RESUMO: O artigo visa explorar alguns dos principais traços morfológicos dos cientistas sociais brasileiros. Esboça-se aqui um perfil do segmento acadêmico dos sociólogos, através de uma amostra de membros da Sociedade Brasileira de Sociologia, tendo sido os dados colhidos através de survey a ser respondido pela internet em 2009. Os dados indicam um segmento profissional predominantemente feminino, branco, com mais de 45 anos e renda bem acima da média nacional. Seis instituições nacionais concentram mais da metade dos doutorados feitos por esse grupo. Inseridos principalmente como professores e pesquisadores, os sociólogos também têm entradas diversas no campo profissional, destacando-se as atividades administrativo-gerenciais. Como profissionais, os sociólogos trabalham com toda a gama clássica de problemas e temas sociológicos.
Palavras-Chave:Ciências SociaisCiências Sociais,Sociologia no BrasilSociologia no Brasil,Atuação profissionalAtuação profissional.
ABSTRACT: The article aims to explore some of the main morphological features of the Brazilian social scientists. We outlined a profile of the academic segment of sociologists, using a sample of members of the Brazilian Sociological Society, with data collected through a survey answered via the internet in 2009. The data indicate a largely female professional segment, white, With more than 45 years and income well above the national average. Six national institutions account for more than half of the doctorates made by this group. Inserted primarily as professors and researchers, sociologists also have several entries in the professional field, highlighting the administrative and managerial activities. As professionals, sociologists work with all the classic range of problems and sociological themes.
Keywords: Social Sciences, Sociology in Brazil, Professional Expérience.
RÉSUMÉ: L’article vise à explorer quelques uns des principaux traits morphologiques des sociologues brésiliens. On ébauche ici un profil du segment académique des sociologues par le biais d’un échantillon des membres de la Société brésilienne de Sociologie, auprès desquels les réponses furent recueillies via survey envoyé par internet en 2009. Les données obtenues indiquent un ce segment professionnel à prédominance féminine, blanche, de plus de 45 ans et au revenu nettement plus élevé que la moyenne nationale. Ses institutions nationales concentrent plus de la moitié doctorats élaborés par ce groupe. Insérés principalement comme professeurs et chercheurs, les sociologues exercent également des fonctions diverses dans le champ professionnel plus particulièrement dans les activités administratives et de gérance. En tant que professionnels, les sociologues travaillent sur toute une gamme de problèmes et de thèmes sociologiques.
Mots-clés: Sciences sociales, Sociologie au Brésil, Actuation professionnelle.
Artigos
ESBOÇO DE UMA MORFOLOGIA DA SOCIOLOGIA BRASILEIRA: PERFIL, RECRUTAMENTO, PRODUÇÃO E IDEOLOGIA
OUTLINE OF A MORPHOLOGY OF BRAZILIAN SOCIOLOGY: PROFILE, RECRUITMENT, PRODUCTION AND IDEOLOGY
ÉBAUCHE D’UNE MORPHOLOGIE DE LA SOCIOLOGIE BRÉSILIENNE : PROFIL, RECRUTEMENT, PRODUCTION, IDÉOLOGIE
Recepção: 09 Outubro 2013
Aprovação: 22 Dezembro 2013
DOI: 10.20336/rbs.46
Uma olhada rápida na produção sociológica brasileira, feita de forma mais impressionista que propriamente analítica, produz alguma perplexidade. Usando os encontros da ANPOCS e da SBS como referência encontra-se um quadro que poderíamos classificar como quase amorfo exatamente pela ausência de uma estrutura teórica e metodológica que permitisse identificar o tipo de ciência social dominante. Uma simples listagem dos trabalhos apresentados nos diferentes grupos nos encontros das duas associações mencionadas chama a atenção para alguns dos traços dessa amorfia: do corpo aos sentimentos, a preocupação com o indivíduo parece dar pouca ênfase às regularidades das identidades individuais e aos seus traços propriamente sociais; opiniões individuais e individualizadas ocupam o espaço das representações coletivas e, mais grave, sob certo ponto de vista, dos próprios conceitos; malabarismos ideológicos aparecem travestidos de tendências sociais sem que se apresentem quaisquer dados empíricos mais substantivos e bem analisados. Em suma, como disse um pesquisador que não quis se identificar, a sociologia brasileira está se tornando uma grande especialista na pesquisa sobre “a cor do umbigo da cobra gay de Madureira”. De forma menos sarcástica, outros pesquisadores destacam a diluição da perspectiva científica da sociologia numa visão culturalista e relativista que teria reduzido enormemente a especificidade teórica e metodológica – para alguns outros também a qualidade da sociologia brasileira.1
Continuamente “em processo”, a estrutura e a cultura que formam as Ciências Sociais brasileiras – envolvendo disciplina e profissão não passaram por nenhuma nova crise nos últimos dez anos. Suas várias crises já foram hipotetizadas ou conceituadas anteriormente: somem-se a crise da universidade pública e do financiamento da produção científica, a falta de regulação do ensino privado, o mercado público de avaliações laudatórias, os obstáculos à inserção profissional, a falta de oportunidades para os pós-graduados, a falta de relação com a sociedade. Nos últimos anos, ao contrário, a principal força externa a esses dois sistemas de relações tem caráter expansivo a partir de sua inclusão no currículo do Ensino Médio, abrindo cargos e vagas no ensino, na produção bibliográfica, atingindo novas demandantes. De acordo com os dados do INEP, entre 2000 e 2011, a tendência é de estabilidade no número de alunos matriculados (aproximadamente 27 mil) e de declínio significativo no número de formados (de 4.300 para 3.400) em Ciências Sociais - licenciatura e bacharelado, excluindo as Relações Internacionais. O texto que segue pretende, ao sistematizar estas e outras fontes de dados, acompanhar algumas das transformações que estão se passando nas Ciências Sociais, seja em seu recrutamento, seu perfil institucional de formação, seja na valorização diferencial que os segmentos profissionais recebem.
Aqui não se trata de tentar “encaixar” diretamente a produção em seu substrato social (que tem idas e voltas: de um lado, os ingressantes-matriculados-concluintes serão produtores de conhecimento após alguns anos, e aí poderão ser verificadas como as alterações no recrutamento influenciarão, e, de outro, os atuais produtores se adaptam e buscam campos e áreas em mutação para posição de vantagem científica): a intenção aqui é de explorar o “corpo” e a “mente” da sociologia brasileira, ou ainda, usando um modelo clássico de análise, desenhar os traços morfológicos dessa ciência no país.
Essa exploração começa pelos números comparativos mais gerais sobre as áreas de conhecimento dentro do sistema de educação superior brasileira para, em seguida, lançar mais luz sobre uma parte de seus agentes e produtos para os quais temos dados recentes – o segmento acadêmico das Ciências Sociais, por meio de uma amostra de membros da Sociedade Brasileira de Sociologia.
Dados sobre o recrutamento e a produção de diplomados em todas as áreas, extraídos da série anual do Censo da Educação Superior do INEP, mostram o substancial crescimento de matriculados no ensino superior presencial (5.746.762 em 2011 contra 2.694.245 em 2000, ou seja, mais que o dobro de acréscimo) e ainda maior de concluintes. Dentro das grandes áreas, apesar das flutuações, as Humanas perderam apenas uma pequena parte de sua ampla maioria, e as Ciências Sociais, consideradas com seus cursos de licenciatura mas excluindo os de Relações Internacionais, perderam um pouco mais do seu já reduzido espaço dentro das Humanas (de 1,53% do total de matriculados em 2000 para 0,82% em 2011; de 1,94% dos concluintes em 2000 para 0,61% em 2011), sendo que não se percebe uma transferência clara para números relacionados à graduação a distância. Os casos mais representativos de grandes variações nas Humanas são a Administração, pela expansão de matriculados (de 18,9% a 27,7% no mesmo período) e de concluintes (16,1% a 30,1%), e a Economia, pela retração também tanto de matriculados (de 3,6% a 1,5%) quanto de concluintes (3,2% a 1,2%).
O que chama a atenção no caso das Ciências Sociais é a tendência de acréscimo na proporção de matriculados e concluintes em instituições públicas (respectivamente 53,8% e 36,8% em 2000 e 85,5% e 76,4% em 2011). Esta tendência parece, à primeira vista, contrasensual, já que muito se discute a respeito da expansão das vagas pelo ensino superior privado na disciplina e das novas vagas abertas no ensino privado para a formação de professores de Ensino Médio após a inclusão obrigatória da Sociologia e da Filosofia nos currículos (primeiro pelo parecer do CNE em 2006 e em seguida pela Lei 11.684 de 2008).2
Mesmo considerando a infinidade de questões colocadas em pauta pelas situações descritas, nesse texto, o objetivo maior é o de caracterizar a sociologia acadêmica, que parece ser dominante no corpo profissional, mas que, por outro lado, possui uma produção que, pelo menos aparentemente, recusa delimitações disciplinares claras.
Os dados mais atuais trazidos por este texto apresentam um grupo particularmente “distinto” da profissão: a diretoria da SBS, na gestão 2007-2009, decidiu conhecer melhor um conjunto de aspectos (entre profissionais, pessoais, científicos, valorativos etc.) de seus membros. Para isso, realizou um survey com todos os 911 associados no primeiro semestre de 2009. No formulário, preenchido via internet, constavam 39 perguntas, respondidas totalmente ou parcialmente por 477 dos seus membros. Baseados nessas respostas, tentaremos caracterizar, sob a ótica da sociologia das profissões, esta parte bem específica de nossa profissão. Isto porque, pelo que veremos em seguida, e pelo perfil geral da Sociedade, trata-se de um grupo predominantemente constituído por acadêmicos.
Além disso, a caracterização desse grupo profissional será realizada, onde couber, por comparação, pelas “diferenças”, no intervalo entre os resultados dessa pesquisa e aquela apresentada em Braga (2009), um survey com diplomados de Ciências Sociais da USP, Unicamp, PUC-SP e PUC-Campinas com foco nas suas trajetórias de trabalho dentro elou fora da profissão e na composição dos segmentos intraprofissionais. Aqui o desenho de pesquisa envolvia a localização dos formados a partir das listas de concluintes dessas quatro universidades entre 1970-2005. De cada cruzamento de década e universidade, eram selecionados aleatoriamente 45 nomes (como dois cruzamentos foram excluídos, o total chegou a 630 pessoas), procurados e contatados (359 localizados), e questionários enviados e recebidos anonimamente (total de 230 respostas). A abordagem anônima e o contato direto com todos almejava cobrir as variadas opções profissionais e aumentar a taxa de resposta daqueles que não trabalham, nem nunca trabalharam, na área.
Para efeitos de contraste, incluiremos aqui apenas as respostas dos 126 cientistas sociais dessa última amostra que exerciam, no momento da abordagem, atividades dentro de sua área de formação, enquanto acadêmicos, funcionários públicos, pesquisadores privados, assessores, coletores de dados, entre outros (utilizando uma codificação bem inclusiva do que está “dentro” da formação). Veremos, portanto, uma amostra de todos os subgrupos profissionais que efetivamente trabalham como cientistas sociais (denominação que inclui sociólogos, antropólogos e cientistas políticos) lado a lado com o segmento3 formado pelos sócios da SBS. Nas diferenças entre as amostras (e a de cientistas sociais SP – como serão chamados os profissionais da amostra de Braga, pela sua origem escolar naquele estado – incluem os acadêmicos) espera-se encontrar indicações do diferencial de extensão dos atributos entre a parte e o todo.
As mulheres formam a maioria de ambas as amostras, tanto de membros da SBS (53,6%), quanto do grupo de cientistas sociais em atividade na sua formação (56,3%).
Já no caso da idade, chama a atenção o fato de que mais da metade dos sócios da SBS têm mais que 45 anos (63,9%). Isso pode indicar que nossa profissão não anda muito atraente para os jovens ou que a SBS não tem sido capaz de mobilizar esses jovens para a Sociedade. Essa segunda hipótese ganharia força com os dados mencionados anteriormente sobre um crescimento recente de aproximadamente 100% no número de matrículas e de 150% do número de concluintes.
O perfil etário dos sócios da SBS, com uma idade média de 50,3 anos, é muito parecido com aquele dos formados em SP, com exceção do grupo com até 34 anos, bem mais representado na amostra paulista. Esse pode ser um indicador de que efetivamente a SBS está tendo dificuldades de recrutamento entre os jovens sociólogos.
Associado à idade mais elevada, encontramos também um percentual relativamente pequeno de profissionais solteiros/as. Verifica-se também que mais de dois terços (67,3%) dos sociólogos e sociólogas membros da SBS têm filhos (contra pouco mais da metade dos profissionais paulistas). Mesmo assim, é impressionante a semelhança entre os perfis familiares dos sócios da SBS e de seus colegas formados nos cursos paulistas.
Apesar desta última amostra representar apenas os formados de quatro universidades paulistas, os membros da SBS apresentam uma distribuição também com moda no Sudeste mas que parece refletir a distribuição nacional da população. A região Centro-Oeste, por sua vez, tem muitas universidades com cursos de Ciências Sociais, o que permitiria hipoteticamente encontrar mais associados nessa região.
Outro dado importante sobre o grupo social diz respeito à sua composição racial ou, como é usual no Brasil, a distribuição da cor da pele segundo as declarações dos respondentes. Quase três quartos (73,9%) dos membros da SBS e mais de quatro quintos (85,6%) dos diplomados paulistas declaram-se brancos.
Não se pode dizer que seja um dado surpreendente: somos uma profissão de brancos! Como sabemos, a entrada massiva de negros no ensino superior apenas começa no Brasil. Seria importante analisar aqui uma medida simples usada na sociologia da educação que é a taxa de paridade: comparando-se a presença de brancos, pretos e pardos na população como um todo (para os dados da SBS) e da população paulista (para os dados de Braga), fica evidente a força do grupo de brancos entre os sociólogos. Na população brasileira eles são 47,7%, e 63,9% na paulista (dados do Censo 2010).
Ainda assim, estudos recentes indicam – e os dados sobre os membros da SBS convergem – o quanto os cursos de ciências sociais são mais abertos em termos sociais, acolhendo um público mais preto, mais pobre e mais periférico e que consegue chegar inclusive à pós-graduação, contrariamente ao que acontece em outras áreas (Bastos, 2004). Na verdade, nos cursos de Ciências Sociais de pós-graduação (Martins et al., 2002) foi possível encontrar filhos de pais analfabetos, um indicador importante do caminho de mobilidade social que existe na profissão de sociólogo e que se confirma em nossos dados.
A distribuição da escolaridade dos pais – um indicador de origem social – dos grupos de cientistas sociais aqui apresentados estão na tabela 1.
Aqui, mais uma vez, ressaltamos o padrão geral de semelhanças, apesar de diferenças importantes aparecerem em uma ou duas faixas; e apenas em uma das faixas houve inversão entre pais e mães nas duas amostras. Esses movimentos sociais ascendentes podem se expressar também no nível de rendimento encontrado entre os sócios da SBS e os formados em SP, apresentado na tabela 2.
A diferença de rendimentos, principalmente médios, entre as amostras adquiriu interesse, pois contraria dados gerais que mostram que o estado de São Paulo tem os níveis mais elevados de renda do país. Uma possível explicação seria o fato do grupo de membros da SBS apresentar um perfil etário mais velho. Outra alternativa pode ser a concentração dos profissionais da SBS na academia, normalmente em universidades públicas, que garantem maiores rendimentos, talvez apontando para o locus da maior valorização para o profissional. Por outro lado, como a associação à SBS tem o título de mestre como requisito, e muitos profissionais de São Paulo não possuem este título, se trataria assim de um efeito da associação entre titulação e renda.
Num país em que o PIB per capita não passa de R$ 16.920,00 anuais (dados de 2009), a renda familiar dos sociólogos indica uma posição social privilegiada. Mesmo na ausência de dados per capita comparáveis, os valores apresentados indicam que estamos diante de um quadro de profissionais que se classificaria facilmente entre as chamadas classes médias mais elevadas. Isto se traduz no próprio sentimento de bem-estar declarado pelos respondentes, que se localizam, majoritariamente (57,8% e 55,6% para SBS e paulistas, respectivamente) nos níveis superiores da escala proposta de bem-estar familiar (numérica, variando entre 1 e 5).
Outro detalhe interessante na descrição do grupo profissional dos sociólogos é sua filiação religiosa, apresentada na tabela 3. A marcada presença de profissionais que se declaram ateus ou sem religião seria o maior diferencial em relação ao conjunto dos brasileiros. Ainda assim, dados censitários indicariam que o grupo de pessoas que se declaram sem pertencimento religioso é o que mais cresce no país (de 0,2% no Censo de 1940 a 8,0% no de 2010; neste último, a proporção de católicos era de 64,6%).
Um grupo profissional define sua identidade inicialmente através do processo de socialização que, no caso das profissões superiores, ocorre primeiramente na formação universitária. Como mostra Magali Larson (1977), é através de uma formação relativamente unificada e uniforme que uma profissão desenha sua identidade coletiva, demonstrando para a sociedade que o serviço que cada um dos seus membros profissionais presta é similar ao trabalho que fazem os demais membros do mesmo grupo. Ou seja, a identidade de um grupo profissional organiza-se principalmente através do compartilhamento de formas específicas de ver o mundo, de definir os problemas da sua esfera de atuação e de agir sobre o mundo e buscar soluções para os problemas. A formação universitária seria o modo primordial de socialização profissional, feita em cursos especializados que garantiriam um conjunto de conhecimentos necessários à realização das tarefas que cabem a um grupo profissional na divisão social do trabalho.
É sob essa ótica que se explica o fato de que, em geral, são os cursos de graduação que definem as ocupações ou profissões. Nesse sentido, a primeira pergunta seria sobre a graduação dos sociólogos. No caso dos associados da SBS, apenas 73,0% dos respondentes têm diploma de graduação em Ciências Sociais. Isso porque o que caracteriza este grupo é a posse de um diploma de pós-graduação em Ciências Sociais. Já o grupo de cientistas sociais profissionais necessariamente possui esta graduação, e isto foi a base para a seleção aleatória dos respondentes da pesquisa. As questões mais importantes para este grupo são: quais outros cursos de graduação que frequentaram, a maior titulação recebida e em quais áreas.
Os dados sobre as instituições de socialização profissional evocam um panorama diversificado, porém convergente, concentrando em algumas instituições – principalmente USP, UFRJ, Unicamp, UnB, UFPE e IUPERJ (somados 42,3% dos mestrados e 51,8% dos doutorados dos membros da SBS) em função do histórico de institucionalização dos cursos de pós-graduação a obtenção da credencial de acesso à carreira acadêmica. Assim, em contraste às diferentes tradições-programas de pesquisa desenvolvidos nessas instituições, o fato de que são limitadas pode implicar, por outro lado, em semelhanças na formação do professor ou do pesquisador, no modo de se fazer da profissão acadêmica.
Isso também se relaciona com o fato de que, pelo menos em nossa disciplina, é na pós-graduação que a perspectiva de uma das possíveis identidades profissionais se firma, e se tornar “sociólogo acadêmico” se confunde com o “sociólogo profissional”, em parte pelo limitado direcionamento profissional na graduação, em parte pela institucionalização mais antiga e centrada na pesquisa dos principais centros de formação.
Chama a atenção também a proporção de doutorados cursados ou em curso no exterior (16,5%). Dentre os membros da SBS que concluíram ou cursavam doutorado no momento da pesquisa (perto de 90% dos respondentes), mais da metade está especificamente na Sociologia, e outro quarto está em cursos de Ciências Sociais ou de Ciência Política ou Antropologia, separados ou em combinação com a Sociologia. Não são, portanto, exclusivamente mestres e doutores em Sociologia. Encontramos mestres ou doutores em Economia, Administração, História, Psicologia, Extensão Rural, Ciências do Solo, Direito e Arquitetura, entre outras áreas de conhecimento.
A Tabela 4 permite outra perspectiva sobre a formação acadêmica dos membros da SBS através da tabulação do percurso acadêmico realizado.6 Na primeira parte temos a sequência educacional dos membros da SBS após a graduação (em Ciências Sociais e nas demais áreas). Do grupo de formados em Ciências Sociais, por exemplo, 76,8% cursaram mestrado na área. Na segunda parte apresentamos a sequência deste último grupo de mestres: 86,1% permaneceu na disciplina para o doutorado.
O os dados nos mostram é que, entre aqueles que cursam Ciências Sociais em um nível educacional, manter-se na área no próximo não é uma escolha automática, apesar dessa proporção aumentar entre a graduação e o mestrado. Esse seria mais um dos indicadores da fluidez da área e das dificuldades de consolidação de uma identidade profissional que seja consistentemente sociológica.
Mas esse quadro – uma tentativa de reconstruir caminhos alternativos de profissionalização merece mais atenção, pois mostra que, na verdade, considerando-se as Ciências Sociais de forma geral e não apenas a sociologia, o percurso típico do cientista social pode ser desenhado a partir daqui. Seria um profissional graduado em Ciências Sociais (três quartos deles), seguindo o mestrado (76,8%) e o doutorado (81,5%) na mesma área. Além dessa trajetória típica de formação, o mestrado parece funcionar como um catalisador de vocações para a área, fortalecendo mais ainda a proporção dos que completam o doutorado nas Ciências Sociais.
É importante perceber que esses dados referem-se aos sócios da SBS e configuram um perfil fortemente acadêmico, correspondente a um dos três sub-ramos profissionais analisados por Freidson (1998 e 2001). Essa trajetória pode ser bastante diferenciada se considerarmos os dois outros, técnico e administrativo gerencial. Também o crescimento da demanda por professores no ensino médio pode definir outros padrões de formação e carreira.
Nossos dados apontam que, proporcionalmente, no grupo de cientistas sociais profissionais, ter cursado ou estar cursando outra graduação ocorre com o dobro da frequência do que na amostra de membros da SBS (separados aqui apenas os formados em Ciências Sociais), seja como complemento da formação ou como estratégia de inserção no mercado de trabalho. Em ambos os casos, Direito é o curso mais frequentado pelos cientistas sociais/sociólogos.
Como consequência da maior proporção de dupla graduação, os cientistas sociais profissionais avançam menos na obtenção de titulação educacional de cunho acadêmico (como mestrado e doutorado) quase 20% da amostra não cursou qualquer tipo de pós-graduações. Por outro lado, visto que este grupo inclui também o subgrupo dos acadêmicos, encontramos também uma alta proporção de doutores (ou alunos de doutorado).
Enquanto 95,5% dos membros da SBS cursaram ou cursavam mestrado, no grupo de cientistas sociais formados em São Paulo essa proporção alcança apenas 63,5%, principalmente – e aqui encontramos uma informação significativa porque condizente com a diferença de perfil entre as duas amostras – a área de mestrado mais mencionada foi Antropologia. No caso do doutorado, anteriormente vimos que 77,4% dos membros da SBS cursaram ou cursavam uma formação nesse nível e, entre os cientistas sociais profissionais, encontramos 42,9%. As principais áreas estão dispostas na tabela 5.
Os sociólogos participantes da SBS são majoritariamente professores universitários, como vemos na tabela 6. Mas esse primeiro quadro descritivo da principal atividade dos sociólogos já indica uma imensa diversidade de entradas distintas no mercado de trabalho e que possivelmente configura trajetórias distintas para esses profissionais. Aparecem inúmeras e diferentes posições na ocupação, indicando um campo de trabalho pouco conhecido para quem restringe suas atividades ao mundo acadêmico.
Antes de passarmos para os objetos, extremamente importante já que se trata de um conjunto de sociólogos com atuação acadêmica predominante, vejamos mais sobre os sujeitos, ao analisarmos as principais características apresentadas até aqui segundo a posição profissional.
Temos na tabela 7 uma síntese das características do profissional sociólogo, sócio da SBS. Se não temos clareza quanto à representatividade dos dados no plano nacional, principalmente devido à expansão e diversificação recente das atividades dos sociólogos, podemos desenhar um perfil razoavelmente seguro dos profissionais acadêmicos.
Assim, professores e, mais ainda, pesquisadores, são mulheres com aproximadamente 50 anos, majoritariamente formadas em Ciências Sociais e com doutorado na mesma área. Um detalhe que pode ser interessante é que há mais brancos entre os pesquisadores do que entre os professores. A renda média nos dois grupos é quase idêntica e são formados nas seis instituições mais antigas no país.
Um outro grupo se desenha com os profissionais do sub-ramo administrativo gerencial, que são os gestores de instituições públicas e privadas. As mulheres formam uma maioria mais forte, são ligeiramente mais jovens e – um dado de destaque – são muito pouco presentes na região Sudeste, ao contrário dos demais grupos. Sua renda média é mais elevada e a renda máxima declarada é bastante superior aos demais.
Sobre os estudantes, o fato notável é que eles provêm, em maiores proporções, de outros cursos de graduação que não o de Ciências Sociais.
Quanto à relação com o ensino, chamam a atenção os profissionais que trabalham no ensino médio. Apesar de sua pequena presença numérica na SBS (apenas 12 casos em nosso survey), pode-se supor, devido à reintrodução da Sociologia no Ensino Médio, o seu crescimento como alternativa de profissionalização. Por outro lado, verifica-se que são sociólogos com rendimentos bem mais baixos que a média da categoria e (um dado que talvez explique isso) apenas dois terços deles estão cursando ou já completaram o seu doutoramento.
Já na amostra de cientistas sociais formados em SP encontramos (tal como o esperado) menor concentração de respostas na categoria de professor universitário e maior pulverização entre outras atividades no mercado de trabalho. Destacados estão os funcionários públicos e os pesquisadores (em qualquer setor). Este retrato da inserção profissional dos graduados em Ciências Sociais, apesar de limitado em sua abrangência geográfica, explicita a limitação – e o potencial – de uma associação vista como acadêmica. Mais da metade dos graduados em SP – onde se pode supor também uma inclinação mais acadêmica dos formados do que em outras partes do país – não trabalha em atividades relacionadas com o ensino superior (número que tende a crescer) e muitos estão em atividade técnica em empresas privadas (além dos professores).
Como se pode perceber pela tabela 8, encontramos dados que apontam que tanto o setor privado quanto o terceiro setor estão sub-representados na amostra da SBS. O setor público foi citado por aproximadamente dois terços (64%) dos cientistas sociais graduados em São Paulo como aquele da sua atividade principal. Apenas 8,8% deles declaram trabalhar no terceiro setor (por exemplo, ONGs) e 27,2% têm atividades no setor privado.
A comparação entre grupos, de acordo com a atividade principal, na tabela 9, mostra que os professores universitários são nossos profissionais mais bem pagos. Chama a atenção que 58,7% destes estão em universidades públicas, contra 81,6% dos professores de ensino superior da amostra da SBS. O grupo “demais atividades” (inclui técnicos especializados no setor privado e em instituições sem fins lucrativos e consultores), realizado quase que integralmente fora do setor público, é particularmente interessante: inclinado à maior participação de mulheres e não-brancos, tem a segunda maior renda média entre os respondentes.
Uma leitura interessante da perspectiva dos sociólogos membros da SBS sobre o próprio trabalho pode ser dada pelas respostas à questão fechada em que se pedia que classificassem sua atividade principal. A maior parte dos respondentes foi capaz de estabelecer essa classificação, definindo-se majoritariamente como professores (70,7%), mas com algum espaço para as atividades de pesquisador (13,9%). No entanto, chama a atenção o fato de que 7,5% dos respondentes não conseguiram “encaixar” sua atividade nas alternativas oferecidas. Será que não seriam capazes de perceber que um sociólogo que trabalha como consultor poderia estar, em grande medida, fazendo pesquisa?
Outra informação que abre caminhos para reflexão, ainda mais se consideramos que o setor privado de ensino superior cresce enormemente nos últimos anos: trata-se do quase absoluto predomínio do emprego no setor público (78,9%), sendo a maior surpresa o reduzido número de profissionais no terceiro setor (2,6%). Como consequência do perfil acadêmico inerente ao tipo de associação à SBS, não se consegue atrair com a mesma intensidade aqueles mestres em Ciências Sociais em atividade fora do meio universitário público.
Por outro lado, é muito interessante verificar que existe um contingente significativo de sociólogos, sócios da SBS, cuja atividade não está relacionada ao ensino em qualquer nível. São quase 10% dos profissionais que responderam ao questionário e que têm atividades extremamente diversificadas sem relação com o ensino, reforçando a impressão dada na tabela acima sobre o mercado para o trabalho do sociólogo.
Mesmo assim, o associado típico da SBS é um profissional da academia, envolvido principalmente com atividades de ensino e alguma pesquisa. A diversidade de posições alternativas no mercado de trabalho seria um indicador de mudanças nesse padrão e que provavelmente precisará ser mais pesquisado.
Indo além dessa análise da posição dominante no mercado de trabalho entre os associados da SBS, procuraremos a seguir compreender os meandros da divisão propriamente técnica do trabalho sociológico. O primeiro dado interessante é que apenas uma parcela (76,8%) dos sociólogos considera seu trabalho como tendo um caráter eminentemente sociológico. Por outro lado, há uma afirmação da especialização temática, sendo que apenas 14% dos respondentes dizem não ter um tema específico de trabalho.
Uma boa pergunta nesse quadro seria o quanto essa especialização temática não descaracteriza o trabalho sociológico, produzindo um especialista sobre o tema X, e não um profissional capaz de analisar vários temas sob uma ótica específica, utilizando conceitos, métodos e técnicas característicos de um determinado campo científico. Pergunta-se aqui se não seria uma espécie de domínio do sujeito pelo objeto e que poderia ser vista como a entrada de uma nova perspectiva – multi, inter, pluri ou transdisciplinar – que modificaria a divisão técnica do trabalho tradicionalmente associada à disciplina.
Constituindo principalmente o sub-ramo acadêmico da profissão dos sociólogos (segundo Freidson, aquele setor da profissão que seria encarregado da produção e do avanço do conhecimento na área), os membros da SBS apresentam indicadores de produtividade acadêmica naturalmente sobrevalorizados frente ao conjunto de todos os sociólogos. Na sequência, veremos detalhes sobre essa produção e, mais adiante, sobre as temáticas abordadas.
Quase 80% dos membros da SBS publicaram artigos em periódicos nacionais nos últimos dez anos e mais de um quarto deles publicaram artigos em periódicos internacionais. Adicionalmente, foi possível tabular as indicações de três artigos e identificar os periódicos (inviável nos casos em que o respondente apenas citou o título do artigo). Com essa estratégia, conseguimos identificar 525 artigos (sendo que a maioria dos membros com este tipo de publicação – 52,8% – indicou pelo menos três) publicados em mais de 200 periódicos nacionais e os mais citados constam na tabela 12. O perfil de publicação mostra uma ativa e impactante participação dos membros na ciência nacional e um grupo restrito com inserção internacional.
É interessante notar que essa lista corresponde quase que exatamente aos periódicos melhor qualificados no indicador da CAPES, o QUALIS.
Já entre os periódicos internacionais citados no período, prevalecem os jornais europeus, sendo bem restrita a publicação em revistas norte-americanas. A atual política de forte incentivo à publicação internacional pode ajudar a abrir mais fortemente ao mundo acadêmico de todos os países a produção brasileira, que permanece muito local, como nos mostram esses dados.
Assim como os artigos, os livros e capítulos de livros são voltados muito fortemente para o mercado local. No entanto, neste item há maior participação dos sociólogos da SBS, sendo significativa a produção de capítulos em livros acadêmicos no exterior por mais que um quarto dos respondentes.
Essas informações sobre as apresentações de trabalhos em congressos e seminários parecem indicar ao menos duas tendências. Primeiro: a forte presença dos colegas nos seminários da SBS. Se isso se explica pelas políticas mais restritivas desenvolvidas pela ANPOCS, talvez possa indicar também que a dinâmica da produção científica na sociologia brasileira tenha se transferido para a SBS, onde se atinge um público mais amplo e tem-se, muitas vezes, maior amplitude de temáticas propriamente sociológicas.
Por outro lado, quando se verifica que mais que dois terços dos sociólogos da SBS apresentaram trabalhos em eventos internacionais, acende-se algum otimismo com relação às possibilidades de internacionalização da sociologia brasileira, uma vez que ao apresentar trabalhos as pessoas se expõem a um ambiente internacionalizado e suas apresentações podem se converter em publicações no exterior.
Nem todos os profissionais, dos 86% que responderam sim à pergunta sobre a existência uma temática substantiva predominante em seu trabalho, indicaram quais seriam estas temáticas. Ainda assim, é possível construir um quadro riquíssimo da produção brasileira, onde dominam as temáticas clássicas, mas existe espaço para as novas formas e temas de pesquisa sociológica. E importante indicar que as respostas estão apresentadas aqui exatamente como foram definidas pelos respondentes, com uma agregação mínima para análise.
Se alguns temas indicam claramente uma orientação docente para definição da pesquisa (Introdução à sociologia ou Ensino de sociologia), o fato de que desenvolvamos estudos teóricos (Teoria sociológica) ou ligados à sociologia da ciência podem ser indicadores de maioridade da nossa sociologia, que deixaria apenas de produzir exemplos para se aventurar na produção intelectual propriamente dita (Reis 1991). Também o fortalecimento da Sociologia jurídica parece indicar o retorno a uma parceria clássica da ciência social brasileira: os nossos grandes cientistas sociais, de Oliveira Vianna a Raymundo Faoro, e tantos outros, eram todos juristas de origem. Entretanto, esta Sociologia jurídica pode também estar associada não à pesquisa propriamente dita, mas à necessidade de publicação daqueles que ministram cursos acessórios de Sociologia para faculdades de Direito em instituições públicas e, principalmente, privadas.
Esse conjunto de dados permite colocar uma questão importante apresentada no início desse artigo: haveria mesmo um domínio da especificidade irrelevante e de uma perspectiva culturalista e pouco analítica? Os dados nos permitem afirmar, com certeza, que não. Os sociólogos brasileiros fazem pesquisas sobre os temas sociológicos clássicos e problemas sociais relevantes. Eles estudam a cidadania e o estado, as formas do trabalho, as desigualdades sociais, a violência, a religião.
Considerando o que foi visto anteriormente sobre as dificuldades de internacionalização das publicações e mesmo sobre o número restrito de artigos científicos publicados, podemos aventar a hipótese de que o conhecimento sociológico seja pouco e mal divulgado. Enquanto os economistas criam classes sociais a cada mudança no índice de Gini, os sociólogos precisam de (e fazem) estudos mais profundos e abrangentes para falar de um novo grupo social. E a mídia não tem muito tempo para esperar. Enquanto os antropólogos nos presenteiam com maravilhosos casos únicos ou interessantíssimos detalhes e noções sobre a vida privada, os sociólogos precisam construir tabelas chatas em que se evidenciam regularidades pouco charmosas das desigualdades sociais.
E isso não ocorre apenas na mídia, mas também na capacidade dos sociólogos para atrair bons alunos, no ensino de uma disciplina que exige rigor e paciência, conceitos bem trabalhados e metodologias complexas. Tildo isso dificulta a divulgação e expansão da sociologia, mesmo entre os cientistas sociais.
Os dados apresentados a seguir são apenas uma amostra das questões que serão tratadas em outro artigo sobre os valores sociais vigentes entre os sociólogos. Parte essencial da identidade profissional do grupo, as informações aqui presentes serão usadas apenas para ajudar a compreender o sentido dado ao trabalho acadêmico e a sua importância na dinâmica da ocupação. Caracterizar essas percepções dos sociólogos é outro desafio que se coloca a partir dos dados das pesquisas da SBS e de Braga, que recobrem a temática.
Fazendo isso de maneira ainda muito exploratória e sem introduzir pesos ou associações das notas atribuídas com as posições de trabalho dos sociólogos, a Tabela 17 apresenta apenas a nota média atribuída pelos respondentes da SBS a cada tipo de atividade possível aberta aos cientistas sociais.
Note-se que o que é considerado mais prestigiado é o político. O professor universitário vem apenas em quarto lugar! E, reconhecidamente, quem tem menos prestígio é o entrevistador, coletor de dados. Aqui entramos nas hierarquias internas à profissão. Esses extremos colocam pelo menos duas questões: se o mais apreciado dos sociólogos é aquele que exerce atividades políticas (efeito Fernando Henrique Cardoso?), é razoável indagar sobre a noção de posição social utilizada pelos profissionais entrevistados. Como o segundo e o terceiro lugar foram ocupados pelos empresários e donos de empresas de opinião pública (uma duplicidade intencional para verificação de consistência), reforça-se a ideia de uma certa subordinação da visão dos sociólogos ao senso comum. Mais que valorizar a produção científica e acadêmica, o que poderia evidenciar uma autonomia de julgamento quanto ao funcionamento do próprio grupo, prestigia-se a atuação fora do espaço acadêmico. Além disso, os profissionais que, principalmente dentro das empresas, fazem a pesquisa empírica trabalhando como entrevistadores são muito desprestigiados e aqueles que trabalham como analistas de dados e pesquisadores em empresas não ficam em situação melhor. Aparentemente, os sociólogos não dão grande valor à pesquisa empírica, pensando sempre na pesquisa acadêmica como uma reflexão ou como trabalho intelectual que não “põe a mão na massa”. Ou quem sabe a pesquisa acadêmica seria base de um trabalho político? A não ser que se considere que as respostas avaliam não a importância efetiva do trabalho para o desenvolvimento do grupo profissional, mas que elas refletem apenas a avaliação feita externamente ao grupo pela sociedade. Cabe perguntar, como nos estudos clássicos sobre prestígio, qual é a base da sua definição do sucesso segundo esses profissionais: sucesso no mercado ou maior expertise profissional?
O quadro traçado a partir desses dados é bem mais otimista que as questões que originaram o estudo, mesmo considerando que problemas importantes também foram desenhados. A profissão dos sociólogos ou das sociólogas (elas têm uma ligeira maioria) vista de sua associação é um conjunto de profissionais maduros, brancos em sua imensa maioria, distribuídos por todo o país e relativamente estável em seu recrutamento.
A expansão geral do ensino superior dos últimos dez anos favoreceu as Ciências Sociais, mas talvez a diversificação coloque alguns problemas. E o caso das dificuldades do grupo em lidar com os professores do Ensino Médio, formados especialmente nas novas licenciaturas oferecidas em Ciências Sociais.
Essa questão tende a se tornar mais expressiva quando vista como parte dos processos de democratização do ensino superior. Nossos dados, assim como pesquisas anteriores, mostram que a trajetória dos cientistas sociais é um caminho importante de mobilidade social ascendente através da escolarização. As informações sobre os pais dos profissionais da área, em que encontramos inclusive analfabetos com filhos doutores, ou a crescente presença de negros e pobres entre os alunos são indicadores da maior igualdade relativa de oportunidades e da abertura dos cursos de Ciências Sociais. A pergunta que não conseguimos trabalhar com dados neste artigo é: serão estes os que ocuparão as posições mais desvalorizadas da profissão?
Como profissionais, os sociólogos trabalham com toda a gama clássica de problemas e temas sociológicos. Verifica-se não apenas a diversidade temática como também a busca de inovação, acompanhando os avanços da ciência no plano internacional. No entanto, e talvez esteja aqui a razão de uma das questões colocadas inicialmente, se temos qualidade na produção científica ainda, carecemos de melhor e maior divulgação, faltando maior quantidade e qualidade de publicações e, sobretudo, maior internacionalização.
O sociólogo “ideal típico” parece aproximar-se fortemente do modelo do intelectual clássico: a atividade política é a mais prestigiada e o trabalho acadêmico aparece em seguida. Uma das razões, além dessa classificação explicitamente construída pelos colegas, que faz reforçar a ideia do sociólogo não como um técnico, mas como intelectual, é a desvalorização das atividades como entrevistar ou analisar dados, bases essenciais da pesquisa empírica propriamente dita. A pesquisa acadêmica, constituinte essencial da identidade do grupo analisado, tem outra posição, outro valor. Ela é mais um trabalho intelectual e político do que esforço científico e analítico.
Faixas de renda dos respondentes (em RS)