoca um entendimento intersubjetivo que pode ser compreendido a partir de uma hermenêutica da alteridade, na qual experiência e aprendizagem orientam a relação de Ego com Alter num mundo culturalmente plural e comum (CICCHELLI , 2016b, pp. 153-166).

O cosmopolitismo estético-cultural diz então respeito à dimensão sincrônica (simetria) da experiência da mundialização; ele identifica a diversificação dos conteúdos culturais que constituem nossa experiência quotidiana do mundo (sincronia) e nos mostra que acessamos e incorporamos esses conteúdos interpretativamente, no contexto de uma situação hermenêutica particular (simetria). A hipótese que desenvolvo a seguir está voltada para os aspectos fundamentais dessa experiência, o que significa dizer, de acordo com a perspectiva hermenêutica adotada, que a vincularei às pré-condições da compreensão do mundo de que somos capazes. Para tanto, argumento ser necessário introduzir uma perspectiva intercultural que esteja em medida de acessar os fenômenos da diversidade cultural e do entrelaçamento cultural. Mais precisamente, argumento que a experiência da mundialização e a socialização cosmopolita pressupõem um tipo intercultural de entendimento mútuo.

Experiência da mundialização como experiência hermenêutica

No plano metateórico, a perspectiva hermenêutica desenvolvida a seguir permite derivar a pressuposição de dedução do todo pela relação entre as partes em uma fundação para o projeto de teoria social crítica cosmopolita. É com esse propósito que sugiro conceber a experiência da mundialização como experiência hermenêutica. Aqui, limito-me a traçar os contornos gerais do conceito de entendimento intercultural. Para tanto, oriento-me por duas perguntas de caráter ontológico: (i) Por que a diversidade cultural é uma característica imanente ao nosso estar-no-mundo? (ii) Como é possível o entrelaçamento cultural das sociedades?

A mundialização parece ter dilatado a dimensão sincrônica de nossa experiência do mundo ao diversificar o contato quotidiano com outras tradições culturais e coisas no mundo. Isso sugere que cada vez mais nos damos conta do fato de que a intensificação dos entrelaçamentos culturais exerce uma influência efetiva sobre a consciência histórica. Fundamentalmente, esse argumento se justifica pelo fato de que seria infundado caracterizar a possibilidade de ter consciência a respeito da singularidade da própria tradição cultural, sem invocar o que nos distingue de outra tradição.

No plano hermenêutico, a mundialização invoca uma diversificação das fontes de significação disponíveis e de interpretações culturais do mundo e de coisas no mundo com as quais temos contato ao longo de nossa vida. Em sentido amplo, pode-se dizer que isso conforma a experiência de um tempo e de um espaço potencialmente comum, que estimula um imaginário cosmopolita em atores encarnados em diferentes situações hermenêuticas. Trata-se aqui da dimensão hermenêutica da vinculação entre localismo e cosmopolitismo.

Por outro lado, essa diversificação também remete a uma finitude imanente da experiência da mundialização. Essa finitude se deve às pré-condições hermenêuticas da compreensão do mundo de que somos capazes. Três aspectos pré-condicionantes da compreensão são importantes aqui. Primeiro, a experiência da mundialização é finita porque nossa encarnação em determinada situação hermenêutica impõe um limite ao nosso horizonte sobre o mundo, horizonte este que herdamos da tradição cultural via linguagem (diacronia) e que adquirimos no acontecer de nossa experiência do mundo (sincronia) (GADAMER, 1999, pp. 440-455, 540-543, 550-555). Segundo, essa finitude se deve ao fato de que nossa compreensão é mediatizada pelo uso da linguagem. Nossa compreensão do mundo e de si no mundo é limitada porque a linguagem caracteriza meios finitos, dotados de um universo pré-estruturado de representação simbólica do mundo que não pode ser invocado de maneira total, una, mas sempre com base na forma progressiva do discurso (estrutura pronominal, por exemplo); acessamos o nosso conhecimento sobre o mundo progressivamente. E terceiro, a experiência da mundialização se caracteriza por uma finitude intransponível porque não somos capazes de abstrair a efetividade contextual da experiência (sincronia). Trata-se aqui de um limite propriamente fenomenológico da compreensão. Porque o nosso corpo está situado espacial e temporalmente, não podemos passar por todas as experiências disponíveis no mundo (GADAMER, 1999, pp. 636-662). Essas pré-condições hermenêuticas de nossa compreensão impõem uma finitude à experiência da mundialização no sentido de como a vivemos e podemos compreendê-la.

Isso nos permite tratar da primeira pergunta formulada: a diversidade cultural é imanente ao nosso estar-no-mundo porque nossa compreensão do mundo é finita. Porque nossa compreensão é finita, experienciamos a mundialização diferentemente, a partir da situação hermenêutica na qual estamos sempre já encarnados e mediante fusões parciais do nosso horizonte com o horizonte daqueles tantos Outros que se nos fazem presentes – como turista, como estrangeiro que se tornou vizinho, ou via circulação internacional de produtos culturais, as narrativas midiáticas. Portanto, a finitude hermenêutica de nossa compreensão sugere que há tantas formas sociológicas de cosmopolitismo quanto há diferentes formas culturais de vida, no sentido de comonos relacionamos com a alteridade e com quais Outros.

Essas fusões parciais dos horizontes podem ser tácitas, no sentido de que pré-constituem nossa experiência do mundo – como no caso da acepção involuntária do cosmopolita amador, por exemplo –, ou conscientes, no sentido de que podem ser ensejadas – como no caso da acepção intencional. Em ambas as formas, pressupõe-se um tipo intercultural de entendimento, o que nos leva para a segunda pergunta formulada: o entrelaçamento cultural das sociedades é possível porque nossa abertura hermenêutica ao mundo invoca um tipo intercultural de entendimento como pré-condição de nossa experiência do mundo.

As pré-condições de um tipo intercultural de entendimento podem ser reveladas por três aspectos fundamentais que caracterizam nossa abertura hermenêutica ao mundo (BOSCO, 2016, pp. 301-302). O entrelaçamento cultural das sociedades é possível porque:

Nesta perspectiva, não estamos culturalmente isolados. No acontecer de nossa experiência do mundo, não há apenas diferenciação em relação a outras tradições culturais, mas também compartilhamento:

Tal como cada indivíduo não é nunca indivíduo solitário, pois está sempre entendendo-se com os outros, da mesma maneira o horizonte fechado que cercaria uma cultura é uma abstração. A mobilidade histórica da existência humana apoia-se precisamente em que não há uma vinculação absoluta a uma determinada posição, e nesse sentido tampouco existe um horizonte fechado (GADAMER, 1999, pp. 454-455).

Isso quer dizer que a impregnação linguística de nossa experiência do mundo não está fechada em si mesma. A fronteira da percepção (situação hermenêutica) e a impregnação linguística não constituem uma fronteira hermenêutica (GADAMER, 1999, pp. 540-543, 550-559) nem sociológica. Porque a impregnação linguística e a percepção acontecem via um “continuum de matizações” do objeto, nossa compreensão está hermeneuticamente aberta, permitindo até mesmo acessar a “acepção do mundo” que se oferece em outra língua e cultura (GADAMER, 1999, p. 650).

Em vista disso, o fato de a mundialização diversificar (sincronia) os conteúdos materiais e simbólicos que compõem nossa experiência do mundo sugere que a fusão de horizontes não está restrita à comunidade linguística. Na perspectiva dos participantes, essas pré-condições significam que as dimensões sincrônica e diacrônica se tornam efetivas como diálogo contínuo (GADAMER, 1999, pp. 512-533) com os Outros culturais – numa dinâmica imaginativa, por exemplo, de aproximação e distanciamento estimulada pelas narrativas midiáticas, o consumo cultural, a imigração, o exílio (CICCHELLI, 2016b, pp. 140-141; ver também APPADURAI, 1996, pp. 1-88). Para o que nos ocupa, o fato de o entrelaçamento cultural das sociedades invocar um entendimento intercultural como pré-condição de nossa experiência de mundo significa que viver em um mundo mundializado implica interagir continuamente com fontes de significação e interpretações culturais do mundo e de coisas no mundo que, por assim dizer, chegam até nós. Neste contexto, a experiência da mundialização se caracteriza pela dialética da familiaridade e da não-familiaridade do conteúdo cultural.

O entendimento intercultural, portanto, pode ser tido como o medium da experiência da mundialização, o que implica dizer que ele também constitui, ao lado do entendimento mútuo concebido comunicativamente, a reprodução do mundo da vida. Isso sugere que o entrelaçamento cultural das sociedades estaria na origem de processos de aprendizagem – tácitos ou conscientes, fundamentalmente ambivalentes, como diagnosticado no cosmopolitismo estético-cultural. Uma vez que a mundialização remete a uma diversificação das fontes de significação disponíveis e das interpretações culturais do mundo e de coisas no mundo, esse processo de aprendizagem pode ser hermeneuticamente compreendido como diversificação dos signos de pensamento e diversificação semântica das estruturas linguísticas compartilhadas intersubjetivamente no mundo da vida.

Compreende-se assim que a consciência histórica não seria apenas expressão da apreensão auto-referenciada e reflexiva da tradição cultural. Na medida em que o nosso horizonte sobre o mundo não é a expressão estática da situação hermenêutica na qual estamos sempre já encarnados (GADAMER, 1999, pp. 544-550), a experiência do contato com o Outro (sincronia) pode ativar a apreensão reflexiva da tradição cultural herdada (diacronia). Isso equivale a dizer que, como processo de aprendizagem, a experiência do contato com o Outro pode levar a uma ampliação do nosso horizonte sobre o mundo.

Em sentido amplo, a implicação empírica dessa hipótese é a seguinte: consciente ou inconscientemente, viver em um mundo mundializado implica ser cosmopolita de alguma maneira, uma vez que a diferença cultural se tornou parte imanente da socialização. No plano sociológico, essa perspectiva intercultural deve estar em medida de caracterizar a alteridade e o papel que cumpre na constituição da identidade cultural, na reprodução cultural e nas formas de socialização.

Considerações finais: de Gadamer a Habermas

Nas duas primeiras seções, fomos sucessivamente da análise metateórica da vinculação habermasiana entre modernização e cosmopolitismo à identificação de limites interpretativos a essa vinculação nos planos empírico, teórico e político-normativo. Na terceira seção, vimos o diagnóstico do cosmopolitismo estético-cultural como dimensão quotidiana do entrelaçamento cultural das sociedades, i.e., da experiência da mundialização. Conectando esse diagnóstico com a hermenêutica filosófica de Gadamer, na quarta seção delineei uma hipótese reconstrutiva que desvela as pré-condições de um tipo intercultural de entendimento, o qual pode ser tido, assim sugeri, como medium da experiência da mundialização. Adotar uma estratégia reconstrutiva significa, nesse contexto, que o conceito de entendimento intercultural pode contribuir com a fundação de uma teoria social crítica que reivindica um horizonte cosmopolita, na medida em que permite compreender por que a diversidade cultural é imanente ao nosso estar-no-mundo e como é possível o entrelaçamento cultural das sociedades. O tratamento dessas questões, em princípio, possibilita fundar ontologicamente o que vimos com a literatura sociológica e antropológica sobre o cosmopolitismo: de que há tantas formas de cosmopolitismo quanto há diferentes formas culturais de vida e que o mundo da vida está aberto a tudo o que se nos faz presente.

Tal abertura do mundo da vida para outras culturas oferece um ponto de partida fundamental para operar o movimento de volta, de Gadamer a Habermas. Isso é necessário porque a hermenêutica gadameriana não é crítica e não nos oferece uma teoria da sociedade. Eu concordo com Habermas quando argumenta ser problemática a autossuficiência ontológica da hermenêutica e o subsequente rechaço da questão da metodologia nas ciências sociais, assim como o conservadorismo que representa a vinculação interna e anti-iluminista que Gadamer (1999, pp. 400-435) estabelece entre pré-conceito, autoridade e tradição (HABERMAS, 1988, pp. 143-170). A hermenêutica gadameriana nos mostra os limites da autocompreensão científica da verdade ao invocar outras experiências de verdade (na arte e na religião, por exemplo), sem, todavia, formular uma alternativa, um conceito de método orientado hermeneuticamente. A reivindicação ontológica de Gadamer de que a experiência hermenêutica é pré-condicional (GADAMER, 1976) tem implicações normativas para a prática científica, as quais “se realizarão nas ciências ou perderão relevância” (HABERMAS, 1988, p. 167). Por outro lado, a oposição que Habermas avança entre crítica da ideologia e hermenêutica é excessiva. Como Paul Ricoeur (1986) argumenta, a possibilidade da crítica em si mesma pressupõe pré-compreensões herdadas da tradição: a crítica é ela mesma uma tradição. Inversamente, a hermenêutica da tradição pressupõe a interpretação como momento crítico envolvendo distanciamento em relação ao que foi herdado. No plano filosófico, essa perspectiva assegura a orientação crítica do retorno a Gadamer.

Para o interesse teórico-social aqui perseguido, o argumento formulado joga nova luz sobre o continuum entre ação comunicativa e ação estratégica, racionalidade comunicativa e racionalidade cognitivo-instrumental, mundo da vida e sistema, esfera sociomoral e esfera cognitivo-tecnológica da evolução social. É necessário introduzir nesse continuum aquilo que a experiência intercultural e o cosmopolitismo invocam no mundo, a saber, a diversidade cultural e o entrelaçamento histórico das sociedades.

O argumento de que o conceito gadameriano de experiência hermenêutica nos fornece aspectos ontológicos do uso da linguagem que nos permitem desvelar um tipo intercultural de entendimento, implica dizer que um conceito como esse nos permitiria abrir a constituição e reprodução do mundo da vida para o entrelaçamento cultural das sociedades. Para tanto, é necessário elucidar a questão do significado no entendimento intercultural e o papel deste último na reprodução do mundo da vida, de modo a reconectar a teoria do significado, primeiro, à teoria da ação, segundo, à teoria social e à geração interativa da ordem social em sociedades culturalmente diversas. Isso permitirá formular hipóteses empíricas e normativas com vistas a analisar a socialização intercultural. Num sentido fundamental, isso significa reconstruir o continuum da teoria habermasiana da sociedade a partir da concepção de que o entrelaçamento cultural das sociedades constitui fonte de aprendizagem e, nesta medida, impulso para a transformação social.

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Notas

* Esta pesquisa conta com o suporte da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
[1] Adoto aqui a diferenciação de Renato Ortiz (2003), segundo a qual a globalização remete a processos de integração funcional e a mundialização, a processos de abertura simbólica e cultural.
[2] Neste artigo, desenvolvo argumentos inicialmente elaborados em minha tese de doutorado. Ver: Bosco, 2016.
[3] Para uma reconstrução da reatualização da ideia kantiana de cosmopolitismo elaborada por Habermas, ver: Chernilo, 2007; Fine, 2003.
[4] A esse respeito, ver as ponderações de Frédéric Vandenberghe (2002, pp. 567-568), quando busca encontrar uma alternativa simpática à fundação habermasiana da vida social no conceito de empatia de Husserl.
[5] Todas as citações em língua estrangeira foram por mim livremente traduzidas.
[6] Ancorada na dialética entre igualdade e diferença, a hermenêutica diatópica de Santos se concentra nas condições do diálogo intercultural e está circunscrita às lutas emancipatórias que mobilizam os direitos humanos em direções distintas (SANTOS, 2003, pp. 454-458). Nesta medida, pode-se tê-la como complementar à hipótese aqui desenvolvida, que desvela pré-condições hermenêuticas de um tipo intercultural de entendimento mútuo.
[7] Ver também os estudos de Wilson Bekesas et al. (2016) sobre o cosmopolitismo estéticocultural no Brasil.
[8] Representativo disso é o fenômeno socio-linguístico de codeswitching, que caracteriza empréstimos quotidianos e abundantes de palavras de línguas estrangeiras (ver, por exemplo, BLOMMAERT, 2015).
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