Resenhas & críticas
Os Bois-bumbás de Parintins e o folkmarketing institucional e mercadológico em “O Poder da Empatia”
![]() | Miranda Ana Paula, Lucena Filho Severino Alves de. O poder da empatia: comunicação e marketing cultural em cenários de negócios.. 2019. Brasil. Appris. 207pp.. 978-85-473-3607-3 |
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Os estudos do folkmarketing (LUCENA FILHO, 2012) têm sido ampliados a partir de diversas perspectivas, compreendendo os cenários locais e as manifestações da cultura popular evidenciados sob a ótica da comunicação organizacional. Como explica o professor Severino Alves de Lucena Filho (2012), as estratégias do folkmarketing são baseadas a partir das distintas apropriações simbólicas da cultura popular no campo mercadológico e institucional, a exemplo das festas do São João de Caruaru (PROCÓPIO; PATRIOTA, 2016), nos Festejos Farroupilhas (MORIGI; COUTO, 2018), no Carnaval de Triunfo (PE) a partir dos Caretas (SANTOS, 2015).
Nessa trilha, a obra “O Poder da Empatia: Comunicação e marketing cultural em cenários de negócios”, de autoria de Ana Paula Almeida Miranda e coautoria de Severino Lucena Filho (2019), reflete sobre esse universo do folkmarketing que se dá na cidade de Parintins (AM). A relação identitária presente nos produtos consumidos no município, comungados pelos bois-bumbás Garantido e Caprichoso, entoa todo o texto, sob o olhar dos pesquisadores para o Festival Folclórico de Parintins, uma das festas mais populares do Brasil.
Parintins é uma ilha de mais de 116 mil habitantes, localizada a 360 quilômetros de Manaus (AM)2. Para cada morador, os Bumbás Caprichoso e Garantido são um manto sagrado, para além da festa que ocorre anualmente. A estrela azul e o coração vermelho, alusão às cores dos Bumbás, estão presentes na cidade sob diversas formas: na divisão das ruas, nos letreiros das lojas, inclusive nos caixões que são vendidos nas funerárias. O refrigerante Coca-Cola, conhecido pela cor marcante vermelha, se rende durante o período da festa, e assume também a cor azul, como estratégia mercadológica para atender ao torcedor do Caprichoso. “[...] O que levaria uma multinacional do porte dessa empresa a colocar em um mercado restrito seu produto com tal posicionamento” (MIRANDA; LUCENA FILHO, 2019, p. 15), questiona os autores. Para além das estratégias mercadológicas, o Festival Folclórico de Parintins é resultado de uma empatia motivada pelos moradores na perspectiva de um desenvolvimento local.
O presente livro é fruto da dissertação defendida por Ana Paula Almeida Miranda em 2018, no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Católica de Brasília. É dividido em oito capítulos: 1. Percurso Metodológico; 2. Estado da Arte e Bibliometria da Folkcomunicação; 3. Processos Comunicacionais; 4. Mercado Cultural no Brasil; 5. Estudo de Caso do Festival Folclórico de Parintins; 6. Cultura Popular Como Estratégia de Negócio; 7. Análise de Dados; 8. Considerações Finais.
Logo na introdução, a autora Ana Paula Miranda explica como se deu o surgimento da pesquisa, a partir de uma conversa com uma companheira de trabalho, que era da cidade de Parintins. Nesse diálogo, a jovem parintinense explicou a Miranda que a multinacional Coca-Cola comercializava o refrigerante também na cor azul, devido à rivalidade dos Bumbás que existia na cidade. “Nesse caso, a empresa se apresenta na cor da concorrente Pepsi para agradar um público bastante restrito. A embalagem na cor vermelha estava sendo consumida apenas pelos torcedores do bumbá rival, Garantido” (MIRANDA; LUCENA FILHO, 2019, p. 15-16). O encantamento pela história e o fato peculiar levaram ao início da pesquisa, diz a autora.
No capítulo 1, os pesquisadores contextualizam como fomentaram o estudo, a partir da perspectiva metodológica. Tendo como objetivo “investigar a relação do Festival Folclórico com a comunicação mercadológica” (MIRANDA; LUCENA FILHO, 2019, p. 21), a obra analisa in loco os dados obtidos na pesquisa de campo durante as festividades no ano de 2018. Para tanto, foram realizadas 10 entrevistas semiestruturadas com moradores, turistas e visitantes, para compreender o olhar mercadológico e institucional a partir de outros sujeitos. Os autores usam dos conceitos de cultura, comunicação popular, folclore, folkcomunicação e folkmarketing para explanar o referencial teórico da obra.
Durante o capítulo 2, há uma importante revisão de literatura em relação às publicações referentes aos estudos de folkcomunicacão e folkmarketing, no período de 2009 a 2018. O levantamento mostra diversas temáticas que dialogam com o campo da cultura popular, apresentando um recorte que abrange uma série de discussões sobre as teorizações discutidas pelos autores. Nos capítulos 3 e 4, por conseguinte, a pesquisa abarca referenciais norteadores para o estudo, a partir dos diálogos sobre processos comunicacionais, comunicação mercadológica e marketing.
Finalmente no capítulo 5 o leitor se depara com o objeto de pesquisa, a Festa Folclórica de Parintins. Ana Paula Miranda e Lucena Filho (2019) produzem a partir de dados coletados em campo uma breve demonstração do que é o festival, os ambientes da cidade, a origem das festividades, as cores dos Bumbás que dividem ruas e lugares. Além disso, há uma discussão acerca de como os torcedores do Boi Caprichoso e do Boi Garantido são importantes para compreender o comportamento de consumo como pertencimento a determinado grupo social.
Os últimos capítulos do estudo reverberam os resultados obtidos a partir desse diálogo in loco, desde as personificações de espaços, empresas e instituições diante das festividades (a praça pública, a venda de tapiocas, os caixões personalizados com as cores e símbolos dos Bumbás), que geram afeto, segundo os autores, entre os moradores, visitantes e turistas, “[...] uma vez que as torcidas priorizam consumo de itens que contemplem as cores de suas agremiações ou que se mantêm neutros nas campanhas ou ainda façam qualquer modo de apresentação de comunicação mercadológica na cidade” (MIRANDA; LUCENA FILHO, 2019, p. 151). As entrevistas semiestruturadas realizadas com torcedores moradores, torcedores turistas e torcedores ex-moradores (visitantes) geraram importantes discussões que são analisadas sob quatro blocos imagéticos discursivos: 1) Bumbás Garantido e Caprichoso; 2) cores Vermelho e Azul; 3) embalagens personalizadas para o Festival; e 4) personalização à identidade organizacional (marca). Deste modo, os símbolos dos Bumbás apresentam-se como um universo que compõe as ações comunicativas de folkmarketing, reconhecidos pelos entrevistados em suas falas.
Lucena Filho (2012) nos lembra que o folkmarketing é um processo comunicacional de forte mobilização dos elementos que constituem a identidade de um povo e sua localidade, gerando sentido, pertencimento. Sublinha-se, assim, que o Festival Folclórico de Parintins gera uma série de evocações produzidas pelos e para os torcedores dos Bumbás, para além das festividades. A obra, decerto, é um importante instrumento de pesquisa que possibilita uma série de questões norteadoras para compreender o campo do folkmarketing nesse cenário.
Ficha Técnica:
Título: O poder da empatia: comunicação e marketing cultural em cenários de negócios.
Autor: Ana Paula Miranda e Severino Alves de Lucena Filho (coautoria).
Editora: Appris
Ano: 2019
Número de páginas: 207 p.
Tamanho: 22.4 x 15.6 x 0.8 cm
ISBN: 978-85-473-3607-3
