Artigos

SAÚDE, FAKE NEWS E A DOCÊNCIA NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA

SALUD, FALSAS NOTICIAS Y ENSEÑANZA EN FORMACIÓN PROFESIONAL Y TECNOLÓGICA

HEALTH, FAKE NEWS AND TEACHING IN PROFESSIONAL AND TECHNOLOGICAL TRAINNING

Edilaine Cristina de Melo KAWACHI 1
Instituto Federal Sul de Minas (IFSULDEMINAS), Brasil
Ariadne ECAR 2
Universidade de São Paulo (USP), Brasil

SAÚDE, FAKE NEWS E A DOCÊNCIA NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA

Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, vol. 17, núm. 2, pp. 1327-1340, 2022

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho

Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação 2022

Recepción: 21 Julio 2021

Recibido del documento revisado: 15 Septiembre 2021

Aprobación: 22 Enero 2022

Publicación: 01 Abril 2022

Resumo: O presente artigo buscou, através de uma revisão de literatura, apresentar o avanço das fake news e como a desinformação e a falta de conhecimento prévio afetam a rotina dos indivíduos e interferem na saúde da população. Embora disciplinas da saúde não componham o currículo de muitos cursos da Educação Profissional e Tecnológica (EPT), é importante problematizar como determinados eventos interferem na comunidade escolar e de que maneira a escola e o docente podem utilizar uma fake news de forma didática junto ao conhecimento científico, com o intuito de formar cidadãos com novas competências e habilidades tão requisitadas pelo mercado de trabalho atualmente. A inquietação surge no momento de pandemia em que, mundialmente, as pessoas estão aprendendo a conviver com uma nova rotina imposta pela COVID-19. Partimos dessa contextualização para propor a epistemologia da metodologia ativa, baseada em projetos, que considera como pressupostos da aprendizagem situações reais, tendo por contexto a vida e os acontecimentos, e isso permite ao aluno a pesquisa e reflexão, levando ao desenvolvimento de novas competências e habilidades.

Palavras-chave: Docência, Saúde, Fake news, Metodologias ativas, Educação profissional e tecnológica.

Resumen: Este artículo buscó, a través de la revisión de la literatura, presentar el avance de las fake news y cómo la desinformación y la falta de conocimiento previo afectan la rutina de los individuos e interfieren en la salud de la población. Aunque las asignaturas de salud no componen el currículo de muchos cursos de Formación Profesional y Tecnológica (EFA), es importante cuestionar cómo interfieren ciertos eventos en la comunidad escolar y cómo la escuela y el profesor pueden utilizar una noticia falsa de forma didáctica con conocimientos científicos, para formar ciudadanos con nuevas competencias y habilidades tan demandadas por el mercado laboral actual. La preocupación surge, en el momento de la pandemia, donde en todo el mundo, la gente está aprendiendo a vivir con una nueva rutina, impuesta por la COVID-19. Partimos de esta contextualización para proponer la epistemología de la metodología activa, basada en proyectos, que considera como supuestos del aprendizaje, situaciones reales que tienen el contexto de la vida y los acontecimientos y esto permite al estudiante la investigación y la reflexión que conduce al desarrollo de nuevas habilidades y destrezas.

Palabras clave: La enseñanza, Salud, Noticias falsas, Metodologías activas, Educación profesional y tecnológica.

Abstract: This article sought, through literature review, to present the advance of fake news and how misinformation and lack of prior knowledge affect the routine of individuals and interfere with the health of the population. Although health subjects are not part of the curriculum of many Educação Profissional e Tecnológica (EPT) courses, it is important to question how certain events interfere in the school community and how the school and the teacher can use fake news in a didactic way with scientific knowledge, to train citizens with new competencies and skills that are in demand in the labor market today. The concern arises at the time of the pandemic, when people worldwide are learning to live with a new routine, imposed by COVID-19. We start from this contextualization to propose the epistemology of the active methodology, based on projects, which considers as presuppositions for learning, real situations having life and events as context and this allows the student to research and reflect, leading to the development of new competencies and skills.

Keywords: Teaching, Health, Fake news, Active methodologies, Professional and technological education.

Introdução

Segundo Michaelis (online), educação é “[...] o processo que visa ao desenvolvimento físico, intelectual e moral do ser humano, através da aplicação de métodos próprios, com o intuito de assegurar-lhe a integração social e a formação da cidadania”3. É indiscutível o fato de que a educação, em linhas gerais, está em constante processo de aperfeiçoamento. A trajetória e a importância da educação consolidada são importantes para ajudar docentes a educarem discentes de modo que possam diferenciar as fakes news (BRASIL, 2019; SANTOS; LEÃO, 2019).

Em tempos de tecnologia transformadora, população midiatizada, uma notícia publicada no Japão pode viralizar em poucos minutos em outras partes do mundo. Porém, apesar do benefício e de sinalizar evolução, existem os inconvenientes que ladeiam essa modernidade. Essa geração convive com as pós verdades, as fake news e os danos dos novos tempos, que ganham proporções gigantescas a ponto de interferir na rotina das pessoas, inclusive no âmbito escolar (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019; SANTOS, 2020; SANTOS; LEÃO, 2019).

Uma área vulnerável aos ataques das fake news é a saúde, sendo esse um tema de amplo interesse. O indivíduo busca por saúde e esse desejo se estende para toda família e amigos. Diante de tanta desinformação o Ministério da Saúde criou o Saúde sem fake news, no segundo semestre de 2018, permitindo que a população utilize o canal para consultar a veracidade de notícias (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019; SACRAMENTO, 2018).

Segundo o Saúde Brasil, portal do Ministério da Saúde do Governo Federal (2020), a palavra saúde significa: “Além da ausência de doenças, [...] o bem-estar-físico, mental e social”. Haja vista a recente pandemia da COVID-19 e todas as pós-verdades e fake news que circulam em torno do assunto, trazendo desconfiança, desequilíbrio emocional e medo na população, o que agravou ainda mais todo o cenário, afetando inclusive os profissionais da saúde (BERTI, 2020).

Não há como cessar a produção de fake news, e se considerarmos que desde o Império Romano há falsas notícias fica mais fácil dimensionar a questão (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019). A própria população opta por dar mais credibilidade a relatos pessoais do que a estudos sobre o tema (SACRAMENTO, 2018).

Por isso, o olhar se volta ao docente como um intermediário nesse processo de educar e transformar os jovens, procurando torná-los cidadãos críticos. Apesar do domínio das redes sociais, eles encontram dificuldades em diferenciar a verdade das fake news (BUSKO; KARAT, 2019). A esse lugar intermediário podemos também considerar, como o fizeram Gomes e Hansen (2016, p. 34), o papel do “intelectual mediador” do professor como divulgador de conhecimentos, “um tradutor em sentido lato de conteúdos, valores, sensibilidades”.

Problematização

Inicialmente, abordaremos a construção do Sistema Único de Saúde (SUS), sua importância no contexto histórico, contemplando a saúde, concedendo direitos e cidadania, trazendo sentimento de dignidade ao indivíduo. De igual modo, percorreremos a ideia de fake news e sua definição, além de discutir como o avanço das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) impulsiona a desinformação.

Ainda, pretendemos perceber quais medidas têm se apresentado como eficientes, objetivando minimizar os efeitos provados pelas fake news, e como o ambiente escolar pode contribuir com a formação midiatizada dos alunos, sinalizando o seu potencial benefício para a construção do aprendizado, colaborando com a formação crítica.

Sistema Único de Saúde

Ao tratar sobre direito e saúde, a Constituição Federal (CF) de 1988 no Art. 6º assegura que “[...] São direitos sociais, a educação, a saúde, a alimentação [...] e na Seção II Da Saúde, a CF no Art. 196 relata que [...] a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença [...]”. Anteriormente à Constituição Federal, o sistema de saúde público prestava assistência apenas aos trabalhadores com vínculo à Previdência Social, sendo sua promulgação um verdadeiro marco histórico de avanço na saúde brasileira (BRASIL, 1998).

De acordo com o Ministério da Saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS), responsável por assegurar o cumprimento do Art. 196 da Constituição Federal, é o maior e mais abrangente sistema de saúde do mundo, assistindo à população desde a aferição da pressão arterial até o transplante de órgãos (BRASIL, 2020).

Os cuidados com a saúde eram privilégios para os indivíduos que podiam pagar por ela, ou obter assistência através de ações filantrópicas, ou para os trabalhadores; com a criação dos SUS, essa visão foi modificada: antes tratada como um bem passível de ser comprado por poucos, agora é direito universal, atendendo a todos (MARTINS et al., 2011; PAIM, 2009).

O princípio do SUS é a universalização, ou seja, garantir acesso a todos sem discriminação de nenhum tipo, com equidade, ou seja, há um investimento maior ou diferenciado onde há desigualdade social, e integralidade, que vai da promoção à saúde e prevenção de doenças ao tratamento e reabilitação, garantindo qualidade de vida ao indivíduo (BRASIL, 2020).

Participam do SUS as esferas Estaduais, Municipais e os Conselhos de Saúde, que se ramificam em diversas Secretarias e Órgãos. No entanto, o Gestor do SUS é o Ministério da Saúde, que administra, coordena e fiscaliza, articulando as ações com o Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2020).

Cabe ao Ministério da Saúde criar políticas e atender as necessidades da população em sua individualidade, no âmbito regional, municipal e nacional, analisando as circunstâncias que levam ao número crescente de determinada doença, ou o que está colocando a saúde da população em risco, como violência, desemprego, acidentes de trânsito, para citar algumas situações. As diversidades da população brasileira, como a cultura e território, são consideradas para assim garantir o princípio de equidade do SUS (BRASIL, 2020).

O Ministério da Saúde, através do SUS, é responsável por pesquisas científicas e tecnológicas na área da saúde, ações preventivas, assistência farmacêutica, atenção à saúde, educação em saúde, gestão do trabalho, promoção à saúde, sangue e hemoderivados, saúde suplementar, vigilância em saúde, vigilância sanitária (BRASIL, 2020).

Dever, direito, articulações, secretarias, objeto do texto da Constituição Federal, motivo de discussão em todo mundo, assunto alvo em campanhas eleitorais, inclusive dos Estados Unidos (PAIM, 2009). Diante dessas inquietações, o que é saúde?

O Saúde Brasil, portal do Ministério da Saúde do Governo Federal (2020), descreve que saúde vai além da ausência de doença e inclui o bem-estar físico, mental e social. A julgar pela ação do Ministério da Saúde criando o Saúde sem fake news, em 2018, com o intuito de combater as fakes news, é notória a repercussão que essas notícias causam na saúde. O objetivo do canal é ser um facilitador, permitindo a consulta de notícias, desmistificando através da consulta e opinião de especialistas no tema (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019).

Impacto das fake news na saúde

Partimos da definição de que fake news é a produção e propaganda de falsas notícias, com objetivo de manipular, desinformar e induzir a erros (OXFORD, 2016).

Faz-se necessário refletir sobre as considerações de Alcott e Gentzkow (2017) quando abordam o objetivo das fake news, consolidando-se em ser atrativa, visando proporcionar audiência e engajamento, e manipulando para determinar resultados que as favoreçam (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019; ROCHA, 2018).

Destacamos a vulnerabilidade que envolve a área da saúde e as fake news, como objeto de desejo e assunto sobre o qual a população não tem informação suficiente para formar opinião, o que torna o tema um problema de ordem pública, valendo a reflexão e demandando urgência por ações que amenizem ou controlem os danos provocados (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019; ROCHA, 2018).

Para melhor compreensão de como as fake news influenciam a saúde, Busko (2019) analisa as notícias sobre a microcefalia e suas inverdades em um estudo relacionado ao Zika Vírus. No Brasil, o vírus circulava desde o primeiro trimestre de 2014, porém o primeiro caso foi diagnosticado em maio de 2015 na Bahia, quando foram detectados diferentes sintomas provocados pelo vírus. À medida que houve aumento de más-formações congênitas em recém-nascidos, que podem ser provocadas por outros agentes, a população se alarmou e os cientistas iniciaram pesquisas para responder à sociedade.

Diante das incertezas, da impossibilidade de se responder cientificamente sobre as causas da doença, em função do curto tempo entre aparecimento e surto, a preocupação da população e a busca por respostas conferem às fake news oportunidade para se apresentarem em diferentes tons. Segundo Busko (2019), circulou nas redes sociais a informação de que a microcefalia estava sendo provocada por um lote de vacinas vencido aplicado em gestantes contra Rubéola: nesse caso, não eram apenas as incertezas científicas, mas sim as mentiras, fake news, sobre o assunto.

O Ministério da Saúde vem registrando queda nas vacinações desde 2016 e considera vários fatores para esse declive, porém aponta as fake news como responsável por 75% dele. A facilidade de compartilhamento em uma sociedade midiatizada aumenta a propagação. Uma das iniciativas do governo para combater as fake news sobre a vacinação foi uma campanha que divulgou imagens e vídeos com os erros mais comuns divulgados pela mídia (MONARI; BERTOLLI FILHO, 2019).

Associa-se parte das fake news à falta de respostas científicas, e também, segundo Busko (2019) e Monari (2019), à quebra de credibilidade da mídia de referência, salientando que existem inúmeros sites com publicações mal embasadas que divulgam falsos resultados, tornando complexa a pesquisa por parte dos profissionais.

O mais recente problema envolvendo a população e a saúde, com alcance mundial, foi a COVID-19, extremamente desafiador. Foi declarado como emergência o surto do vírus em 30 janeiro de 2019 pela Organização Mundial da Saúde, sendo que os primeiros casos apareceram em 31 dezembro de 2019 na China, ou seja, em 30 dias se instalou uma pandemia. Em fevereiro de 2020 o Brasil confirmou o primeiro caso (SANTOS, 2020). Presentemente (novembro de 2020), ainda não temos uma visão clara sobre o problema, tratamento ou uma data para o desfecho da pandemia.

Segundo o Jornal Nacional (2020), o #FatoouFake, uma iniciativa criada por várias empresas de comunicação, em agosto de 2020 havia checado 300 notícias que circulavam nas redes sociais sobre a COVID-19, desde aquelas em que veiculavam que a vacina estava pronta, porém os governos se recusavam a liberá-la para a população – fake – até que a Rússia soltaria leões nas ruas para impedir que a população circulasse – fake. Dessas 300 checagens, 295 eram falsas.

Os jornalistas recebem a notícia que está circulando, passam por aplicativo para checar se a imagem é uma montagem, falam com especialistas, entram em contato com outros países – quando essa notícia os envolve –, para então circular informando se é verdade ou não.

Em linhas gerais, as notícias falsas, quando circulam, buscam utilizar mecanismos para atrair a confiança do público, usando o termo de que foi um médico quem disse, ou quem liberou a informação.

Para Monari (2019), não há um projeto de lei que coíba as fake news, então cabe ao cidadão interpretar, ser consciente quando tem acesso à informação. Sacramento (2018) ressalta que não há como cessar a produção das fake news. Se considerarmos a facilidade de compartilhamento de informação nos tempos atuais fica fácil entender o quão difícil será o combate. Quando retomamos a ação da iniciativa privada #FatoouFake, composta por diversos profissionais de diferentes canais de comunicação, o que fazer então? Como deixar a responsabilidade apenas para a população que nem sempre tem os mesmos recursos, iniciativa ou conhecimento?

Educação midiática

Monari (2019) contextualiza o fato de que os jovens estão aptos às tecnologias e as utilizam com destreza, no entanto, no que diz respeito às fake News, falta discernimento para distingui-las ou discernir quais são os canais confiáveis. O ex-Ministro da Educação, Mendonça Filho, afirmou que [...] “Fake news são um desserviço à população e à democracia”, se referindo a uma das inverdades envolvendo o Ministério da Educação (BRASIL, 2019).

Diante dessa realidade, a contribuição docente é de extrema importância. Gravina (2018) sugere que o docente trabalhe uma notícia com os discentes, de forma crítica, incentivando a avaliação e desenvolvendo habilidades para julgarem os conteúdos publicados nas redes sociais. Ela ainda cita formas de envolver a comunidade, através de palestras que podem ser ministradas pelos discentes com o objetivo de esclarecer uma fake news através de oficinas e cursos.

Para Santos (2019), os alunos são fonte de informações, e oferecer um espaço para que utilizem com responsabilidade o conhecimento adquirido trará impacto para a comunidade. Escola e docentes podem propiciar oportunidades de pensamento crítico e troca de conhecimentos, o que será benéfico e dará novo sentido à formação de cidadãos responsáveis. A educação é, sem sombra de dúvidas, o melhor caminho para o uso consciente da internet, e não o repasse de falsas notícias.

A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) tem levantado a bandeira da educação contra as fake news, além de uma série de publicações com orientações sobre o assunto. Entre esses materiais estão manual, livros, trabalhos, e também uma ação chamada A Semana Global de Alfabetização de Mídia e Informação (AMI), com eventos que acontecem de forma local, porém com abrangência mundial. O tema do ano de 2020 abordou a desinformação e suas divisões, envolvendo o cenário atual de comunicação, tecnologia e informação.

Em uma ação da Associação de Acadêmicos e Profissionais de Comunicação da Nigéria, em 2019, foi desenvolvido um jogo de tabuleiro com o objetivo de educar sobre as fake news. Ao avançar no jogo, aparecem desenhos das mídias sociais utilizadas, como Whatsapp, Instagram, Facebook e comandos como: “[...] verifique se a informação é verdadeira; Se for machucar alguém não compartilhe; Pense antes de curtir a notícia; Se isso pode causar problemas delete; Todos merecem respeito; Discursos de ódio nos dividem” (UNESCO, 2019). Esse trabalho é um exemplo de como o tema fake news pode ser combatido de forma lúdica e diferenciada, propiciando uma educação descontraída.

A Revista Educação (2018) publicou uma matéria sobre a importância de trabalhar fake news em sala de aula, chamando a atenção para medidas simples como conferir se a conta da rede social é verdadeira ou não, trabalhar com imagens montadas em sala de aula, ensinar o aluno a não se prender na manchete apenas e sim no conteúdo, além de identificar o autor.

Marquetto (2010) aponta a França como um dos países que mais investem em educação midiática e a Finlândia como o país mais comprometido em educar e o mais preocupado em combater as fake News, e ressalta que o Brasil ainda precisa de políticas públicas e ações que transformem essa educação em midiática.

A UNESCO elaborou um livro denominado Alfabetização midiática e informacional: currículo para a formação de professores (2013), que trata do desenvolvimento profissional dos professores para o combate às fake news.

Metodologia

Este artigo iniciou-se a partir de uma pesquisa empreendida em um período atípico, envolvendo a pandemia de COVID-19, cujo evento impossibilitou que as aulas presenciais do curso de Pós-graduação em Educação Profissional e Tecnológica do Instituto Federal do Sul de Minas acontecessem. Juntamente com essa impossibilidade, nos deparamos com inúmeras fake News, complicando ainda mais a rotina de modo geral.

Identificamos então a demanda em tratar o assunto em sala de aula. Iniciamos uma busca por trabalhos sobre a temática utilizando os descritores: saúde; fake news; escola profissional e tecnológica; pandemia de COVID-19; ensino e fake news; com intuito de preconizar a formação completa do aluno.

A pesquisa bibliográfica ocorreu através da busca por artigos científicos, resoluções e legislações publicadas nas bases de dados SciELO; Lilacs; Biblioteca Virtual; além de livros e periódicos.

Por pesquisa bibliográfica, compreendemos toda a produção pública que tem por objetivo conhecer e condensar as informações, sem repetições, visando examinar um tema sob uma nova abordagem e oferecendo novas conclusões (MARCONI; LAKATOS, 2021).

Análise de resultados

Muito se tem discutido, no âmbito educacional, sobre preparar profissionais aptos e capazes de se adequarem às mudanças impostas, seja em função da tecnologia ou simplesmente pela necessidade de adaptar-se a uma nova realidade de mercado em seu contexto histórico, através das novas competências e habilidades requeridas dos profissionais e potencialmente desenvolvidas enquanto alunos (BARBOSA; MOURA, 2013; ROQUE, 2004)

Essa nova competência compreende apresentar aos discentes caminhos, para que possam explorar a pesquisa como forma de construir seu conhecimento, provocando interesse pela descoberta (DIAS, 2010). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) e a reforma do Ensino Médio ressaltam a importância de trabalhar além do conteúdo, reconhecendo a competência e habilidade dos discentes (ROQUE, 2004). Para Moreira (2016), o profissional que sai das Escolas Técnicas Profissionalizantes, além do conhecimento técnico, precisa ser um cidadão crítico e competente na resolução de problemas ou enfrentamento de obstáculos, precisa ser responsável e capaz de resolver questões não pertinentes a sua área técnica.

Diante das exposições pretendemos levantar possibilidades a serem trabalhadas com os discentes abordando as fake news, a partir da temática da saúde, sem a pretensão de esgotar todas as possibilidades de trabalhar o tema nas escolas, porque seria impossível traçar uma única ação capaz de combater o problema, assim como prever quais seriam os assuntos alvo para o futuro.

Partindo do fundamento epistemológico das metodologias ativas, esse artigo propõe o uso dessa abordagem como uma das ferramentas para o docente trabalhar fake news e saúde na formação profissional e tecnológica de forma crítica, incentivando a avaliação e desenvolvendo habilidades e novas competências.

A metodologia ativa é empregada quando o aluno participa da construção do seu conhecimento, e isso é possível em práticas de ensino em que há interação com o assunto, leitura, escrita, discussão, levantamento de questões sobre o tema. Permite ao aluno desenvolver habilidades e trabalhar de forma independente (BARBOSA; MOURA, 2013; OKANE; TAKAHASHI, 2006).

Segundo Dewey (1959), o aprendizado se dá quando compartilhamos experiências, e isso só é possível num ambiente democrático, em que não haja barreiras ao intercâmbio de pensamento.

Ao utilizar a metodologia ativa, o professor tem a oportunidade de avaliar o discente e sua aptidão, sua competência em solucionar o problema e como ele conduz o trabalho. É possível também fazer uma análise crítica quanto à aplicação da proposta para o conteúdo escolhido (MOREIRA; RIBEIRO, 2016; OKANE; TAKAHASHI, 2006).

Dentro das metodologias ativas, cabe evidenciar o aprendizado baseado em projetos, no qual o docente irá apresentar um problema ou um contexto real como pressuposto teórico de aprendizagem e, com isso, levantar perguntas, traçar a pesquisa, desenvolver o cronograma, analisar o melhor formato para apresentar a resolução. Podendo realizar apresentações através de oficinas, palestras para a escola ou externalizando com demonstrações para a comunidade, sendo essa última uma opção a ser avaliada no trato da fake news com abrangência para além dos muros da escola (BARBOSA; MOURA, 2003).

O estudo dirigido é também uma possibilidade que permite trabalhar fake news com o discente, através de questionamentos ou problematização, porém, com o professor direcionando o estudo, mostrando quais os possíveis caminhos a serem percorridos na tentativa de obter as respostas. Nessa metodologia, o docente permite a participação do aluno na construção do seu aprendizado e consegue conduzir a pesquisa de forma a transformar a maneira como se busca informação (LIBÂNEO, 2014; OKANE; TAKAHASHI, 2006).

Na metodologia denominada sala de aula invertida, o discente entra em contato com o material antes de entrar em sala de aula; com antecedência, o docente irá disponibilizar o conteúdo a ser estudado, que podem ser vídeos, textos, games, podcast, gravuras, imagens, de acordo com o objetivo da aula e do tema a ser tratado, sempre priorizando o conhecimento prévio. O aluno pode e deve pesquisar material complementar sobre o assunto. Nessa proposta, o aluno irá construir o seu conhecimento junto com o docente, pois mesmo com um material de estudo o professor não irá expor o conteúdo e seu posicionamento aos alunos; o tema será tratado em uma discussão em sala de aula, em que todos terão a oportunidade de expor suas ideias, questionar sobre o que foi estudado previamente, tirar dúvidas, comentar pontos positivos e negativos, interagir com os colegas, emitindo opiniões, refletindo sobre o assunto (VALENTE, 2014).

Ainda podem ser considerados os debates sobre temas da atualidade, permitindo aos discentes a exposição do seu conhecimento prévio sobre o assunto, levantando questões para pesquisa e trabalho em equipe (ARAÚJO, 2011).

Considerações finais

Consideramos que muito há para se discutir sobre o assunto. São necessários mais trabalhos, inclusive com relatos de experiências de sucesso ou não com a finalidade de traçar objetivos para que o docente e a escola utilizem o ambiente escolar como instrumento não só de aprendizado técnico/teórico, mas que auxiliem os alunos a construírem uma nova realidade. É de extrema importância e urgência que a escola ofereça um ambiente transformador para os alunos, com o intuito de evitar que sejam receptores e repetidores de fake news, contribuindo para uma sociedade capaz de refletir e analisar de forma crítica todo tipo de notícia ou acontecimento à sua volta.

Incertezas e novidades tendem a trazer angústias e frear a disseminação de desinformação, podendo facilitar e trazer leveza ao cotidiano das pessoas. Se pensarmos no atual momento do país, envolto nos problemas originados pela COVID-19, poderíamos estar passando por esse período sem ter que conviver com as fake news e nos fortalecendo para resolver impasses, nos constituindo como uma sociedade madura intelectualmente.

Como assinalamos inicialmente, consideramos ser necessário que os docentes assumam seu papel de tradutores do mundo, orientando crianças, jovens e adultos, contribuindo para a disseminação do conhecimento científico.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, E. F.; MOURA, D. G. Metodologias Ativas de Aprendizagem na Educação Profissional e Tecnológica. B. Tec. Senac, Rio de Janeiro, v. 39, n. 2, p. 48-67, maio/ago. 2013. Disponível em: https://www.bts.senac.br/bts/article/view/349. Acesso em: 20 nov. 2020.

BERTI, O. M. C. Quem cuida de quem cuida? As redes sociais em tempos de combate à pandemia da COVID-19 contra as fake news. O caso do Instagram e do WhatsApp da Rede de Solidariedade de Segurança do Trabalho no Piauí. Rizoma, Santa Cruz do Sul, v. 8, n. 1, p. 165-184, out. 2020. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/rizoma_e-issn. Acesso em: 12 ago. 2021.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 20 out. 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde sem fake news. Brasília, DF: MS, 2019. Disponível em: https://www.saude.gov.br/fakenews/. Acesso em: 01 nov. 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Sistema Único de Saúde. Brasília, DF: MS, 2020. Disponível em: https://antigo.saude.gov.br/sistema-unico-de-saude. Acesso em: 02 nov. 2020.

BUSKO, P. S.; KARAT, M. T. Ensino de ciências: o vírus zika e as fake news – proposições para uma prática docente. Revista Teias. Santa Catarina, v. 20, n. 57, p. 332-334. abr./jun. 2019. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistateias/article/view/38798. Acesso em: 02 nov. 2020.

DEWEY, J. Democracia e educação: introdução à Filosofia da Educação. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1959.

DIAS, I. S. Competências em educação: conceito e significado pedagógico. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 73-78. 2010. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141385572010000100008&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 19 nov. 2020.

DICIONÁRIO DE CAMBRIDGE. Significado de fake news. Inglaterra: Cambridge University Press. Disponível em: https://dictionary.cambridge.org/us/dictionary/english/fake-news. Acesso em: 24 out. 2020.

GOMES, A. C.; HANSEN, P. S. Intelectuais mediadores: Práticas culturais e ação política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.

GRAVINA, M. Educação uma vacina contra as fake news. Rio de Janeiro: Ciência Hoje, 2018. Disponível em: https://cienciahoje.org.br/artigo/educação-uma-vacina-contra-as-fake-news/. Acesso em: 14 nov. 2020.

JORNAL NACIONAL. Fato ou Fake chega a 300 checagens sobre o coronavírus. 2020. 1 vídeo (4 min). Publicado pela plataforma digital de streaming Globoplay. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/8761169/. Acesso em: 10 nov. 2020.

LIBÂNEO, J. C. Didática e práticas de ensino e a abordagem da diversidade sociocultural na escola. Livro 4, 00127. Fortaleza, CE: EdUECE, 2014. Disponível em: http://www.uece.br/endipe2014/ebooks/livro4/10.%20DID%C3%81TICA%20E%20PR%C3%81TICAS%20DE%20ENSINO%20E%20A%20ABORDAGEM%20DA%20DIVERSIDADE%20SOCIOCULTURAL%20NA%ESCOLA.pdf. Acesso em: 18 nov. 2020.

MARCONI, M. A; LAKATOS, E. M. Fundamentos da Metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 2021.

MARQUETTO, C. R. Distinguindo conceitos de educação para mídia: Alfabetização midiática como objetivo. Revista ECCOM, Lorena, v. 11, n. 22, p. 201-2012, jul./dez. 2020. Disponível em: http://unifatea.com.br/seer3/index.php/ECCOM/article/view/1138/1106. Acesso em: 16 nov. 2021.

MARTINS, P. C. et al. De quem é o SUS? Sobre as representações sociais dos usuários do Programa Saúde da Família. Ciência Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 3, p. 1933-1942, mar. 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/gSs8LMFXxF3k6h9whJJMqXP/?lang=pt. Acesso em: 13 nov. 2020.

MICHAELIS. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2015. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=educa%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 07 nov. 2020.

MONARI, A. C. P.; BERTOLLI FILHO, C. Saúde sem fake news: estudo e caracterização das informações falsas divulgadas no canal de informação e checagem de fake news do Ministério da Saúde. Revista Mídia e Cotidiano, São Paulo, v. 13, n. 1, p. 161-186, abr. 2019. Disponível em: https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/27618. Acesso em: 23 out. 2020.

MOREIRA, J. R.; RIBEIRO, J. B. P. Prática pedagógica baseada em metodologia ativa: Aprendizagem sob as perspectivas do letramento informacional para o ensino na educação profissional. Rev. Faculdade de Projeção, v. 12, n. 2, p. 93-114, 2016. Disponível em: http://revista.faculdadeprojecao.edu.br/index.php/Projecao5/article/view/722. Acesso em: 20 nov. 2020.

OKANE, E. S. H.; TAKAHASHI, R. T. O estudo Dirigido como estratégia de ensino na educação profissional em enfermagem. Rev. Esc. Enferm. USP, São Paulo, v. 40, n. 2, p. 160 – 169, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S008062342006000200003&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 18 nov. 2020.

ONU. Organização das Nações Unidas. Estudo da ONU revela que o mundo tem abismo digital de gênero. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2019/11/1693711. Acesso em: 23 out. 2020.

PAIM, J. S. O que é SUS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.

ROCHA, B. A. O avanço das fake news e sua retratação na mídia de referência. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIA DA COMUNICAÇÃO DA REGIÃO SUL, 19., 2018, Cascavel. Anais [...]. Cascavel: Intercom, 2018. Disponível em: http://portalintercom.org.br/anais/sul2018/resumos/R60-1477-1.pdf. Acesso em: 23 out. 2020.

ROQUE, G. O.; ELIA, M.; MOTTA, C. L. R. Uma ferramenta para avaliação de competência baseada no desenvolvimento de projeto. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, 15., 2004, Manaus. Anais [...]. Manaus, AM: UFAM, 2004. Disponível em: http://ojs.sector3.com.br/index.php/sbie/article/view/311/297. Acesso em: 23 nov. 2020.

SACRAMENTO, I. A saúde numa sociedade de verdades. Reciis – Rev. Eletron Comum Inf Inov Saúde, Rio de Janeiro, v. 12, n. 1, p. 4-8, jan./mar. 2018. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/1514/2201. Acesso em: 23 nov. 2020.

SANTOS, E. C. N.; LEÃO, V. P. Uma análise da repercussão de fake news, nas aulas de geografia da educação básica. In: ENCONTRO NACIONAL DE PRÁTICA DE ENSINO DE GEOGRAFIA POLÍTICAS, LINGUAGENS E TRAJETÓRIAS, 14., Campinas, 2019. Anais [...]. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas, 2019. Disponível em: https://ocs.ige.unicamp.br/ojs/anais14enpeg/article/view/2950. Acesso em: 20 out. 2020.

SANTOS, I. M. B. et al. Atuação na telemedicina Paraná: Experiência de acadêmicos da área da saúde da UEM em tempos de pandemia. Revista Aproximação, Guarapuava, v. 2, n. 4, p. 37-41, jul./ago./set. 2020. Disponível em: https://revistas.unicentro.br/index.php/aproximacao/article/view/6582/0. Acesso em: 23 out. 2020.

UNESCO. Corporate author Association of Communication Sholars and Professionals of Nigeria. Media and information literacy: fun game. Abuja: UNESDOC Digital Library, 2019. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000372421. Acesso em: 14 nov. 2020.

Notas

3 Cf. https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/educa%C3%A7%C3%A3o/. Acesso em 07/11/2020.

Notas de autor

1 Instituto Federal Sul de Minas (IFSULDEMINAS), Pouso Alegre – MG – Brasil. Mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos.
2 Universidade de São Paulo (USP), São Paulo – SP – Brasil. Professora Colaboradora. Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação. Universidade Ibirapuera. Professora do Programa de Pós-graduação em Educação. Doutorado em Educação. Pós-doutorado (IEA-USP).

Información adicional

Como referenciar este artigo: KAWACHI, E.; ECAR, A. Saúde, fake news e a docência na formação profissional e tecnológica. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1327-1340, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587. DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.15312

HTML generado a partir de XML-JATS4R por