As tecnologias da informação e comunicação como processo de inclusão dos ribeirinhos do Baixo Madeira em Porto Velho (RO)

The information and communication technologies as a process of inclusion of the ribeirinhos do Baixo Madeira in Porto Velho (RO)

Las tecnologías de la información y comunicación como proceso de inclusión de los ribereños del Baixo Madera en Porto Velho (RO)

Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição 4.0.

A relação entre Comunicação e o desenvolvimento de um território é foco de estudo acadêmico há algumas décadas. Um dos pioneiros, Schramm (1970), fomentou o debate a partir de um ambiente caracterizado pela comunicação de massa e de uma compreensão de desenvolvimento ainda marcada prioritariamente pela cadência do crescimento econômico. Tal combinação resultou em uma perspectiva difusionista, que baseada na ideia de modernização por meio do acesso aos meios de Comunicação (SERVAES, 2003).

Tal perspectiva foi claramente superada por se fundamentar em uma visão limitada do desenvolvimento, marcada pela perspectiva verticalizada da comunicação e dos próprios processos de desenvolvimento. O mero acesso aos meios de comunicação é insuficiente para, por si só, gerar desenvolvimento. Participação, apropriação e ampliação dos objetivos de desenvolvimento são alguns dos aspectos a serem considerados na relação comunicação-desenvolvimento.

Sen (2000) destaca o acesso à informação e a transparência como condições para uma sociedade desenvolvida, esta compreendida como uma sociedade cujos indivíduos podem exercer suas escolhas livremente, sem que restrições sociais, econômicas, políticas, culturais as limitem. Nota-se na perspectiva de Sen uma reelaboração do conceito de desenvolvimento que embasou a obra de Schramm.

O contexto comunicacional contemporâneo, marcado pelas mídias digitais estruturadas me rede, ampliou as possibilidades de comunicação reconfigurando o modelo de comunicação de massa estudado por Schramm (1970). Com o avanço das tecnologias de informação e comunicação (doravante TIC), o processo de comunicação entre os povos de uma região remota com grandes centros urbanos ficou mais ágil e mais econômico.

O Brasil, por suas dimensões continentais e condições geográficas e socioespaciais, possui grandes disparidades no que tange à ocupação e organização territorial. É o caso, por exemplo, do distrito de Calama, localizado a 205 quilômetros da capital de Rondônia, Porto Velho, na região conhecida como o Baixo Madeira. O trajeto da capital até o distrito é feito por vias fluviais, com duração de cerca de oito horas de barco descendo o rio Madeira. A comunidade, que vive isolada de outros municípios, possui população residente de 2.782 pessoas. A população do local vive basicamente do extrativismo, da pesca e da agricultura.

A Internet chegou ao distrito de forma precária no ano de 2015. Assim, os moradores passaram a utilizar as mídias sociais para compartilhar e receber informações, tanto no que diz respeito ao âmbito familiar como da sociedade em geral. Nesse sentido, este trabalho visa entender como a comunidade que reside no distrito de Calama, localizado no Baixo Rio Madeira, em Porto Velho – Rondônia, usa as mídias sociais como fator de acesso à informação.

Este estudo justifica-se por convergir com a proposta de Beltrão (1980) que dá visibilidade aos processos de comunicação em grupos minoritários e/ ou marginalizados, que revela a busca de uma perspectiva da comunicação para o desenvolvimento.

Partindo da concepção de Castells (2003), entende-se que a Internet impactou profundamente a sociedade contemporânea pelo fato de ampliar o acesso das pessoas às informações, tal como o fato de as pessoas poderem produzir e compartilhar conteúdos de seu interesse.

Ainda na visão do autor, a Internet é o tecido da vida em sociedade na contemporaneidade. A tecnologia é, atualmente, o que a eletricidade foi na era industrial, de modo que a internet pode ser equiparada tanto a uma rede elétrica quanto ao motor elétrico. O autor afirma ainda que a internet é um meio de comunicação que permite, pela primeira vez, a comunicação de muitos com muitos em escala Global. O uso da internet como sistema de comunicação explodiu no final do segundo milênio.

Na mesma ótica, tem-se o entendimento de Levy (1999), ao afirmar que a comunicação pode ser separada em três categorias: um-todos; um-um; e todos-todos. Em síntese,

...um-todos: um emissor envia a mensagem a um grande número de receptores, tendo como exemplos o rádio e a televisão;

um-um: nessa categoria, as relações de comunicação individual são estabelecidas ponto a ponto, por exemplo, telefone e correios; e

todos-todos: compreende-se como uma comunicação possibilitada pelo ciberespaço, que permite às comunidades constituírem, de forma progressiva e de maneira cooperativa, um contexto comum, como, por exemplo, as conferências eletrônicas ou mesmo os ambientes de educação a distância. (LEVY, 1999, p.69).

Nesse contexto, o fato é que, segundo Gomes (2002), o problema da exclusão digital se apresenta como um dos maiores desafios deste início de século, com implicações diretas e indiretas sobre os mais variados aspectos da moderna sociedade, a sociedade do conhecimento. A conhecida desigualdade registrada entre pobres e ricos entra agora na era digital e ameaça se expandir com a mesma rapidez das Tecnologias de Informação e Comunicação. Nesta nova sociedade, o conhecimento é um driver fundamental para aumentar a produtividade e a competição global. Alerta que é fundamental para a invenção, para a inovação e para a geração de riqueza, uma vez que as TIC proveem uma fundação para a construção e aplicação do conhecimento nos setores públicos e privados.

Além disso, as TICs podem oferecer vantagens aos usuários, sendo que a principal delas é facilitar o acesso ao vasto volume de informação nos mais variados níveis de conhecimento. Até porque, para Gomes (2002), tais recursos tecnológicos podem cumprir também um papel social, provendo informações àqueles que tiveram esse direito negado ou negligenciado, e, com isso, permitir maiores graus de mobilidade social e econômica. Kleine (2013) observa que, em um contexto tecnocrático, o uso das tecnologias divide as pessoas em hábeis e inábeis, em capazes e incapazes de vincular-se com o desenvolvimento. Tais valores tendem a colocar os excluídos da tecnologia em papeis sociais menos valorizados socialmente. Dessa forma, na sociedade contemporânea, a tecnologia afeta diretamente a vida das pessoas, e sua ausência pode ser considerada um prejuízo (KLEINE, 2013). Ressalta-se que a autora faz um contraponto e questiona se as pessoas menos favorecidas, com acesso às tecnologias, sempre se beneficiarão das TIC como elemento de transformação de suas vidas, pois a relação não é automática e depende de um conjunto de variáveis de como as TIC são inseridas e apropriadas em determinado grupo social. No entanto, é fato que a ausência de uso das TIC gera exclusão sob o prisma dos valores contemporâneos.

Nesta mesma linha de entendimento, Akhras (2011) explana que os estudos sobre o grau de desenvolvimento da sociedade da informação têm como foco as oportunidades para a sociedade em rede, que, de modo geral, mostram que o desenvolvimento da sociedade da informação no Brasil tem sido mais lento do que em outros países que exploram mais efetivamente a utilização da internet como meio de desenvolvimento.

Desta forma, o referido autor destaca que:

Para países economicamente menos desenvolvidos, a incorporação desse novo conceito coloca um duplo desafio – o acesso à telefonia e o acesso à Internet. O conceito de universalização deve abranger também o de democratização, não privilegiando apenas a forma física, mas também o conteúdo. Deve permitir que as pessoas sejam provedoras ativas de conteúdos que circulam na internet. Portanto, é extremamente necessário promover a alfabetização digital, ou seja, que capacite as pessoas a utilizar as diversas mídias de acordo com suas necessidades, considerando que o capital intelectual é cada vez mais imprescindível para que o cidadão se coloque no mercado de trabalho. (AKHRAS, 2011, p.2).

Diante disso, a reflexão aponta que o acesso à tecnologia digital vai além do acesso à informação como notícia. Na perspectiva difusionista, as pessoas terão condições de estudar e buscar formação técnica e intelectual, mesmo estando em regiões de difícil acesso. No entanto, os usos e apropriações de tecnologia que tornou-se condição de manutenção do modelo de sociedade dominante por comunidades isoladas pode superar tal perspectiva. Justifica-se este estudo para verificar quais usos os moradores do distrito de Calama inicialmente atribuíram às mídias sociais, a partir de sua inserção, ainda que tímida, na comunidade.

No que tange à eficácia das Redes, Martelo (2001) alerta que o conceito de redes tem dupla aplicação, sendo a primeira a utilização estática e a segunda a utilização dinâmica.

Sobre essa questão, Marteleto diz o seguinte:

A utilização estática explora a rede estrutura, ou seja, lança mão da ideia de rede para melhor compreender a sociedade ou um grupo social por sua estrutura, seus nós e suas ramificações. Essa foi a contribuição que o enfoque de redes sociais deu à sociologia e a outras ciências. A utilização dinâmica explicita a rede sistema, o que significa trabalhar as redes como uma estratégia de ação no nível pessoal ou grupal, para gerar instrumentos de mobilização de recursos. (MARTELETO, 2001, p.03).

Para a autora, o conceito de redes é conflituoso entre diferentes correntes nas ciências sociais, que criam os pares dicotômicos sendo indivíduo/sociedade; ator/estrutura; abordagens subjetivistas/objetivistas; enfoques micro ou macro da realidade social colocando cada qual a ênfase analítica em uma das partes.

A antropologia estrutural entende as redes como descritivas, servindo para identificar o caráter perene das organizações e dos comportamentos sociais. Já a linha do individualismo metodológico desconstrói essa concepção, privilegiando o ponto de vista do agente que produz sentido, e as relações sociais na formação do seu agir. As redes surgem como um novo instrumento face aos determinismos institucionais. Por outro lado, o trabalho pessoal em redes de conexão é tão antigo quanto a história da humanidade, mas apenas nas últimas décadas, as pessoas passaram a percebê-lo como uma ferramenta organizacional. (MARTELETO, 2001, p.03).

Por outro lado, Castells afirma que Rede é um conjunto de nós interconectados, onde a formação de rede é uma prática humana muito antiga, isso porque:

As redes ganharam vida nova em nosso tempo transformando em redes de informação energizadas pela internet. As redes têm vantagens extraordinárias como ferramentas de organização em virtude de sua flexibilidade e adaptabilidade inerentes, características essenciais para sobreviver em um ambiente em rápida mutação. (CASTELLS, 2003, p.07).

Nesse entendimento, o autor afirma que é por isso que as redes estão proliferando em todos os domínios da economia e da sociedade, desbancando organizações verticalmente organizadas e burocracias centralizadas e superando-as em desempenho.

Ampliando para redes sociais, pode-se verificar a amplitude delas na sociedade. As redes sociais foram definidas por Boyd e Ellison (2007) como aquelas ferramentas que possibilitavam aos seus usuários ter um perfil particular, isto é, ter uma grande publicidade de suas redes sociais e também a possibilidade de interagir e compartilhar seus conteúdos, assim como os conteúdos de outras pessoas. As redes sociais evoluíram para o ambiente online onde as pessoas não apenas publicavam suas redes, mas igualmente para transformá-las. Essas transformações, decorrentes dos novos sentidos negociados e construídos através da comunicação, proporcionaram que essas redes tornassem muito mais "associativas" (RECUERO E ZAGO, 2009).

Os autores acima colacionados afirmam que, em lugar de redes sociais construídas com base na interação social, mantidas por essa interação e limitadas ao tempo e investimento de cada ator, as redes sociais publicadas nessas ferramentas passaram a ser constituídas de conexões construídas pelos sites, mantidas por eles e independentes do investimento nas relações sociais de cada ator. Por conta disso, as redes sociais online tornaram-se representações muito maiores das redes sociais, diferentes de seus correspondentes off-line.

Com o desenvolvimento de tecnologias, as comunidades que se encontram em lugares distantes conseguem interagir com o mundo da mesma maneira que todas as populações, uma vez que encontrem infraestrutura para fazer. Para compartilhar conteúdos e se informar, as pessoas têm se utilizado de ferramentas criadas recentemente.

Segundo uma pesquisa realizada pela Digital in 2018 Global Overview, pelo menos 62% da população brasileira estava conectada nas redes sociais. O YouTube com 60% está entre os mais acessados, na sequência, aparece o Facebook com 59%, o WhatsApp com 56% e o Instagram era acessado por 40% dos brasileiros, à época da pesquisa.

Essas tecnologias são acessadas principalmente por celulares smartphones, os quais estão presentes em 90% da população brasileira. As tecnologias digitais possuem o diferencial de uma comunicação mais fluida, onde emissor, meio e receptor podem ser os mesmos. Nesse sentido, as redes sociais mais utilizadas são o YouTube, Facebook e o WhatsApp por facilitarem o acesso (TELECOM, 2016. SECOM, 2016).

Para Deponti e Kist (2017), as tecnologias fomentam a mediação entre as pessoas e os mais variados veículos de comunicação; por exemplo, televisão, rádio, jornais e sites. Desse modo, é possível ter acesso a esses veículos de comunicação mesmo estando em comunidades isoladas geograficamente. Daí afirmar que, de acordo com Castells (2017), o desenvolvimento da Internet, em certa medida, facilitou o acesso à informação e ao conhecimento, tanto em escala mundial como em escalas circunscritas a países ou regiões.

Por seu turno, Santos (2006) argumenta que a maior barreira a impedir a inclusão das pessoas que residem em comunidades isoladas está relacionada à infraestrutura. Para este autor, a chegada das tecnologias e o acesso às informações podem tornar um local isolado mais perto dos grandes centros.

Kleine (2013) também segue nesta direção, no sentido de opinar que a falta de acesso pode promover ainda mais o isolamento de um lugar. Ademais, a autora entende que apenas o acesso não garante inclusão, pois uma pessoa em comunidade isolada pode até ter acesso a uma tecnologia, porém, pode não conseguir se apropriar desta tecnologia, enquanto outros na mesma comunidade conseguem se apropriar de maneira fácil. Logo, pode ocorrer o sentimento de exclusão, mesmo em uma comunidade com acesso às tecnologias. Tais possibilidades enfatizam a relevância de estudos que buscam compreender como se deu a apropriação das TIC e suas especificidades.

Com o objetivo de observar como o uso da Internet está provocando transformações no distrito de Calama, em relação ao modo de as pessoas se comunicarem e como elas recebem e compartilham informações, realizou-se uma pesquisa exploratória. A pesquisa foi realizada com a população do centro urbano, onde foram entrevistadas 386 pessoas da localidade. Nesta investigação, os dados são do tipo primário e foram obtidos por meio de questionário estruturado. A observância do uso das mídias sociais pela população de Calama é uma fase inicial de uma pesquisa que pretende verificar se as TIC ampliaram o desenvolvimento da localidade, a partir do conceito de desenvolvimento proposto por Sen (2000). Enfatiza-se que o mero acesso às tecnologias é suficiente para gerar desenvolvimento, no entanto, para se estabelecer as relações entre comunicação e desenvolvimento a primeira etapa diz respeito ao acesso. Não se trata da adoção de uma postura difusionista, e sim da verificação das condições de acesso para embasar uma reflexão mais ampla de comunicação para o desenvolvimento.

Dito isto, para a pesquisa de abordagem quantitativa, foi utilizada a fórmula de cálculo amostral finita, de amostragem não probabilística por acessibilidade.

Neste compasso, estima-se que em Calama residam cerca de 2.782 pessoas, conforme dados extraídos do IBGE (2016). Na coleta de dados, os instrumentos utilizados foram um questionário estruturado aplicado aos moradores de Calama e entrevistas semiestruturadas realizadas com o administrador do distrito e com o administrador local da Emater.

Com efeito, Mattar (2001) estabelece que a aplicação de questionário conta com as seguintes vantagens: pode ser aplicado a qualquer seguimento da população; fornece uma amostragem melhor da população em geral; possibilita avaliar conduta, atitudes, reações e gestos; e permite obter dados que não se encontram em fontes documentais.

Para tanto, foi feito um estudo cujo questionário foi elaborado com 46 questões, todas elas estruturadas e construídas com base no framework de escolha apresentado por Kleine (2013), um portfólio de capital e elementos de sua representação visual e recursos. Este artigo apresenta uma parcela dos resultados no que diz respeito a acesso e usos das mídias sociais pela população estudada.

Na fase de coleta de dados, foi utilizado o software SIAP – Sistema para análise de pesquisas na versão Android, e, nas fases de tabulação, interpretação e análise dos dados coletados, foram utilizados os softwares IBM SPSS Statistics - versão 22 e Microsoft Excel - Versão Office 365.

Seguidamente, será apresentada a análise e a discussão de uma parte dos resultados extraídos da pesquisa quantitativa para compreender o tema abordado neste artigo.

A pesquisa foi aplicada no distrito e contou com a participação de 386 moradores; no entanto, com o filtro aplicado à pesquisa foram excluídos 73% dos pesquisados por terem declarado que não acessam a Internet, o que resultou em 104 moradores entrevistados com acesso à Internet. Isso porque o objetivo da análise desse público, especificamente, é que acessem as redes sociais. Somente assim, é possível verificar o comportamento do público que acessa a Internet. Verifica-se que a inserção da Internet na comunidade ainda é tímida, seja por dificuldades estruturais ou por questões culturais.

Calama é uma região isolada geograficamente, e, neste sentido, os hábitos dos ribeirinhos, no sentido de consumo de informação, não seguem à risca a tendencial do restante do país. Isso foi constatado na pesquisa.

O exemplo mais perceptível está nas redes socais mais acessadas no local. O WhatsApp é o aplicativo mais usado no distrito, ampliando a forma de os moradores se comunicarem. Trata-se de um aplicativo multiplataforma de mensagens de textos instantâneas e chamadas de voz gratuitas, que permite compartilhar vídeos, fotos, arquivos, textos e áudios.

Conforme o Gráfico 1, exposto a seguir, pelo menos 80,8% dos respondentes usam o WhatsApp. Logo, verifica-se que as pessoas trocam informações a todo momento. Tanto é que chegam a utilizar o aplicativo para compra e venda de produtos, bem como conferir os preços dos seus produtos que são vendidos em outra região.

Já 76% optaram pelo Facebook, uma rede social gratuita na qual os usurários podem publicar fotos e vídeos, além de escrever seus pensamentos de modo público ou privado. Nesta rede, os moradores de Calama compartilham conteúdos informacionais produzidos por eles ou por outras pessoas, porém, de seu interesse.

Por sua vez, o Instagram é acessado por 23,1% dos entrevistados, que disseram usar o Instagram, uma rede social gratuita, para postar fotos e vídeos que podem ser visualizados pela rede de amigos. Por fim, 9,6% afirmaram usar o Twitter, que também é uma rede social gratuita a qual funciona como um microblogging, permitindo postar fotos e textos.

Gráfico 1
Redes sociais
elaborado pelo autor (2019)

É certo que, sem a Internet, a possibilidade de os moradores do distrito de Calama cobrarem providências das autoridades políticas era muito limitada, dada a distância do distrito da área urbana de Porto Velho. Com a chegada da Internet, ficou mais fácil para os moradores reivindicarem suas necessidades às autoridades, de forma que passaram a exercer esse ‘poder’, como pode ser percebido no Gráfico 2.

Nesse sentido, 55,77% dos moradores do distrito de Calama afirmaram que se sentem com mais voz (poder) ao utilizar o acesso à Internet para expor suas necessidades.

Gráfico 2
Internet como porta-voz
elaborado pelo autor (2019)

Outra pergunta com respostas múltiplas teve o objetivo de saber com quais finalidades os moradores acessam a Internet. Conforme o Gráfico 3, pelo menos 88, 5% disseram que é para acessar o WhatsApp.

Dos entrevistados, 76,9% acessam para atualizar-se com as notícias locais, nacionais e internacionais; outros 75% para entrar nas redes sociais, dentre elas, o Facebook, Instagram e Twitter. Há também relatos de que o envio e recebimento de cartas diminuíram, pois 47,1% usam o e-mail como forma de se comunicar.

Outra transformação provocada pela chegada da Internet foi a maneira de ouvir música: 69,2% dos entrevistados deixaram de lado rádio e CDs, optando por baixar músicas pela Internet e ouvir pelo celular. Nessa mesma linha, 68,3% veem vídeos por aparelhos on-line

No quesito educação, a chegada da Internet também tem provocado transformações: 66,3% informaram que acessam para pesquisar conteúdo educativo de seu interesse.

Nesse diapasão, um dado que chama atenção é o acesso às operações bancárias, que já são realizadas por 22,1% dos que têm acesso à Internet no distrito de Calama. Os moradores do local, antes da Internet, não conseguiam realizar essas operações; para isso, era necessário viajar de barco até a cidade de Porto Velho.

Tal realidade pode ser constatada no Gráfico 3, que traz a finalidade pessoal para o acesso à Internet.

Gráfico 3
Finalidade do acesso à internet
elaborado pelo autor (2019)

Portanto, verifica-se que os moradores em comunidades isoladas recorrem às tecnologias para terem acesso a serviços que não eram oferecidos no local devido à distância dos grandes centros urbanos. Um exemplo disso, conforme já dito, é a simples operação bancária que, até então, não era possível ser feita no distrito de Calama por não haver bancos no local. Com a chegada da Internet, essas operações começaram a ser realizadas.

Verificou-se que a inserção gradual da Internet na comunidade aproxima a comunidade dos modelos de comunicação dominantes em localidades mais centrais, caracterizados pela forte presença de veículos comerciais. O sistema de mídia brasileiro é categorizado por Hallim e Mancini (2004) como pluralista polarizado, caracterizado por um sistema de mídia de jornais com baixa circulação, centralidade da mídia eletrônica e orientação à elite política.

Enfatiza-se que seria prematuro dizer que tais apropriações das TIC geram desenvolvimento local. Sob o prisma difusionista de Schramm (1970), seria possível afirmar que o acesso aos meios de comunicação digital iniciou um processo de modernização na comunidade, visão obsoleta para o entendimento contemporâneo de desenvolvimento. A perspectiva de desenvolvimento baseada na Teoria da Modernização pautava-se no progresso econômico decorrente da difusão do capital e das inovações tecnológicas, em um movimento de transferência dos países ricos para os considerados subdesenvolvidos (PERUZZO, 2014; SERVAES, 2003). Os meios de comunicação teriam o papel de difundir a inovação, em um ambiente caracterizado pela comunicação de massa. A compreensão contemporânea de desenvolvimento supera a visão economicista e foca no bem-estar social (SEN, 2000; KLEINE, 2013), cujo alcance pode implicar no acesso às mídias, que se estruturam atualmente em redes. Em suma, o mero acesso às TIC não garante o desenvolvimento, mas as TIC fazem parte da sociedade contemporânea e podem ser partícipes dos processos de desenvolvimento.

Ainda assim, é impossível negar as mudanças que se imprimem sobre a comunidade. O seguimento desta pesquisa permitirá verificar, a posteriori, os efeitos da inserção da Internet em Calama e como nesta localidade se estabeleceu a relação comunicação e desenvolvimento.

Este trabalho teve o objetivo de verificar como a população do Baixo Madeira, em Porto Velho, Rondônia se apropriou das redes sociais após a chegada da Internet em 2015. Também buscou analisar como é feita a interação da população que vive no distrito de Calama, distante 200 quilômetros de Porto Velho, com as demais regiões.

Na realização desta pesquisa, verificou-se que a Internet é a ferramenta que contribui para para aproximar por meio do fluxo de informações regiões isoladas, mas que os efeitos deste processo para o desenvolvimento não são homogêneos nem conhecidos, demandando estudos caso a caso.

Também foi observado que as pessoas se apropriaram da Internet e passaram a utilizar as redes sociais para se comunicarem no âmbito familiar e social. Mesmo estando em um local de difícil acesso, as pessoas utilizam as redes sociais para, além de receber conteúdos informacionais, elas passaram a produzir e compartilhar esses conteúdos. Não foi objeto deste estudo verificar a que tipo de conteúdo os usuários das TIC foram expostos, o que poderia ser um novo prisma para pesquisas futuras, dada a controvérsia e a circulação de notícias falsas e conteúdo sem checagem proporcionado por estes meios.

Por fim, foi visualizado que, em termos gerais, os moradores de Calama se sentem com mais poder para reivindicar das autoridades melhorias para sua localidade, graças à tecnologia como ferramenta viabilizadora de transformações. Esta sensação pode tanto resultar em efeitos positivos quanto pode ser uma sensação inicial provocada pelo acesso recente às TIC, visto que não ficou claro se houve resultados efetivos das reivindicações declaradas pelos entrevistados.

Enfim, as relações entre comunicação e desenvolvimento, ou os caminhos da comunicação para o desenvolvimento demandam o olhar acadêmico para consolidação e construção de uma epistemologia adequada ao contexto contemporâneo.