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José Calvino Filho: A Trajetória de um editor comunista no Brasil (1930-1959)
Vinícius Juberte
Vinícius Juberte
José Calvino Filho: A Trajetória de um editor comunista no Brasil (1930-1959)
José Calvino Filho: The Work of a communist publisher in Brazil (1930-1959)
Amoxtli, núm. 1, pp. 19-52, 2018
Universidad Finis Terrae
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Resumo: O artigo apresenta a trajetória do editor comunista José Calvino Filho entre 1930 e 1959. A partir da sua atuação como jornalista e editor analisamos a difusão da literatura marxista no Brasil sob diferentes conjunturas políticas pelas quais passou o país, o movimento comunista, e consequentemente, o PCB (Partido Comunista Brasileiro). Com a atuação da Editorial Calvino Limitada e de Calvino Filho, apresentamos as potencialidades e limites pelos quais passou a produção e circulação da literatura marxista no Brasil, sob o olhar da História do Livro e da Edição.

Palavras-chave:ComunismoComunismo,Partido Comunista BrasileiroPartido Comunista Brasileiro,Edições comunistasEdições comunistas,Editorial CalvinoEditorial Calvino.

Abstract: This article introduces the life of the communist publisher José Calvino Filho between 1930 and 1959. The diffusion of the marxist’s literature in Brazil’s political conjunctures trought those years, the communist movement and the PCB (Partido comunista Brasileiro) are investigated based on Calvino’s work as journalist and publisher. By analysing the activities of Editorial Calvino Limitada and Calvino Filho this article introduces the potentiality and the limits of marxist literature’s production and circulation in Brazil according to Book and Publishing History.

Keywords: Communism, Partido Comunista Brasileiro, Communist publishing, Editorial Calvino.

Carátula del artículo

Artículos

José Calvino Filho: A Trajetória de um editor comunista no Brasil (1930-1959)

José Calvino Filho: The Work of a communist publisher in Brazil (1930-1959)

Vinícius Juberte*
Universidade de São Paulo, Brasil
Amoxtli, núm. 1, pp. 19-52, 2018
Universidad Finis Terrae

Recepção: 02 Maio 2018

Aprovação: 28 Junho 2018

Introdução

A questão editorial sempre foi cara aos comunistas, sendo parte fundamental da estratégia de agitação (formação de quadros) e propaganda (mecanismos de comunicação), conhecida como agitprop. A cultura comunista, de modo análogo a tradição da Revolução Francesa que enxergava o livro como uma força transformadora, passa a realizar de fato a sua vocação internacionalista após a Revolução de Outubro de 19171, com a produção de livros se destacando nesse processo. A URSS foi a base da maior expansão do marxismo na história, ao criar uma estrutura editorial sem precedentes na história do livro contemporâneo e publicar em diversas línguas, procurando expandir o seu alcance pelo mundo.2

No Brasil, os livros marxistas só passam a circular de fato após a Revolução de Outubro, seguindo a lógica de difusão de livros pela Internacional Comunista, que buscava propagar para o mundo o processo de construção do socialismo na Rússia. Nesse primeiro momento, além dos livros publicados em francês pela IC, o país tem outro polo de influência que é o Partido Comunista Argentino, que, desde 1918, passa a editar a literatura marxista em espanhol. Mas a difusão no Brasil só irá se sistematizar a partir de 1922, com a fundação do PCB.3 O movimento comunista, que vinha se fortalecendo no país desde a Revolução de Outubro de 1917, passa a se concentrar em uma mesma organização, em um partido de caráter revolucionário. Segundo João Quartim de Moraes, foi uma característica peculiar do Brasil o fato de aqui o comunismo ter precedido o marxismo como corrente política, sendo que este apenas entrou na luta política através daquele, após a consolidação do PCB.4

No momento de fundação do partido, as fontes marxistas existentes no Brasil eram variadas, baseando-se em literatura vinda da Rússia ou da França, dessa forma as publicações marxistas brasileiras dos anos 1920 continuaram intrinsecamente ligadas ao movimento editorial francês, responsável pela formação de uma geração inteira de comunistas nos países de língua latina.5 Nesse momento, Argentina e Espanha também têm influência sobre o movimento comunista brasileiro no que concerne ao campo editorial, ainda que menor se comparados à França. Nesses primeiros anos de existência, de 1922 a 1930, o PCB teve escassas publicações, devido a debilidades financeiras e de caráter organizacional, não mantendo, nem mesmo, uma editora própria. Muitas vezes o esforço de distribuir livros para a militância, nesse período, foi de caráter pessoal, do próprio secretário-geral do partido, Astrojildo Pereira.6

Nos anos 1930, a situação muda. Há uma radicalização da esquerda mundial devido à crise de 1929 e, no caso específico do Brasil, uma reação à Revolução de 1930. Esse desenvolvimento é interrompido devido à repressão ao PCB após a rebelião comunista de 1935 e a instauração, em 1937, do Estado Novo, fazendo com que a literatura marxista editada no Brasil praticamente desaparecesse.7 As edições de livros marxistas no Brasil só serão retomadas novamente nos anos 1940, mais especificamente em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, com a aliança antifascista e o esforço de guerra da URSS. Nesse contexto, as editoras passam a reeditar muitas das obras lançadas nos anos 1930. Em 1945, com o fim da guerra e do Estado Novo, o PCB retorna à legalidade e passa por um processo de reorganização de suas atividades, adotando a linha política de “coexistência pacífica”8 ditada por Moscou no pós-Segunda Guerra, passando finalmente a organizar também as suas próprias editoras, entre elas a Editorial Calvino Limitada, comandada pelo editor José Calvino Filho, objeto de nossa análise nesse artigo.

Anos 1930: A Calvino Filho Editor e o início da trajetória intelectual

José Calvino Filho foi figura de destaque no cenário político brasileiro dos anos 1930, 1940 e 1950. Proprietário-fundador da Calvino Filho Editor (Editorial Calvino nos anos 1940), na qual também trabalhava editando os livros, e figura constante nos meios intelectuais da época, o médico carioca mostrou-se simpatizante da Revolução Russa e do comunismo desde o início do seu trabalho editorial. Formado na Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro) em 1929, e com uma “passagem brilhante” pelo Instituto Manguinhos (atual Instituto Oswaldo Cruz), segundo nota pelo seu aniversário publicada no jornal Diário da Noite em 1943, o doutor Calvino Filho foi muito além de sua formação profissional, tornando-se um editor militante na defesa de suas publicações de caráter marxista e um intelectual ativo nos debates políticos do período. Segundo o Diário da Noite: (...) Jornalista de combate, Calvino Filho é hoje uma figura de prestígio entre os editores de grandes livros no Brasil, graças ao tirocínio revelado nesse novo campo de sua atividade, testemunhado na simpatia pública pelas suas edições preparadas com esmero e habilidade.(...)9

A atuação de Calvino Filho como jornalista é marcante principalmente na imprensa carioca, com artigos de sua autoria aparecendo em destaque no Diário da Noite, e com menor intensidade na Tribuna Popular, o primeiro de propriedade de Assis Chateubriand, e o segundo, órgão de imprensa do PCB (Partido Comunista Brasileiro) no Rio de Janeiro. Vale lembrar que em ambos jornais também apareciam diversos anúncios dos livros publicados por Calvino.

A Calvino Filho Editor começou a funcionar em 1929, mesmo ano em que o proprietário se formou no curso de Medicina, editando até 1932, segundo ele, em depoimento ao Tribunal de Segurança Nacional de Vargas: “Livros que tratassem dos problemas sociais, sem a preocupação com as ideologias defendidas (…) lançando a venda livros socialistas, fascistas, comunistas, parlamentaristas, etc.(...)”

Ainda segundo o editor, após 1934, com a proibição da venda e circulação de livros comunistas pela Lei de Segurança Nacional, todos os livros dessa natureza publicados pela Calvino Filho Editor foram recolhidos ao depósito desta, que passou a editar apenas livros de medicina, direito e didáticos.10 O catálogo da editora nesse momento não tinha uma linha clara alinhada às ideias comunistas, sendo de fato a maior parte das edições formada por romances, livros de ciência e didáticos. Não se encontra nos catálogos desse período, porém, livros abertamente fascistas, aquele que mais se aproximaria de uma linha nesse sentido seria A Verdade Sobre Salazar de José Jobim, que ainda assim, pela forma como é apresentado no anúncio, procurava fazer um levantamento crítico sobre a trajetória do ditador português. Calvino também editou o livro De 1929 a 1934 de Getúlio Vargas, no qual o próprio analisa a Revolução de 1930 e o seu papel nos acontecimentos. Ainda assim, ao que tudo indica, o editor pode ter citado a publicação de livros dessa natureza em seu depoimento à polícia política para fortalecer o argumento de que sua editora tinha um caráter eclético e despistar quanto à literatura marxista.

Apesar dessas características do catálogo, fica evidente a simpatia de Calvino Filho pelo comunismo. Além da publicação do “best-seller” Rússia de Maurício de Medeiros, que chegou a incríveis seis edições (algo em torno de 7000 exemplares)11, foram publicadas obras de caráter claramente marxista, como As Bases Fundamentais do Marxismo e Anarquismo e Socialismo de Plekanov, A Mulher no Regime Proletário de Gastão Pereira da Silva, Meus Encontros com Lenin de Clara Zetkin, O Materialismo Histórico de L. A. Tekefikiss, Extremismo: doença infantil do comunismo de Lênin (com capa assinada por Di Cavalcanti), além de Os Fundamentos do Leninismo de Stalin, Lenine – sua vida e sua obra de D.S. Mirsky e Teoria da Revolução Proletária de Pokrovsky, que serão reeditados posteriormente nos anos 1940.

Também foram publicados A Vida Sexual e o Amor na Rússia de J. Helman, Capitalismo e Comunismo, obra com textos de Marx, Engels, Lenin, Trotsky, Bukharin e outros, Preparação Socialista do Brasil de Almachio Diniz, Um Engenheiro Brasileiro na Rússia, livro de cartas de Cláudio Edmundo, engenheiro brasileiro que participou da execução dos primeiros Planos Quinquenais na URSS e Caminho da Revolução Operária e Camponesa de Leôncio Basbaum, importante quadro do PCB, sob o pseudônimo de Augusto Machado. No final do prefácio do livro de Basbaum constam os seguintes parágrafos:

O plano inicial da obra incluía uma última parte referente a ação do PCB diante dos acontecimentos da política nacional e internacional. Mas para não tornar o livro volumoso, resolvemos reunir os capítulos referentes àquele assunto em um livro à parte: “O PCB em Ação” e que será publicado depois. Estou convencido de que tanto um como outro serão imensamente úteis ao proletariado, às classes oprimidas e exploradas do Brasil, à Revolução operária e camponesa, e ao PCB.

Essa citação literal de Basbaum ao PCB e a Revolução operária são indícios de que Calvino Filho poderia manter já nesse período ligações com o partido, ainda que a sua linha editorial não seja alinhada às diretrizes deste como será nos anos 1940, o que será analisado posteriormente. Ainda sobre os livros de caráter marxista editados por Calvino nesse período, é interessante observar os anúncios feitos sobre esses no jornal Diário da Noite. Ainda que na totalidade do catálogo essa literatura não seja predominante, essas edições ganharam destaque nos anúncios vinculados no jornal ao lado dos livros de caráter não-marxista. São enfatizados dois aspectos relacionados a essas edições: o crescimento na publicação de livros a respeito da Rússia soviética, que por sua vez viria suprir um crescente interesse do público brasileiro pelo assunto. No anúncio do livro Caminho da Revolução Operária e Camponesa de Leôncio Basbaum afirma-se que:

A Rússia é o tema predileto dos escritores contemporâneos, voltados a realidade social do momento, o que significa dizer, aos fenômenos sociológicos. O mercado livresco acusa uma produção abundante, sucedem-se os livros, os trabalhos que fixam a ideologia marxista, que orienta hoje os discutidos destinos da Rússia. (…) Discorde-se ou não do ponto de vista do autor, o seu trabalho apresenta-se destinado a orientação dos que não estão bem senhor do problema proletário.12

Dessa forma, Calvino se insere em um nicho de mercado que crescia nesse momento, o dos livros relacionados ao marxismo e a construção do socialismo na URSS. Outras editoras que publicavam literatura marxista apareceram nesse momento, como a Editorial Pax, a Cultura Brasileira e a Unitas.13 Sendo assim, o tema Rússia soviética consta em um primeiro momento como algo que fazia parte daquele contexto geopolítico dos anos 1930, como um “fenômeno sociológico”, assim como diz o texto da sinopse do livro, passível de ser apresentado nas páginas de um jornal que nada tinha a ver com os comunistas, como é o caso do Diário da Noite.

Isso muda de figura a partir de 1934, quando a editora de Calvino Filho sofre pela primeira vez com a repressão do governo Vargas. São desse ano os últimos anúncios de livros da editora vinculados pelo Diário da Noite nessa década, sendo que esses só voltarão nos anos 1940, já no contexto da Segunda Guerra. É de agosto de 1935 a última aparição de um anúncio da editora nas páginas do jornal com a venda de livros de Medicina, Direito e Literatura, a prazo, com a possibilidade de pagamento em até 10 vezes. É provável que a Calvino tenha entrado em dificuldades financeiras após o governo Vargas fechar o cerco em cima da literatura marxista, precisando dessa forma encontrar um meio de liquidar o seu estoque.

A editora continuou a enfrentar problemas com a repressão, que só aumentou com a onda anticomunista que se seguiu após o levante comunista de 1935.14 Outra ação policial contra Calvino Filho foi notícia no Diário da Noite de 15 de março de 1937. Segundo a nota, foram apreendidos 3 mil livros no depósito da empresa Draupt & Cia pertencentes a editora Calvino Filho, todos “destinados a difusão de ideias vermelhas”. A notícia informa que os livros foram editados em um período em que ainda “era permitida a circulação de tais obras”, que os mesmos foram removidos para o prédio da Polícia Central, e que duas pessoas acabaram presas nessa operação, ainda que os nomes das mesmas não tivessem sido revelados.

É interessante perceber a mudança de tom do jornal quanto a literatura marxista, que até 1935 era tratada com naturalidade e tinha seu espaço de divulgação, representando uma linha política como qualquer outra. Naquela conjuntura, inclusive, se indicava a leitura de tais livros para uma melhor compreensão do “problema proletário”. Em 1937, essa mesma literatura é tachada de “extremista de esquerda” pelo jornal, o que demonstra como o pensamento anticomunista havia se fortalecido em um período de dois anos, com a crescente repressão aos comunistas levada a cabo pelo governo Vargas.

Ainda em 1937, antes mesmo do golpe que instaurou o Estado Novo, a Calvino Filho sofreu uma investigação por parte da polícia política. Em 27 de março de 1937, Filinto Müller solicitou a instauração de um inquérito contra a editora, através de um ofício enviado a Seção de Investigações da DESPS (Delegacia Especial de Segurança Política e Social), que deveria ser acompanhado por uma busca nos estoques da Calvino. A solicitação foi motivada por uma denúncia feita a chefatura de polícia do DF, na qual a editora era acusada de ter sob sua guarda grande quantidade de livros “subversivos” de caráter comunista, proibidos pelo Decreto nº 38, de 4 de abril de 1935. Dois dias depois uma diligência autuou a editora, apreendendo mais de 20 mil exemplares de 57 títulos diferentes. Não foi feita a retirada dos exemplares, porém o depósito da editora passou a ser vigiado por turnos de grupos de policias, 24 horas por dia.15

Vale ressaltar que no depósito da Calvino também foram apreendidos livros de outras editoras de caráter marxista, mais especificamente da Pax, da Alba, da Adersen e da Unitas, o que demonstra a importância da editora também como distribuidora desses livros. Segundo Ana Paula Palamartchuk, a procuradoria não conseguiu provar que Calvino tenha vendido ou publicado livros comunistas após o decreto da “Lei Monstro”. A defesa do editor argumentou que os livros apreendidos faziam parte da massa falida da editora que foi encerrada em 8 de novembro de 1934, e desde então a edição e o comércio dos livros passaram a ser feitos pela empresa Calvino & Mello Ltda. O processo acabou arquivado em 9 de março de 1938.16

Desse período até o início dos anos 1940, Calvino Filho deixa de editar, sendo que a própria literatura marxista praticamente desaparece. Esse processo acompanha o desmonte do PCB por conta da feroz repressão da Polícia Política do Estado Novo, que faz com que o partido praticamente deixasse de existir.17 Calvino só reorganizará sua editora no início dos anos 1940, já na conjuntura da Segunda Guerra, levando o nome de Editorial Calvino Limitada, período em que a editora se alinha definitivamente ao PCB.

José Calvino Filho apareceu bastante nas páginas do jornal Diário da Noite não apenas nos anúncios de seus livros, mas também na defesa dos mesmos, principalmente nos anos 1940. Além disso, escreveu artigos sobre a conjuntura social e política, exercendo o papel de intelectual e formador de opinião. Curiosamente, a sua primeira aparição nas páginas do jornal foi por conta de uma querela com o então secretário da educação do Rio de Janeiro, Anísio Teixeira.

Segundo reportagem publicada em 19 de março de 1933, Calvino Filho acusava o então secretário de favorecer a Companhia Editora Nacional em uma disputa para a edição e venda das publicações do departamento de educação do Rio de Janeiro. Calvino teria perdido a disputa mesmo fazendo uma proposta melhor que a de seu concorrente, assumindo a responsabilidade de editar também o Boletim de Educação para os professores do município, da qual a outra editora foi dispensada ao ser escolhida vencedora. A reportagem fala ainda em “favoritismo no ensino” e no fato dessa não ser a primeira denúncia acerca de “concessões e de camaradagens” relacionadas ao secretário.

A polêmica continuará até pelo menos o início de 1934. Na edição de 17 de outubro de 1933, uma nota é publicada na seção “Ineditoriais”, com as seguintes palavras do próprio Calvino:

O sr. Anísio S. Teixeira, diretor do Departamento de Educação da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, é um administrador que PREVARICA no desempenho de suas funções. Faço essa denúncia reproduzida em 250 jornais de todo Brasil, para que o sr. Anísio me processe e eu tenha a oportunidade de perante a justiça provar que o indivíduo Anísio S. Teixeira é um PREVARICADOR. (a) CALVINO FILHO, editor18

Um mês depois, na edição de 4 de novembro de 1933, Calvino continua seus ataques e seu clamor por justiça em uma carta publicada na mesma seção, intitulada A Prevaricação do Snr. Anísio S. Teixeira. Vale reproduzir o texto na íntegra:

O tempo se passa e o Sr. Anísio S. Teixeira, diretor do Departamento de Educação, não se demite, não é demitido e nem me processa, e por esta última razão não tenho oportunidade de provar que o Sr. Anísio é um PREVARICADOR.

Pedi ao Dr. Pedro Ernesto, por telegrama, que me concedesse uma audiência pois desejava provar-lhe a prevaricação do Sr. Anísio. S. Ex. até hoje não me atendeu.

A comissão que julgou a concorrência anunciou que se reuniria para rever a sua decisão. Telegrafei-lhe, pondo-me a sua disposição para prestar esclarecimentos técnicos. Não me foi acusado o recebimento do telegrama.

Sou um industrial perfeitamente idôneo, portanto, a minha denúncia pública contra um administrador não podia deixar de ser tomada em consideração.

Que respeito pode merecer e que autoridade moral pode ter um educador que é acusado publicamente de PREVARICADOR por um cidadão idôneo, que não o confunde imediatamente e não o atira ao cárcere provando que é vítima de uma calúnia ou injúria infame?

Em que país estamos nós? Há ou não há moralidade administrativa? Há ou não há pudor bastante, capaz de levar os nossos administradores a repelirem com dignidade as injúrias que contra eles possam ser assacadas?

Continuarei clamando em pleno deserto? Será possível?

Calvino Filho, editor

Firma reconhecida19

Após essa súplica de Calvino, que envolveu inclusive o então prefeito do Rio de Janeiro, Pedro Ernesto, a resposta a sua questão final parece ter vindo na edição do jornal de 5 de janeiro de 1934. Uma pequena nota intitulada Fez uma publicação referente ao diretor de Educação da Prefeitura trazia a informação de que o editor havia sido denunciado na 4ª Vara Criminal por publicação ofensiva a Anísio Teixeira no jornal A Pátria em 15 de outubro de 1933. Enfim, Calvino Filho conseguiu o processo que queria.

Não há informações de como se deu o desfecho dessa disputa entre o editor e Anísio Teixeira, porém, é possível deduzir a partir desse episódio que a editora de Calvino Filho tinha certa relevância no mercado, dado o seu posicionamento na disputa pelas publicações oficiais da secretária da educação do Rio de Janeiro, e o posterior espaço que o editor teve nos jornais para reclamar desse mesmo processo contra o secretário de educação.

Calvino Filho é citado também na edição de 23 de agosto de 1933, em uma reportagem sobre o Congresso de Editores e Autores que ocorreu no Rio de Janeiro naquele ano. O editor fazia parte da Comissão Executiva, responsável pela organização do evento, ao lado de outros editores e autores. Essa comissão, além de Calvino Filho, contava com Humberto de Campos, Herbert Moses, Martins Capistrano, Vasco Lima, Jarbas de Carvalho, José Maciel Filho, Octalles Marcondes, Benjamin Lima, Augusto Pinto Lima, Osvaldo Orico, entre outros. O Congresso era definido pelos organizadores como um espaço que procurava “estabelecer o mais perfeito e harmônico entendimento entre as duas classes”, em prol da divulgação dos livros brasileiros. Fica claro como a composição da comissão era ampla, contemplando desde um editor simpatizante do comunismo como Calvino, até intelectuais ligados ao governo Vargas.

Ele aparece também na edição do dia 9 de dezembro de 1939 do Diário da Noite, através de um artigo intitulado Como Baratear a Vida? discutindo a conjuntura política do país. Isso mostra como a atuação de Calvino Filho muitas vezes foi além daquela de editor, participando como intelectual das discussões pertinentes a situação política e social do país através das páginas dos jornais. Nesse artigo ele discute as medidas tomadas pelo governo para salvaguardar os preços de alguns produtos essenciais, isso já no contexto da Segunda Guerra. É tomada uma posição de defesa dos comerciantes e apontadas falhas na política do Estado Novo. Segundo Calvino:

O governo criou em boa hora a Comissão de Tabelamento. Esta pôs-se em campo e estabeleceu para logo os preços máximos porque deveriam ser vendidos o pão, a carne, o leite, as verduras, etc, etc. Nada mais justo e razoável que o governo interviesse no mercado, afim de evitar que gananciosos explorassem o povo, a pretexto da guerra..

Todavia, está se passando um fato que talvez o governo federal ainda não tomou conhecimento. É com a Rede Mineira de Viação, essa importante estrada de ferro, por iniciativa própria, sem dúvida, apenas aumentou os seus fretes em 150%! Para fretes relativos a gêneros de primeira necessidade.

A Rede Mineira de Viação, que por sua vez é também o grande fornecedor de carnes, frutas, pão, leite, verduras, etc., para esta capital, cobrava há poucos dias 12$000 por tonelada em cada percurso de 100 quilômetros. Aumentou esses preços a partir de 1º do corrente mês, “somente” para 30$000! Ou seja, um aumento de 150%!

(…) Mas, se o governo consente que a produção, manipulação, embalagem, transportes, etc., aumentem os preços, como pode exigir do comércio que mantenha os que antes desses aumentos marcava para as utilidades que vendia?

Urge, pois, providências gerais, que alcancem todas as classes, para que uma ou poucas não sejam sacrificadas em benefício de outras, estabelecendo, dessarte, um desequilíbrio, que em última ratio, prejudicará enormemente a todos: produtores, intermediários e o público.20

Dessa forma, Calvino defende a intervenção do Estado Novo na economia por conta da Guerra, mas critica o fato dessa intervenção atingir alguns grupos mais vulneráveis enquanto deixa livre grupos mais favorecidos. Assim, ele se coloca pela primeira vez diretamente no debate público como intelectual e formador de opinião, cumprindo essa função para além dos livros que publicava.

Anos 1940: A Editorial Calvino Limitada, a defesa da literatura marxista e o auge como intelectual

Nos anos 1940, já no contexto da aliança entre as democracias capitalistas e a URSS por conta da Guerra, e com a Editorial Calvino reorganizada, José Calvino Filho manterá suas incursões nos jornais, mas dessa vez alinhando o seu ofício de editor com a sua face de intelectual, comprando debates na defesa de suas publicações, principalmente aquelas referentes a realidade soviética.

Em um primeiro momento, Calvino Filho escreve um artigo para a edição de 28 de setembro de 1942 do Diário da Noite, acerca da Campanha do Livro. O texto se intitula O livro é a arma que o gênio humano criou para destruir a mentira. Existe um parágrafo de apresentação redigido pelo jornal sobre o autor antes do texto, exaltando a figura de Calvino. Diz o parágrafo: “Calvino Filho, que é médico, jornalista e livreiro, tem tido no país uma atuação excepcional, como um dos mais talentosos divulgadores do pensamento humano, através de seus livros de combate ao nazi-fascismo”.

Nesse trecho fica claro como Calvino, nesse momento, já era reconhecido como um editor engajado nos embates políticos do seu tempo, nesse caso na luta contra o nazifascismo. Não por acaso, esse tema será recorrente no decorrer do artigo. Vale destacar um longo trecho desse texto, já que nele Calvino Filho não só expõe suas ideias enquanto editor, mas também faz uma declaração política contra o regime nazifascista. Segundo ele:

O livro, recinto sagrado do pensamento, é a arma mais eficiente que o gênio humano criou para destruir a mentira que germina e cresce em todas as latitudes, em todas as épocas, semeada e amparada pelos exploradores da humanidade de todos os tempos. Seu poder é incomensurável e destrói tudo quanto a limitada imaginação humana acredita ser imortal, indestrutível, ao mesmo tempo que cria o que julgamos impossível em dado momento da evolução humana.

Deuses e tiranos, com suas criações, foram destruídos, reduzidos a nada, através dos séculos, por essa arma terrível, invencível, o livro quando está a serviço da Verdade. Em alguns instantes da vida dos povos circulam páginas impressas rabiscadas pelos que pretendem esconder a Verdade, na defesa de seus interesses subalternos ou de grupos organizados para explorarem a comunhão humana. Essas páginas mentirosas pouco vivem, pois para logo são relegadas ao esquecimento e a um fim inglório, valendo apenas como testemunho histórico e gritante da imperfeição e miséria moral de muitos homens ou épocas.

O livro, repositório da Verdade, ou da tentativa honesta de perscrutá-la, esse é eterno, apesar de todas as chamas com que o queima a estultícia ridícula de potentados transitórios, que passam como relâmpagos pela face da terra, mas acreditam ingenuamente estar o mundo girando em torno deles e se esquecem que depois retornarão ao pó nivelador, pó humilde que se ri da vaidade tola desses que se julgam eternos e superiores aos vermes que os roerão deliciosamente.

Somente por isso, os tiranos, despeitados e impotentes, procuram em vão impedir a circulação do livro, queimam-no, rasgam-no, num esforço inútil de anularem e destruírem o pensamento que encerram.

Somos e seremos sempre democratas, seja qual for o regime vigorante no mundo. (…) Transformemos pois, os livros em fonte de canhões e balas para que a Democracia esmague o nazi-fascismo de forma a não deixar dele nem o menor traço na face da terra. Os porvindouros decerto se horrorizarão ao estudá-lo, tal como nos sucede, quando procuramos conhecer as barbaridades da Idade Média, de tão triste memória, porém, farão justiça a Democracia de hoje, que tão bravamente há de destruí-lo, em breve. Como sempre, fortalecidos pelas nossas indescritíveis convicções democráticas, pleiteamos os postos de vanguarda na luta pela liberdade de pensamento, inclusive pela livre circulação do livro. Tudo quando se nos pedir nesse sentido, dentro das nossas possibilidades, daremos com o mais vivo entusiasmo e maior sinceridade.21

Calvino ainda cita durante o texto um trecho do livro Educando para a Morte de Gregor Ziemer, o qual ele havia editado, sobre um episódio de queima de livros em uma escola alemã. Vão para a fogueira um exemplar do Alcorão, um da Bíblia e livros de Shakespeare. Ele também cita um discurso de Roosevelt para a Sociedade dos Editores, no qual o presidente dos EUA enfatizava a liberdade que o livro encontrava nas democracias, muito diferente dos regimes nazifascistas, ressaltando que os livros seriam “a luz” da civilização contra a barbárie nazista.

É possível depreender algumas questões interessantes desse artigo. A primeira delas é o papel desempenhado pelo livro, segundo Calvino. Para ele o livro além de ser o “recinto sagrado do pensamento”, é também uma arma, termo que ele utiliza diversas vezes. Dessa forma, o seu papel é central no embate político e na luta em auxílio dos Aliados. No contexto da guerra, os livros são fundamentais para combater o nazi-fascismo, logo o ato de editá-los também se torna algo central. Colocando os livros em destaque nessa luta, Calvino também valoriza o papel do editor, como agente político direto da Guerra.

Seguindo essa linha de raciocínio, o tratamento dispensado aos livros passa a ser fundamental na definição de caráter de um regime. Dessa forma, ele apresenta o nazi-fascismo como um regime de barbárie e obscurantismo que queimava livros, na tentativa de impedir a livre circulação do pensamento. Assim o livro, essa “arma terrível e invencível” torna-se peça fundamental contra a tirania nazifascista, o que fica ainda mais claro pelo apelo do editor, quando pede para que os livros sejam transformados em “canhões e balas” em nome da democracia.

Enfim, esse artigo de Calvino Filho acaba sendo um grande manifesto contra o nazi-fascismo, em defesa da democracia e da livre circulação do pensamento através dos livros. Ao mesmo tempo, ele aproveita para citar um livro antifascista editado pela sua casa editorial, o que além de servir como propaganda para a editora também mostra o seu engajamento como editor na luta antifascista.

Após esse artigo, Calvino volta a aparecer nas páginas do Diário da Noite para rebater críticas aos livros que lançava. Na edição de 2 de junho de 1943, ele publica um direito de resposta a um artigo do padre Arlindo Vieira publicado no jornal A Manhã, que criticava o “bolchevismo” e mais especificamente o livro O Poder Soviético de Hewlett Johnson, o deão de Canterbury, editado pela Calvino. Vale ressaltar que esse jornal pertencia ao governo, e era dirigido por Cassiano Ricardo, reconhecido poeta conservador, defensor do Estado Novo e bastante próximo ao integralista Plínio Salgado.22 Sobre o livro do deão, afirma o padre:

Afirmam outros mentirosamente que cerca de cem mil padres vivem e pregam na Rússia, que os templos estão todos abertos, e andam sempre repletos de fiéis. Nem o próprio Deão de Canterbury, o infeliz panegirista do regime soviético, fala assim com tanto entusiasmo. A obra do famigerado Deão é a maior farsa dos nossos dias. Ele mesmo declara explicitamente seu intento de fazer apologia da Rússia, ou melhor, do regime que a infelicita. Esse livro que é uma congérie de patranhas, uma pura fantasia, está envenenando a alma da nossa juventude.23

A resposta de Calvino Filho ao padre não demora a aparecer. No seu direito de resposta escreve o editor:

Padre! O senhor errou e pecou e errou novamente, faltando à VERDADE, que Deus ama e prega e eu estimo e sigo.

(…) Padre! Quem citou que há 100.000 clérigos exercendo a sua profissão na Rússia foi Joseph E. Davies em seu livro “Missão em Moscou” (vide página 96). Que Davies merece o seu, o meu e o nosso respeito, é mais que claro, tal a sua posição intelectual, social, econômica, religiosa e política, que o colocam acima das nossas reduzidas autoridades, minha e sua. Sejamos humildes! Eu o sou!

(…) Padre! O autor de O PODER SOVIÉTICO, o Deão de Canterbury, é um arcebispo protestante inglês. Prefaciou esse livro o bispo católico brasileiro D. Carlos Duarte Costa. Ambos inspiram respeito pelos cabelos brancos que têm, maiores que são de 60 anos. Além disso, são apóstolos de Deus! Esses apóstolos de Deus sendo acusados pelo senhor, padre, de que são farsantes e capazes de patranhas, embora ocupando os mais altos cargos na hierarquia da Igreja, deixam aos tementes a Deus, como eu, em plena confusão de espírito, pois passaríamos a ver daqui por diante, em cada padre ou bispo, um possível farsante, um indivíduo hábil em patranhas, pois ninguém traz marca na testa, indicando se é herói ou vilão.

(…) Padre! Para poder vender meus livros, luto desesperadamente, vencendo sérias dificuldades, e nem sempre o consigo, e ganho pouco, de forma que não vou à Igreja, por estar essa casa de Deus acima das minhas posses, visto que não aceito serviços de quem quer que seja, sem pagar.

Mas, garanto-lhe que ontem, à noite, pus-me de joelhos e, contrito, invoquei e pedi a Deus para que apague o ódio que queima o seu coração e lhe permita ver o povo russo como nosso irmão em Cristo, pois além do mais está morrendo pela liberdade que o senhor, padre, e eu, tanto valorizamos.

(…) Que Deus lhe perdoe, padre, mais essa irreflexão, que ditou as suas palavras amargas e falsas no domingo.24

Calvino começa sua resposta observando que a informação citada pelo padre sobre os 100 mil clérigos se encontra no livro Missão em Moscou editado por ele e de autoria do então embaixador estadunidense na URSS, Joseph Davies. Da mesma forma, ele enfatiza que o autor de O Poder Soviético é um arcebispo protestante, e que o livro foi prefaciado por um bispo católico. Para além das ironias quanto a religião presentes na sua resposta, a base para a refutação às críticas do padre Arlindo é o destaque para a posição dos autores dos livros citados e a credibilidade que estaria presente a partir do cargo de cada um. Não haveria porque desconfiar das palavras de um embaixador dos EUA, de um arcebispo protestante e um bispo católico a respeito da URSS, segundo o editor. A autoridade dos autores garantiria a veracidade de suas obras. O editor ainda enfatiza dificuldades pelas quais passaria para vender seus livros, o que, sem dúvida, é uma referência a censura enfrentada por ele diversas vezes por parte do Estado Novo. Por fim, Calvino ainda faz uma defesa do esforço de guerra do povo soviético.

O livro do deão de Canterbury continuou levantando polêmica, dado o seu olhar positivo da experiência soviética. Mais uma vez no jornal A Manhã, do dia 31 de outubro de 1943, uma crítica aparece a esse livro, dessa vez feita pelo professor Lúcio José dos Santos, apresentado como um importante pensador católico, além de ser um renomado engenheiro, e ter sido diretor da Escola de Minas, reitor da Universidade de Belo Horizonte e diretor da Faculdade de Filosofia da mesma instituição. Segundo a chamada do jornal o professor faria uma crítica “a parte técnica, filosófica, e religiosa” do livro.

O professor dá início ao seu artigo dizendo que fará uma crítica a obra de Hewlett Johnson, e que através de suas observações pretende “neutralizar o veneno da obra” do deão. Para Lúcio José dos Santos, antes da guerra o consenso em torno da experiência soviética, ou do “sovietismo” como ele diz, era negativo. Com o início do conflito teria surgido duas vertentes de escritores especializados na URSS: De um lado escritores que afirmavam que os soviéticos tinham deixado de lado a radicalidade da sua ação política, mudando suas ideias quanto a religião, a família e até mesmo quanto a economia. E de outro, autores mais radicais que passaram a defender que tudo o que havia sido dito a respeito da URSS até a guerra não passavam de calúnias, e que as ações dos líderes soviéticos se justificariam pela necessidade de defesa da Revolução. Johnson, para ele, estaria inserido nesse segundo grupo. O professor afirma que a “dificuldade de encontrar serenidade, imparcialidade e objetividade” sobre o que era escrito a respeito da Revolução Russa após 1917, ficou ainda pior após a Guerra, sendo para ele o deão de Canterbury o maior exemplo disso.

Para o professor católico, a prática da “verdade” por parte de Hewlett Johnson teria ficado comprometida por conta de suas intenções declaradas com o seu livro, que seriam as de dissipar qualquer preconceito em relação a URSS na Inglaterra e com isso levar a uma aliança entre as duas nações. Esse objetivo “apologético e utilitário” do deão levantaria suspeitas quanto ao conteúdo de seu livro. Para o autor do artigo, nada justifica que as palavras de Johnson sejam tomadas como verdade, enquanto inúmeros autores que também escreveram sobre a URSS fizessem duras críticas ao “sovietismo”. Mas as críticas mais contundentes se dão a forma como o deão trata a religião na Rússia. Diz o professor: “Passemos agora à parte em que o autor trata da questão religiosa. Nesta parte, é impossível acreditar na boa fé e sinceridade do autor, a menos que não se lhe atribua uma rara ignorância, ou se admita que ele abjurou o cristianismo cuja falência não cessa de proclamar, convertendo-se integralmente ao comunismo”. 25

Lúcio José dos Santos critica a visão de Hewlett Johnson sobre a proximidade que existiria entre os valores cristãos e comunistas defendidos pelo deão, além da sua interpretação de que a repressão sofrida pela igreja por parte dos bolcheviques seria motivada muito mais por questões sociopolíticas do que religiosas.

O professor católico critica o livro do deão por conivência a violência dos revolucionários bolcheviques contra a religião na Rússia, argumentando que a supressão da religião seria um pressuposto dos comunistas, e não um fato que teria se dado pela própria dinâmica da luta revolucionária contra as estruturas do estado czarista. Ele traz afirmações de Marx e Lênin para corroborar a sua crítica, o que para ele, a priori, já desautorizaria o livro de Hewlett Johnson. Foge dos objetivos do trabalho uma análise mais aprofundada sobre o entendimento da religião por Marx e Lênin, mas é fato que o livro do deão traz uma discussão sobre a mudança de perspectiva dos soviéticos frente a religião com a consolidação do estado socialista, fato ignorado pelo professor católico na sua crítica.

O editor Calvino Filho mais uma vez responde a crítica feita ao seu livro, dessa vez na edição do dia 05 de novembro de 1943 do jornal Diário da Noite. Com o título O Poder Soviético do Deão de Canterbury e a crítica feita pelo notável integral-católico Lúcio José dos Santos, o direito de resposta afirma o seguinte:

Li a longa e exaustiva crítica que o sr. Lúcio José dos Santos escreveu sobre o livro O Poder Soviético do Deão de Canterbury, afim de desaconselhar a sua leitura aos católicos e integralistas. Essa crítica me deixaria sobremodo apreensivo se pudesse aceitar como exatas todas as suas considerações baseadas em fatos discutíveis e outros criados pela sua imaginação, pois o Deão de Canterbury, por ser bispo cristão, com 70 anos de idade, tendo sido, há poucos dias atrás, escolhido pelo Rei da Inglaterra para seu Conselheiro, na organização do programa de estudos da Princesa Izabel, herdeira da Coroa, figura respeitada pela sociedade britânica, parecia-me, como me parece, por tais títulos, insuspeito e incapaz de mentiras, facilmente desmascaráveis pelo sr. Lúcio ou qualquer colegial...ainda que ingênuo.26

Calvino começa sua resposta seguindo a mesma linha de raciocínio já usada anteriormente, ou seja, apelando para a posição do autor do livro como garantia da veracidade do conteúdo do mesmo. Dessa vez, o deão não é apenas um sacerdote cristão respeitável, mas também homem de confiança do rei da Inglaterra, o que tornaria o seu posicionamento simpático a URSS ainda mais digno de respeito e livre de suspeitas. O editor continua agora defendendo outras edições publicadas por ele sobre a Rússia:

E mais apreensivo ficaria se o sr. Lúcio, à maneira dos trotskistas, concluísse que crítica idêntica, no mesmo estilo e com o mesmo espírito, seria aplicável aos demais livros que a Editorial Calvino editou, convicta de que revelava, tão fielmente quanto possível, a Rússia atual, tais como “Missão em Moscou”, de Joseph E. Davies, ex-embaixador dos Estados Unidos na URSS, que desfruta do mais alto conceito em seu país, pela sua posição social excepcional, pois que é grande capitalista e maior advogado, afora ser amigo pessoal e conselheiro do presidente Roosevelt; “A Rússia na Guerra e na Paz”, de Anna Louise Strong, que viveu 25 anos na URSS, trabalhando como jornalista, e goza do mais alto prestígio nos Estados Unidos, sua pátria, fruindo mesmo o privilégio da amizade pessoal do presidente Roosevelt, do qual é comensal; “A Resistência Russa” de Maurice Hindus, que é russo de nascimento, mas vive desde a sua meninice nos Estados Unidos, onde exerce a profissão de professor universitário “doublé” de repórter internacional, sendo considerado mesmo o mais “expert” em assuntos russos.27

Nesse trecho, Calvino continua o seu direito de resposta apresentado outras obras sobre a realidade da Rússia editadas por ele, ressaltando mais uma vez as qualidades pessoais de cada autor e a sua total capacidade para falar a respeito do tema. Continua pesando o argumento de que esses autores estão acima de qualquer suspeita, nesse caso pelo fato de serem próximos aos EUA, dois deles sendo inclusive amigos do presidente Roosevelt. É o caso de Joseph Davies, que além de amigo do presidente também é respeitado por ser “grande capitalista”, e Anna Louise Strong, amiga e frequentadora da casa do presidente. Curiosamente, o que pesa para esses autores serem dignos de confiança ao tratarem da questão russa, segundo a lógica da argumentação de Calvino, é esses não serem comunistas, o que lhes garantiria “distanciamento” e “objetividade” na análise da URSS.

Na sequência de seu artigo, o editor afirma que todos esses livros são complementares uns aos outros. Vale lembrar que todos faziam parte de uma coleção da editora intitulada “A Verdade Sobre a Rússia”, e que o fato de um deles estar errado ou mentindo, invalidaria todos os outros, o que para Calvino era algo impensável. Ele ainda ressalta o fato de os autores serem respeitados no mundo todo, existindo traduções dessas obras em diversas línguas e países. Ainda reconhece que livros que pretendem descrever “povos e costumes” não seriam “isentos de pequenas falhas, omissões ou enganos”, mas que, no entanto, essas edições da Editorial Calvino representariam “a verdade e a boafé” com a qual foram escritas pelos seus autores. As obras teriam como grande objetivo “desmascarar e alertar o mundo contra os efeitos da infame propaganda fascista”, por esse motivo incomodariam tanto ao “quintacolunismo verde nacional”, aos fascistas e trotskistas.

Outro aspecto marcante da resposta do editor ao professor católico é o tom de embate político existente nele. O editor comunista não poupa acusações ao integralismo, ao nazifascismo e ao trotskismo. De modo mais direto ao seu interlocutor, ele afirma com ironia:

(...) o senhor Lúcio, o universalmente admirado Lúcio, de “Vozes de Petrópolis”, não só pela sua super-autoridade moral e científica, que o elevou a situação de membro da Câmara dos 40 do Integralismo, como pelo seu vasto, profundo e insuperável conhecimento sobre a Rússia cuja evolução “in loco” acompanha...através da sua imaginação verde, desde o “Outubro Vermelho” até hoje, o que o autorizou negar veracidade às informações do Deão, então mais não me restaria que descrer de tudo e de todos. Felizmente não serei levado a esse ceticismo, pois a hipocrisia, mentira, e estupidez são quase que privilégios de fasci-integralistas, sobrando algo para os trotskistas... 28

O tom utilizado por Calvino para se referir aos acontecimentos referentes a Guerra e a luta contra o nazifascismo é o mesmo. Nesse momento as vitórias do exército vermelho sobre o exército nazista também servem de argumentos pró-URSS no debate:

(...) apelo para as extraordinárias luzes do sr. Lúcio, beatificada autoridade moral, religiosa e integralista, afim de que explique o MILAGRE RUSSO, que não pelo progresso material, moral e intelectual da URSS, que permitiu a esse povo tiranizado, escravizado, amoral, analfabeto, que vive sob o cão do comunismo sanguinário no dizer dos fascistas, trotskistas e católicos despeitados, repelir a agressão do supercivilizado, liberto, cristão e feliz nazista, enquanto que povos como o francês, belga, holandês, dinamarquês, etc., fracassaram lamentavelmente demonstrando contristadora incapacidade moral e material de reação frente às hordas germânicas, apesar dos padres católicos lhes benzerem as espadas e implorarem a proteção de Deus para eles. Esses padres não foram atendidos em suas súplicas, certamente porque o Papa não lhes endossou as preces...mudo que ficou de emoção, em face da vitoriosa e traiçoeira arremetida de Hitler.

Os fascistas, com Hitler à frente, disseram ao mundo que o povo russo era desgraçado, incapaz, infeliz; que odiava o governo que o escravizava; que ansiava pela liberdade germânica. (…) Parece-me que Hitler se enganou...entretanto os que deram ouvidos ao dr. Goebbels, estultamente, teimam em acreditar no que ficou exuberantemente provado ser mentira, pois chegam ao cúmulo de afirmar não existir aquilo que todos nós estamos vendo e assistindo, quase que apalpando: a vitória esplêndida do povo russo, vitória que só pode exprimir uma superior organização econômica e bélica, amparada por um povo de moral excepcional, moral que só se encontra nos indivíduos de convicções muito sérias, naqueles que não querem perder o que valorizam acima de tudo e estão preparados espiritualmente para defendê-lo.29

E termina sua resposta, de forma bastante irônica:

Se os escritos do deão de Canterbury são mentirosos e as afirmações do dr. Goebbels são verdadeiras, forçoso é concluir que houve um milagre divino na Rússia que os fascistas dizem ser sem Deus, qual permitiu a esse povo resistir e vencer o sacripanta nazista enquanto povos ultracatólicos como os da França e da Polônia eram impiedosamente e facilmente esmagados pela besta teutônica. Se tudo quanto foi realizado na URSS não é fruto da vontade férrea e esclarecida do seu povo, então teremos que aceitar como fato consumado que Deus obrou um milagre e ele ocorreu na Rússia porque o seu povo o mereceu.30

Fica claro por esse texto de Calvino Filho que a questão editorial está intimamente ligada a questão política. Através da edição de livros sobre a URSS, o editor tem como objetivo influenciar na luta política que se travava naquele momento da Guerra, rebatendo o discurso anticomunista do nazifascismo. Dessa forma, rebater as críticas de um integralista como Lúcio dos Santos vai muito além do fato de apenas defender a obra publicada, é também uma forma de marcar posição clara na luta que acontecia naquele momento. Para o editor, em meio da guerra contra o nazifascismo, criticar a URSS era servir ao “quintacolunismo”, corroborar a propaganda antisoviética e confundir os brasileiros durante o esforço de Guerra. Não é à toa que por diversas vezes ele usa os termos “integralista”, “fascista” e “trotskista” no seu texto, demarcando com clareza a quais adversários políticos suas palavras se dirigiam.

Outro livro editado pela Editorial Calvino que entrou na mira das críticas foi Stalin de Emil Ludwig. O crítico literário Edmundo Moniz publicou uma crítica a esse livro na revista literária Carioca, intitulada A tradução do Staline de Ludwig, mas dessa vez os apontamentos se referiam não ao conteúdo do livro propriamente dito, mas a forma como ele foi traduzido e editado. Moniz afirma que “o livro foi tão deformando que nem parece o mesmo”. O crítico aponta alguns trechos do livro que constariam nas versões francesa e espanhola, mas que estariam ausentes da versão em português. Ele acusa Calvino Filho de deturpar o livro de Ludwig favorecendo Stalin, principalmente quando esse aparece contraposto a Trotski. O principal exemplo disso, segundo ele, é a forma em que o texto conhecido como “testamento de Lenin” foi traduzido. Segundo Moniz:

Como sabemos, o testamento de Lenine é um documento histórico amplamente divulgado no Brasil. Várias vezes já foi traduzido para o nosso idioma, inclusive pelo acadêmico Manuel Bandeira. Eis como traduziu o seguinte trecho do referido documento:

'O camarada Staline, tornado secretário-geral, concentra em suas mãos um enorme poder: e “não estou seguro” de que ele saiba sempre usar esse poder com cautela.' (…) Na edição francesa de “Staline” de Ludwig, encontramos o seguinte:

'Le camarade Staline, devenu Secrétaire Général du Parti, a concentré une puisance énorme entre ses mains et “je ne suis pas sû” qu'il s'en serve toujours avec la prudence necessaire'(...)

Diz a tradução espanhola:

'El camarada Staline al convertirse em Secretario General del Partido há concentrado un enorme poder em sus manos y “no estoy seguro” de que siempre lo utilice com la prudencia necessária.' (...)

A edição brasileira transformou a negativa numa afirmativa. Vejamos:

'O camarada Staline, tendo sido feito secretário geral, concentrou um enorme poder em suas mãos, e “estou certo” de que sabe sempre usar esse poder com suficiente cautela.

E Moniz encerra a sua crítica da seguinte forma:

Teríamos que publicar um novo livro se fôssemos mostrar todas as deturpações que existem na tradução portuguesa do “Staline” de Ludwig. Essa tradução estragou a obra do famoso historiador. Pelo menos, podemos dizer que não se trata propriamente da obra de Ludwig, já que teve um colaborador que em nada se recomenda. O que circula por aí até que se prove o contrário não é o livro de Ludwig. Trata-se, ao que parece, de uma mistificação sem outra finalidade senão a de enganar o público de boa fé.31

A resposta de Calvino Filho às duras críticas de Edmundo Moniz, vieram na edição do dia 1º de outubro de 1943 do Diário da Noite. Com um artigo intitulado “Stalin”, de Emil Ludwig, não foi deturpado em sua tradução, o editor rebate uma a uma as acusações feitas a ele. Moniz o acusa de ter censurado um capítulo todo do livro de Ludwig por ser desfavorável a figura de Stalin, no que ele responde:

Diz o sr. Moniz que se encontra em “Stalin”, em inglês, um capítulo de 9 páginas, intitulado “Portrait Sketch” (esboço de um retrato), que não consta da tradução brasileira porque “censurei” todo esse pequeno capítulo, que segue imediatamente ao prefácio do autor, o qual, com toda a segurança, não é absolutamente desprimorosa para Stalin, pelo contrário. Realmente isso poderia parecer verdade, um corte, mas nenhuma culpa com a omissão tem a Editora Calvino. O culpado foi Ludwig, porque para atender o nosso desejo de lançarmos aqui, em português, sua biografia completa de Stalin, ao mesmo tempo que era lançada em inglês, nos Estados Unidos, mandou-nos as últimas provas tipográficas, revistas por ele, certamente, das quais foi feita a tradução. Esse “Portrait Sketch” não figura nessas provasoriginais, como não figura também nas edições francesa e espanhola, embora o senhor Moniz afirme que sim. Salvo um lapso de Ludwig, que deixou de nos enviar esse capítulo, este foi escrito depois da remessa das provas-originais. Ludwig supunha que pudéssemos realizar o nosso desejo de lançar imediatamente a tradução do seu livro, o que não nos foi possível por motivos independentes da nossa vontade, e por isso não nos remeteu o capítulo que depois escrevera, talvez, e que fez constar da edição norte-americana.

Isto explicado, pode alguém acusar-me de “censor” e de má-fé? Se há omissão, essa foi de Ludwig. Ademais, se acaso, fosse verdadeira a imputação que me faz o sr. Moniz, de que alterei todo o livro para beneficiar Stalin, por que motivo iria “censurar” um capítulo, no seu conjunto, simpático ao Marechal soviético?32

Vale ressaltar que esse capítulo intitulado “Portrait Sketch” foi adicionado na 2ª edição do livro de Ludwig editado pela Editorial Calvino. O editor continua a sua resposta a Edmundo Moniz, dessa vez se referindo a acusação de ter transformado a negativa do “testamento de Lênin” sobre Stalin em afirmativa, e também sobre a suposta supressão de trechos do livro que constavam nas edições francesa e espanhola. Diz Calvino Filho:

Falando sobre o testamento de Lenine, o sr. Moniz cita e transcreve um trecho da tradução dele, testamento, nas edições francesa e argentina, bem como uma de Manuel Bandeira, em que se lê (…) “A edição brasileira transformou uma negativa em afirmativa”. Não é verdade. No original norte-americano de “Stalin”, lê-se a pág.81, linha 23, o seguinte: I am sure, etc. A frase inglesa é afirmativa, como poderá reconhecer qualquer colegial. (…) 'Este pensamento de Ludwig não vem transcrito na edição brasileira e se encontra nas edições francesa e espanhola.' Que tenho com isso? Se não constava no original norteamericano, do qual foi feita a tradução brasileira, queria que eu alterasse o original, enxertando-o? Sou incapaz de ações trotskistas, por isso foi respeitado o original norteamericano. (…) Queixe-se a Ludwig, mas não me calunie e tampouco a Editorial Calvino, cujo conceito que desfruta, coloca-a acima de acusações levianas.33

Calvino ainda pondera que nenhuma tradução está livre de críticas e pequenos deslizes, que pode se criticar um tradutor pela escolha imprecisa das palavras, mas que isso, no caso da sua editora, jamais aconteceria por má-fé. Ele ainda comenta que o tradutor desse livro, Eduardo de Lima Castro, é “homem respeitável”, tendo sido deputado por Pernambuco e prefeito de Recife, além de tradutor de inúmeros outros livros, o que demonstraria o seu conhecimento cultural e a sua capacidade para a tradução do livro criticado. E complementa com uma observação:

Nenhum editor do mundo dispõe de tempo para conferir traduções. Confia-a ao tradutor e revisores. Este é o caso do livro “Stalin” e como todos os demais de qualquer casa editorial. Como sempre, o sr. Eduardo de Lima Castro continua a merecer a nossa confiança, como tradutor capaz e criterioso, pois as acusações do sr. Moniz são falsas, levianas e ineptas.34

O editor termina essa parte de sua resposta rebatendo a tentativa de Moniz, de segundo ele “(...)denunciar-me como o comunista stalinista que realizou cortes de textos e de frases inteiras (…) com o objetivo único e exclusivo de diminuir Trotsky e engrandecer Stalin.”. E continua:

Nunca fui comunista, em época alguma. Sempre fui democrata e antifascista. A Polícia desta capital poderá, em qualquer momento, comprovar o que afirmo. Algumas vezes, nesses longos anos, fui obrigado a prestar declarações à Polícia, que dispondo de recursos de investigações jamais me acusou ou me envolveu em processos comunistas.35

É curiosa a declaração de Calvino de que nunca foi comunista, porém compreensível. Apesar do arrefecimento da repressão aos comunistas no período da Guerra, ela não cessou por completo, sem contar o fato de o partido ainda se encontrar na ilegalidade. Não é difícil supor que essa fala do editor visava a proteção da editora e dele mesmo. Existem indícios que provam que Calvino Filho foi sim membro do PCB e figura pública importante do partido no Rio de Janeiro, questão que será abordada posteriormente. Continuando a sua resposta, afirma o editor:

Quando o trotskista Moniz ainda estava, talvez, no jardim de infância, eu já combatia o fascismo com todas as possibilidades de que dispunha, tendo mesmo editado, vendido e distribuído de graça “A verdade sobre o incêndio do Reichstag”, numa hora que parecia ao mundo ser infalível a vitória do fascinazismo, que deu origem ao integralismo, ao rexismo, etc. (…)

Quantos me conhecem sabem o ódio consciente que tive, tenho e terei contra o fascismo e todas as formas de opressão e exploração humana, por isso que sou DEMOCRATA CONSCIENTE, e como tal me tenho revelado em toda minha longa vida, através de palavras orais e escritas, atitude e ações.36

E termina da seguinte forma:

Finalmente a Editorial Calvino é a única empresa brasileira do gênero que se dedicou e se dedica a combater o nazifascismo. Pois bem, o sr. Moniz ataca-a. Por quê? Porque é quinta coluna trotskista, evidentemente.

Ao terminar a série de calúnias, em seu aranzel no “Correio da Manhã”, o sr. Moniz diz que considera encerrada a questão. É claro, que a tanto seja obrigado, pois precisaria possuir uma imaginação genial para descobrir novas e originais calúnias. E, na verdade, sua imaginação é pobre e sem brilho, produziu o máximo que podia, e mal.

Quanto a mim, como sempre, estou inteiramente a disposição dos quintacolunistas e trotskistas para combatê-los com quaisquer armas, em qualquer terreno, na defesa do meu ideal, que é o de todos os homens decentes: Liberdade e igualdade de oportunidades para todos, isto é, a DEMOCRACIA!37

Fica claro mais uma vez como as questões editorial e política estão intrinsecamente ligadas para Calvino. A sua defesa do livro extrapola as questões textuais apontadas por Moniz e se transforma em um manifesto político. Esse posicionamento aponta para o fato da crítica recebida também não ser neutra, trazendo a tona o seu caráter político. Não é a toa que o editor chama Moniz de “quinta coluna” e “trotskista”, termos muito presentes nas disputas políticas daquele período, ambos designando agentes que estariam a serviço do inimigo, que nesse momento era o nazifascismo. “Quinta Coluna” eram os infiltrados fascistas no exército republicano durante a Guerra Civil Espanhola, e “trotskista” naquele momento tinha basicamente o mesmo significado, desde a expulsão de Trotsky e seus correligionários da URSS.

Vale notar também a ênfase dada por Calvino Filho ao fato de, segundo ele, defender e lutar pela democracia. No contexto da ditadura do Estado Novo a luta pela restauração da democracia no Brasil passou a ser uma bandeira dos comunistas e a linha a ser seguida pelo PCB desde o final dos anos 193038, o que explica essa aparente contradição na fala do editor comunista.

Em 1944, Calvino Filho continua a defender os seus livros. Dessa vez, a crítica feita partiu do tenente-coronel Ary Maurell Lobo, que entre outras coisas o teria insultado por causa do livro A Questão Social e os Cristãos Sociais de Lisandro de la Torre. Em resposta a Lobo, o editor publica um telegrama no Diário da Noite do dia 19 de maio, que diz:

Pretendia e me mantenho no propósito de demonstrar sua incapacidade em provar o impossível, isto é, serem mentirosas minhas edições sobre a Rússia, particularmente o Poder Soviético e Stalin, com parte no apêndice da Constituição Soviética. Aguardava, pois, suas arguições para destruí-las a seguir. Fugindo ao meu repto V.S. desvia-se da questão, por isso não posso deixar de imediatamente protestar indignado contra sua acusação fácil e mal pesada de que estou traindo a Pátria com lançamento de Questão Social e Cristãos Sociais. Repito o insulto. Promover desconfiança e ódio contra o nosso aliado é trair os nossos soldados que vão bater-se no mesmo campo e ao lado dos seus soldados. Reclamar para o Brasil uma forma de governo fascista é mais que simples traição a Pátria, é tripudiar, escarnecer, insultar a nossa heroica e generosa mocidade que vai ajudar no estrangeiro a de custa qualquer sacrifício inclusive da vida, os soldados da liberdade a esmagarem o Fascismo e todas as suas formas degeneradas que só multiplicam pelo mundo, defendidas e sustentadas miseravelmente por inconscientes ou traidores venais. Se estima a verdade não a confunda com insultos soezes e inconscientes. É o que espero.

Calvino Filho39

A resposta continua em grande texto publicado pelo editor no Diário da Noite do dia seguinte. Intitulado A Verdade Sobre a Rússia através dos livros da Editorial Calvino e as acusações do sr. Ary Maurell Lobo, o artigo traz citadas as acusações do tenente-coronel aos livros editados por Calvino, principalmente O Poder Soviético do deão de Canterbury e A Questão Social e Os Cristãos Sociais de Lisandro de la Torre. Lobo acusa Calvino de ter se aproveitado “da ingenuidade ou ignorância” dos brasileiros ao lançar o livro do deão com enorme alarde nos jornais, afirmando que o mesmo traria “em cores naturais a Rússia de Stalin”. Ele ainda afirma que o livro é “sem nenhum valor na atualidade” e uma “brochura de ficção”. Ainda critica o fato de o livro Stalin de Emil Ludwig trazer como apêndice a Constituição Soviética, o que segundo ele seria uma forma de “enganar os bons comunistas brasileiros” sobre o funcionamento das leis na URSS.

A seguir o tenente-coronel afirma: “O sr. Calvino Filho, a quem não tenho até agora na conta de comunista, e sim na de livreiro industrioso, assaz interessado em tornar próspero o seu negócio, com a edição de obras vendáveis, educativas ou não, úteis ou prejudiciais”.40

Nesse trecho, Lobo acusa Calvino, ainda que de forma indireta, de oportunista, dando a entender que o editor buscaria o desenvolvimento da sua editora a qualquer custo, aproveitando-se do contexto da Guerra para lançar livros sobre a realidade soviética que seriam não apenas “prejudiciais”, mas também “perigosos”. É evidente que para o editor é importante a vendagem dos livros, mas fica claro que nesse caso o fator preponderante para a edição dessas obras é político. O importante é disseminar essa literatura antifascista e sobre a URSS procurando auxiliar no esforço de guerra. O lucro da editora, ainda que não seja algo a se desprezar, é mais consequência do que causa da ação editorial de Calvino Filho. Na sequência, o editor começa a responder às acusações de Ary Maurell Filho. Diz ele:

É de lastimar que o Sr.Maurell, muito embora haja prometido provar serem “inverídicas”, “perigosas”, “não educativas”, “prejudiciais” as edições Calvino, tenha abandonado essa ideia e resolvido “provocar-me” para uma “discussão sobre o tema religioso”, a pretexto do livro “A Questão Social e os Cristãos Sociais”. Estarei a disposição de s. s. para discutir sobre “religiões”, mas não pela imprensa leiga, porque considero essa discussão, perante o grande público profundamente prejudicial, principalmente porque neste momento só deveremos profligar os quinta-colunistas e prender a atenção do povo brasileiro sobre quanto concorra para a vitória do nosso esforço de guerra, ou seja, da União Nacional, para fortalecer o governo e possibilitá-lo enfrentar vitoriosamente os graves problemas atuais e gravíssimos de após-guerra.41

Mais uma vez, Calvino traz em sua resposta a questão política ligada a defesa de seus livros. Mas nessa resposta a questão da Guerra não só é predominante, e pela primeira vez o editor afirma defender a União Nacional em torno do governo em apoio ao esforço de guerra. Essa era exatamente a linha seguida pelo PCB, dessa forma aparece de maneira explícita o alinhamento do editor com o partido pela primeira vez nos jornais. Calvino continua nesse sentido, subindo o tom contra Maurell Lobo:

Qualquer atitude, ou iniciativa diversionista que facilite a vitória do fascismo ou apenas a de suas formas metastásicas, é trair a Pátria. Não acompanharei ninguém nesse sentido. Pelo contrário, combaterei com todo meu ardor democrático e patriótico. Hoje, mais que nunca, impõe-se-me à consciência pregar e lutar pela União Nacional, sob a bandeira reivindicatória de Vargas, na peleja contra a “exploração do homem pelo homem” para o engrandecimento do Brasil. (…)

Afirmei no início dessa defesa: 'Não há efeito sem causa'. A causa que moveu a pena injuriadora, evidente, gritante, foi o quinta-colunismo e o efeito se revela na pregação da discórdia entre os brasileiros, de desconfianças aos nossos Aliados, sejam eles os ingleses, norte-americanos ou russos.

Acusar o governo soviético de insincero e despistador, afirmar inverdades sobre a religião na Rússia para assustar os brasileiros, querendo reviver o espantalho do comunismo, já tão desmoralizado, é ação de quintacolunismo. (…)

Sr. Maurell, como brasileiro tenho o direito de exigir de V.S., como jornalista, que não use a sua pena para fomentar a desunião e malquerências através de intrigas parvas, contrariando assim os supremos interesses do Brasil, pois isso só serve ao Fascismo, o único inimigo presente que nos cabe combater, sem tréguas, abrigue-se ele onde for.42

Nesse trecho, mais uma vez, Calvino transforma a sua resposta a um crítico em um manifesto pela união na luta contra o fascismo e o “'quinta-colunismo”, apontando como “diversionista” as críticas de Ary Lobo. Para o editor, essas discussões trazidas por ele não tinham espaço naquele momento, no qual a unidade contra o inimigo externo deveria ser prioridade. Ainda que o apoio ao governo já tenha sido citado, é a primeira vez que Vargas aparece nominalmente. Além disso, ele cita, associado a Vargas, a luta contra a “exploração do homem pelo homem” pelo bem do Brasil, ou seja, fica claro mais uma vez o seu alinhamento a linha do PCB, que endossava o apoio ao presidente nesse momento.

No mês seguinte, no dia 16, foi a vez de Calvino Filho polemizar com um jesuíta alemão, Frei Mansueto, nas páginas do Diário da Noite. Mais uma vez a polêmica girou em torno da questão da religião na URSS, quando o editor é questionado pelo Frei por não editar as obras do russo ortodoxo Timasheff, crítico ao governo soviético. Em sua resposta, mais uma vez, Calvino produz um manifesto antifascista, utilizando o contexto de guerra para justificar a sua linha editorial. Vale citar a fala do editor praticamente na íntegra:

Respondo, em plena paz de consciência: tenho verdadeiro asco, repugnância, por qualquer quinta-coluna, embora, muita vez seja obrigado, contrariado, a vesgastar (azotar) os que pretendem sujar o meu calcanhar com a peçonha vil de sua baba infame. Razão, pois, mais que suficiente para jamais me permitir editar quaisquer livros de Timasheff, Mansueto, Arlindo Vieira, et caterva.

Quando os nobres fugiram da Rússia, de 1918 a 1920, muitos padres e bispos ortodoxos também fugiram. Estes criaram a igreja chamada de Carlovac, que imediatamente se pôs a injuriar a Revolução de Outubro, a expensas do prussianismo. Subindo Hitler ao poder, esses renegados padres e bispos do Sínodo de Carlovac, e como eles existem muitos mais ordinários ainda noutras igrejas, passaram a ganhar mais dinheiro alemão quanto mais se chafurdavam na lama das mais torpes calúnias contra o Governo Bolchevique. Enquanto isso a Igreja Patriarcal Ortodoxa Russa, sob a orientação sábia do Patriarca Sergei, reorganizada logo após a fase do “comunismo de guerra”, desenvolveu-se extraordinariamente, material, moral, espiritual e intelectualmente, a ponto de existirem hoje, na URSS, mais de 100.000 clérigos, 130.000 igrejas, seminários e academias para bispos. Essas e outras numerosas e sensacionais verdades incontestáveis constam no livro A VERDADE SOBRE A RELIGIÃO NA RÚSSIA, o único oficial e publicado pela Igreja Ortodoxa Russa, sob a responsabilidade e prefácio do Patriarca Sergei, e que só por isso foi traduzido diretamente do russo pela Editora Calvino.43

O editor mais uma vez defende seu posicionamento quanto ao esforço de guerra, quando afirma negar a editar livros de autores que critiquem a URSS, taxando-os mais uma vez de “quintacolunas” e afirmando a colaboração desses com o nazismo. Na sequência, ele enfatiza o desenvolvimento da Igreja Ortodoxa em diversas frentes, apresentando inclusive números expressivos relativos ao tamanho da mesma dentro da URSS. Essas informações saíram de um livro publicado oficialmente pela Igreja, o que claramente tinha por objetivo rebater a propaganda anticomunista que sempre se valeu da perseguição a religião por parte dos bolcheviques para fomentar o anticomunismo. Um livro da própria Igreja estaria acima de qualquer suspeita. Nesse sentido, complementa o editor: “Entre um autor ortodoxo russo, sórdido mentiroso e quinta-coluna, que vive no estrangeiro, inventando infâmias, e o Patriarca Sergei e outros altos dignatários da Igreja Patriarcal Ortodoxa Russa, vivendo na Rússia, em todos os tempos, em contato com a realidade, é claro que eu não poderia ter dúvidas. Editei o livro oficial da Igreja Patriarcal Ortodoxa Russa”. 44

Aqui, Calvino deixa claro a escolha política da sua linha editorial, falando abertamente que entre um autor ortodoxo “quinta-coluna” e os líderes da Igreja Ortodoxa na URSS, preferiu editar o livro de caráter oficial publicado por esses. Mais uma vez, não poderia existir maior garantia de credibilidade para o editor do que um livro editado pela própria Igreja contando a sua realidade dentro da URSS e sua relação com o governo bolchevique. O editor deixa claro que o seu principal compromisso nesse momento é com obras que tragam uma visão simpática, ou, pelo menos, não negativa da realidade soviética, visando apresentar ao público os russos como aliados confiáveis, diferente do que pregava toda a propaganda anticomunista no país.45 Calvino Filho termina seu manifesto da seguinte forma:

Bem sei que esses jesuítas vão vergonhosamente fugir ao repto. É velho hábito jesuítico fugir a Verdade. Mas nem por isso, quero perder a oportunidade de denunciá-los ao povo, novamente, como obreiros da desunião, da intriga e da felonia, justamente neste momento em que a todos brasileiros, de coração e em consciência, cumpre, sem discussões estéreis e sabotadoras, unir-se decisiva e sinceramente em torno de Vargas, em perfeita União Nacional para a vitória!46

Além do ataque aos jesuítas como desagregadores, sabotadores e afins, o editor mais uma vez repete a máxima do PCB nesse momento: União Nacional em torno do governo Vargas para a vitória na guerra contra o nazifascismo.

Nesse mesmo ano, Calvino Filho aparece nas páginas do Diário da Noite, mas por outros motivos. Um deles são as propagandas publicadas de sua revista Mundo Médico, voltada ao debate de assuntos referentes a política nacional e internacional, além de artigos específicos sobre questões médicas. A revista publicou artigos de personalidades como Abguar Bastos, Leônidas de Rezende, Maurício de Medeiros, que colaboraram com a Editorial Calvino nas traduções de diversas obras, além de terem livros próprios publicados pela mesma. O próprio editor também aparece com artigos de sua autoria, um com o curioso título Qual a profissão mais rendosa: sacerdote ou editor? que sem dúvidas remete as polêmicas envolvendo o livro do deão de Canterbury, e outro intitulado União Nacional.

A outra aparição foi em um anúncio de coluna social sobre um jantar no restaurante da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) em homenagem ao Barão de Itararé, pseudônimo do jornalista e humorista Aparício Torelli, pelos seus 25 anos na profissão, que contaria com a presença de diversos intelectuais. Entre eles está Calvino Filho, ao lado de nomes como Frederico Chateaubriand, Augusto Frederico Schmidt, Astrojildo Pereira, Dorival Caymmi, Samuel Wainer, Oscar Niemeyer, Graciliano Ramos, Rubem Braga, Vinicius de Morais, Oswald de Andrade, entre outros. Isso mostra como o editor comunista era presente nos meios intelectuais da época, além de importante figura pública do partido ao lado de outras personalidades comunistas. A partir da ação de Calvino Filho em entidades como a ABI é possível observar como os espaços de sociabilidade intelectual eram amplamente ocupados pelos comunistas nesse período.

As últimas aparições de Calvino Filho em polêmicas envolvendo os seus livros são de 1945. Ambas intervenções do editor nesse ano são no sentido de rebater a ideia de que vigoraria na URSS um governo ditatorial e totalitário. A primeira delas aparece em um telegrama endereçado a J.F. Maciel Filho publicado no Diário da Noite no dia 10 de março. Diz o texto:

Sr. J.F. Maciel Filho:

O senhor reafirmou um absurdo, muito divulgado pelos fascistas, no seu artigo “O DIREITO E OS FATOS”, dizendo ser a Rússia um Estado Totalitário. Essa afirmação é inexata, injuriosa e de sabor fascista. O Governo Russo emana do Povo, que participa nas eleições de seus dirigentes com interesse e número não atingido em nenhum outro país do mundo, em qualquer época. Leia, para eliminar qualquer dúvida a esse respeito, URSS – UMA NOVA CIVILIZAÇÃO, de autoria de Sidney e Beatrice Webb, obra em cinco volumes, já traduzida para o português. Nessa obra insuspeita, que confirma outras tantas de mérito – escrita por um Barão e Lord e por uma Lady britânicos – fica demonstrado irretorquivelmente ter a Democracia atingido sua máxima perfeição justamente no país mais sacrificado na luta pela defesa da Democracia – URSS – como é universalmente reconhecido, apesar dos esforços confusionistas dos fascistas de todas as cores e graus. Sua expressão de que há duas doutrinas opostas, uma, a da Economia do Estado, que seria a da URSS, em oposição a Economia individual dos países capitalistas, não corresponde a verdade, como qualquer estudante primário de economia facilmente demonstrará. Permitome sugerir-lhe leitura de um dos livros apreendidos pelo famoso e insuperável romancista Amilcar Dutra Menezes, diretor do DIP, ora em liquidação – PRINCÍPIOS DE ECONOMIA POLÍTICA, de Lapidus e Ostrovitianov – ou então o livro de Segal, sobre o mesmo assunto, que circula entre nós em espanhol e também será brevemente publicada vernáculo. Cordialmente, com minhas saudações antifascistas, subscrevo-me patrício e democrata.

Calvino Filho47

O editor comunista em seu telegrama afirma ser a URSS uma democracia plena, baseado em dois livros publicados pela sua editora, URSS – Uma Nova Civilização de Sidney e Beatrice Webb e Princípios de Economia Política de Lapidus e Ostrovitianov, e que a acusação de totalitarismo seria uma afirmação de “sabor fascista”. É interessante observar como o próprio Calvino garante a credibilidade das obras editadas ao mencioná-las como referência, o que também não deixa de ser um tipo de propaganda para esses livros. Mas o que mais chama a atenção nesse telegrama é o fato do editor citar a censura sofrida a um dos livros por parte do DIP. Apesar do relaxamento da perseguição aos comunistas por conta da Guerra, fica claro que, ainda em 1945, os mecanismos de censura do Estado Novo continuam na ativa, tendo vitimizado mais uma vez a Editorial Calvino.

Por último, encerrando a série de debates dos quais participaram o editor, uma carta aberta a Viriato Vargas, irmão de Getúlio, no Diário da Noite de 17 de abril, ainda no debate a respeito do regime soviético. Vargas chama esse regime de “totalitarismo ferrenho que extingue a iniciativa individual e por isso mesmo escraviza e degrada o indivíduo”. A resposta de Calvino, nesse caso, vem amparada pela vitória soviética sobre o exército nazista, que a essa altura já estava praticamente derrotado. Diz ele:

(...) os fatos reais permitem a qualquer um afirmar que foi o regime soviético, na sua opinião “escravizador e degradador do indivíduo”, que, para infelicidade e humilhação dos fascistas de todas as cores e formas, destruiu, mais que outro, as poderosas e tidas como invencíveis forças fascistas, recrutadas entre todos os povos europeus. Os povos da URSS, “escravizados e degradados”, no seu conceito, que também era o de Hitler, pela sua heroicidade ímpar e convicção ideológica na luta contra o Fascismo, arrancaram a admiração de todos os homens livres da terra, primeiramente de vultos incomparáveis como Churchill e o inesquecível Roosevelt. Se os fascistas cegos, atrasados e fanáticos ainda mantém a afirmação de que o regime soviético “escravizou e degradou” os povos da URSS, Hitler, ele próprio, já se retratou de tamanha sandice, obrigado pela força insuperável da organização soviética e valor indiscutível do livre soldado vermelho, na sua homérica luta pela própria liberdade e da de todos os povos do mundo.48

Na visão do editor a superioridade da organização social soviética ficou comprovada com as vitórias durante a Guerra, ressaltando a admiração conquistada pela URSS inclusive por parte de dois líderes de potências capitalistas, Roosevelt e Churchill. Calvino não esconde o seu entusiasmo com as vitoriosas campanhas soviéticas, com o seu texto ganhando ainda mais cores militantes do que aqueles dos debates anteriores. Na sequência, ele afirma que se Viriato Vargas ainda não se convenceu da realidade soviética, bastaria ler os livros com “depoimentos insuspeitos” de “Davies, Strong, Hindus, etc. e os do casal Webb, barões e lordes ingleses”, todos editados pela Editorial Calvino. Para ele, depois da edição desses livros dizer “inverdades sobre o regime soviético” só poderia ser considerado “calúnias fascistas”, e continua: “A verdade que entra pelos olhos até mesmo das massas, que não podem ler infelizmente a obra dos Webb, dado o seu preço acima da capacidade aquisitiva dos desafortunados, é que o Regime Soviético se transformou depois do “test” dessa guerra em fonte inexaurível de ensinamentos para os povos em pleno desenvolvimento como o Brasil”. 49

Nesse trecho vale ressaltar o fato de o editor ter plena consciência da dificuldade de acesso as obras editadas por ele pelos “desafortunados”, ou seja, a classe trabalhadora. Isso levanta a discussão de qual seria o público-alvo dos livros da Editorial Calvino, que por indicações do próprio editor, seria a pequena burguesia intelectualizada. Afirmar alguém que o regime soviético é totalitário e que “o nazismo e o comunismo são o mesmo regime destruidor da liberdade humana”, mais não prova que a suprema ignorância de quem o afirma, afora envolver severo e estúpido ataque ao Presidente Vargas, que em boa hora pleiteou o reatamento diplomático com o Regime Soviético, democracia aliada de democracias e declarou guerra ao Fascismo Internacional.

(…) Na minha opinião e na de todos os bons brasileiros antifascistas, o Presidente Vargas acertou em que pese a opinião do seu irmão Viriato. A União Soviética é realmente a mais avançada Democracia do mundo e, sobretudo, a garantia para todos os povos livres da liquidação final e definitiva de todas as sobrevivências fascistas, seja em que meridiano elas se atrevam subsistir, daí a admiração e entusiasmo que desperta a URSS em todos os antifascistas sinceros e conscientes do mundo. (…) Getúlio Vargas honra-se estendendo a mão ao Governo Soviético, ou melhor, ao heroico povo soviético, enquanto Viriato Vargas pretende insultá-lo com as mais revoltantes calúnias.50

Nesse trecho Calvino rechaça a ideia de que o nazismo e o comunismo seriam regimes iguais, argumento recorrente nos pensadores de direita, além de mais uma vez ressaltar os acertos do governo Vargas, dessa vez na questão referente ao reatamento diplomático com a URSS. É interessante notar que o editor não só exalta a figura de Vargas, como também o preserva das críticas ao governo, como no caso da censura sofrida pelo livro Princípios de Economia Política por parte do DIP. Mais uma vez fica claro como ele segue de forma disciplinada a linha do partido de União Nacional em torno da figura do presidente.

Além das diversas aparições no Diário da Noite, Calvino Filho também deu contribuições para o debate teórico nas páginas da imprensa do partido. Foi publicado um artigo de sua autoria na Tribuna Popular do dia 23 de março de 1946 intitulado Qual a razão da atitude de Prestes?, no qual o editor defende o secretário-geral do partido. Naquela ocasião Prestes deu a seguinte declaração, respondendo uma sabatina, a respeito do posicionamento dos comunistas caso o Brasil declarasse guerra a URSS:

Faríamos como o povo da Resistência Francesa, o povo italiano, que se ergueram contra Petáin e Mussolini. Combateríamos uma guerra imperialista contra a URSS e empunharíamos armas para fazer a resistência em nossa pátria contra um governo desses, retrógrado, que quisesse a volta do fascismo. Mas, acreditamos que nenhum governo tentará mover o povo brasileiro contra o povo soviético, em luta pelo progresso e bemestar dos povos. Se algum governo cometesse esse crime, nós, comunistas, lutaríamos pela transformação da guerra imperialista em guerra de libertação nacional.51

Essa declaração foi distorcida pelos anticomunistas na época, gerando forte reação contra Prestes e o PCB, chamando-os de “traidores da pátria”. É nesse sentido que Calvino defende o secretário-geral, apontando como a sua fala foi mal interpretada. O editor, de início, já acusa esse episódio como sendo uma “contramarcha” sobre os avanços democráticos, levado a cabo pelas forças reacionárias do Brasil, “fascistas e capitalistas reacionários”. Para ele, essa investida se daria contra a “corrente democrática mais poderosa do país” constituída pelos comunistas e antifascistas.

Calvino Filho argumenta que Prestes, em momento algum, trairia a pátria ao lutar contra um governo fascista, mas pelo contrário, “prestaria relevantes serviços” ao país, assim como o fizeram os Partisans antifascistas na Itália e na França, admirados por todos os “democratas” ao redor do mundo. Ele continua dizendo que uma guerra imperialista pressupõe pilhagem e escravização de nações mais fracas por nações mais poderosas, e que resistir a um governo que participasse de tal guerra jamais seria traição, mas sim patriotismo. Nesse sentido, ele defende que Prestes não disse que não lutaria contra a URSS na “hipótese absurda” de o Brasil declarar guerra aos soviéticos, mas sim que um governo que tomasse tal decisão, subordinando o país a interesses externos, seria traidor e não patriota.

Ele segue defendendo que a URSS não é uma “nação guerreira”. Que as guerras imperialistas só serviriam para as potências capitalistas, que as fariam em busca do lucro. Segundo ele, um país socialista, no qual não existiria propriedade privada dos meios de produção, não teria tais interesses. Após 1920 a URSS não teria feito outra coisa a não ser “trabalhar pacificamente para construir um Estado Socialista, até que se viu envolvida nesta última guerra”. Ele segue seu raciocínio afirmando que seria impossível uma guerra entre o Brasil e a URSS, pois o Brasil seria ainda uma economia “semicolonial”, sem excesso de capitais para exportar e nem condições de exigir de outro país o fornecimento de matérias-primas. Por sua vez, a URSS não teria interesses expansionistas através da guerra, já que a sua economia socialista seria voltada para suprir o consumo interno, e apenas por motivos extraordinários realizaria o comércio externo com países capitalistas. Para Calvino, a guerra seria a “forma sanguinolenta” para a expansão do capitalismo, o que não envolveria a URSS.

O editor afirma que seria “justo e patriótico” transformar uma “guerra imperialista” em “guerra de libertação nacional”, alegando que se assim não fosse os “heróicos Partisans” não seriam aclamados e respeitos. Segue argumentando que o Brasil não é um país imperialista, pois para isso teria que alcançar o nível mais elevado de sua industrialização, e essa ainda seria “pobre” e viveria “artificialmente à custa do povo, através das tarifas alfandegárias”. Calvino faz uma diferenciação dizendo que não seria patriotismo morrer pelo imperialismo estrangeiro, porém, o seria no caso de entregar a vida pela pátria. Mais do que isso, “seria uma honra”. E faz uma distinção dizendo que a pátria não é o governo ou alguns poucos indivíduos, mas sim o povo lutando pelos interesses “maiores e históricos” do país.

Para o editor, Prestes jamais trairia a pátria, pois para isso ele teria de ter interesses em dinheiro e posições políticas, das quais o “Cavaleiro da Esperança” teria abdicado, além de ressaltar os seus valores de comunista e antifascista, e sua “convicção democrática”. Na sequência, ele define o que seria a “convicção comunista”, e teoriza sobre o comunismo. Vale a longa citação:

Qual é a convicção comunista? Ou melhor, que é um comunista e o que pretende ele? Um comunista é um cidadão que sabe, por demonstração científica indiscutível, que a sociedade não toma a forma desejada por este ou aquele homem, grupo ou classe. Que ela sofre um processo de evolução, correspondendo sua superestrutura, ou seja, forma de governo, jurídica, política, religiosa, etc., ao desenvolvimento da infraestrutura da sociedade, isto é, do modo de produção que nela se realiza. Um país colonial, semicolonial, dependente, jamais poderá ser imperialista – superestrutura – era preciso que o país fosse altamente industrializado e rico de capitais, e o Brasil, infelizmente, não o é. Por conseguinte, se não é o comunismo que querem os comunistas implantar hoje no Brasil, que pretendem eles em geral e no nosso caso particular? Os comunistas em cada país do mundo, lutam para que a economia do seu país progrida e se torne ele cada vez mais democrático, porque o clima exigido e pelo qual lutam os comunistas é o do progresso e da democracia! Os comunistas sabem, estão convictos, que a sociedade que sucederá ao capitalismo, tal como este sucedeu ao feudalismo e este ao escravismo, é o socialismo. (…) Assim sendo, o comunista, em cada país, luta para que a sua pátria progrida e evolua para formas superiores. E lutando fá-lo patrioticamente porque a sua luta resulta em benefício do povo de hoje e do futuro da Nação, pelos benefícios que advirão às gerações vindouras. Trai, sim, aquele que, em vez de lutar pelo progresso do seu país, o coloca à mercê dos imperialistas estrangeiros, subordinando-os aos seus interesses. Quem pretendeu ou pretende vender o nosso território aos Estados Unidos para que nele se estabelecem bases através das quais poderão invadir o Brasil a qualquer momento? Não foi Prestes. E por quê? Porque Prestes é comunista.52

Após esse desenvolvimento teórico sobre o comunismo, afirmando que os comunistas no Brasil lutam pela democracia, fica evidente mais uma vez a linha do partido presente na fala de Calvino. Seguindo a essa defesa apaixonada da condição de comunista, ele ainda afirma que Prestes é acusado por representar os “direitos do povo contra o nosso capitalismo reacionário”, que se subordina ao capital estrangeiro em detrimento do desenvolvimento do país. E na sequência, terminando o seu artigo, curiosamente afirma:

Perguntar-se-á por que escrevi tudo isto. Respondo antecipadamente: não sou comunista, pois não tenho a honra de pertencer ao Partido de Vanguarda do Proletariado. Sou antifascista e vejo claramente que, se não desmascararmos a trama fascista, iniciada com as acusações a Prestes, teremos todos que ser escravos do imperialismo estrangeiro, sob a chibata de seus capatazes nacionais. (…) Não bastam essas razões para me expor, como me exponho, à fúria dos fascistas e traidores de nossa Pátria?53

Volto a afirmar que essa reiterada preocupação de Calvino Filho em dizer que não é comunista tem relação direta com o fato do editor já ter sofrido diversos atos de censura sobre os seus livros. É uma forma de tentar se salvaguardar de novas investidas, até porque, nesse momento, tem início uma mudança de conjuntura, do entusiasmo após a vitória dos Aliados na Guerra, para o início da tensão da Guerra Fria. Em solo nacional esse novo momento já começava a se expressar através do governo abertamente anticomunista do General Dutra.

No ano de 1946, o editor ainda é citado em uma nota assinada por diversos intelectuais e publicada pelo jornal sobre uma visita do embaixador russo ao Brasil, por conta do reatamento de relações diplomáticas entre os dois países. É desse ano também as primeiras propagandas de uma outra revista editada por ele e S. O. Hersen, a Divulgação Marxista. Como o nome sugere, a revista focava o seu conteúdo em artigos dos teóricos do marxismo-leninismo como Lênin e Stalin, textos sobre a realidade soviética e a história do socialismo, comentários acerca da obra de Marx e críticas a economia capitalista, com tiragem de duas edições por mês. Além de textos do próprio Calvino, a revista, que ainda circulava em 1947, trouxe contribuições de diversos autores soviéticos, e na sua edição de número 12 um artigo de Caio Prado Jr. sobre a exploração de jazidas no Brasil Colonial.

Em 1947, é publicada uma nota a respeito de um jantar em homenagem ao escritor Aníbal Machado promovido pela ABDE (Associação Brasileira de Escritores), na qual o nome de Calvino Filho aparece ao lado de inúmeros intelectuais, muitos deles membros do PCB, como Cândido Portinari, Carlos Drummond de Andrade e Jorge Amado. No texto aparece que o editor estaria acompanhado pela sua “senhora”, o que mostra que nesse momento ele era casado. Além disso, fica claro mais uma vez como Calvino Filho fazia parte de importantes círculos intelectuais e era próximo de suas entidades, como a ABI e a ABDE.

A partir de 1948, após o PCB cair novamente na ilegalidade e ter os seus representantes no Congresso cassados, a Editorial Calvino também desaparece, fazendo com que o editor Calvino Filho mudasse o foco da sua atividade profissional, tornando-se corretor de Artes Plásticas, pelo menos momentaneamente. É desse ano diversos anúncios sobre as “Exposições Calvino”, ocorridas na Galeria Calvino, especializada na venda de pinturas. Em uma propaganda do dia 6 de agosto desse ano é anunciada uma “exposição e venda de pinturas” a ser realizada no Instituto dos Arquitetos do Brasil, no centro do Rio de Janeiro. Fazem parte da exposição pinturas de Cândido Portinari, José Pancetti, Oswaldo Teixeira, Raul Deveza, Quirino Campofiorito, Sinhá D'Amora, Jordão de Oliveira, Edith Behring, Eugênio Sigaud, Joaquim Tenreiro, Bustamante Sá, Djanira Motta, entre outros. O anúncio ainda traz um complemento que diz:

Calvino Filho aceita encomendas de qualquer gênero de pinturas, pois representa grande número de artistas brasileiros, de todas as escolas, com renome local, nacional e internacional, dos quais também vende as telas já prontas, facilitando o pagamento a quem desejar. (…)

Retratos de qualquer gênero, desde o “a carvão” até o “a óleo”, poderão também ser pintados à base de uma simples fotografia, donde o artista com sua excepcional sensibilidade, destacará os detalhes marcantes da personalidade do retratado.

Em outros anúncios da galeria, além de se reafirmar sempre que Calvino Filho trabalha apenas com “boa pintura” com preços que variam “de trezentos a muitos milhares de cruzeiros”, o requinte e bom gosto em se presentear com pinturas, entre outras formas de propaganda, um detalhe chama a atenção ao final dos anúncios com os dizeres: “aceitam-se encomendas de livros e revistas estrangeiras”, o que mostra que o editor comunista não largou por completo o ramo dos livros, mantendo ainda algum grau de atividade nesse sentido.

Anos 1950: Desfecho de uma vida militante

Nos anos 1950, a presença de Calvino Filho se torna bastante pontual nos jornais, principalmente no Diário da Noite. Em 1951, seu nome aparece em uma reportagem sobre o Movimento Brasileiro dos Partidários da Paz, uma frente ampla da qual participavam os comunistas, agora na clandestinidade, que reivindicava o fim da Guerra da Coréia. Quanto a sua atividade como editor, essa continuou como pode ser visto em um telegrama recebido por ele da Associação Soviética Livro Internacional, datado de 21 de agosto de 1952, no qual consta o seguinte conteúdo:

AO SR. CALVINO FILHO

Em resposta à sua carta de 22 de julho deste ano, comunicamos que estaremos lhes enviando as Obras de V. I. Lenin e I. V. Stalin.

Dos escritos de K. Marx e F. Engels, propomos publicar as “Obras escolhidas em dois tomos”, bem como trabalhos à parte.

Pedimos que efetue o pagamento das quantias referentes aos livros recebidos por meio da firma “Ediciones Pueblos Unidos”.

Atenciosamente, O ESCRITÓRIO DE EXPORTAÇÃO

Logo, fica claro que Calvino Filho permaneceu em atividade no ramo editorial e na edição de livros marxistas, ainda que a Editorial Calvino já não existisse mais.

No dia 13 de dezembro de 1954 sai no Diário da Noite uma convocação para o Primeiro Congresso Nacional de Intelectuais, seguido de uma lista com o nome de centenas de intelectuais. Calvino Filho faz parte do grupo do Distrito Federal, ao lado de nomes como Astrojildo Pereira, Alina Paim, Dias Gomes, Ênio Silveira, Jorge Amado, Oscar Niemeyer, entre outros. Diz a convocação:

O Brasil possui um patrimônio cultural que se criou e vem se enriquecendo no decurso de toda sua história, e que representa valiosa contribuição ao tesouro comum da cultura universal.

Nos mais diversos ramos da nossa cultura verificamos peculiaridades nacionais que bem revelam as virtudes criadoras do povo brasileiro. No entanto, os intelectuais brasileiros estão convencidos de que é necessário e urgente um esforço conjunto afim de preservar o caráter nacional de nossa cultura, vencer as barreiras que hoje mais do que nunca se opõem ao seu livre desenvolvimento e permitir que se estabeleça o mais amplo intercâmbio cultural com todos os países, em benefício da cultura de toda humanidade.

É certo também que os intelectuais brasileiros não tiveram até aqui oportunidade de promover e manter contatos permanentes entre as suas diversas categorias profissionais, e compreendem que daí decorre a maior parte dos obstáculos à execução de medidas comuns em defesa de seus interesses éticos e profissionais.

Essas considerações nos levam a propor a realização de um CONGRESSO NACIONAL DE INTELECTUAIS em que se reúnam poetas, escritores, artistas, cientistas, educadores, cineastas, jornalistas, juristas, pesquisadores, editores, profissionais liberais, técnicos, universitários, musicistas, radialistas, etc., com o propósito de examinar tais problemas e encontrar medidas capazes de solucioná-los, num ambiente de paz e entendimento entre os povos. 54

Essa foi a última aparição do nome do editor no Diário da Noite referente as suas atividades profissionais, seja como jornalista ou editor. No caso da imprensa do partido, o editor ainda terá algumas aparições. A primeira delas em 27 de março de 1956 na Imprensa Popular, quando da adesão de novos membros para a Comissão Nacional de Anistia, após a sua seção solene de criação no auditório da ABI. A nota na primeira página do jornal comemorava a adesão do editor Calvino Filho e do radialista Mário Lago, entre outras figuras do mundo intelectual. Segundo o jornal, essa comissão tinha como objetivo “a pacificação da família brasileira”, marcada pela perseguição aos comunistas no contexto da Guerra Fria.

Nas páginas da Imprensa Popular, jornal do PCB, Calvino ainda marca presença com duas contribuições para a “Tribuna de Debates”. Aqui é importante destacar que essa é a principal evidência de que o editor era de fato membro do partido, já que tratava-se de sessão exclusiva na imprensa partidária para membros partidários realizarem os debates políticos e teóricos que estavam colocados naquele momento. Vale ressaltar que o fato do editor sempre ressaltar sua oposição aos trotskistas em seus textos também ser um grande indício da sua filiação ao PCB. Às vésperas do IV Congresso o PCB abriu a sessão “Tribuna do IV Congresso” no jornal A Voz Operária em 195455, e também após o XX Congresso do PCUS, principalmente nos anos de 1957 e 1958.56

O primeiro artigo intitula-se “Inteliguêntsia” Marxista e foi publicado no dia 29 de janeiro de 1957. Nele, o editor dialoga com Agildo Barata acerca da questão da superação da divisão de trabalho manuel e trabalho intelectual dentro da concepção marxista. Ele discorre a respeito da forma como Barata utilizou esse termo em um artigo, dando a entender que a “inteliguêntsia” seria uma ala fundamental do partido. Fica claro no decorrer do artigo como essa discussão está inserida na questão mais ampla do impacto do XX Congresso do PCUS no PCB. Diz Calvino:

Como devemos entender a formulação “inteliguêntsia” marxista? Que por extensão, no movimento operário mundial, no seio dos partidos comunistas, que a todos iguala na situação objetiva de revolucionários, diz-se que constituem a “inteliguêntsia” marxista quantos, independentemente da situação social ou posição na produção, elevam a sua consciência revolucionária à luz do marxismo-leninismo.

Nos partidos comunistas de estados não socialistas, portando, a distinção entre os indivíduos independentemente de sua situação de classe e de grau cultural, intelectuais ou não, faz-se através da elevação que alcançam do nível ideológico marxista-leninista, donde caber a essa camada chamada “inteliguêntsia” marxista, em grande parte, a tarefa de contribuir para a teorização dos fatos e realidades e a sua inculcação às amplas massas partidárias e sem partido, sobre a base da propaganda e divulgação das ideias, dos princípios marxistas-leninistas, que precisam impregnar a consciência das massas, se se deseja que venham a ser as ideias dominantes.

É justamente por isso que nos CC se encontram operários, camponeses, militares, intelectuais, etc., constituindo o grupo principal da “inteliguêntsia” marxista do partido.57

Aqui o editor define o que seria a “inteliguêntsia marxista” dentro do partido. Essa seria a ala de militantes, operários e intelectuais, que tendo um entendimento mais aprofundado acerca das diretrizes do marxismo-leninismo, teriam a tarefa de fazer chegar essas ideias a toda massa proletária, através do trabalho de agitprop. Ele deixa claro que, o que faz um militante, parte dessa “inteliguêntsia”, não é a sua origem de classe, mas sim o seu nível de compreensão da doutrina marxista-leninista. Ainda sobre essa questão, argumenta Calvino:

Todavia, por mais sábio e abnegado que seja o dirigente, se isolar das massas, afastar-se da realidade, jamais poderá ser um dirigente completo, à altura das necessidades do movimento proletário. Poderá vir a ser até mesmo um excelente burocrata, mas nunca um dirigente comunista.

Ninguém, seja quem for, dirigente ou não, que se isola num gabinete, ainda que repleto de valiosos livros dos clássicos do marxismo e do quanto se publique no mundo, com perfeito serviço de informações, nunca poderá interpretar acertadamente a realidade social e a vida que é o movimento das massas expresso nas suas lutas econômicas e políticas.

Somente em contato permanente com as massas, ensinando-as e principalmente aprendendo com elas, os dirigentes e o ideólogo socialista poderão fundir a teoria com a prática, tornando-se dessa forma verdadeiros guias mestres das massas trabalhadoras.

Os movimentos das massas que são a sua vida, sem dúvida, são o caldo da cultura, o meio adequado, em que se desenvolvem plenamente os dirigentes e ideólogos socialistas. Fora desse meio ótimo, é a estagnação, decomposição e morte.58

Nesse trecho o editor deixa claro que a “inteliguêntsia” e os dirigentes comunistas não podem se ater apenas a teoria marxista, deixando a prática militante de lado. Ele diz com todas as letras que um dirigente que não participa ativamente do movimento dos trabalhadores é um burocrata e não um líder comunista. Ele ainda enfatiza que são esses movimentos o “meio adequado” e o “caldo de cultura” que de fato forjam as lideranças, e que mais do que ensinar, é preciso aprender com os trabalhadores. Essa é uma crítica bastante presente nesse momento de debates acerca dos erros e equívocos do PCB pós-XX Congresso do PCUS, no qual o burocratismo e o engessamento da liderança partidária são duramente criticadas. Nessa linha vem a ideia de uma direção que não apenas ensine aos trabalhadores de forma unilateral, mas que, ao invés disso, mantenha uma relação dialética de ensinar e aprender com as massas proletárias.

Calvino continua seu texto dizendo que os dirigentes do partido estavam saindo de suas “redomas de vidro”, mudança de comportamento causada por conta do relatório secreto de Krushev revelado no XX Congresso do PCUS. Por esse motivo, eles deveriam continuar sendo apoiados pela classe trabalhadora e todos os membros da “inteliguêntsia” marxista brasileira, inclusive para não cometerem os mesmos erros do passado. Era preciso acreditar nos dirigentes como “fraternais guias e mestres capazes”. O editor ainda concorda com Agildo Barata quando esse afirma que o caminho para o socialismo no Brasil deverá ser “descoberto” pela intelectualidade marxista. Segundo ele:

(...) as nossas massas trabalhadoras, em geral, por culpa consciente da classe dominante, são incultas. Os indivíduos alfabetizados, na sua generalidade, não possuem cultura senão primária. Poucos são os que lograram frequentar um curso secundário.

Somente especialistas, homens de grande cultura, poderão dar-nos um quadro tão perfeito quão possível da realidade brasileira. Esses especialistas, intelectuais, são indispensáveis no cumprimento dessa tarefa. Até aqui, no campo capitalista, a cultura é privilégio da burguesia, que a nega criminosamente aos trabalhadores, tornando-a inacessível para eles, simples máquinas que são de produzir mais-valia.59

Dessa forma, ainda que o editor defenda que a origem de classe não impeça alguém de fazer parte da “inteliguêntsia” do partido, ele demonstra que por uma questão de desigualdade social essa função acabe hegemonizada pelos intelectuais em detrimento dos operários. Por conta dessa situação, para Calvino Filho, a compreensão do materialismo histórico não estaria ao alcance de todos. Ele faz um paralelo entre um médico e um intelectual marxista, dizendo que assim como o primeiro possui conhecimentos específicos para o diagnóstico dos pacientes, o segundo também o teria, mas nesse caso seriam conhecimentos para a interpretação correta da realidade concreta, sendo o marxista um “médico da sociedade”. Assim como os médicos lutariam contra os “charlatões” e “curandeiros” que tentariam enganar os pacientes, os marxistas deveriam lutar contra os mal intencionados do campo da sociologia, que seriam os social-democratas, os anarquistas, os fascistas, etc. E continua:

É no seio dos partidos comunistas (vanguardas proletárias) que se encontram os marxistas. Isto, contudo, não significa que todos os comunistas sejam marxistas. Basta aos comunistas aceitarem e defenderem tão consequentemente quanto possível, os princípios marxistas, na prática.

São marxistas no seio dos partidos comunistas os intelectuais revolucionários –Lênin é o exemplo mais alto– que estudaram profundamente o marxismo e consequentemente defendem, na sociedade, o ponto de vista do proletariado, da classe única verdadeiramente revolucionária, cuja missão histórica de coveiro do capitalismo ninguém mais discute nos tempos atuais. Da mesma forma são marxistas os poucos trabalhadores em geral, os assalariados, que se elevaram à custa de sacrifícios incríveis pelo estudo sacrificado à compreensão superior das leis e princípios marxistas.

Ser marxista, portanto, não é privilégio dos intelectuais, diplomados ou não, tampouco dos operários, mas dos que dedicaram o melhor tempo de sua vida ao estudo do marxismo. Os exemplos de Engels e Stalin são decisivos.60

Calvino Filho faz uma diferenciação entre “marxistas” e “não-marxistas” dentro do partido. Os “marxistas” seriam aqueles que teriam um entendimento mais completo acerca do marxismo, que seriam os “intelectuais revolucionários”, que justamente por terem essa compreensão teórica seriam os líderes partidários, a “vanguarda proletária”. Ele cita como grandes exemplos nesse sentido Lênin, Engels e Stalin. Em relação aos “não-marxistas”, fica subentendido que seriam aqueles militantes focados nas questões práticas da militância, voltados ao cumprimento da linha e das tarefas partidárias. O editor conclui afirmando serem os intelectuais revolucionários irmãos de luta dos trabalhadores manuais:

A condição de existência dos intelectuais revolucionários é a presença de uma classe revolucionária, no presente, do proletariado. A condição de emancipação do proletariado inclui a existência de intelectuais revolucionários. Somente unidos –proletários e intelectuais revolucionários– realizarão a transformação da sociedade em que vivemos em socialista. (…) Não há, portanto, porque não acompanhá-los na luta contra os inimigos do Partido e criar malquerenças entre intelectuais revolucionários e operários, que precisam e devem constituir um bloco monolítico, à base de uma unidade consciente.61

Para ele, a existência dos intelectuais revolucionários, da “vanguarda proletária”, é condicionada a existência da classe proletária, que necessitaria dos intelectuais para cumprir a sua função histórica de classe revolucionária. Mais uma vez, fica evidente uma relação dialética proposta por Calvino, dessa vez entre os intelectuais revolucionários e a massa proletária, que em unidade deveriam avançar na luta.

Por fim, o outro artigo de Calvino Filho na “Tribuna dos Debates” é publicado no dia 8 de fevereiro de 1957. Nesse segundo texto, intitulado Grave Infração de Princípio, o editor polemiza sobre um artigo de Carlos Marighella chamado O artigo de Prestes e o Internacionalismo Proletário. Calvino afirma esperar se tratar de “um lapso e não de convicção revolucionária” de uma figura tão fiel ao partido como Marighella. O editor critica a seguinte declaração do dirigente comunista: “Nossa maior autocrítica deve ser por não termos ainda tornado vitoriosa a luta para levar ao poder o proletariado e as demais classes revolucionárias, cuja frente única torna imprescindível constituir agora afim de assegurar no futuro a transição ao socialismo”. 62 Afirma Calvino sobre esse trecho:

No Brasil, a direção do PC, antes ou agora, deixou de realizar a revolução, de tomar o poder, unicamente por culpa da sua incapacidade dirigente? Ou melhor, para que se realize a revolução, a tomada do poder, basta apenas o desejo da direção do PC, inda que imensa seja a sua sabedoria ou nele exista um gênio incomparável como Lênin? Para que uma revolução ou tomada do poder se efetive, não são necessárias para que se realize todo um conjunto de condições objetivas e subjetivas? Ou basta apenas que exista um PC completamente capaz de realizar a revolução, a tomada do Poder? As revoluções não são o resultado necessário, sujeito a leis universais e particularidades nacionais do desenvolvimento da sociedade de classes, da luta de classes? 63

O editor critica o posicionamento de Marighella por esse não seguir a “teoria da Revolução” encontrada nos preceitos da doutrina marxista-leninista, dando a entender que o processo revolucionário aconteceria por mera vontade da direção partidária, ignorando outros fatores. E complementa:

O artigo de Marighella, e estamos nisso persuadidos, não ajuda os comunistas de baixo nível ideológico a compreenderem princípios fundamentais do marxismo-leninismo, tais como a “teoria da revolução” e o “internacionalismo proletário”. Pelo contrário. Cremos até que levará ao erro e a confusão abnegados quadros partidários e sem partido, que, infelizmente em geral, são de baixíssimo nível ideológico e político para cuja elevação todo esforço será pequeno e nenhum, sério e inteligente, até agora, foi realizado. Salvo o presente debate consequente ao XX Congresso do PCUS.64

Para Calvino, o posicionamento de Carlos Marighella não é apenas equivocado, mas estaria “deseducando” as massas proletárias, inclusive quadros do partido. Para ele, o artigo do dirigente comunista atrapalha na formação ideológica dos quadros, afirmando ainda que os esforços nesse sentido por parte do partido ainda são pífios, tendo início alguma mudança nesse sentido só após o XX Congresso do PCUS. O editor segue citando vários trechos de obras de Marx e Lênin para corroborar o seu posicionamento, e continua:

Poderíamos alongar-nos com dezenas de outras citações dos clássicos do marxismo, inclusive com algumas notáveis de Stalin sobre o papel e a missão do partido, todavia julgamos que o leitor de mais não precisa para reconhecer a violação de princípio marxistaleninista, que encerra a afirmação de Marighella.65

Para o editor, a afirmação do dirigente comunista não se trata apenas de divergência teórica, mas vai além, tratando-se de “violação de princípio”, tirando a crítica do campo teórico-político e trazendo para o campo moral, como se a afirmação fosse um desvio de conduta. É interessante notar como Calvino ainda utiliza a figura de Stalin como grande exemplo teórico, já que a figura do líder da URSS vinha sofrendo grande desgaste no mundo todo desde a divulgação do relatório Krushev. Nessa linha de raciocínio continua Calvino a sua crítica:

O açodamento pequeno-burguês e as muitas ideias sobre a revolução, a muitos criminosamente tem levado a substituir “as armas da crítica pela crítica das armas” (Marx). Mas isso se manifesta como aventureirismo, incompatível com um verdadeiro dirigente comunista. Esse aventureirismo, entre nós, já custou sangue e sofrimentos sem conta, em 1935...

E até agora, infelizmente, a direção do PCB tem procurado encobrir o erro de 1935, mascarando-o de diversas formas. Resultado, um intelectual revolucionário do porte de Marighella continua a alimentar e a propagar falsas ideias sobre a teoria da revolução, o que levará, consequentemente, como dirigente, a contribuir na repetição de velhos erros.66

O editor aqui, indiretamente, acusa as ideias defendidas por Marighella de “pequenoburguesas”, e diretamente acusa o dirigente de “aventureirismo” ao conclamar uma tática de ação direta que já havia sido derrotada em 1935, trazendo grandes prejuízos ao partido. A crítica de Calvino se estende para a direção do partido, que segundo ele, até aquele momento ainda não havia feito a necessária autocrítica da via armada para a Revolução, que para ele só poderia levar a novos equívocos no futuro. E termina afirmando: “É preciso, portanto, que Marighella, em face da sua imensa responsabilidade como dirigente comunista e de intelectual revolucionário, reestude a teoria da revolução e o papel do Partido, a fim de fazer a autocrítica da sua autocrítica citada, com que muito lucrarão, sem dúvida, as massas partidárias e as sem partido”. 67

Calvino termina sugerindo a Carlos Marighella que esse retorne aos estudos teóricos acerca da teoria revolucionária defendida pelo marxismo-leninismo, e faça uma “autocrítica de sua autocrítica”, rechaçando o posicionamento defendido em seu artigo. É interessante notar que nesse momento de mudanças pós-XX Congresso do PCUS nem mesmo a doutrina marxista-leninista é mais unânime dentro do partido, o que fica bastante claro nessa divergência entre Marighella e Calvino, o que já é um indício dos “rachas” pelos quais passará o partido nos anos seguintes. Vale notar ainda que o editor permaneceu fiel às diretrizes partidárias anteriores a 1956, ainda que também apresente algumas críticas quanto ao distanciamento da direção do partido em relação às massas proletárias.

Enfim, a última notícia referente a José Calvino Filho na imprensa, mais uma vez no Diário da Noite, é de 24 de junho de 1959, sobre o falecimento do editor. Na coluna intitulada “Teatro de Sombras” de autoria do escritor Abguar Bastos, consta a seguinte nota: “Os professores da Faculdade de Medicina recusaram-se a aceitar, para estudos e dissecação entre os alunos, o corpo do médico e editor José Calvino Filho, que assim o dispusera como última vontade. Amigos do extinto providenciaram seu imediato enterramento”. 68

Sendo assim, o editor Calvino Filho não teve a sua última vontade atendida, o que não é difícil imaginar que tenha relação com o fato do mesmo ser publicamente um militante comunista, lembrando que nesse momento uma segunda onda anticomunista começa a se fortalecer no país.69 Até onde foi possível apurar, o editor não estava casado no momento do seu falecimento e nem deixou herdeiros.

Por fim, podemos afirmar que o editor José Calvino Filho teve uma vida dedicada aos livros e a intensa atividade nos meios intelectuais, unindo as duas frentes na sua militância comunista. Essa militância tem início com clareza nos anos 1930, com sua primeira experiência editorial, o início de suas colunas no Diário da Noite, e as várias repressões sofridas por parte da polícia política do Estado Novo. Conhece o seu auge enquanto editor e intelectual nos anos 1940, pegando carona na reestruturação, e depois legalidade do PCB, que naqueles anos conhece o seu momento de maior popularidade devido ao papel decisivo da URSS na derrota do nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial. Continua editando e participando da vida intelectual do partido até os anos 1950, e morre sem romper com o partido, ainda fiel as diretrizes teóricas do marxismo-leninismo. Uma vida militante que nos dá pistas do que significava ser um editor comunista no Brasil em um período tão conturbado para a história mundial, do movimento comunista e do próprio país.

Material suplementar
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Notas
Notas
2 Marisa Midori Deaecto, op. cit., p. 15.
3 Edgard Carone, op. cit., p. 39.
4 João Quartim de Moraes, “A Influência do Leninismo de Stálin no Comunismo Brasileiro”, In: João Quartim de Moraes, Daniel Aarão Reis (orgs.), História do Marxismo no Brasil, volume 1, Editora Unicamp, Campinas, 2007, p. 134.
6 Edgard Carone, op. cit., p. 62.
7 Edgard Carone, op.cit., p. 67.
8 Como afirma Edgard Carone em seu livro O PCB (1943-1964), Editora Difel, São Paulo, 1982: “O súbito arrebatamento do movimento provoca reação das classes dirigentes que, neste momento pós-guerra, ficam impedidas de negar o papel do PCB e o esforço da URSS no conflito europeu. A época de intolerância e incompreensão parecia distante e tudo levava a crer que dentro do atual sistema democrático brasileiro houvesse lugar para a participação da esquerda comunista. Ainda mais, o esforço da CNOP e, a partir de 1945, a própria posição oficial do partido demonstrou que sempre realçaram o papel da burguesia nacional, mostrando que o país deveria desenvolver-se sem grandes convulsões. Esta política, denominada de Coexistência Pacífica, marca a posição do partido desde 1943, momento em que, no plano internacional, Stalin dissolve a III Internacional, gesto de boa vontade com os seus aliados de guerra.”. p. 5.
9 Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.6, 22 out. 1943.
11 Ana Paula Palamarchuk. op. cit. p. 140.
12 Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.3, 19 abr. 1934
14 Rodrigo Patto Sá Motta. Em Guarda Contra o Perigo Vermelho: O Anticomunismo no Brasil (1917-1964). Tese de Doutorado. FFLCH/USP, 2000. p. 7.
16 Ana Paula Palamartchuk. op.cit., p. 276.
18 Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.6, 17 out.1933.
19 Calvino Filho. “A Prevaricação do Sr. Anísio S. Teixeira”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.2, 04 nov.1933.
20 Calvino Filho. “Como Baratear a Vida?”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.2, 09 dez. 1939.
21 Calvino Filho. “O Livro é a Arma que o Gênio Humano Criou para Destruir a Mentira.”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.3, 28 set. 1942.
22 Disponível em: https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/biografias/cassiano_ricardo. Acessado em 08 set. 2017.
23 Pe.Arlindo Vieira. “John Dewey e a Rússia”. A Manhã, Rio de Janeiro, p.2, 30 mai. 1943.
24 Calvino Filho. “Direito de Resposta (Contestando o Artigo do Padre Arlindo Vieira Publicano na “A Manhã” de Domingo)”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.3, 2 jun. 1943.
25 Lúcio José dos Santos. “Em torno do 'Poder Soviético' do Deão de Canterbury”. A Manhã, Rio de Janeiro, p.3, 31 out. 1943.
26 Calvino Filho. “O Poder Soviético do Deão de Canterbury e a Crítica Feita pelo Notável Integral-Católico Lúcio José dos Santos.”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.2, 5 nov. 1943.
27 Calvino Filho. “O Poder Soviético do Deão de Canterbury e a Crítica Feita pelo Notável Integral-Católico Lúcio José dos Santos.”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.2, 5 nov. 1943.
28 Calvino Filho. “O Poder Soviético do Deão de Canterbury e a Crítica Feita pelo Notável Integral-Católico Lúcio José dos Santos.”. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.2, 5 nov. 1943.
29 Calvino Filho. op. cit., p. 2.
30 Calvino Filho. op. cit., p. 2.
31 Edmundo Moniz. “A Tradução do 'Staline' de Ludwig”. Carioca, Rio de Janeiro, p.8, 1943.
32 Calvino Filho. “'Stalin', de Emil Ludwig, Não Foi Deturpado em sua Tradução”. Diário da Noite, p. 5, 01 out. 1943.
33 Calvino Filho. op.cit. p.5.
34 Calvino Filho. “'Stalin', de Emil Ludwig, Não Foi Deturpado em sua Tradução”. Diário da Noite, p. 5, 01 out. 1943.
35 Calvino Filho. op.cit., p.5.
36 Calvino Filho. op.cit., p.5.
37 Calvino Filho. “'Stalin', de Emil Ludwig, Não Foi Deturpado em sua Tradução”. Diário da Noite, p. 5, 01 out. 1943.
39 Diário da Noite, p.2, 19 mai. 1944.
40 Calvino Filho. “A Verdade Sobre a Rússia Através dos Livros da Editorial Calvino e as Acusações do Sr. Ary Maurell Lobo”. Diário da Noite, p.3, 23 mai. 1944.
41 Calvino Filho. “A Verdade Sobre a Rússia Através dos Livros da Editorial Calvino e as Acusações do Sr. Ary Maurell Lobo”. Diário da Noite, p.3, 23 mai. 1944.
42 Calvino Filho. “A Verdade Sobre a Rússia Através dos Livros da Editorial Calvino e as Acusações do Sr. Ary Maurell Lobo”. Diário da Noite, p.3, 23 mai. 1944.
43 Calvino Filho. “Responde a Frei Mansueto o Editor Calvino Filho”. Diário da Noite, p.3, 16 jun. 1944.
44 Calvino Filho. op. cit. p. 3.
45 Rodrigo Patto Sá Motta. Em Guarda Contra o Perigo Vermelho: O Anticomunismo no Brasil (1917-1964). Tese de Doutorado. FFLCH/USP, 2000. p. 42.
46 Calvino Filho. “Responde a Frei Mansueto o Editor Calvino Filho”. Diário da Noite, p.3, 16 jun. 1944.
47 Diário da Noite, p.2, 10 mar. 1945.
48 Calvino Filho. “Carta Aberta ao Sr. Viriato Vargas”. Diário da Noite, p.2, 17 mar. 1945.
49 Calvino Filho. op.cit. p.2.
50 Calvino Filho. “Carta Aberta ao Sr. Viriato Vargas”. Diário da Noite, p.2, 17 mar. 1945.
51 Calvino Filho. “Qual a Razão da Atitude de Prestes?”. Tribuna Popular, p.6, 23 mar. 1946.
52 Calvino Filho. “Qual a Razão da Atitude de Prestes?”. Tribuna Popular, p.6, 23 mar. 1946.
53 Calvino Filho. op.cit., p.6.
54 Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.6, 13 dez. 1954.
57 Calvino Filho. “Inteliguêntsia Marxista”. Imprensa Popular, p.2, 29 jan. 1957.
58 Calvino Filho. “Inteliguêntsia Marxista”. Imprensa Popular, p.2, 29 jan. 1957.
59 Calvino Filho. op.cit. p.2.
60 Calvino Filho. “Inteliguêntsia Marxista”. Imprensa Popular, p.2, 29 jan. 1957.
61 Calvino Filho. “Inteliguêntsia Marxista”. op.cit., p.2.
62 Calvino Filho. “Grave Infração de Princípio”. Imprensa Popular, p.2, 08 fev. 1957.
63 Calvino Filho. “Grave Infração de Princípio”. op.cit., p.2.
64 Calvino Filho. op.cit., p. 2.
65 Calvino Filho. op.cit., p. 2.
66 Calvino Filho. op.cit., p.2.
67 Calvino Filho. op. cit. p.2.
68 Diário da Noite, Rio de Janeiro, p.4, 24 jun. 1959.
69 Rodrigo Patto Sá Motta. Em Guarda Contra o Perigo Vermelho: O Anticomunismo no Brasil (1917-1964). Tese de Doutorado. FFLCH/USP, 2000. p. 293.
Autor notes
* Brasil. Mestre e Doutorando pelo programa de pós-graduação em História Econômica da FFLCH/USP. https://usp-br.academia.edu/Vin%C3%ADciusJuberte vinicius.juberte@usp.br
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