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O repertório da ação policial: contribuições da literatura sobre policiamento a protestos para o estudo da repressão política no Brasil
Eduardo Georjão Fernandes
Eduardo Georjão Fernandes
O repertório da ação policial: contribuições da literatura sobre policiamento a protestos para o estudo da repressão política no Brasil
The repertoire of police action: contributions from protest policing literature for the study of political repression in Brazil
Revista Brasileira de Sociologia, vol. 8, núm. 20, pp. 102-127, 2020
Sociedade Brasileira de Sociologia
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Resumo: A atuação policial em protestos tem sido uma temática recorrente do debate público nacional. No campo acadêmico, porém, identifica-se uma desconexão entre os campos da ação coletiva/movimentos sociais e da violência/segurança pública. O objetivo do estudo é contribuir, a partir de uma revisão de literatura, para a construção do diálogo entre os estudos internacionais sobre policiamento a protestos e as pesquisas nacionais em violência. Para tanto, são propostos os seguintes direcionamentos: a construção de um arcabouço conceitual que define os termos centrais desse diálogo; a identificação de um amplo campo de controle social da ação coletiva; a mobilização do conceito de repertório para mapeamento de táticas e estratégias de controle da ação coletiva; a construção de abordagens que relacionam o repertório policial às características institucionais e culturais das polícias brasileiras.

Palavras-chave:policiamento a protestospoliciamento a protestos,ação coletivaação coletiva,repertório da ação policialrepertório da ação policial.

Abstract: Police action at protest events in Brazil is a recurring topic of national public debates. In the academic field, however, I identify a disconnection between the fields of collective action/social movements and violence/public security. The aim of this study is to contribute, based on a literature review, for establishing a dialogue between the international studies on protest policing and the national research on violence. Therefore, I propose the following directions: the construction of a conceptual framework that defines the central terms of this dialogue; the identification of a broad field of social control of collective action; the mobilization of the concept of repertoire to classify control tactics and strategies; the construction of approaches that relate the police repertoire to the institutional and cultural characteristics of Brazilian police.

Keywords: protest policing, collective action, repertoire of police action.

Carátula del artículo

Dossiê

O repertório da ação policial: contribuições da literatura sobre policiamento a protestos para o estudo da repressão política no Brasil

The repertoire of police action: contributions from protest policing literature for the study of political repression in Brazil

Eduardo Georjão Fernandes
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Revista Brasileira de Sociologia, vol. 8, núm. 20, pp. 102-127, 2020
Sociedade Brasileira de Sociologia

Recepción: 21 Junio 2020

Aprobación: 08 Octubre 2020

Introdução

No período recente, a atuação policial em eventos de protesto no Brasil tem sido uma temática recorrente do debate público, em especial desde os massivos protestos de junho de 2013. As formas de ação adotadas pelas forças policiais têm sido classificadas por diferentes atores, seja de forma crítica – com a construção e a disseminação de pautas “contra a violência policial” e “contra a criminalização dos movimentos sociais” –, seja de forma favorável ao endurecimento policial – com a construção e disseminação de pautas restritivas à mobilização social. Relatórios produzidos por organizações não governamentais, por exemplo, buscam sistematizar as violações ao direito de protesto ocorridas nos últimos anos, salientando a articulação dos três poderes em torno da restrição ao direito de protesto pós-2013 (Artigo 19 Brasil, 2014; 2019).

No campo acadêmico das ciências sociais, a atuação policial em eventos de protesto tem sido pouco estudada. Em consulta ao termo “repressão política” no Catálogo de Teses e Dissertações CAPES,[1] foram encontrados 62 resultados para teses e dissertações que abordam, com centralidade, o tema da repressão e/ou do controle policial da ação coletiva. Esses estudos em sua maioria são oriundos do campo da história (36 resultados) e analisam a repressão durante o regime militar de 1964-1985 (39 resultados). Pesquisas do campo das ciências sociais (nove resultados) e sobre eventos pós-transição democrática (três resultados) são pouco frequentes.

Parte da lacuna teórica no estudo das táticas policiais de controle da ação coletiva é explicada, no Brasil, pela desarticulação do debate entre dois campos de pesquisa específicos: a sociologia da ação coletiva e dos movimentos sociais, de um lado, e a sociologia da violência e da segurança pública, de outro. Esses campos desenvolveram-se no país de forma relativamente autônoma e pouco dialogam entre si. Ainda, identifica-se um escasso diálogo da literatura brasileira com o campo internacional de estudos do policiamento a protestos (protest policing) (Davenport, Johnston, & Mueller, 2005; Della Porta, & Reiter, 1998; 2006; Earl, 2003; 2006; 2011; Fernandez, 2008; Koopmans, 1997).

A partir desse diagnóstico, o objetivo desta pesquisa é, por meio de um balanço da literatura, propor a conexão entre as pesquisas internacionais sobre policiamento a protestos e os estudos brasileiros em violência e segurança pública. Este artigo inicia-se, na seção seguinte, por uma revisão da literatura internacional sobre policiamento a protestos, com foco sobre a proposição de direções teórico-metodológicas para estudo do controle da ação coletiva. Na seção posterior, a partir de uma revisão das pesquisas brasileiras sobre violência e segurança pública, é proposta a adoção da abordagem “polícia-centrada” para explicação do repertório da ação policial no Brasil. Nas considerações finais são propostas questões para a construção de uma agenda nacional de pesquisa sobre o controle policial da ação coletiva.

A literatura internacional sobre policiamento a protestos

O campo acadêmico do policiamento a protestos, cujo foco é o estudo das formas e dos efeitos do policiamento sobre eventos de protesto, é amplo e variado, havendo um avanço considerável nos últimos 30 anos e um número significativo de pesquisas desde os anos 2000 (Earl, 2011). Apesar da longevidade dessa agenda pesquisa, esses estudos possuem alguns vieses. Espacialmente, identifica-se a concentração de objetos empíricos em países do “Norte Global” (América do Norte e Europa); temporalmente, as análises concentram-se sobre eventos de protesto ocorridos na segunda metade do século XX e no início do século XXI (Fernandes, 2020).

Quanto ao enquadramento conceitual, esses estudos tendem a focar o policiamento a eventos de protesto, ou seja, as situações de interação nas ruas entre manifestantes e forças policiais. A maioria dos estudos, ademais, não explicita o conceito de repressão, implicitamente assumindo que a repressão é a ação adotada pelas autoridades governamentais – geralmente identificada a partir do confronto físico entre agentes policiais e manifestantes (Fernandes, 2020).

As consequências analíticas desses vieses já foram identificadas por alguns autores, dentre os quais se destaca o trabalho de Earl (2003, 2004, 2006, 2011). Earl (2003) e Cunningham (2003) apontam que pesquisadores(as) da ação coletiva, por estarem mais apropriados(as) do vocabulário desse campo e por tenderem a situar os movimentos sociais como unidade de análise, frequentemente atribuem um papel secundário à ação de outros atores, grupos e instituições (forças policiais, mídias etc.). Ao se adotar o ponto de vista específico dos movimentos sociais, as ações das forças policiais, quando abordadas, tendem a ser tratadas como elementos relativamente exógenos e que atuam de modo a necessariamente elevar os custos da ação coletiva.

Alguns estudos dessa literatura, por outro lado, adotam as instituições policiais como unidade de análise, analisando as caraterísticas culturais e organizacionais dessas instituições para além da faceta visível da atuação nas ruas. Tais estudos são as denominadas abordagens “polícia-centradas” (blue approach) (Cunningham, 2003; Della Porta, & Reiter, 1998; Earl, & Soule, 2006; Rafail, 2010; Waddington, & King, 2007).

Considerando-se o acúmulo dessa agenda de pesquisa, parte-se aqui da hipótese de que o diálogo entre a literatura internacional sobre policiamento a protestos e o campo nacional da violência e da segurança pública é profícuo. A seguir são propostos três caminhos teórico-metodológicos para que a conexão entre esses campos ocorra: a construção de um arcabouço conceitual preciso sobre os elementos da ação coletiva e da ação repressiva; a expansão do olhar analítico da repressão física e situacional para o estudo do campo de controle social da ação coletiva; a mobilização eclética do conceito de repertório para classificar táticas e estratégias de controle da ação coletiva.

Do que estamos falando? Confronto político, ação coletiva, movimentos sociais e protestos

A aproximação entre campos de estudo distintos – oriundos de tradições teóricas igualmente distintas – envolve o desafio inicial da construção de um vocabulário comum, que evite desentendimentos a respeito do que se está falando. Por exemplo, é esperado que um(a) pesquisador(a) do campo da violência utilize de forma intercambiável os termos “mobilização”, “movimentos sociais” e “protestos”, como se sinônimos fossem. Com vistas à construção de “pontes” semânticas que diminuam as distâncias da linguagem, essa seção busca definir os principais conceitos oriundos do campo de estudos da ação coletiva: confronto político, ação coletiva, movimentos sociais e protesto.

Parcela importante dos estudos internacionais sobre policiamento a protestos adota a abordagem do “confronto político” (contentious politics) (McAdam, Tarrow, & Tilly, 2001; Tilly, & Tarrow, 2015). Essa abordagem tem como proposta central o deslocamento do foco analítico do estudo isolado dos movimentos sociais para a análise dinâmica dos movimentos na relação com diversos atores, grupos e instituições – tais como mídias, governos, polícias, contramovimentos e corporações privadas. Estudos sob essa perspectiva buscam explicar como atores em cooperação ou em oposição podem se transformar mutuamente durante a interação, salientando-se o caráter dinâmico do confronto político (Della Porta, & Tarrow, 2012; Fernandez, 2008; Moss, 2014; Gillham, & Noakes 2007). Tilly e Tarrow (2015, p. 7) definem “confrontos políticos” como

interações nas quais determinados atores apresentam demandas que afetam os interesses de outros atores levando a esforços coordenados em defesa de interesses ou programas compartilhados e nas quais governos estão envolvidos como alvos ou iniciadores de demandas ou, ainda, como terceiros interessados (tradução própria).

Já “movimentos sociais”, em uma definição amplamente citada na perspectiva do confronto político, são conceituados como “redes de interação informal entre uma pluralidade de indivíduos, grupos e/ou organizações, engajados em um conflito político ou cultural, com base em uma identidade coletiva compartilhada” (Diani, 1992, p. 3). Essa definição pode ser desmembrada em três elementos: a constituição de redes de interação informal; o compartilhamento de uma identidade coletiva; o engajamento em uma ação conflitiva.

Por outro lado, “ação coletiva” pode ser definida como a conexão entre o nível individual e o coletivo, “a ação conjunta de pessoas visando interesses comuns” (Tilly, 1978, p. 7, tradução própria). Refletir sobre a ação coletiva envolve investigar, entre outros aspectos, como os indivíduos podem atuar juntos, por que estes se engajam em um coletivo, como as ações se tornam coletivas e, ainda, quais tipos de ação são adotados para os fins coletivamente estabelecidos. A ação coletiva não necessariamente é contestatória, mas os movimentos sociais caracterizam-se, entre outros elementos, pelo engajamento em ações conflitivas. Destaca-se que os movimentos sociais são uma espécie do gênero ação coletiva, ou seja, movimentos sociais são uma das formas como os indivíduos podem se associar para agir coletivamente. Indivíduos que se organizam pela Internet para a realização de um protesto de rua, por exemplo, configuram uma ação coletiva mesmo que não estejam vinculados organicamente a uma reivindicação ou formalmente a uma organização de movimento social.

A seguir, “protestos” podem ser definidos como uma forma geralmente não rotinizada de afetar processos políticos, sociais e culturais (Della Porta, & Diani, 2006). Protestos são eventos realizados frequentemente – mas não exclusivamente – por organizações de movimentos sociais para expressão de reivindicações e busca de persuasão de autoridades e/ou da opinião pública sobre a legitimidade dessas reivindicações, configurando-se, assim, “arenas de contestação nas quais corpos, símbolos, identidades, práticas e discursos são usados para persuadir ou prevenir mudanças nas relações de poder institucionais” (Taylor, & Van Dyke, 2004, p. 68, tradução própria).


Figura 1
Diagrama das relações conceituais entre ação coletiva, movimento social, protesto
Fonte: autoria própria.

Eventos de protesto constituem uma das principais formas contemporâneas de demonstração pública de demandas coletivas e são frequentemente mobilizados por meio de marchas/passeatas em vias públicas. Como já evidenciado, parte relevante da literatura sobre repressão a movimentos sociais e aos diversos tipos de ação coletiva tende a focar eventos de rua nos quais são identificadas interações de confronto (geralmente violentas) entre manifestantes e forças policiais.

Porém, o foco sobre eventos de protesto tende a invisibilizar formas de interação que ocorrem entre agentes repressivos e diferentes modalidades, elementos e temporalidades de ação coletiva. As táticas policiais de vigilância, por exemplo, podem ser mobilizadas em diferentes momentos (antes, durante e após eventos de protesto) e incidir tanto sobre eventos de protesto quanto sobre os vínculos organizativos de movimentos sociais (como no caso de inquéritos e processos criminais contra integrantes dessas organizações), sobre a ação de ativistas específicos etc. Assim, o olhar amplo sobre a ação coletiva permite uma visão mais complexa – e não restrita a confrontos no momento de um protesto – sobre a incidência da ação repressiva.

Da repressão ao controle social da ação coletiva

Por outro lado, quais são as definições mais adequadas para se conceituar a ação repressiva? Na literatura sobre ação coletiva é de Tilly (1978, p. 100, tradução própria) o conceito mais clássico de repressão: “qualquer ação por outro grupo que aumenta o custo da ação coletiva de um grupo competidor”. Tilly (2006) ainda distingue repressão de facilitação, sendo esta última definida como a ação que diminui o custo da ação coletiva:

Quadro 1
Repressão e facilitação segundo Tilly

Fonte: Tilly (2006, p. 74, tradução própria)

O mérito dessa definição é sua abrangência, dado que Tilly não restringe o promotor da repressão a autoridades policiais ou estatais, abrindo-se possibilidades de estudo das formas como outros atores – contramovimentos e mídias, por exemplo – atuam para o aumento do custo da ação coletiva. Ademais, Tilly não reduz o escopo da repressão à ação física ou à coerção violenta, deixando também um campo aberto para a investigação de diferentes modalidades de ação repressiva, as quais podem atuar de forma antecipatória ou responsiva (reativa). Entretanto, a amplitude do conceito de Tilly não foi suficientemente explorada pela literatura sobre movimentos sociais e ação coletiva, restringindo-se a maioria dos estudos desse campo à repressão física observável e violenta operada por autoridades estatais – predominantemente forças policiais – diante de eventos de protesto (Earl, 2003, 2004, 2011; Oliver, 2008; Starr, Fernandez, & Scholl, 2011).

Earl (2011, p. 263, tradução própria), por seu turno, propõe o seguinte conceito de repressão: “uma ação estatal ou privada dirigida a prevenir, controlar ou constranger a ação coletiva não institucional (exemplo: protesto), incluindo sua iniciação”. Para caracterizar essas diferentes dimensões da ação repressiva, Earl (2003, p. 47) cria a seguinte tipologia:

Quadro 2
Tipologia da ação repressiva segundo Earl

Fonte: Earl (2003, p. 47, tradução própria)

Além de diferenciar as possíveis identidades do agente repressivo quanto à relação deste com o Estado e de separar a ação observável da não observável, Earl estabelece uma diferenciação entre “coerção” (coercion) e “canalização” (chanelling). A primeira refere-se à demonstração ou uso da força por agentes repressivos tradicionais – o uso de bombas de gás lacrimogêneo, por exemplo; a segunda refere-se a formas mais indiretas de repressão, que agem sobre “as formas de protesto disponíveis, o timing dos protestos e/ou os fluxos de recursos para os movimentos” (Earl, 2003, p. 49).

Porém, Earl (2004, 2006) também afirma que o conceito de repressão, por sua excessiva utilização –, geralmente carregada de uma conotação negativa – deveria ser usado de forma parcimoniosa, dando-se preferência ao conceito de “controle social”. No presente estudo compartilha-se da posição de Earl e se entende que o conceito de “controle social” permite a ampliação do olhar dos(as) pesquisadores(as) e a identificação de formas geralmente não estudadas pela literatura sobre movimentos sociais na interação entre ativistas e seus opositores (Boykoff, 2007; Cable, 2019; Earl, 2004; Fernandez, 2008; Starr et al., 2011).

Todavia, o que se entende por “controle social”? A discussão sobre controle social remonta a diversas tradições filosóficas e sociológicas (Starr et al., 2011, p. 3). Reconhecendo-se o amplo debate em torno desse conceito, adota-se aqui a definição de Zald (1978, p. 83) de controle social como “o processo pelo qual indivíduos, grupos e organizações tentam tornar a performance, o comportamento e as operações de outros grupos, organizações e indivíduos, em conformidade com os padrões de comportamento ou preferências normativas”.

No campo da ação coletiva essa definição implica que, ao mesmo tempo em que há indivíduos e grupos cuja ação objetiva mudanças sociais e o questionamento da ordem instituída, em oposição, há um conjunto de indivíduos e grupos voltados para controlar a ação dos primeiros. Nas disputas em torno da mudança ou da manutenção da ordem, o Estado é um ator central, o que se traduz em instituições coercitivas como as polícias. Essas representam, porém, a faceta mais evidente do controle estatal. Outros campos, como o jurídico e o legislativo, conformam o aparato estatal voltado para o controle social (Barkan, 2006; Oliver, 2008). Atores e grupos não estatais, como contramovimentos e mídias, podem também atuar para a manutenção da ordem social. Destacam-se, ainda, modalidades mais difusas e informais de controle, como a violência privada exercida cotidianamente contra minorias sociais.

Assim, adota-se aqui a ideia de que há um “sistema de controle social” (Starr et al., 2011, p. 2), ou um “campo multiorganizacional de controle social”, o qual limita e impõe dificuldades à transformação de demandas individuais em ação coletiva, desde sua iniciação até o momento posterior à ação. A atuação de forças policiais nas ruas, os inquéritos policiais e processos criminais contra ativistas, as legislações restritivas ao direito de protesto, os enquadramentos midiáticos que deslegitimam a ação de movimentos são algumas das formas por meio das quais o controle social é exercido sobre a ação coletiva.


Figura 2
Diagrama do controle social da ação coletiva
Fonte: autoria própria.

Recentemente têm sido realizados esforços para conectar a literatura sobre movimentos sociais ao campo do “controle social” (Boykoff, 2007; Cable, 2019; Earl, 2004; Fernandez, 2008; Noakes, & Gillham, 2006; Oliver, 2008; Starr et al., 2011). O estudo de Oliver (2008) propõe a incorporação do encarceramento em massa – especialmente a partir do caso da população negra dos Estados Unidos – como uma forma de controle da ação coletiva. A autora interpreta que o encarceramento da população negra é uma forma de desarticular esses grupos antes mesmo que eles possam se organizar coletiva e politicamente. Noakes e Gillham (2006) dialogam com Garland (2001) e entendem que o policiamento ao protesto no século XXI tem seguido algumas tendências identificadas no campo do controle criminal.

Uma das principais contribuições das pesquisas acima citadas é demonstrar a constituição de um campo relativamente autônomo de controle social, o qual impacta decisões, estratégias e táticas de controle à ação coletiva. Por essa perspectiva, explicar o policiamento a eventos de protesto apenas como dependente da configuração da ação coletiva – identidade dos manifestantes, tamanho do protesto, táticas da ação coletiva, entre outros – é insuficiente.

Repertório, táticas e estratégias policiais de controle à ação coletiva

A partir da amplificação conceitual operada pela identificação de um campo de controle social da ação coletiva, questiona-se: como proceder para a classificação e sistematização das múltiplas formas do controle da ação coletiva? Com vistas a responder de forma exemplar a essa questão, restringe-se aqui o foco à atuação das instituições policiais. Parte-se de uma proposta de estudo das formas de ação policial por meio dos conceitos de repertório, táticas e estratégias policiais de controle à ação coletiva.

Um dos conceitos centrais das teorias dos movimentos sociais é o de “repertório da ação coletiva” (Tilly, 1978). Fundando-se na metáfora oriunda do campo do teatro, Tilly busca com esse conceito propor que os atores engajados em ações coletivas dispõem de um conjunto de ações para expressar publicamente suas demandas. Esse conjunto de ações – “as maneiras através das quais as pessoas agem juntas em busca de interesses compartilhados” (Tilly, 1995, p. 41) – tende a variar pouco temporalmente, configurando um leque reduzido de possibilidades de ação a cada período histórico. As ações que fazem parte de um repertório são mobilizadas em situações de contestação e, a depender do sucesso ou do fracasso, configuram um determinado script sobre as formas como atores e grupos podem pleitear publicamente suas reivindicações.

Embora o conceito de repertório tenha sido formulado para estudo dos padrões da ação coletiva contestatória, entende-se aqui que esse conceito pode ser também aplicado para classificar as formas de controle social, como no caso das ações policiais. Assim como os atores engajados em ações coletivas desenvolvem “protótipos” de atuação, as instituições policiais igualmente constituem um repertório de ação nas interações com os ativistas, as organizações de movimentos sociais e a ação coletiva de modo geral. Os tipos de ação policial disponíveis – como o uso de bombas de efeito moral e a detenção de ativistas – fazem parte de um repertório, sendo tais ações adotadas preferencialmente em relação a outras, a depender de um conjunto de variáveis. Postula-se aqui que o conjunto de ações disponíveis às forças policiais para controle da ação coletiva constitui um “repertório da ação policial”.

Entende-se, ainda, que, assim como a unidade dos repertórios da ação coletiva consiste nas táticas de ação – tais como passeatas, ocupações, depredação de patrimônios –, as unidades que conformam, em conjunto, o repertório da ação policial são as táticas policiais de controle à ação coletiva – como detenções, uso de armamento menos letal, monitoramento de redes sociais etc.

As táticas policiais de controle da ação coletiva não são adotadas aleatoriamente, mas sim de modo combinado, ou seja, algumas táticas tendem a ser pareadas com outras – por exemplo, bombas de efeito moral, balas de borracha e detenções. A combinação de diferentes táticas é o resultado da construção de determinados padrões ou modelos de policiamento, dado que as forças policiais, desde o comando até os agentes de rua, buscam determinados fins – por exemplo, a dispersão de eventos de protestos. O uso combinado de táticas visando a fins específicos é aqui conceituado como “estratégias policiais de controle”. As estratégias são também denominadas pela literatura sobre movimentos sociais como “modelos de policiamento” (policing models) (Della Porta, & Reiter, 1998).

Parcela importante da literatura sobre movimentos sociais, ao focar o estudo da ação policial, busca classificar quais seriam as estratégias predominantes nos períodos e territórios estudados e como essas estratégias variam. Essas pesquisas, como já afirmado, tendem a se concentrar em países de democracias ocidentais do “Norte Global”, o que resulta em certo consenso entre elas a respeito da história recente do controle policial à ação coletiva, diferenciando-se três estratégias principais: “força em escalada” (escalated force) (Della Porta, & Reiter, 1998; McPhail, Schweingrubber, & McCarthy, 1998); “gestão negociada” (negotiated management) (McPhail et al., 1998); “incapacitação estratégica” (strategic incapacitation) (Gillham, 2011; Gillham, & Noakes, 2007).

Segundo esses estudos, até a década de 1970, predomina nos países democráticos do Ocidente uma estratégia de policiamento definida como “força em escalada”. Essa estratégia “não tolera direitos dos cidadãos a protestar e frequentemente ostenta o recurso imediato ao uso excessivo da força, dando precedência a táticas brutais e repressivas” (Della Porta, & Atak, 2015). As táticas centrais dessa estratégia são direcionadas à dispersão – prisões generalizadas, uso de armamento letal e não letal etc.

Durante a década de 1970, a estratégia de força em escalada passa por um processo de deslegitimação social, em especial nos Estado Unidos, onde o governo federal adota medidas para controle das forças policiais. Essas mudanças, cujo desenvolvimento e consolidação a literatura situa entre as décadas de 1970 e 1990, conformam a estratégia de policiamento definida como “gestão negociada”. Esta é baseada em táticas de negociação com ativistas e na busca de garantia do direito ao protesto conforme os limites estabelecidos pelas forças policiais (McPhail et al., 1998; Waddington, 2007).

A tendência à configuração de estratégias policiais mais tolerantes e moderadas, porém, não se mantém no período contemporâneo. A insuficiência da estratégia de gestão negociada tem sido relacionada às características específicas dos protestos do Movimento por Justiça Global (Gillham, 2011). Tais protestos, organizados por uma nova geração de ativistas, desafiam os princípios da gestão negociada na medida em que fazem uso extensivo de ações diretas e disruptivas e são constituídos por grupos heterogêneos, sem uma liderança formal definida, que se recusam a negociar com as autoridades policiais. A resposta policial às características desse evento é o desenvolvimento de um modelo policial de “incapacitação estratégica” (Gillham, 2011; Gillham, & Noakes, 2007).

A incapacitação estratégica é centrada em “preservar a segurança e neutralizar aqueles mais propensos a representar uma ameaça à segurança” (Gillham, 2011, p. 640), suprimindo seletivamente o protesto. Para aplicar essa lógica de controle, as forças policiais buscam diferenciar duas categorias de ativistas, os “contidos” e os “transgressores”, agindo para identificar e neutralizar os atores mais propensos a se engajar em atividades disruptivas (Gillham, 2011). Amplifica-se o uso de táticas de vigilância (como a coleta massiva de informações em redes sociais) e de controle espacial (como o estabelecimento de zonas em que a manifestação pública é proibida – as “no protest zones”). O quadro 3 é uma síntese dos elementos característicos das três estratégias acima descritas:

Quadro 3
Estratégias de policiamento a protestos segundo Gillham

Fonte: Gillham (2011, p. 640, tradução própria)

Os estudos citados demonstram um percurso possível para a classificação das formas de controle da ação coletiva. Por um lado, a identificação e classificação do conjunto de táticas mobilizadas pelas forças policiais permite a amplificação do olhar para além das táticas mais tradicionalmente visibilizadas pela literatura sobre movimentos sociais. Por outro lado, a verificação do uso combinado de determinadas táticas em situações e períodos históricos específicos permite a identificação, em um nível mais elevado de abstração, de modelos de policiamento (estratégias) (Della Porta, & Reiter, 1998; McPhail et al., 1998; Gillham, 2011; Gillham, & Noakes, 2007).

O controle policial da ação coletiva no Brasil: aspectos institucionais e culturais

Considerando-se o aporte teórico-metodológico acima exposto, como explicar o repertório (táticas e estratégias) da ação policial adotado no contexto brasileiro? Dado que o foco empírico da literatura sobre policiamento a protestos recai em países do “Norte Global”, defende-se aqui a mobilização, nas pesquisas nacionais, de uma perspectiva “polícia-centrada” (Earl, & Soule, 2006). Sob essa perspectiva, é central a contextualização das especificidades das instituições policiais estudadas quando se analisa o controle da ação coletiva. Della Porta e Reiter (1998), nesse sentido, propõem que o repertório policial é dependente, dentre outras variáveis, das características institucionais e culturais das polícias. Nesta seção são apontadas as principais características institucionais e culturais das polícias brasileiras, conforme a revisão da literatura nacional em violência e segurança pública, apontando-se os impactos dessas características sobre o controle policial da ação coletiva.

Características institucionais: descentralização, militarização e opacidade

Os traços gerais da estrutura organizacional das polícias no Brasil são previstos na Constituição Federal de 1988 (CF/88). O país adota um modelo híbrido de divisão entre duas instituições policiais de âmbito estadual: a Polícia Militar (PM), responsável pelo policiamento ostensivo e pela preservação da ordem pública; a Polícia Civil (PC), encarregada de atuar como polícia judiciária na investigação de crimes. Essa separação entre um órgão de policiamento ostensivo e um órgão responsável pela investigação criminal caracteriza o chamado “ciclo incompleto de policiamento” (Azevedo, & Nascimento, 2016).

A responsabilidade pelo policiamento ostensivo e pela preservação da ordem pública situa as polícias militares como atores centrais das interações com os atores promotores da ação coletiva em eventos de rua (Almeida, Monteiro, & Smiderle, 2020). Quando as táticas da ação coletiva tornam-se objeto de investigação policial – por exemplo, em casos de depredação de patrimônio –, os inquéritos policiais, produzidos pela PC, visam investigar indícios de cometimento de delitos, formando-se as bases legais para o relatório policial e a eventual formalização da denúncia criminal pelo Ministério Público (MP). Residualmente, manifestantes e ativistas interagem com as Guardas Municipais (GM), dado que é função da GM proteger bens, serviços e instalações do município.


Figura 3
Atribuições das polícias no controle da ação coletiva no Brasil
Fonte: autoria própria.

Della Porta e Reiter (1998) apontam que as características institucionais das forças policiais envolvem três elementos principais: o grau de centralização, o grau de militarização e o grau de transparência (accountability). A literatura nacional indica altos graus de descentralização e militarização, somados à escassez de mecanismos de transparência nas instituições policiais.

A descentralização refere-se ao fato de as polícias do Brasil serem, em grande parte, administradas pelos governos estaduais, o que culmina na existência de especificidades regionais (Azevedo, & Nascimento, 2016). As diretrizes de atuação das polícias dependem das configurações do poder político local – por exemplo, qual partido está no governo estadual –, o que ocasiona dificuldades de implementação de diretrizes nacionais na segurança pública (Freire, 2009). Além disso, as implicações da separação entre a PM e a PC já foram extensamente estudadas, com a identificação de que as diferenças organizacionais e culturais entre PM e PC recorrentemente acarretam uma postura conflitiva nas práticas de policiamento, com disputas de competências, status e prerrogativas entre cada instituição (Azevedo, 2016; Nóbrega Jr., 2010a).

Na prática policial, militarização significa a aplicação de uma lógica bélica no “treinamento, equipamento, filosofia e organização para a questão do policiamento” (Jefferson, 1990, p. 16). A atuação das polícias brasileiras nas ruas mantém um importante grau de militarização, decorrente do fato de a PM ser responsável pelo policiamento ostensivo. No controle da ação coletiva, a militarização tem ao menos dois impactos: a tendência à adoção generalizada de armamentos militarizados – por exemplo, armamentos menos letais – para controle de multidões; a tendência de identificação dos agentes promotores da ação coletiva como “massas irracionais” e como inimigos a serem combatidos para retomada da ordem pública (Atak, 2017).

Quanto à escassez de mecanismos de transparência, a literatura nacional identifica a dificuldade de exercício de controle sobre a prática policial ostensiva, dado que agentes policiais militares gozam de foro especial privilegiado para julgamento (Justiça Militar) (Silva, & Gurgel, 2016). A insuficiência de mecanismos formais de controle tende a resultar na desconfiança geral da população quanto ao papel e à eficácia das forças policiais (Azevedo, 2016; Nóbrega Jr., 2010b; Silva, 2011). No controle à ação coletiva, é identificada a falta de transparência sobre estratégias, táticas e protocolos de uso de força. Relatório sobre a transparência em assuntos de segurança pública e protestos, por exemplo, conclui que no Brasil “a falta de conhecimento destes manuais e protocolos [sobre o uso da força nos protestos] impossibilita que seja feito o controle da atuação policial pela população” (Artigo 19 Brasil, 2017, p. 40).

Características culturais: a construção da realidade policial

A variável cultura policial envolve “esquemas cognitivos” ou “representações de traços culturais” que tendem a se preservar no tempo, influenciando tomadas de decisão (Della Porta, & Atak, 2015, p. 125-126). Na literatura brasileira formou-se relativo consenso em torno da identificação de um “legado autoritário” nas forças policiais como herança do regime militar e da chamada Doutrina de Segurança Nacional (Azevedo, & Nascimento, 2016; Lima, Sinhoretto, & Bueno, 2015).

Essa doutrina funda-se na lógica de supremacia inquestionável do interesse nacional, o que justificaria o uso irrestrito da força visando a preservação da ordem. A nível externo, a Doutrina de Segurança Nacional foi historicamente empregada no combate ao comunismo; internamente, traduziu-se na tendência à intolerância ao dissenso por meio da supressão de ações contestatórias (Freire, 2009). Essa lógica culminou na predominância histórica de uma cultura da defesa prioritária do Estado em detrimento da defesa do cidadão (Silva, & Gurgel, 2016; Souza, 2015; Nóbrega Jr., 2010b). Nesse sentido, a literatura destaca que as polícias no Brasil, diante dos conflitos sociais, tendem a atuar de forma violenta e discricionária, em desconsideração a direitos individuais e com alto grau de letalidade (Bretas, & Rosemberg, 2013; Lima, Sinhoretto, & Bueno, 2015; Silva, & Gurgel, 2016).

Esses aspectos culturais estão incorporados à “percepção dos policiais sobre seu papel e a realidade externa”, ou seja, ao conhecimento policial (police knowledge) (Della Porta, & Reiter, 1998, p. 22). No Brasil, a literatura indica que os agentes policiais tendem a se ver como os responsáveis por “limpar a sociedade de indivíduos desviantes, sendo moralmente justificável a ação violenta contra criminosos” (Silva, 2011, p. 83). Esse papel dos agentes policiais contém uma carga moral de defesa daqueles, que, em tese, obedecem a lei – e que, portanto, seriam portadores de direitos –, em contraposição àqueles que, em tese, a infringem – constituindo-se uma separação entre “nós” (cidadãos “de bem”) e “outros” (cidadãos “perigosos”) (Silva, 2011).

Esse controle policial do crime tende a atuar de modo seletivo. Os “outros”, alvos preferenciais das ações repressivas, historicamente tendem a constituir as parcelas marginalizadas da população, às quais, tradicionalmente, os direitos de cidadania foram negados (Azevedo, & Nascimento, 2016; Rocha, 2013). Na fase de investigação criminal, as pesquisas identificam a predominância de uma lógica inquisitorial, a qual pressupõe a suspeição dos indiciados no inquérito policial, relativizando-se a presunção de inocência em favor da criminalização das camadas sociais enquadradas como “inimigas da ordem” (Kant de Lima, & Pires, 2014). No controle à ação coletiva, essa lógica traduz-se na tendência policial de interpretar o ativismo – principalmente quando promovido pelas parcelas marginalizadas – como deturpação da ordem (Artigo 19 Brasil, 2014; Rocha, 2013).

Porém, a literatura salienta que a cultura policial é um produto de tendências autoritárias mais gerais na população. Weichert (2017, p. 111), por exemplo, identifica que a sociedade brasileira é “desacostumada à democracia” e intolerante à organização de movimentos de luta por direitos sociais. Não apenas as elites conservadoras, mas também considerável parcela das camadas marginalizadas – as quais são objeto recorrente do controle repressivo do Estado – demonstra aprovação à violência estatal, consolidando-se uma cultura legitimadora de práticas autoritárias (Weichert, 2017).

As características das interações atuais entre forças policiais e manifestantes, ativistas e organizações de movimentos sociais são, enfim, um produto histórico, que remonta ao papel das polícias brasileiras no controle de classes populares desde o período colonial. Ortiz (2015), buscando mapear a história da repressão política na América Latina, identifica o período de transição democrática (de meados dos anos 1980) como um momento de abertura de oportunidades políticas a movimentos sociais e a organizações da sociedade civil no continente. Apesar da democratização da participação política e da possibilidade de discussão de um modelo de ordem pública garantidor de direitos, a literatura nacional aponta que a transição foi insuficiente para alterar o padrão histórico de uso das forças policiais para supressão dos conflitos sociais (Azevedo, & Nascimento, 2016; Lima, Sinhoretto, & Bueno, 2015).

Considerações finais

Neste estudo, buscou-se contribuir para a construção de abordagens direcionadas ao estudo do tema da “repressão política” no Brasil. Para tanto, foram propostas direções teórico-metodológicas que buscam conectar a literatura internacional sobre policiamento a protestos e os estudos nacionais em violência e segurança pública. Propôs-se um percurso que compreende os seguintes passos: a construção de um arcabouço teórico que delimita conceitos centrais do campo da ação coletiva e do campo da ação repressiva; a expansão do olhar analítico da repressão física e situacional para o estudo do campo de controle social da ação coletiva; o mapeamento do repertório da ação policial, subdivido em táticas e estratégias; a adoção de uma abordagem “polícia-centrada” para explicação do repertório policial a partir das especificidades institucionais e culturais das polícias no contexto brasileiro.

Salienta-se o conceito de “repertório da ação policial” como contribuição original, direcionada à classificação da diversidade de táticas e estratégias policiais empregadas para controle da ação coletiva. Esse repertório, assim como o repertório da ação coletiva, envolve um conjunto de ações disponíveis às forças policiais e resulta de um processo histórico de interações com manifestantes, ativistas e organizações de movimentos sociais. No caso do Brasil, esse repertório deve ser, em parte, explicado por características próprias das instituições policiais, como a descentralização, a militarização, a escassez de mecanismos de transparência e, ainda, a baixa tolerância à ação coletiva contestatória – em especial, quando promovida pelas parcelas marginalizadas da população.

Espera-se, por fim, que esse estudo contribua para a construção de uma agenda nacional de pesquisa sobre o controle policial da ação coletiva. Essa agenda deverá responder a diversas perguntas, como as seguintes: quais as táticas e estratégias policiais tipicamente adotadas para controle da ação coletiva no Brasil? Como esse repertório policial varia no território nacional e em períodos históricos distintos? Como as características institucionais (descentralização, militarização e opacidade) e culturais (construção da realidade) das polícias explicam as estratégias e táticas adotadas? Como a interação entre instituições policiais e outros atores (governos, mídias, coalizões políticas) impactam o repertório da ação policial? Essas questões são desafios para pesquisas futuras.

Material suplementario
Referências
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Notas
Notas
[1] Os estudos que tratavam da “repressão política” como contexto ou questão secundária não foram incluídos nos resultados. Fonte: <https://catalogodeteses.capes.gov.br/catalogo-teses/>. Último acesso em: 29/09/2020. Pesquisa realizada em 23/09/2020.

Figura 1
Diagrama das relações conceituais entre ação coletiva, movimento social, protesto
Fonte: autoria própria.
Quadro 1
Repressão e facilitação segundo Tilly

Fonte: Tilly (2006, p. 74, tradução própria)
Quadro 2
Tipologia da ação repressiva segundo Earl

Fonte: Earl (2003, p. 47, tradução própria)

Figura 2
Diagrama do controle social da ação coletiva
Fonte: autoria própria.
Quadro 3
Estratégias de policiamento a protestos segundo Gillham

Fonte: Gillham (2011, p. 640, tradução própria)

Figura 3
Atribuições das polícias no controle da ação coletiva no Brasil
Fonte: autoria própria.
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