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Recepção: 02 Julho 2019
Aprovação: 07 Agosto 2019
Publicado: 01 Outubro 2019
DOI: https://doi.org/10.26512/patryter.v2i4.22999
Resumo: O presente artigo aborda uma nova forma de conceber o conceito de Patrimônio Cultural, a partir da Fenomenologia. Posteriormente, apresenta parte dos resultados de pesquisa defendidos na tese de doutorado que teve como estudo de caso a cidade de Sabará, no estado de Minas Gerais, Brasil. Partindo da visão tripartida do homem - como corpo, alma e espírito - cultura e valor são categorizados como espirituais, ou seja, como parte da faceta mais elevada da existência humana. Sendo assim, o patrimônio, para ser cultural, é preciso se relacionar com o homem em seu estágio mais elevado, de modo a atuar como um bem de formação, que tem papel transformador e humanizador. Buscou-se, em pesquisa a totalidade da cidade de Sabará, identificar os patrimônios culturais realmente existentes, isso quer dizer, aqueles que representam a valoração afetiva dos moradores. Nem todos os bens tombados, ou seja, oriundos de um processo de valorização patrimonial, estão inseridos no mundo espiritual dos moradores da cidade. Portanto, catalogamos três tipos de patrimônios culturais: ativos, invisíveis e excluídos.
Palavras-chave: Patrimônio cultural, bens de formação, mundo espiritual, valorização patrimonial, valoração afetiva.
Resumen: El presente artículo aborda una nueva forma de concebir el concepto de Patrimonio Cultural, a partir de la Fenomenología. Posteriormente, presenta parte de los resultados de investigación presentados en la tesis de doctorado que tuvo como estudio de caso la ciudad de Sabará, en el estado de Minas Gerais, Brasil. A partir de la visión tripartita del hombre - como cuerpo, alma y espíritu - cultura y valor son categorizados como espirituales, o sea, como parte de la faceta más elevada de la existencia humana. Siendo así, el patrimonio, para ser cultural, es preciso relacionarse con el hombre en su etapa más elevada, para actuar como un bien de formación, que tiene papel transformador y humanizador. Se buscó, en investigación a la totalidad de la ciudad de Sabará, identificar los patrimonios culturales realmente existentes, es decir, aquellos que representan la valoración afectiva de los habitantes. No todos los bienes consagrados, o sea, oriundos de un proceso de valorización patrimonial, están insertos en el mundo espiritual de los moradores de la ciudad. Portanto, catalogamos tres tipos de patrimonios culturales: activos, invisibles y excluidos.
Palabras clave: Patrimonio cultural, bienes de formación, mundo espiritual, valorización patrimonial, valoración afectiva.
Abstract: The present article approaches a new way of conceiving the concept of Cultural Heritage, based on the Phenomenology. Subsequently, it presents part of the research results defended in the doctoral dissertation that had as a case of study the city of Sabará, in Minas Gerais State, Brazil. Starting from the tripartite vision of man - as body, soul and spirit - culture and value are categorized as spiritual, that is, as part of the highest facet of human existence. Therefore, heritage, in order to be cultural, must be related to man at his highest stage, in order to act as a good of formation, which has a transforming and humanizing role. The entire city of Sabará was sought to identify the cultural heritages actually existing, that is to say, those that represent the affective valuation of the inhabitants. Not all heritages inscribed, that is, derived from a patrimonial valorization process, are inserted in the spiritual world of the inhabitants of the city. Because of that, we catalog three types of cultural heritage: active, invisible and excluded.
Keywords: Cultural heritage, goods of formation, spiritual world, patrimonial valorization, affective evaluation.
Patrimônio(s) Cultural(is): Abordagem fenomenológica para estudos de patrimonialização
1. Introdução
O presente artigo é resultante da tese de doutorado defendida diante do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília. A busca empreendida durante a pesquisa reflete uma caminhada que vem sendo trilhada desde a graduação em Geografia, na mesma universidade. O objetivo é alcançar uma Geografia espiritual. Entende-se por espiritual, é importante ressaltar, os fenômenos que acontecem no nível mais alto de existência humana, ou seja, o do espírito. Nada tem a ver com espiritismo ou religiosidade, mas com a compreensão clássica do homem enquanto um ser tripartido, composto por corpo, alma e espírito. O corpo como o local das afecções sensoriais captadas por meio dos sentidos, a alma como o ambiente das emoções e o espírito como espaço do pensamento racional e da elevação do homem a graus de compreensão sobre a existência mais altos e profundos. Nesse sentido, ao empreender uma pesquisa focada em cidade histórica – Sabará/MG- iniciamos um processo de questionamento dos conceitos que balizam os estudos patrimoniais de modo a melhor guiar as análises e delinear nossas hipóteses. Tendo a Fenomenologia Steiniana como base teórica e metodológica, buscamos fazer uma criteriosa redução fenomenológica no sentido de alcançar o sentido primário de questões fundamentais como: “o que é património cultural? O que é um bem cultural? O que é valor?”. Assim, nos valendo principalmente de Edith Stein, mas também recorrendo a uma diversidade de estudiosos do âmbito cultural e patrimonial, questionamos a forma como esses termos vem sendo empenhados. Esse artigo tem como objetivo mostrar como a teoria nos norteou aos questionamentos e apresentar como empregamos essa nova forma de pensar na pesquisa prática realizada em Sabará.
Inicialmente, compreender as três facetas básicas do homem tornou-se fundamental para que posicionássemos a relação do morador da cidade histórica com os bens tombados (optamos por não trabalhar com os bens imateriais), no nível existencial adequado. A relação, ainda que dependa do corpo para a captação dos sentidos e da alma para criar emoções, é mais profunda ainda – é espiritual. Isto porque patrimônio cultural é memória, é testemunho e é o individuo e o coletivo representados por uma edificação. Em verdade, onde se diz que o patrimônio cultural é isso, na verdade se quer dizer que o patrimônio cultural deveria ser isso. Caso contrário, acredita-se que o uso do termo cultural seria dispensado. Um bem, para ser cultural, é preciso estar inserido no mundo espiritual dos indivíduos, ou seja, ser parte da existência, atuando como bem formador. Formador no sentido de transformador, de modificador de um ser humano, pois é exatamente isso que a cultura faz, ela remodela, eleva e humaniza. Bens culturais só podem ser assim denominados quando tiverem esse poder alquímico. Esta é a primeira proposição trazida ao longo da tese. Ou seja, defendemos que o uso do adjetivo cultural acompanhado de “patrimônio” ou de “bem”, não deve ser leviano, pois se a matéria oriunda de tombamento não fizer parte da vida da comunidade, ela não tem o papel transformador que a cultura impele. Embora essa conclusão pareça simplista, ela desvela a necessidade de um compromisso de conexão entre dois tipos de valor, aquele dado pelos órgãos de tombamento e aquele dado pelos moradores, que denominamos como valorização patrimonial e valoração afetiva, respectivamente.
Os termos valorização patrimonial foram usados para representar as ações de tombamento nas diversas esferas, sejam elas federais, estaduais ou municipais, e os termos valoração afetiva, para designar o envolvimento da comunidade com o bem cultural. Torna-se fundamental diferenciar os dois termos, para isso, citaremos trechos do dicionário Houaiss (2001). Valoração é “o ato ou efeito de valorar, de determinar a qualidade ou o valor de algo <av. da propriedade feita por especialistas> <av. de uma obra por seus admiradores>”. A valorização refere-se ao “aumento do valor ou do preço de algo, em virtude de ter recebido aperfeiçoamento ou melhoria, em virtude de suas qualidades intrínsecas ou raridade, ou em virtude de estar em alta o valor ou o preço de seus similares.” A valoração é, portanto, um ato de determinar o valor de algo, relativo à sua qualidade, e está ligada ao valor dado por especialistas e admiradores de uma obra. Valoração afetiva refere-se, portanto, a essa determinação de valor dentro do mundo espiritual do sujeito, como um objeto cultural. Já a valorização reporta-se a um preço ligado a uma melhoria, por isso, quando tratamos de valorização patrimonial, nos referimos as ações governamentais em prol do aumento do valor mercadológico de determinados monumentos, tanto a partir de restaurações quanto pelo uso do instrumento de tombamento (no caso, os bens imóveis). Esse valor mercadológico pode ser identificado por meio de atividades turísticas, ingressos para acesso, estímulo ao comércio local, etc. Vale ressaltar que entendemos que a valoração afetiva está muitas vezes à margem do processo de valorização patrimonial, posto que o patrimônio tem sido aplicado mais como uma imposição do que como resultado de uma experiência coletiva.
Durante a tese, não consideramos a questão turística pois nosso objetivo era compreender a relação dos diversos moradores, da totalidade da cidade, com os bens tombados. Sabemos contudo, que o bem pode atuar como cultural para o viajante, o historiador e o curioso. O objetivo, todavia, era questionar o próprio sentido de tombar um bem. Tombar pra quem? Pra que? Por causa de quê? Para manter o quê? Apenas a pedra ou também a memória? O que não se quer deixar ruir? Existe algo para ruir além das paredes desgastadas pelo tempo?
Tendo em mãos essas compreensões teóricas, iniciamos a pesquisa para compreender a relação dos moradores com os monumentos a partir da aplicação de entrevistas, questionários e caminhadas de reconhecimento. Por fim, catalogamos três tipos de patrimônio cultural: ativo, invisível e excluído. O primeiro refere-se aqueles que estão mais atuantes no cotidiano de moradores (não de todos os moradores), o segundo é designado aos que ainda são importantes aos moradores mas que foram suprimidos da paisagem (e que portanto não são tombados, mas que precisaram ser considerados pela importância que têm) e o terceiro aos bens culturais que estão inacessíveis por motivos diversos e que, por isso, geram um vazio na vida de muitos moradores.
Para melhor entendimento da cidade, optamos por fazer um cálculo de amostra com margem de erro de 3% a partir da população estimada, por setor censitário, no censo de 2010. Foi por meio da aplicação dos questionários que conhecemos as pessoas que futuramente entrevistamos, além de muitas esquinas, ruas sem saídas, fim de linhas, casas isoladas, resquícios de moradias e ladeiras. Muitas ladeiras.

O objetivo de uma pesquisa quantitativa em uma tese fenomenológica deu-se, primordialmente, pelo querer de entender o diálogo entre os lugares, em seus ritmos, redes e caminhos de uma forma que fosse possível mapeá-los. Através de um rigor metodológico seria mais crível, para nós mesmos, a complexa dinâmica existente dentro de Sabará, enquanto uma cidade histórica situada em região metropolitana – RMBH.
O questionário foi organizado em três grandes áreas: identificação da pessoa, conexões urbanas e valoração afetiva, totalizando dezoito questões com sete delas no modelo aberta. No primeiro grupo, detetamos elementos como gênero, religião, idade, tempo de moradia em Sabará e escolaridade. Na segunda área, procuramos identificar qual o local de trabalho das pessoas, assim como o tempo de permanência diária em Sabará e o contato com o centro da cidade. No terceiro grupo aproveitamos para inserir duas perguntas ligadas a patrimonialização, embora refletir sobre o patrimônio não fosse o objetivo nesse momento. Além disso, procuramos identificar as condições de vida do lugar de moradia e a importância de Sabará para o morador. A combinação dessas respostas nos deu um panorama detalhado da vida sabarense.
Após a finalização da pesquisa quantitativa, demos início as caminhadas de reconhecimento. Os objetivos que levaram a adoção dessa metodologia foram: necessidade de entrada em áreas que não pareciam seguras sem algum membro do local e aprofundamento na perceção da área. Essa técnica “procura expressar em mapas o conhecimento dos atores e observação visual direta em relação ao solo, ao relevo, a paisagem, aos usos agrícolas, aos recursos hídricos, a oferta e a disponibilidade de infraestrutura” (Buarque, 2008, p.129). O objetivo desse percurso metodológico foi compreender a situação espacial do sujeito tal como ela se manifesta.
2. Fenomenologia e Patrimônio Cultural
2.1 Corpo, Alma e Espírito
O conceito de corpo, alma e espírito, ainda que clássico e frequente em diversos estudos filosóficos, tem sido aprofundado por poucos pesquisadores das ciências sociais. Na Geografia, está no domínio da Fenomenologia e do existencialismo a discussão sobre esses conceitos. Para clarificar como pretendemos relacionar essas categorias ao estudo geográfico, faremos um breve resgate sobre suas definições e implicações. Ainda que os debates sobre eles venham desde os gregos e tenhamos um importante registro disso através do livro “sobre a alma” de Aristóteles, não é incomum encontrar confusões, principalmente ao tratar do espírito, que muitos consideram como um termo religioso e exotérico. Para o resgate conceitual, nos valeremos da Fenomenologia, dialogando também com a antroposofia.
O objetivo da Fenomenologia é a clarificação e fundamentação última de todo conhecimento, para isso, exclui tudo que é desnecessário. Todo o mundo que nos rodeia, para o método fenomenológico, está sujeito à redução fenomenológica. Diante de uma coisa, posso duvidar se ela realmente existe: será uma alucinação? O que não há dúvida é que com ela tenho uma vivência naquele momento. Portanto, sua existência não importa a Fenomenologia, mas sim a vivência do ser com o fenômeno-coisa, ou seja, a coisa enquanto fenômeno para o ser. Não se nega, portanto, a existência do objeto, mas o foco está na vivência entre o ser e esse objeto, chamado de fenômeno, e não em sua materialidade (que Edith Stein [2003a] admite a existência).
A experiência experimentada, sempre quando captada já se passou. A vida, ela mesma, não pode ser tomada.
A pessoa humana[i], possui uma estrutura tripartida: corpo, alma e espírito, todavia, Edith Stein (2003a) denomina a alma como psique. As afecções sensoriais fazem parte das vivências corpóreas. Como explica Bello (2004), temos consciência em relação ao nosso corpo, o que permite que eu distinga que algo está fora de mim a ser alcançado pelo tato. “O perceber tem necessidade de corporeidade” (Bello, 2004, p.92). É a partir do corpo que se dão as sensações. Nesse primeiro domínio da vida humana, o ser se depara com algo como um fato dado por meio dos sentidos. Ele percebe o mundo a partir do seu corpo. Assim, ele sabe se algo é quente, frio, denso, leve, amarelo, azul, barulhento, silencioso, azedo, amargo, cheiroso ou fedido. Através do corpo o homem inicia a experiência do mundo.
As vivências psíquicas, ou anímicas, são compostas pelos atos de reação. Não são por nós provocadas, mas tem um conteúdo emocional muitas vezes intenso. Quando ouvimos um barulho forte podemos ter medo. É uma espécie de avaliação imediata que conseguimos fazer. Se começarmos a refletir sobre o barulho, avaliando as possibilidades de sua origem, já estaremos imersos nas vivências espirituais. Nas vivências psíquicas estão os sentimentos/estados vitais: ânimo, cansaço, alegria, tristeza, medo, coragem, etc. A psique revela a emoção gerada pela sensação. Nessa faceta da existência humana, cria-se o próprio mundo interior. Vale ressaltar que “a corporalidade se torna o alicerce do anímico”, no sentido de que sem os sentidos não é possível construir emoções. (Steiner, 2004, p.13)
No âmbito do espírito, o ser pensa, reflete, compreende, decide e valora. Quando tratamos de vivências sensoriais, ou seja, corpóreas, vigora uma relação de causalidade. Algo causa um efeito. Nas vivências psíquicas, por tratarem-se de sentimentos vitais, há ainda uma causa que gerou um efeito. É só a partir das vivências espirituais que a motivação se estabelece como uma base de controle individual e social, que determina o viver do ser como liberdade de escolhas. “O elemento anímico do homem não é determinado somente pelo corpo. O homem não vagueia sem direção e sem objetivo de uma impressão sensorial a outra [...] ele reflete sobre suas perceções e sobre suas ações.” (Steiner, 2004, pp.13-14). Desse modo, ao refletir, o homem alcança o nível espiritual. Nesse sentido o elemento anímico tem tanto a necessidade das leis do corpo quanto das leis do pensamento – que regem a faceta espiritual do homem. “O homem é, assim, cidadão de três mundos. Por meio de seu corpo, pertence ao mundo que ele percebe com esse mesmo corpo; por meio de sua alma, edifica para si seu próprio mundo; por meio de seu espírito se lhe manifesta um mundo elevado acima dos outros dois” (Steiner, 2004, p.12). Esse mundo elevado oriundo da capacidade reflexiva é possível pelo distanciamento que se faz do fato como dado para a análise do fato. O ser revive a experiência presente da vida através do pensamento e constitui memória, imagina, valora – habita o mundo como nenhum outro ser habita.
2.2 Formação humana e bens culturais
Edith Stein, além de filósofa e freira carmelita, sempre foi educadora, principalmente de mulheres. Isso foi fundamental para o seu aprofundamento filosófico, visto que se dedicou imensamente à formação humana e ao sentido primeiro desse formar. Para compreender melhor o seu conceito de formação e como ele se relaciona com a estrutura tripartida do homem e o patrimônio cultural, é preciso revisitar os tipos de matéria que existem.
De acordo com Edith Stein (2003b), matéria é tudo o que não está inteiramente formado, mas que pode tomar alguma forma. O não inteiramente formado refere-se aquilo que embora ainda possa se formar, não é amorfo. A única matéria amorfa é Deus. Portanto, sempre nos deparamos com algo com forma, esteja em formação ou completamente formado. Existem dois tipos de matéria: inanimada e animada, sendo que a primeira é a mais suscetível a ser formada, posto que os objetos estão ausentes de vontade própria ou motivação. Os patrimônios imóveis tombados estão nessa classe de matéria.
As matérias animadas são divididas em vegetais e animais, sendo que dentro do segundo reino há distintos níveis e o mais alto deles é o humano. A matéria animada tem uma formação interior e exterior, pois tem uma alma que a anima. Se nenhuma intervenção externa for feita em uma planta, ela não ficará inerte, pois continuará a se desenvolver pela energia vital interna que possui. A alma é o princípio vital interior, invisível e misterioso. Contudo, a planta também pode sofrer formações externas como a jardinagem e o paisagismo, além da ação formativa de fenômenos naturais como a chuva, a fertilidade do solo, etc.
Os animais também possuem alma, contudo há uma diferença pois: “ella puede disponer, em cierto modo, de la matéria organizada desde dentro del cuerpo, es decir, puede moverlo, y como consecuencia puede procurarse la matéria em um ambiente mas amplio” (Stein, 2003b, p.182)[ii]. A possibilidade do movimento é típica da estrutura anímica animal, que pode dispor de um mundo de alcance efetivo[iii] mais amplo que o reino vegetal. Para o ser humano esse mundo de alcance efetivo ganha uma qualificação mais profunda e uma ação mais intensa, visto que o ser humano possui o que se chama de alma racional: o espírito, como já visto. Nesse sentido, a medida que o ser habita o espaço, ele cria laços emocionais e racionais, e é capaz de ter experiências espirituais com esse espaço, como é o caso da memória, da reflexão e da valoração. Os sentidos são, portanto, os órgãos espirituais que recebem o externo, e provêm ao EU suprimentos que podem ser valorados ou não. “Lo que el conviene al alma como material estructural, es asimilado em su más profundo interior y crece con ella. Así el alma crece, se enriquece y se amplia, pero al mismo tempo crece también el mundo que explora discerniendo” (Stein, 2003b, p.183)[iv]. Alma e mundo, em interação, crescem e se desenvolvem mutuamente e compreender isso é fundamental para que o homem seja enxergado em sua condição básica – a social. A matéria animal humana se forma, portanto, não apenas pelo “sopro da vida”, que emana de dentro, mas pelos elementos externos - o mundo espiritual de alcance efetivo - com o qual o ser tem experiências, vivências corpóreas, psíquicas e espirituais.
Os objetos, quando significativos para o ser, são denominados por Edith Stein (2003b) como objetos de valor ou bens culturais. Na maioria dos casos esses bens culturais têm como fundamento um objeto material “pero lo que constituye su valor es algo espiritual; uma parte de la vida espiritual está misteriosamente prisionera em ellos, y puede ser asimilado por el alma que entra em contacto com ellos” (Stein, 2003b, p.184)[v]. De acordo com a Fenomenologia, para que um bem seja cultural é preciso que esteja inserido no mundo dos valores do ser que habita, possuindo um sentido afetivo (gemut) (Stein, 2003c). Gemut pode ser traduzido como coração, desde que não seja compreendido como algo sem razão, apenas emoção, pois o sentimento não é algo livre de conhecimento. Pelo Gemut o ser pode receber e usufruir da força formadora dos bens culturais e o reflexo disso atua tanto no próprio individuo, quanto no grupo social.
O mundo da vida do ser humano vivente é um mundo espiritual que tem no individual o que ele é no grupo, porque também é um mundo cultural e histórico. A alma individual é “como un pequeño mundo, un microcosmo, y se ha dicho que debe ser una imagen del macrocosmos, del ‘gran mundo’ [...] las ‘ideas’ y los ‘conceptos’ del espíritu en su actividad cognoscitiva eran una imagen del mundo conocido” (Stein, 2003b, p.187).
De que se trata ser histórico? Alfred Schutz (2012, p.180) alega que: “Eu sempre me encontro em um mundo historicamente dado, o qual, tanto enquanto mundo natural quanto sociocultural, já existia antes do meu nascimento e continuarão a existir após a minha morte”. Portanto, quando nascemos não adentramos em um nada, mas sim em uma cultura. A cultura para Edith Stein (2004) são as formas espirituais constituídas pelos seres humanos para sua organização social. Como exemplo tem-se as leis, a economia, as artes, o patrimônio, etc.
E de que se trata ser social? Significa ser intersubjetivo, relativo à condições normais da vida humana. Edith Stein (2004) dedica sua tese de doutorado ao conceito de empatia/entropatia, que defende como uma forma de compreensão da vida do ser humano sempre de um “eu” para um “nós”. É a identificação da humanidade no outro, um ser semelhante - um apreender imediato do outro.
Nesse sentido, os bens culturais formam os indivíduos que atuam na sociedade e influenciam o grupo social. Portanto, a formação humana é, em um determinado nível, uma formação coletiva.
2.3 Sabará: cidade patrimonializada
O que é patrimônio? Eduardo Yázigi (2003) explica que o termo patrimônio vem do latim pater e quer dizer pai, donde também se deriva o termo pátria, “era o legado do pai ao filho, aquilo que deveria servir para a geração seguinte”. (Yázigi, 2003, p.56). Vale ressaltar que essa noção de patrimônio não reside em todas as culturas e não coexiste da mesma maneira nos lugares que a adotam. Em geral, são ações em nome do amanhã, que visam salvaguardar, por meio de leis, o que se deseja manter para as gerações futuras. Além disso, o conceito surge apenas na modernidade, o que não significa dizer que as práticas de preservação de artefatos, edifícios etc., sejam tão recentes assim.
[...] as ameaças permanentes que pesam sobre o patrimônio não impedem um amplo consenso em favor de sua conservação e de sua proteção, que são oficialmente defendidas e nome dos valores científicos, estéticos, memoriais, sociais e urbanos, representados por esse patrimônio nas sociedades industriais avançadas (Choay, 2006, p.17).
O uso do termo patrimônio sem o adjetivo cultural não é acidental. A partir da perspectiva fenomenológica, o patrimônio cultural é um bem cultural, ou seja, um produto material preenchido de espírito: a cultura. Essa cultura tem um papel formador, à medida que viabiliza uma humanização (Rus, 2015).
Na base de um patrimônio cultural está sempre a experiência viva de um povo que se organiza, se estrutura, atinge tal ou qual configuração particular homogênea e se manifesta por meio de tudo o que nós definimos, justamente como bens culturais. Um patrimônio cultural é, de certo modo, uma sedimentação de experiências humanas fundadoras que tomam corpo e se objetivam materialmente em obras. (Rus, 2015, p.66).
O processo de patrimonialização de bens móveis e imóveis perpassa pelo uso do instrumento do tombamento, passível nas esferas federal, estadual e municipal. Para Dencker (2012), inspirada em Jorge Eduardo Esperança, existem duas definições principais de patrimônio: jurídicas e periciais. Ambas se pautam na definição de Unesco, de que: “O patrimônio é o legado que recebemos do passado, vivemos no presente e transmitimos as futuras gerações. Nosso patrimônio cultural e natural é fonte insubstituível de vida e inspiração, nossa pedra de toque, nosso ponto de referência, nossa identidade” (UNESCO)[vi], apoiada pelas cartas de Haia (1954), Veneza (1964) e Paris (1972). A perícia avalia o potencial patrimonial de um bem, enquanto o jurídico, baseado na análise de especialistas, define as formas legais de proteção.
Entendemos que a cultura é um processo de humanização através do qual os seres humanos inventam matrizes como a linguagem, a técnica, a arte e as ciências. Através da cultura desenvolvem características próprias e constituem um patrimônio espiritual que é, em síntese, a forma de manifestação do espírito (Rus, 2015).
[...] uma cultura não morre: antes, são as almas que ressecam por não cultivarem uma relação viva com um patrimônio cultural que, à medida que é redescoberto em toda a sua novidade e realmente acolhido, conserva o poder de renovar as almas infundindo nelas energias formativas. (Rus, 2015, p.68).
O patrimônio cultural possui uma energia formativa, contudo, pode ruir, caso não haja entre ele e o ser uma relação ativa e viva. Se ele é a sedimentação das experiências humanas em bens culturais, é o reflexo de um povo. Um bem cultural é um produto material revestido de espírito. Portanto, ser um bem de formação é ter com a pessoa uma relação íntima e afetiva e não apenas um contato de objeto externo, mas de objeto com significação interna. O patrimônio se torna cultural pelo valor que é dado a ele, pelo sentido afetivo (gemut), ou seja, a capacidade do espírito humano de entrar em contato com o mundo dos valores. “A las realidades que tienen en sí algo que les hace aptas para ser aceptadas en el interior del alma les llamamos ‘bienes’, a ese algo le denominamos ‘valor’” (Stein, 2003c, p.203)[vii].
O mundo material valorado (com sentido afetivo) é uma fonte de formação. O bem cultural, ou patrimônio cultural, é assim constituído porque reúne uma percepção afetiva (um sentimento), pelo contato do ser com o mundo dos valores. Por isso, denominamos como valoração afetiva, as vivências dos moradores sobre o bem tombado, tornando-o mais que um imóvel congelado: um patrimônio cultural.
É a simples ignorância, portanto, que leva a supor que a ligação da arte e da percepção estética com a experiência significa uma diminuição de sua importância e dignidade. A experiência, na medida em que é experiência, consiste na acentuação da vitalidade. Em vez de significar um encerrar-se em sentimentos e sensações privados, significa uma troca ativa e alerta com o mundo; em seu auge, significa uma interpenetração completa entre o eu e o mundo dos objetos e acontecimentos (Dewey, 2010, p.83).
A valoração afetiva, portanto, acentua a vitalidade e representa um ser consciente no mundo. Sem a valoração afetiva o patrimônio é coisificado, deixando de ser matéria formativa. Nesse sentido, denominamos como valorização patrimonial, as ações institucionais de tombamento e registro que produzem patrimônio, ainda que não haja garantia quanto a contemplação de um patrimônio cultural.
O estudo de caso realizado durante a pesquisa de doutorado foi a cidade de Sabará, em Minas Gerais. A região do Sabarabussu é considerada uma das primeiras habitadas no atual estado de Minas Gerais, ainda que haja algumas controvérsias. A Igreja Grande, que dava nome ao arraial, é o local onde se acredita terem surgido os primeiros povoamentos, por baianos. “Neste ‘arrayal’ com sua ‘igreija’, de que tenho notícia até 1760, eu vejo a célular máter da terra mineira” (Passos, 1942, p.158). Não apenas os povoamentos de Sabará se iniciaram dalí, mas de toda Minas Gerais. Nesta área hoje está erguida a Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição.
Sabará está dividida em quatro distritos: Carvalho de Brito, Sede, Mestre Caetano e Ravena. O município está inserido na RMBH – Região Metropolitana de Belo Horizonte - desde a formação desta, em 1973. Faz fronteira com Belo Horizonte, Santa Luzia, Raposos, Caeté, Nova Lima e Taquaraçu de Minas (conforme figura 1).

As primeiras ocupações do município, que são também as pioneiras de todo o estado, se deram nas proximidades do rio Sabará, situado no distrito Sede. Os bandeirantes nordestinos que lá chegaram, imprimiram marcas no território. Os paulistas, instigados por lendas indígenas sobre a região de Sabarabuçu, ocuparam o rio das Velhas, formando diversos arraiais que ganharam grande importância na Capitania. Nas proximidades do ribeirão Arrudas, as ocupações datam apenas do século XIX, embora se saiba de algumas fazendas anteriores a isso, restando apenas registros escritos. A bacia do rio das Velhas é berço desse território rico em minerais de ferro e ouro, desenhado por relevos mamelonados e um cerrado denso.
Para realização da pesquisa, analisamos a cidade a partir dos setores censitários estabelecidos pelo IBGE. Foram realizadas visitas a cada um dos 177 setores. Após esta etapa, aplicamos os questionários, entrevistas e caminhadas de reconhecimento.
De posse de uma visão ampla sobre a cidade, passamos para a etapa de catalogação dos monumentos e de avaliação do envolvimento dos moradores com os patrimônios tombados.
Diante dos objetivos que nos propomos na tese, focamos nos bens materiais. Sabará possui alguns monumentos históricos tombados que estão em distintos níveis de degradação e uso. Salientaremos os tombamentos oriundos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA), conforme quadro a seguir. Os bens foram organizados de acordo com o instituto responsável pelo tombamento e por zonas, estabelecidas por nós para facilitação da análise.
Os principais bens barrocos de Sabará foram tombados pelo IPHAN, embora haja algumas exceções. Três das zonas tombadas pelo instituto federal estão no distrito Sede e uma no distrito Mestre Caetano. Ravena e Carvalho de Brito foram desconsiderados pelo IPHAN. Em compensação, o IEPHA não tem nenhum bem tombado na Sede. O tombamento municipal abarca edificações que não foram salvaguardadas pelos anteriores, principalmente residências.

A primeira zona tombada pelo IPHAN, conforme o mapa, refere-se ao centro histórico e arredores, localizado na Sede. Além de bens individuais, também foi tombado o conjunto arquitetónico e urbanístico da Rua Dom Pedro II. Essa primeira zona tem três igrejas de grande porte: São Francisco de Assis, das Mercês e Nossa Senhora do Carmo. A terceira já́ foi matriz e comportou a terceira ordem do Carmo de Minas Gerais, e estima-se que seja a mais antiga ainda edificada. Além disso, na praça Melo Viana, se encontra a igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, uma ruína nunca finalizada, mantida como marco. A irmandade do Rosário foi fundada em 1713, quando ergueu-se uma pequena capela que ainda existe no interior da ruína. Estima-se que as obras da grande igreja começaram em 1767, mas os problemas financeiros embargaram a atividade por diversos momentos. A abolição da escravatura veio a romper qualquer tentativa de término. Por isso, a nave da igreja é metade finalizada e metade inacabada.
Há́ monumentos que valem por uma consagração: - as paredes inacabadas da obra monumental que os sabarenses de antanho começaram a construir no Largo do Rosário, e que hoje fazem os viandantes se deter em muda contemplação de pasmo e admiração, fazendo acudir de tropel a sua imaginação, os heróis de tão empolgante empreendimento, são argumentos irrespondíveis da indomável força do querer, do alevantado espírito de fé́ e da grandeza de sentimentos dos que nos antecederam! (Passos, 1942, p.285).
É da igreja do Rosário que partem todas as procissões em feriados católicos. Passam pela Nossa Senhora do Carmo e finalizam na matriz Nossa Senhora da Conceição. Até a primeira parada a composição paisagística de casas estilo colonial é mantida (rua Borba Gato e do Carmo), mas depois ecletiza-se com construções mais modernas, embora mais perto da rua Getúlio Vargas estejam as áreas de ocupações mais antigas.

Além da irmandade de Nossa Senhora do Rosário, também havia outras irmandades dos pretos e de pardos nos tempos de Comarca: Nossa Senhora das Mercês e São Francisco de Assis. A primeira foi construída nos inícios do século XVIII, enquanto a segunda tem registro que data de 1761, a partir da fundação da não existente mais Capela da Senhora Rainha dos Anjos.
Os pretos e os pardos, filhos de português com negras, eram em número considerável, a ponto de se reunirem em duas irmandades cada grupo: Rosário e Mercês, pretos; Amparo e São Francisco, pardos; ao passo que só em 1763, repito, os brancos começaram a erigir a sua irmandade, a do Carmo, com a sua ordem terceira (Passos, 1942, p.325).
Vale ressaltar que muitas igrejas e capelas foram destruídas, inclusive a Igreja Grande, que dava nome ao arraial, donde se acredita terem surgido os primeiros povoamentos, por baianos. “Neste ‘arrayal’ com sua ‘igreija’, de que tenho notícia até 1760, eu vejo a celula máter da terra mineira” (Passos, 1942, p.158). Não apenas os povoamentos de Sabará se iniciaram dali, mas de toda Minas Gerais. A figura a seguir é uma representação da antiga igreja Grande e seu arraial. Próximo ao Rio Sabará́, o arraial da Igreja Grande teve grande proeminência, mas a escassez de registros contribui para a manutenção do discurso colonizador paulista como o originário, elevando Borba Gato como o grande povoador. Nesta zona hoje está erguida a Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição.
Ainda na Zona 1 encontram-se dois passos, dois chafarizes e algumas residências, a maioria delas na rua Dom Pedro II. Os passos não costumam abrir nem em períodos festivos e apenas o chafariz do Kaquende ainda funciona. É possível visitar a nascente da água no alto do monte e sua estrutura é muito bonita. A todo instante os moradores chegam com garrafas para coletar água. Na verdade, vê-lo vazio é realmente uma raridade.
Assim como a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, o chafariz do Kaquende é um importante representante do patrimônio sabarense principalmente por seu valor de uso, como presença constante no cotidiano dos moradores da Sede. No caso da Igreja do Rosário, não é tanto o santuário que tem grande usabilidade, mas sim a praça Melo Viana, situada a sua frente, e onde diversos bancos recebem moradores de todas as idades diariamente, que convivem sob a paisagem da ruína. Por fim, na zona 1, é importante frisar a presença da Capela Nossa Senhora do Pilar, situada bem próxima a Santa Casa e ao museu do Ouro. Ela foi erguida em 1712 junto com o Hospício que antes existia (Passos, 1942).
A zona 2 é composta pela Igreja de Santana, no bairro Arraial Velho. O acesso não é fácil e tem pouca sinalização. Parte do caminho ainda não é asfaltado e a via é bem estreita. A Igreja já não realiza tantas atividades religiosas e a chave fica com uma moradora próxima, portanto, para adentrar é preciso encontra-la na residência. O Arraial Velho combina casas medianas com chácaras e tem uma população pouquíssimo articulada. Os casamentos e batismos que costumavam acontecer, atualmente são raríssimos.

A zona 3 reúne a matriz de Nossa Senhora da Conceição e a Igreja Nossa Senhora do Ó, a primeira é a padroeira da cidade e a segunda, o monumento histórico símbolo de Sabará(estando em todos os postais e divulgações turísticas do município). Essa área é a mais antiga ocupada, embora atualmente pareça mais nova. Com exceção de algumas casas e as igrejas, pouca coisa remete ao Brasil Colonial. Dos arraiais que tinham em volta da Igreja Grande já destruída (local da atual Nossa Senhora da Conceição), apenas uma igreja permanece. No interior da igreja, as telas e os afrescos remetem ao oriente e por isso estima-se que foram encomendadas de Macau.
Não há registros gráficos de antes de sua modificação, quando ainda não tinha a torre, contudo, é nesta morfologia de agora que ela conquistou o posto de especialíssima. “Foi num ambiente de grande afazer que se erigiu, em 1717, a capela de Nossa Senhora da Expectação, Nossa Senhora do Ó, assim chamada porque as antífonas que se cantam nas vigílias das vésperas de Natal começam todas por Ó (Passos, 1942, p.152). Algumas alterações abusivas também foram realizadas, acabando com trechos inteiros de afrescos. Ela tem estado a cada ano um pouco mais inclinada e há uma grande preocupação da população de que não resista ao tempo.
O conjunto arquitetônico da Igreja de Nossa Senhora da Lapa, em Ravena, também está em abandono, não apenas a Igreja, mas algumas casas ao redor. Estima-se, por alguns registros comerciais encontrados, que o santuário foi erguido em 1727, passando por diversas mudanças até os dias de hoje. A maior reforma aconteceu em 1853 pelo Frei Luís de Ravena, isso a elevou a condição de Matriz de Nossa Senhora da Assunção da Lapa. Para visita-la é preciso agendar, pois praticamente não fica aberta. Em 2003 foi fechada pela prefeitura por conta de goteiras, cupins e problemas estruturais.
Em 2010 sofreu nova interdição pelo corpo de bombeiros que alegou impossibilidade de uso constante. Desde então as missas ligadas a santa são realizadas na rua. As capelas do Cuiabá vivem uma situação particular, por estarem dentro dos limites da empresa Anglo Gold, não podem ser visitadas sem a autorização da mineradora.
2.4 Patrimônio(s) cultural(ais)
A tipologia foi construída a partir dos critérios abaixo listados, inspirados nas análises feitas por Everaldo Costa (2015) na cidade de Ouro Preto.
1. Acesso ao imóvel por meio de vias pavimentadas
2. Placas de sinalização no caminho ao imóvel
3. Referência do imóvel no mapa turístico principal da cidade (entregue no centro de apoio ao turista)
4. Acesso permitido para moradores e turistas. Consideramos aqui todos os imóveis que podem ser visitados, ainda que haja uma agenda específica. Por exemplo, apenas a Igreja Nossa Senhora do Ó abre as segundas feiras, todas as outras igrejas, assim como o Museu do Ouro e o Teatro não abrem, mas isso não significa que tenham acesso negado.

Esses quatro critérios resultaram em oito tipologias, conforme imagem a seguir:
De posse de todas as informações, identificamos três tipos distintos de bens, são eles:
Patrimônio cultural excluído à Bens tombados importantes para o cotidiano sabarense que são inacessíveis aos moradores, dificultando a perpetuação de seu valor afetivo para as gerações futuras.
Patrimônio cultural invisível à Bens já demolidos que ainda permanecem vivos na memória de muitos moradores, principalmente os mais antigos.
Patrimônio cultural ativo à Bens tombados com maior presença no cotidiano dos sabarenses e que possuem valor de uso permanente.
Denominamos como patrimônio cultural invisível (ver figura 6) aqueles que possuem valor afetivo e memorial, mas que foram suprimidos da paisagem. Para compreensão disso trabalhamos com o conceito de paisagem na memória[viii]. De acordo com Simon Schama (1996, p.17), “[...] a paisagem é obra da mente. Compõe-se tanto de camadas de lembranças quanto de estratos de rochas”. Com essa afirmativa o autor demonstra que a paisagem conserva não apenas o visível, mas também o memorial, os extratos de lembrança que compõem a vida do ser, as experiências vividas.

A história está viva aqui ainda, o Santinho ainda estava vivo e comentou como funcionava a fábrica do Marzagão. Gente, a história, o que interessa não é o prédio estar inteiro, mas que a memória ainda está viva na memória e estamos aqui junto com as crianças contando isso (NLD, 2016)
Concordando com essa fala de NLD (2016), moradora da Vila Eliza, procuramos listar os bens vivos na memória. Nesse grupo inserimos a Igreja de Santa Rita, na atual praça do coreto, no distrito Sede; a estação de trem General Carneiro; o antigo bairro Cuiabá próximo ao Pompéu; e o Coreto da Vila Eliza, próximo a Vila Marzagão. A Igreja de Santa Rita é comentada por diversos moradores como uma das preciosidades que havia na cidade. Zoroastro Passos (1942) comenta sobre a igreja dedicada a santa que era devoto:
Nascido ao pé de Santa Rita na rua do fogo, quase de fronte do passo que teve a mesma sorte que o destino a ela reservara; nela batizado, criado na rua Direita, a dois passos da capela; aí tendo feito minha primeira comunhão; a cuja sombra cresci, brinquei os primeiros brincos da meninice, e onde recebi a bênção matrimonial; onde se batizaram filhos meus; tendo-a sempre presente em minha lembrança [...]. A Igreja de Santa Rita se integrava de tal jeito a minha vida, que a estou relembrando com lágrimas a me enevoar os olhos e o coração inundado com a suavíssima saudade! (Passos, 1942, p.341).
Esse sentimento do autor ainda vigora em muitos moradores da cidade que relembram a beleza da igreja e sentem não apenas pela construção, mas pela ausência de um santuário dedicado a santa de devoção. Por estar em uma área central, a sua supressão foi impactante na paisagem.
No distrito de Carvalho de Brito identificamos duas edificações invisíveis na paisagem física mas aparentes nas paisagens da memória dos moradores. A primeira delas é o coreto da Vila Eliza, que foi comentado por todos os moradores com os quais conversamos na Vila Marzagão[ix]. Ele era muito presente pois lá se reuniam para conversar e conviver, além de ser uma praça de festividades. Além do Coreto, a estacão de trem de General Carneiro ainda perpetua muito na memória dos moradores do distrito. Embora outras estações também tenham sido suprimidas da paisagem, essa nos pareceu a mais marcante. Para os jovens essa edificação é indiferente, mas os adultos e idosos sempre comentam sobre o lugar que era um ponto de encontro e de reunião dos moradores. Além disso, para ir à estação usavam as melhores roupas, demonstrando a importância do local.
Por fim, como patrimônio cultural invisível, citamos o antigo bairro Mestre Caetano, também conhecido como Cuiabá. Pelo que nos explicaram os moradores, o bairro era importante pois tinha diversos equipamentos urbanos inexistentes no Pompéu como médico, escola, armazém, cartório, etc. O bairro foi desmobilizado por causa do fechamento da Mina Morro Velho na segunda Guerra Mundial, pela falta de explosivos no mercado. Anos depois, também a estação Central do Brasil foi desativada. Esses dois contextos retiraram a população do local, e anos depois as edificações foram demolidas pela Anglo Gold. A memória do lugar, contudo, permanece viva. Dois elementos do antigo bairro são mais mencionados, o primeiro é o antigo trem e o segundo o antigo casarão demolido a poucos anos.
Tinha trem mas o trem era só duas vezes no dia, só de manhã e a noite. Agora não tem mais, não para mais o trem aqui. A estação acabou, destruíram a estação. De Sabará́, de Mestre Caetano, aqui tinha uma parada de trem. A festa do povo era ali na paradinha. Todo dia de domingo, deu 2 horas que é a hora do trem passar, ia todo mundo pra parada, uns ia ficar jogando bola, outros vendendo salgado, vendendo doce, enchia de gente pra ver o trem passar (SLS, 2015).

A obra mais recente demolida é o casarão, um sobrado que lá havia. De acordo com SLS (2015), com quem fizemos a caminhada de reconhecimento, o casarão teve várias funcionalidades. Ele foi construído para ser um hospital pois tinha muita incidência de febre amarela, mas com a edificação da Santa Casa em Sabará, tornou-se uma hospedaria para as pessoas que vinham de fora visitar a mina. Posteriormente, virou uma escola.
Os patrimônios culturais excluídos são aqueles que, ao contrário dos anteriores, ainda estão erguidos na paisagem, mas estão com acesso impedido, por motivos diversos. Excluem-se na paisagem mas permanecem no imaginário e memória da população. Primeiramente podemos citar a Igreja de Nossa Senhora da Lapa, em Ravena, que está fechada por conta de uma obra não finalizada pelo IEPHA.
A Igreja “ficou 10 anos fechada sem restauro, aí em 2010 ela começou a reforma e em 2013 fechou. Precisava de uns 10 anos de reforma pra poder liberar ela...é muito minucioso” (EDR, 2015). Os moradores sentem intensamente a ausência da igreja, principalmente por conta da festa da Padroeira (Marujada) que não tem mais a missa dentro do templo religioso, mas sim na praça central.
Uma moradora expressou o sentimento que tem ao vê-la fechada: “Revolta, decepção, é um sentimento que a gente chora...precisa ser reaberta sabe, é nossa” (CLD, 2015). O isolamento da igreja é o isolamento de uma memória que está totalmente ligada as festividades. Os moradores contam que era costume comprar a melhor roupa para o evento que durava quase uma semana (essa roupa era guardada para o natal daquele ano). (EDR, 2015), organizador da festa na atualidade

conta que: “o que define a festa pra mim é saudade. Eu saía catando cavaco da escola pra ver o sino tocar e os fogos saindo das casas, mas os tempos mudaram, além de ser fácil comprar roupa em qualquer lugar, a igreja não pode mais ser usada” (EDR, 2015). Visitamos a igreja e ela está toda em obras, cheia de poeira, fezes de ratos e cupins. Abaixo fotos das estruturas internas usadas para reforma, uma viga poida por cupins e materiais jogados no chão.
Além disso, a santa original foi roubada na década de 80 e muitos moradores não aceitam a da atualidade, o que impacta muito na memória popular. Não há registros do paradeiro da santa original. Os outros dois bens tombados excluídos são as igrejas que estão nos limites da Anglo Gold: Igreja do Rosário e Hermida de Santa Efigênia.
A primeira ainda é acessada em um a dois momentos durante o ano, mas a segunda está completamente excluída do cotidiano sabarense. Os habitantes sentem muito essa falta e lutam por mais oportunidade.
Muitos moradores do Pompéu tinham relação direta com elas, tendo inclusive parentes enterrados. A Capela de Santa Efigênia não é visitada há muito tempo, inclusive não pudemos conhece-la durante a tese, pois a empresa alega que não há segurança no local. Isso tem intrigado muito os moradores do bairro que desconfiam dessa explicação. A Capela do Rosário recebe visitantes no dia dos finados e em outras poucas datas pré-estipuladas e agendadas. Não cabe toda a população, por isso, só os primeiros a se inscrever obtém o direito.
Além dos bens excluídos e invisíveis, mapeamos cinco patrimônios culturais ativos. Não significa que não haja outros presentes no cotidiano dos moradores, mas observamos que esses são os mais atuantes no dia-a-dia e nas identidades sabarenses:
· Vila Marzagão;
· Chafariz do Kaquende;
· Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos;
· Igreja Nossa Senhora do Ó;
· Igreja de Santo Antônio (Pompéu).

A Vila Marzagão é uma antiga vila operária da indústria têxtil sabarense, segunda do Brasil e pioneira de Minas Gerais. Já abarcou aproximadamente 2.500 funcionários que moravam na vila. Hoje, nas estruturas da antiga indústria, funciona uma outra denominada Marcel Philippe; no galapo de deposito do algodão, mora uma família dona de um grupo de teatro chamado Kabana; e nas casas que restaram, habitam moradores que não tem registro e nem direito a terra. Muitos desses moradores são descendentes de trabalhadores da indústria têxtil, que sem terem para onde ir, ali se estabeleceram. A memória da antiga vila ainda está presente nos moradores mais antigos. Há algum tempo isso vem sendo reproduzido aos jovens, através do trabalho realizado pelo grupo Kabana, que já́ se considera parte da comunidade que frequenta a vinte anos.
A gente começou a ver que os jovens que moravam aqui não tinham ideia da história e tinham vergonha de morar aqui. Muita vergonha, assim, por exemplo, na escola: onde você mora? Porque não conheciam a história e tinha um preconceito com quem morava aqui, afinal, é aquele lugar que a ponte ta caída, que só tem casa velha, que só tem gente velha, é tudo gente pobre. Tudo isso gerou um preconceito com o Marzagão (NLD, 2016).
Marzagão, contudo, está vivo, vivíssimo!
Importar imagenNo distrito Sede elencamos apenas o chafariz do Kaquende e duas igrejas. O Chafariz é utilizado por toda a população dos arredores. Sempre há moradores ou turistas enchendo as garrafas de água. Carros e bicicletas se amontoam na frente da edificação. A igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, além de ser estonteante, é saída para as celebrações religiosas e cenário para um dos principais pontos de encontro do centro: a praça Melo Viana.
Por ser uma grande ruína, chama atenção mesmo dos que não são católicos. Junto com a Igreja Nossa Senhora do Ó, é símbolo da cidade. Por serem singulares, visto que se diferenciam da maioria das igrejas barrocas, ganharam destaque. A “igrejinha do Ó” aparece em todas as representações da cidade, impreterivelmente, pelo seu charme e visibilidade, adquirida com a implantação e fortalecimento da
Companhia Belgo Mineira, que deu origem ao nome do bairro, Siderúrgica, e deu visibilidade ao local. Moradores de diversas localidades mencionaram a sua beleza e importância, quando perguntados sobre o patrimônio de Sabará. Além disso, a comunidade ao redor é bem fortalecida e atuante. No Pompéu, a capela de Santo Antônio é viva no cotidiano da população. É para ela que muitas das lutas se voltam, assim como é a partir dela que muitos moradores se unem.
Analisamos muito se colocaríamos a igreja do Rosário de Ravena como patrimônio ativo, mas pelo que foi percebido ao longo das pesquisas, poucos moradores realmente a vivenciam espiritualmente, principalmente pela expansão pentecostal no local.

Além disso, grande parte dos católicos demonstram verdadeiro afeto pela Matriz da Lapa e não pela Igreja do Rosário, por conta disso, não há em Ravena um patrimônio cultural especializado como ativo, apenas como excluído.
Esses doze bens são, certamente, os que mais representam os sabarenses e são legítimos patrimônios culturais. A igreja do Carmo, que possui obras de Aleijadinho, não foi aqui mencionada porque, embora tenha esse conteúdo artístico fabuloso, não se destaca no cotidiano, revelando-se muito similar a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, Igreja das Mercês e a Igreja de São Francisco. Com certeza não é de obras com grande valor artístico que uma valoração afetiva se estabelece, caso contrário a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos estaria fadada ao escárnio. Os valores objetivos precisam estar acompanhados da valoração afetiva para que o patrimônio seja cultural e não coisificado.
3. Conclusão
O exercício empreendido ao longo da tese de doutorado ainda é apenas um início para futuras pesquisas que pretendemos realizar. Buscar a totalidade da cidade, analisando todo o município enriqueceu muito a experiência e permitiu o alcance de resultados proveitosos. A ideia de repensar o conceito de patrimônio cultural por meio da Fenomenologia vem acompanhada de uma busca antiga por uma Geografia Cultural espiritual, ou seja, que contemple uma visão mais profunda da relação humana com o espaço. De acordo com Eric Dardel (2011), a Geografia coloca em questão as ligações existenciais do homem com a Terra e o que ele denomina como Geograficidade. São essas ligações existenciais estabelecidas com o espaço que tanto nos inquietam e interessam. No que concerne ao estudo das cidades, precisamos dar voz as pessoas que habitam, revelando um outro lado do fenômeno urbano, e talvez o seu lado mais essencial: o humano.
No livro Cidades Invisíveis, Marco Polo relata suas impressões das cidades do império de Kublai Khan visitadas. O imperador interpreta os gestos, as imagens e os movimentos. A mesma cidade é distinta para um e para o outro. Quem sabe as cidades tenham o poder de diversificar compreensões ao invés de agregá-las? Em uma passagem, imperador e mercador dialogam:
Marco Polo descreve uma ponte, pedra por pedra. - Mas qual é a pedra que sustenta a ponte? - perguntou Kublai Khan - A ponte não é sustentada por esta ou aquela pedra –
responde Marco -, mas pela curva do arco que estas formam. Kublai Khan permanece em silêncio, refletindo. Depois acrescenta: - Por que falar das pedras? Só o arco me interessa. Polo responde: - Sem pedras o arco não existe. (Calvino, 2003, p.81).
Em meu contato (imaginado) com o imperador, substituí o final do diálogo pela seguinte estrutura: “- Por que falar das pessoas? Só a cidade me interessa [...] – Sem pessoas, a cidade não existe”. E assim, após essa conversa, iniciei minha busca pelas pessoas da cidade patrimonial.
O encontro com o patrimônio sabarense foi um exercício de dar voz as pessoas e o devido valor aos fragmentos históricos. Dessa forma, a proposta de trabalhar com patrimônios culturais, a partir de uma perspectiva fenomenológica - elencando suas representações na paisagem enquanto ativos invisíveis e excluídos - trata-se de um caminho encontrado para reforçar a importância da valoração afetiva e um exercício de demonstrar a complexidade que acreditamos existir por trás do adjetivo cultural.
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Notas