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Existe um autoritarismo brasileiro? Uma interpretação alternativa à tese da singularidade política nacional

Is there a Brazilian authoritarianism? An alternative interpretation to the thesis of the country’s political singularity

Roberto Dutra
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Brasil
Marcos Abraão Ribeiro
Instituto Federal Fluminense, Brasil

Existe um autoritarismo brasileiro? Uma interpretação alternativa à tese da singularidade política nacional

Revista Brasileira de Sociologia, vol. 9, núm. 22, pp. 246-273, 2021

Sociedade Brasileira de Sociologia

Recepción: 29 Mayo 2020

Aprobación: 07 Diciembre 2020

Resumo: Este artigo tem como objetivo oferecer uma interpretação alternativa à tese do autoritarismo brasileiro. Para tanto, apresentamos uma crítica de três obstáculos epistemológicos centrais à noção de singularidade política brasileira: nacionalismo metodológico, idealização da modernidade política e teleologia. Em seguida, oferecemos uma interpretação alternativa para o autoritarismo como fenômeno constitutivo da modernidade política global. Nesse sentido, mobilizamos a teoria social sistêmica e esboçamos um diálogo com uma abordagem da ciência política brasileira que também busca romper com estes obstáculos epistemológicos. Argumentamos que as variações do autoritarismo ao longo da história brasileira não são resultantes da singularidade política nacional, mas sim variantes distintas do autoritarismo moderno.

Palavras-chave: autoritarismo brasileiro, modernidade política, nacionalismo metodológico.

Abstract: This article offers an alternative interpretation to the thesis of Brazilian authoritarianism. To this end, we present a critique of three central epistemological obstacles to the notion of Brazilian political singularity: methodological nationalism, idealization of political modernity, and teleology. Following, we offer an alternative interpretation of authoritarianism as a constitutive phenomenon of global political modernity. In this sense, we mobilize systemic social theory and outline a dialogue with a Brazilian approach in political science that also seeks to break through these epistemological obstacles. We argue that the variations of authoritarianism throughout Brazilian history are not the result of national political singularity, but rather distinct variants of modern authoritarianism.

Keywords: Brazilian authoritarianism, political modernity, methodological nationalism.

Introdução

O autoritarismo é um dos principais temas do pensamento político brasileiro (PPB). Há uma dimensão interpretativa culturalista e liberal que busca compreender o nosso “atraso” tendo como foco a ausência de uma ordem moderna, racional-legal e autenticamente democrática (Werneck Vianna, 1999). Essa vertente, formada por Tavares Bastos, Raymundo Faoro e Simon Schwartzman, baseia-se em uma perspectiva dualista, pois apresenta uma distinção estrita entre Estado e sociedade (Chaloub & Lima, 2018, p.26). Existe a premissa da autonomia do Estado em relação à sociedade e o compartilhamento da tese da singularidade política brasileira, marcada, entre outros aspectos, pela falta de divisão estrita entre público e privado, de secularização e de racionalização (Tavolaro, 2014). Esses autores guardam em comum a tese de que a singularidade brasileira é definida pela configuração de seu sistema político (Werneck Vianna, 2004, p.169). Não existe o questionamento da ideia de que a vida política brasileira é resultado de uma forma singular de organização política, marcada pelo domínio autocrático e privatista sobre o Estado, e que define uma realidade essencialmente diferente das democracias que existiriam nos países centrais. O autoritarismo nacional seria explicado pela persistência de formas tradicionais de sociabilidade política que fazem com que as instituições do “país legal” sejam rejeitadas pelas instituições do “país real” (Lynch, 2019, p.26).

Essa vertente do PPB já foi alvo de algumas críticas, como a da ausência das bases sociais e da dinâmica social da política (Botelho, 2019, p.17) na análise, e a consequente dissociação entre Estado e sociedade (p.20) Ao contrário da interpretação formulada pela sociologia política, essas leituras do PPB produziram, como vimos, imagens do Brasil que apresentam o autoritarismo como fenômeno exclusivo do Estado.

O PPB possui um estilo de redação próprio que o leva a enfocar a realidade nacional como atrasada em relação à modernidade central que teríamos de alcançar através da superação das estruturas tradicionais herdadas da colonização (Lynch, 2016). Nesse sentido, “nada do que se produzisse intelectualmente na periferia teria valor ‘universal’ ou ‘original’; na melhor das hipóteses, ela teria validade restrita aos limites da periferia” (Lynch, 2019, p.16).

O nacionalismo metodológico é uma característica central dessa vertente do PPB que percebe o fenômeno autocrático no Brasil como algo singular do país e a democracia como télos de desenvolvimento, cuja vigência depende da superação de nosso atraso político. Esse atraso seria reproduzido pela força de heranças institucionais (como patrimonialismo e neopatrimonialismo) e culturais (como personalismo e populismo) próprias do país.

O nacionalismo metodológico também está presente na análise política comparada sobre regimes políticos, que trata o Estado nacional como unidade analítica exclusiva, desconsiderando outros níveis sistêmicos da modernidade política (Ahlers & Stichweh, 2019). Na teoria social, a crítica ao nacionalismo metodológico não exige desconsiderar o Estado nacional como categoria analítica e histórica e constitui um dos avanços importantes das últimas décadas (Beck, 2005; Luhmann, 1997; Quijano & Wallerstein, 1992; Habermas, 2001). No entanto, como observa Chernilo (2011), a história das ciências sociais não é inteiramente presa às premissas do nacionalismo metodológico. Muito antes dos esforços das últimas décadas, no período dos “pais fundadores” da teoria social e política, já existia a preocupação de explicar as características sociais e políticas dos Estados-nacionais a partir de desenvolvimentos estruturais e culturais que extrapolam suas fronteiras e trajetórias próprias (Chernilo, 2011, p. 109).

De todo modo, ainda há um contato insuficiente entre teoria social e teoria política, especialmente na teoria democrática. Na teoria social sistêmica, Anna Ahlers e Rudolf Stichweh (2019) sugerem, recentemente, um caminho promissor de diálogo entre teoria social e teoria política, cujo foco é empreender análises sobre a relação entre democracia e autocracia para além do Estado nacional. Em um esforço teórico inicial, que dialoga com a análise política comparada, especialmente com a discussão das preferências valorativas típicas de regimes autocráticos e democráticos, os autores propõem um quadro analítico multinível, no qual os níveis subnacionais e a política da sociedade global figuram ao lado do Estado nacional enquanto unidades analíticas. Nesse quadro, a diferença entre democracia e autocracia não é correlacionada unicamente aos países, mas tratada como uma “bipolaridade política” moderna, que pode ser encontrada nos distintos níveis (subnacional, nacional, global), em que o sistema político se diferencia internamente. Embora a classificação dos países como democráticos ou autocráticos seja válida e importante, ela deve ser complementada pela observação das descontinuidades de cada nível e nas relações entre eles.

Explicar o avanço e a resiliência de fenômenos e regimes autocráticos com base em singularidades nacionais percebidas como alheias à modernidade política é algo descartado neste modelo. Para Ahlers e Stichweh (2019), as autocracias contemporâneas não se explicam por qualquer tipo de resistência pré-moderna ou tradicional à modernidade política, mas sim pelo caráter especificamente moderno dessas autocracias. A modernidade política não pode ser reduzida à democracia. Formas autocráticas de poder se apropriam dos princípios do sistema político moderno, especialmente a norma da inclusão.

Essa proposta de uma análise sistêmica multinível da política moderna parece adequada para orientar uma crítica da tradição do PPB identificada com a premissa de uma singularidade política brasileira como explicação para os fenômenos autoritários observados no país. Com ela, podemos não apenas desconstruir a premissa da singularidade nacional enquanto premissa explicativa, mas também oferecer explicações alternativas para a relação entre democracia e autoritarismo no Brasil.

Para desenvolver o argumento, dividimos o artigo em duas seções. Na primeira, fazemos uma apresentação seletiva e uma crítica da tradição do PPB centrada na ideia de que o Brasil é caracterizado por uma singularidade autoritária que reproduz o caráter tradicional de nossa formação sociopolítica. Conceitos como patrimonialismo e neopatrimonialismo ocupam lugar de destaque nessa tradição, atualizada recentemente em análises que buscam compreender os riscos à democracia no Brasil com base na premissa da singularidade política brasileira (cf. Schwarcz, 2019). Na segunda seção, apresentamos uma alternativa a essa tradição, mobilizando a teoria social sistêmica multinível de matriz luhmanniana em seus desenvolvimentos recentes. Nesta alternativa, articulamos a análise sociológica da constituição do sistema funcional da política com sua diferenciação interna em distintos níveis, nos quais e entre os quais a oscilação entre democracia e autocracia é percebida como uma “bipolaridade” da modernidade política contemporânea, que serve de referência teórica mais ampla para explicar os casos nacionais. Para construir esta alternativa, é necessário um contato produtivo entre teoria social e teoria política.

O autoritarismo brasileiro no PPB

Nesta seção, apresentamos de maneira resumida os argumentos de Tavares Bastos, Raymundo Faoro e Simon Schwartzman, pois são os intelectuais que mais se destacaram na tentativa de explicar as raízes do “autoritarismo brasileiro”. Precisamente, os autores procuram responder ao seguinte questionamento: por que constituímos uma ordem essencialmente diferente das democracias ocidentais? A resposta para tal hiato civilizacional seria dada pela herança ibérica, responsável por perpetuar uma cultura privatista, autoritária, desigual e excludente. Teríamos constituído, portanto, uma sociedade baseada no princípio da singularidade (Tavolaro, 2014).

As interpretações dos autores estão baseadas em três elementos que são decisivos para compreendermos o alcance e os limites presentes nelas. As leituras são estruturadas com base no nacionalismo metodológico, na idealização da modernidade política e na tese da singularidade política brasileira. Dessa forma, procuramos contribuir para romper com as narrativas que interpretam o Brasil como essencialmente inferior e atrasado (Lynch, 2019, p.15), presentes nos autores aqui analisados.

A singularidade política brasileira em Tavares Bastos

Tavares Bastos deu início às leituras institucionalistas que explicam o autoritarismo brasileiro como resultante da herança ibérica, ou seja, da transplantação do Estado português para o Brasil. Teríamos recebido uma cultura privatista, autoritária, que seria decisiva para compreender o “atraso” brasileiro frente aos Estados Unidos, que eram, para o autor, o grande modelo a ser alcançado pelo Brasil, pois a modernidade política existiria plenamente no país do Norte do continente. A herança recebida de Portugal teria feito com que constituíssemos, portanto, uma singular forma de autoritarismo. Essa herança seria corroborada no Brasil pelo sistema centralizador, responsável por nossos vícios políticos e administrativos. Por seu caráter fortemente concentrado, ele moveria mecanicamente a nação, promovendo, assim, o estado social de inércia, o ceticismo e a profunda corrupção (Tavares Bastos, 1976).

Era, portanto, necessário retirar a tradição ibérica de dentro do Estado, sobretudo modificando sua forma, removendo o Conselho de Estado, o Senado Vitalício e o Poder Moderador. Outro grande problema atacado por Tavares Bastos (1976) se refere ao Judiciário, que, no Brasil, teria sua ação anulada pela configuração centralizada e despótica que nos conformaria. Esse quadro extremamente adverso ocasionou, como grande consequência, a ausência de autonomia, considerada pelo publicista alagoano como o vício orgânico dos brasileiros. De acordo com Tavares Bastos (1976), a falta de autonomia gerou um quadro de corrupção moral, responsável pela nulidade de nosso sistema representativo, resultando no domínio inconteste do absolutismo.

Apesar da identificação de um vício de origem responsável pelo “atraso”, a realidade brasileira era perfeitamente mutável para Tavares Bastos, pois havia no pensamento do publicista alagoano uma proposta de ação pública reformadora, com o objetivo de instituir o liberalismo federalista (Leão Rêgo, 2002, p.17). Em virtude disso, Tavares Bastos propõe ações em torno da modernização econômica e da descentralização administrativa para a constituição de uma monarquia federativa e democrática (Moraes Filho, 2001. Em relação à modernização, Tavares Bastos propõe algumas medidas consideradas como centrais para realizar tal propósito. A primeira delas é a imigração europeia. Tavares Bastos (1975) argumenta que esse processo seria fundamental para a mudança de hábitos dos brasileiros, retirando de nossa realidade o quadro de imoralidade então dominante. O grande motor do desenvolvimento seria não a sociedade industrial, mas a agrícola. Em virtude disso, o autor afirma que o imigrante seria dono da pequena propriedade, o que ocasionaria a modificação da face política no Brasil.

Outras ações fundamentais se refeririam à liberdade da navegação de cabotagem, acabando com o monopólio do governo, e a livre navegação no Rio Amazonas. Essas medidas teriam a função de redimir as populações pobres ribeirinhas e proporcionar a comunicação do país com os Estados Unidos e as potências europeias (Tavares Bastos, 1975).

Havia no publicista Tavares Bastos uma clara junção entre as dimensões analítica e normativa, com a proposição de um programa político global de rearticulação institucional. Como veremos a seguir, a interpretação de Faoro possui diferenças em termos analíticos e normativos, assim como a leitura realizada por Simon Schwartzman sobre o autoritarismo brasileiro.

O diagnóstico de Tavares Bastos é estruturado pelo nacionalismo metodológico, pois o autoritarismo seria um dilema especificamente brasileiro. O publicista alagoano também idealiza a modernidade política que existiria nos Estados Unidos, pois ela representaria a democracia, o espírito público, a separação entre público e privado, a racionalização e a secularização. Para o autor, portanto, o autoritarismo seria um dilema pré-moderno e inexistente em países modernos e centrais.

A singularidade política brasileira em Raymundo Faoro

Se Tavares Bastos defende que o grande obstáculo para a instituição da modernidade política seria o Estado absolutista, Raymundo Faoro, por sua vez, defende que o elemento explicativo para o autoritarismo brasileiro seria, especificamente, o estamento burocrático, que se havia reproduzido secularmente durante seis séculos através de um controle privatista sobre o Estado. Para Faoro, assim como para o seu antecessor do século XIX, o autoritarismo estaria circunscrito à dimensão institucional. Faoro volta à história portuguesa como forma de defender, assim como fizera Tavares Bastos, que o autoritarismo brasileiro seria resultante de um endêmico vício de origem, iniciado pelo Estado português no século XIV. De forma teoricamente mais fundamentada que seu antecessor, Faoro defende que essa volta ao passado ibérico teria como objetivo demonstrar que o conceito de patrimonialismo seria chave para a compreensão da história brasileira (Faoro, 1993). A partir da história portuguesa, seria possível compreender as raízes do autoritarismo brasileiro, pois, no século XV, surge em Portugal uma camada social amorfa que será, a partir de então, o grande fator explicativo de todos os nossos males, o estamento burocrático.

Após fazer a reconstituição da formação do Estado português, Faoro constitui a dissociação fundamental que selaria o destino brasileiro. De acordo com o autor, a sociedade capitalista foi gerada da decadente sociedade feudal. Houve uma evolução da economia natural para uma pautada pelas manufaturas, responsável pelo movimento de acumulação de capital (Faoro, 2008). O feudalismo, portanto, seria uma fase necessária para a constituição do capitalismo.

Portugal, por sua vez, não conheceu em sua história o feudalismo. Por não passar pela etapa feudal, necessária para a constituição da modernidade representada pelo capitalismo industrial, Portugal (e também o Brasil) constituiu-se como um desvio, responsável por fazer com que o elemento tradicional tivesse um caráter absolutizado naquele país. O singular processo de formação de Portugal gerou uma forma própria de capitalismo, caracterizada por Faoro como politicamente orientado, ou pré-capitalismo, que tem a presença e o domínio inconteste do estamento sobre ele. Esta seria a única forma de capitalismo que conhecemos para além das teorias e dos livros (Faoro, 1993). O estamento burocrático foi responsável, apesar das mudanças ocorridas na realidade, por deixar o país sob o domínio absoluto do elemento tradicional.

O Estado patrimonial, estruturado estamentalmente, diversamente das sociedades organizadas contratualmente pelas classes sociais, possui um domínio de cima para baixo, governando, dirigindo, orientando, “determinando, não apenas formalmente, o curso da economia e as expressões da sociedade, sociedade tolhida, impedida, amordaçada” (Faoro, 2008, p. 62). Essa situação de completa submissão da sociedade frente ao Estado se dava em virtude da organização deste acima das classes, fechada sobre si mesma, não deixando espaços para qualquer tipo de expressão política além do próprio estamento.

Com o processo de colonização, recebemos o capitalismo politicamente orientado e o estamento burocrático, cujo domínio impedia a constituição do legítimo capitalismo industrial. Com a transmigração da corte imperial para o país em 1808, houve a ação direta em solo americano do rei absoluto que “realiza, preside, tutela a nação em emergência, podando, repelindo e absorvendo o impulso liberal, associado à fazenda e às unidades locais de poder” (Faoro, 2008, p.285). Com a volta de Dom João VI a Portugal, retornam com ele cerca de três mil graduados servidores da monarquia, representantes da nobreza funcionária do Império. O regresso foi responsável por debilitar o estamento burocrático, visto que seus principais representantes regressaram a Portugal com Dom João (Faoro, 2008).

Com o processo de independência, o Brasil herdou o sistema político de Portugal, rearticulando o estamento burocrático e a tradição estamental patrimonialista que caracterizou a história portuguesa e brasileira. Tal organização fora responsável por manter uma realidade apartada da democracia, além de o liberalismo, fruto da ideologia, estar fora da soberania popular (Faoro, 2008). Assim como Tavares Bastos, Faoro defende que o Estado pautou seu domínio através de instituições como o Senado vitalício, os partidos, o Conselho de Estado e a política centralizada (Faoro, 2008, p. 378).

É dentro desse quadro que se pode compreender, também, por que não conseguimos superar o domínio autoritário do estamento burocrático, que controla o país a partir de uma lógica própria. Isso faz com que a democracia, entre nós, tenha sempre um caráter superficial, na medida em que, para haver uma democracia efetiva, seria necessária a constituição de uma plena economia de mercado, ponto também defendido por Tavares Bastos. A economia racional teria como características a igualdade jurídica e a defesa contra o arbítrio.

Ao contrário de Tavares Bastos, não existe um programa político de rearticulação institucional com o objetivo de superar o domínio autoritário sobre a nação incapaz (Ribeiro, 2010; Ribeiro e Mesquita, 2019). Consequentemente, não havia, em Faoro, a defesa da monarquia e do federalismo como a presente no publicista alagoano, tampouco a defesa da economia agrícola como caminho para modernizar o Brasil. Um ponto de similitude entre os autores é a caracterização da nação como incapaz de enfrentar o domínio do Estado absolutista e do estamento burocrático, respectivamente. Ao mesmo tempo, Faoro também constrói sua interpretação do autoritarismo brasileiro através da contraposição com a idealização da modernidade política, visto que, nos países centrais, haveria um efetivo sistema de representação, uma separação estrita entre público e privado, secularização e racionalização. A interpretação faoriana, portanto, reproduz os elementos presentes na leitura de Tavares Bastos, quais sejam: nacionalismo metodológico, idealização da modernidade política e a tese da singularidade política brasileira.

A singularidade política brasileira em Simon Schwartzman

Assim como Tavares Bastos e Faoro, Simon Schwartzman também possui como objetivo central apresentar as bases do autoritarismo brasileiro. Para tanto, Schwartzman segue os autores supracitados, defendendo que o autoritarismo brasileiro é resultante da herança sociocultural deixada pela colonização ibérica. De forma distinta dos autores supracitados, Schwartzman procura apresentar uma teorização sobre o “moderno” autoritarismo brasileiro, pois defende que o Brasil nunca foi tradicional (Brito, 2015, p.147). Este ponto é um elemento importante de inflexão em relação aos seus antecessores, que apresentaram uma narrativa através da qual o Brasil seria um país absolutamente tradicional.

Schwartzman (1988) afirma que Bases do autoritarismo brasileiro confirmaria a tese de que o entendimento da realidade brasileira seria resultante das contradições entre São Paulo, centro econômico e mais organizado da sociedade civil, e o centro do poder político, fixado no eixo Rio de Janeiro-Brasília (Schawartzman, 1988, p.9).

Dentro dessa relação dicotômica existente no país, haveria a constituição de uma sociedade civil incapaz de conseguir, no âmbito político, contrapor-se de forma efetiva ao peso excessivo do poder central. Isso porque o Brasil se teria caracterizado, através dos séculos, pelo domínio de uma burocracia estatal pesada, todo-poderosa e ineficiente frente a uma sociedade acovardada (Schwartzman, 1988).

Assim como Faoro, Schwartzmam constrói sua interpretação a partir da diferença entre feudalismo e patrimonialismo. Através dela, o sociólogo afirma que os Estados modernos nascidos à margem da revolução burguesa surgida do feudalismo seriam caracterizados como neopatrimoniais. Ao contrário da ordem moderna racional-legal, teríamos uma modernidade negativa, marcada pelo domínio do neopatrimonialismo.

De forma diferente de seus antecessores, Schwartzman (1988) constitui sua interpretação a partir da análise dividida em dois níveis: o estrutural e o político. A abordagem estrutural seria caracterizada pela existência de uma relação essencial entre o desenvolvimento histórico surgido da Europa feudal, responsável por conduzir às sociedades capitalistas modernas, ocidentais e desenvolvidas, e outra que ligaria as sociedades patrimonialistas tradicionais às sociedades subdesenvolvidas contemporâneas (Schwartzman, 1988).

O nível político seria caracterizado pelo regime de cooptação. A junção entre os planos estrutural e político legaria para as relações políticas no Brasil o “patrimonialismo político”. Para tanto, Schwartzman postula uma perspectiva pautada em clivagens regionais. A análise regional daria conta das descontinuidades espaciais, tornando visíveis os fenômenos históricos que ficariam escondidos sob a capa da sociedade não indiferenciada, globalizada. As regiões foram divididas em Nordeste e Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo.

Nordeste, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro tiveram como característica principal o domínio do elemento tradicional sobre o moderno. São Paulo, por sua vez, seria caracterizada pelo domínio do elemento moderno. Dessa forma, São Paulo funciona, no argumento do sociólogo, como meio capaz de corrigir o autoritarismo brasileiro, pois as relações se constituiriam de maneira contratual e monetária, além de possuir formas embrionárias de representação política.

Contudo, a partir da derrota de São Paulo e do seu sistema de representação, houve a hegemonia do sistema de cooptação e a condução da modernização brasileira através de uma base neopatrimonial do domínio político. Em virtude desse domínio, seria necessária uma ruptura com a tradição ibérica coadunada no seio do Estado, por meio de uma cruzada antiburocrática para que este pudesse montar uma estrutura ágil, efetivamente moderna e capaz de fazer a transição de uma realidade subdesenvolvida e atrasada para uma situação pautada pelo desenvolvimento e pela justiça (Schwartzman, 1988). Esse seria o caminho para o Brasil instituir uma autêntica modernidade política, que, por sua vez, existiria nos países centrais e democráticos.

Apesar da construção de uma narrativa “moderna” para o autoritarismo brasileiro, a interpretação de Schwartzman1 segue as leituras de seus antecessores, porque também é pautada pelo nacionalismo metodológico, pela idealização da modernidade política e pela tese da singularidade política brasileira. Existe uma perspectiva teleológica da democracia, visto que o autoritarismo é interpretado como um fenômeno essencialmente distinto das democracias ocidentais.

A partir da exposição dos argumentos de Tavares Bastos, Faoro e Schwartzman, apresentaremos uma leitura alternativa do autoritarismo, que rompe com o nacionalismo metodológico, a idealização da modernidade política e a tese da singularidade política brasileira. Nesse sentido, cabe notar como, apesar de suas diferenças e nuances, os argumentos dos três autores analisados acima pressupõem a ideia de “diferenciação das esferas sociais” como critério para identificar avanço e atraso societário e político como características de “sociedades nacionais”. A ausência ou incompletude do processo de diferenciação entre as esferas pública e privada é o quadro de referência da ideia de que a cooptação política e outros obstáculos à ordem racional-legal e à democracia representativa constituem traços singulares do atraso político brasileiro. Como notou Tavolaro (2014), o diagnóstico do “déficit de diferenciação das esferas sociais” assume duas importantes variações, igualmente presentes em diferentes linhagens do pensamento social e político brasileiro (Tavolaro, 2014). A primeira é a concepção de que temos um “déficit de secularização”, ou seja, de que concepções mágico-religiosas continuam a se fazer presentes em amplos segmentos da população brasileira, impedindo uma efetiva separação entre a religião e as demais esferas da sociedade, como a política. A segunda variação é a concepção de que, entre nós, haveria uma forma singular de não separar as esferas pública e privada.

A recepção da teoria da diferenciação funcional de Niklas Luhmann também tem encontrado dificuldades para superar essa dicotomia caricatural entre uma modernidade política idealizada nos países centrais, marcada pela completude da diferenciação entre as esferas e pela plena constitucionalização e democratização do poder, e uma periferia de regiões e países definidos pela ausência ou pela incompletude dessas características (Dutra, 2016). O próprio Luhmann nunca logrou se distanciar suficientemente da associação entre modernidade política, democracia e diferenciação funcional nos países do Atlântico Norte. Sua concepção de diferenciação funcional se descolou, no final de sua vida e obra, apenas parcialmente de um discurso hegemônico e eurocêntrico sobre a modernidade em geral e a política em particular. Sua teoria da modernidade social e política ainda precisa ser corrigida em seu viés eurocêntrico.

Para superar a tese da singularidade política brasileira autoritária, precisamos de um diálogo entre teoria social e teoria política capaz de superar a concepção eurocêntrica da diferenciação entre as esferas sociais (Dutra, 2020) e a associação reducionista entre modernidade política e as democracias liberais do Atlântico Norte. Precisamos de uma teoria da diferenciação da sociedade que seja capaz de considerar fenômenos autoritários observáveis no Brasil como parte da variedade das formas estruturais e institucionais da modernidade política, sem que suas contradições e incompletudes sejam atribuídas a trajetórias nacionais singulares. Na próxima seção, buscaremos delinear os traços gerais de uma teoria da diferenciação da esfera política capaz de atender a esses requisitos, buscando construir uma sociologia política do autoritarismo que supere o nacionalismo metodológico, a idealização da modernidade política nos países centrais e a tese da singularidade política brasileira e, com isso, ofereça a possibilidade de compreender os problemas de autoritarismo no Brasil como parte da modernidade política e suas variantes.

Teoria política para além do nacionalismo metodológico

Há uma teleologia implícita do desenvolvimento político (Ahlers & Stichweh, 2019) que classifica os países de acordo com sua trajetória de regimes mais autocráticos para regimes mais democráticos. Desse modo, problemas de autoritarismo podem ser atribuídos e identificados com países específicos, considerados atrasados em termos de desenvolvimento político, deixando de ser observados como problemas modernos. A possibilidade de formas especificamente modernas da autocracia é desconsiderada.

A teleologia política reproduzida na idealização dos países centrais e na atribuição de uma singularidade pré-moderna ou uma modernidade negativa a países periféricos como o Brasil está vinculada de modo umbilical ao nacionalismo metodológico, pois a ideia de um ponto de chegada, que atua como critério de comparação para definir estágios relativos de “atraso” e “modernidade”, tem no imaginário sociológico das “sociedades nacionais” uma referência obrigatória. Precisamos de uma abordagem que recuse a completude da diferenciação funcional e a associação reducionista entre modernidade política e democracia como traços de países específicos (nacionalismo metodológico), idealizados como referência comparativa em uma visão teleológica da evolução sociocultural.

Luhmann não se afasta completamente da associação entre modernidade política e as experiências sociopolíticas da Europa e da América do Norte, tratando democracia e diferenciação funcional da política como quase sinônimos. Essa associação

conduz Luhmann a não fazer nenhuma consideração substancial sobre regimes políticos diferentes da democracia liberal representativa, que serve de modelo para observar o sistema político da sociedade global. Este estreitamento da diversidade de regimes políticos a nível mundial cobra o preço da ignorância sobre como realmente funciona a política nas diferentes regiões do globo (Saavedra, 2020, p. 109)

Desse modo, para Luhmann, a configuração política propriamente moderna decorre de evolução da democracia liberal representativa para a constituição dos Estados de bem-estar social que definem a paisagem política dos países do Atlântico Norte no pós-Segunda Guerra Mundial. Na demarcação dos eventos históricos que concretizam o desenvolvimento político moderno, o constitucionalismo liberal, que normaliza e formaliza a rivalidade em torno das posições de comando político através de disjunção binária entre governo e oposição (Luhmann, 1990, pp. 47-48), é tratado como caminho sem alternativa para o desenvolvimento dos Estados de bem-estar social, com sua dinâmica de amplificação recíproca de inclusão política e social por meio dos direitos fundamentais de cidadania (Luhmann, 1981b, p. 27; Neves, 2006, p. 256) . O problema dessa concepção é que ela tende a reduzir a função de mediar a promover inclusão política e social ao leque restrito dos modelos de Estado de bem-estar social do Atlântico Norte, desconsiderando não apenas formas políticas e estatais alternativas, como soluções informais funcionalmente equivalentes (como redes sociais dos mais diferentes tipos) que costumam florescer em regiões em que o Estado não consegue cumprir esta função (Cadenas & Mascareño, 2020, p. 90).

Para observar o funcionamento de regimes políticos em sua diversidade global, é preciso desenvolver a teoria dos sistemas além do que Luhmann pôde realizar. O estreitamento da visão evolutiva de Luhmann sobre as variedades da modernidade política é, em parte, herdeiro de certa “teleologia do desenvolvimento” encontrada no esforço sistêmico parsoniano, que concebe a diferenciação funcional dedutivamente e teleologicamente como a especialização de funções societais pré-estabelecidas (as famosas quatro funções do esquema AGIL) (Parsons, 1971). No entanto, em sua última fase de produção, Luhmann deixou elementos que permitem superar claramente a visão dedutiva e teleológica da diferenciação funcional, desenvolvidos, por exemplo, por vários autores brasileiros, mais recentemente, especialmente nas críticas à noção de “modernidade periférica” (Bachur, 2013; Dutra, 2020).

Desde o começo dos anos 1990, fica claro que Luhmann não parte de um modelo de diferenciação funcional no qual os sistemas funcionais coevoluem de forma harmoniosa, como se a autonomização da economia, da política, do direito, do ensino, da ciência etc. “fosse capaz de preencher funções de sustentação recíproca” (Luhmann, 1995, p. 24). Ele parte, na verdade, da premissa oposta: “a elevada especialização e autonomização dos sistemas funcionais irá conduzir a prejuízos recíprocos” (Luhmann, 1995, p. 25). A possibilidade de desdobrar esta visão antiteleológica da diferenciação funcional demonstra que a sociologia de Luhmann continua sendo uma opção interessante para romper simultânea e explicitamente com a visão teleológica da evolução sociocultural e com o nacionalismo metodológico (Cadenas & Mascareño, 2020; Dutra, 2020)2. Como recomenda Chernilo (2011), o obstáculo epistemológico mais importante do nacionalismo metodológico é o que ele chama de “argumento explicativo”: “a ascensão e as características principais do Estado-nação são usadas para explicar a ascensão e as características principais da própria modernidade. A modernidade seria a soma de trajetórias nacionais” (Chernilo, 2011, p. 104). Neste artigo, consideramos que a ideia de um autoritarismo singularmente brasileiro, como apresentamos na primeira seção, decorre de um “argumento explicativo” desta natureza, que coloca a trajetória nacional como variável independente para explicar o “atraso” político de países autoritários em comparação idealizada com as trajetórias de democratização dos países “avançados”.

O sistema funcional da política e suas diferenciações internas

A diferenciação do sistema político está baseada na constituição de um meio de comunicação simbolicamente generalizado, o poder, e de papéis sociais complementares definidos pelo acesso e uso do poder: os papéis de governante e governado (Schneider, 2010, p. 216). Em sociedades estamentais, governados e governantes não percebiam a relação entre eles como uma hierarquia de poder, mas sim como uma hierarquia ontológica natural entre seres superiores e seres inferiores. A ordem política, assim como a ordem religiosa, era uma derivação da ordem estamental mais ampla. Com a formação de um meio de comunicação simbolicamente generalizado e específico, a política passa a contar com um recurso propriamente político para constituir assimetrias de mando baseadas na capacidade de sanção negativa. A ameaça do uso da violência física é a principal forma de sanção negativa que assegura a probabilidade de aceitação das ações políticas de quem está em posição superior de poder. Dessa forma, o monopólio estatal do emprego da violência física é um pré-requisito para a diferenciação da política como subsistema especializado em produzir decisões coletivamente vinculantes.

A diferenciação do sistema político foi historicamente marcada pela consolidação da “razão de estado” (Staatsraison) em substituição à moralidade religiosa no esforço de monopolizar e centralizar o uso legítimo da violência física em um determinado território. Em Maquiavel (1996 [1532]), esse problema fundamental aparece formulado como paradoxo moral do “príncipe” que, para alcançar o fim moralmente justificado de assegurar a “ordem, a paz e a justiça”, precisa agir de forma moralmente reprovável, assassinando ou deportando potenciais usurpadores do poder. Uma vez assegurada a diferença entre governantes e governados por meio da concentração do poder e da violência, o problema deixa de ser essa necessidade de afirmar a autonomia das exigências funcionais da atividade política diante das exigências da moral religiosa. No lugar do problema da “razão de estado”, entra o problema do controle do uso arbitrário do poder. O exercício do poder, uma vez que não pode mais estar baseado no “cheque em branco” constituído pela fórmula da “razão de estado”, terá, então, de ser legitimado pela observação dos direitos do cidadão e do sistema de “freios e contrapesos”/divisão de poderes. Trata-se, aqui, da passagem da monarquia absolutista para o Estado constitucional.

É precisamente esse processo de “constitucionalização do poder” (Neves, 2008, p. 481) que resulta na formação de direitos políticos igualitários como expressão da noção de soberania popular, concebida como fonte última de legitimação do poder. Na medida em que o acesso e o exercício do poder são regulados por procedimentos jurídicos destinados a garantir tanto a expressão da vontade popular como o uso constitucional do poder, espera-se neutralizar a influência direta do poder social sobre o poder político. Na teoria de Luhmann, a constituição se torna o acoplamento estrutural entre direito e política, capaz de realizar essa neutralização do poder social, filtrando, especificando e rotinizando as possibilidades de irritação mútua entre os dois subsistemas. O direito irrita a política na medida em que o código do direito se torna relevante para o poder, podendo-se distinguir entre poder lícito ou ilícito e constitucional ou não constitucional (Neves, 2006, p. 252). As realizações e problemas dessa “constitucionalização do poder” constituem o foco temático da semântica teórica da política (“teorias de reflexão” no jargão de Luhmann) que vai se ocupar primariamente dos problemas relativos à (insuficiente) universalização dos direitos do cidadão e ao controle do uso arbitrário do poder (a divisão de poderes e os “freios e contrapesos”). Como sintetiza Luhmann (1997, p. 968): “a teoria política torna-se teoria do Estado constitucional”.

Mas, ao se tornar teoria do Estado constitucional, a teoria política perde de vista a dimensão não constitucional do poder. Embora Luhmann não tenha se distanciado suficientemente da associação entre modernidade política e as democracias liberais do Atlântico Norte, ele consegue se afastar da ideia de uma política plenamente controlada por procedimentos democráticos e constitucionais, com conceitos que se mostram produtivos no desafio de compreender a variedade do fenômeno político em diferentes regiões da sociedade mundial. Esses conceitos podem ser utilizados para conduzir a teoria a romper com a idealização da política democrática nos países de modernidade central, com o nacionalismo metodológico e com a teleologia na observação da diferença entre democracia e autocracia: referimo-nos, especialmente, aos modos de diferenciação interna do sistema político em política, administração e público (Luhmann, 2002, p. 253), associados à diferença centro/periferia e à constituição de dois circuitos de poder paralelos, distintos e eventualmente contraditórios: o circuito formal e o circuito informal.

Na diferenciação interna do sistema, a políticaengloba os processos, estruturas e atores dos poderes executivo e legislativo, mas também os partidos políticos envolvidos na elaboração de decisões coletivamente vinculantes. Não se trata de uma atividade que produz, isoladamente, decisões coletivamente vinculantes, mas sim de comunicações que servem para preparar essas decisões, testando e avaliando suas chances de sucesso (Luhmann, 2002, p. 254). A administração inclui todo o complexo de organizações responsáveis por implementar leis, normas e regulamentos, oferecer serviços públicos e aplicar todo tipo de política pública ou programa formulados por decisões políticas. Por fim, como resultado do acoplamento entre sistema político e sistema de comunicação de massas, surge uma esfera marcada pela auto-observação do sistema político: trata-se do público enquanto conjunto formado por discussões que informam a opinião pública sobre temas politicamente relevantes e por papéis que os cidadãos podem assumir no sistema político, como eleitor, membro de organização de interesse e movimentos sociais, contribuinte, beneficiário de programas sociais etc. Na forma de opinião pública, o público filtra os temas que interessam à produção de decisões coletivamente vinculantes.

A diferenciação entre política, administração e público está associada à diferença interna centro/periferia (Luhmann, 2002, p. 245). Segundo essa diferença, o centro do sistema engloba os poderes executivo e legislativo, a administração pública e os partidos políticos, enquanto a periferia é composta pela opinião pública, os movimentos sociais, as organizações de interesse, organizações não governamentais etc. Com isso, a dicotomia ontológica entre Estado e sociedade civil (Saavedra, 2020) é dissolvida e trabalhada como uma distinção produzida e controlada pelo próprio sistema político. Nesse sentido, Luhmann não reproduz, no plano da sociologia, a noção de Estado enquanto representação simbólica do sistema político em sua totalidade, permitindo conceber as comunicações políticas da “periferia” e do “público” (que não são “estatais”) como constitutivas do sistema de preparação e produção de decisões coletivamente vinculantes. Isso permite avaliar a importância do Estado em uma concepção não estadocêntrica da política, multinível e capaz de romper com o nacionalismo metodológico.

A sociologia política de Luhmann engloba não apenas os fluxos de poder do tipo top-down (de cima para baixo) e do tipo bottom-up (de baixo para cima), como considera a possibilidade de coexistência contraditória e não sincronizada de uma variedade bem maior de fluxos e arenas de poder. Assim:

é possível pensar a decisão política e o poder como fluxos comunicativos [...] que circulam em seu processo de elaboração de forma horizontal, vertical, central, periférica, espiral, contraditória e/ou intermitente. Tudo isso acontece em múltiplos lugares e momentos que não são necessariamente coordenados e sincronizados entre si, nem dirigidos ou supervisionados centralmente. Portanto, os efeitos desses fluxos de decisão e poder [...] têm escopos e consequências diferenciados e inesperados (Saavedra, 2020, p. 107).

Nos distintos fluxos, arenas e circuitos da comunicação política, podem surgir e se alterar formas específicas de inclusão e exclusão, de acordo com disputas “distributivas” igualmente específicas (Bachur, 2020). A variedade de processos comunicativos faz com que o binarismo da forma inclusão/exclusão (Stichweh, 2005) assuma configurações específicas nos distintos níveis, circuitos e arenas do sistema. É preciso ressaltar o caráter operativo e binário da forma inclusão/exclusão na teoria dos sistemas. Em todo evento ou processo comunicativo, opera-se com a distinção entre inclusão e exclusão: não há inclusão sem exclusão, pois se trata de uma forma operativa de dois lados.

Enquanto os sistemas funcionais se apoiam na norma universalista da inclusão – e isso, como veremos, acontece até em regimes políticos autocráticos –, deixando o “outro lado” (exclusão) da forma fora de consideração, a diferenciação interna dos subsistemas funcionais produz uma variedade de organizações, redes e outros níveis sistêmicos que produzem simultaneamente inclusão e exclusão, de acordo com lógicas e estruturas específicas. A combinação entre inclusão universalista nos sistemas funcionais com exclusão particularista em seus níveis e arenas internas se realiza, na política, especialmente com a bifurcação entre os fluxos do poder formal e do poder informal (Luhmann, 1981a; Luhmann, 2002, p. 260). Ao trabalhar com essa bifurcação, Luhmann aborda a política não só para além do Estado e sua dimensão oficial, mas também para além do ideal constitucional de um poder político plenamente imune ao poder social desigualmente distribuído. A distinção entre poder formal e informal não trata formas autocráticas de inclusão e exclusão políticas como características exclusivas de determinados países (nacionalismo metodológico) considerados atrasados em sua trajetória de desenvolvimento político, mas sim como características presentes, em maior ou menor grau, também em países definidos como democracias constitucionais, liberais e representativas.

Na relação entre o público e a política, o poder formal é aquele que o cidadão transfere pelo voto ao governante e que institucionaliza a “constitucionalização do poder” e a norma da igualdade política. Na relação entre política e administração, o poder formal é a decisão sobre normas, leis, regulamentos, projetos, programas e políticas que os poderes executivo e legislativo produzem para serem implementados pela burocracia estatal. Na relação entre administração e público, o poder formal consiste nas atribuições relativas à implementação das decisões políticas na relação com os cidadãos.

O circuito do poder informal é uma espécie de fluxo comunicativo na direção oposta à do poder formal, e que floresce nas relações de interdependência entre política, administração e público. Nesse circuito, as comunicações políticas não são alcançadas pela normatização constitucional, estabelecendo-se como um espaço que contrasta com a igualdade política normativamente esperada no espaço do poder formal. Nessa dimensão do poder:

[...] a política não pode funcionar sem as orientações da administração. Assim como o público torna-se dependente da pré-seleção de pessoas e programas dentro da política e a administração passa a depender, na medida em que se expande para campos de forças mais complexos, da atuação voluntária do público, sendo obrigada a concedê-lo alguma influência. (Luhmann, 1981a, p. 164)

O crescimento e o adensamento das estruturas organizacionais envolvendo a administração e o público, incentivados pela expansão do Estado de bem-estar social, elevam a complexidade das situações de decisão com as quais a administração se vê diariamente confrontada em função de suas relações informais com o público. Isso faz com que a administração se torne cada vez mais dependente da cooperação dos segmentos organizados do público. Esses segmentos possuem uma margem de atuação e influência sobre a implementação de políticas públicas que não se deixa controlar pelo poder constitucionalizado e pelos programas decisórios oficiais (Luhmann, 2002, p. 260-261).

Essa relação de dependência significa que os grupos organizados podem sancionar (punir) o governo, adquirindo posições de poder informal e autocrático capazes de se opor ao curso do poder formal democrático. Um exemplo contemporâneo, presente no Brasil, de crescimento do poder informal autocrático é o protagonismo de organizações religiosas, especialmente as pentecostais, em processos de moralização da política. Tais organizações têm aproveitado oportunidades de sanção no circuito informal do poder. As negociações e ameaças de denominações religiosas a atores políticos geralmente envolve o componente da moralização, especialmente a ameaça de vincular determinado político ou partido a posicionamentos capazes de alimentar rejeição moral nos segmentos religiosos da população. Os meios de comunicação de massa e sua capacidade de difusão são indispensáveis na configuração de um ambiente político interno (opinião pública) de ameaças e escândalos morais cotidianos (Luhmann, 1996b) que prende a atenção e orienta a conduta dos atores políticos. Por causa de seu papel decisivo na moralização da política, a organização e o controle dos meios de comunicação de massa, que se alteram profundamente com a emergência das ditas “redes sociais” (Facebook, WhatsApp, Twitter, Instagram), constituem um dos fatores mais importantes do poder informal em sua configuração autocrática, cujos efeitos se estendem rápida e ciclicamente para o poder formal, influenciando o processo eleitoral.

A relação entre democracia e autocracia

Para Anna Ahlers e Rudolf Stichweh (2019), a política moderna, funcionalmente diferenciada em nível global, oscila atualmente de modo bipolar entre alternativas democráticas e autocráticas de organização e exercício do poder. Com isso, ela não só transcende a idealização constitucional da política, já realizada por Luhmann, como permite análises comparativas de fenômenos autocráticos e democráticos sem nenhum tipo de nacionalismo metodológico.

Essa concepção “bipolar” da política moderna a partir da teoria sociológica sistêmica nos permite um olhar mais nuançado sobre os processos de democratização ou de autocracia. Entre a possibilidade de retirar o rótulo de democrático e colocar o de autocrático há um leque de gradações e de avanços dos enclaves autocráticos e democráticos. Democracia e autocracia são percebidas como dois equivalentes funcionais de que dispõe a modernidade política para realizar a função de construir decisões coletivamente vinculantes. Para o argumento deste artigo, a concepção de “bipolaridade” da política moderna implica que fenômenos autoritários não devem ser vistos como elementos de tradições autoritárias do passado que sobrevivem no presente.

Como a política é um sistema global, diferenciado internamente em Estados-nações e em níveis subnacionais, Ahlers e Stichweh sugerem uma análise multinível que seja capaz de considerar as semelhanças e diferenças na relação entre os níveis global, nacional e subnacional. Não se trata de recusar a classificação de países como autoritários ou democráticos, mas de incluir na análise outros níveis do sistema político (Ahlers & Stichweh, 2019, pp. 821-822 e 833). No nível global, não existe democracia. Tudo o que a modernidade produziu em termos de democracia nunca alcançou o nível global em termos institucionais. Nos níveis subnacionais, é comum que regimes autoritários, a exemplo da China, combinem diferentes formas de inclusão e exclusão com a hierarquia interna da organização estatal e dos processos de tomada de decisões coletivamente vinculantes. Assim, enquanto a condução do governo central permanece inacessível, a implementação local de políticas públicas adquire mais abertura para a variedade de interesses e demandas do ambiente, promovendo formas distintas de participação da população afetada pelos resultados (output) das políticas governamentais (Ahlers & Stichweh, 2019, p. 833; Zhiyuan, 2009).

Nessa análise sistêmica multinível, a combinação de exclusão da maioria da população dos papéis profissionais de condução política do governo central com sua inclusão nos papéis de público destinatário de políticas públicas se articula com os padrões de hierarquia entre valores societais típicos de democracias e autocracias: na democracia predomina a hierarquia de valores, na qual a política é avaliada pelos valores fixados internamente pelo próprio sistema político (como as liberdades de opinar e votar) em seus procedimentos de tomada de decisão coletiva; nas autocracias, por sua vez, o valor do processo político é subjugado a uma hierarquia de valores externa à política, mas que serve de fundamento para elites que controlam o acesso às posições do poder formal. Valorizar primariamente o input é valorizar o próprio sistema político, o jogo democrático tomado como um fim em si. Valorizar primariamente o output é valorizar o sistema político como meio para fins estabelecidos a partir de valores sociais externos à política – como a conservação da moral, a preservação da vida dos indivíduos ou a efetividade na implementação das políticas públicas –, mas que a política aceita como necessários para estruturar a tomada de decisões (Ahlers & Stichweh, 2019, p. 824-825).

Essa distinção entre padrões de preferência de valores permite não reduzir modernidade política à democracia e conceber o autoritarismo como uma latência sempre presente na formação e reprodução do sistema político moderno. Como a modernidade é marcada pelo pluralismo de valores inerente à diferenciação funcional, a sociedade não garante ao sistema político que o valor próprio dos processos políticos seja sempre preferido pelas maiorias. Às vezes a maioria prefere um regime autoritário por considerá-lo mais eficiente para tomar decisões sobre valores de outros sistemas funcionais, externos à política (Ahlers & Stichweh, 2019, p. 826).

As diferentes formas modernas de autocracia acolhem, seletivamente, o imperativo da inclusão do público, mas sem sua participação na seleção das elites políticas. Trata-se de fenômeno moderno, no qual autocracias precisam legitimar suas decisões diante de um público levado em conta por quem controla o poder do Estado, ainda que de modo passivo. A crescente importância da “opinião pública” nos regimes autoritários atesta esse fato.

No paradigma da singularidade política brasileira, como vimos, existe uma idealização da democracia constitucional como única forma política moderna, sem equivalentes funcionais, para a construção de decisões coletivamente vinculantes e aceitáveis como legítimas pelo público da política.

Nesse sentido, é importante mencionar o trabalho teórico de Wanderley Guilherme dos Santos (2017). O cientista político defende que o autoritarismo não pode ser observado mais como um fato que não cabe no presente, como se fosse sobrevivência do passado, exatamente como preveem os conceitos de patrimonialismo e neopatrimonialismo que tentam explicar o fechamento das posições de poder político pelo passado ibérico. Ele recusa a concepção de que as rupturas no jogo democrático brasileiro sejam a demonstração de um reiterado autoritarismo que marcaria atavicamente o sistema político nacional.

Para mostrar o equívoco dessa concepção, Santos compara regimes oligárquicos e democráticos: dentro do sistema democrático identificamos mais rupturas das regras do jogo do que nos períodos oligárquicos, corroborando a tese da “bipolaridade” da política moderna (Santos, 2017, p.11). Nesse sentido, golpes parlamentares como o que retirou Dilma Rousseff da Presidência indicam contradições do sistema político e os limites da própria democracia moderna, sobretudo a tensão entre os valores do sistema representativo e o capitalismo. Sua abordagem vai além das interpretações do PPB expostas neste artigo: rompe com a tese da excepcionalidade brasileira e com a idealização do sistema democrático (Santos, 2017, p14).

Conclusão

A idealização da modernidade política dos países do centro é um contraponto normativo para a definição dos países periféricos como deficitários na realização dos atributos considerados típicos da política moderna: a democracia e o constitucionalismo. A atribuição ontológica (nacionalismo metodológico) de características modernas (democracia e poder constitucional) aos países centrais e características pré-modernas (autoritarismo e poder arbitrário) aos países periféricos pressupõe uma linha de desenvolvimento (teleologia) que vincula o tradicional a tudo que é autoritário e o moderno ao que é exclusivamente democrático. Esse discurso público e acadêmico sobre a relação entre democracia e as formas políticas autocráticas precisa ser revisto.

Além da crítica, esboçamos o ponto de partida teórico de uma sociologia política de orientação sistêmica como explicação alternativa que redefine os parâmetros de observação e o próprio objeto: o Estado nacional perde sua exclusividade como categoria analítica da teoria política e passa a ser observado como um nível entre outros na política moderna, e o objeto deixa de ser a democracia e o autoritarismo enquanto formas políticas separadas para ser a “bipolaridade” entre elas, sua coexistência dentro do mesmo sistema político moderno e em seus distintos níveis. Em síntese: observa-se as relações entre poder democrático e poder autocrático na configuração estrutural interna e nas relações entre os diferentes níveis do sistema político.

Esta sociologia política que propomos não hierarquiza no tempo (moderno/atrasado) e na região (regiões modernas/ regiões atrasadas) a diferença entre democracia e autocracia, mas a considera como uma diferença moderna, que assume configuração bipolar na modernidade política global. Nesse contexto teórico, variantes locais e regionais podem ser comparadas para além dos obstáculos epistemológicos do nacionalismo, da teleologia e da idealização. A política moderna não pode ser reduzida à democracia. O chamado “recesso da democracia” não é um corpo estranho à modernidade política.

Para a teoria da diferenciação funcional, a consideração de que as autocracias e os fenômenos autocráticos existentes são modernos, no sentido de que partilham estruturas semânticas e formas de diferenciação interna com os regimes democráticos, coloca em xeque a imagem de uma diferenciação funcional completa e acabada como traço de qualquer Estado nacional, região e da sociedade mundial como um todo. Nesse sentido, trata-se de contribuir para um processo de revisão e aperfeiçoamento da teoria da sociedade moderna e de sua dimensão política, que leve em conta os paradoxos e contradições dessa sociedade e de sua política.

Os fenômenos autoritários que observamos na história política brasileira, tanto os regimes autoritários do passado como as estratégias recentes de limitação do poder democrático constitucional, precisam ser compreendidos a partir da modernidade do poder autocrático. A análise deve partir de uma teoria social multinível e não estadocêntrica da política, que nos permita observar os problemas da política moderna em sua globalidade e dinâmica de incerteza no jogo oscilante entre democracia e autocracia.

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Notas

1 Para uma crítica detalhada da narrativa “moderna” de Schwartzman sobre o autoritarismo brasileiro, ver Ribeiro e Dutra (2020) que, além de explicitar os pressupostos presentes na formulação do sociólogo mineiro, ainda oferecem uma alternativa teórica a partir da sociologia política de Niklas Luhmann.
2 A “teleologia do desenvolvimento” é uma característica central das teorias da modernização preocupadas não apenas com o desenvolvimento político, mas também com a relação entre política, sociedade e o desenvolvimento econômico de países “subdesenvolvidos”. No tema do desenvolvimento econômico, a teoria etapista de Walt Whitman Rostow (1974) é exemplo paradigmático e tem desdobramentos práticos também para a dimensão política, já que estreita fortemente o leque de combinações possíveis entre política e sociedade (a “decolagem” da mudança social e econômica) que podem levar à transição de formas tradicionais para formas modernas.
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