Servicios
Descargas
Buscar
Idiomas
P. Completa
Interpretações sobre o messianismo
Dora Vianna Vasconcellos
Dora Vianna Vasconcellos
Interpretações sobre o messianismo
Estudos Sociedade e Agricultura, vol. 26, núm. 1, pp. 172-198, 2018
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: : (Interpretações sobre o messianismo). O artigo se dedica ao tema do messianismo com a preocupação de lhe determinar a função que cumpre. Para tanto, se remete à teoria sociológica para saber se os movimentos messiânicos são revolucionários ou reformistas. Tal discussão reascende o debate sobre o pretenso caráter utópico dos movimentos messiânicos e sua natureza pré-política. A intenção é mostrar como este questionamento marcou direta ou indiretamente boa parte da literatura sociológica brasileira dedicada ao tema.

Palavras-chave:messianismomessianismo,teoria socialteoria social,pensamento social brasileiropensamento social brasileiro.

Abstract: : (Interpretations on messianism). This article approaches the theme of messianism with a concern for the determination of its function. For this reason we refer to sociological theory to know if messianic movements are revolutionary or reformist. The controversy reignites the debate about their pretense at a utopic character and their pre-political nature. The intention is to show that this controversy directly or indirectly marked a substantial part of Brazilian sociological literature dedicated to the theme.

Keywords: messianism, social theory, Brazilian social thought.

Carátula del artículo

Artigos

Interpretações sobre o messianismo

Dora Vianna Vasconcellos
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Brasil
Estudos Sociedade e Agricultura, vol. 26, núm. 1, pp. 172-198, 2018
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Recepción: 01 Enero 2018

Aprobación: 15 Enero 2018

Messianismo no Brasil

Ao pesquisador que se dedique a estudar os movimentos messiânicos brasileiros, com a preocupação de lhes determinar a função social que cumprem, é necessário fazer menção à teoria sociológica para averiguar se estes movimentos obedecem a um intuito revolucionário ou reformista por serem movidos pela crença na possibilidade da instalação de um paraíso terrestre. Tal discussão reacende o debate sobre o seu suposto caráter utópico e sua natureza pré-política. É que subjacente à ideia de revolução está na teoria sociológica a noção de utopia. Daí ser esta a indagação que orientou também os estudos sobre o messianismo no Brasil: teriam tido as comunidades messiânicas um caráter excessivamente utópico-revolucionário, e por isso a facilidade com que foram enquadradas pela sociedade brasileira, indo a reboque das circunstâncias políticas por não se aterem ao possível, mas ao impossível? Ou, ao contrário, foram manifestações reformistas que visavam aprofundar a institucionalidade capitalista por meio da crítica ao latifúndio improdutivo, embora não estivessem alicerçadas numa ideologia comunista moderna?

A referência à sociologia de orientação mais generalizante permite que se veja o messianismo sob novos termos, desde que se relativize o pressuposto marxista que condena toda manifestação utópica como falsa consciência. A desconsideração desse axioma permite que se veja que, por traz desta interpretação, existe uma opção política subjacente: a preferência pelo reformismo ou pelo socialismo de reformas capitalistas. Vale dizer que tal opção marcou o pensamento social brasileiro, unindo ideologias opostas como o liberalismo e o comunismo (FRANK, 1973). Não à toa, o capitalismo ter sido visto como uma realidade inexorável pelo Partido Comunista Brasileiro, para quem o socialismo viria apenas gradualmente e a longo prazo, após a total reificação do mundo. Entre os publicistas pecebistas mais progressistas (SANTOS, 2007), previu-se uma saída para a questão agrária brasileira à moda farmer, embora tenhamos acabado por trilhar uma via junker de desenvolvimento. O golpe de 1964 veio mostrar que a luta pela terra, quando dirigida apenas contra o latifúndio improdutivo, permite que os setores burgueses se aliem aos latifundiários, modernizando a agropecuária sem a necessidade de realização de uma política de reforma agrária, inibindo até mesmo a opção pela via farmer de desenvolvimento. Há que se lembrar da ligação intrínseca que possui o capitalismo com regimes políticos autoritários, sendo a questão social, sempre que possível, escamoteada para haver maior desenvolvimento das forças produtivas.

O marxismo leninista propagado pelo Partido Comunista Brasileiro orientou que as aspirações messiânicas revolucionárias reduzissem seus anseios igualitaristas na luta contra o latifúndio improdutivo, para que os movimentos campesinos se tornassem consequentes politicamente. Ao adotar uma orientação reformista, os camponeses poderiam incidir efetivamente sobre as circunstâncias sociais, atuando de maneira mais eficaz ao concretizar uma democracia capitalista no campo. Boa parte da literatura marxista aderiu a este posicionamento, condenando o conteúdo revolucionário no messianismo como um desejo utópico que levava necessariamente ao conservadorismo.

Mesmo a ala mais progressista do PCB preferiu pensar a questão campesina por meio do axioma reformista, priorizando uma política de frente ampla que levava em consideração o máximo de consciência possível, para usarmos a categoria de Lucien Goldmann (GOLDMANN, 1978). Ou seja, que dá representatividade aos anseios do proletariado sem perder de vista os interesses das demais classes sociais. Daí a ideia de que era possível a união entre o proletariado e a burguesia contra o latifúndio para dar consequência a uma transformação democrático-burguesa de caráter antifeudal e anti-imperialista. A ala dissidente do PCB, mais adepta ainda ao liberalismo, preferiu o que chamou de “marxismo mais adequado às circunstâncias brasileiras” ao antever uma revolução brasileira concentrada apenas na melhoria das condições de emprego e salário no campo, apostando num take of capitalista por meio do aumento das taxas de consumo. A ala dissidente do PCB deixava de lado a bandeira da reforma agrária e a crítica ao latifúndio apostando na racionalização das grandes empresas rurais, preferindo uma ida à modernidade pelo alto2.

Para que se entenda a função social que cumprem os movimentos messiânicos brasileiros de uma maneira não reformista, há que se superar alguns dos axiomas da teoria marxista de cunho mais ocidental que nega haver um conteúdo político no igualitarismo revolucionário campesino, mas também mostrar os equívocos cometidos pela tradição intelectual brasileira filiada ao funcionalismo durkheimiano que inaugurou uma nova vertente interpretativa ao compreender o messianismo por meio da análise da dinâmica social, descrevendo-o como um reformismo de novo tipo.

Esta vertente interpretativa ganhou relevância no Brasil com os estudos de Roger Bastide, estudioso que se destacou no cenário intelectual brasileiro ao divergir da tradição ensaística por considerar que o animismo-fetichista no Brasil não redundava em movimentos messiânicos (BASTIDE, 1958). Para Bastide, o animismo-fetichista apenas apresentaria um conteúdo revolucionário, fazendo eclodir a crença messiânica, em uma situação de crise colonial típica. Não seria este o caso da sociedade brasileira, em que os vínculos de dependência foram mitigados pelo patriarcalismo. Por esta razão, não houve um messianismo revolucionário no país.

Maria Isaura Pereira de Queiroz deu continuidade a esta vertente interpretativa com a interpretação de que o messianismo pode cumprir uma função conservadora-reformista, como é o caso dos movimentos messiânicos brasileiros (QUEIROZ, 1976). E lança uma nova explicação para o fenômeno, considerando-o como uma decorrência dos laços de compadrio e de aliança que se estendem de alto a baixo de nossa estrutura social, inaugurando uma solidariedade vertical que une atores hierarquicamente desiguais. Os surtos de messianismos seriam então uma resposta à crise endêmica que assolava o meio rural, trazida com a disseminação de vínculos impessoais que estavam provocando o solapamento do ideal de reciprocidade presente nos antigos laços de dependência pessoal. Movendo-se pelo ideal de querer salvaguardar a barganha política que era inerente aos tradicionais laços de compadrio, os movimentos messiânicos brasileiros seriam conservadores, conquanto cumprissem uma função social reformista ao garantirem uma bilateralidade nas relações de mando.

Deste modo, é curioso notar que também a tradição intelectual inaugurada por Roger Bastide e Maria Isaura preferiu a interpretação de que estes seriam conservadores-reformistas. Subjacente a esta interpretação, estava a ideia de que a orientação comunista-igualitarista levaria os camponeses a não participarem da sociedade mercantil, suscitando a decadência de sua cultura e a sua exclusão do jogo político. De modo análogo à literatura marxista de matiz ocidental, Bastide e Queiroz sustentaram a tese de que o messianismo revolucionário era pouco adequado às circunstâncias, uma vez que impedia a adaptação campesina aos preceitos burgueses, o que na visão destes autores era um retrocesso político.

Daí a relevância de se resgatar criticamente os axiomas trazidos da teoria sociológica para que se desfaça o consenso criado no pensamento social brasileiro em torno da razão reformista. A discussão travado no âmbito do marxismo ocidental entre Georg Lukács e Ernest Bloch ajuda a evidenciar os equívocos da interpretação que considera o messianismo igualitarista-revolucionário como um desejo utópico. Por sua vez, as ideias anticolonialistas de Georges Balandier referidas ao terceiro mundo ajudam a mostrar os erros trazidos da teoria funcionalista que considerou o messianismo como propagador de um reformismo de novo tipo, que é reflexo da dinâmica social. Deste modo, é com o intuito de questionar a razão reformista que se fará menção a estes autores.

Messianismo e utopia

Numa releitura interessante sobre messianismo, Michael Lowy apresenta a importante hipótese de que estes movimentos veiculam uma crítica romântica contra a sociedade capitalista moderna em nome de valores pré-modernos ou pré-capitalistas (LOWY, 2012). Portadores de um novo socialismo que faz resistência à submissão desesperada dos indivíduos aos mecanismos sociais, os movimentos messiânicos lutam contra a “substituição dos esforços heroicos e revolucionários pela deplorável marcha do progresso” ou contra a marcha a passos de caranguejos da evolução. E contrapõem-se à informe tendência progressista com sua concepção linear de tempo, ou à razão histórica ocidental, impondo o instante revolucionário como momento decisivo. Por acreditar na possibilidade de irrupção do instante revolucionário, a crença messiânica no reino dos céus proporia a total redenção do mundo no instante-agora. Ao adiantar o porvir insurgindo-se contra a ideia que inscreve o fim ideal no curso do tempo infinito, os movimentos messiânicos acreditariam que não há nenhum momento que não carregue consigo uma chance de revolução. Afinal, cada instante poderia provocar a chegada dos tempos messiânicos. Deste modo, o messianismo direcionaria uma crítica à ideia de progresso na história. Apesar de se pautarem em valores pré-modernos e pré-capitalistas, a desconstrução da ideologia do progresso pela crença messiânica não seria feita em nome da conservação ou da restauração, mas da revolução.

Michael Lowy cita Walter Benjamin como um dos pensadores marxistas que mais se preocupou em dar um corpo teórico para os anseios messiânicos ao não se limitar a fazer uma análise das relações do presente, por levar em conta a totalidade, insurgindo-se contra a tradução cultural e política do Ocidente (LOWY, 2002). Há que se perguntar se a crítica à razão histórica do Ocidente é um traço característico de todo teórico que enxerga virtualidades progressistas na crença messiânica do instante revolucionário ou, ao contrário, haveria aqueles autores que, a despeito de fazerem críticas ao pensamento político ocidental, não chegam de todo a romper com o etapismo histórico ocidental, por reduzirem o instante-agora a um agir “revolucionário” que concretiza reformas capitalistas.

Por que não lembrar de Ernest Bloch, autor que se perguntou se as prédicas messiânicas descrevem as possibilidades abertas por um determinado contexto como objetivações dele, ou, ao contrário, elegem como referência o sujeito messiânico, as manifestações do utópico e da transcendência? (BLOCH, 1973)

Bloch escolheria a segunda opção, por considerar que os movimentos messiânicos não nascem do mal-entendido da vida, mas se relacionam com a tendência apocalíptica do sujeito, com os símbolos da parusia, sendo manifestações de uma utopia concreta. Ao se recusar a aceitar o pensamento marxista que se centraliza na objetivação, Bloch acaba por ver a vida como mais ampla do que os destinos que são oferecidas por ela no presente. Ao mesmo tempo desacreditaria a ideia que enxerga a utopia como uma fuga do mundo, da atualidade, por crer na possibilidade de haver um ser autêntico que reconstrói as misérias do mundo, mas as ultrapassa através do utópico (MUNSTER, 1997).

Será que Bloch se oporia inclusive à concepção de revolução social inspirada pelo Ocidente que atrela a ideia do instante revolucionário ao ideal de revolução democrático-burguesa inspirado pelo Ocidente, por acreditar que a conscientização do proletariado está associada às positividades trazidas pelos direitos e liberdades burguesas? Há que se perguntar se o pensamento de Bolch de fato propõe uma reaproximação com as tendências progressivas da mística e nega que o radicalismo é uma doença infantil do comunismo. Teria a mística o levado a superar a unilateralidade da perspectiva evolucionária do marxismo-leninismo que, ao atribuir virtualidades políticas positivas na democracia burguesa, se veicula necessariamente à servidão e ao imperialismo por negar a possibilidade de se saltar uma etapa histórica?

Bloch é comumente considerado um autor que vai na contracorrente das ortodoxias marxistas que veem no utópico a marca infamante do idealismo e condenam qualquer esforço de ir além do status quo como uma inconsequência política. Vendo uma função progressista na utopia, ainda que reconheça que em alguns casos ela pode cumprir uma função social conservadora, Bloch recusaria a ideia que a vê como um produto da imaginação, por considerá-la uma visão global do desenvolvimento histórico que manifesta nos homens a necessidade de não se esgotar no real imediato. A utopia lhes indicaria, por meio das possibilidades possíveis, uma maneira de ir além do real. Por esta razão, o pensamento de Bloch seria representante de uma utopia concreta que não prescinde totalmente da práxis, embora seja uma crítica prospectiva do amanhã (FURTER, 1974).

A utopia concreta introduziria a exigência da radicalidade ao chamar atenção para uma realidade que é transformável e que pode dar lugar ao novo. Por esta razão, ela se distingue da utopia que propõe uma volta para trás. A utopia seria um modo de pensar que, por estar baseada numa dialética antecipadora que valora o imaginário, rompe com o ciclo de ferro do imediato. Por meio desta consideração, Bloch questiona se de fato há uma evolução histórica a ser seguida, negando a ideia de que a revolução é uma consequência inevitável de um processo linear irreversível.

Resta saber se para ele a revolução seria apenas a continuação de uma evolução já começada ou se seria algo que abole o passado para começar tudo de novo. Será que o ponto de vista de Bloch vai de encontro à teoria de Georges Gurvitch, autor que também direcionou uma crítica ao marxismo, mas para situar a revolução a meio de caminho, entre a revolução propriamente dita e a contrarrevolução (GURVITCH, 1968)? Se este for o caso, Bolch cairia na mesma armadilha dos marxistas-leninistas que concebem a revolução como uma evolução, uma atualização de algo já existente. Ou será que sua teoria aponta para a possibilidade de se ir direto para o socialismo, por fundar uma ideia de revolução assentada numa dialética da antecipação? Tem quem acentue essa possibilidade ao considerar que o pensamento de Ernest Bloch vai de encontro à prática política e social revolucionária da América-Latina. Se for este o caso, Bloch seria representante de um messianismo secularizado e ateu que reatualiza as utopias tradicionais que mobilizam o sonho de uma sociedade idealizada, transformando-as em uma filosofia da práxis (MUNTER, 1993). Há que se indagar se Bloch de fato guarda das utopias tradicionais o que há nelas de mais valioso: a crítica que fazem ao direito de propriedade privada (MORUS, 1979). Ou seja, é necessário indagar se Bloch associa o milenarismo à crença campesina da democracia igualitarista. E se, contrariamente ao que supõe o marxismo-leninismo, ele nega a ideia que afirma que o que move os camponeses é a nostalgia da economia parcelaria, o anseio por uma divisão de terras que consolida o capitalismo pela pequena propriedade.

Vale dizer que o campesinato rompe com essas ideias românticas, superando-as, ao antecipar um ideal de sociedade comunista igualitária no messianismo. Daí sua tendência de querer saltar por estágios intermediários do desenvolvimento econômico expressa na crença de um paraíso terrestre. Isto é, o instante revolucionário se abriria para o campesinato mesmo quando as condições sociais não estão maduras do ponto de vista econômico. Deste modo, é mister considerar se a obra de Bloch é de fato representante do anseio coletivista da economia, uma crítica ao capitalismo a favor do coletivismo agrário camponês.

Há quem diga que Ernest Bloch, diferentemente do marxismo ortodoxo, não baseia o conceito de práxis revolucionária e transformadora exclusivamente na crítica materialista da economia política, mas sim em uma crítica dialética das relações entre base e superestrutura. Diante disso, cabe a pergunta: Por meio de sua teoria da consciência antecipadora, cujo conceito-chave é a antecipação das imagens utópicas, Bloch realmente contrariaria a visão evolucionista e “etapista” do marxismo ocidental3? Ou será que a teoria de Bloch se livraria do dilema de ficar entre a tradição mística e a tradição racionalista da modernidade conjugando os elementos das duas tradições, tal como fizera Georg Lukács? Ao que tudo indica, a obra de Bloch conjuga os ideais de fraternidade e igualdade sintetizados pela Revolução Francesa como os objetivos de uma revolução socialista, abrindo margem para esta dúvida (MUNSTER, op. cit.). Lukács, seu contemporâneo, defendeu uma ancoragem da teoria e da ação revolucionária no processo histórico, uma vez que para ele o sujeito da produção histórica apenas tornava-se consciente de si na imanência do ser social. Ou seja, a exemplo de Bloch, Luckács subtrai da utopia a sua força de antecipação tal como fizera o marxismo ocidental. Esse excessivo sociologismo de Lukács, que é decorrente do modo como ele concebe a relação sujeito-objeto, parece ser também fundante “utopismo” de Ernest Bloch.4

Bloch endossa a teoria do fetichismo da mercadoria de Marx e a teoria da reificação de Lukács, mas inova a concepção de tempo histórico na análise marxiana do desenvolvimento desigual e combinado ao chamar atenção para as formas arcaicas de consciência originadas num tempo histórico que não é contemporâneo, mas que convive simultaneamente com este (MACHADO, 1988). Ao estudar as revoltas camponesas, Bloch as classifica como movidas por um ideal comunista revolucionário quiliástico que tem como base as concepções igualitárias herdadas do cristianismo primitivo (BLOCH, 1973). Ou seja, estas seriam revoltas que defendem o ideal comunista igualitarista de que todos os bens fossem comuns, e que cada qual os recebesse segundo suas necessidades, conforme suas circunstâncias. Tudo indica que estes seriam movimentos sociais democráticos-revolucionários e não democráticos-burgueses. O messianismo não seria um pressentimento da sociedade burguesa porque, ao fazerem referência aos ensinamentos do cristianismo primitivo, recusaram o direito de propriedade.

Todavia, Bloch reatualiza o marxismo ocidental por considerar que os movimentos camponeses são imaturos para defender metas revolucionárias socialistas como a desapropriação dos meios de produção. Daí apresentar traços quixotescos que favorecem a capitulação destes movimentos diante dos latifundiários. É que, segundo ele, o comunismo agrário facilmente cede lugar ao espírito carolíngio que tem como base o frio código cavalheiresco da Idade Média que harmoniza surpreendentemente o comunismo camponês com o patriarcalismo. Isso explica a força simbólica que a história do senhor de terras imperial Carlos Magno possui junto ao campesinato, mistificação que, segundo ele, vivifica moralmente a sociedade de classes.

Para Bloch, esta completa submissão dos camponeses à ratio política ocidental anula todo escrúpulo comunista igualitário porque faz supor uma ordem hierárquica desde os tempos primeiros, deixando aberta apenas a possibilidade da liberdade burguesa.5 É assim que o paroxismo camponês submete-se à razão regida pelas classes e ao panlogismo estratificado, permitindo que a economia mercantil varra as relações econômicas primitivas do Ocidente e suplante a demanda camponesa por direitos econômicos distribuídos equitativamente.

Em função disso, Bloch acaba por afirmar que a visão camponesa da parusia e o entusiasmo carismático herdado do cristianismo primitivo, com sua ascese intramundana, manifestariam seu progressismo por formar um consenso em torno da necessidade de uma rebelião econômico-política. E deixa mais claro seu ponto de vista quando afirma que o messianismo camponês cumpre uma função social reformista democrática-burguesa, apesar de ser movido por um ideal revolucionário. Ou seja, as suas conclusões a respeito do messianismo são controversas, afinal, a despeito de reconhecer o igualitarismo revolucionário, ele considera que sua atuação na prática é reformista. A exemplo do pensamento marxista ocidental, Bloch não desvincula a mudança democrático-revolucionária da ideia da necessidade de uma transição democrático-burguesa. Em função disso, desacredita na possibilidade de ocorrer uma passagem direta para o socialismo. Se de fato tivesse acreditado no ideal do salto histórico, a teoria de Bloch seria mais representativa do comunismo-igualitarista campesino.

Portanto, a teoria de Ernest Bloch não está tão distante da de Georg Lukács, autor que elaborou uma ideia de revolução por meio de valores românticos que não rompem com os valores mercantis, por ter a revolução democrático-burguesa como inevitável para que um ímpeto revolucionário proletário-camponês se concretize.

Lukács elege o proletariado como a vanguarda revolucionária que luta contra a burguesia, pelo campesinato (LUKÁCS, 1974). Não reconhece o campesinato como classe social protagonista por considerar no capitalismo o sentido revolucionário igualitarista campesino perde o sentido que tivera no feudalismo. Lukács afirma isso a despeito de reconhecer que diante dos latifundiários os camponeses continuam a atuar como classe social ativa e combativa. Ele recusa a ideia de que a base do capitalismo seja cindido em partes heterogêneas, pois considera que somente as contradições que ocorrem entre burguesia e proletariado são imanentes ao modo de produção burguês. O proletariado estaria na base do sistema capitalista justamente por ter condições objetivas de tornar as contradições burguesas conscientes. As contradições que ocorrem entre dois modos de produção distintos, como as que são levadas a cabo pelos camponeses, não seriam suficientemente dialéticas, por isso não permitem a compreensão do desenvolvimento global do capitalismo como um processo contraditório.

Para Lukács, o modo de produção camponês com suas relações sociais pré-capitalistas apresentaria desvantagens econômicas enquanto o desenvolvimento capitalista não se completa. Daí a incapacidade que possui o campesinato de conduzir o processo revolucionário. Lukács recusa portanto a potencialidade revolucionária que está presente no messianismo como uma consciência pré-política, idealista, que leva ao “reboquismo”. E aposta na crítica proletária contra a reificação do mundo, estabelecendo um paralelo com a crítica marxista-leninista.

Em Realismo crítico hoje, Lukács deixa claro o conteúdo que imprime ao

termo revolucionário quando considera que todo movimento de revolta deve sempre partir de uma avaliação consciente da realidade concreta (LUKÁCS, 1969). Segundo ele, toda desmundanização geraria apenas protestos inconsequentes, facilmente recalcados pela sociedade. Não se pode recusar o princípio de hierarquização burguês, não se pode dissolver a hierarquização social por meio da crença na possibilidade de anulação das contradições socioeconômicas porque assim se cava um abismo entre o homem e o real.

Lukács supõe existir um traço de fuga do real na convicção messiânico- espontaneísta revolucionária do campesinato. Por esta razão, ele recusa o conteúdo revolucionário presente no messianismo igualitarista camponês, por acreditar que há nele um excesso de subjetivismo que conduz necessariamente ao reboquismo, ou seja, a não incidência nas circunstâncias históricas concretas.

E aponta a consciência política que acredita ser a mais consequente: aquela que conjuga o realismo crítico burguês com o realismo socialista. A razão teórica desta junção seria de interesse fundamental e constante do movimento socialista porque somente por meio dela se produz um conhecimento objetivo dos fatos. É que para Lukács o caminho que leva ao socialismo confunde-se com a própria marcha da realidade social burguesa.6 Afirma isso em função de crer que o movimento revolucionário mais consequente é aquele que conduz devagar para o socialismo por meio de uma consciência não socialista. Lukács é contra, portanto, o radicalismo político socialista, pois acredita que no capitalismo a veiculação do indivíduo a uma classe é contingente. Em suma, o publicista defende, como Lênin, uma transição para o socialismo.

Vale dizer que em História e consciência de classe (LUKÁCS, op. cit.) o autor já apresentava este ponto de vista ao escolher fazer uma crítica ao capitalismo por meio do fenômeno da reificação. Lukács afirma a tese de que seria somente com a total separação do sujeito e do objeto provocada pela experiência histórica capitalista que uma consciência revolucionária consequente historicamente se formaria.7 Ou seja, antecipa o conteúdo marxista-leninista de seus estudos ao acreditar na possibilidade de realização de uma revolução socialista conduzida pelo proletariado, que teria como condição primeira uma longa etapa democrático-burguesa.8 Mas, assim como Lênin, Lukács acredita na possibilidade de antecipação da mudança revolucionária, caso o Partido Comunista atue consequentemente, combinando o realismo crítico burguês com o realismo socialista.

Para alguns autores, Lukács questiona a ideologia do progresso presente no marxismo ocidental, ou seja, a ideia de que o processo histórico se desenvolve necessariamente segundo uma evolução que leva mecanicamente ao próximo estágio evolutivo (LOWY, 2002). O que se argumenta é que por centralizar sua análise no fenômeno da reificação, o autor é levado a afirmar que é apenas com o desenvolvimento do capitalismo que ocorre a autonomia do fator subjetivo, ou seja, a formação do instante decisivo como uma decorrência da atuação política. Assim, em Lukács, a palavra revolução ganha um conteúdo democrático- burguês, se afastando do sentido de revolução democrático-igualitarista campesino.

Torna-se significativo que num intervalo de poucos anos, em Reboquismo e dialética, Lukács revele não acreditar na possibilidade de antecipação revolucionária socialista por considerá-la idealista enquanto as condições sociais não estão maduras para isso (LUKÁCS, 2015). Ele condena o excesso de subjetivismo na consciência do sujeito histórico que pretende romper com o curso processual da história, pois considera que esta orientação faz os agentes históricos irem a reboque dos acontecimentos.9 E acaba por afirmar que a superação econômica e política da reificação capitalista apenas se produz na experiência da luta de classes.

Deste modo, tal como Lênin, Lukács reconhece a importância do fator subjetivo, mas evita a sua aplicação num momento histórico inadequado. Ou seja, critica as concepções revolucionárias socialistas que de modo leviano dão como existente o instante decisivo mesmo que ele não esteja dado. Isto é, evita o ponto de vista que generaliza para todo o processo histórico o instante revolucionário, o papel do fator subjetivo como se ele fosse possível em qualquer tempo e sob todas as circunstâncias. E combate a teoria marxista de esquerda que crê na espontaneidade da ação revolucionária por considerá-la demasiadamente idealista.

Lukács defende a função do fator subjetivo, mas de forma dialeticamente limitada, ou seja, não acha possível mudar arbitrariamente a estrutura econômica de um país. Mas adverte para a importância do Partido Comunista saber tirar as consequências possíveis das circunstâncias dadas ao oferecer representação aos interesses mais imediatos do proletariado, isto é, aos interesses que não estão em contradição com os ideais burgueses. Critica as teorias de esquerda que superestimam a maturidade revolucionária socialista do proletariado que, em sua reiterada necessidade de nadar contra a corrente, comprovam a insustentabilidade, a essência objetiva não revolucionária de qualquer espontaneidade e sua incapacidade de interferir na situação concreta, objetiva.

Para Lukács, caberia ao Partido Comunista fazer com que o proletariado supere suas agitações espontâneas propondo uma mediação que faça referência a sua situação de classe, mas por meio de uma práxis compreendida corretamente. Para o proletariado, seria preciso relativizar a luta econômica, a dialética entre patrões e empregados e formar uma consciência que leve em consideração os interesses das demais classes, da totalidade social. Deste modo, o autor considerava fundamental que o proletariado desenvolva uma consciência não socialista.

Há que se perguntar se a adesão de alguns dos axiomas maxistas- leninista, como a ideia da necessidade de uma transição democrático- burguesa, não é a explicação para que Lukács tenha considerado o messianismo revolucionário campesino como pré-político. Portanto, mesmo no âmbito do marxismo ocidental de cunho mais revolucionário, a chance da passagem direta para o socialismo foi reconhecida somente mediante a ideia do utópico, como em Bloch e Lukács. O primeiro, por considerar o paroxismo camponês como facilmente enquadrado pela rátio política ocidental, sendo esta capitulação apontada como uma precondição para o desenvolvimento do capitalismo e o surgimento de metas proletárias revolucionárias. O segundo, por defender a irrupção do subjetivo na política de maneira dialeticamente limitada, já que a concepção messiânico-espontaneísta é tida como a explicação para a ocorrência do reboquismo. De maneira homóloga a Bloch, Lukács centraliza sua análise no fenômeno da reificação, considerando que é apenas com o desenvolvimento do capitalismo que pode ocorrer a autonomia do fator subjetivo ou da vontade política consequente. Isto é, uma vontade política que contamina o paroxismo camponês e a consciência proletária socialista com a razão burguesa, fazendo-as ter maior incidência sobre as circunstâncias reais. Ou seja, se para ambos a revolução não é uma consequência mecânica do desenvolvimento das forças produtivas, é necessariamente uma decorrência do capitalismo.

Tanto Bloch como Lukács escrevem com o intuito de possibilitar um salto histórico, mas veem o capitalismo como uma realidade inexorável. Recusam a ideia de revolução que concretiza o socialismo no instante agora por conferirem validade ao caminho reformista. Suas teorias, a despeito de serem consideradas como representativas de um marxismo revolucionário, contribuem pouco para a superação da compreensão ocidental que reduz a concepção messiânica à dimensão do utópico, sujeitando o democratismo igualitarista campesino ao democratismo burguês.

Messianismo e dinâmica social

Está presente na literatura sociológica e antropológica a ideia de que os movimentos messiânicos desempenham uma função revolucionária em países colonizados ou marcados pela dependência econômica. Todavia, esta afirmativa reproduz o erro das teorias sociológicas e antropológicas funcionalistas quando considera a crença messiânica como produto de uma dinâmica social que é reflexo das sociedades ocidentais. Segundo esta literatura, o messianismo das sociedades terceiro-mundista, embora não reproduza o evolucionismo linear das sociedades capitalistas, ainda as têm como avatares da modernização e da mudança histórica, mesmo que veiculem críticas à situação de dependência econômica. Por esta razão, a superação da dependência ainda é associada a uma modernização tecnológica que aprofunda a relação com os países ocidentais, mesmo que em novos termos. Ainda que esta forma de ver dinamista refute a visão etnocêntrica que considera as sociedades não desenvolvidas como a-históricas, não ilumina o teor revolucionário igualitarista e anti-imperialista do messianismo terceiro-mundista

Segundo esta forma de ver, o nacionalismo messiânico das sociedades terceiro-mundistas é nacionalista justamente porque almeja por uma modernização singularizada, consoante à divisão internacional do trabalho existente entre os países industrializados e agrícolas. É que a transformação dos países agrícolas em países industriais aumentaria a força de expansão e o colonialismo dos países de antiga industrialização. Por isso, o anticolonialismo dinamista questiona a tendência dos países dependentes de importar modelos de desenvolvimento mal-adaptados às suas condições peculiares. E reproduz o paradigma ocidental colonizador quando supõe que a superação da dependência vem com o aprofundamento dos vínculos com o capitalismo. Em razão disso, tal forma de ver caracteriza o messianismo como anticolonialista, mas não anti-imperialista. Revolucionário, mas não anticapitalista. Daí a constatação de que as teorias funcionalistas sobre o messianismo terceiro- mundista aproximam a ideia de revolução da concepção de reforma, ainda que descrevam uma via reformista de novo tipo.

Balandier é exemplo de autor que se filiou à teoria dinamista anticolonialista para analisar o messianismo dos países africanos. E deixa claro o viés reformista que marca essa tradição intelectual quando adota a perspectiva durkheimiana que supõe que as sociedades não industrializadas se desenvolvem por meio de um ritmo lento, segundo o qual as exigências de ordem e de conformidade prevalecem sobre as reivindicações de mudança (BALANDIER, 1963). A exemplo de Durkheim, Balandier considera que as sociedades tradicionais não padecem de uma ausência de dinamismo interno, mas supõe que seu dinamismo é resultado de uma ligação com os países industrializados, como comprovam os movimentos messiânicos africanos.10

Segundo Balandier, o messianismo seria uma forma de consciência política típica de sociedades de tradição oral nas quais as reações à dominação são indiretas. Não à toa, Balandier cita Georges Gurvitch para afirmar que toda liberdade é enquadrada pelo real, condicionada e relativa, daí a importância dos fatores socioculturais para a formação da consciência messiânica (GURVITCH, 1968). Em função disso, o messianismo seria uma reação à dependência que está subordinada a fatores socioculturais específicos. Balandier chama atenção para a importância do fenômeno ideológico que mascara as relações de subordinação e dependência nos países desenvolvidos. O messianismo seria a afirmação de uma vontade política que reivindica a independência nacional, mas que não é reflexo direto da contradição capital-trabalho, sobretudo porque a situação de dependência colonial atenua os conflitos existentes entre as classes sociais. Daí o messianismo se tornar utópico quando origina o profetismo. Por esta razão, Balandier adota o conceito de dinâmica social durkheimiano para explicar o messianismo anticolonialista suis generis dos países terceiro-mundistas, por negar a hipótese de que tais movimentos tenham tido um caráter profético- revolucionário.

Georges Balandier é autor que tem o grande mérito de associar o messianismo à situação de dependência econômica dos países não desenvolvidos, mas, por valer-se da concepção durkheimiana de dinâmica social, acaba por reduzir o conteúdo disruptivo destes movimentos a um reformismo de novo tipo. Para Balandier, os movimentos messiânicos seriam uma sublevação campesina a meio de caminho entre o mito e a ideologia. Por isso, ele adverte para a necessidade de que o messianismo seja traduzido nos termos de uma sublevação política moderna. Ou seja, que seja arregimentado por uma doutrina política para que se consolide como ideologia. Caso contrário, o messianismo se voltaria para um passado comunista-igualitarista idealizado, anterior ao tempo da colonização, deixando de ser uma força política orientada para o futuro. Ao se inscrever no tempo do mito, o messianismo anticolonialista torna-se-ia passível de ser derrotado como utopia. Para que tal não ocorra, seria necessário transformar o mito em ideologia, isto é fazer os movimentos messiânicos dos países do terceiro mundo portadores de um socialismo suis generis, de tipo durkheimiano (DURKHEIM, 2015).11

É que, para Balandier, nas sociedades terceiro-mundistas de ampla população campesina e nas quais o proletariado não se estabiliza, a revolução não é necessariamente expressão de uma polarização de classes, pois ainda vigorariam nestas sociedades relações pessoais de parentesco que unem atores hierarquicamente desiguais, impedindo o surgimento das contradições de classes. Balandier se vale da teoria de Marcel Mauss para afirmar que as relações de parentesco nas sociedades tradicionais são regidas pela lógica do dom e contradom, ou seja, pela imposição de que haja retribuição da dádiva alcançada (MAUSS, 2013). E supõe a lógica da reciprocidade como um fato social total, isto é, que permeia toda vida social, inclusive as relações econômicas. Tal como Mauss, Balandier afirma que a presença de um ideal de reciprocidade nas relações de troca apaziguaria os ímpetos capitalistas das classes sociais dominantes, fazendo nascer uma moral social comum entre as classes sociais.12 Em função disso, o socialismo nestes países se manifestaria pela crença de que é possível uma industrialização capitalista que socialize gradualmente a economia sem redundar na superação das contradições econômicas.

Mas Balandier adverte: “para que as crenças messiânicas deem lugar a um socialismo de tipo durkheimiano, os marcos do pensamento tradicional devem ser contaminados pelos pressupostos leninistas- marxistas”. O descontentamento campesino, quando estabilizado pelo ideal marxista-leninista, daria fim ao dualismo das sociedades tradicionais por meio de medidas de reforma agrária que fariam o sistema familiar voltado para a subsistência se contaminar por ímpetos mercantis e modernizantes. No que diz respeito ao regime de distribuição de terras, a modernização marxista-leninista transformaria a terra coletiva em propriedade privada.

Deste modo, tal como Bloch e Lukács, Balandier questiona o evolucionismo linear que pressupõe a modernização capitalista como um desenvolvimento contínuo que repete necessariamente o caminho dos países ocidentais. Para ele, “los câmbios fundamentales no pueden resultar simplesmente de um processo acumulativo, se llevan a cabo mediante saltos, a favor de um movimento descontinuo” (BALANDIER, 1973, p. 124). Afirma isso em função de acreditar que o potencial evolutivo seria mais alto nas sociedades atrasadas, cujo dinamismo é decorrência de uma dinâmica interna pautada pelo exterior.13

A singularidade da teoria do autor viria justamente de sua filiação à tradição intelectual durkhemiana. É que Balandier considera um erro relacionar a dinâmica social das sociedades terceiro-mundistas à transformação das estruturas sociais. Nestas, a estrutura se identifica com a contradição, pois esta lhe seria imanente, mas tende ao equilíbrio, inclusive quando este equilíbrio chega por meio de uma crise, uma vez que a contradição nelas nunca é de todo superada. É que numa situação de dependência econômica, o conflito concorre para o aprofundamento da coesão social, uma vez que não é consequência necessária da luta pelo fim da apropriação privada dos meios de produção. A dinâmica social viria de desajustes que se operam a longo prazo. Balandier ressalta a função social transformadora que possuem as representações coletivas inovadoras, como são as crenças messiânicas. As crenças messiânicas são inovadoras porque buscam pela vantagem máxima, mas dentro dos limites impostos pela ordem social existente. Por esta razão, Balandier prescreve para as sociedades terceiro-mundistas um socialismo de tipo durkheimiano.

As sociedades terceiro-mundistas seriam, então, sociedades em que a tradição é um recurso simultâneo de resistência e conformação. Justamente por isso, as sociedades tradicionais não seriam portadoras de rupturas, mas de desajustes originados pelos agentes sociais.14 Nelas, as descontinuidades se expressam em meio a uma continuidade profunda. São geradas por crises de anomia, dando origens a mutações ou transições e não a mudanças históricas.

Ainda assim, Balandier critica o fato do marxismo concentrar sua atenção nas rupturas e nas mudanças, ao apresentar uma leitura demasiado histórica das sociedades. Para ele, os conflitos historicamente determinados não se reduzem à luta de classes, podem ser resultado do surgimento de uma lógica aliancista entre as classes. Por esta razão, sua sociologia dinamista privilegia as permanências e as situações de equilíbrio e situa a mudança em um conjunto de causas externas. “El desarrolismo atual apresenta com mayor claridade a launificación de la estática y de la dinâmica sociales em um mismo sistema teórico” (BALANDIER, op. cit., p. 127). E deixa claro o viés que orienta seus estudos quando afirma que sua teoria dialoga com o pensamento conservador por considerar que em todas as sociedades, inclusive as ocidentais, que são tidas como mais sensíveis às mudanças rápidas, estão expressas continuidades. Segundo ele, nem tudo muda e o que muda não se modifica em bloco.

Balandier emprega o termo “desarrolismo” para descrever o dinamismo social que é peculiar às sociedades terceiro-mundistas. Isso talvez indique que seu ponto de vista seja correlato de Durkheim também em outro aspecto: na ideia de que a lógica aliancista entre as classes sociais apenas surge com a maior divisão do trabalho, ou seja, na medida em que o industrialismo se aprofunda. Deste modo, Balandier reatualiza o paradigma durkheimiano quando faz uma crítica ao individualismo econômico, mas não nega os preceitos burgueses do lucro da propriedade privada. É preciso ressaltar que este posicionamento também está presente no pensamento marxista ocidental, ainda que este tenha enfatizado as rupturas e mudanças históricas.

As teorias marxistas de matiz ocidental estão assentadas na ideia de continuidade, são devedoras de um pressuposto evolucionista linear. Como é característica de todo pensamento ocidental, o marxismo também se nutriu dos ideais de desenvolvimento, crescimento e progresso. Por conta disso, também incorreu no erro de acreditar que todas as mudanças se processam por etapas e não por saltos. Vale lembrar que o principal axioma do pensamento marxista ocidental afirma que a luta de classes nem sempre seria movida por uma luta pelo fim da apropriação privada dos meios de produção. Enquanto não se completasse o processo de reificação do mundo ou a total separação entre sujeito e objeto, a ideia de revolução ganharia uma dimensão “etapista”. Afinal, o constante incremento das forças produtivas, produzidas pelo capitalismo, impõe a todo momento novas relações sociais de produção, sem redundar necessariamente no aumento do conflito entre as classes sociais. O marxismo ocidental considerou essa dinâmica evolucionista, assentada na ideia de continuidade, como a mais consequente politicamente, fato que se comprova mesmo nas teorias de Bloch e de Lukács.15

Significativamente, Lucien Goldmann sugere que o marxismo ocidental de modo geral abraçou a ideia de que o proletariado deveria ter como referência o máximo de consciência possível e não a consciência que reflete a sua situação de classe (GOLDMANN, op. cit.). Isto é, a tese de que o proletariado deveria levar somente em consideração as suas demandas que não estão em contradição com os interesses das demais classes. Este seria a precondição para que uma lógica aliancista se formasse, dando curso a uma modernização democrático-burguesa, que seria uma primeira e longa etapa de um socialismo que se concretizaria por meio de reformas capitalistas (GURVITCH, 1973).

Há que se dizer que a teoria de Balandier marca a existência de uma homologia entre o funcionalismo durkheimiano e o marxismo ocidental: a ideia de que o socialismo se constitui com o surgimento de uma moral social comum entre as classes ou de uma lógica aliancista. Georges Gurvitch foi quem sinalizou essa interseção teórica ao pontuar que a dialética histórica, tal como o marxismo ocidental a concebe, não surge de uma dialética de oposição entre as classes sociais, mas de uma dialética de complementaridade. Desse modo, o processo histórico nas sociedades ocidentais é fruto de uma deflação dos determinismos das classes sociais. De forma correspondente a Goldmann, Gurvitch também viu com otimismo o fato do proletariado nas sociedades ocidentais não formar uma consciência que é reflexo apenas da sua situação de classe, mas de uma consciência real que congrega todas as classes em torno de um ideal comum: o desenvolvimento das forças produtivas. E situou a mudança histórica a meio caminho da revolução e da contrarrevolução, porque considera que o aumento do determinismo das classes sociais ou da dimensão utópica revolucionária, em vez de desencadear a revolução, a inibiria, por entravar o desenvolvimento das forças produtivas.

Deste modo, chama a atenção o fato de que a dimensão igualitarista- revolucionária do proletariado e do campesinato ocidental tenha sido vista como um irracionalismo tanto pelo marxismo como pelo funcionalismo durkheimiano. É o que se comprova mesmo nas teorias marxistas de Ernest Bloch e Georges Lukács e na teoria funcionalista de Georges Balandier, autores que são comumente considerados expoentes de um pensamento contra-hegemônico. Os primeiros, por supostamente serem representantes de um marxismo revolucionário-escatológico, que se contrapõe ao evolucionismo historicista presente no marxismo, o último, por ter aparentemente adotado o funcionalismo para explicar a busca terceiro-mundista, pela superação da dependência, por uma via revolucionária que não repetiria o caminho trilhado pelos países ocidentais. Ocorre que tanto Bloch como Lukács e Balandier, a despeito das críticas que dirigem ao pensamento ocidental, aproximam a ideia de revolução da de reforma, pelo fato de que ainda veem a realidade capitalista como inexorável, mesmo quando se concretiza uma via messiânico-revolucionária escatológica (como postulam Block e Lukács) ou quando se realiza uma via messiânico-anticolonialista (como descreve Balandier).

Considerações finais

As análises sobre o messianismo, que têm como base o marxismo ocidental e o funcionalismo durkheimiano, veem com otimismo a contenção da dimensão revolucionária nos movimentos sociais, considerando que este processo é uma condição necessária para a transformação histórica. Todavia, é preciso esclarecer qual o sentido que o processo revolucionário passa a ter, quando isso acontece. Esta indagação parece ser relevante se se toma como referência não apenas o contexto mundial, mas também o brasileiro, sobretudo quando se nota que a deflação das antinomias ligadas aos determinismos das classes sociais está longe de prefigurar até mesmo o que se acreditou ser um caminho socialista de etapas capitalistas. Pelo contrário, a perda da dimensão revolucionária induz a uma confusão teórica entre doutrinas políticas opostas como o comunismo e o liberalismo, imprimindo um viés reformista-conservador até mesmo no pensamento marxismo, o que faz o socialismo ser cada vez um destino a se perder de vista. Torna-se sintomático o fato de que entre as esquerdas o ideal democrático burguês vem cada vez mais povoando o ideal democrático-revolucionário, tergiversando a própria ideia de revolução. Pode-se dizer que o socialismo de reformas capitalistas imprimiu força ao liberalismo econômico e político, mostrando, ao longo do século XX, os perigos inerentes à formação de um pensamento único, com o advento do autoritarismo nazifascista e da democracia liberal imperialista.16

É o que comprova também o caso brasileiro, país no qual a associação entre as doutrinas liberais e comunistas resultou numa via autocrática de desenvolvimento do capitalismo. Também aqui as interpretações sobre o messianismo repetem o mesmo erro do pensamento político ocidental ao condenar as manifestações igualitaristas-revolucionárias como manifestações pré-políticas por não estarem arregimentadas por uma ideologia comunista moderna que endossa a democracia liberal, pelo fato de ter o capitalismo como uma primeira etapa necessária ao socialismo. Também no Brasil se firmou no imaginário político a ideia de que o surgimento de uma antinomia ligada às classes sociais frearia o incremento das forças produtivas e, por consequência, o processo revolucionário, preferindo a nossa esquerda de feição mais ocidentalizante a opção por uma deflação das antinomias entre as classes. A história brasileira do pré-1964 vem demonstrar que o PCB errou ao orientar o proletariado e o campesinato a levar em consideração o máximo de consciência possível ou a formar uma consciência real que faz seus interesses de classe capitularem diante dos interesses das classes dominantes. Esta pode ser vista como uma das razões de o comunismo igualitarista campesino ter sido alijado do jogo político, tendo o Brasil incrementado suas forças produtivas por uma via junker.

No plano mais teórico, esse desfecho histórico chegou a ser relacionado à perda da dimensão revolucionária nos movimentos sociais, por alguns autores, mesmo que de forma indireta. O próprio Lucien Goldmann reconhece isso ao analisar o pensamento trágico característico do século XVII e XVIII, afirmando-o como uma consciência “revolucionária” não contrária à razão burguesa e que tem no marxismo ocidental seu prolongamento.

Segundo Goldmann, por meio de um Deus espectador eternamente ausente, mas constantemente presente na consciência do indivíduo, o indivíduo trágico formaria uma ideia da essência humana inequívoca, balizada entre as ideias de bem e de mal. Por esta razão, ao contrariar os valores parciais e ambíguos da realidade, o pensamento trágico teria suscitado o reconhecimento da miséria intramundana, permitindo ao indivíduo dar significação a uma ideia de ser que recusa o relativo a favor de uma existência absoluta e verdadeira, que comporte o livre-arbítrio. O contraste entre a grandeza absoluta dos valores divinos e a parcialidade humana tornaria o Deus trágico um postulado prático. A alma convertida deve se voltar para o mundo. Todavia, em função do Deus trágico ser um Deus espectador, o indivíduo viveria num eterno paradoxo: ao mesmo tempo em que adota a ideia divina de que existe uma essência humana, reconhece a natureza humana naturalmente faltosa. O contraste entre a fé e a parcialidade da vida seria compensado no pensamento trágico com o discernimento da razão. Os desígnios da fé não erram, mas o homem é falível em seus atos. Por isso, a certeza da fé não deve ser oposta à razão humana, à razão burguesa e à riqueza, pois estas seriam manifestações de reconhecimento da graça divina.17

Este posicionamento está presente na teoria social por meio da ideia de que a contaminação dos anseios campesinos comunistas igualitaristas pela razão burguesa é condição necessária para que os espíritos das leis vigorem na consciência humana (GATTI, 2015). A lei seria a concretude e universalização da fraternidade na qual ser semelhante não é ser igual. Por meio da lei, funda-se um ideal de caridade e de irmandade que tem como base uma ideia de perfeição moral não engajada na solução dos problemas sociais. A igualdade torna-se igualdade no mercado (MANIERE, op. cit.). No âmbito do marxismo ocidental, esta corrente de opinião se afirmaria por meio da ideia de que a igualdade não é condição própria do homem, mas produto da história do futuro, quase um post- mortem cristão.

Em termos mais históricos, o pensamento trágico reduziria o antagonismo entre as classes sociais ao subordinar o anseio comunista igualitarista campesino à razão burguesa, tornando possível uma política de compromisso entre elas. Goldmann faz referência ao período da monarquia absolutista francesa no qual a burguesia se aliou à aristocracia agrária sem romper sua aliança com o terceiro estado. Ao neutralizar a expectativa popular de uma mudança radical e fazer a luta contra o feudalismo ganhar um conteúdo racionalista democrático-burguês, a burguesia revolucionou as relações sociais, impedindo que a dimensão comunista igualitarista, tida como um alheamento da realidade, refreasse o desenvolvimento do capitalismo.

Todavia, o próprio Goldmann reconhece a consciência trágica como uma visão a-histórica que, por não estar ancorada numa ideia de futuro, de avenir, enxerga o mundo como definitivo e imutável. Seria justamente essa ausência de uma dimensão temporal que faria o Deus caché ganhar um conteúdo trágico: ao mesmo tempo que suscita a crítica da sociedade capitalista, não fornece os meios de realizar uma comunidade de fato ancorada em valores morais não parciais, que realize concretamente a

essência igualitarista do homem. Prova disso é que a consciência trágica não rompe em definitivo com a razão burguesa. E mais: a consciência trágica comprova que o racionalismo burguês não é de todo contrário aos interesses da aristocracia agrária. Isso se comprova também pelo modelo brasileiro de desenvolvimento de capitalismo consolidado em 1964.

Goldmann considera que a crítica ao racionalismo cartesiano e ao individualismo burguês apenas ganha contundência com o surgimento de um pensamento dialético alicerçado numa concepção histórica do mundo. Segundo ele, isso se torna possível quando a fé marxista tem o socialismo como continuação necessária do progresso capitalista. A existência desta convicção distinguiria o pensamento marxista do pensamento racionalista burguês porque faz a compreensão racional estar empenhada na transformação qualitativa da realidade. Em termos mais teóricos, o marxismo teria revolucionado o racionalismo burguês porque compreende a vida econômica e social por meio da totalidade significativa econômica e social das diferentes classes sociais.

Portanto, o mérito do marxismo viria do fato de ter enraizado sua fé revolucionária na descrição das correntes ideológicas da vida social. Com esta perspectiva vinculada à compreensão histórica da realidade, o marxismo deu como certa a ocorrência de um avenir revolucionário intramundano que realiza a essência igualitária humana concretamente e de forma integral quando a totalidade significativa que emerge das classes sociais é posta em evidência.

O que se tentou argumentar neste trabalho é que o marxismo ocidental reatualiza os impasses históricos da consciência trágica por não inaugurar um ponto de vista totalmente contrário aos preceitos burgueses. Daí o seu paralelismo com o funcionalismo durkheimiano. De forma semelhante ao pensamento trágico, o marxismo ocidental postulou a necessidade de neutralização dos anseios revolucionários, evidenciando a sua opção por uma política de compromisso entre as diferentes classes sociais ou a inibição do antagonismo entre elas. Com isso, fez a ideia de revolução que concretiza o igualitarismo comunista no instante agora se contaminar pelos ideais democráticos burgueses do liberalismo.

Torna-se significativo que o próprio Goldmann reconheça que o pensamento trágico, e, de quebra, o marxismo ocidental se distinguem do misticismo das massas. Este divórcio ocorrido no contexto do capitalismo ocidental se repetiu no caso brasileiro, com o misticismo popular sendo contido por uma ideologia comunista moderna que subordina o ideal democrático-revolucionário ao ideal democrático-burguês, dando origem a uma via autocrática de desenvolvimento, tal como é própria ao Ocidente, e suas manifestações autoritárias de imperialismo e de nazifascismo.

Por que não lembrar da definição de conservadorismo adotada por Karl Manheinn para explicar a relação intrínseca que existe entre capitalismo e autoritarismo e os estilos de pensamento (MANHEINN, 1986)? Segundo este autor, o conservadorismo moderno promove um resgate dos valores sociais arcaicos, normalmente associados ao qualitativo e ao intuitivo (valores de uso), para conjugá-los aos valores de troca burgueses. Este estilo de pensamento é comumente próprio das classes sociais que não estão inteiramente interessadas no processo capitalista. Deste modo, para Manheinn, a insurgência do pensamento conservador seria possível a partir de um resgate reflexivo racional de valores irracionais, ligados a modos de vida de classes sociais anteriores ao capitalismo, que no capitalismo adquirem um caráter essencialmente antirrevolucionário (no sentido de que refreiam a revolução democrático-burguesa)18.

O que se quer argumentar é que não necessariamente diferentes classes sociais dão origem a diferentes estilos de pensamento. O fato do conservadorismo se valer do racionalismo burguês, de suas categorias intelectuais e de seus critérios de raciocínio para se tornar coerente com o capitalismo indica que ele, como estilo de pensamento, exprime, na realidade, um modo de vida capitalista e moderno. Ou seja, a própria burguesia com seu ideal democrático-burguês seria antirrevolucionária e conservadora. O problema da teoria de Manheinn está no fato de ela afirmar ser o estilo de pensamento próprio da aristocracia agrária, da pequeno-burguesia e também do campesinato. Ou seja, Manheinn exclui a burguesia como representante deste modo de pensar e inclui o campesinato, classe social que, de acordo com o que vem se argumentando, move-se por um ideal comunista igualitário e não por um estilo de pensamento conservador.

Este erro se reproduziria no marxismo ocidental, mas não pela razão que aponta Manheinn. Segundo ele, o materialismo histórico dialético suprime o racionalismo moderno e resgata elementos do pensamento conservador ao operar descobrindo um sentido histórico e metafísico em todo processo histórico. Na realidade o que ocorre é o inverso, o marxismo ocidental contingencia os valores de uso para dar destaque aos valores de troca burgueses, fazendo-os se tornar conservadores. O mesmo ocorreria na sociologia durkheiminana, que propõe uma saída conservadora para as crises e as grandes mudanças sociais que ocorrem no capitalismo em função de desvirtuar os valores de uso pelo racionalismo burguês, ao adotar ideias-elementos que são antinômicas à ideia de classe, tais como: comunidade autoridade, status, sagrado e alienação (NISBET, 1986). Tais ideias dão base ao socialismo durkheimiano que está baseado na moral social da reciprocidade (ou da caridade). Este modo de pensar é correlato ao socialismo de reformas capitalistas propagado pelo marxismo ocidental porque também este contingencia a antinomia entre as classes sociais por crer que o maior desenvolvimento do capitalismo tem como consequência necessária o socialismo. O que tentou-se mostrar é que esta conjugação entre doutrinas políticas opostas, como o comunismo e o liberalismo, se repetiu também no contexto brasileiro, o que se comprova com o ideal de desenvolvimento social propagado pelo PCB ter dado paulatinamente lugar ao ideal de desenvolvimento econômico.

Material suplementario
Referências
BALANDIER, Georges. L’Afrique noire. Paris: Press Universitaires de France, 1963.
BASTIDE, Roger. Les religions africaines au Brésil. Vers une sociologie dês interpénétrations de civilisations. Paris: Press Universitaires de France, 1960.
Le messianisme raté. Archives de Sociologie dês Religions, n. 5, jan./jun., 1958a.
O sagrado selvagem e outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
As Américas negras: as religiões africanas no novo mundo. São Paulo: Difusão Européia do Livro/Editora da universidade de São Paulo, 1974.
Problemas afro-brasileiros. In: QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de (Org.). Roger Bastide: ensaios e pesquisas, série 2, n. 5. São Paulo: CERU/USP, 1994.
BLOCH, Ernest. Thomas Münzer: teólogo da revolução. Rio de Janeiro: Biblioteca Tempo Universitário, 1973.
CAILLE, A. Nem holismo nem individualismo metodológicos: Marcel Mauss e o paradigma da dádiva. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 13, n. 38. São Paulo, out. 1998, p. 5-38.
DURKHEIM, É. As formas elementares da vida religiosa. O sistema totêmico na Austrália. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
Sociologia e filosofia. São Paulo: Editora EDIPRO, 2015.
As regras do método sociológico. São Paulo: Editora EDIPRO, 2012.
In: José Albertino Rodrigues (Org.). Emile Durkheim: Sociologia. São Paulo: Ática, 1978.
FRANK, Andre Gunder. América Latina: subdesarrollo o revolución. México: Ediciones Era, 1973.
FURTER, Pierre. A dialética da esperança: uma interpretação do pensamento utópico de Ernest Bloch. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974
GATTI, Roberto. Rousseau. São Paulo: Ideias & Letras, 2015
GOLDMANN, Lucien. Ciências humanas e filosofia: o que é sociologia? Rio de Janeiro: Difel Editorial, 1978.
Le dieucaché. Etude sur la vision tragique dans les pensée de Pascal et dans Le théâtre de Racine. Paris: Éditions Gallimarg, 1959.
GURVITCH, Georges. Dialética e Sociologia. São Paulo: Vértice/Editora Revista dos Tribunais, 1987.
El concepto de clases sociales de Marx a nuestros días. Argentina: Ediciones Nueva Visíon, 1973.
Determinismos sociais e liberdade humana [1955]. Rio de Janeiro;São Paulo: Forense, 1968.
KONDER, Leandro. Rebeldia, desespero e revolução no jovem Lukács. Temas das Ciências Humanas. São Paulo: Editora Gryalbo, 1977. LOCKE, John. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
LÖWY, Michel. Romantismo e messianismo: ensaios sobre Luckács e Walter Benjamin. São Paulo: Editora Perspectiva, 1990.
Judeus heterodoxos. São Paulo: Editora Perspectiva, 2012.
LUKACS, Georg. Realismo crítico hoje. Brasília: Coordenada-Editora de Brasília, 1969.
Reboquismo e dialética: uma resposta para os críticos de História e Consciência de Classe. São Paulo: Boitempo, 2015.
História e consciência de classe. Porto: Publicações Escorpião, 1974.
A alma e as formas. Ensaios. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.
MANIERE, Maria Rosário. Fraternidade. Releitura civil de uma ideia que pode mudar o mundo. Brasília: Fundação Astrogildo Pereira, 2017.
MANNHEIM, Karl. O pensamento conservador. In: MARTINS, José de Souza (Org.). Introdução crítica à sociologia rural. São Paulo: Editora Hucitec, 1986.
MARTINS, José de Souza Martins. Expropriação e violência: a questão política no campo. São Paulo: Hucitec, 1991.
Os camponeses e a política no Brasil. In. Os camponeses e a política no Brasil: as lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. Petrópolis: Vozes, 1983.
As coisas no lugar. In: MARTINS, José de Souza (Org.). Introdução crítica à sociologia rural. São Paulo: Editora Hucitec, 1986.
KARL, Marx. O dezoito de Brumário de Luiz Bonaparte. In. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
MAUSS, M. O ensaio sobre a dádiva. Forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. São Paulo: Cosac Naify, 2013.
Antropologia e sociologia. São Paulo: Cosac &Naif, 2003.
MORUS, Thomas. A Utopia. In. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979.
MÜNSTER, Arno. Utopia, messianismo e apocalipse nas primeiras obras de Ernest Bloch. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1997.
Ernest Bloch: Filosofia da práxis e utopia concreta. São Paulo: Editora Unesp, 1993.
NISBET, Robert A. Conservadorismo e sociologia. In: MARTINS, José de Souza (Org.). Introdução crítica à sociologia rural. São Paulo: Editora Hucitec, 1986.
Ortiz, R. Durkheim: arquiteto e herói fundador. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 4, n. 11. São Paulo, out. 1989.
QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. Historia y etnologia de los movimientos mesiánicos. Reforma y revolución en las sociedades tradicionales. México: Siglo XXI Editores, S.A, 1969.
Images messianiques Du Brésil. Guernavaca, n. 87, México: Sondeos, 1972.
Notas sociológicas sobre o cangaço. Ciência e Cultura, n. 27. São Paulo: USP, 1975, p. 495-516.
O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Alfa-Omega, 1976a [1965].
O mandonismo local na vida política brasileira e outros ensaios. São Paulo: Alfa-Omega, 1976c.
SANTOS, Raimundo. Agraristas Políticos brasileiros. Brasília: Fundação Astrogildo Pereira, 2007.
VASCONCELLOS, Dora Vianna. Interpretações sobre o messianismo. Estudos Sociedade e Agricultura, fevereiro de 2018, vol. 26, n. 1, p. 172-198, ISSN 2526-7752.
Notas
Notas
1 Doutora pelo Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ). E- mail: doravianna@ig.com.br.
2 Deste modo, por meio de uma acentuação desta tergiversação ideológica, a ala dissidente do PCB acabou ganhando maior significação política.
3 Vale a pena lembrar a crítica marxista relativa às utopias elaborada pelo pensamento do Ocidente.
4 “A convergência [entre estes dois autores] se estabelece sobretudo na finalidade do caminho dialético concebido: a superação da alienação pela tomada de consciência-de-si do proletariado desperto, em Lukács, e a superação da alienação e do Mal na visão pós- apocalíptica, no momento salutar do encontro de nós mesmos, concebido como momento da identidade restaurada em Bloch” (MUNSTER, op. cit., p. 49).
5 O direito de propriedade, a desigualdade e o Estado burguês deixam de ser vistos como derivados do pecado original, do crime primeiro da humanidade, para serem considerados inerentes à natureza humana.
6 Para Lukács, nenhuma muralha da China separava a revolução burguesa da revolução proletária.
7 Segundo Lukács, nas sociedades pré-capitalistas existiria apenas falsas consciências que não apreendem adequadamente a totalidade social.
8 Há quem diga que no jovem Lukács sobressaem a rebeldia, o desespero e a ideia de revolução disruptiva, ao passo que no Lukács maduro prevalece a ideia de revolução marxista-leninista. Esteticamente, essa mudança de perspectiva se evidenciaria quando sua preferência pelo drama cede espaço para o romance (KONDER, 1977).
9 Ponto de vista semelhante apresenta Karl Marx, em O dezoito de Brumário de Luís Bonaparte, ao afirmar que o proletariado fora a reboque dos acontecimentos por apresentar anseios revolucionários inadequados àquela circunstância histórica, tendo sido esta a razão de ter havido um movimento contrarrevolucionário e uma modernização burguesa pelo alto na França (MARX, 1978).
10 “El dinamismo de las sociedades tradicionais no se halla condicionado tan diretamente por la preocupacion por el incremento constante delvolumen de bienesmateriales, como lo está el dinamismo de los lhamados países desarrolhados” (BALANDIER, op. cit., p. 85).
11 Curiosamente, em seus livros, Georges Balandier declara sua teoria como sendo contrária ao funcionalismo, ao estruturalismo e às teorias da dinâmica social. Afirma-se como pertencente à escola dinamista, vertente intelectual que aponta as relações recíprocas entre tradicional e moderno e que desfaz a oposição entre sincronia e diacronia. De fato, Balandier questiona a prioridade concedida à sincronia em relação à diacronia pelas teorias estruturalistas. Todavia, esta acentuação já se encontrava presente na tradição sociológica durkheimiana, que considera que as sociedades tradicionais não possuem uma lógica contrária das sociedades ocidentais. Afinal, também nelas as transformações seriam uma decorrência das crises de anomia social.
12 O princípio de reciprocidade não estaria baseado em valores de uso. Em função disso, não é totalmente contrário à ideia de lucro contida nos valores de troca. O princípio de reciprocidade estabelece apenas um parâmetro para que a troca na sociedade capitalista seja mais justa.
13 ara a escola durkheimiana, a mudança é imanente, de origem interna às sociedades. Balandier faz uma crítica a esta tradição intelectual por considerar que o conceito de imanência torna-se correlato ao de continuidade quando exclui a possibilidade de saltos históricos, de rupturas e mudanças bruscas. Por isso, em sua análise sobre as sociedades tradicionais, afirma a necessidade de se considerar o dinamismo social que se manifesta internamente, mas que é de origem externa. Embora Balandier inove em relação a vertente intelectual durkheimiana quanto a isso, seu ponto de vista não chega a inaugurar uma nova perspectiva porque apresenta o mesmo viés ideológico da sociologia funcionalista, qual seja, a ideia de que o socialismo é resultado de uma certa reciprocidade nas relações de troca, de uma moral social comum que congrega todas as classes sociais, suspendendo os conflitos socioeconômicos.
14 “Todos los conflitos historicamente determinados no se reduzem a la lucha de classes; la revolución — o la mutación — no es la salida necesaria de la lucha de clases” (BALANDIER, 1973, p. 136).
15 Ou seja, mesmo estes autores que são considerados como os mais radicais do marxismo ocidental adotam um ideal de um socialismo que se concretiza por meio de reformas capitalistas.
16 Para alguns autores, o nazifascismo seria uma tergiversação produzida pela combinação do comunismo camponês com os mecanismos burgueses de racionalização e domínio. Esta combinação seria própria da democracia liberal do ocidente (MACHADO, op. cit.), embora tenha se repetido também no mundo soviético.
17 A consciência trágica seria uma consciência típica das massas incultas que se volta contra o racionalismo cartesiano, o egoísmo individualista e o homo economicus, por acreditar numa essência humana que transcende a razão individual e resgata a ideia de comunidade, os valores morais não ambíguos, as verdades eternas. O racionalismo cartesiano e o pensamento individualista, na contrapartida, destroem esses princípios morais universais por deduzir as ideias de bem e de mal do indivíduo, suprimindo a ideia da existência de valores supraindividuais. Este paradoxo se resolveria na consciência trágica por meio da ideia de que o pecado original não corrompeu a natureza humana, uma vez que a parcialidade faz parte da condição humana. O estado de liberdade e igualdade humana seria uma questão puramente doutrinal, que conduziria ao alheamento do mundo por não ter enraizamento na prática. Prova disso é que o homem não consegue aspirar um estado radicalmente diferente de sua condição atual. A razão burguesa é que forneceria um conteúdo intramundano à fé trágica ao oferecer ao indivíduo a possibilidade de ponderação entre o bem e o mal.
18 Como forma de conceber a realidade, o conservadorismo moderno exerce a sua influência como um modo de pensamento que se prende ao concreto, isto é, que condena todo pensamento que vai além da estrutura atual da sociedade e que repudia tudo que contém um caráter especulativo e hipotético.
Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visor de artículos científicos generados a partir de XML-JATS4R por Redalyc