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Espaços públicos e fragmentação socioespacial, reflexão teórico-empírica sobre o Rio de Janeiro
Andre Felix de Souza
Andre Felix de Souza
Espaços públicos e fragmentação socioespacial, reflexão teórico-empírica sobre o Rio de Janeiro
Public spaces and sociospatial fragmentation, theoretical-empirical reflection on Rio de Janeiro
Espacios públicos y fragmentación socioespacial, reflexión teórico-empírica sobre Río de Janeiro
PatryTer, vol. 5, núm. 10, pp. 130-152, 2022
Universidade de Brasília
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Resumo: Qual a importância dos espaços públicos no contexto das cidades fragmentadas? Para responder a essa pergunta, dividiremos o presente artigo em duas partes: na primeira, com base em uma revisão bibliográfica recente, propomos uma reflexão teórica e empírica sobre as possíveis relações entre os temas da fragmentação socioespacial e dos espaços públicos, tomando a cidade do Rio de Janeiro como exemplo; na segunda parte, à luz de nossos dados empíricos de fonte primária, questionários e entrevistas, propomos uma reflexão sobre a opinião dos frequentadores das três maiores e mais icônicas praças do bairro da Tijuca (RJ) sobre questões ligadas ao tema dos espaços públicos. O artigo conclui que, no contexto das cidades fragmentadas, os espaços públicos cumprem um papel fundamental: a reunião de públicos diversos.

Palavras-chave: espaços públicos, fragmentação socioespacial, Rio de Janeiro.

Abstract: What is the importance of public spaces in the context of fragmented cities? To answer this question, we will divide this article into two parts: in the first, based on a recent bibliographic review, we propose a theoretical and empirical reflection on the possible relationships between the themes of sociospatial fragmentation and public spaces, taking the city of Rio de Janeiro as an example; In the second part, in the light of our empirical data from a primary source, questionnaires, and interviews, we propose a reflection on the opinion of visitors to the three largest and most iconic squares in the neighborhood of Tijuca (RJ) on issues related to the theme of public spaces. The article concludes that, in the context of fragmented cities, public spaces play a fundamental role: meeting diverse publics.

Keywords: public spaces, sociospatial fragmentation, Rio de Janeiro.

Resumen: ¿Cuál es la importancia de los espacios públicos en el contexto de las ciudades fragmentadas? Para responder a esta pregunta, dividiremos este artículo en dos partes: en la primera, a partir de una revisión bibliográfica reciente, proponemos una reflexión teórica y empírica sobre las posibles relaciones entre los temas de la fragmentación socioespacial y los espacios públicos, tomando la ciudad de Río de Janeiro como ejemplo; En la segunda parte, a la luz de nuestros datos empíricos de fuente primaria, cuestionarios y entrevistas, proponemos una reflexión sobre la opinión de los visitantes de las tres plazas más grandes e icónicas del barrio de Tijuca (RJ) sobre cuestiones relacionadas con el tema de los espacios públicos. El artículo concluye que, en el contexto de las ciudades fragmentadas, los espacios públicos juegan un papel fundamental: el encuentro de públicos diversos.

Palabras clave: espacios públicos, fragmentación socioespacial, Rio de Janeiro.

Carátula del artículo

Artigos

Espaços públicos e fragmentação socioespacial, reflexão teórico-empírica sobre o Rio de Janeiro

Public spaces and sociospatial fragmentation, theoretical-empirical reflection on Rio de Janeiro

Espacios públicos y fragmentación socioespacial, reflexión teórico-empírica sobre Río de Janeiro

Andre Felix de Souza
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
PatryTer, vol. 5, núm. 10, pp. 130-152, 2022
Universidade de Brasília

Recepción: 01 Octubre 2021

Aprobación: 01 Marzo 2022

Publicación: 01 Septiembre 2022

1. Introdução[i]

Na bibliografia especializada nos estudos urbanos e, mais especificamente, nas reflexões concernentes às cidades contemporâneas, dois temas de pesquisa tornaram-se particularmente populares no Brasil e internacionalmente: espaços públicos e fragmentação socioespacial. Ambos os temas reapareceram na agenda das humanidades, das ciências sociais e da geografia nos anos 90, consolidando-se efetivamente como objetos de investigação científica no decorrer dos anos 2000. O objetivo fundamental do presente artigo é propor uma reflexão, teórica e empírica, acerca da relação entre esses dois tópicos, buscando responder, de maneira geral, o seguinte questionamento: qual a importância dos espaços públicos no contexto das cidades fragmentadas? Para tal, em termos teóricos, propomos uma revisão bibliográfica recente acerca desses temas em periódicos científicos e, de um ponto de vista empírico, à luz da aplicação de questionários e entrevistas em três grandes praças públicas de um bairro residencial na cidade do Rio de Janeiro, propomos uma discussão sobre a opinião dos frequentadores dessas praças acerca de temas relacionados aos espaços públicos.

A constatação de que vivemos em cidades cada vez mais “fragmentadas”, “segmentadas”, “divididas” ou “segregadas” não é compartilhada apenas pelos teóricos das cidades contemporâneas. Em uma pesquisa hipotética, se indagássemos as pessoas que vivem nas grandes capitais e metrópoles brasileiras e/ou latino-americanas acerca do nível de “fragmentação” de suas respectivas cidades, muito provavelmente, a maioria das pessoas reconheceria, em maior ou menor grau, diferentes formas de “divisão” (centro/periferia; bairros ricos/bairros pobres, subúrbios/enclaves, condomínios fechados/favelas etc.). Essa suposição seria particularmente legítima se levássemos em consideração que, em muitos casos, a percepção acerca dessa “fragmentação” pode ser constatada facilmente, literalmente, a “olhos nus”: um rápido passeio por qualquer bairro tradicional da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, revelaria aos olhares mais atentos uma abrupta descontinuidade da paisagem urbana, que separa os “assentamentos formais”, o “asfalto”, dos “assentamentos informais”, as “favelas”.

Em contrapartida, em outra pesquisa hipotética, se perguntássemos a essas mesmas pessoas, residentes nas “favelas” e no “asfalto”, moradores dos subúrbios periféricos ou dos bairros centrais, se elas costumam frequentar, mesmo que de tempos em tempos, alguns dos espaços públicos mais emblemáticos da cidade do Rio de Janeiro, como a praia de Copacabana, por exemplo, frequentada por públicos extremamente diversos, de diferentes partes da cidade, do estado, do país e até do mundo, muito provavelmente, parte significativa das pessoas responderia que sim, acrescentando, inclusive, além das famosas praias cariocas, outros espaços públicos conhecidos por atrair públicos diversos nessa cidade.

Como diria o geógrafo Roberto Lobato Corrêa, essa aparente contradição decorre, em realidade, de um argumento quase inquestionável: as cidades são, simultaneamente, fragmentadas e articuladas (Corrêa, 1985). Conforme demonstraremos nas próximas páginas, parte significativa dos estudos que se propõe a refletir sobre o fenômeno da fragmentação socioespacial relega aos espaços públicos citadinos (urbanos, livres ou abertos) uma atenção secundária, concentrando-se, via de regra, nos espaços residenciais privados. Apesar do crescente número de pesquisas existentes acerca desses temas, são poucos os autores que refletem especificamente sobre a importância dos espaços públicos no contexto das cidades fragmentadas.

Um dos primeiros autores a propor uma reflexão sistemática acerca das consequências da segregação residencial, socioespacial ou urbana para a vida pública das cidades modernas foi o teórico estadunidense Richard Sennett, em seu livro “O declínio do homem público: as tiranias da intimidade”. Nesse trabalho, Sennett argumentava que, nas cidades capitalistas, sob a égide do processo de industrialização, a difusão de um novo padrão de distribuição/hierarquização das classes e grupos sociais no espaço urbano, que originou os assim chamados bairros homogêneos, constituiu um dos mais importantes elementos daquilo que o autor qualificou como sendo a “morte” dos espaços públicos, leia-se, um processo cada vez mais pronunciado de “compartimentação” da vida pública, da esfera pública e, sobretudo, das interações face a face nos espaços públicos das cidades modernas (Sennett, 1989).

Quase três décadas depois, o livro de Mike Davis, “Cidade de quartzo: escavando o futuro em Los Angeles”, foi um dos primeiros estudos a refletir sobre as consequências dos novos processos de fragmentação urbana para a existência da vida pública nas cidades pós-modernas. O livro trata, entre outras coisas, do processo de militarização da cidade de Los Angeles, caracterizada por uma pronunciada polarização social (e espacial): expansão dos subúrbios, proliferação de guetos homogêneos, exclusão/marginalização/criminalização de grupos sociais específicos, multiplicação dos sistemas de “segurança”, arquitetura do medo e/ou “defensiva”, crescimento da violência e da criminalidade urbanas, atuação desenfreada do capital imobiliário, expansão urbana fragmentada, privatização etc.. Como resultado, dizia Mike Davis, Los Angeles promoveu uma verdadeira “destruição” da vida pública citadina, em especial, dos espaços públicos (Davis, 1993).

Inspirados nesses dois textos fundamentais, parte significativa dos estudos que relaciona essas duas temáticas, espaços públicos e segregação residencial, ou, mais recentemente, fragmentação socioespacial, se concentra em demonstrar o papel dos espaços públicos enquanto “reprodutores” de uma lógica socioespacial fragmentária. Poucas são as pesquisas que reconhecem os espaços públicos, especialmente aqueles que atraem públicos diversos, como possíveis “contrapontos” aos processos de fragmentação urbana. Essa é, justamente, a lacuna que pretendemos preencher com este estudo. A tese central do artigo é a seguinte: nos interstícios da fragmentação, a despeito das muitas contradições e problemas característicos das cidades contemporâneas, existe uma vida pública que se contrapõe ao processo de fragmentação socioespacial. Trata-se, nesse sentido, de uma reflexão sobre a dialética entre fragmentação e articulação nas cidades contemporâneas e, mais especificamente, sobre a importância dos espaços públicos no contexto das cidades fragmentadas.

Para tal, dividimos o texto em cinco tópicos: os dois primeiros tratam, respectivamente, das notas introdutórias e de questões de ordem metodológica, concernentes à revisão bibliográfica e ao estudo empírico; no terceiro tópico, propomos uma reflexão teórica sobre a relação entre os seguintes temas, fragmentação socioespacial e espaços públicos, à luz de estudos oriundos de diferentes contextos geográficos, mas com foco nas cidades da América Latina, do Brasil e, na parte final do tópico, na cidade do Rio de Janeiro. No quarto tópico do texto, com base na aplicação de questionários e entrevistas estruturadas, apresentaremos alguns dados primários acerca da opinião dos frequentadores das três maiores praças do bairro da Tijuca, cidade do Rio de Janeiro, sobre questões referentes ao tema dos espaços públicos. Nas considerações finais, o artigo conclui que, no contexto das cidades fragmentadas, os espaços públicos cumprem um papel fundamental: a reunião de públicos diversos.

1.1. Notas metodológicas

Antes de começarmos a reflexão propriamente dita, faz-se necessário tecer alguns breves comentários acerca dos métodos empregados. Comecemos pela revisão bibliográfica, que foi realizada no portal de periódicos Google Acadêmico, tendo como foco os textos publicados após anos 2000. Nos idiomas português e espanhol, as expressões “fragmentação socioespacial” e “fragmentación socioespacial”, respectivamente, são facilmente encontradas em artigos publicados em periódicos científicos e anais de eventos. No idioma inglês, todavia, a expressão “urban fragmentation” é mais usual. No que diz respeito ao tema dos espaços públicos, os idiomas português e espanhol foram privilegiados, tendo em vista que a bibliografia em língua inglesa foi explorada por mim em outros trabalhos, ainda em processo de publicação.

Além dos artigos, incluímos também na revisão alguns livros e capítulos emblemáticos publicados acerca desses temas nas últimas décadas. Uma vez selecionados os textos foram classificados em três grupos: (1) textos predominantemente empíricos, (2) textos predominantemente teóricos e (3) textos que tratam da relação espaços públicos/fragmentação socioespacial. O critério fundamental para a seleção dos textos citados foi a proximidade com o tema proposto para o artigo. Não se trata, nesse sentido, de uma revisão bibliográfica sistemática ou exaustiva acerca desses temas.

A pesquisa empírica foi realizada no bairro da Tijuca, um tradicional bairro residencial de classe-média localizado na zona-norte da cidade do Rio de Janeiro (Figura 1). Com a ajuda de alguns membros do grupo de pesquisa Território e Cidadania (UFRJ), graduandos e pós-graduandos, realizamos um total de 17 trabalhos de campo nas 29 praças do bairro, em diferentes períodos da semana (dias de semana e fins de semana) e do dia (manhã, tarde e noite). No presente artigo, porém, concentraremos nossa atenção nos dados concernentes às três maiores praças do bairro, Praça Afonso Pena, Praça Saens Peña e Praça Comandante Xavier de Brito, onde foram aplicados 655 questionários e 45 entrevistas com os frequentadores, nas seguintes datas: 10/01/2018, 18/01/2018, 07/11/2018, 11/11/2018, 14/11/2018, 22/11/2018, 28/11/2018, 15/12/2018. Para a realização da pesquisa, adaptamos alguns instrumentos metodológicos concebidos no âmbito do grupo de pesquisa Território e Cidadania (UFRJ):

1. Questionário fechado: descreve o perfil sociodemográfico dos frequentadores, frequências de uso, etc. (amostra aleatória: dados quantitativos);

2. Entrevista estruturada: descreve a opinião dos frequentadores acerca de diferentes temas ligados aos espaços públicos (amostra aleatória: dados quantitativos/qualitativos).


Figura 1
Mapa de localização do bairro da Tijuca
elaboração própria, 2020.

No que se refere aos questionários, o nosso objetivo fundamental não era propor uma pesquisa quantitativa fidedignamente assentada em critérios estatísticos, ou seja, a ideia era quantificar algumas informações de âmbito geral acerca dos frequentadores (sexo, idade, ocupação principal, grau de instrução, frequência de uso dos espaços públicos e se havia preferência por dias específicos da semana). Mesmo assim, optamos por uma amostra consideravelmente robusta (n=655), tendo em vista que o bairro da Tijuca, segundo o último censo realizado (2010), conta com uma população total estimada em cerca de 170.000 pessoas. Os questionários foram aplicados de maneira aleatória, isto é, não havia critérios específicos para a escolha das pessoas indagadas, sendo aplicados aproximadamente 200 questionários em cada uma das três praças pesquisadas, em diferentes dias e horários.

As entrevistas estruturadas (n=45) eram compostas originalmente por 15 perguntas, das quais 10 foram selecionadas para este artigo, gravadas em arquivos de áudio e depois transcritas. Não havia um critério específico para a escolha dos entrevistados, porém, na maioria dos casos, aquelas pessoas que se mostravam mais interessadas na pesquisa foram as escolhidas, tendo em vista que sua realização demandava mais tempo. Todas as perguntas foram devidamente contextualizadas, ou seja, antes das respostas, o conteúdo das perguntas era minuciosamente explicado, de modo a orientar a reflexão dos entrevistados, porém, com cuidado, para não induzir as respostas, conforme consta nas gravações. O objetivo fundamental das entrevistas era identificar, em linhas gerais, alguns dos principais elementos que apareciam nas falas dos frequentadores indagados acerca de questões referentes aos espaços públicos.

Boa parte das perguntas era objetiva, tendo como respostas sim ou não, cujos resultados foram apresentados em gráficos. Nas perguntas passíveis de respostas mais desenvolvidas, optamos por apresentar os resultados sob a forma de nuvens de palavras: as respostas dos frequentadores foram tabuladas e classificadas em diferentes categorias, que foram criadas e hierarquizadas com base no número de menções, quanto maior o número de menções, maior o destaque nas nuvens de palavras. Nos títulos dos gráficos e nuvens de palavras concernentes aos resultados das entrevistas se encontram apenas versões resumidas das perguntas que, nos instrumentos metodológicos, eram elaboradas de maneira mais complexa, sendo devidamente contextualizadas. Como houve um problema na numeração de algumas entrevistas, não foi possível associar os dados dos questionários às entrevistas, por esse motivo, os trechos de entrevistas selecionados não foram identificados.

Uma vez colhidos os dados foram transcritos, tabulados, sistematizados e receberam tratamento estatístico: mapas, mosaicos fotográficos, gráficos, nuvens de palavras e entrevistas selecionadas foram os recursos priorizados para a exposição dos resultados. Entre outras coisas, buscávamos saber: o que leva as pessoas a irem a esses espaços públicos? Quem é o seu público frequentador? Qual a dinâmica de funcionamento desses espaços em termos temporais, seus ritmos de uso? Há interação entre diferentes segmentos sociais? O que essas pessoas costumam fazer quando vão a esses espaços? etc. Essas são algumas das questões que guiaram a confecção da pesquisa empírica.

2. Sobre a relação entre a fragmentação socioespacial e os espaços públicos: o exemplo do Rio de Janeiro

Nos estudos que se propõem a refletir sobre as principais características (e problemas) das cidades contemporâneas, uma perspectiva tornou-se particularmente influente na bibliografia especializada: aquela que enfatiza o caráter fragmentário das cidades (Marcuse, 2003). Se levarmos em consideração a bibliografia publicada em língua inglesa, a expressão urban fragmentation pode ser encontrada em diversos trabalhos. Não há consenso entre os especialistas nesse tema acerca do primeiro estudo a utilizar a expressão urban fragmentation, entretanto, sabe-se que foi a partir do fim da década da 1970 que essa expressão começou de fato a se popularizar nos estudos urbanos. Em que pese o fato de que o pioneirismo acerca do tema da segregação residencial deva ser creditado aos clássicos estudos da Escola de Chicago, pelo menos desde o início do século XX, Los Angeles é caracterizada como caso paradigmático do processo de “suburbanização” das cidades estadunidenses, compondo um conjunto de estudos que ficou conhecido na bibliografia especializada como a Escola de Los Angeles (Delmelle, 2019).

Ainda na década de 1920 Los Angeles emerge como uma city of suburbs, quando as elites e classes médias (brancas) começaram de fato a estabelecer assentamentos urbanos distantes da área central da cidade. Essa dispersão do processo de urbanização promovida pelas elites e classes médias tinha, entre outras, três justificativas principais: (1) a proximidade de amenidades (natureza); (2) a possibilidade de viver em residências unifamiliares e (3) o desejo desses estratos ou classes mais abastados de se manter distantes de outros grupos sociais. Apesar do fato de que, nas primeiras décadas do século XX, esses novos assentamentos ainda eram completamente dependentes do centro da cidade, após a Segunda Guerra Mundial, um padrão cada vez mais fragmentado se estabeleceu, caracterizado pela descentralização residencial, industrial, comercial, cultural, social, política e administrativa, ou seja, diferentes áreas ou regiões das cidades tonaram-se menos “dependentes” da área central, do antigo centro funcional, administrativo, financeiro, recreativo, comercial, de serviços, de comércio, de consumo, de lazer, de entretenimento etc. (MacKillop & Boudreau, 2008).

Tomando Los Angeles como paradigma citadino dos tempos pós-modernos, a fragmentação urbana foi então concebida como um fenômeno de abrangência global, isto é, interpretada como reflexo de um amplo conjunto de transformações associadas ao advento das cidades pós-modernas (Dear, 2000; Harvey, 2003; Soja, 1993). Com o objetivo de propiciar uma perspectiva global sobre o tema, Setha Low elenca os seguintes fenômenos como alguns dos principais componentes desse novo contexto urbano: transição para o regime de acumulação flexível, incorporação dos países periféricos e semiperiféricos à globalização econômica, advento de uma ordem neoliberal na economia-política global, homogeneização cultural e dos padrões de consumo, redefinição do papel dos Estados, cortes nos orçamentos públicos, empresariamento urbano, as crescentes disparidades entre ricos e pobres, crescimento da heterogeneidade das populações citadinas, variações na percepção acerca do crescimento da violência e da criminalidade urbanas, acentuação dos processos de segregação residencial, entre outros (Low, 2006).

No que se refere às cidades do capitalismo periférico ou semiperiférico, em países como África do Sul e Índia, por exemplo, a fragmentação urbana estaria associada, de um lado, ao processo de metropolização e globalização das cidades (expansão urbana, nova divisão espacial do trabalho e mobilidade), e, de outro lado, à ruptura da unidade social e espacial das cidades, oriunda, entre outras coisas, de uma diversificação cada vez mais pronunciada das práticas socioespaciais de diferentes grupos e classes (Dupont & Houssay-Holzschuch, 2005). Conforme argumentam alguns autores, sem desconsiderar as hipóteses que dizem respeito ao caráter global desses fenômenos, é necessário que tenhamos cuidado para não extrapolamos as interpretações. Em muitos casos, acabamos promovendo generalizações exacerbadas que tomam alguns exemplos paradigmáticos como tendências globais, obscurecendo a real complexidade dos fenômenos e ocultando suas particularidades (Allegra, Casaglia & Rokem, 2012).

Nas cidades da América Latina, esse processo de fragmentação da vida citadina tem sido foco de um intenso debate nas últimas décadas, especialmente após à década de 1980 (Vidal, 1994). Há muitos estudos empíricos acerca desse tema em nosso continente, entre os países mais citados, destacam-se os seguintes: México, Colômbia, Argentina, Brasil, Chile e Equador. Segundo diversos autores, transformações relativamente recentes, observadas em diversas cidades do continente, evidenciariam a constituição de um fenômeno característico dos tempos pós-modernos (Salgueiro, 1998). Uma conjunção de processos que acentua a segmentação, a ruptura, a separação, a segregação, o afastamento ou o isolamento de diferentes partes ou unidades que compõem os sistemas urbanos latino-americanos, onde as crescentes desigualdades socioeconômicas e o advento de novos mecanismos de exclusão, precarização e marginalização de determinadas parcelas das sociedades acentuam ou criam novos modos de dissolução da urbanidade, da cidadania, dos laços sociais, culturais e políticos (Peñuelas, 2021; Ramírez et. al., 2021; Núñes, Franco & Galindo, 2020; Jirón & Mansilla, 2014; Schapira & Pinera, 2008; Schapira, 2001; etc.).

Nas cidades brasileiras, mais especificamente, os processos de metropolização, “suburbanização”, mobilidade urbana e a emergência de centralidades periféricas se combinam aos processos de fragmentação da diversidade citadina. Trata-se, pois, de um amplo conjunto de transformações no processo de urbanização (reestruturação urbana, multiplicação de enclaves homogêneos, policentralidade, etc.), que levaram à substituição das cidades segregadas e hierarquizadas, marcadas pela preponderância de grandes regiões metropolitanas interligadas por uma estrutura urbana centralizadora (lógica centro-periferia); para as assim chamadas cidades fragmentadas, um “mosaico urbano” composto por diferentes grupos que, contraditoriamente, vivem nas mesmas cidades, porém, segregados socioespacialmente e “integrados” por uma estrutura urbana descentralizada (lógica fragmentária) (Sposito & Góes, 2013; Carlos, Souza & Sposito, 2011; Santos, 1993, 1990).

Uma das expressões empíricas desse contexto urbano “fragmentado” foi o surgimento de novas formas de segregação e autossegregação em diversas cidades do globo, que originaram verdadeiros enclaves citadinos, isto é, fragmentos justapostos que compõem sistemas urbanos interdependentes, porém, segmentados. Nessas cidades fragmentadas, grupos sociais distintos (étnico-raciais, socioeconômicos, socioculturais, etc.), em muitos casos, habitam áreas geograficamente próximas, porém, marcadas por abruptas rupturas do tecido urbano. Cada um desses fragmentos urbanos descontínuos ostenta, entre outras características, forte homogeneidade socioespacial interna e heterogeneidade socioespacial em relação aos espaços externos (Morcuende, 2021; Legroux, 2021; Morcuende, 2020; Serpa, 2018; Góes & Sposito, 2014).

Em que pese o fato de que a acentuação do fenômeno da segregação residencial seja um dos mais importantes componentes desse processo, conforme argumentam alguns autores, a fragmentação socioespacial deve ser entendida como um fenômeno mais amplo. Para Eliseu Sposito e Maria Sposito, por exemplo, para uma melhor delimitação conceitual, podemos pensar na ideia de fragmentação socioespacial com um processo geral, que é composto por outros processos: segregação, autossegregação, exclusão e diferenciação (Sposito & Sposito, 2020). Nesse contexto, nas últimas décadas, o número de estudos empíricos produzidos é muito expressivo, em cidades de tamanhos e contextos regionais bastante diversos: São Paulo, Minas Gerais, Maranhão, Ceará, Paraná, Mato Grosso do Sul, Bahia, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pará constituem alguns dos estados mais citados no Brasil.

Nas cidades latino-americanas e brasileiras, conforme argumentam vários autores, a perpetuação dessas estruturas socioespaciais de caráter fragmentário constituiria, simultaneamente, uma expressão e um agravante das desigualdades sistêmicas, que consolidam fronteiras sociais, espaciais e simbólicas entre os diversos grupos que habitam as nossas cidades. Nesse contexto, os espaços públicos urbanos são concebidos como importantes instrumentos, simultaneamente, de reprodução e contraposição de tendências e forças antagônicas: público-estatal/privado-corporativo, articulação/fragmentação, exclusão/inclusão, segregação/integração, clientelismo/cidadania, parecem, literalmente, disputar a cidade e seus cidadãos (Kuri, 2016). Apesar do expressivo número de estudos, todavia, ainda são poucas as pesquisas empíricas que refletem sobre o papel específico desempenhado pelos espaços públicos (Vasconcelos & Góes, 2021; Cortés, 2016; Link & Valenzuela, 2016; Saraví, 2004).

Afinal de contas, sobre o que exatamente estamos falando quando utilizamos a expressão “espaços públicos”? Apesar de muito popular atualmente, com exceção de algumas contribuições pioneiras, o tema dos espaços públicos demorou até ser de fato incorporado à agenda da geografia, das ciências sociais e dos estudos urbanos. Como bem argumenta Paulo Cesar Gomes, o conceito de espaços públicos é geralmente empregado na geografia e em outras disciplinas como sinônimo de áreas urbanas livres ou abertas (Gomes, 2018). A arquitetura e o urbanismo, por exemplo, os concebem como espaços, formas e morfologias físicas (ruas, praças, parques, calçadas, esquinas, largos etc.) (Galender, 1992); a ciência política, por outro lado, concebe os espaços públicos como partes constituintes da vida ou esfera pública, leia-se, esfera abstrata de fluxos comunicacionais que media as relações entre os Estados e as sociedades civis (Vieira, 2001).

Segundo Gomes, ao unirmos essas duas dimensões (política e físico-morfológica), emergem três componentes ou características fundamentais que nós geógrafos devemos valorizar ao estudarmos os espaços públicos: a co-presença da diversidade, a reflexividade da visibilidade e a possibilidade de instituição de um “debate político/público”, isto é, um fluxo comunicacional (comportamentos, presenças, ações etc.) que é derivado da convivência socioespacial da diversidade citadina (Gomes, 2010). Conforme argumentam diferentes autores, todavia, existem outras variáveis analíticas que não podem ser desconsideradas ao estudarmos esses espaços, como as dimensões cultural (Fortuna, 2002), socioespacial (Valverde, 2007), comportamental (Rodríguez & Montserrat, 2014), identitária (Ruiz, 1998), funcional (García, 2011), ambiental (Beleño, 2004), patrimonial (Souza, 2020), dos direitos (Borja, 2011), da cidadania (Cardamone, 2004), das contradições (Narciso, 2020) etc.

A vida pública que tem lugar nos espaços públicos nada mais é do que um processo de coexistência da diversidade citadina, isto é, de construção e desconstrução dos códigos de convivência (Castro, 2002). Em outras palavras, à luz dos encontros públicos e das interações face-a-face que ocorrem em lugares que reúnem públicos diversos, a cidade, literalmente, se encontra (Borja & Muxí, 2001), convive e se diferencia (Andrade & Baptista, 2015); mobiliza identidades e confere visibilidade, simultaneamente, às diversidades e aos conflitos (Machado & Santos, 2019), às virtudes e aos problemas (García, 2005; Dascal, 2007). Essa convivência socioespacial da diversidade é, tal como argumentam vários autores, essencial à existência das sociedades republicanas e democráticas (Gomes & Ribeiro, 2018). Os espaços públicos, independentemente das formas que assumem (Ojeda, 2003), constituem verdadeiros territórios de conciliação ou atenuação dos conflitos de interesse, pois, mobilizam poderes espacialmente (Gomes, 2020), organizando a convivência entre indivíduos e grupos que, em princípio, interagem de maneira “livre” e “igualitária”, compondo públicos diversos (Díaz & Ortiz, 2006).

Não podemos nos esquecer, no entanto, que os espaços públicos urbanos, livres ou abertos (praças, parques, ruas, largos, esquinas, áreas centrais etc.), que constituem parte significativa do espaço físico das cidades, estão inseridos em contextos urbanos, em muitos casos, extremamente desiguais e socioespacialmente “fragmentados” (Gomes, 2005; Fonseca, 2005; Sobarzo, 2006). Por esse motivo, como não poderia deixar de ser, os espaços públicos citadinos tornam evidentes os inúmeros problemas e contradições inerentes às cidades (Martins, 2013; Leite, 2002), mas também as diferentes formas de resistências e mobilizações, sejam elas de ordem política (Castro, 2004; Borges, 2018; Filho 2018) ou culturais (Gutmann & Schicchi, 2013; Sant’Anna & Carneiro, 2017; Passos, 2014). Não por acaso, a dinâmica de funcionamento dos espaços públicos, suas formas de uso e apropriação, por exemplo, podem variar enormemente em diferentes contextos temporais (Calliari, 2014), espaciais (Burgos, 2015) e espaço-temporais (Góis, 2018).

Durante muitas décadas, a bibliografia acadêmica dedicada aos estudos urbanos pouco refletiu sobre as diversas formas de experiências individuais e coletivas características da vida cotidiana dos espaços públicos (Segovia, 2007). Não obstante, na virada do século XXI, o tema dos espaços públicos passou a ocupar um lugar de destaque. Estudos sobre o convívio da diversidade (Páramo et al., 2021), especialmente, em logradouros públicos centrais (Barros, 2016; López & Vieyra, 2021), demonstram como muitos espaços públicos, apesar das novas formas de controle e restrição (Andrade, Jayme & Almeida, 2009), continuam sendo utilizados por públicos diversos (Fernández, 2014), conferindo visibilidade à grupos e indivíduos que, geralmente, são invisibilizados (Robaina, 2011), excluídos (Frehse, 2016a, 2016b) e marginalizados (Sposito, 1993). Nesse contexto, é crescente o número de pesquisas que reflete sobre o papel fundamental que os espaços públicos desempenham na suscitação de debates diversos (Valverde, 2018).

Quais seriam então, especificamente nas cidades brasileiras, os impactos desse processo de fragmentação socioespacial sobre a vida pública, a esfera pública e os espaços públicos? Gostaríamos de destacar aqui seis contribuições que julgamos essenciais para o entendimento dessa problemática. De maneira geral, esses trabalhos demonstram, entre outras coisas, como a desigualdade socioespacial brutal que caracteriza o nosso país já há alguns séculos e que, infelizmente, segue sendo a nossa maior mazela, corrompe o nosso sistema político de cidadania de diversas formas. Nesse contexto, cada qual à sua maneira, esses estudos tornam evidente que, em nosso país, a cidadania não se traduz em um fenômeno homogeneamente distribuído, tanto em termos sociais quanto em termos espaciais (Souza, 2008; Serpa, 2007; Gomes, 2010; Caldeira, 2000; DaMatta, 1997; Santos, 2007).

Em 1987, o geógrafo brasileiro Milton Santos publicou um pequeno livro intitulado “O Espaço do Cidadão” (2002) que, apesar de praticamente não mencionar a expressão espaço público ao longo do texto, tratou do tema da cidadania à luz de um ponto de vista geográfico e, sobretudo, crítico, relacionando essa temática ao contexto nacional. De acordo com Santos, em uma sociedade tão profundamente injusta como a nossa, o princípio da igualdade que rege a ideia de cidadania perde completamente o sentido original de sua existência. Em outras palavras, em países extremamente desiguais (do ponto de vista geográfico, econômico, social, cultural, de classe, de gênero, de etnia, de “raça” etc.), a cidadania não se traduz em um fenômeno universal, tanto em termos sociais quanto em termos territoriais: “A definição atual da cidadania não escapa a essa regra. É uma cidadania mutilada, subalternizada, muito longe do que, habitualmente, em outros países capitalistas, define o instituto” (Santos, 2007, p. 37).

Para o sociólogo Roberto DaMatta, na sociedade brasileira, há um discurso generalizado que concebe os espaços públicos como lugares negativos: o espaço público não é necessariamente visto como um espaço de todos, mas sim como um espaço de ninguém, “sem dono”; uma forma de pensar que pode ser explicada por nosso histórico “personalismo”, um traço cultural bastante difundido em nossa sociedade. Por esse motivo, tendemos a vê-los como espaços onde há o predomínio do perigo, onde o discurso da ordem é tido como autoritário, onde a liberdade não pode ser experimentada em toda a sua plenitude, tal qual ocorre na “casa”, no espaço privado. Onde espaço público e espaço privado muitas vezes se confundem, como pode a cidadania estabelecer-se enquanto um valor individual e coletivo? Em uma sociedade incontestavelmente injusta e desigual como a nossa, pergunta-nos DaMatta: podemos falar em uma única cidadania ou haveria diferentes cidadanias associadas a lugares e/ou grupos sociais distintos? (DaMatta, 1997).

Conforme argumenta a antropóloga Teresa Caldeira, as grandes metrópoles brasileiras vêm se transformando, literalmente, em verdadeiras “cidades de muros”, em função, entre outras coisas, da existência de novos formas de autossegregação e segregação-imposta, do crescimento dos índices de violência e criminalidade urbanas e, sobretudo, de um discurso generalizado de “insegurança”, alimentado pela comunicação de massa. Tomando a cidade de São Paulo como palco principal de suas reflexões, Caldeira descreve como a maior metrópole do país vem se transformando em uma cidade cada vez mais dividida, segmentada em fragmentos que se comunicam pouco ou quase nada, apesar de serem interdependentes. A proliferação de condomínios e loteamentos fechados/privados destinados às elites e classes médias, de um lado, e a multiplicação de enclaves de pobreza e miséria nas favelas e periferias, de outro lado, constituiriam expressões evidentes do caráter fragmentário das cidades contemporâneas. Nesse contexto, os espaços públicos perdem a capacidade de reunir segmentos sociais diversos e, a “cidade pública”, concebida enquanto bem coletivo, se converte em “cidade privada” (Caldeira, 2000).

É nesse sentido que o geógrafo Paulo Cesar Gomes fala de um “recuo da cidadania” e, por conseguinte, dos espaços públicos. Gomes identifica quatro processos que, em conjunto, constituiriam expressões do “encolhimento” da cidadania e dos espaços públicos nas cidades contemporâneas: (1) a apropriação privada dos espaços públicos, leia-se, práticas socioespaciais privadas que se “superpõem” aos interesses públicos; (2) a progressão das identidades territoriais, isto é, proliferação de diferentes formas de identidades sociais e espaciais; (3) o emuralhamento da vida social, ou seja, o individualismo e o desinteresse pelas experiências públicas e comuns e (4) o crescimento das ilhas utópicas, tais como os condomínios e loteamentos fechados. Quando se perdem os espaços públicos de convivência, argumenta Gomes, afrouxam-se também os laços sociais e políticos. Nesse contexto: “As metrópoles desfazem-se em fragmentos socioespaciais e perdem a ideia de unidade” (Gomes, 2010, p. 191).

À luz de uma pesquisa sobre os espaços públicos de cidades como Salvador, São Paulo e Paris, o geógrafo Ângelo Serpa nos alerta para o fato de que esses espaços vêm sendo “privatizados” de diferentes maneiras, isto é, colonizados por interesses privados e não públicos. A partir de uma reflexão sobre processos de “requalificação” dirigidos aos espaços públicos das cidades contemporâneas, especialmente as praças e parques urbanos, Serpa (2007) demonstra como muitos desses espaços vêm sendo produzidos para atender aos anseios específicos das classes médias e elites urbanas. Essa verdadeira mercantilização dos espaços urbanos e públicos, segundo o autor, traz consequências muitas vezes irreversíveis para a existência de uma vida pública efetivamente democrática, acirrando ainda mais as divisões existentes entre diferentes grupos e classes que habitam cidades cada vez mais desiguais, de um ponto de vista socioespacial.

Tendo a cidade do Rio de Janeiro como exemplo, o também geógrafo Marcelo Lopes de Souza reflete sobre o processo de “militarização da questão urbana” nessa cidade, assolada pelo “medo generalizado” associado à criminalidade e à violência urbanas, que se transformou em um tema central na opinião pública local (e nacional) nas últimas décadas. Marcelo Lopes propõe que utilizemos a expressão “fragmentação do tecido sociopolítico-espacial” para se referir às especificidades dos processos de fragmentação inerentes à capital do estado do Rio de Janeiro, antiga capital do República. Segundo Souza (2008), o aspecto mais marcante desse processo de fragmentação na cidade do Rio de Janeiro é a existência das favelas no interior ou nas proximidades dos bairros de classes média e alta, isto é, assentamentos urbanos precários caracterizados por baixos ou baixíssimos níveis de “desenvolvimento sócio-espacial” encravados nos bairros mais valorizados que circundam do núcleo metropolitano.

Em fins do século XIX e início do século XX, surgem as primeiras favelas da cidade do Rio de Janeiro, que eram compostas, entre outros grupos, pelas camadas populares que haviam sido “removidas” (expulsas) da área central da cidade após a realização de obras de “modernização”. Geralmente, essas favelas recém-formadas se localizavam em áreas pouco cobiçadas pelas elites e pelo mercado imobiliário, como nas montanhas e encostas características do acidentado relevo da cidade, por exemplo. Diante da completa inexistência de uma política pública de habitação dirigida às classes populares no Brasil, praticamente todas as casas e edificações, em sua maioria precárias, foram sendo levantas aos poucos, via autoconstrução, em condições habitacionais e urbanísticas rudimentares, sem nenhum tipo de assistência do Estado (Abreu, 1997).

Segundo dados disponibilizados pelo IBGE, no último censo realizado em 2010, a cidade do Rio de Janeiro é aquela que detém a maior proporção de pessoas residentes em favelas no Brasil, dos cerca de 6,5 milhões de habitantes da cidade, 22% vivem nas mais de 760 favelas contabilizadas apenas no município, que conta com 163 bairros[ii]. Para qualquer morador da cidade do Rio de Janeiro, a percepção de que grupos sociais distintos vivem em “fragmentos” relativamente descontínuos é, muito provavelmente, quase que generalizada, especialmente, quando se trata do Brasil, uma das sociedades mais desiguais do planeta[iii].

Desde os anos 1980, quando a população da cidade e das favelas cresceu sobremaneira, muitas dessas áreas foram territorializadas por organizações criminosas que, aproveitando-se da ausência do Estado, dominaram essas localidades submetendo sua população à níveis inaceitáveis de violência. Nessas favelas, os “cidadãos” (sem direitos) são oprimidos e violentados, historicamente, de diferentes formas: primeiramente, pelo próprio Estado, que, além de não garantir direitos à essa população, através de seu braço armado, a polícia (militar) que mais mata e morre no mundo, age com enorme violência nessas comunidades para supostamente “combater a violência”, vitimando milhares de pessoas que vivem nessas áreas anualmente, na imensa maioria dos casos, jovens negros[iv]; em segundo lugar, pelas organizações criminosas, narcotraficantes varejistas e grupos paramilitares de milicianos, que controlam a maior parte dessas localidades com mãos-de-ferro, submetendo os seus moradores às suas próprias leis, as leis do crime; e, em terceiro lugar, por diferentes setores da sociedade civil que, à luz de estereótipos generalizantes, criminalizam e marginalizam a pobreza, as favelas e os “favelados”, em especial, a população negra que, desde a escravidão até os dias atuais é, literalmente, massacrada por uma sociedade racista e “criminógena” (Souza, 2008).

Segundo Marcelo Lopes de Souza, em tal contexto, os espaços públicos se encontram em avançado estado de “anemia”, pois, além da fragmentação, o medo do “outro” impossibilita a realização plena das relações sociais. Nesse sentido, pode-se falar em uma deterioração da “democracia” e da “cidadania”, não apenas no plano institucional, mas, também, no plano da vida cotidiana. De um lado, os bairros “formais”, destinados às classes médias e elites e, de outro lato, as vezes com poucos metros de distância, as favelas, enclaves da pobreza, das desigualdades e da ausência de direitos, como se isso não bastasse, territorializadas por organizações criminosas. No meio disso tudo, os espaços públicos, “abandonados”, “cercados”, “monitorados”, “controlados”, “vigiados” e “decadentes”: “isso já não é mais apenas ‘segregação’, isso é uma verdadeira fragmentação – uma fragmentação do tecido sociopolítico-espacial” (Souza, 2008, p. 87).

Diante do prognóstico pessimista esboçado até aqui, seria perfeitamente legítimo decretar, como fizeram muitos autores, a “morte” (Sennett, 1989), a “destruição” (Davis, 1993) ou até mesmo o “fim” dos espaços públicos (Sorkin, 1992). Contudo, não será essa a conclusão desse tópico. Pois, segundo o ponto de vista aqui defendido, mesmo com todos os problemas e contradições estruturais que caracterizam as sociedades e cidades contemporâneas, é possível perceber a existência de fenômenos e processos que parecem contestar as lógicas fragmentárias e, nesse contexto, os espaços públicos e as sociedades civis “desorganizadas” cumprem papéis fundamentais. É óbvio que a dinâmica de funcionamento desses espaços não pode ser completamente dissociada dos processos mais gerais que caracterizam a urbanização, no Brasil e no resto do mundo. Contudo, há algum nível de autonomia da vida pública que não pode ser simplesmente ignorado, como ocorre em grande parte dos estudos consultados.

A cidade do Rio de Janeiro é, nesse sentido, um caso emblemático: nessa cidade, há diferentes exemplos de espaços públicos que têm como característica essencial o fato de que atraem públicos socioespacialmente muito diversos. É importante que se diga, desde já, que não se trata de promover uma “romantização” dos espaços públicos, mas sim de reconhecer que, tanto na cidade do Rio de Janeiro quanto em outras cidades do Brasil, existem espaços públicos que, ao promoverem a convivência de públicos diversos, se contrapõem aos processos de fragmentação socioespacial. O tema é, como se sabe, extremamente complexo e, em alguma medida, controverso. Porém, uma coisa é certa: jamais reconheceremos a importância dos espaços públicos nas cidades contemporâneas se não promovermos estudos empíricos em espaços públicos que atraem públicos diversos. Em outras palavras: se olharmos apenas para os espaços públicos que reproduzem lógicas fragmentárias, estaremos fechando os olhos para os espaços públicos que expressam outras lógicas socioespaciais.

3. Sobre a importância dos espaços públicos na cidade do Rio de Janeiro: a opinião dos frequentadores das praças do bairro da Tijuca

O bairro da Tijuca, escolhido para o nosso estudo de caso empírico, é um dos mais antigos bairros residenciais da cidade do Rio de Janeiro, localizado na zona-norte da cidade, próximo ao núcleo central. Trata-se do único bairro da cidade em cuja própria toponímia designa os seus habitantes, os “tijucanos”. Os autores que refletem sobre o processo de urbanização desse bairro são unânimes em reconhecer que a história do bairro se confunde com a história da própria cidade. No bairro da Tijuca, como dito antes, estima-se uma população total de cerca de 170.000 residentes. Atualmente, há nas proximidades da Tijuca cerca de 17 favelas, entre as maiores estão: Salgueiro (1901); Formiga (1911); Borel (1921); Bananal (1921); Turano (1928); Casa Branca (1931); Liberdade (1931); Chacrinha (1941); Coréia (1946); Morro do Cruz (1950); Indiana (1965); Chácara do Céu (sem informação) e Pedaço do Céu (sem informação). Algumas delas, como as favelas do Salgueiro, Borel e Formiga, por exemplo, que surgiram ainda nas primeiras décadas do século XX, estão entre as mais antigas da cidade (Cardoso, 1984; Santos, Leite & Franca, 2003; Rose & Aguiar, 2004).

A escolha pelo bairro da Tijuca para a realização do estudo empírico se deve, entre outras coisas, à importância amplamente reconhecida das praças tijucanas para a integração de públicos diversos no interior do bairro. Trata-se, pois, a meu ver, de um traço distintivo fundamental da identidade carioca, em geral, e da tijucana, em particular: a pujante vida pública que tem lugar nos seus espaços públicos e, mais especificamente, nas suas praças. Conforme se pode observar no mapa de localização das praças do bairro da Tijuca (Figura 2) e no mosaico de fotografias das praças (Figura 3), há um total de 29 praças distribuídas pelo interior do bairro. Podemos organizar esse conjunto de praças em três grupos: grandes, médias e pequenas, isto é, segundo uma tipologia de tamanhos, classificação essa que foi proposta pela geógrafa Amanda Fernandes de Carvalho em uma pesquisa anterior, que concebia as diferentes praças do bairro como unidades componentes de um sistema de espaços públicos (Carvalho, 2016). Neste tópico do trabalho, apresentaremos e comentaremos brevemente os resultados da pesquisa empírica que realizamos sobre o tema dos espaços públicos no bairro da Tijuca. Nas páginas que se seguem, concentraremos nossa atenção nos dados referentes às três maiores praças do bairro, onde foram aplicadas, como dito antes, 45 entrevistas estruturadas e 655 questionários com os frequentadores.

Comecemos pelas entrevistas, um conjunto de 10 perguntas de âmbito geral sobre a opinião dos frequentadores acerca de questões referentes ao tema dos espaços públicos[v]. A primeira pergunta da entrevista (Figura 4), simples e objetiva, buscava saber qual a porcentagem de pessoas que costumava frequentar diferentes espaços públicos da cidade do Rio de Janeiro: 71% dos entrevistados disseram que frequentam diversos espaços públicos na cidade, enquanto 29% deles afirmaram que não costumavam frequentar muitos espaços públicos na cidade, na maioria dos casos, por fazerem uso apenas daqueles mais próximos aos seus bairros de residência: “frequento geralmente próximo à residência” (Nº 17); “normalmente só esse, onde está sendo realizada a entrevista” (Nº 18); “sempre são os mesmos” (Nº 19); “só frequento aqui mesmo” (Nº 36) (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

O segundo gráfico, referente à segunda pergunta (Figura 4), indagava os frequentadores acerca dos tipos de espaços públicos que eles mais utilizavam, atribuindo um valor em uma escala de 0 a 5, em que 5 representa a maior frequência de uso, 1 a menor frequência de uso e 0 a não utilização: as praças (3,86), calçadas (3,63), ruas de veículos (3,31) e centros comerciais (3,25) obtiveram as maiores médias, constituindo, pois, os tipos de espaços públicos mais utilizados; as praias (2,95); parques (2,34); calçadões (2,04); largos (1,61) e ciclovias (0,9) aparecem logo em seguida, com médias um pouco inferiores. Esse gráfico, em certo sentido, confirma algumas informações do gráfico anterior, na medida em que demonstra que os espaços públicos utilizados com maior frequência são aqueles próximos aos locais de residência dos entrevistados, tendo em vista que as praças e calçadas são os espaços públicos mais comuns nos bairros residenciais da cidade. Merece destaque ainda as altas médias atribuídas às praias e parques, que demonstra o apreço dos cariocas, em geral, e dos tijucanos, em particular, pelo “contato com a natureza” nos espaços públicos abertos.

Conforme sugerem os dados, grande parte das pessoas indagadas faz uso de diferentes espaços públicos na cidade e no bairro. Essas informações podem parecer banais, mas não são. Partindo-se do princípio de que a convivência de públicos diversos é um dos mais importantes componentes da publicidade, isto é, o atributo daquilo que é público, seria perfeitamente plausível afirmar que os espaços públicos livres, abertos ou urbanos, especialmente os mais icônicos e frequentados, podem ser chamados de verdadeiros lugares centrais da vida pública citadina, pois, eles atraem públicos de diferentes partes da cidade e, mais importante ainda, reúnem públicos diversos, levando-se em consideração diferentes critérios de diferenciação. Em poucas palavras: existe uma centralidade pública que, em alguma medida, se contrapõe aos processos de fragmentação socioespacial.


Figura 2
Mapa de localização das praças tijucanas organizadas segundo uma tipologia de tamanhos
elaboração própria, 2020.


Figura 3
Mosaico de fotografias das praças do bairro da Tijuca
acervo do autor, 2020.


Figura 4
Gráficos (entrevista)
elaboração própria, 2020.


Figura 5
Nuvem de palavras e gráfico (entrevista)
elaboração própria, 2020.

A terceira pergunta (Figura 5) indagava os frequentadores acerca das características que mais os atraiam nos espaços públicos, entre as características mais citadas, destacam-se as seguintes: a escassez de construções e edifícios; a presença de amenidades (ar livre/puro, natureza, beleza do lugar); além de atividades como caminhadas e conversas. Em suas palavras: “o ar livre, muito maravilhoso você poder desfrutar do sol e das pessoas, a diversidade, as coisas que acontecem, essa praça, por exemplo” (Nº 1); “é bonito, é tranquilo, é sossegado, a gente pode respirar, relaxar, é fresquinho” (Nº 5); “escassez de construção mais as questões de natureza” (Nº 5); “nos parques é o ambiente natural, nas praças são os brinquedos das crianças” (Nº 7); “uma oportunidade de trabalho” (Nº 9); “a liberdade de qualquer um transitar, estarem bem conservados e o ar livre” (Nº 10); “o fato de que aqui é um espaço pro cachorro, tem equipamentos para isso” (Nº 14); “ver um pouco de gente, distrair um pouco a mente” (Nº 29); “eu prefiro o ar livre, eu não gosto de shopping, de lugar fechado, gosto de estar na rua e fazer as coisas, e gosto de lugares pertos, aqui posso encontrar pessoas, pode socializar” (Nº 32); “[a presença de] pessoas diferentes” (Nº 39); “gratuidade, heterogeneidade de pessoas, é um espaço aberto” (Nº 40) etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

A quarta questão (Figura 5) perguntava aos entrevistados se eles achavam que o público frequentador dos espaços públicos era diverso, levando-se em consideração diferentes critérios de diferenciação: 90% dos entrevistados consideravam que sim, que os espaços públicos são frequentados por todos os “tipos” de pessoas. Dois desses entrevistados fizeram ressalvas: “dependendo do bairro, cada um tem um tipo” (Nº 29); “aqui sim, mas depende, acho que não é todos os lugares” (Nº 32); segundo esses entrevistados, dependendo do lugar, da localização ou da situação dos espaços públicos, o seu público frequentador poderá ser mais ou menos diverso (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).


Figura 6
Gráficos (entrevista)
elaboração própria, 2020.

Diferentes espaços públicos tendem a atrair públicos distintos, ou seja, há muitas variáveis que interferem, direta ou indiretamente, na dinâmica de funcionamento desses espaços: a localização geográfica, as características do sítio, a situação, a acessibilidade, os tipos de equipamentos, o mobiliário urbano, a heterogeneidade do público, as atividades, ações e comportamentos dos frequentadores etc. As formas de uso e apropriação dos espaços públicos, conforme evidenciam os dados, podem ser muito diversas; não obstante, no caso específico das três praças estudadas, é muito evidente que, além das características físico-morfológicas, a reunião de públicos constitui, certamente, um dos mais importantes atrativos. É nos espaços públicos do bairro que, literalmente, as “favelas” e o “asfalto” se encontram, “relativizando” e, em alguma medida, “questionando” a segregação residencial na escala do bairro e, se levarmos em consideração a escala da cidade do Rio de Janeiro, os processos de fragmentação socioespacial.

A quinta pergunta da entrevista (Figura 6) indagava os frequentadores acerca das formas de uso ou apropriação das quais eles não gostavam: a maioria dos entrevistados, 58%, afirmou que nenhuma forma de uso/apropriação incomodava; enquanto 42% deles disseram que se incomodavam com algumas coisas, vejamos alguns exemplos: “quando alguém coloca um som muito excessivo, como um som potente em um carro, quando passam do limite normal de sonoridade” (Nº 1); "não cuidarem dos locais, sujar, jogar lixo, danificar aparelhos, bancos, os parquinhos das crianças, as vezes tem um adulto brincando que não é compatível” (Nº 4); “nada me incomoda” (Nº 5); “especificamente da praça aqui eu não gosto dos cavalos, o problema não é nem na hora, é depois com o cheiro, mas de maneira geral nenhum uso me incomoda” (Nº 6); “as vezes têm pessoas que não sabe utilizar, tipo não saber usar direito os brinquedos” (Nº 8); “os malucos fumando maconha ali, por exemplo, mas não me incomoda” (Nº 11); “existe o mal uso, não tem muita educação” (Nº 12) etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

A sexta questão (Figura 6) perguntava se algum “tipo” de frequentador os incomodava: 68% dos entrevistados disseram que não e 32% que sim, vejamos como algumas pessoas justificaram suas respostas: “não, desde que não me incomode” (Nº 1), “a gente entende o social da cidade numa forma geral, mas têm moradores de rua que as vezes têm idosos e crianças e incomoda um pouco, mas não assim discriminando” (Nº 4); “não, é público, não é?” (Nº 6); “pelo menos aonde eu vou não tem problema de ‘crackudo’ não, mas se tiver muito fica ruim” (Nº 7); “o frequentador que se coloca no espaço buscando proveito próprio sem saber dividir” (Nº 9); “usuários de maconha perto de crianças” (Nº 12); “não, só isso que acabei de falar, mas é o uso, não a pessoa” (Nº 18); “dependendo do lugar, sim” (Nº 24); “pessoas de rua” (Nº 26); “não, só se for pessoa que dorme na praça, mas isso aí não tenho mais visto” (Nº 29); “não, só alguns ‘pivetinhos’ e pedintes que enchem o saco de vez em quando” (Nº 30); “o frequentador não me incomoda, mas sim os usos impróprios” (Nº 32); “sim, os flanelinhas, os pedintes” (Nº 33) etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

Quanto mais diversos forem os públicos frequentadores dos espaços públicos, ao menos em tese, mais diversos serão os interesses das pessoas envolvidas nesse processo de coexistência socioespacial. Nesse contexto, a existência de “conflitos” e “acordos” são concebidos como partes essenciais dos ritos que caracterizam a vida pública. Diferenças nas formas de uso apropriação, por exemplo, tal como demonstram os dados, constituem alguns dos mais importantes delimitadores desses “conflitos” e “acordos. Nesse processo de copresença citadina, como não poderia deixar de ser, por um lado, a diversidade de públicos é celebrada como um atrativo incondicional, construindo e desconstruindo os códigos e acordos de convivência; por outro lado, porém, os conflitos de interesse tendem a “segmentar” o público conforme os interesses desses indivíduos e grupos envolvidos nesse processo de interação.

A sétima questão (Figura 7) perguntou aos frequentadores se eles se sentiam “seguros” quando estavam nos espaços públicos: a maioria dos entrevistados, 59%, disse que não se sentia segura nesses espaços, enquanto 41% dos entrevistados disseram que sim, que se sentiam “seguros”. Esse dado reflete, em alguma medida, aquilo que fica evidente nas respostas dos entrevistados, isto é, o receio que muitas pessoas têm de tornarem-se vítimas da violência urbana: “considero, por incrível que pareça, mas acho que sou um pouco fora da média” (Nº 1); “não, em determinado horário, a noite principalmente, não tem segurança” (Nº 4); “não, nada aqui é seguro, falta polícia” (Nº 8); “esse aqui eu considero que sim, outros não, principalmente quando é pouco frequentado” (Nº 10); “comigo nada aconteceu” (Nº 13); “inteiramente seguros não, muitos relatos de assalto” (Nº 14); “mais ou menos, depende da hora, a frequência muda com a hora, de noite fica muito deserto” (Nº 19); “de certa forma é, tem policiamento” (Nº 21); “hoje em dia tá tão perigoso que só estar sentado aqui que acontece algo, um assalto, um tiroteio, a violência urbana em geral” (Nº 23); “mais ou menos, os ‘pivetes’ são perigosos, principalmente na Saens Peña, é o que mais tem” (Nº 24); “relativamente, não pelo espaço, mas sim por ser no Rio de Janeiro” (Nº 43); “Rio de Janeiro nenhum lugar é seguro” (Nº 30) etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

A oitava pergunta (Figura 7) indagava a opinião dos frequentadores acerca da presença ostensiva de agentes de segurança pública e/ou privada nos espaços públicos: apesar de existirem várias vozes discordantes, a maioria dos frequentadores é favorável à presença de agentes de segurança nos espaços públicos, pois, supostamente, isso ajudaria a coibir eventuais crimes e melhoraria a assim chamada “sensação de segurança”: “eu acho necessário um mínimo de controle na cidade que a gente tá vivendo” (Nº 1) “se ele não estiver com o fuzil apontado pra gente é ótimo, e normalmente isso acontece” (Nº 2); “seria ideal, não digo 24 horas, mas até um certo horário, que é para as pessoas usufruírem daquilo ali” (Nº 3); “ajuda, se os caras tiverem educação” (Nº 7); “péssimo” (Nº 9); “é controverso, mas é um mal necessário” (Nº 11); “acho horrível, funciona como repressão” (Nº 14); “falta muita segurança” (Nº 16); “é muito bom, ótimo” (Nº 18); “me sinto ameaçada, porque eles não são treinados, pode ter bala perdida, tiroteio” (Nº 43); “acho ineficiente” (Nº 38); “eu acho que é necessário ter guardas municipais ou seguranças privados” (Nº 44); “acho que não adianta nada (Nº 37)” etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).


Figura 7
Gráfico e nuvem de palavras (entrevista).
elaboração própria, 2020.


Figura 8
Gráfico e nuvem de palavras (entrevista)
elaboração própria, 2020.

No caso específico da cidade do Rio de Janeiro, que, nas últimas décadas, experimentou crescimentos vertiginosos dos índices de violência e criminalidade urbanas, amplamente propalados pelos veículos de imprensa, conforme sugerem os dados empíricos, difundiu-se entre os cidadãos da cidade uma permanente “sensação de insegurança”, que influencia de maneira muito negativa, direta ou indiretamente, a vida pública que tem lugar nos espaços públicos; onde, os “outros”, os “diferentes”, nomeadamente, indivíduos e grupos que pertencem a classes ou segmentos sociais desfavorecidos, marginalizados e/ou excluídos, são vistos como potenciais “criminosos”, não apenas pelas autoridades públicas ou privadas de “segurança”, mas também por determinadas parcelas da sociedade civil. Nesse contexto, em muitos casos, os espaços públicos citadinos, mesmo promovendo a articulação de públicos diversos, acabam corroborando, em maior ou menor grau, lógicas fragmentárias, terreno fértil para a reprodução de preconceitos e estereótipos generalizantes, mas também para o seu questionamento

A nona questão (Figura 8) perguntava aos entrevistados, em uma escala de 0 a 5, qual a importância dos espaços públicos para determinadas atividades. Quase todas as atividades obtiveram médias superiores a quatro: lazer (4,69), prática de atividades físicas (4,55); protestos (4,41); encontrar pessoas conhecidas (4,41); interação social (4,39); deslocamentos (4,23); encontrar desconhecidos (4); fazer compras (3,69). A última questão da entrevista (Figura 8) indagava os frequentadores acerca das principais atividades que eles costumam realizar nos espaços públicos que frequentavam. Entre as atividades mais citadas estavam aquelas associadas à prática de exercícios físicos, tais como caminhar e andar de bicicleta, além daquelas atividades de caráter mais “lúdico”, como o entretenimento infantil ou mesmo conversar com outras pessoas, vejamos alguns exemplos de respostas: “leitura, conversas e contemplação” (Nº 1); “caminhar, beber uma cerveja” (Nº 15); “ando bastante, faço caminhada, relaxo um pouco” (Nº 30); “costumo ficar sentado relaxando e conversando” (Nº 3); “andar de patins, bicicleta, bola, correr, trazer as crianças para brincar” (Nº 8); “só vou pra trabalho mesmo” (Nº 24); “tomar sol, caminhar, pegar um banho de mar, desfrutar do ambiente livre” (Nº 10); “trabalho ou lazer” (Nº 35); “fumar um, refletir, desestressar” (Nº 13); “não faço nada” (Nº 21); “eu vou trabalhar, vou passear com meu filho, vou comprar alguma coisa” (Nº 32); “eu gosto mais de sentar com alguém e bater papo” (Nº 34); “comer, conversar, relaxar, brincar” (Nº 39) etc. (Entrevistas realizadas em 10/01/2018; 18/01/2018 e 11/11/2018).

As atividades realizadas por essas pessoas nos espaços públicos estudados são, conforme demonstram os dados, consideravelmente diversas. São nas praças do bairro que os conflitos de interesse se transformam, literalmente, em acordos. Há uma natureza política no estabelecimento desses códigos de convivência que, geralmente, é pouco aludida. À luz desses encontros e desencontros públicos, mediados por uma infinidade de interesses individuais e coletivos, a cortesia, a civilidade, a urbanidade, a polidez, a urbanidade, a cidadania e o cosmopolitismo, valores considerados essenciais às sociedades republicanas e democráticas, se convertem em realidade empírica: trata-se daquilo que podemos chamar de sociabilidade pública (Souza, 2020). Nas próximas páginas, apresentaremos ao leitor um conjunto de gráficos que se refere aos 655 questionários aplicados nas três maiores e mais icônicas praças do bairro da Tijuca, que objetivam, em linhas gerais, traçar um perfil sociodemográfico dos frequentadores dessas praças.


Figura 9
Gráficos (questionário)
elaboração própria, 2020.


Figura 10
Gráficos (questionário)
elaboração própria, 2020.

Os quatro primeiros gráficos atinentes aos questionários (Figura 9) fazem referência aos dados sociodemográficos de nossa amostra aleatória de frequentadores das praças tijucanas: o primeiro gráfico (sexo) se refere ao número de homens (48%) e mulheres (52%) que participou da pesquisa; o segundo gráfico (idade) demonstra como a nossa amostra foi composta por frequentadores de diversas faixas-etárias, com predomínio de pessoas entre 20 e 60 anos de idade; o terceiro gráfico faz referência aos diferentes graus de instrução dos frequentadores, demonstrando como a maior parte das pessoas indagadas tinha o segundo ou terceiro graus completos; o quarto gráfico dessa série demonstra como a amostra de frequentadores também era diversa no que diz respeito aos tipos de ocupação, empregoƒ e remuneração.

Os frequentadores foram indagados também sobre o número de vezes que costumam utilizar os espaços públicos (Figura 10), considerando-se determinados intervalos de tempo (frequência de uso): 33% dos entrevistados afirmaram que costumam utilizar os espaços públicos praticamente todos os dias e 27% deles disseram que os utilizam entre duas e três vezes por semana, isto é, mais da metade dos frequentadores das praças tijucanas faz uso regular de diferentes espaços públicos. O último gráfico dessa série (Figura 10) se refere ao período da semana em que os frequentadores costumam utilizar esses espaços, os resultados demonstraram que a maior parte das pessoas utiliza os espaços públicos tanto nos dias de semana quanto nos fins de semana (37%), enquanto o restante dos frequentadores os utiliza especificamente nos dias de semana ou fins de semana. Tal como sugerem os dados empíricos, de maneira espontânea, esse processo de convivência socioespacial de públicos diversos ocorre quase que diariamente nos diferentes espaços públicos do bairro da Tijuca e da cidade do Rio de Janeiro, construindo e desconstruindo os códigos de convivência, os laços sociais, políticos, culturais, identitários etc.; reproduzindo e, simultaneamente, questionando o racismo, o machismo, a homofobia, a xenofobia, os estereótipos, as generalizações, as desigualdades etc.

4. Considerações finais

No presente artigo, propomos uma reflexão, teórica e empírica, acerca da relação entre dois temas de pesquisa que, nas últimas décadas, tornaram-se fundamentais na agenda dos assim chamados estudos urbanos: espaços públicos e fragmentação socioespacial. Em termos teóricos, demonstramos, entre outras coisas, como a literatura especializada nesses temas dificilmente estabelece uma relação de complementaridade entre esses debates e, mesmo quando esses temas aparecem vinculados, os espaços públicos são concebidos, geralmente, como meros “reprodutores” de uma lógica socioespacial fragmentária. Conforme argumentamos ao longo do texto, no entanto, o estabelecimento de um diálogo entre essas duas abordagens representa uma valiosa oportunidade para construirmos instrumentos analíticos que nos possibilite tornar inteligível a dialética entre fragmentação e articulação nas cidades contemporâneas.

Qual a importância dos espaços públicos no contexto das cidades fragmentadas? No bairro da Tijuca, cidade do Rio de Janeiro, em um contexto socioespacialmente “segregado”, “segmentado” e “dividido”, que separa as favelas dos bairros formais, onde grupos sociais distintos vivem em fragmentos urbanos justapostos, conforme demonstramos em nosso estudo de caso empírico, existe uma vida pública que, em alguma medida, se contrapõe às lógicas fragmentárias. Nesse sentido, seria legítimo argumentar: no contexto das cidades fragmentadas, os espaços públicos cumprem uma função fundamental - a convivência da diversidade citadina. Esse verdadeiro “encontro marcado” que ocorre nas praças do bairro constitui um elemento fundamental de reconhecimento das diversidades e, simultaneamente, das profundas desigualdades que caracterizam as nossas cidades.

Não se trata, nesse sentido, de “idealizar” os espaços públicos, tão pouco os muitos problemas e contradições inerentes às cidades contemporâneas, mas sim reconhecer que, nos interstícios da fragmentação, existe uma vida pública que não pode ou deve ser ignorada. Se pretendemos construir cidades mais justas e democráticas, precisamos encontrar formas mais contundentes de combater as desigualdades e, por extensão, as lógicas fragmentárias que, direta ou indiretamente, delas derivam. As transformações das quais precisamos são estruturais, não resta dúvidas, contudo, para alcançá-las, não podemos fechar os olhos para os espaços públicos. Como bem argumentava a filósofa Hannah Arendt, o próprio conceito de democracia, tomado em sentido amplo, remete à ideia da convivência pacífica da pluralidade, condição essencial para a existência de sociedades que se pretendam realmente livres, igualitárias, fraternas e diversas: realidade ainda distante das nossas cidades.

Material suplementario
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Notas
Notas
[i] Pesquisa financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES.
[ii] Fonte: https://infograficos.oglobo.globo.com/rio/as-dez-favelas-mais-populosas-do-rio.html (acessado em: 09/01/2022).
[iii] Para alguns dados aberrantes sobre as desigualdades brasileiras, sugiro a leitura dos relatórios anuais produzidos pela OXFAM Brasil, filial nacional da ONG britânica OXFAM. Fonte: https://www.oxfam.org.br/um-retrato-das-desigualdades-brasileiras/ (acessado em 05/02/2022).
[iv] Os números são muito chocantes: segundo dados disponibilizados pela Rede de Observatórios da Segurança, no ano de 2020, por exemplo, apenas para se ter uma ideia, 1245 pessoas foram mortas em operações policiais re alizadas apenas no Estado do Rio de Janeiro, desse total, 86% eram pessoas negras. Fonte: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2021/12/14/estudo-diz-que-86percent-dos-mortos-em-acoes-policiais-no-rj-sao-negros-apesar-de-grupo-representar-517percent-da-populacao.ghtml (acessado em 05/02/2022).
[v] Os números que aparecem entre parênteses após os trechos selecionados das entrevistas se referem à numeração associada aos entrevistados. Cabe aqui uma ressalva: o conteúdo das falas dos entrevistados é de responsabilidade exclusiva dos mesmos, elas não refletem a opinião do autor.

Figura 1
Mapa de localização do bairro da Tijuca
elaboração própria, 2020.

Figura 2
Mapa de localização das praças tijucanas organizadas segundo uma tipologia de tamanhos
elaboração própria, 2020.

Figura 3
Mosaico de fotografias das praças do bairro da Tijuca
acervo do autor, 2020.

Figura 4
Gráficos (entrevista)
elaboração própria, 2020.

Figura 5
Nuvem de palavras e gráfico (entrevista)
elaboração própria, 2020.

Figura 6
Gráficos (entrevista)
elaboração própria, 2020.

Figura 7
Gráfico e nuvem de palavras (entrevista).
elaboração própria, 2020.

Figura 8
Gráfico e nuvem de palavras (entrevista)
elaboração própria, 2020.

Figura 9
Gráficos (questionário)
elaboração própria, 2020.

Figura 10
Gráficos (questionário)
elaboração própria, 2020.
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