Resumo: Este artigo faz uma descrição de duas das principais representações docentes presentes em cursos livres de idiomas, quais sejam: professores de inglês licenciados e não licenciados. A partir dessas relações dicotômicas, busca-se fomentar uma reflexão acerca do quão importante papel desempenha um professor licenciado no processo ensino-aprendizagem de língua estrangeira e a relevância da formação acadêmica e continuada para o pleno exercício docente do professor de línguas.
Palavras-chave: Exercício docente, Formação de professor de língua estrangeira, Cursos livres de idiomas, Ensino de língua inglesa, Formação acadêmica e continuada.
Abstract: This paper makes a description of the two main representations of teachers present at free language courses, i.e. college graduate English teachers and non-college graduate ones. From these dichotomic relations, it is intended to promote a reflection upon how important role plays a college graduate teacher within the teaching learning process of foreign language and the relevance of the academic and ongoing formation to the teaching work of a language teacher.
Keywords: Teaching work, English language teacher, Teaching learning proces, Academic and continual formation.
Artigos Originais
Representações do exercício docente em cursos livres de idiomas: reflexões acerca de relações dicotômicas no ensino de língua inglesa
Representations of teaching work at free language courses: reflections upon dichotomic relations within the English language teaching

Recepción: 05 Enero 2013
Aprobación: 10 Mayo 2013
Até pouco tempo atrás falar em globalização era lembrar-se do inglês como o principal idioma responsável por estabelecer a comunicação entre os diversos povos do mundo. Tal realidade, porém, torna-se bem mais evidente nos dias de hoje – em virtude da massificação das relações e interações proporcionadas pelo uso intensivo das tecnologias da informação e comunicação (TICs). Ainda nessa perspectiva, podemos fazer referência ao fato de que vivemos em um enorme planeta que se tornou pequeno diante da velocidade de difusão das informações, o que corrobora o que fora mencionado acerca das relações e interações quanto ao uso das TICs.
Pode-se dizer, então, que o inglês é determinante, diante do panorama delineado, no que tange a se ter acesso a todo conhecimento disponível no globo. Desse modo, mesmo com todas as mudanças ocorridas ao longo dos anos, parece que o aprendizado de inglês permanece como sendo algo com relevância inabalada, ou mesmo, intensificada.
Se há permanência da relevância para que se aprenda língua inglesa1, é evidente que a manutenção de cursos livres de idiomas, bem como o crescimento destes no mercado privado de ensino de línguas, têm se mantido constantes, já que estudos mostram que o ensino de língua inglesa na rede regular de ensino não é eficaz no que concerne a possibilitar aos educandos adquirirem fluência significativa no idioma alvo. Como bem salienta Schütz (2006)2, “enquanto o ensino fundamental não nos proporcionar essa qualificação básica, temos que obtê-la por outros meios.” Em outras palavras, é nesta lacuna que surgem os cursos privados de língua estrangeira, como possibilidade de cumprir com a tarefa de prover todos aqueles que desejam aprender uma língua estrangeira com as habilidades linguísticas necessárias para tal empreitada. Sendo assim, por conta dessa demanda, cresce, consequentemente, a procura por professores de língua estrangeira moderna, em especial, inglês. Qual é a formação destes professores? Esta é a pergunta central que norteia este trabalho acadêmico.
Sabe-se que o professor é uma peça de extrema importância dentro de qualquer contexto educacional. As implicações que surgem deste pressuposto levam a uma melhor caracterização desta profissão, sendo o professor de língua estrangeira, em especial inglês, concebido como um profissional que atua em uma área com características próprias (CELANI, 2008). Características estas que requerem deste profissional uma preparação especializada para atuar de forma proficiente no processo ensino-aprendizagem de línguas. Dessa maneira, as questões levantadas neste artigo tendem a fomentar uma discussão no que se refere à compreensão do quão importante papel desempenha o profissional licenciado “numa época em que a habilidade de se falar inglês torna-se uma qualificação tanto cultural como profissional básica, indispensável, quando seu aprendizado exige um considerável investimento de tempo e dinheiro [...]” (SCHÜTZ, 2006).
No primeiro momento, delimitamos o campo de atuação que é objeto de estudo deste trabalho. Em seguida, são feitas considerações acerca do “ser” e do “estar” professor de línguas estrangeiras em cursos livres de idiomas, levantando-se questionamentos sobre o papel desempenhado pela formação acadêmica e continuada para o pleno exercício docente nesses ambientes de ensino-aprendizagem. Por fim, apresentamos as principais características do professor licenciado capacitado para o pleno exercício docente em cursos de línguas.
O exercício docente em cursos livres de idiomas constitui-se em um ramo específico de ensino de línguas com características empregatícias próprias e cujas práticas de ensino aplicadas nestes espaços diferem sobremaneira do modo como se dá o processo ensino-aprendizagem na rede regular de ensino.
Ser é essência,
É ter certeza de que existe um ‘eu’
Na complexidade de estar vivo;
É ter determinada característica ou qualidade.
Estar é temporalidade;
É indicação de um estado, condição.
Verdade é Que se estou nem sempre sou.
Ora, é possível ser e estar?
Parece que dúvida maior não há.
Sendo assim, devo dizer:
Melhor do que estar é ser!
Ser ou Estar
Fuente: (Composição minha)
Em cursos livres de idiomas são encontrados dois tipos de profissionais ministrando aulas de inglês, a saber: o professor licenciado e o profissional que leciona, mesmo sem possuir formação acadêmica em Letras. Portanto, há profissionais que “são” professores de línguas e aqueles que “estão” professores. Ao desenvolver uma pesquisa sobre a identidade do professor de inglês no Estado de Minas Gerais (MG), Paiva (1997) concluiu que há “dois grandes grupos de profissionais que compõem os extremos do conjunto de professores” nesse Estado da Federação, quais sejam:
[...] de um lado, profissionais com fluência oral (a escrita muitas vezes deixa a desejar) adquirida através de intercâmbios culturais ou outro tipo de experiência no exterior e sem formação pedagógica; do outro lado, profissionais egressos de cursos de Letras (que lhes proporcionaram poucas oportunidades de aprender o idioma) e precária formação pedagógica. Os primeiros estão quase sempre nos cursos livres de idiomas e os segundos nas escolas de primeiro e segundo graus (grifo do autor, PAIVA, 1997, p. 9).
Quando um estudante procura por um curso de inglês, essencialmente, ele/ela não quer saber que seu/sua professor/a foi aos Estados Unidos diversas vezes, que tenha morado fora do país, ou mesmo estudado no exterior. Os fatores mencionados não são determinantes no que concerne a ser um profissional apto a lecionar um idioma com competência, embora sejam fatores bastante enriquecedores linguística e culturalmente. Que o professor deve falar a língua alvo fluentemente é algo que o aprendiz já espera (ou deveria), caso contrário, a situação torna-se bastante complicada. Na verdade, quem precisa possuir fluência, agora, são os estudantes. E, para tanto, precisam de um profissional comprometido com tal objetivo no processo ensino-aprendizagem de língua estrangeira. Dessa maneira, a partir do que afirma Paiva (1997), apreende-se que profissionais com fluência (competência comunicativa oral) encontram em cursos livres de idiomas um espaço para atuarem, já que é sabido que nesses ambientes educacionais há maior ênfase em práticas de conversação. Por outro lado, os profissionais licenciados, na maioria das vezes, saem da graduação em Letras para “ensinar uma língua que eles não falam e que não têm oportunidade de praticar durante o curso superior” (PAIVA, 1997, p.13), pois foram dadas a eles poucas chances de aprender o idioma.
Segundo Ricardo Schütz (2011), “cursos de línguas são classificados como ‘cursos livres’ pelo Ministério da Educação, não estando sujeitos a qualquer tipo de controle nem de reconhecimento. Tampouco as secretarias estaduais regulamentam cursos livres.” Em síntese, a partir do apontamento feito por Schütz (2011), podemos inferir que por não haver qualquer tipo de controle e reconhecimento por parte de órgãos do governo, em especial o Ministério da Educação, a decisão de contratar profissionais não licenciados para que os mesmos atuem ministrando aulas torna-se uma atividade cuja apreciação cabe somente à instituição de ensino contratante. Tal fato vai ao encontro do que afirma Celani (2008, p.36) quando diz que “a profissão, e particularmente a profissão de ensinar línguas estrangeiras, é invadida por todos os lados. Qualquer um pode ser professor,” o que também corrobora com os apontamentos feitos por Paiva (1997).
Ora, não seria esse tipo de empregabilidade uma depreciação para com a profissão do professor? Ao considerarmos ser o professor um profissional que pertence a uma atividade especializada, pois, estes são obrigatoriamente pessoas com formação acadêmica (CELANI, 2008, p.26), há necessidade latente de se fomentar um debate acerca da valorização destes profissionais. Não obstante, devemos refletir criticamente sobre a qualificação para os profissionais em serviço que pretendem, de fato, permanecer lecionando, já que a valorização do próprio docente depende de uma formação adequada.
Consideremos o seguinte trecho:
Se o profissional de língua estrangeira não fizer uso do idioma na sala de aula, ele estará abrindo mão da qualificação que mais o caracteriza e que o distingue de professores de outras matérias: a sua condição de ser bilíngue, de poder transitar entre duas culturas, a materna e a estrangeira. O que nós esperamos de um professor de inglês, espanhol ou japonês? Que ele fale o referido idioma estrangeiro e tenha uma competência profissional na metodologia de ensino de língua estrangeira (SCHMITZ, 2009, p.17).
A partir da fala de Schmitz (2009), apreende-se que uma das principais características do professor de língua estrangeira é a condição de ser fluente na língua alvo. Porém, como já mencionado anteriormente, há profissionais que saem dos bancos acadêmicos formados em Letras – Português/Inglês sem falar fluentemente a língua que irão lecionar.
É possível chegar à faculdade para cursar licenciatura em matemática sem ao menos ter um conhecimento acerca das operações básicas de adição, subtração, multiplicação e divisão? Bem, a resposta a esta pergunta parece bastante óbvia. No entanto, no que diz respeito ao curso de licenciatura em Letras – Português/Inglês -, muitos graduandos ainda acham que se deva aprender a falar inglês na faculdade, enquanto o esperado é que estes cheguem à Academia com conhecimento básico de inglês que os permitam a se comunicar em língua estrangeira, utilizando as quatro habilidades linguísticas básicas, quais sejam: ouvir, falar, ler e escrever em língua inglesa.
Diante dessa realidade, evidencia-se o fato de que estes profissionais licenciados que não falam inglês com fluência não terão espaço para atuarem na maioria dos cursos livres de idiomas, já que nestes ambientes educacionais a ênfase é maior quanto ao uso oral da língua em situações reais de comunicação. Em outras palavras, por conta da procura por professores para suprirem a grande demanda nos cursos livres de idiomas, o fato de se falar inglês fluentemente, por si só, já capacita um profissional não licenciado a ministrar aulas na língua alvo. A instituição de ensino, porém, tem uma responsabilidade muito grande sobre os seus aprendizes, ao proporcionar-lhes estudarem com professores realmente capacitados e competentes, o que requer a aquisição de “uma competência profissional na metodologia de ensino de língua estrangeira” (SCHMITZ, 2009, p.17).
Portanto, se levarmos em conta o que afirma Schmitz (2009), concluímos que para o exercício docente no ensino de línguas, além de possuir fluência na língua alvo, faz-se necessário alcançar a formação acadêmico-profissional cujo professor licenciado terá sua prática pautada na construção de conhecimentos didático-metodológicos de ensino de língua estrangeira, em especial.
É sabido que ter profissionais proficientes no quadro de funcionários de uma escola é sinônimo de excelência. Contudo, se por um lado encontrar profissionais licenciados no mercado que tenham fluência em inglês para trabalhar em cursos livres de idiomas é considerado complicado, resta lançar mão de contratação de profissionais não licenciados que falam o idioma alvo fluentemente. Porém, é preciso dar especial atenção aos profissionais que começam a lecionar inglês em cursos privados de línguas e acabam tendo interesse em seguir carreira nesta área.
De acordo com Paiva,
[...] o professor de inglês deveria ter, além de consciência política, bom domínio do idioma (oral e escrito) e sólida formação pedagógica com aprofundamento em linguística aplicada. Em número reduzido, temos profissionais bem formados dentro do perfil ideal que acabamos de descrever. A boa formação é, muitas vezes, fruto apenas de esforço próprio, pois os cursos de licenciatura, em geral, ensinam sobre a língua e não aprofundam conhecimentos na área específica de aprendizagem de língua estrangeira (PAIVA, 1997, p. 9).
Como podemos perceber, após a leitura atenta do que pontua Paiva (1997) acerca da formação acadêmica do professor de língua estrangeira moderna, dar condições para que o/a profissional termine a graduação e seja capaz de ministrar aulas com proficiência em qualquer ambiente de ensino é uma tarefa árdua e que não tem sido cumprida em sua totalidade.
Se fôssemos discorrer sobre as problemáticas que envolvem a “(de)-formação do professor de língua inglesa” (PAIVA, 1997) – sobretudo quanto à aquisição de fluência no idioma alvo em bancos acadêmicos – seria necessário dedicarmos um trabalho completo somente a essa temática. Por ora, cabe-nos discutir questões concernentes à qualificação dos profissionais em serviço que atuam ministrando aulas de inglês e que pretendem tornar-se professores de fato, por acreditarem ser este um caminho mais prático e direcionado. Além, é claro, de resolver o problema da demanda de mercado, tendo em atuação professores de língua inglesa qualificados para o exercício pleno da docência em cursos livres de idiomas.
Não se influencie pelo nome da escola, mas pelo currículo do instrutor. Não é a cor da camiseta que faz o bom jogador. O fato de escolas em diferentes cidades operarem sob o mesmo nome e usarem o mesmo livro não significa que sejam iguais, muito menos que os instrutores sejam todos bons. O fundamental (além da vontade do aluno) é o instrutor, não o nome da escola nem os materiais de ensino usados [...] (SCHÜTZ, 2006).
Ao analisar o apontamento feito por Ricardo Schütz (2006) podemos fazer algumas inferências no que tange ao papel do professor de línguas3 em cursos de idiomas. Primeiramente, evidencia-se a relevância do professor para o processo de ensino na medida em que este é considerado como peça fundamental, sendo estes bons ou maus profissionais.
Falar um idioma fluentemente não significa estar apto a lecioná-lo. Ao tomarmos como foco de análise os brasileiros que por falarem o português com fluência não são professores de língua portuguesa, percebe-se que com a língua inglesa, a situação tem se mostrado bastante diferente. Há muitas pessoas lecionando em cursos de idiomas, em especial, pelo simples fato de que estas falam inglês fluentemente. Ora, ser um falante fluente em uma determinada língua nada tem a haver com ser professor do referido idioma.
É evidente que há pessoas que demonstram um gosto especial pela língua estrangeira e, por isso, acabam tirando proveito da competência linguística adquirida durante anos de estudo e a coloca em prática ao ensinar. Bem sabemos que, muitas vezes, é difícil se manter em contato com o idioma alvo integralmente na vida cotidiana e, por isso, o fato de estar lecionando agrega um importante valor ao falante, ou seja, é uma maneira bastante produtiva de não perder a fluência.
Além disso, tira-se proveito da remuneração que é paga pelo serviço prestado – uma renda extra, proveniente do exercício docente. Mas seria esse um trabalho correto do ponto de vista ético do que é ser um profissional legalizadamente comprometido com o seu labor?
Segundo Gimenez,
[...] embora tenhamos no Brasil condições de considerar o ensino de língua estrangeira como uma profissão, em muitas instâncias este é visto como ocupação, isto é, não tem reconhecimento devido. Isto pode ser mais facilmente visível no setor privado que, como empregador, muitas vezes requer apenas o domínio da língua como requesito para ‘ser professor’ (GIMENEZ, 2004, p.172).
A fala de Gimenez (2004) é bastante pertinente, sobretudo, no que se refere a nos alertar sobre o risco de acharmos aceitável, enquanto educadores comprometidos com o processo ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras, que o ‘estar’ professor de inglês ocupe o lugar do ‘ser’ professor. Assim, devo afirmar que do ponto de vista prático, o ‘estar’ professor de línguas é um status temporário. A maioria das pessoas que leciona inglês sem que estas sejam licenciadas têm outros objetivos para o futuro profissional delas, exceto continuar ministrando aulas de língua estrangeira, caso contrário, optariam pela graduação em Letras.
Afinal, qual profissional não quer ser reconhecido pela sua formação? Fato é que ‘estar’ professor de línguas é um agravante dentro do processo de ensino como um todo, já que o exercício docente requer uma preparação específica cujo profissional que carece de tal formação não será capaz de colher “os resultados que dela advêm em termos de sua qualidade e eficácia” (CELANI, 2008, p.26).
Vejamos de modo mais detalhado a caracterização do ‘estar’ professor de línguas:
Fala o idioma alvo fluentemente, porém, muitas vezes não sabe como fazer com que seus alunos atinjam este objetivo – em virtude da falta de conhecimentos didático-metodológicos específicos;
Geralmente não possui amplo conhecimento acerca dos aspectos linguísticos da língua alvo. A utilização da língua em contextos comunicativos em sala de aula se dá de modo intuitivo sem, no entanto, ter sua prática pautada no desenvolvimento de um amplo repertório de ensino e de um desenvolvimento mais profundo sobre o ensino-aprendizagem de línguas;
Por não apresentar grande, ou mesmo nenhum conhecimento didático-metodológico, a base de sustentação da prática utilizada em abordagens em sala de aula é construída, instintivamente, ou mesmo a partir de suas próprias crenças baseadas no que seria ‘ministrar’ aulas de inglês; a experiência adquirida leva este profissional a ter maior segurança ao ministrar aulas. No entanto, percebe-se que o desenvolvimento da filosofia própria de ensinar destes profissionais carece de fundamentação teórica;
Muitas vezes não demanda comprometimento com o processo ensino-aprendizagem de seus alunos; o trabalho docente resume-se a uma oportunidade de ganhar dinheiro (um ‘bico’). Assim, muitos não se interessam por expandir o seu próprio conhecimento através da atualização profissional, não vão a oficinas, seminários, nem mesmo tentam ler sobre novas técnicas e métodos de ensino;
Quando oportunidades em outras áreas surgem, abandona o labor docente sem nenhum arrependimento, visto que este é um trabalho considerado temporário, como já mencionado.
A partir do que fora explanado acerca do ‘estar’ professor de línguas, percebe-se o quão deficitário se torna o processo ensino-aprendizagem de língua estrangeira do qual o profissional não licenciado faz parte, principalmente, quanto a garantir uma formação adequada aos educandos. Pois, como nos alerta Almeida Filho,
o papel preponderante que exerce o professor é traduzível no seu continuo esforço por criar caminhos de aprender e de adquirir para os alunos, de prever obstáculos (suavizando o encontro final com realidades linguístico-discursivas multissistêmicas), de premeditar experiências, criando climas favoráveis, oferecendo segurança ou proteção, desafio justo, desequilíbrios necessários, informações auxiliares e possibilidades de tomada de consciência sobre o complexo processo em andamento (ALMEIDA FILHO, 1997, p.30).
Diante da complexidade que envolve o processo de formar um educando, é necessário estar apto para exercer a árdua tarefa de professor e, assim, considerase o professor licenciado como sendo o profissional mais indicado para esta função. Porém, vale ressaltar que o simples fato de cursar uma licenciatura não é garantia de se tornar um excelente professor de línguas. Muitos outros aspectos relevantes devem ser considerados tal que profissionais licenciados atinjam este estágio. No que concerne a essa perspectiva Libâneo salienta que
muitas pessoas acreditam que o desempenho satisfatório do professor na sala de aula depende de vocação natural ou somente da experiência prática, descartando-se a teoria. É verdade que muitos professores manifestam especial tendência e gosto pela profissão, assim como se sabe que mais tempo de experiência ajuda no desempenho profissional. Entretanto, o domínio das bases teórico-científicas e técnicas, e sua articulação com as exigências concretas do ensino, permitem maior segurança profissional, de modo que o docente ganhe base para pensar sua prática e aprimore sempre mais a qualidade do seu trabalho (LIBÂNEO, 1994, p.28).
Portanto, a aquisição da formação docente institucionalizada (formal) é indispensável para dar condições para que os profissionais não licenciados, que atuam ministrando aulas de inglês em cursos livres de idiomas e que pretendem seguir carreira como professores, de fato, sejam reconhecidamente profissionais aptos a exercerem a docência com compromisso e competência.
Consideremos o seguinte trecho:
O professor de línguas estrangeiras, quando ensina uma língua a um aluno, toca o ser humano na sua essência – tanto pela ação do verbo ensinar, que significa provocar uma mudança, estabelecendo, portanto uma relação com a capacidade de evoluir, como pelo objeto do verbo, que é a própria língua, estabelecendo aí uma relação com a fala. Mas, se lidar com a essência do ser humano é o aspecto fascinante da profissão há, no entanto, um preço a se pagar por essa prerrogativa, que é o longo e pesado investimento que precisa ser feito para formar um professor de línguas estrangeiras. Sem este investimento não se obtém um profissional dentro do perfil que se deseja: reflexivo, crítico e comprometido com a educação (LEFFA, 2008, p. 353-354).
A partir da fala de Leffa (2008), encontramos subsídios pertinentes que nos conduzem também a uma melhor compreensão acerca do quão importante papel desempenha um professor de língua estrangeira, além de quão complexa é a sua formação.
No que concerne a tornar-se um profissional habilitado a exercer uma determinada função, alguns aspectos devem ser levados em conta. Primeiramente, a formação acadêmica deve ser encarada como a base de fundamentação teórica na qual o agente em formação constrói conhecimentos acerca da profissão que irá exercer ao longo de sua jornada profissional.
Libâneo (1994, p.27) assinala que “a formação profissional é um processo pedagógico, intencional e organizado, de preparação teórico-científica e técnica do professor para dirigir competentemente o processo de ensino.” É sabido ainda que qualquer profissional para estar apto a exercer suas funções docentes deve passar ao longo de sua caminhada acadêmica por um currículo que contemple também uma carga horária de prática e estágio, visto que, este é o momento em que os futuros professores poderão colocar à prova os saberes apreendidos durante as aulas de teoria em meio aos conceitos e princípios estudados.
Se por um lado o ambiente acadêmico exerce importante papel na construção do futuro professor – embora careça de mudanças significativas, é através da experiência que este tem a possibilidade de aprimorar sua práxis. No entanto, este processo só terá ‘sentido’ se o professor refletir periodicamente sobre suas ações; a reflexão é entendida, dessa forma, como um processo de constante análise e construção de saberes, evidenciando o caráter contínuo de formação do educador (FÉLIX, 2009).
Quanto ao trabalho realizado em ambiente acadêmico, pode-se dizer que formar um professor de línguas é uma tarefa multifacetada que muitas vezes não cumpre o seu real papel. Como bem pontua Fernandéz (2008), é possível constatar diversos fatores que contribuem para essa precariedade. Podemos destacar, dentre estes, o fato de que a disciplina Metodologia/Prática de Ensino é reduzida, muitas vezes, a simples realização de estágios, sendo os de regência, em muitos cursos, estágios não obrigatórios. Portanto, como forma de enfrentar todos estes pormenores, resta ao futuro professor investir em sua formação continuada (FERNANDÉZ, 2008, p.279).
É evidente que a formação do professor de inglês para atuar em cursos livres de idiomas difere sobremaneira da formação do professor de língua estrangeira moderna (LEM) que atua na rede regular de ensino. Sendo, assim, necessário destacar que o curso de licenciatura em Letras (português-inglês) cumpre o papel de tratar estas vertentes do exercício docente no ensino de língua inglesa de forma diferenciada, dando maior ênfase à formação do professor de línguas para atuar na rede regular de ensino, seja esta pública ou privada.
Ainda quanto à formação, no que concerne ao ato de ensinar uma língua estrangeira, Almeida Filho toma por base a expressão abordagem de ensinar, explicitando que
[...] se compõe do conjunto de disposições de que o professor dispõe para orientar todas as ações da operação global de ensinar uma língua estrangeira. A operação global de ensino de uma língua estrangeira compreende o planejamento de cursos e suas unidades, a produção ou seleção criteriosa de materiais, a escolha e construção de procedimentos para experienciar a língua-alvo, e as maneiras de avaliar o desempenho dos participantes. A abordagem é uma filosofia de trabalho, um conjunto de pressupostos explicitados, princípios estabilizados ou mesmo crenças intuitivas quanto à natureza da linguagem humana, de uma língua estrangeira em particular, de aprender e de ensinar línguas, da sala de aula de línguas e de papéis de aluno e de professor de uma outra língua (ALMEIDA FILHO, 2010, p.13).
Assim, buscando contemplar de forma teórica quais competências e habilidades se aplicam melhor ao trabalho docente em cursos livres de idiomas, é fundamental que o professor de língua estrangeira (LE) tenha consciência da importância de sua abordagem de ensino para a docência. Desse modo, tem-se que todo professor de LE atua em sala de aula a partir de uma filosofia própria de ensino que resulta em síntese de das seguintes fontes conceituais, a saber: língua, linguagem, língua estrangeira (LE), ensinar LE, e aprender LE (ALMEIDA FILHO, 2009).
Não há como falar da relevância da formação acadêmica para o professor de língua estrangeira sem levar em consideração a ‘prática de ensino’ deste. Nos currículos acadêmicos, esta disciplina deve fornecer uma oportunidade ao professor em formação de desenvolver, ou mesmo, aprimorar as habilidades de ensino através de experiências significativas, seja em discussões em sala de aula ou por meio de estágios supervisionados.
Segundo Richards & Farrell (2011), “a ‘prática de ensino’ sugere que o desenvolvimento de um professor de línguas envolve, primeiramente, a aquisição de um grupo específico de habilidades de ensino, as quais gradualmente se desenvolvem e melhoram com o exercício docente.” Sendo assim, os autores em questão estabeleceram 08 (oito) dimensões diferentes ligadas à natureza do aprendizado de (ser) professor de línguas, sendo estas:
Desenvolver as habilidades discursivas de um professor de línguas;
Desenvolver a identidade de um professor de línguas;
Desenvolver um repertório de habilidades de ensino;
Aprender como aplicar conhecimento profissional;
Desenvolver uma compreensão sobre como a aprendizagem é moldada a partir do contexto;
Desenvolver as habilidades cognitivas de um professor de línguas;
Desenvolver um ensino focado no educando;
Aprender como teorizar a partir da prática.
A Fig. 1 mostra como o profissional não licenciado – que atua ministrando aulas de língua inglesa em cursos livres de idiomas – pode ser tornar um professor de línguas licenciado, capacitado para o pleno exercício docente. Percebe-se ao analisá-la que o processo que enseja a construção de um professor de línguas (licenciado) configura-se por ser uma linha tracejada, na qual o aperfeiçoamento docente e a experiência profissional englobam a formação continuada deste profissional, sendo esta o melhor caminho a ser trilhado.
Observemos a ilustração a seguir cujo propósito é sintetizar o processo contínuo de formação que envolve a profissão especializada de um professor:

Podemos dizer que o acúmulo de saberes provenientes da experiência enquanto “ser” atuante em sala de aula materializa-se na prática profissional. É impossível conceber o processo de construção deste profissional sem levar em consideração este saber. Como bem nos alerta Abdalla,
[...] é importante assinalar que o conhecimento profissional/ prático do professor não se reduz a um conhecimento do “como”, mas a um campo de conhecimentos que compreende os saberes epistemológicos, os pedagógicos/os didáticos, os da experiência e aqueles que permitem o campo das possibilidades [...] [grifo meu] (ABDALLA, 2006, p.103).
Nessa perspectiva, a experiência profissional é representada na Fig. 1 através de uma linha tracejada cuja construção de saberes acerca do labor docente se dá ao longo da caminhada enquanto professor em serviço.
O presente trabalho objetivou fomentar uma discussão e refletir acerca da importância da formação acadêmica para os profissionais não licenciados que atuam ministrando aulas de inglês em cursos livres de idiomas.
É sabido que nestes ambientes educacionais são fornecidos treinamentos para que os instrutores de ensino de línguas em serviço possam desempenhar um melhor “papel” em sala de aula. Contudo, devemos levar em consideração o que diz Leffa (2008) quando nos alerta acerca da diferença entre treinamento e formação:
Um exemplo clássico de treinamento são os cursos às vezes oferecidos pelas escolas particulares de línguas aos seus futuros professores e que visam simplesmente desenvolver a competência no uso do material de ensino produzido pela própria escola. O objetivo imediato é ensinar o professor a usar aquele material; no dia em que o material for substituído, o professor deverá fazer um outro curso. Geralmente não há condições de dar ao professor um embasamento teórico; buscam-se resultados imediatos que devem ser obtidos da maneira mais rápida e econômica possível. Formação é diferente: busca a reflexão e o motivo por que uma ação é feita da maneira que é feita. Há, assim, uma preocupação com o embasamento teórico que subjaz à atividade do professor. Enquanto o treinamento limita-se ao aqui e agora, a formação olha além (LEFFA, 2008, p.355).
Ao analisar os apontamentos feitos por Leffa (2008), percebemos o quão necessária para o processo ensino-aprendizagem de língua estrangeira se torna a formação do professor de línguas tal que este profissional possa vir, efetivamente, a atuar de maneira qualificada em cursos livres de idiomas, por ser este contexto de ensino um campo em permanente crescimento e expansão. É através da formação que podemos pensar em um exercício docente qualificado dentro de um processo que se faz contínuo.
Assim, os educandos só tendem a ser beneficiados, pois estarão em contato, em ambiente formal de instrução, com profissionais especializados para auxiliá-los na melhor construção do conhecimento ao longo de todo o processo de aquisição da língua alvo.
No mais, vale ressaltar, como já mencionado, que as instituições privadas de ensino de idiomas têm uma responsabilidade muito grande sobre os seus aprendizes, ao proporcionar-lhes estudarem com professores realmente capacitados e competentes.
No que concerne à grande complexidade que envolve o processo de formar um educando na língua alvo, é possível afirmar que o profissional licenciado capacitado será o que melhor desempenhará o papel de contribuir com a formação de seus alunos, pois estes são professores que, efetivamente,
Falam o idioma alvo fluentemente, sabendo como fazer com que seus alunos atinjam este objetivo;
Apresentam conhecimento acerca dos aspectos linguísticos do idioma alvo tanto intuitivamente quanto por dedução;
Possuem conhecimento didático-metodológico. A base de sustentação da prática utilizada em abordagens em sala de aula é construída a partir de formação acadêmica, cursos de capacitação e experiência profissional. Tornase um professor pesquisador, já que o verdadeiro docente é aquele que nunca deixa de aprender. Quanto mais se ensina, mais se aprende. Entende que a formação continuada é a base fundamental para um exercício docente eficaz;
Demandam comprometimento com o processo ensino-aprendizagem de seus alunos;
Apresentam proficiência quanto à fluência no idioma a ser lecionado permanecendo nessa profissão por vocação. Quanto maior o tempo de trabalho, mais experiente torna-se o professor.
Dessa maneira, espera-se que este trabalho possa vir a contribuir, sobremaneira, com novas pesquisas no meio acadêmico, esperando que os questionamentos levantados venham, de fato, servir como aportes teóricos para reflexões futuras no que tange à formação adequada de profissionais em serviço que atuam dando aulas de língua inglesa em cursos livres de idiomas.
