Resenhas & críticas

![]() | CASTRO Janio Roque B. Da casa à praça pública: a espetacularização das festas juninas no espaço urbano. 2012. Salvador. Edufba. 340pp.. 978-85-232-0956-8 |
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A obra “Da casa à praça pública: a espetacularização das festas juninas no espaço urbano” (2012) é resultado da adaptação de tese de doutorado do professor Janio Roque Barros de Castro e traz à tona conceitos de espetacularização e hegemonia aplicados às festas juninas dos municípios de Amargosa, Cachoeira e Cruz das Almas, localizados no Recôncavo da Bahia. O livro expressa a forma como essas cidades “bebem” desses princípios para adentrar ao processo de mercantilização dos festejos, perpassando por conceitos como o city marketing. Castro é professor adjunto na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), campus V, em Santo Antônio de Jesus. É doutor em Arquitetura e Urbanismo e mestre em Geografia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Suas pesquisas giram em torno de temas como as festas populares, a relação entre cultura e espaço urbano e as abordagens da geografia cultural contemporânea.
De um modo geral, o autor, neste livro, trabalha os festejos juninos nas três cidades objeto de estudo situando a dinâmica das festividades nos anos 2000 e mostra um formato de celebração abraçado pela massa que o consome – seja da própria cidade ou de outras que se deslocam para contemplar a festa. Traz peculiaridades dos três municípios para expor os motivos pelos quais as gestões de cultura de cada local resolveram aderir à espetacularização e mercantilização do São João. Situando-os num contexto histórico remoto, evidencia a relevância dos três economicamente no auge da indústria fumageira em que o Recôncavo baiano se destacava pelos bons rendimentos. No decorrer do livro, explana sobre as práticas culturais nas respectivas cidades, mostrando como algumas são preservadas de forma integral e como outras vão se modificando com o reordenamento urbano e com as alterações que implicam na desconstrução ou reconstrução de determinadas práticas.
No bojo da conceituação de espetacularização, Castro (2012) dialoga com autores como Guy Debord e o conceito de “sociedade do espetáculo” para caracterizar a sociedade de massa e de consumo contemporânea. Com base em Antônio Rubim, classifica espetáculo enquanto tudo que atrai e prende o olhar e a atenção. Nesse sentido, Castro traz à tona a necessidade que os municípios identificaram em apostar no city marketing, que seria a venda de uma imagem positiva da cidade para um público externo e mais amplo. Com a falta de uma atividade econômica pujante nos três municípios, as gestões de cultura apostam na espetacularização dos festejos juninos a fim de atrair um público maior impulsionado pela propaganda e pelo “espetáculo”. Situa as festas em arenas privadas nas cidades de Amargosa e Cruz das Almas enquanto agentes potencializadores dos festejos promovidos pela iniciativa pública, corroborando então para a expansão da função prática do city marketing.
Acreditamos que ambos os conceitos – espetacularização e city marketing – podem trazer ganhos teóricos-metodológicos para a teoria da Folkcomunicação. Em relação à espetacularização das festas populares, é possível realizar um diálogo com a conceituação de Roberto Benjamin (2004), quando argumenta sobre a apropriação dos órgãos de Governo para refuncionalizar tradições populares em espetáculo. Já o city marketing pode ser entendido como estratégia do folkturismo (LUCENA FILHO; FERNANDES, 2012) e, igualmente, complementar o debate do folkmarketing apresentado por Severino Lucena Filho (2007), não apenas pelo fato de Lucena Filho e Castro terem o mesmo objeto de estudo, mas é que ao nosso ver esses fenômenos estão interligados, afinal, como pretendemos demostrar na obra de Castro, a publicidade da cidade está relacionada ao turismo e o marketing, utilizando elementos da cultura popular.
No capítulo intitulado “Concepções de festa, os sentidos do festejar e as dimensões socioeconômicas, culturais, lúdicas e das festas juninas”, Castro dialoga com Havery Cox que trata o festejar como a fuga do cotidiano e Henri Lefebvre ao situar os festejos de um modo mais amplo enquanto uma necessidade diante da rotina que ele vai chamar de “fadigas da vida moderna”. Castro mostra a importância das festas populares e já adianta o que ele vai falar mais à frente, que a cultura é passível de mudança, adaptações, recriações e atualizações, sobretudo, com as mudanças da sociedade – algo próximo ao conceito de folclore defendido por Edison Carneiro (1965), principal base teórica que Luiz Beltrão (2001) utilizou para formular o conceito de folkcomunicação.
Colocando em voga a dinâmica e especificidades culturais das festas juninas espetacularizadas no espaço público, Castro exemplifica características próprias de cada município, usadas em detrimento da venda de uma imagem sustentada pela gestão municipal de cada local para movimentar um turismo de eventos sazonais. Nesse contexto, pontua, por exemplo, a feira do porto em Cachoeira enquanto um evento cultural e tradicional, do mesmo modo que trata a batalha de espadas em Cruz das Almas – esta última, fruto de discussões polêmicas tanto a nível local, quando a nível regional. Além disso, traz outras potencialidades, como o paisagismo e a arquitetura contemplados por Cachoeira nos festejos juninos.
Em suma, o autor faz um mapeamento das festas juninas no Recôncavo Baiano, região que no passado já exerceu forte influência no Estado – principalmente o município de Cachoeira que foi primeira capital do Brasil e possuiu importante relevância no cenário econômico, e os demais que também contribuíram de alguma forma. Castro mostra como se dão as comemorações dos festejos juninos na dinâmica do urbano e da necessidade de espetacularização desses eventos para atrair maior público e, consequentemente, economicamente beneficiar a comunidade local. Ele trata a espetacularização e as novas formas de comemorar não de maneira pejorativa ou acusando os governos e/ou os gestores e sociedade de um modo geral de provocar perdas e rupturas na cultura, mas busca pensar enquanto processos de reinvenção constante.
Essa obra é importante para estudiosos da cultura popular de forma geral e, em especial, para os pesquisadores da folkcomunicação. Embora o autor não utilize a teoria beltraniana, há uma série de possíveis diálogos e ganhos conceituais para podermos pensar os processos de apropriação do popular pelos órgãos públicos;
Ficha Técnica:
Título: Da casa à praça pública: a espetacularização das festas juninas no espaço urbano.
Autora: Janio Roque Barros de Castro
Editora: Edufba
Ano: 2012
Número de páginas: 340 p.
Tamanho: 17 x 24 cm.
ISBN 978-85-232-0956-8
Referências
BELTRÃO, Luiz. Folkcomunicação: um estudo dos agentes e dos meios populares de informação de fatos e expressão de ideias. Porto Alegre: Edupucrs, 2001.
BENJAMIN, Roberto. Folkcomunicação na sociedade contemporânea. Porto Alegre: Com. Gaúcha de Folclore, 2004.
CARNEIRO, Edison. Dinâmica do folclore. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1965.
LUCENA FILHO, Severino A. A festa junina de Campina Grande-PB: uma estratégia de folkmarketing. João Pessoa: UFPB, 2007.
______; FERNANDES, Guilherme M. Espaço gastronômico folkturístico: Cajá-PB. In: LOPES FILHO, Boanerges et al (orgs). A Folkcomunicação no limiar do século XXI. Juiz de Fora: UFJF, 2012. p. 125-139.
Notas