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Recepción: 05 Febrero 2021
Recibido del documento revisado: 30 Marzo 2021
Aprobación: 12 Mayo 2021
Publicación: 01 Junio 2021
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16iesp.3.15295
Resumo: Este trabalho visa pensar dois pontos principais: explorar as contribuições reflexivas para a formação docente e observar as possibilidades didáticas para o ensino através do mangá Assassination Classroom, de Yusei Matsui. Dessa forma, o intento desta pesquisa é conceber o referente mangá enquanto ponte para imaginação: seja para debater sobre a condição humana na aventura docente, acerca de suas responsabilidades e de suas limitações, seja para entendermos o valor que reside em nutrir e desenvolver relações de saber-afetivo com os discentes, na intenção de acolher e cuidar para melhor ensinar a viver e existir em sociedade.
Palavras-chave: Educação, Docência, Afetividade, Mangá.
Resumen: Este trabajo tiene como objetivo pensar dos puntos principales: explorar las contribuciones reflexivas a la formación docente y observar las posibilidades didácticas para la enseñanza a través del cómic japonés (mangá) Assassination Classroom, de Yusei Matsui. De esta manera, el objetivo de esta investigación es concebir el mangá como puente para la imaginación: ya sea para debatir sobre la condición humana en la aventura docente, acerca de sus responsabilidades y sus limitaciones, sea para entender el valor que reside en nutrir y desarrollar relaciones de saber-afectivo con los discentes, en la intención de acoger y cuidar para mejor enseñar a vivir y existir en sociedad.
Palabras clave: Educación, Docencia, Afectividad, Mangá.
Abstract: This paper aims to think about two main points: exploring the reflective contributions to teacher education and observing the didactic possibilities for teaching through Japanese comics (Mangá) titled Assassination Classroom, by Yusei Matsui. Thus, the intent of this research is to conceive the Mangá as a bridge to imagination: either to discuss the human condition in the adventure of teaching - about its responsibilities and its limitations, or to understand the value that lies in nurturing and developing affective-knowledge relations with students, with the intention of welcoming and caring in order to better teach how to live and exist in society.
Keywords: Education, Teaching, Affectivity, Mangá.
Introdução
A referente pesquisa surge mediante a necessidade de entendermos o valor que possui as histórias em quadrinhos para, no mínimo, fazer-nos pensar e questionar acerca de inúmeras problemáticas, a depender da obra que se adote e da abordagem que se utilize. Aqui, trabalharemos com uma arte oriental que vem conseguindo sucesso entre crianças, jovens e adultos por todo o mundo: as histórias em quadrinhos japonesas, ou mangá. Como o mangá, que “significa ‘involuntário’ (man) e ‘desenho/imagem’ (gá)” (BARBOSA, 2020, p. 105), é um suporte que contém uma linguagem verbo-visual em sua constituição, iremos tratar de examiná-lo com toda sua riqueza, através de uma investigação sobre seu uso ao longo da história e das possibilidades de aplicabilidade na educação. Para tanto, autores como Waldomiro Vergueiro e Sobia Bibe Luyten, parte dos pioneiros nos estudos e pesquisas em histórias em quadrinhos no Brasil desde os anos 1960, serão demandados para se discutir tanto os quadrinhos dentro e fora das salas de aula, quanto para mobilizar reflexões relacionadas à profissão docente.
Assim, tentaremos compreender não só a capacidade do mangá em costurar sua arte literária com a realidade em que vivemos e ser uma genuína fonte para o estudo de questões sociais, culturais e históricas, como em explorar a presença e a abordagem da condição humana em seus enredos. Como exemplo, serão analisados recortes da obra Ansatsu Kyoushitsu4 (ou Assassination Classroom, no Ocidente), do autor Yusei Matsui, originalmente publicada entre 2014 e 2018 pela editora Shueisha, através da revista semanal de mangá Weekly Shonen Jump, num total de 180 capítulos. A pesquisa será realizada no campo digital, por via de websites como “Mangayabu” (responsável por traduzir a obra completa em 2019), que traduz e adapta diversos mangás do japonês para o português, com o interesse de divulgar a cultura nipônica.
Por fim, este trabalho visa pensar dois pontos principais: explorar as contribuições reflexivas para a formação docente e observar as possibilidades didáticas para o ensino através do mangá Assassination Classroom. Em um primeiro momento, teceremos breve contextualização acerca do uso do mangá ao longo de sua história e sobre as dificuldades de sua receptividade no Ocidente enquanto leitura intelectual e acadêmica, além de abordar sobre as diferenças e as vantagens do mangá em relação às histórias em quadrinhos norte-americanas. Em seguida, na medida em que discutimos o uso do mangá em sala de aula, utilizaremos como fonte de nosso estudo os diálogos, as situações e as querelas presentes na obra Assassination Classroom, analisando os códigos entrelaçados da linguagem tanto verbal quanto visual contida em seu formato. Dessa forma, o intento desta pesquisa é conceber o referente mangá enquanto ponte para imaginação: seja para debater sobre a condição humana no exercício da docência, acerca de suas responsabilidades e de suas limitações, seja para entendermos o valor que reside em nutrir e desenvolver relações de saber-afetivo com os discentes, na intenção de acolher e cuidar para melhor ensinar a viver e existir em sociedade.
Os traços de uma história: narrativas em preto e branco
Tendo o mangá o poder de criar mundos e neles nos convidar a viajar sob plena imaginação, capaz de rodopiar e embaralhar sentimentos que vão desde os nossos maiores sonhos e fantasias aos nossos piores medos e frustrações, deveras uma arma, nada mais coeso do que carregar seu potencial para dentro – e para fora – das calorosas e agitadas salas de aula, apresentando-o tanto para os/as educadores/as quanto para os/as discentes dos mais variados níveis de ensino. Dito isso, é preciso contextualizar seu potencial numa prosa por meio da qual possamos conhecer sua história e desenvolvimento, bem como explicar sobre seu espinhoso percurso até chegar e adentrar, mesmo que timidamente, nas veias escolares.
Tudo começa a partir das relações que o Japão constrói com os estrangeiros, mediante uma movimentação de pessoas, de histórias e de mercadorias. Já “no início do século XX, o Japão estava absorvendo a cultura ocidental intensamente em todas as áreas” (LUYTEN, 2000, p. 104). Logo, em vista de um choque cultural entre mundos distintos, o processo de hibridismo irá gerar apropriações, voluntárias ou não.
Com isso, atualmente, após inserir o “espírito japonês” nestas “influências alienígenas” das histórias em quadrinhos e melhor desenvolver seu formato, tornando, além de único, o mais rico em compor linguagens plurais num mesmo suporte, o mangá pode se aproximar de seu lugar ao sol no país ao conquistar um “vínculo peculiar – no formato, na editoração e, principalmente, no conteúdo” (LUYTEN, 2000, p. 168). Todavia, ainda que sua evidência estivesse mais ligada a questões puramente econômicas, “antes da Segunda Guerra Mundial, os quadrinhos japoneses já haviam se firmado no gosto popular” (LUYTEN, 2000, p. 26), talvez por ser “um meio de alívio de tensão e estresse, principalmente da faixa infanto-juvenil” (LUYTEN, 2000, p. 15), logo após algumas décadas da Segunda Guerra Mundial, “os japoneses investiram nas histórias em quadrinhos como forma de preservação das tradições e da ideia de unidade nacional” (BARBOSA, 2020, p. 108). Faltava, agora, ganhar a atenção do resto do mundo.
Quer dizer, apesar de ser considerado hoje uma das maiores indústrias do mundo japonês moderno, capaz de mobilizar milhões de vendas em tiragens semanais e ser um relevante motor econômico para seu povo, o mangá teve que lidar com um trajeto árduo e longo até alcançar um patamar mais prestigiado na sociedade e nos bancos acadêmicos. E isto só foi possível mediante uma ampla propaganda do mangá no exterior, mesmo que em um suporte diferente.
Sobretudo por meio dos animês, os quadrinhos japoneses puderam ser mais conhecidos por todo o mundo, pois “foram os grandes divulgadores do traço do mangá, antes de eles serem publicados fora do Japão” (NAGADO, 2005, p. 52), servindo “como agentes de difusão em grande escala dos mangás para o Ocidente” (LUYTEN, 2005, p. 9). Ou seja, a partir do contato com os animês, o mangá estava presente, dado que muitas vezes as histórias serializadas para as TV’s não produzem seu conteúdo até o fim, tornando necessário buscar a fonte original para se ler de forma completa. Entretanto, mesmo após o mangá conquistar mais território, as histórias em quadrinhos, de forma geral, sempre foram consideradas como puro entretenimento, sem valor ético, social e histórico.
De cara, “[..] as histórias em quadrinhos encontraram muitos obstáculos até que fossem devidamente apreciadas pelos intelectuais” que, de forma geral, “viam os quadrinhos como ‘coisa de criança’, totalmente supérfluos, produtos feitos para uma leitura rápida e destinados ao esquecimento” (VERGUEIRO, 2005, p. 16). Além disso, “[...] o quadrinho japonês, por barreira linguística ou pelo desconhecimento do assunto, não é tratado com grande importância no mundo ocidental, no contexto internacional do quadrinho” (LUYTEN, 2000, p. 13), indevidamente subestimado “em seu real valor como um meio de comunicação universal, de poder didático eficaz, de aprimoramento artístico e de registro histórico” (ROSA, 2005, p. 104). Não se entendia, decerto, que “[...] a busca da leitura prazerosa não exclui a aquisição de conhecimento, pois jamais deixa de trazer informações ao leitor” (OLIVEIRA, 2010, p. 42).
Mesmo quando exposto como “alvo de crítica dos educadores”, com argumentos de que “[...] oferecem todo tipo de más influências, desviam a atenção dos estudos e são prejudiciais à formação da criança” (LUYTEN, 2000, p. 163), o mangá resiste ao mundo. Parte dessa resistência se fortaleceu, provavelmente, mediante sua recém promoção ao status de literatura pelo meio intelectual do Ocidente, já que “ambos são, predominantemente, narrativos” (POSTEMA, 2018, p. 115). Em vista de seu consumo também enquanto um tipo de literatura, o mangá começa a ocupar novos espaços e alcançar novos públicos, dado que um texto literário.
Apesar de mencionarmos a relação dos quadrinhos com a literatura, é importante destacar que ambas as linguagens possuem sua própria singularidade comunicacional. Além disso, os mangás “são uma manifestação artística autônoma, assim como o são a literatura, o cinema, a dança, a pintura, o teatro e tantas outras formas de expressão”, bem como uma língua deveras emancipada (VERGUEIRO; RAMOS, 2020, p. 37). Então, é comum, e até saudável, que transitemos e nos deixemos envolver nas mais diversas linguagens, desde que se preserve a riqueza e importância de cada uma. Por isso, “[...] não é de causar estranheza, então, que haja um diálogo entre literatura e quadrinhos” (VERGUEIRO; RAMOS, 2020, p. 37), devido a essa relação que “tem se mostrado uma forma eficiente para a criação das mais diversas narrativas” e veiculado “ideias de formas diferentes, revelando outras maneiras de ‘ler’ e compreender o mundo que nos cerca” (OLIVEIRA, 2014, p. 38). Dito isso, e para melhor distingui-la da literatura, falemos do formato que enlaça propriamente as configurações de uma história em quadrinhos.
Além disso, a própria execução no modo de fazer as histórias em quadrinhos japonesas tem em seu bojo múltiplos artifícios e técnicas capazes de transmitir sensibilidades à flor da pele de qualquer leitor/a que se proponha aberto/a para tal experiência, devido à construção narrativa que não só envolve quem lê como abraça aquilo que existe de mais humano em nós. Sem falar que “[...] nos quadrinhos, além da escrita, a percepção do significado é complementada pela expressão facial dos personagens, que ajuda a transmitir o sentido” (LUYTEN, 2000, p. 174).
Consequentemente, através dessa conversa e interação entre visual e verbal, os mangás “[...] formam juntos um significado e uma ironia que não estão presentes em nenhum deles, separadamente”, sendo “[...] mais acurado pensar os quadrinhos mais como uma forma que é impulsionada principalmente pelo visual, em que o verbal com frequência acrescenta interesse ou profundidade” (POSTEMA, 2018, p. 116). Mesmo assim, “a grande maioria das mensagens é”, no entanto, “percebida pelos leitores por intermédio da interação entre os dois códigos” (VERGUEIRO, 2020, p. 31), o que não significa uma linguagem visual somada simplesmente a uma verbal, mas uma própria linguagem visual-verbal, indissociáveis e independentes numa mesma estrutura narrativa. E as narrativas, não podemos esquecê-las, são também cruciais no processo desse contato visual-verbal. Pois, são com elas, através da ligação entre imagem e texto, “[...] que tornamos inteligível para nós mesmos a inconstância das coisas humanas, é através das narrativas que nos situamos no mundo, situando o lugar do outro”, que damos uma chance para o acesso de “experiências que dificilmente teríamos a partir de outros discursos sociais” (DALCCASTAGNÉ, 2014, p. 183).
Neste momento, é possível que se imagine uma significativa semelhança entre as produções ocidentais e orientais de quadrinhos, dado uma aparente proximidade de estruturas narrativas e de seu formato, em geral. Contudo, as diferenças são demasiadamente marcantes, desde a abordagem dos assuntos à construção do conceito e da jornada sobre a figura do herói.
Assim, não se trata de definir qual dos formatos seria o melhor entre os melhores, mas de ressaltar sobre as representações que cada povo produz acerca de sua história, da sua relação com o mundo e das afetividades de si e do outro. Obviamente, a depender do trabalho que se deseje elaborar, o formato e o local de origem são escolhas importantes para se levar em conta durante a pesquisa. Dessa maneira, ao contrário dos bloqueios “tantas vezes castradores dos politicamente corretos heróis norte-americanos”, optamos pelos mangás “por lidarem com temas universais como amizade, lealdade, coragem e amor”, por justamente pautarem a condição humana com mais prioridade, sendo esta a causa por encontrarem “fácil identificação com povos de qualquer etnia” (NAGADO, 2005, p. 53).
Neste caso, ao se tratar de condição humana, temos “uma necessidade interna de heróis”, por serem os responsáveis em povoar “[...] um setor privilegiado de nosso imaginário, governado pela fantasia” (LUYTEN, 2000, p. 69). Esta maestria deve-se a inúmeros fatores: da formação histórica de cada território, de ser ou não colonizado (e se sim, por quem, quando e por quanto tempo), do desenvolvimento da língua e da escrita, das espiritualidades, dos comportamentos e dos modos de ver e se relacionar com a terra em que se pisa. Ao considerar tais fatores, iremos sempre localizar uma maneira única de representar e de apropriar o mundo e as coisas. Não seria, portanto, diferente com os quadrinhos.
Entendemos que os personagens presentes nos quadrinhos japoneses são “concebidos a partir do mundo real, nos quais as pessoas podem encontrar”, em certa medida, “os ingredientes para vivenciar suas fantasias” (LUYTEN, 2000, p. 40). Considerado “uma possibilidade de fuga por meio da fantasia”, o mangá não é simplesmente a fuga por si mesma, mas uma abertura para que o leitor e a leitora encontrem os caminhos de sua fuga estritamente pessoal, tratando-o como “um meio comportado de canalizar extravasar suas emoções” (LUYTEN, 2000, p. 223). Em miúdos, a evasão e a fantasia “podem enriquecer o leitor, reconciliá-lo com o absurdo da condição humana” e, sensivelmente, “levantar sua esperança, alargar sua linguagem e sua consciência” (BOSI, 1981, p. 177).
No mais, tendo esclarecido parte da história e do desenvolvimento da indústria do mangá no Japão e pelo mundo, bem como um pouco de sua recepção na sociedade japonesa e estrangeira, voltaremos nossos esforços para conciliar esses e outros aprendizados com as da fonte selecionada, Assassination Classroom, na intenção de produzirmos uma pesquisa que evidencie a força misteriosa e encantada que detém o mangá para tratar sobre o amor, a fantasia e, claro, a educação.
Um professor duro de matar: ensinar para sentir, aprender para viver
Como já é de se esperar, antes que adentremos a obra Assassination Classroom, faz-se necessário introduzir o/a leitor/a na história, mesmo que brevemente. A seguir, selecionaremos páginas do mangá para análise de nossa proposta, despindo seus conceitos, colhendo reflexões, explorando sua linguagem.
Tudo começa quando um monstro, um polvo sorridente com vários tentáculos e com uma aparência completamente amarelada, surge na renomada Escola Kunigigaoka e exige ser o professor da Classe 3-E (último ano do Ensino Fundamental). Responsável por destruir 70% da lua, ameaça extinguir toda a terra dentro de um ano. A condição de paz que faz aos líderes governamentais é apenas uma: ser professor. Sem escolhas e submetidos a este capricho, dada a velocidade do monstro que vai além da compreensão e tecnologia humana, após diversas batalhas perdidas, o governo mundial permite tal loucura, em vista de que aqueles alunos pudessem fazer o que exércitos do mundo inteiro não conseguiram: isto é, assassiná-lo. Considerado segredo de Estado, nem mesmo a família, amigos e a própria escola podiam ter consciência desta situação, sendo apenas de conhecimento do governo e da Classe 3-E. Armas com munição especiais são providenciadas exclusivamente para o assassinato do professor, sendo seu poder de fogo inofensivo aos seres humanos e letal contra Koro. Prontamente, Koro-sensei5 assente com os termos e passa a ser alvo de assassinatos diariamente, na sala de aula, pelos seus alunos.

Dito isso, evidentemente, é preciso cautela para se entender as metáforas e demais figuras de linguagem presentes durante toda a obra, levando em consideração ser uma ficção que se espelha em questões reais. Como qualquer outra história de fantasia, “bastam poucas páginas para que o leitor ative seu ‘pacto de suspensão da descrença’” e mergulhe “no universo dramático e adulto da narrativa” (DALCCASTAGNÉ, 2014, p. 178). Ativando este modo, estaremos nos autorizando a aprender “um saber sobre o mundo” através da fantasia e do fictício, “oferecendo ao leitor modos de interpretá-lo” (OLIVEIRA, 2010, p. 41).
Nesse sentido, continuaremos a contextualizar o necessário para não se perder o entendimento da obra durante a leitura deste artigo, tanto sobre a trajetória de Koro-sensei quanto acerca das dificuldades presentes em sua sala de aula, para construir, durante seu percurso, as pontes da ficção para a realidade.
Ressignificação de um valor: a classe 3-E3
Ao iniciar sua vida docente, Koro-sensei, nome do professor com uma fisionomia de polvo com vários tentáculos, consegue o aval para lecionar da forma que havia proposto. A recompensa para matá-lo, além de claro salvar a Terra, é a de 10 bilhões de ienes (moeda oficial do Japão) para a turma. Assim, a Classe 3-E acaba, consequentemente, tornando-se uma turma inteiramente de assassinos, agora motivados mais do que nunca a frequentarem a escola. Obviamente, no começo, estranham bastante esse pedido e ficam assustados de encarar tal desafio. Todavia, em pouco tempo, acostumam-se com a ideia devido às ótimas aulas do professor e de sua disposição integral em deixar que todos eles o assassinem. Na escola Kunugigaoka, a sala 3-E é considerada uma classe de estudantes problemáticos, fracassados e incompetentes. Uma classe que, em termos práticos, nem sequer existe: isolada e “excluída até o fim”.
A sala é distante do prédio principal, deixando-os segregados enquanto inferiores. Sem nada para perder, já que são invisíveis para a instituição, aceitam a tarefa incumbida a eles. Dessa maneira, a trama segue com inúmeras tentativas falhas de assassinar o professor, mesmo com as mais elaboradas e complexas estratégias e armadilhas arquitetadas pela turma. Não raro, eles tentam matá-lo mesmo com métodos suicidas. A preocupação de Koro com os estudantes é tanta que, ao perceber que eles correm risco de vida na tentativa de algum plano de ataque contra ele, prontamente protege-os para que não se machuquem. Dessa maneira, rejeita métodos sujos e ações covardes que ponham a vida dos próprios colegas de classe em perigo, ansiando uma turma em que se importem uns com os outros verdadeiramente, mesmo num assassinato. Assim, por qual razão essa vontade de assassinar Koro-sensei os motiva tanto? Por dinheiro? Para se tornarem heróis que protegerão a Terra? Não, querem salvar a si mesmos provando seus esforços de conseguir o que foi considerado impossível. Uma vez na vida, mesmo à custa de suas existências, teriam seu valor legitimado pela sociedade. O que não sabiam: aquele professor iria mudar, da forma mais inesperada, a vida de todos.
Essa gradual aceitação da Classe 3-E pelo professo dá-se pela sua empatia exacerbada, provocando discursos sobre o talento e o potencial da turma em serem boas pessoas, mesmo com a sociedade apontando o inverso. Mesmo que aparentemente sem sentido, essa missão os faz deixar sobressair o melhor de si mesmos, dado que Koro não ensinava somente conteúdos, mas educava, sobretudo, para a vida (ORTEGA Y GASSET, 2010). Isso é, no que tange às habilidades já exercidas por cada um – e sem qualquer reconhecimento da escola: desde jogador de beisebol a gênios em informática; talentos na química e excelentes escultores; nadadores natos e bons diretores de cinema; ótimas ginastas e fabulosas gastrólogas, por aí adiante. Contudo, a escola só enxerga que são meros delinquentes por força de um ou mais episódios negativos que os jogaram no abismo taxativo de “piores alunos” da instituição. O que importa, no fim das contas, é a nota. Suas individualidades são ignoradas e, mesmo aqueles que ainda são bons nos estudos, não são acolhidos por falharem em obter notas máximas, dado que a maior prioridade desse sistema educacional é preservar o próprio prestígio da escola. Dessa forma, a dimensão do social dessas crianças é totalmente descartada. Felizmente, a partir das aulas de Koro-sensei, descobrem a riqueza em valorizar aquilo que já sabiam, com o que aprenderam acerca de assassinatos.

A relação que se opera é a de incentivar nossos/as alunos/as a expressar seus conhecimentos prévios, comuns ao seu cotidiano, torná-los evidentes. Deste modo, saberemos unir o que precisam saber com o que já sentem prazer em conhecer.
Por isso que o conceito de saber-afetivo é uma postura cabível, pois na medida em que descobrimos os gostos dos alunos, entrelaçamos um saber com mais sensibilidade, com sentido para suas vidas, dado que cada estudante tem um objetivo próprio. Adiante, a Classe 3-E começa finalmente a entender que seus aprendizados em disciplinas diferentes não servem apenas para fins acadêmicos, mas também como um poder fundamental para ajudar a quem precisa, se assim desejarem, através do que aprenderam.

Logo, percebem que aprender a assassinar o professor lhes oferece aprendizados não somente sobre conteúdos, mas sobre o que desejam para seus futuros. Isto os faz pensar consideravelmente sobre o que fazer com o que se aprende, independentemente da lição, processo esse possível quando se “convida os educandos a reconhecer e desvelar a realidade criticamente” (FREIRE, 1979, p. 125).
Daí, como eles precisam matar Koro-sensei, partem de suas habilidades pessoais para esse intento, tornando-os mais confiantes naquilo que gostam e querem fazer, posteriormente. Então, mesmo que seja em vista de sua própria morte, Koro-Sensei se disponibiliza para ajudá-los a melhorar suas competências depois da aula, levando sempre em consideração os ensinamentos que o assassinato pode contribuir para si mesmos: uma superação.
Um exemplo deste aprendizado é quando Koro-sensei resolve melhorar as habilidades de uma aluna que é apaixonada por Química, ensinando-a a elaborar um super veneno capaz até mesmo de matá-lo. Porém, tal aluna acredita que o mundo dos números e dos processos químicos são os únicos que verdadeiramente importam, enquanto a capacidade de expressar emoções e entender o outro seriam desnecessárias. Assim, a estudante admite ser péssima em Literatura. Daí, quando ela consegue produzir o poderoso veneno, ela simplesmente o oferece e, prontamente, o professor Koro prova – quase morrendo –, parabenizando seu avanço. No entanto, ele mente quanto à nocividade e efeito do veneno contra ele. E, inesperadamente, ensina:

Isto é, o professor se atenta em “ensinar a necessidade de uma ciência e não ensinar a ciência cuja necessidade seja impossível fazer o estudante sentir” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 70), ampliando os conhecimentos da estudante na área que ela já se sentia bem, usando seu prazer como ponte para fazê-la entender a importância de outra área, a qual menosprezava anteriormente: a literatura. Na situação, de que adiantaria fazer venenos fatais sem conhecer as possibilidades de persuasão e de manipulação também incitados pelo uso da linguagem? Isto é, sem a literatura, com suas ficções que falam sobre realidades em uma língua distinta, com “o poder de conhecer o real por meio do imaginário” (OLIVEIRA, 2010, p. 49), ficamos sem o suporte para expressar aquilo que sentimos. Logo, “não basta estudar”, mas fazer com que se “sinta autenticamente sua necessidade, que as questões a ser estudadas me preocupem espontânea e verdadeiramente” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 70), alargando as perspectivas dos saberes que já nutrimos com paixão.
Com base nesse raciocínio, apreende-se que “matar” é a metáfora vital da aprendizagem de qualquer professor/a e aluno/a: um ciclo de vida-morte-vida, mudar um pensamento, deslocar um conhecimento antes absoluto, considerar um ângulo jamais imaginado. É o pulo do abismo daquilo que é inusitado, desconhecido, distante. Prova disso é a de que precisamos eliminar, não raras às vezes, comportamentos, hábitos e até ideias, para que possamos recriá-las a partir de outra visão e perspectiva de mundo, sendo a morte o ponto de transição para o ineditismo de versões distintas de nós mesmos, a coragem para que “percorramos a distância necessária para alcançarmos o outro” (ESTÉS, 1999, p. 106). Na verdade, precisamos que isso seja comum em nossas vidas: é quando estamos em movimento que a mudança (nos) ocorre. Para crescer e “para que os seres humanos vivam”, é vital “que se enfrente aquilo que mais se teme”, quiçá a própria morte de si (ESTÉS, 1999, p. 98). Por isso que assassinato e educação têm bastante ligação na história de Assassination Classroom, posto que se observa uma ligação entre ambos. Assim, assassinar é sobre aprender a construir um caminho para se alcançar o que deseja, um objetivo ou um sonho.
Assim, aquilo que tanto o professor Koro anseia de seus/suas alunos/as é um assassinato, nada mais nada menos, de suas próprias frustrações e medos, receios e fracassos, elementos responsáveis em acorrentar seus mais singulares sonhos e desejos no mais fundo âmago de seus corações. Deseja, pois, que superem a si mesmos.
Aqui, superar significa não um processo de exclusão, mas de integração. Ou seja, para que superemos algo, é necessário que assimilemos isto às nossas vidas, seja um medo, uma frustração ou receio. Ao superarem o professor Koro, estão afirmando uma aprendizagem que parte do pressuposto de um trabalho em equipe, isto é, de precisarmos uns dos outros, posto que ninguém vive, constrói e nem alcança nada sozinho. Esta verdade se entende, inclusive, à própria docência, que “é profundamente uma profissão do campo das relações humanas”, logo, que necessita do outro para florescer (PEREIRA, et al., 2020, p. 93). E isto é fato para nós, educadores/as, posto que precisamos também dos alunos para melhor nos formar enquanto professores/as, mas sobretudo como humanos. A partir dessas palavras, conheceremos melhor a docência impregnada do personagem Koro-sensei.
A docência sob alvo dos afetos: uma doação
Para conhecer a docência a qual o professor do assassinato fica, posteriormente, imerso, é necessário conhecermos uma parcela importante de seu passado. Antes de tudo, Koro-sensei era um humano. Conhecido como “deus da morte”, foi considerado o maior assassino de toda a história. Ao ser finalmente capturado, é exposto a um experimento secreto de um grupo de cientistas que, inesperadamente, falha, o transformando no monstro que conhecemos. Neste cenário, depois da explosão do laboratório, percebe o leito de morte de uma amiga que foi ferida pelos escombros e escuta atentamente seu último pedido: usar seu incrível poder não para continuar seu antigo trabalho, mas para se dedicar inteiramente à educação. Respeitando o laço que construíram durante o experimento, acata o pedido e vai se aventurar nas trilhas do ensino.
Em outras palavras, o exemplo do personagem de Koro-sensei serve para que pensemos que nem o ambiente em que nascemos nem o que fazemos com a oportunidades que nos são dadas no calor de nossos momentos, definem nosso caráter e nossa história. “Não existe atividade mais íntima que o trabalho de atribuir sentido”, e por isso decidimos o que fazer com aquilo que nos afeta (CYRULNIK, 2006, p. 13), posto que “não seríamos sequer capazes de descobrir quem somos” se acaso “nossa existência fosse pacífica” (CYRULNIK, 2013, p. 23). O conforto, então, não mobiliza ninguém para novas consciências. Afinal, o que fazemos com aquilo que nos é imputado à força, é o diferencial para uma transformação.
Aquilo que a sociedade nos obriga a fazer por força das circunstâncias do meio em que crescemos, pode, sim, distorcer nosso modo de ver as coisas e as pessoas, mas jamais irá definir nosso caráter. Para isso, existem oportunidades e chances que nem todos ficam vivos tempo suficiente para encontrar. Uma delas é quando nos encontramos numa situação difícil, confusa, rodeados por “uma selva, fechada, emaranhada, tenebrosa, dentro da qual não podemos caminhar, sob pena de nos perdermos”, e “aparece alguém que nos explica a situação com uma ideia feliz” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 56); quando alguém entra em nossas vidas, bagunçando nossos sonhos, organizando nossas dores, questionando nossas crenças: um/a professor/a que crê naqueles em que ensina, não medindo esforços para resgatar os sonhos particulares de cada um.
Essa doação, e porque não também chamar de sacrifício, que o professor empreende para suas aulas, nada tem a ver com romantizar a profissão, mas sugerir que nela exista sensibilidade, instigando “a coragem e a curiosidade, o amor e o ódio, a agilidade intelectual, o desejo de ser feliz e vencer, a confiança em si mesmo e no mundo, a imaginação” dos estudantes (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 27).

Enfim, isso nos lança num olhar de perceber o sacrifício que existe em nossa profissão docente: quanto temos que abdicar de nós mesmos para salvar nossos estudantes? Isto é, será que uma única vez, ao dispormos de um tempo para auxiliar um aluno em um pequeno desafio/problema, não estaríamos demonstrando o quanto são importantes para nós? Adianta forçar aprenderem conteúdos que de nada tem ligação com suas vidas? Ao mantermos e operarmos a manutenção de uma relação afetiva com eles, não estaríamos dando o primeiro passo para saber o que eles precisam aprender, de verdade? Como saber o que importa ser ou não ensinado, se não nos preocupamos sobre o que querem aprender? Enquanto a criança não estiver sendo “envolvida numa atmosfera de sentimentos audazes e magnânimos, ambiciosos e estimulantes” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 27), não chegaremos à conclusão alguma. Para entender tantas perguntas e a própria docência, é preciso, antes, entender esse outro que torna possível nos (re)construir constantemente, trazê-lo para perto e ouvi-lo, posto que “o domínio progressivo do trabalho leva a uma abertura em relação à construção de suas próprias aprendizagens, de suas próprias experiências” (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 231).
Ora, como aprender a reaprender se não formos capazes de reconhecer nossos próprios tropeços e derrotas, até mesmo de pequenos erros? Na aventura docente, é um requisito indispensável a se considerar seriamente, sem precisar de nenhuma super velocidade ou poderes incríveis, mas somente da coragem em respeitar nossa própria inconclusão enquanto educadores/as e, sobretudo, humanos. Felizmente, “com o passar do tempo, os/as professores/as aprendem a conhecer e a aceitar seus próprios limites”, tornando-os cada vez “mais flexíveis” (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 231). Para tanto, contatos sensíveis, seja nas relações, seja nos materiais com que trabalha, se tornam imprescindíveis para que perceba a fraqueza das coisas. Neste sentido, nada melhor que se perder nas artes: ao nos debruçarmos, por exemplo, nos encantos de um texto literário como o mangá, “há a possibilidade de recuperar por nós, em nós, aquilo que de belo temos e não sabemos, ou somente intuímos, e aquilo que perdemos”, bem como “uma possibilidade muito concreta de ver e sentir a realidade de uma maneira inusitada” (OLIVEIRA, 2010, p. 46).
E este aspecto reside claramente em nosso professor Koro: ser falho. Sim, embora com super velocidade e versátil de diversas formas sobre-humanas, ainda consegue ser falho em determinadas situações. E nem é esse o ponto principal: e sim o de admitir o erro e aprender com isso, seja a partir da observação dos estudantes, seja volvendo seus olhos para dentro de si.
Isto é, seja por termos aprendido essa postura defensiva de negar erros e falhas com nossos próprios professores da universidade; seja por supormos que ao admitir nossos tropeços diante dos alunos estejamos “baixando de nível profissional”, de ser um professor medíocre; ou mesmo seja “perdendo o respeito” deles, pressupondo claramente uma histórica relação de hierarquia do conhecimento, na qual sabemos sempre de tudo apenas por sermos docentes, é no mínimo coeso destacar: temos dificuldades em compartilhar nossas lacunas. Contudo, enquanto professor, Koro nos ensina a não temer essa inevitável realidade: traz seus erros à tona na frente de toda a classe, quantas vezes for preciso, pois antes de qualquer coisa sofre de uma condição que não é outra senão a humana.
Noutros termos, como praticaremos a ideia de estarmos imersos numa incompletude que é constitutiva, se não superarmos – ou aqui, assassinarmos – aquilo que bloqueia a dança de nossos passos? Precisamos interpretar e entender o outro que nos constitui, e para isso, temos que ler o lugar onde estamos situados, ler o mundo antes de qualquer coisa (FREIRE, 1988, p. 9). Ou seja, para caminharmos, é preciso liberdade e experiência nesta dança, para que nos movimentemos, passo a passo. Isto só se torna possível mediante a postura de aprender com os erros de nossa profissão e, a partir deles, transformarmos nossas condutas e métodos, sensibilizando um ensino regado por afetividade. Para cultivar a própria necessidade e beleza que reside em mudar e repensar constantemente sua prática docente, professores/as precisam destruir várias imagens de si mesmos ao longo de seu árduo percurso, não somente para encontrar uma pretensa identidade em sua profissão, mas para não permitir a si mesmo uma desastrosa condição imóvel: a da comodidade. A saída? Continuar (re)aprendendo.
Na formação docente, essa tarefa não deveria ser tão incomum. Um professor que não faz tudo ao seu alcance para conseguir mudar sua postura e, com isso, tocar os corações de seus alunos no que tange a ouvi-los atentamente, tem na sua carreira um enorme furo profissional e afetivo. Sem escutar suas vozes, não somos capazes de ajudá-los.
Daí a necessidade em matarmos as ideias e crenças que aprisionam novas aberturas de nós mesmos ao mundo e ao outro, tendo, nessa morte, a possibilidade de crescer uma vida, no mínimo, diferente. Entendemos que através do termo “assassinato”, utilizado na obra, podemos adaptar a ideia de “superação” de si e do outro, ou seja, da velha história do aprendiz que ultrapassa seu querido professor, tendo em vista não o saber e nem o mestre, mas o próprio aluno como prioridade (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 31).
Quer dizer, na docência, temos por desejo que nossos estudantes consigam ir além daquilo que nós mesmos propomos e apresentamos, daí nossa constante insistência para que participem de debates e de diálogos. Um professor, da maneira como Koro-sensei, precisa se abrir às possibilidades de ser alcançado, permitindo o toque das relações durante o processo. Conhecer seu aluno, acolhê-lo num abraço pedagógico capaz de construir afetividades, para enfim poder ensiná-lo, “o que se requer para viver à altura do seu tempo, e o que ele possa aprender com facilidade e plenitude” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 31), é fundamental para uma formação genuinamente humana na docência.
Por se abrir sempre ao desconhecido e ao inédito, ou por balas no caso de Koro-sensei, o professor se torna apto a compreender que também aprende todos os dias de sua profissão, observando “os valores éticos e morais do ser humano” que resultam na “sua formação ao longo da existência”, responsáveis por contribuir em “sua capacidade de ler o mundo e refletir sobre ele” (OLIVEIRA, 2010, p. 52), numa dança vitalícia cheia de movimentos incompletos, todavia constitutivos, para nossa edificação docente. Só assim seremos capazes, semelhante ao professor Koro, de orientar nossos estudantes sobre a importância daquilo que já conhecem e irão aprender para viver, sobre “relacionar-se com o mundo, dirigir-se a ele, atuar nele, dele ocupar-se” (ORTEGA Y GASSET, 2010, p. 54). Isto é, em educá-los para a vida.
Considerações à beira da morte
No mais, suspendendo as crenças da realidade para melhor captar e aderir às ideias de uma ficção, percebemos a capacidade deste mangá em abordar dois pontos fundamentais na vida de um docente: sua formação contínua e sua constante doação no processo de ensino-aprendizagem. Muito embora pareça descabida traçar uma comparação de um professor como Koro para nossa realidade, sabemos que, em se tratando de amor pela docência e vontade para mudar o mundo a partir de uma sala de aula, já existem docentes assim. O que precisamos nos preocupar é em multiplicar esta espécie rara de profissional, que ouve o som de um saber-afetivo pulsante entre aquilo que ensina e para quem ensina, uma harmoniosa doação, talvez através dos quadrinhos que “estão aí, prontos para serem descobertos e utilizados” (VERGUEIRO; RAMOS, 2020, p. 41).
Por sinal, não é pretensão ver esta obra, bem como qualquer outra que seja analisada nesse tom, como um ponto de chegada para absolutamente nada. E sim como um ponto de partida que alarga suas possibilidades, semelhante a uma ponte, conectando um conhecimento a outros tantos, cabendo “ao professor escolher a história que melhor se enquadra em sua proposta pedagógica” (BARBOSA, 2020, p. 125). Neste sentido, usar esta obra para pensar a docência, a formação docente e a relação professor-aluno é uma maneira artística e literária de se pensar na beleza do processo sobre encerrar certezas e começar mudanças de si e do outro. E o que fazemos com isso fica para uma outra história.
REFERÊNCIAS
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Notas
Notas de autor
Información adicional
Como referenciar este artigo: SILVA, D. R.; SILVA, F. V.; VILLEGAS, M. M. Uma aventura docente sob meditações afetivas no ensino-aprendizagem: um estudo do mangá Assassination Classroom. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. esp. 3, p. 1509-1528, jun. 2021. e-ISSN: 1982-5587. DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16iesp.3.15295