Dossier
Configurações visuais do centro urbano do Império Espanhol: comparações entre o Zócalo, na Cidade do México, e a Plaza Mayor, em Madri
Configurações visuais do centro urbano do Império Espanhol: comparações entre o Zócalo, na Cidade do México, e a Plaza Mayor, em Madri
H-ART. Revista de historia, teoría y crítica de arte, núm. 5, pp. 177-194, 2019
Universidad de Los Andes
Recepção: 23 Janeiro 2019
Aprovação: 26 Março 2019
Resumen: Se realizará una comparación entre la sede del Imperio Español, Madrid, y la sede del Virreinato de Nueva España, Ciudad de México, en lo que se refiere a la configuración visual de sus respectivas plazas principales, la Plaza Mayor y el Zócalo, siglos XVI y XVII. En este período, las diversas modificaciones que ocurrieron en la configuración de ambas plazas demuestran varios elementos en común. El objetivo de esta comparación es verificar las influencias de modelos indígenas y europeos entre las capitales del Imperio Español a ambos lados del Atlántico, para constituir de esta manera una visualidad urbana de esos lugares como centros de poder y sus significa- dos simbólicos y así demostrar que la gran plaza amerin- dia influenció la formación de la Plaza Mayor en Madrid.
Palabras clave: Ciudad de México, Madrid, Plaza Mayor, Zócalo, Período Colonial, Urbanismo.
Resumo: Será feita uma comparação entre a sede do Império Espanhol, Madri, e a sede do Vice-Reino da Nova Espanha, Cidade do México, no que se refere à configuração visual de suas respectivas praças principais, a Plaza Mayor e o Zócalo, entre os séculos XVI e XVII. Nesse período, as di- versas modificações que ocorreram na configuração de ambas as praças demonstram vários elementos em comum. O objetivo dessa comparação é verificar as influências de modelos indígenas e europeus entre as capitais do Império Espanhol nos dois lados do Atlântico, para constituir desta maneira uma visualidade urbana desses locais como centros de poder e seus significados simbólicos e, assim, demonstrar que a grande praça ameríndia influenciou a formação da Plaza Mayor em Madri.
Palavras-chave: Cidade do México, Madri, Plaza Mayor, Zócalo, Período Colonial, Urbanismo.
Abstract: The headquarters of the Spanish Empire, Madrid, and the seat of the Viceroyalty of New Spain, Mexico City, will be compared regarding the visual configuration of their respective main squares, the Plaza Mayor and the Zocalo, between the Sixteenth Century and the Seventeenth Century. During this period, the modifications that occurred in the configuration of both squares demons- trate several elements in common. The purpose of this comparison is to verify the influences of indigenous and European models between the capitals of the Spanish Empire on both sides of the Atlantic, to constitute the urban visuality of these places as centers of power and their symbolic meanings. This, in order to demonstrate, thus, that the big Amerindian square influenced the formation of “Plaza Mayor” in Madrid.
Keywords: Mexico City, Madrid, Plaza Mayor, Zocalo, Colonial Era, Urbanism.
Introdução:
O filósofo argentino Enrique Dussel, um dos expoentes do pensamento decolonial, apresenta dois conceitos de Modernidade: primeiramente, o eurocêntrico, no qual “a modernidade é uma emancipação, uma ‘saída’ da imaturidade por um esforço da razão como processo crítico, que proporciona à humanidade um novo desenvolvimento do ser humano”1. O segundo conceito, proposto pelo filósofo, seria uma visão da “‘Modernidade’ num sentido mundial, e consistiria em definir como determinação fundamental do mundo ‘moderno’ o fato de ser (seus Estados, exércitos, economia, filosofia, etc.) ‘centro’ da História Mundial”2. Essa História Mundial, ou seja, a compreensão do mundo como um lugar que tem uma única história e é contada a partir de um lugar, segundo Dussel, teria sido uma criação europeia iniciada com a chegada dos portugueses ao Extremo Oriente e dos espanhóis à América, dando início à operação do “Sistema-Mundo”,3 o qual divide o planeta de acordo com sistemas hierárquicos racistas, ou seja, centro e periferia, gerando uma relação de dependência do segundo grupo para com o primeiro, por meio da “colonialidade de poder”.4 A partir desse conceito, a Europa, representada pelo homem branco cristão, colocou-se na posição central na História Mundial, e passou a considerar todas as outras partes do planeta como subalternas e periféricas. Desta forma, todas as ações colonizadoras que a Europa exerceu sobre o mundo seriam justificadas pela “bandeira” da Modernidade que, segundo o semiótico argentino Walter Mignolo, adquiriu os sinônimos de “salvação” e “novidade”.5 Nesses termos, a colonização é entendida como consequência da modernidade, e seus atores, como libertadores dos povos pagãos da barbárie e promotores do desenvolvimento e do progresso.
Pretende-se fazer aqui uma abordagem da configuração visual das cidades americanas, em especial da Cidade do México, pelo viés teórico decolonial, ou seja, desconstruir narrativas eurocêntricas e demonstrar, não apenas permanências da cultura e do urbanismo ameríndios na cidade colonial, mas também que a experiência dos espanhóis na América com as cidades indígenas influenciaram reformas urbanísticas na Europa, como a configuração das “Plazas Mayores” na Espanha. A demonstração desse argumento será feita por meio da análise comparativa entre a Praça da Constituição, popularmente conhecida como Zócalo, na Cidade do México, e a Plaza Mayor de Madri. O arco temporal que o estudo compreende é entre o século XVI, quando se formam as duas praças (Zócalo, em 1524 e Plaza Mayor, a partir de 1590) e o século XVII, quando se instala a sede física do Mercado no Zócalo e a Plaza Mayor atinge sua configuração final. Primeiramente, será feita a descrição da praça mexicana, cuja localização insere-se no espaço da antiga grande praça asteca de Tenochtitlan, cidade tomada e destruída em 1521. Em seguida, será analisada a Plaza Mayor de Madri, cujo projeto iniciado em 1590, foi parte da remodelação da cidade que se tornou a capital do reino da Espanha a partir de 1561, e que se segue à Plaza Mayor de Valladolid, traçada por Francisco de Salamanca (c.1514-1573) e, também, a primeira que se aproxima do formato quadrangular. As análises serão baseadas na bibliografia e em itens cartográficos e iconográficos que permitam verificar suas diferentes configurações ao longo do tempo. Foram utilizados, sobretudo, mapas, deixando claro que, assim como outras representações artísticas, os mesmos são produtos de visões culturais e de época, especialmente nos primeiros séculos abordados. Foram também verificadas gravuras e fotografias de períodos posteriores, uma planta de 1933 demonstrando a sobreposição da configuração Cidade do México à de Tenochtitlan na área central, e desenhos esquemáticos da configuração de Madri no século XV.6
Os mapas originais escolhidos foram:
Mapa da Cidade do México em torno de 1550, conhecido como Mapa de Uppsala.
“Plano de Madrid em el siglo XV”.“
Cofradías y Congregaciones en 1600” em Madri.
“Plano de Madrid”, 1656, de Pedro de Teixeira.
As datas dos mapas não são as mesmas das modificações na cidade, mas foram escolhidos porque apresentam as alterações na configuração das praças de forma documental.
O trabalho será concluído com a comparação de ambas as praças, levando em conta os dados levantados. Não será possível, nesta oportunidade, ceder espaço à análise da arquitetura dos edifícios que contornam as praças.
O Zócalo, na Cidade do México
“El Zócalo” é o nome pelo qual é popularmente conhecida a principal praça da Cidade do México, cuja denominação oficial, desde 1812, é Praça da Constituição, devido à proclamação da Constituição Política da Monarquia Espanhola ou Constituição de Cádiz, promulgada naquele ano. No Período Colonial a praça teve outros nomes, tais como, Plaza de las Armas, Plaza Mayor ou Plaza del Palacio. Ela começou a ser chamada de “Zócalo” em 1843, quando uma base (“zócalo”, em espanhol) foi construída no centro da praça para receber o monumento à Independência mexicana, o qual nunca foi instalado ali. Com uma área de aproximadamente 39.600 m2, que corresponde às dimensões de 180× 220 m,7 o Zócalo está, atualmente, entre as quatro maiores praças do mundo, mas suas origens remontam ao período pré-hispanico.
Em 1521, as tropas espanholas lideradas por Hernán Cortez (1485-1547), assistidas por grupos indígenas aliados, tomaram e destruíram Tenochtitlan. A cidade tinha sido fundada em 1325 pelos mexicas, ou astecas e, em 1428, tinha assumido o domínio da região do Vale do México, sendo, portanto, considerada a capital do chamado Império Asteca. Apesar de situar-se no Lago Texcoco, a cidade comunicava-se com o continente por meio de estradas, algumas das quais também se ligavam a aquedutos para a obtenção de água potável para consumo. A cosmologia dos astecas os orientavam em todas as questões e atividades da vida, bem como em sua percepção de tempo e de espaço. O desenho urbano que elaboraram para Tenochtitlan refletia sua visão da ordem do universo: a área foi divida por estradas em cruz em 4 partes, de acordo com os 4 pontos cardeais, e ao centro, ficava o recinto sagrado, que fazia a união vertical com o céu e o inframundo. O recinto era constituído por 78 edifícios, entre eles, o Templo Mayor, com 45 metros de altura. As ruas e canais da cidade formavam um dese- nho basicamente ortogonal e a ocupação territorial era organizada segundo uma hierarquia, na qual as elites sociais, com suas casas construídas em pedra, ocupavam as áreas mais próximas ao centro, enquanto que o povo, com residências menores e feitas em adobe, ficava nas áreas mais periféricas. O edifício residencial mais importante era o Palácio Real –a residência do líder mexica–, que fazia frente à grande praça e estava ao lado do centro cerimonial. As praças uniam funções cerimoniais, civis, comerciais e sociais, o que fazia que o povo tivesse grande atividade e convivência ao ar livre. A grande praça de Tenochtitlan abrigava também um mercado, embora o maior da ilha estivesse na cidade vizinha de Tlateloco.
A primeira representação cartográfica da cidade de México-Tenochtitlan que se conhece, é o chamado Mapa de Nurbemberg, de 1524, atribuído a Hernán Cortez, que o teria enviado junto com sua segunda “Carta de Relación” ao Rei Carlos V (1500-1558), da Espanha, mostrando-se impressionado com Tenochtitlan, sua grandeza, riqueza, ordem, limpeza e a variedade e organização de seu mercado:
Procurarei dar, mui poderoso senhor, um pequeno relato das grandezas, maravilhas e estranhezas desta grande cidade de Tenochtitlán [sic],8 de sua gente, seus ritos e costumes, assim como da maneira ordeira como a governam [...]. Esta cidade é tão grande como Sevilha e Córdoba. As ruas principais são muito largas e retas. [...]. Há duas pontes, de vigas muito bem trabalhadas e fortes. Tem muitas praças, onde há contínuos mercados e pontos de compra e venda. [...]. Enfim, vendem tantas coisas que seria prolixo relatar todas aqui, mas é preciso salientar que em cada rua é vendido apenas um tipo de mercadoria, havendo muita ordem quanto a isso.9
No entanto, essa não foi a primeira representação da cidade. Os astecas, assim como outros povos da Mesoamérica, produziram extenso material documental a respeito de sua história. O antropólogo e historiador mexicano Miguel León-Portilla destaca que Moctezuma II (1466-1520)10, o “tlatoani” (líder) dos mexicas na ocasião em que os castelhanos chegaram a México-Tenochtitlan em 1519, lhes trazia mapas e livros, muitos dos quais foram levados por Cortés à Coroa, demonstrando que “os astecas conservavam esses manuscritos em lugares onde podiam ser consultados e copiados com rapidez – provavelmente nas ‘casas de livros’ (‘amoxcalli’,11 em asteca)”.12 Portanto, os astecas tinham preocupação com a preservação de sua memória e seus símbolos, mantendo seus documentos em um local similar ao que chamaríamos nós “de arquivo”.
No entanto, pouco resta desse material, pois quase tudo foi destruído, seja pelos castelhanos que consideravam as imagens de sacrifícios e deuses ofensivas ao cristianismo, seja pelos tlaxcaltecas, aliados dos castelhanos na guerra da conquista, seja por deterioração. De fato, restam apenas quinze códices pré-coloniais mesoamericanos e nenhum deles é asteca. Quanto aos mapas, bem como os códices coloniais,13 sabe-se que os ameríndios atuaram em sua confecção, embora, com o passar do tempo, foram introduzidos materiais e traços ocidentais, assim como a própria escrita castelhana.
A cidade de Tenochtitlan, fundada em 1325, tinha, assim como outras cidades mesoamericanas, seu desenho urbano baseado em sua cosmologia, ou seja, suas construções e vias estavam diretamente relacionadas à sua visão de mundo e seus conceitos de tempo e espaço. Na Mesoamérica, em geral, entendia-se o mundo a partir de uma visão vertical e horizontal do espaço, que se relacionavam com um sistema temporal igualmente complexo. As dimensões verticais eram: Omeyocan (área celeste acima da Terra subdividida em treze céus), Tlalpan (No solo - a Terra) e Mictlan (Região dos Mortos ou Inframundo, subdividida em nove mundos subterrâneos), os quais tinham suas subdivisões. E a dimensão horizontal, ou seja, a superfície da Terra (Tlalpan), era dividida em cinco regiões: o centro e os quatro rumos, os quais eram distintos entre si. A demarcação dessas regiões se dava pelo percurso do sol, ou seja, uma demarcada pelo nascer do sol, a outra pelo seu poente, e as outras duas eram as suas intermediárias.
Em México-Tenochtitlan, cujo desenho da cidade teria se baseado em Tula e em Teotihuacán, a área central que fazia a ligação dos quatro rumos do universo e da Terra com o céu e o inframundo correspondia ao recinto cerimonial, uma área amuralhada que continha 78 construções. No século XVI, a cidade já contava com cerca de 200 mil habitantes, superando as maiores cidades europeias do período, como Sevilha, que tinha 70 mil habitantes. As praças, no contexto urbano ameríndio, eram locais de múltiplos usos onde eram realizadas celebrações, trocas comerciais e cerimônias. Portanto, era necessário que fossem amplas para receberem o povo que passava grande parte do tempo ao ar livre.
Segundo Michael Smith, “a fundação de uma nova cidade-estado [asteca] costumava começar com a construção de três elementos principais: o palácio real, o templo piramidal, e o mercado”,14 determinando a existência do espaço sagrado, da liderança política e do comércio.15 Esses elementos permaneceram na Tenochtitlan barroca. Cortez determinou que a construção da nova cidade fosse executada sobre e com os escombros da antiga. O projeto, realizado por Alonso García Bravo (1490-1561) em 1524, baseava-se nas linhas já existentes na cidade asteca, formadas pelos canais e estradas. Os principais elementos do conjunto simbólico arquitetônico, representantes dos poderes da cidade colonial, foram construídos sobre os seus equivalentes da cidade indígena (Img. 1), pois Cortez pensava não apenas no poder político, mas também nos símbolos desse poder. Desta forma, a Catedral Metropolitana e o Sagrario estão localizados muito próximos ao que antes era o Templo Mayor. Já em 1524, Cortez manda que se erga o primeiro templo cristão na praça, finalizado em 1532,16 que estava voltado para o oriente, o qual será demolido para a construção da grande catedral, cujas obras foram de 1573 a 1813, e que foi feita voltada para o sul com o altar ao norte, e uma altura de aproximadamente 60 metros. O Palácio Nacional encontra-se onde antes era o antigo Palácio Real. Em relação ao mercado, o qual proporcionava um índice econômico do local, destaca-se que o mercado principal de Tenochtitlan estava no terreno onde hoje se encontra o Palácio de Belas Artes,17 tendo sido transferido para a Plaza Mayor no século XVII por conta das constan- tes enchentes, embora lá já houvesse um outro menor. No início do século XVIII, foi construída sua sede fixa, com dois edifícios de dois andares, denominada Mercado del Baratillo ou El Párian, projetado por Pedro Jiménez de los Cobos e construído entre 1695 e 1703, sendo demolido em 1843.18 E, principalmente, no centro desses edifícios de poder, manteve-se a grande praça que agregava todos esses elementos e também funcionava como espaço de múltiplas funções, com atividades e celebrações no âmbito civil, religioso e político. No mapa de 1550, pode-se visualizar a “Plaza”, a “Iglesia Mayor” e o palácio, sendo que os dois primeiros estão identificados com legendas (Img. 2).19 Criou-se, assim, um novo modelo de centro urbano na América Hispânica que estabeleceu uma relação de valor entre as construções e sua proximidade do centro, algo que não ocorria nas grandes cidades europeias, as quais tinham seus edifícios representativos dispersos pela cidade.20 Mas isto acontecia já na cidade asteca antes de 1521, devido à organização social ameríndia que estabelecia a ocupação dos arredores da praça pela elite, disposição que foi mantida pelos espanhóis.
É preciso acrescentar algumas informações de períodos posteriores ao informado para análise a fim de apresentar algumas questões importantes para o contexto do local. Em 1790, buscando uma renovação Neoclássica da cidade,o novo Vice-rei Juan Manuel de Güemes Pacheco Padilla (1740-1799), segundo Conde de Revillagigedo, contratou o arquiteto Ignacio de Castera (c.1750-1811) para realizar uma grande reurbanização.21. Como parte desse projeto, a área leste da praça foi gradeada e recebeu quatro portões de ferro, fontes e a estátua equestre do Rei Carlos IV (1748-1819), conhecida como “El Caballito”,22 projetada por Manuel Tolsá (1757-1816), então diretor da Academia de São Carlos.23 Durante essas obras para a renovação da praça foram encontrados os primeiros monolitos pré-hispânicos que estavam soterrados sob a cidade colonial: Coatlicue, a deusa da terra, e a Pedra do Sol ou Calendário Asteca (encontrados em 1790) e a Pedra de Tizoc (encontrada em 1791). Esses achados monumentais foram os primeiros de muitas outras peças encontradas na região da praça, marcando o início de uma ascensão da cultura material asteca e o consequente interesse científico pelo passado indígena e pelo colecionismo desses objetos. Em 1843, o presidente Antonio López de Santa Anna (1794-1876) determina a demolição do mercado “El Párian” para erguer no centro da praça um monumento à independência do México. Para tanto, foi lançado um concurso ganho pelo arquiteto Lorenzo de Hidalga (1810-1872), mas a obra nunca foi executada, tendo sido apenas construída sua base (zócalo), que deu o nome popular à praça.
A atual configuração da praça, depois de diversas outras, ocorreu entre 1957 e 1958, quando o Governador do Distrito Federal, Ernesto P. Uruchurty (1906-1997), também conhecido como “Regente de Ferro”, tirou o jardim e os monumentos e cimentou toda a praça, colocando a bandeira nacional ao centro, deixando-a com um aspecto de parada militar. Verifica-se em tal ação também um ato de apagamento e de enclausuramento dos testemunhos desse local, tal qual ocorrera há mais de quatro séculos na construção de um centro político hispânico a partir da tentativa de apagamento do centro político ameríndio. No entanto, a atual esplanada permite o ajuntamento de grande número de pessoas, tanto para shows e eventos, como para manifestações populares de teor político ou artístico.
Embora a presença física do passado indígena tenha se tornado visível e materialmente presente na região sobretudo com as escavações do Templo Mayor a partir de 1978,24 o legado de Tenochtitlan sempre esteve ali, no traçado de suas principais vias, na monumentalidade de sua praça principal e na localização de seus principais símbolos de poder. Porém, por séculos, a historiografia tradicional sobre a América privilegiou o ponto de vista europeu que apresentava uma história de conquistas de povos e territórios supostamente não civilizados e bárbaros. A modernização trazida pela civilização branca cristã europeia serviu de justificativa para atos violentos e para a destruição de culturas tidas como pagãs. Desta forma, não apenas os atos, mas também a escrita da história, colaborou para os apagamentos dos saberes e fazeres de diversos povos ameríndios e sua influência no urbanismo colonial.
A Plaza Mayor, de Madri
Em 1561, a Corte Espanhola, sob o reinado de Felipe II (1527-1598), muda-se de Toledo para Madri, transformando a sorte desta última cidade que rapidamente precisou expandir-se para além de seus muros medievais e modernizar-se para ser o símbolo da dinastia Habsburgo na Espanha. Seu principal monumento, que servirá como ícone de ordem, bom governo e poder será a Plaza Mayor (Praça Maior), idealizada como espaço de grande atividade comercial e cerimonial, com corridas de touros, festas, espetáculos teatrais, romarias, execuções públicas de condenados e, até, a proclamação de Felipe IV (1605-1665) como rei em 1621. É importante observar que tal fato ocorre décadas após o estabelecimento da Cidade do México, bem como de outras cidades da América Hispânica. A decisão, portanto, de abrir uma praça de grandes dimensões e torná-la um espaço de grande importância no contexto urbano aproxima-se do modelo de praça urbana monumental ameríndia, especialmente encontrado em Tenochtitlan e aproveitado na Cidade do México Colonial.
O local onde se encontra a Plaza Mayor era, até meados do século XV, uma área periférica sobre a dessecada Lagoa de Luján (Img. 3), fora dos muros da cidade medieval, mas perto da Porta de Guadalajara, na qual se desenvolveu uma atividade comercial que atraía a população pelos preços mais vantajosos do que os mercados intramuros.25 O mercado ali formado, da então Plaza del Arrabal, começou a tomar forma e ganhar importância no final do século XV, com a sansão real para comércio de peixes e carnes no local. Ao seu lado ficava a Plaza de Santa Cruz com a Igreja de mesmo nome. O grande espaço entre essas duas praças seria aumentado pela demolição, em 1583, dos edifícios que estavam próximos delas, conjunto conhecido como “manzana” (quarteirão, em espanhol), formando a Plaza Mayor. De fato, já em 1565, o “corregidor” ou prefeito, Francisco de Sotomayor, enviara ao Rei Felipe II, um relatório, conhecido como “Memoria de las obras de Madrid”, no qual informava sobre a necessidade de derrubar a “manzana” para ampliar o espaço e de se construir um prédio para o mercado de carnes (“carnicería”) e de pães (“panadería”).26 Os primeiros traçados ficaram a cargo do arquiteto Juan de Herrera (1530-1597) na década de 1560, mas ele só executou a construção da Casa de la Panadería, concluída em 1590. Em 1608, o rei solicita uma planta quadrilátera regular a Francisco de Mora (1553- 1610). Mas o traçado final, só viria no projeto de Juan Gómez de Mora (1586- 1648), sobrinho de Francisco de Mora, em 1617, que determinou as dimensões da praça em 152 x 94 metros. Sua inauguração oficial ocorreu em 15 de maio de 1620, com a celebração da beatificação de Santo Isidoro, patrono da cidade e dos lavradores, apesar de ter sido concluída apenas em 1622. A cidade, por sua vez, celebrou seus 400 anos em 2017, tendo como marco o ano de 1617, quando se iniciaram as obras do projeto final de Gómez de Mora. A praça sofreu reformas ao longo do tempo, devido, sobretudo, a três grandes incêndios (1631, 1672 e 1790). Após o último deles, a arquitetura foi remodelada pelo projeto do arqui- teto Juan de Villanueva (1739-1811), seguido por Juan José Sánchez Pescador, e com a colaboração de Antonio López Aguado e Custodio Moreno, que terminaram a reforma em 1854, deixando a praça com 129 × 94 m com a adição dos 114 arcos, e a diminuição de andares dos edifícios que compõem a praça para três acima do térreo. A estátua equestre do Rei Felipe III27, que atualmente ainda ocupa a praça, foi lá instalada em 1848, trasladada da Casa de Campo, a oeste da cidade, por ordem da rainha Isabel II (1830-1904), tendo sido removida da praça na Revolução de 1868, retornando em 1875, com a Restauração Bourbon na Espanha. A feição atual da praça foi obtida na reforma realizada em finais da década de 1960, quando o piso foi elevado para acomodar um estacionamento subterrâneo.
Ladeada por uma arquitetura que a define, a Plaza Mayor é o ponto de convergência das principais vias da cidade: Calle de Toledo, Calle de Atocha, Calle Nueva (atual Calle de Ciudad Rodrigo) e Calle Mayor, e recebeu outros nomes: Plaza Real, Plaza de la República e Plaza de la República Federal, retomando, depois, seu primeiro nome e permanecendo Plaza Mayor. Esses edifícios que “amuralham” a praça colaboravam para organizar os diversos setores do mercado:
De acordo com as diretrizes das guildas, a distribuição era a seguinte: na parede ocidental, deveriam estar os tecidos, ao sul, a Casa de Carnes [Casa de la Carnicería], juntamente com o cânhamo e as sedas, na parede oriental, a quinquilharias, mantos e sapateiros, e na parede do norte, a Casa da Padaria [Casa de la Panadería], sedas e fios, exceto no piso térreo da Casa da Padaria, onde estava a inspeção real de pesos e medidas. No primeiro andar da Casa da Padaria, foi construído o salão real com vista para a Praça através da varanda real de onde a monarquia assistiria aos eventos como espectadores privilegiados.28
A Casa de la Panadería (1590-1674) começou a ser erguida no final do século XVI, como um armazém monumental de trigo e farinha, tendo sido completada em 1607. A cada incêndio, era reconstruída ou reformada. Após o incêndio de 1790, o arquiteto Juan de Villanueva a utiliza como modelo para a reconstrução dos demais edifícios da Praça, dando uniformidade à arquitetura. Quanto à Casa de la Carnicería, que situa-se do lado oposto da praça, sua data de construção é incerta, mas, após o incêndio de 1631, o edifício foi reconstruído tal qual à Casa de la Panadería, que está à sua frente.
Em relação ao status social, as áreas mais nobres procuradas pelas elites eram as próximas ao Palácio Real de Alcazár,29 não muito distante da área da Plaza Mayor. A Praça em si pode ter inspiração na Plaza Mayor de Valladolid, oficialmente inaugurada em 1561, após o grande incêndio, e cujas origens estão em uma praça extramuros da cidade para onde, no século XIII, se deslocou o mer- cado, dando ao local a denominação de Plaza del Mercado e, a partir do século XVI, Plaza Mayor.
Outra influência na configuração da praça madrilenha foram as “Ordenanzas de descubrimientos, nueva población y pacificación de las Indias” ou “Lei das Índias”, preparada pelo Conselho Real das Índias em Madri e assinada pelo Rei Felipe II em 1573. As Ordenanzas normatizaram a ocupação e administração das cidades hispano-americanas, incluindo rígidas normas para a morfologia urbana e as construções, mesmo para as praças, surgida após vários anos de experiências urbanas na América. A formação da praça maior é abordada a partir do Artigo 112 das Ordenanzas, que estabeleciam que ela era o ponto inicial da urbanização das novas cidades, que seu tamanho determinaria o crescimento da cidade, que seu formato seria retangular na proporção mínima 1 × 1,5 (comprimento × largura), com cada esquina posicionada de acordo com os pontos cardeais e que das laterais da praça sairiam as quatro principais ruas da cidade. Quanto ao tamanho da praça, as recomendações seguem basicamente em três tamanhos: o mínimo de 200 × 300 ft (61 × 92 m), o médio 400 × 600 ft(122 × 183 m) e o máximo 500 × 800 ft (152 × 244 m).
Nota-se que, pelas medidas sugeridas nas Ordenanzas, a Plaza Mayor de Madri ficaria entre os tamanhos pequeno e médio. Apesar das normas estarem destinadas, sobretudo, às cidades hispano-americanas, elas também foram aplicadas às cidades espanholas.30 No caso das cidades hispano-americanas, as principais delas, à essa altura, já tinham sido fundadas ou reconstruídas pelos espanhóis, como é o caso da própria Cidade do México. Considerando a dimensão da praça do Zócalo até as bordas dos edifícios que o ladeiam, 180 × 220 m, totalizando 39.600 m2, ela é ainda maior do que o tamanho máximo recomendado pela “Lei das Índias”, que seria de 37.088 m2.
Tendo falecido em 1598, as obras de Felipe II foram continuadas por seus herdeiros, Felipe III (1578-1621), Felipe IV (1605-1665) e Carlos II (1661- 1700), os últimos da dinastia Habsburgo na Espanha. Todo esse período marcou a era de ouro da Espanha, que tem Madri como sua grande sede e a Plaza Mayor como seu maior símbolo, conforme aponta Jesús Escobar: “Se Madri era o grande teatro do mundo; então a Plaza Mayor era seu principal palco”.31 Desta forma, foi introduzida a modernidade na antiga Madri medieval em torno de sua principal praça que tornou-se emblema político de um dos maiores impérios da Europa daquele tempo. Tal introdução, no entanto, não pode ser dissociada da experiência espanhola na América, em especial, na cidade de Tenochtitlan. A modernidade que se introduz com a reforma da cidade de Madri para receber a corte e, em especial, com a abertura do espaço urbano para o encravamento de uma grande praça quadrangular de múltiplas funções em meio às sinuosas ruas medievais, muito se relaciona com a experiência colonial no México a partir da cidade ameríndia.
Conclusão
Diante dos dados apresentados, nota-se que a praça principal mexicana foi iniciada e finalizada por volta de 1524, várias décadas antes da praça maior madrilenha. No México, os espanhóis reconstruíram a cidade aproveitando muito do que já existia em Tenochtitlan, cidade que impressionou Hernán Cortez:
Na Cidade do México, as ideias europeias sobre urbanismo certamente desempenharam um papel no esforço de reconstrução. Mas a paixão de Cortez pela capital mexica preexistente é uma das mais fortes evidencias de que os espanhóis procuraram imitar a ordem lá encontrada. A Plaza Mayor da Cidade do México remodelada foi um dos mais importantes espaços recém-planejados no domínio colonial espanhol. Chamada o Zócalo atualmente, ela permanece como a maior praça no mundo de fala espanhola.32
Portanto, o Zócalo, embora bem menor do que o centro cerimonial asteca,33 o teve como base e inspiração, inclusive no aproveitamento dos edifícios ao seu redor e sua funcionalidade. Isto possibilitou que a praça quase quadrada fosse um espaço de celebração civil, religiosa e de comércio, além de agregar o principal centro de poder político e, portanto, fazendo do complexo em si um símbolo de poder. Considerado pelos astecas como o centro do mundo, seu espaço cerimonial era o ponto de partida de suas principais ruas, cujo traçado ainda permanece atualmente com outras denominações: ao sul, a Calzada de Iztapalaga (atualmente Calzada Tlalpan e Avenida San Antonio Abad); a oeste, a Calzada de Tlacopan (atualmente Calle México-Tacuba), e que se ligava ao aqueduto de Chapultepec; ao norte, a Calzada de Tepeyácac (atualmente Estrada dos Mistérios). Ao redor da ampla e aberta praça, estão quadras basicamente regulares e ruas retilíneas. No caso da Plaza Mayor de Madri, finalizada em 1622, foi formada com muito esforço por meio da abertura de espaços entre as tortuosas ruas da cidade, como uma joia regular barroca incrustada no tecido urbano medieval. Seu formato é retangular e definido por edifícios de arquitetura uniforme que fazem da praça um local fechado em si, mas que se comunica com a cidade também por meio de ruas importantes que para ela convergem. Assim como a sua antecessora mexicana, a praça espanhola tem múltiplas funções civis, cerimoniais e comerciais. Apesar de não acolher um edifício religioso ao seu redor, a praça sempre recebeu diversas festas e cerimônias cristãs.
Ambas as praças tinham grandes mercados e é importante salientar o quanto Hernán Cortez elogiou a organização do mercado asteca, e que em 1584 os magistrados de Madri criaram uma legislação para organizar os locais dos vendedores da Plaza Mayor.34 No século XIX, as duas praças receberam jardins, esculturas, fontes e bondes, bem como a estátua equestre de um rei. O Zócalo recebeu a estátua do Rei Carlos IV, especialmente encomendada para aquele local, no início do século XIX, e logo a removeu de lá para outros locais, uma vez que tornou-se uma república independente poucos anos depois. A Plaza Mayor de Madri ainda conserva a estátua do Rei Felipe III, executada no século XVII e trasladada para lá em 1848, uma vez que a Espanha permanece uma monarquia. No século XX, as duas praças adquiriram um aspecto plano, ideal para o ajuntamento de pessoas e para eventos sazonais e temporários. Essa última transformação aconteceu primeiramente na América e depois na Europa.
Evidentemente, as praças urbanas fazem parte da história das cidades ao longo dos séculos desde os tempos mais antigos. No entanto, o que aqui quer se demonstrar é que esse tipo de praça monumental, de formato regular, concebida como centro e símbolo político, que agrega múltiplas funções, numa cidade que relaciona a ordem com o poder, surgiu primeiramente na América, a partir da herança indígena combinada com as influências espanholas. E esse novo formato de centro urbano influenciou o próprio urbanismo europeu moldando as “Plazas Mayores” ordenadas e regulares por toda a Espanha, a partir do século XVI, e após à experiência espanhola na América, como demonstram a criação e difusão das Ordenanzas mencionadas anteriormente. E ainda, como destaca Campos Salgado:
Em nenhuma parte da Espanha havia uma praça com essas dimensões. As praças maiores, como tais, não foram criadas até depois do traçado da Nova Espanha, pelo que é possível concordar com a ideia de Carlos Chanfón,35 que afirmou que estas tinham sua origem nos relatos feitos dos grandes espaços abertos pré-hispânicos.36
Já em 1948, quando publica a primeira edição em inglês de seu livro sobre a arquitetura mexicana do século XVI, o historiador da arte estadunidense George Kubler (1912-1966) destacava a permanência indígena na capital mexicana, afirmando que “a Cidade do México reflete ainda as principais formas da capital asteca. Várias ruas centrais seguem o curso dos antigos canais”.37 Ele também apontava para a importância da experiência na Cidade do México para o urbanismo:
As criações urbanas do século XVI no México tem importância não apenas para a história da colonização espanhola, mas também para a história do urbanismo em geral. Tais obras constituem um dos capítulos mais importantes dentro da história do urbanismo ocidental e incluíram hipóteses nunca antes pensadas na Europa, liberdade completa de experimentação, uma expansão incipiente e recursos ilimitados. Não existe nada comparável a isso depois do Império Romano, nem antes das criações industriais do século XIX. É por isso que, independentemente da desintegração econômica da cidade mexicana de nossos dias, e o evidente descuido de sua fisionomia, ela oferece formas urbanas que não apenas absorveram a maior parte da energia da Colônia, mas também que anteciparam muitas das soluções da prática europeia posterior.38
Não se negam, no entanto, que houveram também transferências e influências dos fazeres e saberes espanhóis na constituição das cidades coloniais hispano-americanas. Mas, o que se propõe é a revisão da historiografia de matriz europeia que silencia a cultura indígena nesse processo, destacando outras influências de origem também europeias como as ideias racionalistas da Renascença ou os escritos de Vitrúvio (séc. I a.C.), por exemplo. Pode-se dizer, conforme afirma Lucía Mier y Terán Rocha que, “a experiência peninsular na criação de cidades é tão importante quanto a influência dos elementos urbanos indígenas que imprimiram sua marca e dotaram as novas cidades coloniais de personalidade própria”39.
O fato fundamental é que não se pode mais ignorar a transculturalidade na formação das cidades latino-americanas e que esse movimento de adaptação do desenho urbano reflete a situação de uma nova sociedade em formação, como aponta Setha Low:
As evidências etnohistórica e arqueológica sugerem que a praça colonial evoluiu a partir de influências indígenas e espanholas e modelos que criaram uma nova forma de design urbano. Nesta nova forma, a praça hispano-americana mantém elementos arquitetônicos, espaciais e físicos de ambas as tradições, de modo que as tensões culturais de conquista e resistência são simbolicamente codificadas em sua arquitetura.40
Verifica-se, portanto, que no processo de transformação cultural das novas cidades hispano-americanas houve um processo de transferências de modelos que cruzava o Atlântico nos dois sentidos. Apesar dos espanhóis já estarem implantando a quadrícula na construção das cidades na América (modelo urbano definido por um esquema ortogonal de ruas quadradas ou retangulares com uma praça central, em cujos lados deveriam estar a igreja principal, o conselho municipal e a residência do governante), Tenochtilan já utilizava o modelo ortogonal e a concentração de edifícios de poder ao redor de uma praça de grandes dimensões e diversos usos, rodeada por edifícios de arquitetura monumental, cuja ordenação refletia sua cosmologia. Os espanhóis tomaram o conceito de ordem como símbolo de bom governo, de poder e de controle social pela ordenação espacial. A experiência espanhola na construção das novas cidades americanas, a partir das influências locais recebidas, foi uma das motivações na transformação do urbanismo nas grandes cidades da Espanha. O centro dessa transformação é também o centro do poder ¾a praça principal¾ levando em conta que o Zócalo foi o grande modelo para a constituição das “plazas mayores” na Espanha e na América Hispânica, a partir do que se verifica na constituição das duas principais praças em ambos os lugares.
Desta forma, em termos decoloniais, apesar de verificar-se a imposição da colonialidade na América sob o pretexto da modernidade, verifica-se também que elementos e estruturas ameríndios foram utilizados no projeto modernizadoraqui e além-mar, fazendo da “periferia” uma influenciadora da metrópole. Tais sinais de influência foram progressivamente apagados com a destruição da cultura material local e transformados com a inserção de elementos da cultura ocidental. Nesse processo, a legitimação das guerras, das conquistas e das destruições veio por meio da religião, e revestiu o homem branco europeu cristão de autoridade para combater as práticas ameríndias e convertê-los para torná-los participantes do sistema colonial como camada servil e subalterna. É importante ressaltar que a reconstrução acontece com a inclusão da dominação ideológica por meio da evangelização e da introdução do idioma castelhano, que será utilizado para contar a história da conquista como um grande empreendimento hispânico. Em meados do século XX, surgem iniciativas para resgatar a história pré-colombiana a partir de outro ponto de vista. Em continuidade, destaca-se que os povos que habitavam a América não devem ser considerados vencidos, mas participantes do sistema, de modo que as permanências de sua cultura são ações de resistência.
Nesse sentido, resgatar tais permanências e influências para revisitar a história e construir uma nova historiografia, aponta também para as relações globais iniciadas no Século XV e que não ocorreram apenas da Europa para as colônias, mas também na via inversa. Isto permite-nos demonstrar que a colocação do continente europeu como centro irradiador de saberes e fazeres é mais uma (e tão-só) construção ideológica.
Imagens
Bibliografia
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Campos Salgado, José Ángel, “ Traza y morfología de la Ciudad de México en el virreinato”. Investigación y Diseño, nº 7 (2011):149- 166, http://programaeditorialcyad.xoc.uam.mx/indice_libro. php?id_libro=367&extenso=0.
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Notas