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Recepción: 15 Julio 2017
Aprobación: 01 Enero 2018
Resumo:
:4 (A relevância dos serviços de Ater na execução do Pronaf no município de Unaí – MG). Este estudo objetivou avaliar o processo de tomada do crédito, sua operacionalização e a percepção sobre os resultados do crédito do Pronaf no município de Unaí – MG, considerando as dificuldades levantadas na literatura acerca da execução
do Pronaf, integrando abordagens quantitativa e qualitativa. Os dados foram coletados por meio de questionário aplicado a agricultores familiares e de entrevistas dirigidas aos representantes das empresas de Ater e do Banco do Brasil. Entre os principais resultados, constatou-se que do ponto de vista dos agricultores persistem dificuldades na apresentação da documentação necessária; eles percebem o processo como burocrático e relatam atrasos prejudiciais na liberação dos recursos; os agentes de Ater procuram elaborar projetos exequíveis financeiramente e que atendam, simultaneamente, às necessidades dos agricultores familiares e às exigências do agente financeiro, mas foi verificada insuficiência dos serviços de Ater na fase de execução dos projetos; existem deficiências na comunicação entre o agente financeiro oficial e os agricultores familiares, ficando mais a cargo das Ater divulgar o Programa e as condições do crédito, as quais foram consideradas satisfatórias, porém sugere-se a revisão nas faixas de valores praticadas. Por fim, constatou-se que existe um consenso local de que o Pronaf gera resultados financeiros positivos para os beneficiários que conseguem acessar os recursos, e contribui para a melhoria da qualidade de vida das famílias no campo.
Palavras-chave: Pronaf, assistência técnica, agricultores familiares, tomada do crédito.
Abstract:
: (The relevance of Ater services in the implementation of Pronaf in the municipality of Unaí – MG). This study propose evaluate the credit-taking process, its application and the results of Pronafcredit in the city of Unaí/MG, considering the problems raised in the literature about Pronafexecution, using quantitative and qualitative approaches. The data were collected through a questionnaire applied to family farmers and
through interviews with the representatives of Atercompanies and Banco do Brasil. Among the main results from de point of view of the family farmers, it was observed that: difficulties persist in the presentation of documentation;the process is bureaucratic, and there are delays in the release of resources; the Ateragents have been working to develop financially feasible projects that meet the needs and the requirements of the financial agent, but Ater’sservices were insufficient to carry out the projects; there are deficiencies in the communication between the official financial agent and the family farmers, being more in charge of the Aterto spread the Program and the conditions of the credit; the credit conditions were considered satisfactory, however, it is suggested to review the ranges of values practiced. Finally, it was found that there is a local consensus that the Pronafgenerates positive financial results for beneficiaries who can access the resource, and contributes to the improvement of the quality of life of families in the field.
Keywords: Pronaf, technical assistance, family farmers, making credit.
Introdução
O desenvolvimento do setor agrícola brasileiro e sua relação de dependência com o crédito remontam a períodos anteriores ao Ciclo do Café e, até os anos 1930, o aporte financeiro ocorreu, em grande parte, pela participação governamental, por meio de empréstimos obtidos no exterior (MASSUQUETTI, 1998; PRETTO, 2005).
No Brasil, as primeiras iniciativas no sentido de criar uma estrutura institucional do crédito rural ocorreram em 1937, com a criação da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial (Creai) do Banco do Brasil (BB) e da Comissão de Financiamento da Produção (CFP), em que os próprios comerciantes e exportadores se posicionavam como intermediadores, financiando as atividades com penhora da produção ou da terra (LIMA, 2011; SERENO 2012). Todavia, concretamente, o financiamento de longo prazo que melhor atenderia ao setor agrário e sustentaria o projeto modernizador da agricultura, iniciado em meados dos anos 1950, veio acontecer com a institucionalização do Crédito Rural pela Lei nº 4.829, de 31 de dezembro de 1965 (PRETTO, 2005).
Além de financiar a modernização da agricultura pela incorporação de novas tecnologias, uso de sementes com alta produtividade, agroquímicos e motomecanização, o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) teve papel importante na consolidação dos Complexos Agroindustriais (CAIs) emergentes e de um forte sistema cooperativo (BIANCHINI, 2015; BUAINAIN; SOUZA FILHO, 2001). Desde então, o crédito rural se transformou na principal política agrícola promotora do desenvolvimento da agricultura brasileira. Contudo, embora volumoso, crescente e disponível a todos os agricultores, a utilização do crédito deu-se de forma concentrada, por médias e grandes unidades patronais (MUNDO NETO; SOUZA FILHO, 2005; RODRIGUES, 2013), sendo beneficiadas as regiões que se encontravam mais aptas ao processo de modernização, à produção de commodities ligadas ao nascente CAI e, por excelência, a um grupo seleto de agricultores conectados ao setor exportador (BIANCHINI, 2015; CARMO, 2015).
No final dos anos 1970, a política de crédito rural começou a apresentar problemas que se agravaram na década de 1980. O cenário que se desenhou no país, com a implantação do modelo de financiamento agrícola e as modificações na estratégia da política econômica brasileira nos anos 1990, intensificou os problemas de ordem econômica e social (WANDERLEY, 2000), convergindo para a articulação dos agricultores em torno das organizações representativas que, por sua vez, passaram a pressionar a esfera governamental, em relação às novas diretrizes para as políticas agrícola e de desenvolvimento rural sustentável (BIANCHINI, 2015; SCHNEIDER; MATTEI; CAZELLA, 2004). Aliados a isso, aqueceram-se os debates nos meios acadêmico e político acerca das temáticas desenvolvimento rural e sobre o papel e a importância da agricultura familiar como categoria social, e as produções e documentos resultantes desses debates serviram de inspiração para a elaboração de formas de intervenção e planejamento, a exemplo do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) (SCHNEIDER, 2010).
Criado em 1995, o Pronaf objetivou atender às particularidades dos pequenos produtores rurais que desenvolvem suas atividades com sua força de trabalho e de sua família. Com esse programa, a inserção desses produtores no mercado do agronegócio seria facilitada e ampliada, aumentando a geração de renda e agregando valor ao produto e à propriedade por meio da modernização dos sistemas produtivos e da profissionalização desses pequenos produtores (BATAGLIN, 2012; BIANCHINI, 2015; MATTEI, 2005; SILVA, 2006).
Com uma linha de crédito diferenciada, os recursos alcançariam, teoricamente, um maior número de famílias, ajudando na melhoria das condições de permanência do agricultor familiar no campo pela ampliação dos postos de trabalho e, consequentemente, na inibição do êxodo rural e no aumento da produção de alimentos para o abastecimento do mercado interno (SILVA, 2006). Importa ressaltar que, isoladamente, a criação de linhas de crédito diferenciadas e a disponibilização dos recursos para custeio e investimento não alcançam a amplitude dessa política creditícia, razão pela qual, após sucessivas mudanças, o programa também abarca o financiamento de infraestruturas e serviços básicos municipais e a capacitação e profissionalização dos agricultores familiares e dos atores relacionados com a categoria (CAZELLA; BERRIET-SOLLIEC, 2010; GRISA; WESZ JUNIOR; BUCHWEITZ, 2014; NUNES, 2007; SCHNEIDER; MATTEI; CAZELLA, 2004).
Dessa forma, em parceria com órgãos e entidades públicas e privadas e com os agricultores familiares e suas organizações, as linhas de ação são operacionalizadas – de acordo com pesquisadores, a exemplo de Bittencourt (2003), Cazella e Berriet-Solliec (2010) e Schneider, Mattei e Cazella (2004) – a partir de quatro eixos estratégicos: 1) o ajuste das políticas públicas à realidade dos agricultores familiares; 2) a instalação e melhoria da infraestrutura e dos serviços municipais essenciais ao desenvolvimento da agricultura familiar; 3) a capacitação e profissionalização de agricultores familiares, técnicos e conselheiros; e 4) o financiamento das atividades produtivas agropecuárias e não agropecuárias desenvolvidas pelos agricultores familiares.
Nunes (2007) sustenta que as inúmeras modificações que vêm aprimorando o projeto inicial a cada ano-safra e as novas ações implementadas pelo Governo Federal, nas áreas de comercialização, assistência técnica e extensão rural, favorecem a ampliação do público- alvo do Pronaf e o fortalecimento da agricultura familiar como categoria social.
Em 2016, o Programa abarcou os agricultores e produtores rurais que compõem as unidades familiares de produção rural, que comprovaram seu enquadramento no programa mediante apresentação da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) ativa e que atenderam aos seguintes requisitos:
[...] explore parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário, comodatário, parceiro, concessionário do Programa Nacional de Reforma Agrária – PNRA, ou permissionário de áreas públicas; resida no estabelecimento ou em local próximo; não detenha, a qualquer título, área superior a quatro módulos fiscais quantificados conforme a legislação em vigor, exceto condomínios; tenha o mínimo de 50% da renda bruta familiar originada da exploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento e o trabalho familiar predominante na exploração do estabelecimento; não tenha auferido renda bruta familiar superior a R$360.000,00, nos últimos doze meses que antecedem a solicitação da DAP, excluídos os benefícios sociais e os proventos previdenciários decorrentes de atividades rurais (Banco Central do Brasil, Manual do Crédito Rural – MCR 10-2-1, 2016).
Foram também beneficiários do Pronaf os pescadores artesanais, os aquicultores e os silvicultores – extrativistas integrantes de comunidades quilombolas rurais, povos indígenas e demais povos e comunidades tradicionais – que cultivam florestas nativas ou exóticas e promovem o manejo sustentável desses ambientes (BANCO CENTRAL DO BRASIL, MANUAL DO CRÉDITO RURAL, 2016). O reconhecimento desse último grupo como agricultor familiar e empreendedor familiar rural pela Lei no 11.326, de 24 de julho de 2006, e sua inclusão como beneficiário do Pronaf representaram uma inovação no Programa (BRASIL, 2006).
Com o objetivo de melhor atender à heterogeneidade do público apoiado pelo Programa e também aos diferentes contextos sociais, a partir de 1999 os beneficiários do Pronaf foram estratificados com base na Renda Bruta Familiar (RBF) anual e, após algumas modificações, o Programa passou a atender a três extratos de agricultores familiares: Grupo A–A/C (assentados); Grupo B (agricultores familiares abaixo da linha de pobreza) e Grupo V (demais agricultores familiares), que atualmente também se denomina “Agricultores Familiares” (BIANCHINI, 2015; NUNES, 2007; SCHNEIDER; MATTEI; CAZELLA, 2004).
No escopo do programa, destaque é dado à linha de crédito Mais Alimentos, criada pelo MDA no Plano Safra 2008/2009, com o objetivo de promover o aumento da produção e da produtividade, a redução dos custos de produção e a elevação da renda da família produtora rural. O acesso facilitado ao crédito e as condições especiais de pagamento possibilitaram a elevação da produção familiar de alimentos básicos em 7,8 milhões de toneladas no primeiro ano, com aumentos expressivos nos produtos leite e mandioca na safra 2009/2010 (BRASIL, 2010; RODRIGUES, 2013). Além do crédito propriamente dito, a linha de crédito Mais Alimentos contempla o seguro agrícola, o apoio à comercialização e a assistência técnica, o que, segundo Rodrigues (2013), ajudou a manter os níveis das atividades agropecuárias e os empregos rurais.
Tem-se no seguro agrícola um instrumento para minimizar os riscos e prejuízos da produção, na medida em que, segundo Buainainet et al. (2014, p. 843), “ele protege as atividades agropecuárias contra fenômenos climáticos adversos e é indispensável à estabilidade de renda”. No que concerne à comercialização da produção familiar, dois instrumentos foram de grande importância por facilitá-la: o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Mais que um elo entre a produção e o combate à fome, o PAA representa uma garantia de mercado para a agricultura familiar, uma vez que o Governo Federal adquire diretamente dos produtores alimentos cujos preços correspondem aos praticados nos mercados regionais (BRASIL, 2010), constituindo potencial instrumento de investimento pelos agricultores familiares mais organizados (BUAINAIM et al., 2014).
No que diz respeito à assistência técnica, é principalmente pela atuação da extensão rural que a transmissão, disseminação e mediação de novos conhecimentos e técnicas relacionados à produção agropecuária, se concretizam. Aos extensionistas e agentes de desenvolvimento cabe a tarefa de mediação entre pesquisa/pesquisadores, instituições financeiras e agricultores familiares (BRASIL, 2010; MDA/CONDRAF, 2012).A importância dos serviços de assistência técnica e extensão rural é evidenciada por Abramovay e Veiga (1999) não apenas na elaboração dos Planos Municipais de Desenvolvimento Rural, mas, principalmente, na mediação entre os agricultores e os bancos e na elaboração dos projetos técnicos que se converterão em créditos.
As modificações no Pronaf, conforme afirmam França, Marques e Del Grossi (2016), resultaram na expansão do montante de crédito disponível, na redução das taxas de juros, na ampliação dos recursos e dos beneficiários mediante a elevação do teto da renda, a inclusão de novos segmentos e a criação de linhas de crédito para diferentes públicos e atividades.
Os benefícios do programa, tanto para os agricultores familiares quanto para o país, são reconhecidos. Porém, no que diz respeito ao acesso e à aplicação dos recursos, etapas que envolvem a assistência técnica e o agente financeiro, parecem persistir algumas dificuldades que podem interferir na eficácia do programa. Partindo desses pressupostos, buscou- se, neste estudo de natureza exploratória, integrar as abordagens quantitativa e qualitativa para avaliar o processo de tomada do crédito do Pronaf, a aplicação e os resultados do crédito no município de Unaí/MG.
Acredita-se que os resultados do estudo podem contribuir para a melhoria dos processos nos níveis das Ater e do agente financeiro, fornecendo novos aportes para a reformulação dos processos e das políticas direcionadas aos agricultores familiares.
Método
De natureza exploratória, este estudo envolveu dados quantitativos e qualitativos relacionados ao processo de tomada do crédito do Pronaf, aplicação e resultados do crédito, desmembrados em indicadores de análise. Os dados quantitativos foram obtidos mediante aplicação de questionários em um grupo de 31 (trinta e um) agricultores familiares, sendo 10 (dez) do Grupo A–A/C (assentados) e 21 (vinte e um) do Grupo V (agricultores familiares) do município de Unaí/MG, beneficiados pelos recursos do Pronaf no ano-safra 2014/2015, por ocasião de visitas realizadas em seus estabelecimentos.
O instrumento abarcou os seguintes indicadores: 1) elaboração do projeto; 2) adequação do projeto; 3) assistência técnica; 4) gerenciamento do crédito; 5) adequação do crédito; e 6) resultados do Pronaf. Os indicadores privilegiados na pesquisa foram selecionados considerando os objetivos do estudo e os problemas e dificuldades identificados no levantamento bibliográfico e nos trabalhos revisados no decorrer da sua construção.
Para operacionalizar os indicadores, foi necessário defini-los de forma a melhor compreendê-los, passo que, segundo Pasquali (1999), requer a conceituação clara e precisa dos fatores para os quais se deseja construir o instrumento de medida, que terá como produto as definições constitutivas e operacionais dos conceitos. Posteriormente, cada indicador foi operacionalizado de modo a constituir um conjunto de oito afirmações positivas, perfazendo 48 itens que foram respondidos utilizando uma escala do tipo Likert com cinco opções de resposta, variando entre “discordo totalmente” e “concordo totalmente”.
Os dados qualitativos resultaram de seis entrevistas, das quais quatro foram realizadas com os representantes de empresas de Ater atuantes no município de Unaí/MG (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais – Emater, duas empresas credenciadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra e uma empresa privada) e dois representantes do Banco do Brasil.
Para compilação dos dados obtidos com os agricultores familiares, foi utilizado o programa Excel e, para fins de tratamento e análise dos dados qualitativos, as respostas às inquisições obtidas por meio das entrevistas foram agrupadas em categorias e tratadas por meio da análise de conteúdo, o que, de acordo com Bardin (2011), permite tomar decisões e tirar conclusões a partir da organização dos dados.
Resultados
A pesquisa foi realizada no município de Unaí/MG, que se situa no entorno do Distrito Federal. O município possui sua economia baseada, desde sua criação, na agricultura e pecuária, sendo um dos maiores produtores de grãos do Brasil com destaque para o feijão, o milho e a soja. Na pecuária, o destaque se dá aos rebanhos leiteiro, quinta maior bacia do estado de Minas Gerais, e de corte com produção destinada ao mercado interno e externo (PREFEITURA MUNICIPAL DE UNAÍ, 2016).
Ressalta-se que o município de Unaí/MG é emblemático por sua história, no que concerne às políticas de distribuição de terras e de desenvolvimento da agricultura brasileira, e uma de suas características é a forte concentração de assentamentos da reforma agrária. (XAVIER et al., 2009). Há de se considerar também que as características edafo climáticas da região, a quantidade de terras agricultáveis e o interesse do governo em fortalecer e implementar tecnologias para desenvolvimento das áreas de cerrado atraíram imigrantes de diferentes regiões do país por ocasião da implementação do Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer)3 e, atualmente, a convivência entre grandes e pequenos produtores garantem ao município representatividade econômica no agronegócio brasileiro.
Análise dos indicadores operacionais do Pronaf
No “Indicador Elaboração do Projeto” buscou-se avaliar o processo interacional entre o agricultor familiar e o agente de Ater na procura de soluções que melhor atenderiam às necessidades do demandante do crédito e se houve problemas que retardaram a liberação e o acesso ao recurso.
Os dados apresentados na Tabela 1 apontam que os agentes de Ater assumem papéis importantes na elaboração dos projetos, atuando como informadores, comunicadores, orientadores e intermediadores do crédito. Nota-se que a maior parte dos agricultores familiares tem inteira confiança no trabalho desses profissionais, uma vez que parte significativa dos pesquisados (52%) não teve acesso ao projeto antes da entrega ao banco, e a entrega em 81% dos casos foi feita pelos próprios técnicos. Os papéis e a importância dos serviços de assistência técnica e extensão rural na elaboração dos Planos Municipais de Desenvolvimento Rural e, principalmente, na elaboração dos projetos técnicos exigidos na solicitação dos recursos e na mediação entre os agricultores familiares e os bancos são destacados por Abramovay e Veiga (1999).
Os dados também apontam que os agricultores pesquisados dos dois grupos veem o processo como burocrático, o que pode ser atribuído às dificuldades de apresentação dos documentos, à necessidade de retornar aos técnicos diversas vezes e à demora na elaboração dos projetos. Também os agentes de Ater percebem o processo como burocrático e demorado, o que se agrava pelas dificuldades de articulação, a pouca experiência e o desconhecimento de muitos agricultores familiares acerca da política que “definham por falta de conhecimento” [Representante Ater credenciado pelo Incra], situações que os atores envolvidos no processo atribuem, à deficiência e às divergências na comunicação entre os órgãos articuladores, os atores diretamente envolvidos no processo e os beneficiários do crédito, que “geralmente é feita de boca em boca” [Representante da Ater privada] e à dependência de documentos de outros órgãos, a exemplo de projetos dos beneficiários do Grupo A–A/C encaminhados ao Incra, que dependem da aprovação do órgão para encaminhamento ao agente financeiro.

Bianchini (2015) defende que há muito a avançar no sentido de qualificar as políticas de Ater para melhoria dos processos. Para Pinheiro (2009), a organização dos atores locais pode transformar uma determinada região, e, na perspectiva do Pronaf, a atuação destes atores amplia a base social do Programa alavancando a inclusão dos agricultores familiares no universo do sistema de crédito rural (PINHEIRO, 2009; BIANCHINI, 2015).
No “Indicador Adequação do Projeto” buscou-se avaliar a influência dos técnicos na atividade produtiva dos estabelecimentos, bem como a adequação do projeto às necessidades, às potencialidades e às expectativas dos demandantes do crédito.
Os dados da Tabela 2 demonstram que os técnicos podem persuadir os agricultores familiares, principalmente aqueles que integram o grupo A–A/C, influenciando-os na forma de aplicação dos recursos, o que reforça a confiança dos pesquisados no trabalho dos profissionais de Ater.

Com relação à influência exercida sobre os agricultores familiares, na forma de utilização dos recursos, os agentes de Ater alegaram a necessidade de atender às diretrizes do agente financeiro local, que em grande medida prioriza os projetos de menor risco, a exemplo da pecuária leiteira, por garantir ao agricultor familiar renda mensal previsível, conforme relato: “[...] infelizmente os bancos têm uma grande dificuldade de liberar crédito a não ser pra vaca [...] ele não pode fazer pra horta, piscicultura porque o banco entende que isso não tem viés de valor” [Representante Ater credenciada pelo Incra]. Percebeu-se, com base em alguns depoimentos dos Ater, que podem ser sintetizados na verbalização “[...] temos que desenhar e apresentar um projeto que seja aceito pelo banco” [Representante de Ater credenciada pelo Incra], que direta ou indiretamente os técnicos podem influenciar o agricultor na forma de utilização do recurso.
Embora 94% dos pesquisados tenham informado que executaram o que foi planejado e que o projeto atendeu ao que queriam fazer no estabelecimento, aproximadamente (30%) dos participantes responderam que o recurso previsto no projeto foi insuficiente para fazer o que tinham planejado e que tiveram dificuldades na execução do projeto, o que certamente compromete o resultado esperado. O fato de parte significativa dos pesquisados (48%) não ter uma cópia do projeto encaminhado ao banco, além de demonstrar excessiva confiança nos profissionais de Ater, comprova o desconhecimento do teor dos contratos, o que pode comprometer a execução do que foi projetado.
Afora as questões levantadas na análise deste indicador, as empresas de Ater assumem papel estratégico, já que, conforme dispõe o MCR, buscam, com os produtores, suas famílias e organizações, soluções adequadas para os problemas de produção, gerenciamento, beneficiamento, armazenamento, comercialização, bem-estar, preservação ambiental, entre outros (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2016).
Ainda no que concerne ao “Indicador Adequação do Projeto”, deve-se ressaltar que, no caso dos agricultores familiares do Grupo A–A/C, houve entendimento, principalmente entre os Ater credenciados pelo Incra, de que os valores precisavam ser revistos “para compensar o trabalho e, de fato, dar o retorno esperado para o agricultor” [Ater credenciado pelo Incra] e que nas operações de custeio o processo precisava ser melhorado para torná-lo menos demorado, devendo ter o mesmo regramento tanto para os assentados (Grupo A–A/C) quanto para agricultores familiares (Grupo V).
No “Indicador Assistência Técnica”, cujos dados são apresentados na Tabela 3, buscou-se avaliar a prestação dos serviços das empresas de Ater nas fases de elaboração e execução dos projetos e a percepção dos agricultores pesquisados acerca do trabalho dos técnicos.
Os dados apresentados na Tabela 3 apontam insuficiências na assistência durante a execução dos projetos, até mesmo entre os agricultores do Grupo A– A/C assistidos pelos escritórios credenciados pelo Incra, indicando lacunas no cumprimento das determinações contidas na Chamada Técnica do órgão. A insuficiência e a ineficiência da assistência técnica são recorrentes no âmbito do Pronaf, o que se deve, comumente, à incapacidade das empresas de Ater públicas e privadas em atender às demandas locais e regionais (CARMO, 2015; ROCHA, 2008; RODRIGUES, 2013; SERENO, 2012; TAVARES, 2010).
Tabela 3– Percepções dos agricultores familiares acerca de Assistência Técnica
Fonte: Dados da pesquisa (mai.-jul. 2016).

As empresas de Ater credenciadas pelo Incra, participantes deste estudo, explicaram que há casos em que o projeto é elaborado, encaminhado ao Incra e, posteriormente, ao agente financeiro, e que, em razão da demora na liberação dos recursos, os contratos de Ater com o Incra expiram, não são renovados nas mesmas condições e, portanto, pode acontecer de o assentamento deixar de ser assistido, impossibilitando a assistência devida na execução do projeto.
O relato do representante da Emater, órgão que nos últimos cinco anos atende principalmente aos agricultores familiares do Grupo V, .hoje nós temos problemas graves de pessoal para fazer melhor, mas esse escritório já foi referência em assistência técnica por muito tempo” demonstra certa preocupação do entrevistado com a qualidade dos serviços prestados atualmente e explica, em parte, o não recebimento e a dificuldade em receber assistência técnica apontada por (71%) dos agricultores familiares pesquisados e a insuficiência da assistência técnica recebida na execução do projeto apontada por 81% dos participantes da pesquisa.
Os dados apresentados na Tabela 3 reforçam a incapacidade das empresas de Ater em atender à demanda local, como já mencionado, mas, por outro lado, o relato “nem tudo que orientamos é seguido pelo agricultor... tem pouca adesão nas capacitações e nos cursos... e o nosso maior desafio é transformar o pequeno produtor em um grande conhecedor” [Representante de Atercredenciado pelo Incra] sinaliza o pouco interesse dos agricultores familiares pesquisados em participar dos cursos, treinamentos e capacitações oferecidos pelas empresas de Ater, o que confirma os resultados apresentados na Tabela 3.
Rodrigues (2013) ressalta a importância das Aters no aperfeiçoamento dos sistemas de produção, na capacitação dos produtores, na orientação quanto às técnicas de manejo e nos mecanismos de acesso ao crédito.
Realce deve ser dado ao número de observações acerca das orientações feitas pelos técnicos de extensão rural, em que se nota que os agricultores pesquisados se mostram relativamente indiferentes às orientações recebidas dos técnicos, contrariando a confiança manifestada nos indicadores “Elaboração do Projeto” e “Adequação do Projeto”.
Esses resultados confirmam os depoimentos dos agentes de Ater pesquisados, que relatam resistência do agricultor familiar da região em acatar as orientações dos técnicos, e também em adotar novas tecnologias que tornariam os estabelecimentos mais produtivos e rentáveis.
Bianchini (2015) reforça a necessidade de qualificação das políticas de Ater, em apoio ao Pronaf, a fim de se orientarem para o fortalecimento e a sustentabilidade dos empreendimentos familiares. Na mesma direção, a conjugação do apoio técnico e financeiro, segundo Schneider, Mattei e Cazella (2004), intenciona fortalecer a capacidade produtiva dos agricultores familiares, gerar emprego e renda nas áreas rurais e melhorar a qualidade de vida das famílias, ou seja, o desenvolvimento rural sustentável por meio do fortalecimento da agricultura familiar, conforme preconiza o MCR.
No “Indicador Gerenciamento do Crédito, “cujos dados são apresentados na Tabela 4, foram avaliados os aspectos relacionados ao papel do agente financeiro na intermediação dos recursos do Pronaf e a relação entre instituição financeira e agricultores familiares.

A análise dos dados apresentados na Tabela 4 evidencia um distanciamento entre os demandantes do crédito e o agente financeiro. As deficiências na comunicação e divulgação do Programa aos demandantes do crédito são nítidas. Diferentemente das Aters, de modo geral, o agente financeiro esquiva-se da responsabilidade de orientar os agricultores familiares sobre a documentação exigida, as condições e os benefícios financeiros do Pronaf.
Embora o Banco do Brasil seja reconhecido pelo seu papel na operacionalização dos créditos ao setor rural, e de modo especial sob o amparo do Pronaf, os dados apresentados na Tabela 4 corroboram com as percepções dos agentes de Ater acerca da postura adotada pelo agente financeiro que pode ser sintetizada nas verbalizações: “[...] como principal agente oficial de intermediação dos recursos do Pronaf há pouco interesse do agente financeiro local pelas causas dos agricultores familiares” [Representante da Emater], inclusive no que concerne ao direcionamento para as operações de menor risco, e a preferência por agricultores mais capitalizados e capazes de gerar melhores resultados financeiros ao agente financeiro: “[...] o BB tem interesse em atender bem os que estão bem financeiramente [...] existe uma resistência bancária que condiciona a liberação do recurso a outra operação de compra de produtos que são negociados pelo banco” [Ater credenciado pelo Incra].
A preferência do agente financeiro pelas operações dirigidas à pecuária, mais tradicionais e de baixo risco, que conferem maior rentabilidade ao banco, aponta para o estabelecimento de relações de interesses e para a mercantilização dos serviços bancários abordados nos estudos de Abramovay e Veiga (1999).
Quando entrevistados, os representantes do Banco do Brasil argumentaram que “o Pronaf é um negócio como outro qualquer” e que a relação entre banco e agricultores familiares propicia ganhos às duas partes e, na medida em que fideliza o cliente, o agente financeiro tem o benefício do volume dos negócios. A observação do agente financeiro reforça a informação do representante da Emater acerca do pouco interesse pelas causas dos agricultores familiares.
Rodrigues (2013) explica que, a priori, os bancos definem a regra da execução das políticas a partir de interesses próprios, econômicos e políticos, esquecendo-se que o estreitamento dos laços entre o agente financeiro e o agricultor familiar e a qualificação dos projetos tornam o crédito mais efetivo, principalmente quando ele vai ao encontro da vocação familiar.
Em complemento, Haag (2009) afirma que o objetivo do Pronaf de promover o desenvolvimento rural mediante a valorização da agricultura familiar esbarra na lógica bancária, que prioriza os projetos com menor risco bancário e melhor desempenho econômico.
No “Indicador Adequação do Crédito” foi avaliado se o recurso liberado foi aplicado corretamente e se as condições do crédito atenderam às necessidades e às expectativas dos pesquisados. Os dados apresentados na Tabela 5 demonstram que o recurso se ajustou às necessidades de pouco mais de 60% dos agricultores familiares pesquisados, com ressalva para a facilitação à entrada no mercado e ao prazo para a liberação do recurso, que tiveram índices de concordância de apenas 16% e 32%, respectivamente.

Embora a maioria dos pesquisados (97%) tenha concordado que as condições do crédito (prazos) atenderam à sua capacidade de pagamento, a liberação dos recursos nem sempre ocorreu na hora esperada.
A despeito dos atrasos na liberação dos recursos pelos agentes bancários, Costa, Zani e Castanhar (2011) argumentam que esses atrasos acabam por criar um descompasso no calendário agrícola, prejudicial ao desempenho da agricultura familiar.
Para um Ater, “a má distribuição dos recursos e a distribuição fora de época comprometem os resultados do Pronaf” [Representante Ater credenciado pelo Incra] e, de forma geral, o atraso na liberação dos recursos foi atribuído “à incapacidade de atendimento do agente financeiro às demandas do município, em razão do reduzido número de empregados alocados no setor do crédito rural. [Representante da Emater]. Um dos Ater pesquisados também assumiu que “o atraso na liberação do recurso pode levar o agricultor familiar a descumprir o contrato, utilizando o recurso para outras finalidades” [Representante Ater credenciado pelo Incra].
É pertinente destacar que, para 35% dos pesquisados, os recursos liberados não foram suficientes para executar o planejado, e que o limite que lhes era permitido acessar não correspondeu ao que precisavam. Esses resultados reforçam a necessidade de revisão das faixas dos valores permitidos nos diferentes grupos do Pronaf, sugerida pelos agentes de Ater.
Por outro lado, a maioria dos pesquisados (84%) concordou que os recursos liberados ajudaram na execução das atividades no estabelecimento e 77% deles concordaram que o uso do recurso permitiu o aumento da produção, mesmo que, para a maior parte, o recurso não tenha facilitado o acesso aos mercados.
A correlação positiva do crédito com o volume produzido, o auxílio na execução das atividades no estabelecimento e a melhoria no planejamento da produção foi encontrada nos estudos de Rodrigues (2013), realizados nos municípios de Caiuá e Teodoro Sampaio/SP e de Sereno (2012), na região do entorno de Brasília/DF.
Com relação à inserção dos agricultores familiares no mercado, o representante da Emater argumentou que a produção e a comercialização coletiva podem facilitar e incrementar o acesso a circuitos comerciais, porém “essas práticas são pouco usuais entre os agricultores familiares no município de Unaí/MG” [Representante da Emater], o que pode estar relacionado com as “disfunções nas organizações das associações comunitárias e associações dos produtores” [representante Ater privada] apontadas pelo entrevistado.
No “Indicador Resultados do Pronaf”, cujas arguições estão dispostas na Tabela 6, buscou-se avaliar os impactos dos recursos do Pronaf, principalmente, na família agricultora familiar.
Tabela 6– Percepções dos agricultores familiares acerca dos Resultados do Pronaf
Fonte: Dados da pesquisa (mai.-jul. 2016).

Embora a maioria dos pesquisados (94%) tenha concordado que o recurso do Pronaf propiciou melhorias na vida do grupo familiar e ajudou a melhorar a renda, parte significativa da amostra se mostrou indiferente. Quando perguntados se o Pronaf trouxe oportunidades de trabalho para o grupo familiar e se o recurso os ajudou a produzir com mais qualidade, o índice de concordância nas duas arguições foi de 13%. Ressalta-se também que apenas 39% afirmaram que o recurso ajudou a manter a família no estabelecimento. Infere-se assim que a melhoria na vida do grupo familiar e na renda que apresentaram índices de concordância superiores a 90% deve-se ao aumento da produção, que também obteve o mesmo índice de concordância (94%) no grupo pesquisado.
A respeito da manutenção da família no campo, Carneiro e Castro (2007, apud DALCIN; TROIAN, 2009) explicam que as opções profissionais e de trabalho remunerado no meio urbano e as dificuldades da atividade agrícola se colocam, respectivamente, como fatores de atração para o meio urbano e expulsão do jovem do campo.
Ao analisar os dados dispostos na Tabela 6, percebe-se que os agricultores pesquisados não veem no aporte financeiro do Pronaf uma oportunidade de diversificar a produção nos estabelecimentos familiares. Acredita-se que este resultado tenha relação com o tradicionalismo dos agricultores familiares da região que, desde sempre, tiveram a atividade pecuarista como principal fonte de renda e com a preferência do agente financeiro em liberar recursos para atividades de menor risco. Na concepção de Gazolla e Schneider (2013), os problemas estruturais institucionalizados limitam a evolução do Pronaf e sua eficiência como instrumento de promoção do desenvolvimento rural por conduzir à especialização produtiva, à mercantilização das unidades familiares e à fragilização social.
Os representantes da Emater e de um dos escritórios credenciado pelo Incra mostraram-se preocupados com a concentração dos recursos apenas na atividade pecuária, e com a indisposição do agente financeiro em liberar recursos em diferentes linhas de financiamento disponíveis no Pronaf. A argumentação “tem outras formas de Pronaf que a gente até tenta, mas junto ao agente financeiro tem uma certa dificuldade [...] aqui no município de Unaí nunca conseguimos que o banco aprovasse um Pronaf Mulher, um Pronaf Jovem... e são políticas importantíssimas para a inclusão dessas classes lá no processo produtivo da propriedade” [Representante da Emater] evidencia a concentração do crédito em operações tradicionais e também a possibilidade de expansão do programa a outros públicos. Ressalta-se que na Safra 2014/2015, entre os oitocentos e setenta e um (871) contratos firmados no município de Unaí/MG, apenas dezessete (17) não tiveram como destino a atividade pecuária (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2016b, MATRIZ DE DADOS DO CRÉDITO RURAL); e, segundo os Ater e o próprio representante do Banco do Brasil, à exceção de uma operação realizada com um pescador artesanal pesquisado neste estudo, todas as operações realizadas na referida safra foram dirigidas às atividades agrícolas e pecuárias nas modalidades custeio e investimento.
Apesar das limitadas condições de atendimento às demandas dos agricultores do município, impostas principalmente pelo reduzido quadro de pessoal, a Emater, segundo seu representante, tem orientado suas ações para a transferência de conhecimento e tecnologia entre os agricultores familiares e a obtenção e aplicação dos recursos a eles destinados sob o amparo do Pronaf, contribuindo assim com a implementação de políticas voltadas ao desenvolvimento territorial e à educação do campo, bem como de políticas diferenciadas dirigidas para públicos específicos da agricultura familiar, como as mulheres, os jovens, os ribeirinhos, os pescadores artesanais, dentre outros (MDA/CONDRAF, 2012).
Embora a maioria dos pesquisados tenha discordado que o recurso do Pronaf tenha propiciado oportunidades de trabalho para o grupo familiar, ajudado na diversificação da produção, na melhoria na qualidade dos itens produzidos e que tenha auxiliado na manutenção da família no estabelecimento, houve entendimento entre os agricultores familiares pesquisados que o Pronaf é bom para o progresso no campo e, para os entrevistados, ele responde pela segurança alimentar da população local e pela dinâmica econômica do município.
Considerações finais
O delineamento deste estudo baseou-se na concepção de que a formatação do Pronaf, como política pública de apoio creditício aos agricultores familiares, é um importante instrumento de inclusão dessa categoria social no processo produtivo.
Envolvidos diretamente na operacionalização do Pronaf, os agentes de Ater assumem papéis importantes na elaboração dos projetos, atuando como informadores, comunicadores, orientadores e intermediadores do crédito.
De modo geral, apesar dos tropeços na fase de elaboração dos projetos, atribuídos, principalmente, às dificuldades de apresentação dos documentos, à necessidade de retornar aos técnicos diversas vezes, ocasionando o atraso na elaboração dos projetos, o trabalho desses profissionais tem o reconhecimento e o respeito dos agricultores familiares e dos representantes do agente financeiro pesquisados. Eles têm, ainda, procurado trabalhar para elaborar e apresentar projetos que, ao mesmo tempo, sejam exequíveis financeiramente, atendam às necessidades e às expectativas dos agricultores familiares e às exigências do agente financeiro. Acredita-se que as dificuldades na execução do que foi planejado tenham como causa o fato de os recursos previstos no projeto serem insuficientes, com o agravante da demora na liberação do crédito pelo agente financeiro.
Apesar dos esforços das empresas de Ater, o estudo apontou índices de discordância significativos, entre os agricultores entrevistados, no “Indicador Assistência Técnica”, quer por falha na prestação dos serviços desses profissionais na execução dos projetos, quer pelo descumprimento das orientações dos técnicos por parte dos agricultores familiares pesquisados.
A avaliação menos satisfatória encontrada no “Indicador Gerenciamento do Crédito”, refere-se aos intermediadores financeiros, o que sinaliza pouca preocupação do agente financeiro oficial local com as causas dos agricultores familiares do município. Além de os agricultores perceberem o processo como burocrático e demorado, é nítido que a comunicação entre o agente financeiro e os agricultores familiares é pouco efetiva, ficando mais a cargo dos agentes de Ater informar e divulgar o Programa e as condições do crédito aos beneficiários. Acredita-se que as deficiências na comunicação, da parte do agente financeiro, limitam o alcance do Pronaf, principalmente quando se leva em consideração o número de agricultores familiares e de famílias assentadas e o limitado número de empresas de Ater que prestam serviços no município.
O “Indicador Adequação do Crédito” obteve resultados satisfatórios, embora para a maioria dos pesquisados o recurso não tenha favorecido a inserção comercial, além de ter sido liberado em momento inoportuno, prejudicando o desempenho da produção familiar. O fato de parte significativa dos agricultores pesquisados ter afirmado que os recursos liberados não foram suficientes para executar o planejado e para atender as suas necessidades, sugere a necessidade de revisão nas faixas de valores praticadas no âmbito do Pronaf.
Ainda assim, o Pronaf tem propiciado a melhoria nas condições econômicas e sociais dos agricultores familiares pesquisados, na medida em que favorece o aumento da produção e da renda. Também para os representantes das empresas de Ater e do agente financeiro, o programa apresenta inúmeros avanços na sua trajetória e tem representatividade nos campos econômico e social, por suprir a demanda de alimentos, gerar resultados financeiros para os agricultores e para o município, além de, ao incluir os agricultores familiares no processo produtivo, contribuir para a melhoria da qualidade de vida das famílias que se mantiveram no campo. As análises aqui apresentadas, independentemente dos objetivos e motivações que as conduziram, podem de alguma forma sustentar futuras ações dos atores locais relativas às políticas de crédito rural e, principalmente, ao Pronaf, na medida em que os resultados apresentados evidenciam, claramente, que o programa ainda pode e deve ser melhorado e ampliado na direção da concretização dos seus objetivos.
Acredita-se que o compartilhamento, a divulgação e a publicação dos resultados auferidos por trabalhos realizados no meio acadêmico, a exemplo dos que foram revisados nesta pesquisa, podem suscitar o interesse da sociedade e dos formuladores das políticas por um desenvolvimento mais igualitário.
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Notas