Dossiê

Recepción: 22 Octubre 2022
Aprobación: 01 Noviembre 2022
DOI: https://doi.org/10.5212/RIF.v.20.i45.0002
Resumo: A Globalização, no decorrer dos últimos anos, estendeu-se por todos os espaços e ocasionou, entre tantas realidades, diferentes formas de entender o contexto social haja vista que o fenômeno introduziu novas tendências nos mais variados campos – econômico, ideológico, histórico etc. Nessa ambiência, surge a regionalização como um caminho viável numa contemporaneidade pautada em ações de cunho global, que salvaguarda ideais de valorização do que é local. O presente artigo, nesse contexto, discute TV Regional a partir da regionalização da TV Meio Norte - emissora sediada em Teresina (PI). Adotadas as metodologias de Pesquisa Bibliográfica, Pesquisa Documental e Estudo de Caso, analisou-se como se constituiu o processo de regionalização na respectiva emissora. Pode-se afirmar neste cenário que o Grupo Meio Norte de Comunicação (GMNC) é apercebido – e se intitula – como um veículo de viés regional no Piauí, uma vez que tem uma programação que preza pela produção e veiculação de conteúdo regional muito embora seja importante destacar que o interesse em produzir conteúdo regional não é genuíno, pois atende; e fortalece, discursos hegemônicos da emissora no estado e/ou sustenta parcerias criadas o longo dos anos.
Palavras-chave: TV Regional, Regionalização, TV Meio Norte.
Abstract: Globalization, over the last few years, has spread to all spaces and has given rise, among so many realities, to different ways of understanding the social context, given that the phenomenon has introduced new trends in the most varied fields – economic, ideological, historical, etc. In this environment, regionalization emerges as a viable path in a contemporaneity based on global actions, which safeguard ideals of valuing what is local. In this context, this article discusses TV Regional from the regionalization of TV Meio Norte - a station based in Teresina (PI). Adopting the methodologies of Bibliographic Research, Documentary Research and Case Study, it was analyzed how the regionalization process was constituted in the respective station. It can be said in this scenario that Grupo Meio Norte de Comunicação (GMNC) is perceived – and is called – as a vehicle of regional bias in Piauí, since it has a program that values the production and broadcasting of regional content, even though it is It is important to highlight that the interest in producing regional content is not genuine, as it serves; and strengthens the broadcaster's hegemonic discourses in the state and/or sustains partnerships created over the years.
Keywords: Regional TV, Regionalization, TV Meio Norte.
Resumen: La globalización, en los últimos años, se ha extendido a todos los espacios y ha dado lugar, entre tantas realidades, a diferentes formas de entender el contexto social, dado que el fenómeno ha introducido nuevas tendencias en los más variados campos –económico, ideológico, histórico, etc. En este entorno, la regionalización surge como un camino viable en una contemporaneidad basada en acciones globales, que salvaguardan ideales de valorización de lo local. En ese contexto, este artículo aborda la TV Regional a partir de la regionalización de TV Meio Norte - una estación con sede en Teresina (PI). Adoptando las metodologías de Investigación Bibliográfica, Investigación Documental y Estudio de Caso, se analizó cómo se constituyó el proceso de regionalización en la respectiva estación. Se puede decir en este escenario que el Grupo Meio Norte de Comunicação (GMNC) es percibido – y es llamado – como un vehículo de sesgo regional en Piauí, ya que tiene un programa que valora la producción y difusión de contenidos regionales, incluso aunque es importante resaltar que el interés por producir contenido regional no es genuino, ya que sirve; y fortalece los discursos hegemónicos del locutor en el estado y/o sustenta las alianzas creadas a lo largo de los años.
Palabras clave: Televisión regional, Regionalización, Televisión del Medio Norte.
Introdução
O processo de globalização permite a configuração da chamada sociedade em rede, segundo Castells (2003), que, no tocante aos aspectos comunicacionais, impulsiona o surgimento de novos fluxos de informação e espaços de interação não mais delimitados pelo espaço físico; ao mesmo tempo em que reforça laços de proximidade quando “regional e global, inicialmente conceitos excludentes e paradoxais, mostram-se interligados em sociedade” (CARVALHO, 2019, p. 257).
Segundo Carvalho (2019), o cenário dual – global/regional – abre espaço para o surgimento ou fortalecimento de mídias regionais com a ampliação, por parte dos veículos, de espaços para programas produzidos no âmbito local. Quer dizer, o global, o regional e o local não se apartam, mas coexistem, e o que se verifica é uma inter-relação entre globalização e regionalização. Dessa forma, mesmo na era da globalização com os movimentos comunicacionais resultantes dela; a regionalização midiática preenche um importante espaço, haja vista que o interesse pelo que está próximo permanece entre o público.
No Piauí, a TV Meio Norte (TV MN), pertencente ao Grupo Meio Norte de Comunicação, empresa escolhida para análise nesse artigo, torna-se uma importante referência, especialmente no âmbito dos estudos sobre regionalização midiática; pois é a única emissora no estado do Piauí como “Cabeça de Rede, ou seja, geradora do próprio sinal” (SILVA, 2018, p. 88). Em 2011, a TV Meio Norte transformou-se em Rede Meio Norte e passou a produzir e veicular sua própria programação sem estar atrelada a uma emissora nacional, o que a qualifica como uma televisão de cunho regional, uma vez que, segundo Bazi (2001), TV Regional é aquela que retransmite seu sinal a uma determinada região e que tenha sua programação voltada para ela mesma.
É referenciado no ideal de que as pessoas se imaginam, ou pelo menos querem se imaginar, parte de uma comunidade, que os autores Morais, Jerónimo e Correia (2020) vão enaltecer a necessidade, e para, além disso, a importância dos meios de comunicação com viés regional. Os autores são categóricos ao assegurar que os media regionais reforçam laços de proximidade, não apenas geográfica.
Cumpre ressaltar ainda que ao refletir sobre o contexto de uma televisão regional, especificamente tratando da Rede Meio Norte no Piauí, este artigo também abre possibilidades para a compreensão dos diálogos existentes entre Regionalização e Folkcomunicação, elucidando uma iniciativa que acaba por abarcar a cobertura de manifestações da cultura popular e dos modos pelos quais grupos, no contexto de cidades do interior do Piauí, comunicam sua cultura, suas práticas e seus costumes.
Nesse sentido, é mister entender que, como salienta Roberto Benjamin (2008), o intercâmbio cultural, presente hoje nas sociedades, permite verificar a inter-relação entre as manifestações da cultura folk e a cultura de massa (ainda que sob outras denominações) em diversas partes do mundo, mesmo em países nos quais as populações de cultura folk são minoritárias.
Para alcançar tal entendimento foi preciso cumprir um caminho em etapas. A primeira delas caracterizada por uma revisão de literatura dos principais autores que versam sobre a temática; alçou-se buscar conhecer mais do fenômeno de regionalização midiática para então, e de forma concreta, compreender a TV Meio Norte como tevê regional no Piauí. Em seguida, em fluxo contínuo, realizou-se um estudo detalhado da emissora a partir da contextualização histórica de surgimento e consolidação da TV MN no Piauí.
TV Regional
Ao refletir sobre a história da televisão no Brasil fica perceptível como a evolução da indústria televisiva nacional está diretamente relacionada com a estruturação da regionalização midiática em todo o território do país e com os moldes de produção e consumo televisivo que se têm na atualidade. Embora tenha surgido em 1950, em formato local – “é importante lembrar que a televisão brasileira nasceu local” (BAZI, 2006, p. 77) –, somente, em 1960, é instalada a primeira TV no interior do país. Até essa data, as tevês regionais só exibiam programas adquiridos junto à geradora de programação: “A primeira no Brasil foi a TV Bauru, canal 2, de São Paulo, em dezembro de 1959, passando a funcionar definitivamente em 1960. Em 1965 foi comprada por Marinho, das organizações Globo” (BAZI, 2006, p. 78).
Em “Dilemas e perspectivas da televisão regional”, Bazi (2006) define três padrões de estações regionais: as TVS geradoras, as retransmissoras e as estações repetidoras. As primeiras são identificadas como aquelas que produzem programação no local em que estão instaladas e as retransmissoras são as que possuem os equipamentos fundamentais para captar sinais recebidos de uma estação geradora, “em geral da cabeça-de-rede” (p. 78), e, como o próprio nome identifica, retransmiti-los para os aparelhos de TV. A autora destaca que esse tipo de TV não produz programas exclusivos. Por sua vez, as estações repetidoras são aquelas que apenas recebem sinal e retransmitem, “também chamadas de Estações de Recepção Terrena (ERT) ou retransmissoras passivas” (p. 78).
Destaca-se que a Rede Meio Norte, objeto desse artigo, deu início às atividades como uma retransmissora de programação nacional das “cabeças de rede” BAND e SBT. Em 2011, passou de ‘TV Meio Norte’ para ‘Rede Meio Norte’ com transmissão de programação própria sem vínculo com emissoras nacionais, tornando-se a única emissora, do Piauí, a conceber o próprio sinal. Isto é, seguindo a tipificação proposta por Bazi (2006), a Rede Meio Norte se qualifica como uma TV geradora, pois produz programação exclusiva dentro da área onde está domiciliada. Dos tipos, seguir-se-á para o conceito de TV Regional.
Cruz (1996), por exemplo, explica que não existe dentro da legislação brasileira sobre radiodifusão nenhuma definição do que seja televisão regional. Segundo a autora, uma das dificuldades é que seria preciso definir em termos de alcance das ondas de TV, o que é uma ‘região’, tarefa complicada visto que a possibilidade de se expandir o sinal, por micro-ondas ou satélites, vincula o conceito às limitações tecnológicas e econômicas. Por sua vez, Moragas Spà (1996, p. 42) argumenta que o conceito regional “tem sido utilizado com frequência para apresentar um modelo de televisão ao qual se supõe reservada a informação local e o folclore”. Já, Martín-Barbero (1987, apud JACKS, 1999, p. 250), considera televisão regional como uma ‘atividade negociada ao modelo estatal e comercial, isto é, um modelo em que nem todos os espaços se façam regidos pela lógica de mercado ou do didatismo paternalista e abram espaço a outros modos de ver e fazer televisão’ (BAZI, 2006, p. 80, tradução nossa).[3]
Para Bazi (2001), considera-se televisão regional aquela que retransmite seu sinal a uma estipulada região marcada por determinados limites geográficos e que tenha a programação voltada para ela mesma, de forma que não haja, nesse processo, perda da contextualização global. Para o autor, a TV regional oportuniza a união entre as pessoas dessa região, encurtando as distâncias e, consequentemente, aproximando as culturas. Bazi (2006) alerta, contudo, que esse conceito deve ser preterido quando a programação produzida pela emissora seja feita a partir de uma grade de programação em nível estadual ou nacional, pois “o regional para essas emissoras é o próprio estado ou nação de origem” (p. 80).
Fabri (2008) vai conceituar TV regional com base na noção de ‘campo’, proposta por teóricos como Bourdieu (1987). Definir televisão regional, para o pesquisador, é pensá-la como uma espécie de campo onde existem representações mentais exemplificadas por ele como língua, sotaque, dialeto, caráter etc., representações objetais em coisas como emblemas, bandeiras, hinos etc., e atos-estratégias de manipulação simbólica com o objetivo de determinar representações mentais, sendo que estas funcionam na prática e são orientadas de forma a produzir efeitos sociais. Desse conceito, o autor fará ainda um correlativo com a noção de identidade regional (Martín-Barbero, 1987) para afirmar que em se tratando de identidade regional, não se está adotando o regional como “sinônimo de impermeabilidade às influências do discurso massivo, pois a cultura regional baliza uma referência que extrapola a questão da cultura popular, que muitos cientistas traduzem como purismo cultural” (p. 208).
No texto “Portal e televisão: o fenômeno do bloco Rede da EPTV entre os limites do global e local”, Fabri (2008) conclui que a globalização dos meios de comunicação permite, às empresas, ampliar horizontes de informação e publicidade à medida que oferece ao telespectador maior diversidade na procura de informações e de prestação de serviços. A TV regional será, portanto, segundo o autor, um canal de informação capaz de apresentar assuntos de natureza local, mas também propiciar a apresentação de assuntos que ocorrem no país e no mundo – nacional/global.
Cabe destacar a este respeito, a título de ilustração, o capítulo “A cultura popular na TV Diário: estudo de caso do programa ‘Memória do Nordeste’”, de autoria de Maria Érica de Oliveira Lima e Bruna Carvalho. No texto, as autoras apresentam algumas reflexões sobre a relação direta entre a cultura e a produção regional de conteúdo tomando como caso de estudo a ‘TV Diário’, emissora de televisão cearense, apontada como um veículo de perspectiva regional.
Ela apresenta uma programação baseada em produção quase que exclusivamente local, seja em programas jornalísticos ou de entretenimento que exploram a realidade da região Nordeste, focando, sobretudo no estado do Ceará, onde se localiza. O objetivo era fazer do canal um meio de comunicação para explorar prioritariamente o Nordeste e aproximar o povo nordestino utilizando uma linguagem ousada, coloquial, inovadora e regional, que falasse a língua do povo nordestino, com a qual as pessoas pudessem se identificar, que mostrasse aquilo que faz parte do cotidiano local e que fosse realmente construída por nordestinos (LIMA; CARVALHO, 2019, p. 113).
Conforme as pesquisadoras, a ‘TV Diário’ é constituída por uma quantidade enorme de programas locais com títulos infinitos e assuntos variados. Cada programa da emissora atinge públicos distintos de acordo com o perfil de interesse de cada telespectador. “Podemos afirmar que praticamente todos estes programas se propõem a trabalhar com a realidade da vida social do povo da região Nordeste, do estado do Ceará e da capital Fortaleza diante das abordagens que lhe são convenientes” (LIMA; CARVALHO, 2019, p. 114). Reforçam, ainda, que a maior parte da grade se utiliza da linguagem coloquial e extremamente regional, o que impõe certa relação de proximidade entre a televisão e o público.
A intenção, para Lima e Carvalho (2019), é dar a sensação de que o telespectador conhece há anos o interlocutor e que ele está ali para um “bate-papo pessoal enquanto saboreiam um ‘chá da tarde’” (p. 114). As autoras, aliás, explicam que a estratégia, dentro do universo televisivo, causava certa estranheza por parte da população no início do século XXI.
Até esse momento tínhamos uma televisão nacional bastante moldada a padrões fixos. O jornalismo tinha um formato amplamente fechado, as notícias tinham de ser transmitidas com ar de seriedade por parte dos jornalistas; os programas de auditório, por sua vez, eram um pouco mais espontâneos, mas não permitia tamanha liberdade aos apresentadores que deveriam se portar dentro das regras preestabelecidas pela emissora à qual pertencessem. A TV Diário chega a romper com essas normas e padrões tradicionais da televisão brasileira (LIMA; CARVALHO, 2019, p. 114).
Vale apontar ainda a própria Rede Meio Norte e seu processo de regionalização, na busca por concretizar-se enquanto TV Regional, como um exemplo de emissora que seguiu os passos da tevê regional no Brasil. Silva (2018) admite que a emissora, desde que se tornou cabeça de rede logo geradora do próprio sinal, persegue o que se pode chamar de identidade regional. Diante desse ideal propôs diversas campanhas dentro da emissora que de alguma forma despertassem maior interesse por parte do público no estado do Piauí, todas contendo expressões como “povo” e “popular”. “Desde então [2011], a Rede de Televisão passou a focar o trabalho para as regiões Norte e Nordeste, concentrando mais esforços no estado do Piauí” (SILVA, 2018, p. 88).
Sobre a produção de conteúdo e a relação de uma TV Regional com seu público, Volpato e Oliveira (2017) são precisos ao dizer que “retratar assuntos regionais” é uma possibilidade que a televisão regional tem – e deve usufruir – para gerar identificação entre as mensagens produzidas/veiculadas e o público, pois a TV regional vai oportunizar esta relação direta ao oferecer conteúdo à região que está inserida. Assim os referidos autores, ao se aprofundar na temática, especificam algumas características que podem ser encaradas como ‘verdadeiras marcas’, seriam: “localização, ausência de participação em uma rede, quantidade de programas produzidos e relação com a região pela publicidade, audiência e recursos profissionais e financeiros” (p. 5).
Contudo Volpato e Oliveira (2017), em “TV Regional e identificação com os públicos: o caso Tem Notícias – primeira edição”, fazem também uma ressalva quanto a identificação entre os públicos e as mensagens veiculadas pela TV regional, neste caso pelo Tem Notícias – Primeira edição, porque, para os autores, a identificação é relativa, ou seja, não acontece de forma homogênea com uma relação de proximidade sempre uniforme, uma vez que há “pouca representatividade da região na programação da emissora, seja pela pequena cobertura jornalística feita nas cidades que não possuem escritório, seja pelas limitações de ordem profissional” (p. 12). Dessa forma, é importante ressaltar que embora as TVs Regionais busquem se aproximar do público por meio do conteúdo produzido/veiculado, gerando identificação e representatividade; este movimento não acontece integralmente haja vista que as empresas de comunicação, com viés regional, ainda enfrentam inúmeras limitações de ordem operacional, de manutenção de custos, de capital, profissionais etc.
Cumpre de forma pontual, também, contextualizar os media regionais e locais nos contextos tecnológicos e culturais, a fim de reforçar, uma vez mais, a importância da notícia local como verdadeira promotora de laços de identidade, visto que cooperam profundamente para que as pessoas – ouvintes, telespectadores, leitores, cidadãos, etc. – se assistam, e se percebam, como membros da comunidade representados nos conteúdos produzidos pelos meios de comunicação que reforçam tais sentimentos de proximidade e pertencimento.
Morais, Jerónimo e Correia (2020), em “Jornalismo na Região Centro”[4], ao pensar o presente e o futuro dos meios de comunicação regionais, estudando também os profissionais e a prática desenvolvida por eles nestes meios, destacam que eles estão conscientes e atentos às mudanças introduzidas na produção, transmissão e consumo informativo, dado que se percebe, na atualidade, o uso e uma influência cada vez maior das novas tecnologias no trabalho dos jornalistas, desde a ascensão da Internet, aliás. Os autores defendem “o papel do jornalista” (p. 150), sobretudo no contexto informacional presente onde há o “problema da desinformação” (p. 150) que necessita, cada vez mais, da verificação dos fatos pelos próprios jornalistas.
Os autores vão ainda destacar, quanto à supervivência da comunicação regional e local, que os próprios profissionais consideram que os apoios por parte do Estado, por exemplo, podem cooperar para resolver alguns dos problemas e limitações encontradas pelos meios de comunicação locais e regionais, desde que existam “critérios objetivos na distribuição desses apoios, para além de uma garantia de que a independência dos media não é colocada em causa” (Morais; Jerónimo; Correia, 2020, p. 151). Concluem assim, mediante reservas à possibilidade de suportes por parte do Estado e os meios de comunicação regionais cientes de sua relevância na sociedade para o fortalecimento e bom funcionamento da democracia, que “os meios locais e regionais são extremamente importantes para dar a conhecer o que se passa nas regiões por parte daqueles que conhecem a realidade local” (p. 153).
Nesta perspectiva é fundamental também traçar um diálogo conjuntamente com os estudos da Folkcomunicação, uma vez que o artigo possibilita; dentro do debate sobre televisão regional, um entendimento acerca do intercâmbio cultural existente nas sociedades e que permite o reconhecimento da relação entre as manifestações culturais e a cultura de massa por meio, por exemplo, da cobertura dessas manifestações no contexto de cidades do interior do Piauí.
Dos primeiros estudos realizados por Luiz Beltrão ainda na década de 1960, possibilitando o estabelecimento dos pressupostos que se tornariam a base das pesquisas na área de Folkcomunicação, os esforços dos pesquisadores que se voltam às pesquisas nessa área concentram-se no sentido de apresentar a Folkcomunicação como o estudo dos procedimentos comunicacionais pelos quais as manifestações da cultura popular ou do folclore se expandem, se socializam, convivem com outras cadeias comunicacionais, sofrem modificações por influência da comunicação massificada e industrializada, ou se modificam quando apropriadas por tais complexos (HOHLFELDT, 2002).
Nesse sentido, entre os objetos a serem trabalhados pela pesquisa folkcomunicacional, encontram-se as produções de veículos da chamada mídia tradicional que adotam ou abarcam, em sua difusão, os elementos simbólicos e o universo linguístico da cultura popular.
Tendo como referência empresas midiáticas que buscam a regionalização especialmente como estratégia mercadológica, aspirando à aproximação do público e à conquista de novos mercados, é compreensível a busca por diferentes formas para afirmação de seus lugares como veículos regionais. Entre as alternativas, estão, por exemplo, o estabelecimento de espaços fixos em suas grades ou páginas para exibição de conteúdos de caráter regional; a criação de programas ou cadernos especiais, veiculados em datas de importância cultural e / ou cívica para sua audiência; a produção de reportagens de cunho regional e, em alguns casos, a manutenção de jornalista ou equipes de reportagem em municípios estratégicos (CARVALHO, 2019).
No caso específico das TVs regionais, percebe-se o planejamento de coberturas que vão além das cidades nas quais estão sediadas as empresas de mídia, o que propicia espaço para a divulgação de manifestações da cultura popular oriundas de diferentes contextos. Além disso, produções dessa natureza podem dar voz a grupos minoritários até então não contemplados por matérias construídas nas capitais e grandes centros urbanos.
A mídia regional, a partir dessas iniciativas, pode concretizar as funções elucidadas por Lima (2010), dentre elas: constituir-se como complemento à experiência cotidiana de seus públicos, fornecendo informações acerca da realidade mais próxima e da mais distante; “reduzir a incerteza” do ambiente que rodeia o leitor, o ouvinte ou o telespectador; servir como banco de dados sobre a região de influência; propiciar entretenimento à audiência e integrar os membros de uma comunidade.
Por outro lado, sabe-se que o alcance dessas funções pode esbarrar em dificuldades como as reduzidas equipes que atuam nos veículos, falta de verbas ou patrocínios para programas de cunho regional e até mesmo ausência de um projeto definido e claro de regionalização midiática.
Grupo Meio Norte de Comunicação (Rede Meio Norte)
A Rede Meio Norte é uma emissora de televisão brasileira com sede em Teresina, capital do Piauí. Fica localizada na Rua Professor Alceu Brandão, 2750, no bairro Monte Castelo, zona Sul da cidade. Apesar do endereço em Teresina, a concessão da emissora está em Timon (MA), desde a sua criação, em 1985, então TV Timon – fundada pelo empresário timonense Napoleão Guimarães – que só passaria a chamar-se TV Meio Norte a partir de 1996, quando a sede foi transferida para a cidade vizinha Teresina (PI).
Outra aquisição para a cidade maranhense na última gestão de Napoleão Guimarães foi a concessão pública de um canal de televisão. Com essa aquisição, concedida pelo governo federal o município [Timon] teria uma forma de produzir conteúdo de mídia que não estivesse necessariamente ligado aos canais instalados em Teresina, ou em São Luis. (TEIXEIRA, 2013, p. 101-102).
Em entrevista concedida a jornalista Thays Teixeira para o livro “Napoleão Guimarães: uma biografia”, o então prefeito de Timon (MA), àquela época, Napoleão Guimarães, explica que a concessão foi dada a ele, ao deputado estadual José Ribamar e ao deputado federal José Texeira, porém nenhum deles entendia de televisão. “Para você ter uma ideia, as primeiras câmeras eram essas que usam em aniversário, pequeninas” (2013, p. 102). Segundo a biografia, a ação de manter a empresa de mídia só foi possível e deu certo quando o canal foi vendido para o seu filho mais velho, Paulo Guimarães.
Se nós não tivéssemos vendido para Paulo, certamente o canal teria fechado. Nós não éramos conhecedores dessa área. Nós começamos com o SBT, mas nosso interesse era trazer a Bandeirantes, que transmitia futebol. E eu consegui com Sarney essa concessão; depois, eu passei para Paulo. Ou melhor, nós passamos, isso foi feito de modo combinado com os outros dois também, só assim pudemos passar (TEIXEIRA, 2013, p. 102).
Assim, a TV Timon entrou no ar, na cidade de Timon (MA), em 1985. Segundo Teixeira (2013), em 1986, um ano após a criação, a emissora saiu do ar e retornou – no mesmo ano – afiliada ao Sistema Brasileiro de Televisão (SBT). Permaneceu afiliada ao SBT até meados de 2000 quando, por divergências com a rede devido à programação local, rompeu o contrato e afiliou-se a Bandeirantes passando a reproduzir a programação da TV Band até novo rompimento de contrato, em 2011, quando se torna – efetivamente – geradora do próprio sinal. Quanto a esse começo, cabe pontuar como a TV Meio Norte, desde sua criação como TV Timon, seguiu também o caminho de estruturação de outras TVs no Brasil cuja capitalização precisava da articulação com grupos de mídia regional, conforme outrora exposto neste texto, a partir do que reflete Aguiar, Oliveira e Souza (2019). Os autores afirmam, ao pensar sobre a TV no país, que o modelo de estruturação da televisão brasileira é apoiado na TV aberta em torno de cabeças de rede, situadas no eixo Rio-São Paulo, que propiciaram o surgimento de grupos de mídia regional. Observa-se que TV Meio Norte surgiu, inicialmente, sustentada a partir da afiliação ao SBT e a BAND, ou seja, de fato apoiada na TV aberta através de grupos que eram ‘cabeças de rede’ portanto detentores de maiores recursos financeiros e que estavam localizadas no eixo Rio-São Paulo.
Com a finalidade de circunstanciar o surgimento da TV Meio Norte, é válido citar a entrevista realizada por Julimar Silva, em 2017, com Jhone Marques Lopes, gerente técnico-operacional do GMNC, no decurso da pesquisa ‘Regionalização Televisiva: análise da proposta da Rede Meio Norte’. Jhone Lopes trabalha na Meio Norte desde 1986, um ano após a criação da TV Timon, e segue ocupando o cargo até os dias atuais.
A transferência da TV Timon da cidade de Timon (MA) para Teresina (PI), entre 1994 e o início de 1995, aconteceu, segundo Silva (2018), por conta de um vendaval que derrubou a torre da emissora no Maranhão, o que gerou enormes transtornos para o grupo, pois a TV ficou fora do ar por pelo menos oito (08) horas, sendo este o acontecimento que oportunizou que as transmissões passassem a ser feitas de Teresina. “José Sarney, ex-presidente da República, durante a inauguração das novas instalações, mencionou o nome Meio Norte, que chamou atenção do empresário Paulo Guimarães e, poucos meses depois, mudou o nome da emissora para TV Meio Norte” (p. 130).
Regionalização do Grupo Meio Norte de Comunicação
O projeto de regionalização implementado pelo Grupo Meio Norte, ao longo dos anos, é intrínseco a história da emissora e sua consolidação e desenvolvimento dentro do Piauí, razão pela qual é importante continuar este resgate histórico por meio do detalhamento de como se deu o processo de afiliação e também o rompimento com as emissoras nacionais desde a transferência da sede para a capital do Piauí, Teresina. Como será apresentada ao longo dessa seção, a história e o fortalecimento do GMNC recaem na forma como o sistema de comunicação pensou e operacionalizou tal regionalização midiática.
Antes de se tornar uma emissora geradora do próprio sinal, e logo após ter a sede transferida para Teresina (PI), a TV Meio Norte seguiu no tempo afiliada ao SBT, até 2000, em seguida afiliou-se a Band, até 2011, quando de fato tornou-se uma televisão ‘cabeça de rede’. “Atualmente, a emissora se chama Rede Meio Norte, desde 1º de janeiro de 2011, quando deixou a Bandeirantes para se tornar uma emissora de TV independente, ou seja, sem operar afiliações com alguma rede de televisão brasileira” (TEIXEIRA, 2013, p. 102).
Em “Indústrias culturais, regionalização e mercado: um olhar a partir da TV Meio Norte”, Santos (2015) atesta que, dentro do Piauí, o Grupo Meio Norte, à época Sistema Meio Norte de Comunicação (SICMN), é a maior marca de uma organização pensada estrategicamente para salvaguardar no imaginário dos piauienses um caráter regional de comunicação. “Com sua programação independente, o grupo garante um acompanhamento maior dos acontecimentos no PI, visto que as outras emissoras, salvo as públicas e estatais, têm forte dependência da grade de programação nacional” (p. 62). Para a autora, até mesmo o nome escolhido para a empresa de comunicação indica uma estratégia que garanta um sentimento de pertencimento e identidade por parte da população do estado sendo a representante do Meio Norte do Brasil.
Tal perspectiva de valorização do que é próximo e o enaltecimento do regionalismo, somados ao próprio fenômeno de regionalização midiática abarca muitos outros fatores (expansão nacional da indústria televisiva, expansão da mídia regional, investimento na produção, etc.), proporcionou a explosão das TVs Regionais no Brasil, o que conflui com o que autores como Lima (2008), antes citado, já destaca: o crescimento dos investimentos na mídia regional a partir da importância dada, pelas elites locais, à comunicação regional e local. O Grupo Meio Norte, ao adotar um projeto de regionalização, faz exatamente este percurso, investe em uma comunicação com teor regional/local e cria, consequentemente, uma programação (grade de programação) produzida dentro do Estado – produzida regionalmente. “A Rede Meio Norte é a única emissora no Piauí com grade fechada, produzida regionalmente, não sendo afiliada de nenhuma outra emissora nacional” (SÁ, 2018, p. 41).
Compete destacar que o Grupo Meio Norte de Comunicação seguiu a tendência de ordenação do jornalismo televisivo (telejornalismo) local-regional no Brasil, como apresentam os autores Aguiar, Oliveira e Souza (2019). Como exposto no capítulo três, para esses autores, o Brasil traz um jornalismo televisivo local-regional que está diretamente ligado às estratégias pensadas e implantadas por grupos de mídia nacional que têm sempre a pretensão de se expandir por todo o território nacional, isto é, a estratégia primeira desses grupos de mídias nacionais é a expansão, logo o telejornalismo local-regional é empreendido pelas mídias regionais também com esse objetivo, o de buscar a expansão, o que fica evidente quando se observa, por exemplo, o projeto comercial do GMNC elaborado em 2020.
A sede de operações do Grupo Integrado de Comunicações MN é em Teresina, a capital do Piauí. Estamos geograficamente situados no Meio-norte do Brasil, um ponto de localização estratégica entre as Regiões Norte e Nordeste, com raio de influência econômica sobre mais de 25 milhões de habitantes. Isso torna o GMNC uma referência obrigatória para a difusão de investimentos em publicidade regional eficaz. O Meio-Norte do Brasil é um corredor logístico natural de amplo alcance publicitário: temos divisas com seis Estados do Brasil e dez capitais estão a menos de mil quilômetros de distância (PROJETO COMERCIAL DO GRUPO MEIO NORTE DE COMUNICAÇÃO, 2020).
Considerando que “televisão regional [é] aquela que retransmite seu sinal a uma determinada região e que tenha sua programação voltada para ela mesma” (BAZI, 2001, p. 16), é possível entender que a TV Meio Norte é uma TV Regional no Piauí. O conceito proposto pelo autor retrata, em alguma medida, o processo estabelecido pelo grupo MN ao empreender uma regionalização dentro da emissora, conforme expõe Wrias Moura, em entrevista concedida a Julimar Silva, em 2018. O então Diretor Geral do Grupo Meio Norte de Comunicação ao ser questionado o que é uma TV Regional e como a emissora se propõe regional, no Piauí, responde:
TV Regional é uma emissora que comunica com personagens e conteúdos de uma determinada região [...] os conteúdos que são abordados, são conteúdos que são aproximados da minha realidade, então, uma TV regional é isso [...] A gente aqui optou por fazer uma rede regional, que tem uma linguagem voltada para o Norte e Nordeste, para a gente garantir para essas regiões, que têm muitas características próximas, a possibilidade de ter uma emissora de televisão, com uma característica mais aproximada do perfil dessa região (SILVA, 2018, p. 491).
Levando em conta o projeto comercial do GMNC, elaborado em 2020, constata-se que a emissora se percebe como uma TV Regional, dentro do Piauí, e que ela se apresenta, perante todos, como a verdadeira TV Regional e a única no Estado, sendo por isso mesmo diferente dos demais meios de comunicação haja vista que sua programação é inteiramente regional e, ao contrário das demais, ela não repete uma programação nacional, mas destaca-se por ser uma emissora com “[...] 24 horas de programação local. Sua grade tem 40 programas 100% produzidos no PI” (Projeto Comercial do GMNC, 2020, p. 5).
Tendo em mente alguns dos conceitos de TV Regional, discutidos ao longo desse estudo, observa-se que a TV Meio Norte também se enquadra em outras características desse segmento televisivo para além da produção de conteúdo regional ou da retransmissão do seu próprio sinal. Fabri (2008), por exemplo, vai pensar esse conceito com base na ideia de campo (Bourdieu, 1987) e com foco em representações mentais, representações objetais em coisas e atos-estratégias de manipulação. No caso das representações mentais, o autor vai exemplificá-las na língua, sotaque, caráter, dialeto, etc. Sobre isso, é pertinente destacar o que Wrias Moura, na entrevista ao jornalista Julimar (2018), traz sobre a ‘linguagem aproximada à população’ que a MN adota. Segundo o diretor, à época, a Meio Norte oferece uma linguagem próxima das regiões Norte e Nordeste. “Você está diante de uma TV que tem o regionalismo como sua base. A linguagem é um meio de aproximação; o falar é um meio de aproximação do público [...] a forma de abordar os conteúdos são aproximados da realidade” (p. 491).
O presente artigo, ao tratar sobre TV Regional, entendeu ser fundamental, primeiramente, recorrer à compreensão dos demais fenômenos que estão diretamente ligados a esta realidade como a Globalização e Regionalização. Isto porque acredita que os processos informativos ultrapassam e/ou dissolvem as fronteiras pré-estabelecidas de qualquer natureza, sejam elas globais, nacionais e/ou regionais. Ou seja, apercebe-se o surgimento – cada vez maior – de novos fluxos comunicacionais e de espaços de interação que não estão mais determinados em parâmetros físicos ou geográficos. Subtende-se com isto que as TVs Regionais precisam estar alinhadas a tal dinâmica considerando os fluxos e espaços de interação que, na atualidade, não se apresentam mais fixados em fronteias de caráter físico e geográfico que condicionam a produção do conteúdo.
Nesse contexto é que na entrevista abaixo, Wrias Moura, que esteve na direção da rede desde o momento da elaboração do projeto até a concepção da TV MN como a primeira rede regional de televisão do Brasil voltada para o Norte Nordeste, destaca a expansão regional do grupo através da ampliação dos conteúdos regionais, a partir da abordagem editorial e ainda através da transmissão para outros estados como Maranhão, Ceará, Tocantins e Pará, por exemplo, como sendo um grande propósito da Rede Meio Norte.
A expansão ela é regional. Nosso foco é Norte e Nordeste. Esse é o nosso objetivo e, a nossa expansão é Norte e Nordeste. Se ela não tivesse expansão, ela não seria regional, ela seria local. Nós não somos uma emissora loca, nós somos uma emissora regional com foco no Norte e Nordeste, então a nossa expansão é para essas regiões (SILVA, 2018, p. 491).
Autores como Lima (2008) pontuam que apesar da busca pelo local, que é um dos propósitos da regionalização midiática, não há – ou não deve existir – uma exclusão, mas uma cinesia pautada na complementaridade e no equilíbrio entre os movimentos. Dessa forma é que a TV Meio Norte entende que, apesar do desafio de estender o conteúdo e ampliar a linha editorial da TV através do processo de expansão adotado pela emissora, deverá pautar-se no equilíbrio entre a produção de matérias locais e falar também dos demais estados que são alcançados pela programação e pelo sinal de retransmissão da rede, até mesmo porque a TV MN, atualmente, está presente em 25 estados brasileiros sendo seis em canal aberto e 19 por meio do canal fechado, conforme o projeto comercial do GMNC, em 2020.
Ao se refletir sobre as mudanças no panorama midiático do Brasil, é inquestionável o fato do crescimento das mídias regionais estar diretamente relacionado às transformações econômicas do país. Fadul (2010) credita a expansão da mídia regional a vários fatores como o processo de descentralização industrial de São Paulo e o crescimento do setor de serviços da região Nordeste. Por essa razão é que a autora vai afirmar que esse contexto estimulou o surgimento de oportunidades de negócios em outras regiões do país - vindas de fora do eixo Rio/São Paulo – e despertou o interesse de agências de publicidade, anunciantes e dos veículos de comunicação. Neste cenário é que o Grupo Meio Norte, após o processo de regionalização e expansão da rede, se denomina “o cross mídia mais forte da região e o maior do Estado” (Projeto Comercial do GMNC, p. 4).
Ainda sobre isso, vale sublinhar a explicação dada por Wrias Moura à pesquisa “Regionalização Televisiva: análise da proposta da Rede Meio Norte”, de Silva (2018), ao ser indagado sobre como se deu a experiência de regionalização da MN a partir do contexto de surgimento e desenvolvimento da TV no Brasil:
Quando a TV surgiu no Brasil há 70 anos, ela surgiu no eixo Rio/São Paulo, na região onde tinha dinheiro para investir em equipamentos de televisão. As TVs se instalaram no eixo Rio/São Paulo, fizeram retransmissão de sinal, fomentaram retransmissoras pelo Brasil, e passaram a ter sinal da Rede Nacional e, começaram a ter afiliadas com programas locais [...] No passado, a TV não conseguiu ser regional no Brasil, cada estado tendo sua rede de televisão com 24 horas de programação, porque não tinha dinheiro para isso. No entanto, teve uma democratização do preço, da diminuição do preço de equipamentos de televisão, de transmissão de tudo. Isso possibilitou que emissoras pequenas pudessem investir se quisessem. Optamos por investir e, transformar a Rede Meio Norte, numa rede de televisão regional (SILVA, 2018, p. 492).
O texto de “Apresentação” do projeto comercial da MN identifica o grupo como sendo um conglomerado de comunicação – através das Rádios, Jornal, TV e Portal – que leva conteúdo global e regional para, segundo eles, mais de quatro milhões de pessoas do Meio-Norte do Brasil. O GMNC afirma ainda que, graças à internet, “o mundo está ao nosso alcance”, o que significa que onde quer que haja internet, o grupo estará para “atualizar, acessar a informação, divertir, comprar, vender ou quando uma marca, produto ou serviço tiver algo relevante a dizer, basta escolher a MÍDIA. O GMNC é o meio capaz de proporcionar uma comunicação por inteiro” (p. 4).
Em síntese, pode-se afirmar que a TV MN atende a muitas das características que compõem uma TV Regional bem como obedece, em certa medida, aos conceitos outrora apresentados tais como: ser geradora do próprio sinal, a sede da emissora estar domiciliada no Piauí, a busca por evocar uma identidade regional e ser a única, no estado, com a programação produzida exclusivamente em território piauiense.
Considerações finais
A própria transformação da MN em um grupo regional através da ruptura com a afiliada se deu no interesse da emissora de produzir e veicular, cada vez mais, conteúdo próprio de cunho regional voltado ao público local.
TV Regional nesse artigo, baseado no levantamento bibliográfico realizado, é concebida como aquela que produz, veicula e retransmite seu sinal a determinada região, cujos limites estejam geograficamente delimitados, e que tenham sua programação voltada para ela mesma. Dessa forma se qualifica como uma televisão regional, sobretudo porque privilegia os assuntos, os temas e principalmente, as necessidades da comunidade daquela região, o que conflui consequentemente para a valorização da cultura e identidade das pessoas que ali residem.
Cumpre pontuar, com base nos pressupostos teóricos dessa investigação, que a TV Regional e a regionalização midiática não descartam, eliminam ou mesmo enfraquecem a Globalização, ao contrário, ambos os fenômenos coexistem lutando com força equipendente dentro do atual e complexo ecossistema midiático de comunicação mundial – ora com produção de conteúdo global, ora com produção de conteúdo regional; ora com produção de conteúdo global/nacional/regional e local.
Neste cenário, o Grupo Meio Norte de Comunicação (GMNC) é apercebido – e se intitula – como um veículo de viés regional no Piauí, uma vez que tem uma programação que preza pela produção e veiculação de conteúdo regional. A emissora, com sede em Teresina (PI), tem uma grade composta por 40 programas – todos eles produzidos dentro do grupo, que são veiculados 24h por dia durante os sete dias da semana, segundo o projeto comercial da rede. Para além dos programas ‘da casa’, que já fazem parte da rede de programação cotidiana, têm-se também projetos jornalísticos como a Caravana Meu Novo Piauí; que foi criada, ainda em 2009/2010 antes mesmo da emissora se tornar independente, com o objetivo de investir na produção e divulgação de conteúdo regional.
Ao veicular conteúdo regionalista; e no âmbito das discussões propostas neste artigo sobre televisão regional, é perceptível ademais o diálogo entre regionalização e Folkcomunicação. A inclusão da cultura, dos costumes, das tradições, das práticas e dos anseios de grupos que normalmente não figuram entre as vozes constantemente difundidas pela dita mídia tradicional pode resultar em produções de significativo valor, tanto do ponto de vista mercadológico como cultural, alimentando, nesses grupos, o sentimento de pertencimento e valorizando sua identidade cultural.
Cumpre destacar, porém, que as razões para o GMNC criar projetos como ‘Caravana Meu Novo Piauí’, por exemplo, vão além do interesse genuíno de produzir conteúdo regionalista, contemplar os piauienses e seus cotidianos em suas produções e atender a critérios de noticiabilidade como grau de interesse ou proximidade; obedecem a princípios outros que estão atrelados a todo o processo de produção informativa como fortalecer discursos hegemônicos da emissora no PI ou sustentar parcerias criadas ao longo dos anos.
Em suma, embora essas reflexões sejam pontuais para o Grupo Meio Norte servem como ponto para pensar outros programas ou projetos jornalísticos que estão sendo desenvolvidos em grupos de mídia local, em TVS Regionais. Necessário destacar, por fim, que as discussões que compõem esse artigo não representam o esgotamento das temáticas, pois os temas seguem ocupando importantes espaços dentro das pesquisas acadêmicas que necessitam de novos aprofundamentos e pesquisas a partir de outros observáveis.
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Notas
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