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Posse privada de livros, práticas de leitura e cultura jurídica na São Paulo Oitocentista. A biblioteca da João Theodoro Xavier
Private book possession, reading habits and legal culture in the nineteenth-century Sao Paulo: the library of João Theodoro Xavier
Amoxtli, núm. 1, pp. 82-96, 2018
Universidad Finis Terrae

Artículos


Recepção: 30 Agosto 2018

Aprovação: 27 Setembro 2018

DOI: 10.5281/zenodo.1435207

Resumo: A formação de um público leitor mais consistente e do mercado livreiro em São Paulo, durante o século XIX, foram inaugurados com a instalação da Academia de Direito, em 1827. Criada com o objetivo explícito de formar as elites dirigentes e burocráticas do novo país, a Faculdade foi palco de intensos debates intelectuais e políticos que, de alguma forma, ilustravam bem as tensões e disputas em torno dos projetos para o novo Estado nacional e, alguns anos mais tarde, para a República brasileira. Seus professores e alunos formavam, majoritariamente, o público leitor da pequena cidade – fato indicado pela análise das bibliotecas privadas presentes nos inventários post-mortem do período. João Theodoro Xavier foi aluno e professor da Academia de Direito de São Paulo, ocupou cargos públicos, atuou no Legislativo e foi presidente dessa Província entre 1872-1875. Como Lente Catedrático, ele redigiu um compêndio de Direito Natural para servir de base para o ensino da disciplina, no qual, mais do que estabelecer as bases que deveriam reger o Direito, o autor formulou suas concepções sobre a sociedade, posicionando-se nos debates e inquietações do período. A análise desse documento, junto com o exame de sua biblioteca particular e de sua atuação como governante da Província, possibilitou a compreensão da dinâmica da posse privada de livros através dos inventários post-mortem e dos mecanismos de leitura e apropriação de textos.

Palavras-chave: História dos livros, inventários post-mortem, São Paulo, posse privada de livros, cultura jurídica.

Abstract: The formation of a solid reading public and book market in Sao Paulo in the nineteenth century started with the establishment of the Law School in 1827. The Law School was created in order to form the ruling and bureaucratic elites of the new country. The School has held highly intelectual and political debates that, somehow, illustrated the tensions and disputes among different projects for the new national State, that some years later would be the Brazilian Republic. The School's professors and students were the majority of the reading public in the little city of Sao Paulo, which is indicated by the analysis of private libraries in the post-mortem inventories of that period. João Theodoro Xavier was a student and a professor in the Law School of Sao Paulo. He hold public offices, took part in the Legislative Power and was president of Sao Paulo Province between 1872 and 1875. As professor, he wrote a Compendium about Natural Rights to set the general guidelines for the Law course, but more than that in this book he expressed his understanding of society, taking part in the debates and questions that rose around that time. The analysis of the Compendium, of his private library and of his activities in the government of Sao Paulo Province allowed the comprehension of reading habits, text apropriation and the dynamics of private book possession using the postmortem inventories.

Keywords: History of books, post-mortem inventories, private book possession, legal culture, São Paulo.

A História dos livros, da edição e das práticas de leitura já mostrou ser um caminho bastante profícuo para se compreender as dinâmicas sociais, políticas, econômicas e culturais de uma determinada época, tanto nos seus pontos específicos quanto nas imbricações entre esses campos. Contudo, justamente por se tratar de um fenômeno que tangencia múltiplos aspectos da vida social, o universo dos impressos precisa ser recortado para que se torne apreensível, sem que se perca de vista a totalidade na qual se insere.1 Destarte, entender o livro como um objeto de duplo caráter – mercadoria sujeita às condições de produção e circulação de uma determinada época, mas também um suporte material do pensamento – pressupõem que qualquer um dos aspectos que se escolha privilegiar seja analisado tendo como ponto de partida e de chegada a economia do livro no seu conjunto. 2

Considerando as três principais esferas desse universo – produção, circulação e consumo – pode-se afirmar que a última delas é a mais difícil de se apreender e a historiografia parece já ter estabelecido um consenso acerca disso. Existem fontes que permitem que tenhamos acesso a informações sobre a posse privada de livros, mas, para daí inferir o que eles significavam é necessário traçar um longo caminho, muitas vezes inatingível – afinal debruçar-se sobre as práticas de leitura passa necessariamente por tentar interpretar o obscuro domínio das ferramentas mentais dos homens do passado.3

No entanto, Henri-Jean Martin afirma que o livro – a forma mais acabada da mensagem escrita – tem como função formular tanto as ideologias oficiais quanto aquelas que se opõem a elas, e que para bem compreender essa dinâmica, é importante que o pesquisador se debruce sobre as relações que os diferentes membros de uma sociedade mantiveram com a cultura escrita, visando extrair daí as possíveis distorções entre os grupos sociais e a evolução de suas opiniões e seus gostos. Para tanto, é necessário se deslocar, pelo menos por um momento, do emissor para o receptor.4

Considerando então a necessidade, mas também as dificuldades desse deslocamento – que fazem com que seja uma tarefa árdua apreender a forma exata como os textos eram lidos e assimilados e os efeitos que essas leituras produziam nos indivíduos –, é preciso pensar em uma outra possibilidade, ou seja, buscar, ao menos, uma aproximação com a maneira como eles foram apropriados e mobilizados para determinados propósitos.5

O estudo da posse privada de livros através da análise de inventários post-mortem é um recurso utilizado na Europa e na América Latina há um certo tempo e, a despeito das limitações impostas pela natureza da fonte, esse documento notarial relativo aos processos de transmissão de bens possibilita o conhecimento, pelo menos de uma parcela, dos livros que as pessoas possuíam em suas residências, revelando questões acerca do consumo desse tipo de impressos, sem deixar de elucidar, também, aspectos relativos à produção e à circulação. Contudo, conforme mencionamos, as informações sobre a posse de livros revelam apenas alguns aspectos dessa esfera, pois como já havia indicado Daniel Mornet, entre “ter” e “ler” podem existir muitos pontos indecifráveis.6Nesse sentido, para se compreender o significado das bibliotecas particulares e o papel que elas cumpriram num determinado momento histórico, é preciso buscar outros caminhos que possam dar algum sentido a esses conjuntos de livros.

Jorge de Souza Araújo sugere uma análise que considera dois tipos de recepção, uma representada pela simples posse dos livros e outra que se refere às relações intertextuais entre os livros possuídos e a literatura local produzida no mesmo contexto.7 Num outro sentido, mas de uma forma que pode complementar essa proposição, ao buscar caminhos para a compreensão das práticas de leitura, Roger Chartier propõe que é necessário considerar, simultaneamente, o caráter rígido e autoritário do texto – devendo-se levar em conta tanto o seu conteúdo em si quanto as formas da sua transposição para um suporte material – mas, também, a autonomia do leitor, que, por sua vez, é pautada por diversos elementos, como o contexto histórico no qual se insere e as suas possibilidades intelectuais individuais.8

Assim, levando em conta essas perspectivas, nos propusemos a uma análise da posse privada de livros na cidade de São Paulo, durante a segunda metade do século XIX, na tentativa de esclarecer alguns aspectos dessas tão obscuras e movediças faces do universo livresco – o consumo e as práticas de leitura –, e suas relações com a estrutura social paulistana, bem como com as profundas transformações vivenciadas no período em questão.9 Após uma breve contextualização das condições de produção e circulação dos impressos e do conjunto das biblioteca particulares encontradas, nos dedicaremos a uma análise dos livros e da trajetória intelectual e política de João Theodoro Xavier, que foi professor da Academia de Direito de São Paulo, político e administrador público.

O consumo de livros em São Paulo (1850-1890)

São Paulo, até cerca de 1850, era uma cidade muito pequena e pouco desenvolvida em termos de urbanização. Quem olhasse para sua escassa população, para as ruas sem calçamento, para as rústicas moradias e para a quase ausência de sistemas de fornecimento de água e de esgoto, teria muita dificuldade em imaginar que essa mesma cidade se tornaria, pouco mais de um século depois, o maior centro populacional e econômico do país.

Mas esse processo, embora começasse a se acelerar na segunda metade do Oitocentos, ainda demoraria muitas décadas para se concretizar. Na verdade, São Paulo só iria desmontar definitivamente seu cenário colonial com o advento das ferrovias, no final do século XIX e começo do século XX, quando passou a incorporar os vários símbolos do progresso que os trilhos transportavam. 10

Em termos gerais, no Brasil, a ausência total de políticas educacionais, a inexistência de universidades e a proibição da instalação de tipografias, durante o período colonial, fizeram com que a cultura e, particularmente, o mundo dos livros ficasse restrito a um círculo muito pequeno de setores da elite. Com a mudança da família real, em 1808, e a independência política do país, em 1822, algumas coisas começaram lentamente a mudar, mas ainda assim, sem uma verdadeira expansão do público leitor e do mercado livreiro.

De qualquer forma, em meados do século XIX, algumas cidades se destacavam em termos populacionais, econômicos e até culturais, como Rio de Janeiro – então capital –, Salvador e Recife. Nessas cidades, já havia uma certa atividade intelectual que em nada se comparava com a estreiteza das práticas paulistanas, onde a rede de comércio de livros era praticamente inexistente até a década de 1860, quando Anatole Louis Garraux se instalou. Nessa mesma década, mais duas livrarias se instalaram, 11 mas foi só a partir de 1880 que o número de livrarias começou realmente a crescer. 12

No entanto, algumas décadas antes da explosão demográfica e da rápida urbanização, um acontecimento começou a mudar os rumos do cenário intelectual daquela pacata cidade. A criação da Academia de Direito, em 1827, foi um marco no caminho da capital rumo à “civilização ocidental” do século XIX. Ela respondia às necessidades de um Estado nacional em formação, que precisava se consolidar após a independência política, e que via na formação local dos bacharéis o caminho mais apropriado para a instrução dos quadros políticos e burocráticos. Apesar de ainda demorar alguns anos para se consolidar e se integrar de fato à cidade, 13 a Academia de Direito trouxe consigo algumas mudanças que já começaram a ser perceptíveis nos primeiros anos.

Mesmo com a ausência de uma rede de livrarias digna desse nome, o comércio de livros passou a sofrer alterações. Os anúncios do Farol Paulistano, primeiro periódico da cidade, avisavam com uma certa frequência sobre a venda deles em casas comerciais não especializadas ou na própria tipografia do jornal. Com o aparecimento de outros jornais, os anúncios se multiplicaram, revelando que, apesar de rudimentar, a venda desse tipo de impressos começava a se intensificar. Os títulos que apareciam também revelavam qual era o público que se visava: os alunos da Academia. Mas, para além deles, os anúncios dos periódicos, até a década de 1850, também procuravam atingir outros setores da sociedade, não só para a venda de livros, como para o oferecimento de cursos de alfabetização, de idiomas estrangeiros, de música e de outras atividades culturais, trazendo sempre um apelo publicitário que chamava as pessoas a se iniciarem em hábitos cultivados na civilização europeia. Embora esses últimos não tivessem relação direta com a Academia de Direito, eles demonstram o impulso dado por ela para a transformação das práticas socioculturais.14

Contudo, como já indicamos, a transformação dessas práticas foi lenta, e a presença de livros e bibliotecas nas residências, apreendida através da análise de inventários post-mortem, entre os anos de 1870-1890, revela esse movimento15. Em primeiro lugar porque os resultados são aparentemente baixos: em apenas 10% dos processos consultados havia menção a livros. No entanto, apesar de não ser uma cifra tão alta, esses dados mostram uma certa evolução quantitativa, sobretudo quando a comparamos com pesquisas relativas a outros períodos. Em um estudo realizado sobre 450 processos de inventário de São Paulo, entre os anos de 1578 e 1700, Alcântara Machado encontrou 15 processos com livros, totalizando 55 volumes. Trata-se de uma porcentagem reduzida, 3,3%, mas bastante condizente com a realidade brasileira no período, principalmente se pensarmos em São Paulo. 16

Porém, de acordo com Luiz Carlos Villalta, essa realidade se modificou no século XVIII, tanto em relação ao tamanho quanto ao conteúdo das bibliotecas. Mas essas transformações se operaram, sobretudo, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, favorecidas pelos processos de urbanização, e, também, pela importância da presença de quadros burocráticos e administrativos ligados ao Estado português. Para o Rio de Janeiro, entre 1751 e 1822, o autor encontrou uma porcentagem de 14, 7% de inventários contendo livros, enquanto a pesquisa sobre Mariana, em Minas Gerais, entre 1714 e 1822, revelou uma cifra de 8,34%.17 Se considerarmos as diferenças econômicas e sociais entre essas regiões e São Paulo, no século XIX, veremos que 10% não é um valor tão baixo, sobretudo porque no começo do século XVIII ele era praticamente um terço disso, e os 55 volumes encontrados por Alcântara Machado configuram uma taxa bastante tímida em comparação aos mais de 20 mil volumes que localizamos.

Ademais, é preciso levar em conta todas as faltas da escritura notarial, que fazem com que esses números sejam subestimados. Corroborando com essa ideia, percebemos, por exemplo, que a porcentagem de processos de inventários com livros se reduziu ao longo dos anos analisados, contrariando o evidente aumento do número de livrarias na cidade, 18 da população em geral, mas também do número de alunos da faculdade – o que nos leva a crer que os livros foram paulatinamente deixando de ser considerados nas avaliações por terem perdido seu valor proporcional em relação aos bens mais valiosos.

De todo modo, as informações encontradas nos inventários revelam alguns aspectos da posse privada de livros em São Paulo, no século XIX. Infelizmente, dos 127 processos nos quais eles aparecem, em apenas 83 encontramos a quantidade de obras descrita, totalizando os cerca de 20 mil volumes já mencionados. Classificando esses conjuntos de livros pelos seus tamanhos, vemos que as coleções pequenas e médias – com até 500 volumes – eram predominantes, representando quase 83% do total. As bibliotecas com mais de 1.000 volumes representavam apenas 7%, mas esse valor é bastante considerável se pensarmos que eram coleções particulares formadas no contexto já descrito.

Quando comparamos o tamanho das coleções com a riqueza deixada nos inventários, não conseguimos enxergar com tanta clareza uma relação direta entre eles. Contudo, mesmo que a clivagem econômica não apareça de forma tão evidente, os traços de especialização profissional da cultura livresca19 ficam bastante claros. A preponderância dos homens da lei entre os proprietários de livros é patente – eles representavam sozinhos cerca de 30% do total. Além disso, praticamente todas as coleções com mais de 500 volumes estavam concentradas nas mãos desses homens, que atuavam tanto nos domínios jurídicos quanto nos quadros administrativos e políticos do Estado. Corroborando esse fenômeno, 61% das obras identificadas eram relativas à jurisprudência.

É claro que esses dados refletem a simples presença da Academia de Direito, sobretudo porque antes dela a vida intelectual era praticamente inexistente na cidade. Mas, também, mostram que ela estava cumprindo bem a função para a qual fora criada: formar a elite política e administrativa do país. E essa formação acabava sendo ainda mais ampla, pois além dos professores e alunos que foram figuras públicas de proeminência, outros cumpriram um importante papel no desenvolvimento cultural do país: eles foram advogados, mas também foram jornalistas, poetas, teatrólogos, etc., fundaram periódicos, gabinetes de leitura e diversas associações nas mais diferentes partes do território nacional.20

A Academia de Direito era um espaço de grande efervescência. Começando com as manifestações culturais das primeiras décadas, como a música, o teatro e a literatura, ela chegou na década de 1870 como um dos palcos centrais dos debates políticos em torno do abolicionismo e do republicanismo. Dessa forma, ela refletiu as principais mudanças sociais e econômicas do Brasil, mas, também, atuou sobre elas, tanto em relação à formação dos alunos naquele ambiente quanto à sua dispersão pelo país.

Um estudo de caso: João Theodoro Xavier (1828-1878)

O período em que João Theodoro Xavier viveu na capital da Província paulista foi um momento bastante complexo da história da cidade. Apesar de ir abandonando paulatinamente os ares de pequeno burgo colonial, São Paulo não era ainda a “grande metrópole” que se tornaria no começo do século XX. Era o momento em que a economia cafeeira se espalhava gradativamente pelo interior da Província, mas ainda não era a maior economia do país, como passaria a ser a partir das décadas 1870 e 1880.21 Era também o período em que as primeiras ferrovias começam a aparecer, trazendo com elas mudanças decisivas – no plano econômico e social, mas também no plano político e cultural.22 Foi ainda, neste intervalo que vai do final da década de 1840 até o final da década de 1870, que a Academia de Direito de São Paulo se consolidou e se integrou de fato à cidade.23 Enfim, foi ao longo desses anos em que transformações importantes se operaram, em um espaço que ia aos poucos se definindo, que encontramos a figura de João Theodoro Xavier.

Personagem curioso e polêmico, João Theodoro é, também, um objeto de pesquisa privilegiado, já que sua trajetória toca em vários pontos importantes para a nossa análise: foi aluno e Lente da Faculdade de Direito, deputado provincial e presidente da Província. Além de ter deixado uma biblioteca descrita com bastante detalhe, também deixou uma série de documentos escritos, tanto como intelectual quanto como administrador.

João Teodoro Xavier de Matos nasceu em Mogi-Mirim, interior da Província de São Paulo, a 1º de maio de 1828. Em 1847, ele ingressou no Curso preparatório da faculdade e, em 1949, quase completando 21 anos, se matriculou no 1º ano do curso jurídico na Academia de Direito de São Paulo, adquirindo o título de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais em 1853. Após receber o título de bacharel, João Theodoro foi nomeado promotor público da capital e, em 1855, fiscal do Tesouro de São Paulo. Nesse mesmo ano, exerceu o cargo de Juiz do Comércio. Doutorou-se em 1856, tornandose Lente substituto da Faculdade de Direito em 1860.

Ele também foi Deputado Provincial Suplente, pelo 9º Distrito, de 1860 a 1861; Deputado Provincial, pelo 3º Distrito, por duas legislaturas, de 1862 a 1863 e de 1864 a 1865; e delegado de polícia da Capital, embora não tenhamos informações a respeito do período. Tornou-se Lente Catedrático de Direito Criminal em 1870. Em 1871, foi transferido para a cadeira de Direito Natural. Ocupou o cargo de presidente da Província de 21 de dezembro de 1872 a 29 de maio de 1875, retornando à Cátedra de Direito Natural, onde permaneceu até sua morte, em 31 de outubro de 1878.

João Theodoro faleceu aos 50 anos de idade e alguns autores indicam que ele morreu na mais extrema pobreza.24 Pelo que encontramos no seu inventário25, podemos dizer que “extrema pobreza” seja uma expressão um pouco exagerada, mas, de fato, a única riqueza que ele possuía era a sua biblioteca. Ela representava 67% do valor total de seus bens, revelando o lugar ocupado pelos livros na vida do nosso personagem. Essa importância se explica, primeiramente, pela sua profissão, e as obras encontradas mostram isso claramente. Mas, por outro lado, sua trajetória, tanto como professor quanto como político, indica que ele tinha em mente um claro “projeto de sociedade” no qual o progresso da civilização e a cultura escrita desempenhavam um enorme papel.

Os livros de João Theodoro

A biblioteca de João Theodoro era composta por 187 títulos e 603 volumes. Essa diferença discrepante se deve ao fato de quase metade dos volumes arrolados (239) serem exemplares da Theoria Transcendental do Direito, de sua própria autoria. Considerando as demais bibliotecas que encontramos ao longo da pesquisa e o tamanho delas, vemos que a de João Theodoro – excluindo os exemplares de seu livro – era uma biblioteca de tamanho médio e estava entre as mais comuns, de 101 a 500 volumes, ela contava com 364.

Infelizmente, mas fenômeno natural tratando-se da escritura notarial, a descrição dos títulos não é completa, fazendo com que algumas vezes não tenhamos conseguido identificá-los. Nos casos em que o reconhecimento foi possível, o que mais chamou a atenção foi o idioma e a nacionalidade dos autores. Das 159 obras que conseguimos identificar os títulos, 98 (62%) eram em português – e quase todas foram escritas nesse idioma mesmo26 –, 59 estavam em francês (37%) e apenas uma em inglês (menos de 1%), a Report of the Department of agrie. Dentre as 59 obras cujos títulos constavam em francês, 14 delas foram escritas por autores de origens diversas, como alemães, estadunidenses, italianos, suíços e um cubano, o que revela duas questões principais: primeiro que a cultura escrita francesa era predominante em relação aos outros países e, segundo, que mesmo a literatura não francesa era recebida em São Paulo através do filtro desse idioma.

Dos 98 títulos em português, 35 eram de autores brasileiros, 21 de autores portugueses, e, de 41 obras não conseguimos identificar o autor. A forte presença de autores brasileiros, considerando-se também a natureza das obras, mostra que João Theodoro não só lia os juristas contemporâneos e conterrâneos, como também estava bastante atento às questões administrativas e políticas do país, fato que se revela pelos vários relatórios de ministérios, formulários, legislações de diversas áreas, orçamentos, contratos, etc. Os dois livros sobre o Brasil nas exposições universais – Brasil na Exposição de 1873 – Viena e Brasil na Exposição Universal da Philadelphia 1876 – também são sintomáticos desse fenômeno.

Por outro lado, o grande número de autores portugueses reafirma a ideia da importância da cultura jurídica portuguesa para a brasileira. Mesmo que houvesse um esforço de constituição de uma cultura jurídica nacional, no qual se inseriu a própria criação das Academias de Direito, a formação dos primeiros juristas brasileiros nas faculdades portuguesas e a origem da nossa legislação não permitiam que essa influência fosse negligenciável.

Pensando nas ausências, a fraca quantidade de autores de outras nacionalidades pode ser reveladora de uma certa particularidade da biblioteca de João Theodoro. Tânia Bessone aponta que, a partir da década de 1870, o francês foi perdendo a preponderância e os textos em inglês e alemão tornaram-se mais habituais nas bibliotecas privadas do Rio de Janeiro – apesar dessa tendência se concretizar, de fato, mais no final do século.27 No livro A Filosofia no Brasil, de Silvio Romero, escrito no mesmo ano da obra de João Theodoro, vemos um grande entusiasmo pelos autores alemães e ingleses e, até, uma certa resistência aos autores franceses, como se eles estivessem carregados de doutrinas ultrapassadas.

Nesse sentido, poderíamos pensar que se existia uma certa atualidade na biblioteca, ela parecia se restringir mais às questões legislativas e administrativas e aos autores brasileiros do que em relação às “novas ideias” europeias que influenciaram uma grande parte da intelectualidade brasileira nas últimas décadas do século XIX. No entanto, é preciso ver com cautela essa ideia de atualidade. Martine Poulain afirma que ela é muito recente, e sua valorização só aparece, de fato – e principalmente para as bibliotecas públicas – no século XX, a partir de um novo consenso sobre as coleções.28

Considerando a pertinência dessa observação, buscamos examinar a “atualidade” da biblioteca de João Theodoro não pela legitimidade temporal e/ou intelectual dos seus livros, mas, primeiramente, na tentativa de mapear a presença de determinadas obras e autores, e relacioná-la com a produção e o comércio dos impressos em São Paulo, durante o século XIX. Em segundo lugar, e levando em conta os debates da própria época, gostaríamos de verificar em que medida ele estava em sintonia ou não com o discurso de Silvio Romero, e de tantos outros contemporâneos, sobre o “bando de ideias novas”29 que conquistava a cada dia mais adeptos na intelectualidade brasileira. Por outro lado, mas não menos importante, gostaríamos de compreender qual a conexão entre os livros de João Theodoro e sua atuação intelectual, tanto como autor quanto como professor, pelo prisma da relação entre a “ortodoxia dos textos” e a “diversidade das leituras”, proposta por Roger Chartier,30 e, ainda nesse sentido, o seu papel como um possível intermediário cultural.31

Sobre o primeiro aspecto – do qual já ressaltamos o predomínio dos franceses entre os autores não brasileiros e a primazia do francês como idioma estrangeiro – poderíamos inferir que o próprio comércio livreiro desempenhasse um importante papel. Como já apontamos anteriormente, uma das principais livrarias desse período era a Casa Garraux. De acordo com Marisa Midori, a preponderância das obras nos catálogos estudados, os de 1866 e de 1872, era justamente de obras em francês. Seguindo a mesma lógica da biblioteca de João Theodoro, as traduções de outros idiomas para o francês eram escassas. A partir do catálogo de 1872, começaram a aparecer obras originais em outras línguas, como inglês, alemão, espanhol, italiano, etc., mas ainda em quantidade incomparavelmente menor.32 Assim, de alguma forma os livros de João Theodoro podem corroborar a ideia da vocação da Casa Garraux como um agente difusor da literatura francesa em solo paulistano.33

Sobre as gerações dos autores das obras encontradas, conseguimos mapear os períodos de vida de 94 deles. Apenas um viveu e morreu no século XVII, Jean Domat, do qual João Theodoro tinha 4 volumes das suas obras (Oeuvres). Os autores que nasceram e morreram no século XVIII representam 9% do total, enquanto os que nasceram no final deste século e faleceram na primeira metade do século seguinte representam 17%. No entanto, a maior parte deles, 74%, pode ser considerada contemporânea de João Theodoro.

Se olharmos os títulos, percebemos claramente a predominância das obras de jurisprudência, de filosofia e de administração pública, livros que se explicam facilmente em função da profissão de João Theodoro, tanto como professor quanto como político e administrador. Mas, embora em menor quantidade, ele também possuía livros de domínios variados. As ciências naturais despertavam bastante interesse e tinham grande reputação no Brasil do século XIX. Os intelectuais das mais diversas áreas se interessavam por ela, inclusive como uma forma de se inserir nas discussões do século. João Theodoro Xavier não possuía muitas obras dessa área, mas as que apareciam estavam bem distribuídas entre os temas.

Quanto às obras de literatura, poesia, teatro etc., sua biblioteca deixava um pouco a desejar. Não podemos dizer que ele não tenha lido ou mesmo possuído livros dessa natureza, mas os que ficaram para serem inventariadas eram escassos. Pensando na hipótese levantada por Márcia Abreu de que os livros guardados seriam aqueles de utilização mais perene, como livros técnicos e ligados à profissão, em detrimento dos de belas-letras, que poderiam ter uma circulação mais fluida entre as pessoas,34 não podemos descartar a hipótese de que João Theodoro pudesse os ter possuído. Mas também, não podemos afirmá-la.

Outra ausência que chama bastante atenção na sua biblioteca é relativa às obras de referência, pois encontramos apenas o Dicionário da Língua Portuguesa, de Antonio de Moraes Silva. Considerando a enorme presença de obras em francês, a ausência de ao menos um dicionário desse idioma poderia indicar um grande domínio da língua. Mas essa questão não seria novidade, já que, para ingressar no curso jurídico, isso era uma exigência. Remarquemos, todavia, que a ausência de dicionários de outras línguas segue a mesma lógica da ausência de obras nesses idiomas.

Em compensação, a parte de obras com conteúdo histórico é bem mais considerável, com cerca de 24 títulos entre os que conseguimos identificar. Eram, sobretudo, livros de História Universal, de História do Brasil e de História da França. Essa disciplina cumpria um papel importante para João Theodoro na definição do Direito, como fica patente em seu próprio livro, dessa forma, parece natural que a sua biblioteca contasse com vários títulos desse gênero.

Em relação às obras jurídicas, consideramos em conjunto as obras de direito de todas as áreas (civil, romano, comercial, criminal, penal, etc.), legislação, filosofia, filosofia do direito, política, economia política, manuais e tratados da prática jurídica etc., encontrando cerca de 115 obras.35 Se considerarmos que sua biblioteca era composta por 187 títulos, vemos que esse último grupo representava 61,5% do total. Sobre as obras filosóficas, cabe uma explicação. Optamos por incluí-las na categoria de jurisprudência, pois muitos filósofos, sobretudo os do século XVIII, se debruçaram sobre temas que tocavam na questão da organização da sociedade, do Estado e da natureza da legislação, e tinham enorme importância nas formulações sobre o direito natural. O mesmo se aplica à economia política que, além de integrar os argumentos que embasavam o direito natural, tinha uma cadeira dedicada a ela na Academia de Direito de São Paulo.

O que podemos sublinhar é que nesse conjunto de obras jurídicas, as mais diversas áreas estão contempladas. Talvez isso se explique pelo fato de que, durante o período em que foi lente substituto, João Theodoro ministrou aulas em diversas cadeiras como Direito Civil, Direito Constitucional e Direito das Gentes e Diplomacia. Já como Lente Catedrático ministrou, além das aulas de Direito Natural, aulas de Direito Internacional. Da mesma maneira, como já mencionamos, muitas obras que aparecem se relacionam às atividades políticas e administrativas que ele exerceu. Vemos, por exemplo 20 volumes de relatórios de diversos ministérios, um livro sobre instrução pública, o Estudo Practico sobre a administração das Províncias do Brasil, do Visconde de Uruguay, o Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial de S. Paulo pelo presidente da provincia, exm. sr. dr. Sebastião José Pereira, um livro sobre o orçamento de 1874 a 1875, período em que ele próprio foi presidente da Província, e dois livros referentes a estradas de ferro: Prolongamento da Estrada de Ferro São Paulo e Contractos para a Estrada de Ferro.

Entrando, contudo, na questão das múltiplas relações entre “ter” e “ler”, a biblioteca de João Theodoro deixa suas reticências, e isso se torna bastante claro quando observamos as obras citadas por ele na Theoria Transcendental do Direito. Os textos que foram utilizados por ele com mais frequência como referência não aparecem entre os seus livros. Trata-se de uma quantidade considerável: 51 títulos e 39 autores. Em alguns casos são citadas as páginas, capítulos e volumes, demonstrando talvez que João Theodoro tivesse os livros à mão. 36 Tal situação poderia ser explicada por, pelo menos, três hipóteses: ou os livros não foram inventariados de forma completa, ou João Theodoro teria se desfeito deles antes de seu falecimento, ou, ainda, que ele utilizasse livros de alguma biblioteca ou emprestados de alguém. De qualquer forma, apenas duas afirmações são possíveis. A primeira é a de que os inventários podem deixar de fora uma parte dos bens, e a segunda, e já bem conhecida, é o fato que da mesma forma que não lemos tudo o que compramos, também lemos livros que não são nossos.37

João Theodoro e a Theoria Transcendental do Direito

A análise da obra Theoria Transcendental do Direito e, também, da trajetória política de João Theodoro – registrada em documentos de diversas naturezas – revelam aspectos interessantes acerca do fenômeno de compreensão e apropriação de ideias, assim como do processo de transmissão e “materialização” delas. Nesse sentido, procuramos analisar essas manifestações sob o prisma das transferências culturais38, pensando o papel do nosso personagem como um possível intermediário de tais transferências.39

O conceito de “intermediário cultural” ganhou fôlego a partir da organização de um colóquio intitulado Les intermédiaires culturels, pelo Centre méridional des mentalités et des cultures de l'Université d'Aix-en-Provence, em 1978. Apesar do debate ser bastante datado, sobretudo por ter como um dos centros uma certa “tipologia das culturas”40, a ideia de intermediário cultural pode ser bastante profícua para a História do livro, da edição e das práticas de leitura, justamente pela natureza do impresso e das práticas que se dão em torno dele.

Partindo de uma perspectiva alargada, e fugindo de uma definição previamente elaborada, Michel Vovelle afirma que é em termos dinâmicos que o intermediário cultural, navegante entre dois mundos, deve ser compreendido. Ele é, sobretudo, um agente da circulação. Mas sua posição não é de antemão definida. Quando esses dois mundos são, por exemplo, o universo dos dominadores e dos dominados, ele pode ser tanto um “cão de guarda” das ideologias imperantes quanto um porta-palavra das revoltas populares. Pode, também, ser um reflexo passivo dos campos de influência que confluem sobre ele, mas com o potencial para, a qualquer momento, forjar uma linguagem própria numa visão de mundo particular.41

Correias de transmissão de uma cultura, agentes de difusão do saber e, às vezes, do poder, sua posição no cruzamento entre dois mundos42 faz do intermediário cultural um objeto de observação privilegiado quando buscamos compreender os processos de contato entre duas culturas ou mais. No entanto, para se pensar esses processos, é importante retomar a proposição de Michel Espagne acerca das transferências culturais franco-alemãs.43 Na tentativa de superar as análises parciais da história comparada, que tendem a privilegiar um dos pontos do contato como sendo o “original” e o outro como uma simples imitação inadequada; mas, também, visando encontrar uma forma de pensar esses contatos em relação a realidades muito distintas uma da outra, o autor afirma que:

A pesquisa sobre as transferências procura examinar novas possibilidades de ultrapassar o quadro nacional da história cultural pelo estudo de forma quase micrológica do processo de translação de um objeto entre seu contexto de surgimento e um novo contexto de recepção. Esse exame obriga a valorizar o papel das diversas instâncias de mediação (viajantes, tradutores, livreiros, editores, bibliotecários, colecionadores etc.), bem como a incontornável transformação semântica ligada à importação. Observaremos, em particular, a transformação que uma importação cultural produz no contexto de recepção e, inversamente, o efeito positivo desse contexto de recepção sobre o sentido do objeto. E preciso combinar uma abordagem sociológica com uma abordagem hermenêutica.44

Assim, considerando essas perspectivas, gostaríamos de analisar alguns aspectos da obra de João Theodoro, a Theoria Transcendental do Direito, tentando compreender de que forma ela se relacionava com a sua biblioteca, mas também com o seu papel de professor, autor e político.

O livro foi publicado em 1876, dois anos antes de seu falecimento. Segundo o próprio autor, a principal motivação de seu livro foi a necessidade que ele via de superar as ideias propostas por Vicente Ferrer Neto Paiva, em seu Elementos de Direito Natural, de 1844, que fora redigido para o curso de Coimbra e era utilizado como compêndio na Academia de São Paulo. Assim, com o objetivo explícito de produzir o material que seria a base de aprendizado dos alunos da Academia de Direito, João Theodoro elaborou seu livro sobre direito natural.

Alguns autores afirmam que do ponto de vista teórico e mesmo da coerência interna da obra, sua qualidade era bastante questionável. De fato, ela não se tornou um clássico e acabou caindo no esquecimento porque, em relação à filosofia do Direito em si, não representou grandes avanços. Miguel Reale, por exemplo, afirma que se fossemos analisar o livro pelo prisma da filosofia, certamente “nosso juízo seria negativo, por faltar-lhe espírito crítico no exame de vários problemas, pela carência de unidade e de sequência lógica na exposição”.45

Da mesma forma, é inegável que a exposição sobre a teoria de alguns autores é um tanto superficial e, às vezes, controversa. Na verdade, muitos deles são citados, por assim dizer, de “segunda mão”, ou seja, através da análise de outros autores. De todo modo, saber se realmente suas interpretações eram superficiais, imprecisas ou, até mesmo, incorretas é menos importante para nós do que compreender de que forma João Theodoro mobilizava as ideias que embasariam a sua própria teoria do Direito, e porque não dizer, de sociedade.

De forma bem simplificada, podemos dizer que o direito natural se ocupava da tarefa de encontrar o que era “natural” no ser humano e nas sociedades que pudesse fundamentar e validar a organização social e, a partir de um determinado momento, o próprio direito positivo – ou seja, o mecanismo dessa disciplina era naturalizar determinadas relações sociais, de modo a universalizá-las e legitimá-las como bases da organização das comunidades. É nesse sentido que buscamos analisar o livro de João Theodoro Xavier. Em primeiro lugar, porque compreendemos que da sua visão sobre o direito natural, poderia ser extraída suas concepções acerca da sociedade. Mas também, e sobretudo, porque o texto, embora fosse composto por recortes de teorias de outros autores, em geral europeus, amalgamados de forma complexa, por vezes inapreensíveis – sobretudo se pretendêssemos uma análise filosófica nos moldes clássicos – revelava uma grande originalidade e coerência interna.

Como não é possível realizar uma análise exaustiva da obra nessas poucas linhas, nos deteremos apenas em um dos pontos discutidos por João Theodoro, o qual acreditamos ser bastante representativo tanto da relação entre a posse privada de livros e os mecanismos de apropriação de ideias quanto das disputas políticas geradas pelas intensas transformações operadas nas esferas local e internacional do período.

Um dos principais debates do século XIX foi, sem dúvida, aquele relacionado às questões sociais. O desenvolvimento do capitalismo com suas promessas de progresso e civilização ilimitados estava baseado na exploração do trabalho e no aprofundamento da clivagem entre a condição de vida dos mais abastados e dos trabalhadores. Nesse sentido, podemos dizer que o Oitocentos foi o século das revoluções e das contrarrevoluções fazendo com que essas questões ocupassem as penas de muitos intelectuais, políticos e militantes do período.

Embora o trabalho ainda estivesse baseado no braço escravo no Brasil, as tensões intrínsecas a esse sistema somadas ao crescimento do movimento abolicionista e, consequentemente, à necessidade de se refletir sobre o problema da mão-de-obra, faziam com que, mesmo com a ausência de um operariado urbano consistente, as discussões em torno da questão social fossem bastante sensíveis. A manutenção de uma estrutura social altamente desigual e excludente exigia esforços constantes por parte da elite proprietária, que se via ameaçada não só pelos problemas internos quanto pela difusão de ideias nacionais e estrangeiras que colocavam em xeque o status quo.

O conhecimento das ideias socialistas e comunistas caminhava a passos bastante lentos, mas a Comuna de Paris, em 1871, repercutiu de forma intensa nos jornais brasileiros, coincidindo com o período de início da crise do Império. As notícias sobre esses nos periódicos paulistanos revelavam um esforço constante em demonizar qualquer proposta que se relacionasse a eles, transformando-os em sinônimos de ofensa política. Mesmo assim, João Theodoro dedicou uma seção inteira de seu livro ao socialismo, tratando-o de forma, aparentemente, positiva – o que lhe valeu a designação de “socialista filantrópico” por parte de um jurista do século XX, que lhe atribuiu, inclusive, o papel de introdutor da questão social no direito brasileiro.46

No entanto, uma leitura um pouco mais detida da Theoria Transcendental do Direito revela claramente que esses rótulos, colocados quando as delimitações do socialismo estavam já bem definidas, não faziam o menor sentido. Mesmo considerando que os referenciais teóricos de João Theodoro fossem alguns autores do panteão daquilo que Marx e Engels denominaram por socialismo utópico47 – cujas ideias ainda estavam dominadas por valores burgueses –, e outros que nada tinham a ver com essa doutrina, a inadequação da interpretação do nosso autor fica patente para um leitor do século XX. Seja como for, se essa crítica se aplica a uma interpretação posterior, ela não pode ser feita da mesma forma para João Theodoro, pois não é possível desconsiderar que no século XIX esses conceitos eram muito mais fluidos.

No seu entendimento, o socialismo seria uma espécie de conduta do Estado, uma espécie de prestação de socorro. Sua interferência maior ou menor deveria se ajustar às condições sociais, ou seja, da avaliação da necessidade ou não desses auxílios em cada momento. Ele não entendia o socialismo como uma proposta de subversão da ordem estabelecida, como uma luta contra o capitalismo, nem tampouco como uma doutrina que contrapunha as classes sociais. Muito ao contrário, para ele, o socialismo parecia ser justamente as medidas necessárias para a conciliação delas. A sociedade, de acordo com a sua metáfora fisiológica, deveria funcionar como um corpo no qual cada um se mantivesse no seu lugar e cumprisse as suas funções da melhor maneira possível.

Para ele, o socialismo era também cristão, pois era pautado pelas regras de convivência estabelecidos pela bondade divina, e a prestação de serviços pelo Estado assumia a forma da caridade. Assim, nessa chave, João Theodoro exemplifica como medidas socialistas a taxa dos pobres criada pela rainha Izabel, na Inglaterra, e os numerosos asilos para mendigos existentes nos países civilizados. Os Estados teriam a missão de favorecer as necessidades, mas sem proteger os ociosos. Ele afirma que tais medidas eram importantes porque “avulta o perigo na razão direta do pauperismo que se augmenta.”48 E esse ponto era central para o nosso autor: a revolução deveria ser evitada de qualquer maneira.

João Theodoro constrói toda a sua teoria sobre o Estado através da descrição do socialismo, selecionando os trechos dos autores que corroboravam com as suas proposições.49 Se essa manipulação era intencional ou fruto de um mal-entendido não vem ao caso, inclusive porque não poderíamos jamais responder a essa questão. O importante é perceber, como é claro nesse exemplo, a ideia proposta por Roger Chartier em relação à autonomia do leitor mediante a ortodoxia do texto escrito.50 Sendo resultado de uma má interpretação ou de uma manipulação proposital, o fato é que os textos base adquiriram uma feição completamente nova nas mãos desse leitor. Leitor que, por sua vez, também era o autor de um texto que seria lido certamente da mesma forma por seus alunos: entre a ortodoxia e a liberdade.

E dessa lógica resultava algo que poderíamos compreender na chave proposta por Michel Espagne.51 O contato com uma literatura filosófica e política estrangeira, que fora produzida em um determinado contexto – no caso, a Europa dos finais do século XVIII e da primeira metade do século XIX –, era lida, interpretada e ressignificada para servir de proposição teórica, mas também prática, em uma pequena cidade do Império brasileiro, que vivia o começo de um intenso processo de transformações, levando os intelectuais e políticos locais a repensarem a forma de organização dessa sociedade.

E no caso de João Theodoro, especificamente, parte dessas proposições tomaram corpo quando ele foi presidente da Província de São Paulo, entre os anos de 1872 e 1875. Apesar de não encontrarmos em sua biblioteca os autores que traziam aquele “bando de ideias novas”, mencionadas por Silvio Romero, seu governo “materializou” ideias bastante modernas. Na realidade, o que vimos entre seus livros e na sua obra teórica era uma presença maciça de autores do ecletismo, ainda muito influenciados por ideias metafísicas e racionalistas, e a ausência total de autores positivistas e evolucionistas. Se nos baseássemos apenas nisso, poderíamos ser levados a crer que as novas ideias do século não haviam atingido nosso autor. No entanto, na sua interpretação bastante peculiar e no seu governo, estavam presentes alguns valores centrais dessas correntes, representados, por um lado, pelo entusiasmo pelas indústrias, pelas ferrovias, enfim, pela crença nos progressos infinitos da “civilização”, e por outro, pela forma como ele enxergava o Estado e a sociedade.

Apesar do caráter moralista e voluntarista – típicos do período das Luzes52 – que João Theodoro atribuía à organização social ideal, alguns pontos caros aos republicanos apareciam fortemente em sua teoria e suas práticas. Seu governo foi marcado pela modernização urbana – pela qual ele é reconhecido até hoje – mas também pela ideia, bastante nova no Brasil, de criação e consolidação de um espaço público. Não só as praças e parques que ele construiu demonstravam isso, como também sua tentativa de acabar com a lógica dos favores,53 que predominava na administração pública.

Essa, inclusive, pode ser a chave para entendermos as críticas ferrenhas que ele recebia de seus opositores. À primeira vista, parece um pouco contraditório que o primeiro presidente da Província de São Paulo que realmente se empenhou na modernização da cidade – tão almejada por aquela elite que tinha os pés no Brasil, mas os olhos na Europa –, fazendo inúmeros contratos para a construção de estradas de ferro, abrindo ruas, saneando e embelezando a cidade, fosse criticado de forma tão dura por essa mesma elite. No entanto, se considerarmos que os “olhos na Europa” tinham um filtro bastante seletivo, que não incluía abrir mão do acesso aos recursos públicos em prol de seus interesses privados, podemos compreender que as ideias de João Theodoro eram bastante novas, mesmo que sua origem fosse uma visão moralista e religiosa da sociedade.

Algumas medidas progressistas de João Theodoro incomodaram uma parte importante da elite paulista, acostumada nos moldes da escravidão. No entanto, ele não propunha nenhuma mudança estrutural, nenhuma reacomodação dos estratos sociais. Seu objetivo era claramente uma harmonização dos conflitos, através de pequenas reformas que pudessem apenas ajustar o sistema. João Theodoro foi o representante paulista de um conceito bastante comum na História do Brasil, o da modernização conservadora. Nomeado durante o gabinete do visconde do Rio Branco – que tentou aplicar essas reformas em escala nacional54 – João Theodoro tinha como objetivo amenizar os problemas intrínsecos ao progresso, garantindo a manutenção da estrutura social.

Pensando nas relações entre a posse privada de livros e as práticas de leitura, baseando-nos, ainda, na interpretação que João Theodoro elaborou sobre o socialismo, é possível fazer algumas considerações. Podemos presumir que a análise de uma biblioteca, considerada somente pela listagem dos livros presentes, pode contribuir com o levantamento das obras, dos autores, dos títulos e dos idiomas que predominavam em determinado lugar e determinada época. Contudo, um estudo que se restrinja apenas a elas pode causar algumas impressões enganosas no que se refere às práticas de leitura e à apropriação das ideias.

A existência de autores socialistas, republicanos e democratas na biblioteca de João Theodoro, que, à primeira vista, nos levou a considerar consistente a avaliação de Miguel Reale sobre o socialismo do nosso autor, pôde ser relativizada a partir de um aprofundamento sobre a forma como ele os interpretava. Possuir as obras de Proudhon, Bancel, Alphonce Esquiros e Vermorel revelava apenas o seu interesse por determinada literatura, mas, de nenhuma forma, pode ser vista como evidência da sua adesão a essas ideias. Por outro lado, a forte presença de autores do ecletismo, ainda muito influenciados por ideias metafísicas e racionalistas, e a ausência quase total de autores positivistas e evolucionistas, poderiam levar a crer que as novas ideias do século não haviam atingido João Theodoro. No entanto, a leitura da sua obra revela que, a despeito da falta desses referenciais teóricos, alguns valores centrais dessas correntes encontravam-se presentes, assim como o entusiasmo pelos progressos infinitos da “civilização”.

Assim, se essas questões deixam claro que entre a posse privada de livros e as práticas de leitura existe uma sensível distância ou, pelo menos, caminhos nem sempre diretos, também fica patente a complexa relação entre as resistências representadas pela tradição e a força da inovação, pois muitas vezes, não há uma oposição, mas sim uma complementariedade.55

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Fontes manuscritas

Arquivo do Estado de São Paulo, Fundo do Tribunal de Justiça, Inventário de João Theodoro Xavier, Caixa: 201007000779, Ano: 1878, Processo nº: 2393.

Notas

1 DARNTON, Robert. O que é a história dos livros. In: ______. O Beijo de Lamourette. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 122-149.
2 FEBVRE, Lucien; MARTIN, Henri-Jean. O Aparecimento do Livro. São Paulo: Edusp, 2017.
3 MARTIN, Henri-Jean. Histoire et pouvoirs de l’écrit. Paris: Éditions Albin Michel, 1996, p. VI.
4 Idem.
5 FEBVRE, Lucien; MARTIN, Henri-Jean, op. cit., p. 49-54.
6 MORNET, Daniel. Les enseignements des bibliothèques privées 1750-1780. Revue d’Histoire littéraire de la France, Paris, Librairie Armand Colin, nº. 3, 17º année, p. 449-496, jul-sep. 1910, p. 451-452.
7 ARAUJO, Jorge de Souza. Perfil do Leitor Colonial. Salvador: UFBA, Ilhéus: UESC, 1999, p. 12.
8 CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL, 1988, p. 121-139.
9 Esse artigo é fruto de parte do estudo realizado durante a pesquisa de doutorado intitulada Da sala de leitura à tribuna: livros e cultura jurídica em São Paulo no século XIX, no Programa de Pós-Graduação em História Econômica da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, com apoio financeiro da Fapesp.
10 MARTINS, Ana Luiza. Gabinetes de Leitura: Cidades, Livros e Leituras na Província Paulista. São Paulo: Edusp, 2015, p. 153.
11 MACHADO, Ubiratan. Pequeno Guia Histórico das Livrarias Brasileiras. São Paulo: Ateliê Editorial, 2008, p. 61; HALLEWELL, Laurence. O livro no Brasil. São Paulo: Edusp, 2012, p. 336.
12 DEAECTO, Marisa Midori. O Império dos Livros: Instituições e Práticas de Leitura na São Paulo Oitocentista. São Paulo: EDUSP, FAPESP, 2011, p. 378-379.
13 Ibidem, p. 117.
14 Frédéric Barbier demonstra como a presença de instituições culturais, como as Universidades, por exemplo, influencia positivamente no processo de alteração dos hábitos culturais. Ver: BARBIER, Frédéric. Livres, lecteurs, lectures. In: VARRY, Dominique (Dir.). Histoire des bibliothèques françaises. Les bibliothèques de la Révolution et du XIXe siècle (1789-1914). Paris: Éd. du Cercle de la librairie, 2009, p. 608.
15 Listamos cerca de 1.900 processos, mas conseguimos localizar apenas 1.300 deles no Arquivo Público do Estado de São Paulo e no Arquivo Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
16 MACHADO, Alcântara. Vida e morte do bandeirante. Belo Horizonte: E. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980.
17 VILLALTA, Luiz Carlos. Reformismo Ilustrado, Censura e Práticas de Leitura: Usos do Livro na América Portuguesa. 1999. 544 f. Tese (Doutorado em História Social). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, p. 283-288.
18 DEAECTO, Marisa Midori, op. cit., p. 378-379.
19 MARTIN, Henri-Jean. Histoire et pouvoirs...op. cit., p. 323.
20 MARTINS, Ana Luiza, op. cit., p. 293.
21 SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa Ômega, 1981, p. 49-50.
22 MARTINS, Ana Luiza. História do Café. São Paulo: Contexto, 2008, p. 161-184.
23 DEAECTO, Marisa Midori, op. cit., p. 118.
24 VITA, Dante Alighieri. João Theodoro e o seu tempo. São Paulo: Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, 1956, p. 31.
25 Arquivo do Estado de São Paulo, Fundo do Tribunal de Justiça, Inventário, Caixa: 201007000779, Ano: 1878, Processo nº: 2393.
26 Encontramos apenas uma tradução do francês para o português, que é o livro Les Enfants du capitaine Grant, de Jules Verne.
27 FERREIRA, Tania Maria Tavares Bessone da Cruz. Palácios de destinos cruzados: bibliotecas, homens e livros no Rio de Janeiro (1870- 1920). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1999, p. 32.
28 FOUCHE, Pascal ; MELLOT, Jean-Dominique ; NAVE, Alain ; [et al.] (Dir.). Dictionnaire encyclopédique du livre. 3 vols. Paris : Éd. du Cercle de la librairie, cop. 2002, vol. 1, A-D, p. 291-292.
29 Essas “ideias novas” se referiam sobretudo às concepções dos autores positivistas e evolucionistas. ROMERO, Sílvio. A Philosophia no Brasil: ensaio crítico. Porto Alegre: Typographia da Deutsche Zeitung, 1878, p. 62-63.
30 CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL, 1988, p. 121.
31 Colloque du Centre méridional d'histoire sociale, des mentalités et des cultures, 3, 1978, Aix-en-Provence, Bouches-duRhône. Les Intermédiaires culturels : actes du Colloque du Centre méridional d'histoire sociale, des mentalités et des cultures. Aix-en-Provence : Publications Université de Provence.
32 DEAECTO, Marisa Midori, op. cit., p. 337-338.
33 Ibidem, p. 330
34 ABREU, Márcia. Os caminhos dos livros. Campinas: Mercado de Letras, 2003, p. 180-181.
35 Não fizemos uma separação temática muito rígida, pois o risco de cometer anacronismos na classificação, além da impossibilidade de conhecer o conteúdo de todas as obras, resultaria em algo bastante artificial.
36 Diferentemente dessas situações, em alguns casos aparece no próprio texto a menção de que as ideias foram retiradas da análise de outros autores, ou seja, que se tratam de citações de segunda mão. Mas quando isso ocorre, ou pelo menos quando é perceptível, os detalhes do livro citado com as páginas, volumes, capítulos, etc., não aparecem, e às vezes, nem mesmo o título da obra.
37 MORNET, Daniel, op. cit., p. 452.
38 ESPAGNE, Michel. Les transferts culturels franco-allemands. Paris: Presses Universitaires de France, 1999.
39 Colloque du Centre méridional d'histoire sociale, des mentalités et des cultures, op. cit..
40 BARBIER, Frédéric. Les «intermédiaires culturels» et l'histoire du livre. Histoire du livre. Disponível em: . Acesso em: 04 mai. 2017.
41 VOVELLE, Michel. Les intermédiaires culturels: une problematique. In: Colloque..., op. cit., p. 12.
42 Ibidem, p. 12-13.
43 ESPAGNE, Michel. Les transferts culturels...op. cit.
44 ESPAGNE, Michel. Transferências Culturais e História do Livro. Livro. Revista do Núcleo de Estudos do Livro, São Paulo: Ateliê Editorial, n. 2, p. 21-34, ago. 2012, p. 23
45 REALE, Miguel. O Krausismo em São Paulo: o “socialismo filantrópico” de João Teodoro e as lições de Galvão Bueno”. In: Filosofia em São Paulo. São Paulo: Grijalbo/Edusp, 1976, p. 23.
46 REALE, Miguel, op. cit., p. 19-25.
47 MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Do Socialismo Utópico Ao Socialismo Científico. São Paulo: Edirpo, 2011.
48 XAVIER, João Theodoro. Theoria Transcendental do Direito. São Paulo: Typographia Seckler, 1876, p. 336.
49 Vilma Peramezza, principalmente quando entra na parte dos sistemas descritos por João Theodoro, aponta vários momentos em que ele se apropria seletivamente de parte da teoria dos autores para corroborar com as suas próprias ideias. PERAMEZZA, Vilma. O pensamento de João Teodoro Xavier. São Paulo, 1982. 232 f. Dissertação (Metrado em Filosofia e Teoria Geral do Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, p. 63 et seq.
50 CHARTIER, Roger, op. cit., p. 121-139.
51 ESPAGNE, Michel. Les transferts culturels...op. cit.
52 BOURETZ, Pierre. Progrès. In: ORY, Pascal (Dir.). Nouvelle Histoire des idées politiques. Paris: Hachette, 1987, p. 292-299.
53 SCHWARZ, Robert. As ideias fora do lugar. In: ______. Ao vencedor as batatas: forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro. São Paulo: Duas Cidades/Ed. 34, 2000.
54 ALONSO, Angela. Ideias em movimento: a geração de 1870 na crise do Brasil-Império. São Paulo: Paz e Terra, 2002, p. 75-86.
55 MORNET, Daniel, op. cit.

Autor notes

* Brasileira, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História Econômica da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), com pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) de 2013 a 2018. E-mail: vivian.ayres@usp.br. Currículo eletrônico (Plataforma Lattes): http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4484851H4


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