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Três Formas de Entender a Liberdade? Notas sobre a Crítica Neorrepublicana ao Liberalismo
Three Ways to Understanding Liberty? Notes on the Neo-republican Critique of Liberalism
¿Tres Formas de Entender la Libertad? Apuntes sobre la Crítica Neorepublicana al Liberalismo
Revista Opinião Jurídica, vol. 22, núm. 41, pp. 63-83, 2024
Centro Universitário Christus

Artigo


Recepción: 07 Junio 2024

Aprobación: 08 Noviembre 2024

DOI: https://doi.org/10.12662/2447-6641oj.v22i41.p63-83.2024

RESUMO

Contextualização: Há farto debate acerca do republicanismo na teoria política contemporânea, sendo uma das mais fortes tradições de pensamento político do Ocidente. Tal tradição foi reavivada como autônoma em relação ao liberalismo por pensadores, como Quentin Skinner, Philip Pettit e Maurizio Viroli, inseridos em uma tradição de pensamento político que se convencionou chamar de neorrepublicanismo. Ponto central do argumento neorrepublicano é a crítica ao conceito liberal de liberdade.

Objetivo: Busca-se retomar o argumento liberal acerca do conceito de liberdade para cotejá-lo com o conceito neorrepublicano. Assim, ao final, articula-se uma crítica alegadamente republicana ao argumento neorrepublicano.

Metodologia: Fazendo um apanhado da ideia de liberdade em pensadores liberais, bem como articulando este conceito na tradição republicana, desenvolveu-se um argumento filosófico demonstrando supostas fraquezas da crítica neorrepublicana.

Contribuições: Resgatando a tradição republicana desde suas origens clássicas, busca-se demonstrar que o argumento crítico ao liberalismo, presente no neorrepublicanismo, acaba por afastar este pensamento das bases clássicas da tradição republicana.

Palavras-chave: Republicanismo, neorrepublicanismo, liberdade, tradição, modernidade.

ABSTRACT

Contextualization: There is a substantial debate on republicanism in contemporary political theory. Republicanism is one of the most valuable traditions from Western political thought. This tradition was revived as autonomous in relation to liberalism by thinkers such as Quentin Skinner, Philip Pettit and Maurizio Viroli, who are inserted in a tradition of political thought that is conventionally called neo-republicanism. The central point of the neo-republican argument is the criticism of the liberal concept of liberty.

Objective: We seek to reconstruct the liberal argument about the concept of liberty in order to compare it with the neo-republican concept. Thus, in the end, an allegedly republican critique of the neo-republican argument is articulated.

Methodology: Taking an overview of the idea of liberty in liberal thinkers, as well as articulating this concept in the republican tradition, a philosophical argument was developed demonstrating supposed weaknesses of neo-republican criticism.

Contributions: Recovering the republican tradition from its classical origins, we seek to demonstrate that the critical argument towards liberalism, present in neo-republicanism, ends up moving this thought away from the classical foundations of the republican tradition.

Keywords: Republicanism, neo-republicanism, liberty, tradition, modernity.

RESUMEN

Contextualización: Hay mucho debate sobre el republicanismo en la teoría política contemporánea, ya que es una de las tradiciones más fuertes del pensamiento político en Occidente. Esta tradición fue revivida como autónoma respecto del liberalismo por pensadores como Quentin Skinner, Philip Pettit y Maurizio Viroli, insertos en una tradición de pensamiento político que convencionalmente se denomina neorepublicanismo. El punto central del argumento neorepublicano es la crítica al concepto liberal de libertad.

Objetivo: Buscamos retomar el argumento liberal sobre el concepto de libertad para compararlo con el concepto neorepublicano. Así, al final, se articula una crítica supuestamente republicana del argumento neorepublicano.

Metodología: Tomando un panorama de la idea de libertad en los pensadores liberales, así como articulando este concepto en la tradición republicana, se desarrolló un argumento filosófico que demuestra supuestas debilidades de la crítica neorepublicana.

Aportes: Recuperando la tradición republicana desde sus orígenes clásicos, buscamos demostrar que el argumento crítico hacia el liberalismo, presente en el neorepublicanismo, termina por alejar este pensamiento de los fundamentos clásicos de la tradición republicana.

Palabras clave: Republicanismo, neorepublicanismo, libertad, tradición, modernidad.

1 INTRODUÇÃO

A mais sólida experiência republicana, altamente influente na teoria política moderna e responsável por implementar na prática e por consolidar um projeto republicano adaptado à realidade de seu tempo, foi a matriz norte-americana. Essa experiência partia de um cru realismo antropológico, explicitado por Madison (2011) quando afirma, no Federalista nº 51, a necessidade de instituições de governo adequadas, uma vez que os homens não são anjos. Uma leitura rápida do Federalista poderia indicar um republicanismo baseado na preponderância das instituições sobre as virtudes dos agentes públicos e dos cidadãos. Uma leitura mais acurada, entretanto, mostra que tal tradição republicana não apenas baseava suas instituições na virtude dos agentes públicos, mas também, de modo mais especial, trazia considerações sobre as virtudes para dentro das próprias instituições: a instituição só funciona adequadamente em vista do exercício de virtudes por parte daqueles agentes públicos que operam tais instituições, de modo que não bastam apenas instituições para que um regime republicano esteja configurado. Deve se dar destaque, ainda, à importância do reconhecimento da virtude popular, pois, como dizia Madison, “supor que alguma forma de governo assegurará a liberdade ou a felicidade sem qualquer virtude no povo é uma ideia quimérica” (Madison apudDiamond, 1986, p. 235). Logo, por mais que houvesse – e havia – um ceticismo em relação ao regime popular, tal reticencia era em relação ao regime democrático na sua forma pura. O republicanismo demandava a consideração pelo governo misto, mas, ao mesmo tempo, ainda assim era, em sua essência, um governo que chamamos de popular ou democrático.

Não se pode olvidar, como está presente na passagem acima transcrita, que instituições e virtudes andam juntas com o objetivo de manter e promover um estado de liberdade. Não apenas modernamente – certamente isto já estava claro em Maquiavel, como visto, sem contar Montesquieu e no Federalista – mas também para Cícero, por exemplo, todo o ponto do regime republicano, toda a defesa das instituições do governo misto, do governo das leis e do governo dos muitos, está na busca pela (e também na manutenção de) um estado de libertas (Cicero, 2006, Rep., II, 57). Então, de certo modo, do ponto de vista dos founding fathers – e mesmo para a tradição republicana como um todo – vai parecer forçada, ou ao menos demasiado esquemática, a divisão intuitivamente estanque que se consagra na terminologia a partir de Constant (2015) a respeito da liberdade, separando uma concepção “antiga” de uma concepção “moderna” de liberdade. Mesmo que o próprio Constant acabe mitigando, ao final, a diferenciação que articula, reconhecendo algum valor à liberdade dos antigos, a verdade é que sua terminologia dual se consolida e passa a influenciar o debate sobre a liberdade e a república, inclusive culminando na efetiva crítica à liberdade dos antigos, por Isaiah Berlin chamada de liberdade “positiva”.

A diferenciação entre liberdade dos antigos e dos modernos passa a ser, portanto, uma chave de leitura canônica, não apenas para compreender o sentido da modernidade, mas também em discussões sobre o liberalismo e mesmo sobre as revoluções. Prova de tal influência é o modo como Arendt (2011, p. 56-64), por exemplo, explora a terminologia para dizer que é a liberdade, e não a justiça, o critério revolucionário. Nessa discussão, ela apresenta uma diferença entre “liberdade” e “libertação”, aduzindo que libertação é apenas uma “liberdade de restrições injustificadas” e, nesse sentido, “negativa”; enquanto “o conteúdo concreto da liberdade ... é a participação nos assuntos públicos ou a admissão na esfera pública”. Para ela, “a libertação pode ser a condição da liberdade, mas de forma alguma conduz automaticamente a ela”. Assim correlaciona, mas, ao mesmo tempo, parece opor, de um lado, uma liberdade de participação política oriunda do ideal de igualdade dos clássicos e, de outro lado, uma noção de libertação enquanto liberdade negativa, proposta pelos revolucionários modernos. O argumento de Arendt em prol da liberdade positiva, ou seja, em prol da liberdade dos antigos, contrasta com os argumentos de Constant e, em especial, com os de Berlin. Para além do fato de que ela parece discordar e defender os antigos, o ponto a ser destacado é o fato de que a terminologia em si não é causa de disputa.

Este era o cenário terminológico quando pensadores, como Quentin Skinner, Philip Pettit e Maurizio Viroli, inseridos em uma tradição de pensamento político que se convencionou chamar de neorrepublicanismo passaram a articular uma crítica, alegadamente republicana, à ideia liberal de liberdade. Assim, o ponto central do argumento neorrepublicano é a crítica à defesa liberal da liberdade dos modernos. A crítica por eles apresentada buscará fazer uma releitura dessa dualidade antiga/moderna, positiva/negativa. O presente estudo pretende explorar a terminologia consagrada sobre a liberdade, que opõe a liberdade antiga ou positiva à liberdade moderna ou negativa, cotejando-a com a crítica neorrepublicana. Com isso, buscaremos demonstrar não apenas que a crítica neorrepublicana ao liberalismo parece não fazer sentido, pois a forma que descrevem o conceito neorrepublicano de liberdade segue sendo negativo e, portanto, moderno, bem como, consequentemente, subestimam a importância do pensamento clássico para a tradição republicana do Ocidente.

2 A APRECIAÇÃO LIBERAL E AS DUAS FORMAS DE ENTENDER A LIBERDADE EM CONSTANT

Constant foi um pensador ambivalente em relação à Revolução Francesa. Ao mesmo tempo que se mostrava como um defensor da revolução republicana, também se apresentou como crítico da política pós-revolucionária (Manent, 2020, p. 155). Justamente na busca dos motivos que levaram a Revolução à desgraça, Constant – como um bom pensador republicano, defensor da soberania popular em oposição à hereditariedade real – não questiona as bases da soberania popular, que havia abusado de sua posição e seu poder (o que ele reconhece e admite), mas, ao contrário, busca a explicação das mazelas revolucionárias na consideração de um descompasso de pensamento acerca da própria ideia de liberdade. A confusão entre dois tipos diferentes de liberdade seria a causa dos males da Revolução (Constant, 2015, p. 75), e essa se dava justamente em função de uma diferença institucional: enquanto os antigos exerciam a liberdade política de modo direto, os modernos possuíam uma nova instituição, desconhecida dos clássicos, que era o governo representativo. A organização social da antiguidade não permitia perceber os benefícios do governo representativo. Aliás, eles nem sequer pensavam nesses termos, pois sua realidade não demandava tal instituição. Uma diferença institucional, portanto, gerava diferentes – e aparentemente incompatíveis – noções de liberdade (Constant, 2015, p. 75-77).

Assim, a liberdade dos modernos poderia ser descrita como “o direito de não ser submetido senão às leis, de não poder ser preso, detido, condenado à morte nem maltratado de maneira alguma pela só vontade arbitrária de um ou alguns indivíduos” (Constant, 2015, p. 77), sendo que, em consequência, envolvia valores caros à sociedade moderna, tais como a manifestação da opinião, a escolha e o exercício da profissão, o direito de dispor e abusar da propriedade, o direito de ir e vir sem pedir permissão e sem prestar contas, o direito de reunir-se com outros indivíduos (debater, crer, gozar), bem como o de influir sobre a administração do governo. Por outro lado, a liberdade antiga “consistia em exercer coletivamente, mas de forma direta, muitas partes da própria soberania” (Constant, 2015, p. 78), mas – e isso é deveras relevante para um moderno – tal liberdade, contudo, também admitia “a sujeição completa do indivíduo à autoridade do conjunto... Todas as ações providas são submetidas a uma vigilância severa. Nada é atribuído à independência individual” (Constant, 2015, p. 78), de modo que “dentre os antigos, o indivíduo, quase sempre soberano nos negócios públicos, é escravo em todas as suas relações privadas” (Constant, 2015, p. 79). Aqui, portanto, podemos ver uma oposição entre o cidadão – conceito claramente ligado à antiguidade –, e o indivíduo – ligado à modernidade. O antigo pode deliberar em praça pública, inclusive sobre guerra e paz; celebrar alianças; votar as leis; realizar julgamentos; examinar contas, atos e gestão dos magistrados e fazê-los comparecer perante o povo, condenando-os e julgando-os; mas “é um escravo em todas suas relações privadas” (Constant, 2015, p. 79).

O destaque que Constant busca dar ao governo representativo vem justamente para explicar a diminuição da soberania do indivíduo em relação ao cidadão. Para a manutenção da paz e do funcionamento moderado do regime, o indivíduo da modernidade delega a soberania que o cidadão da antiguidade gozava: “entre os modernos, ao contrário, o indivíduo, independente na vida privada, não é, mesmo nos Estados mais livres, soberano senão na aparência. Sua soberania é restrita, quase suspensa... se exerce essa soberania, não é senão para abdicá-la” (Constant, 2015, p. 79).

Assim, o que Constant apresenta para justificar e explicar os abusos do governo popular revolucionário é uma série de dualidades. O “antigo” aparece em oposição ao “moderno”, claro, mas, na mesma linha, o “público” aparece em oposição ao “privado”; o “coletivo” aparece em oposição ao “individual”; o “cidadão” aparece em oposição ao “indivíduo”; e a “soberania” aparece curiosamente em oposição à “autonomia”. O indivíduo – que agora é identificado como sujeito de direito que vive a vida privada, se relaciona por meio do direito privado e tem uma esfera de direitos imune à intromissão estatal ou de terceiros – para ter a sua vida privada, é autônomo, mas muito pouco soberano do ponto de vista comunitário. Ele exerce sua cidadania “para abdicá-la”.

Naturalmente a explanação sobre a diferença entre os antigos e os modernos perpassa por uma anotação acerca das causas de tais diferenças. Na antiguidade. havia, por exemplo, limites geográficos estreitos, escravidão, vínculos familiares e históricos elevados, necessidade de permanente preparação para uma eventual guerra, assim como pelo fato de que era justamente a guerra que servia como base para o alcance de desejos. Por outro lado, o comércio moderno “substitui a guerra”. Agora vemos organizações políticas com vasto território – que diminuem a importância relativa de cada indivíduo na deliberação –; temos uma sociedade com modos diversos, ou seja, heterogêneos, de organização social; vive-se sob uma organização social na qual a ausência de escravos retira do cidadão-indivíduo o tempo para a participação na vida pública; e, por fim, no mesmo sentido, em uma sociedade comercial, não há intervalos de inatividade que permitem a preparação para a guerra por meio da participação política, de modo que há uma conexão entre a tendência pela paz e o comércio – que passa a ser, então, o meio para o alcance de desejos (Constant, 2015, p. 81-84).

O objetivo de Constant, parece claro, é dizer que os abusos da Revolução foram causados por aqueles que, com base em uma ideia de liberdade dos antigos, tentaram suprimir a moderna liberdade individual. Erroneamente colocavam a vontade coletiva acima da individual.

Feita a diferenciação e apresentadas suas causas, Constant passa, então, a defender de modo explícito a ideia de que a liberdade dos antigos é incompatível com a vida moderna. Ao mesmo tempo em que afirma que “não podemos mais gozar da liberdade dos antigos, que se compunha da participação ativa e constante no poder coletivo. Nossa liberdade deve compor-se do gozo pacífico da independência privada” (Constant, 2015, p. 85), ele também registra que a liberdade não é mais a partilha e a participação política, mas sim o gozo da vida privada:

o objetivo dos antigos era a partilha do poder social entre todos os cidadãos de uma mesma pátria. Era isso o que eles chamavam de liberdade. O objetivo dos modernos é a segurança nos prazeres privados; eles chamam de liberdade as garantias concedidas pelas instituições a esses prazeres (Constant, 2015, p. 86).

Portanto, em uma primeira leitura ao menos, há uma crítica à liberdade dos antigos.

Agora, é bem verdade – e Constant (2015, p. 97-102) possui clareza sobre isso – que uma nova forma de liberdade também pode ser causa de uma nova forma de tirania. A preocupação dos clássicos com o risco da tirania não é mais, propriamente, o da usurpação do poder político, mas sim o risco da apatia, da renúncia à esfera pública por aqueles que estão “absorvidos pelo gozo da independência privada e pela busca dos prazeres particulares” (Constant, 2015, p. 100). Portanto, mesmo que a oposição forte entre participação política e gozo da vida privada seja o cerne do argumento, esse, ao menos aparentemente, não pode ser visto como um atentado tão grave à tradição republicana. Constant é um pensador de transição. É possível ver nele uma ambivalência, como referiu Manent. Assim, de um modo até confuso, estão presentes simultaneamente elementos de duas visões de mundo diferentes. Ao mesmo tempo em que denuncia a liberdade dos antigos, reconhece sua importância na luta contra o risco da apatia cívica – alerta que vemos muito claramente em Tocqueville (2000, p. 661-665) quando descreve o regime norte-americano. A mitigação da separação estanque entre liberdade política e autonomia individual fica clara na concessão que Constant (2015, p. 102) faz ao final da liberdade dos antigos comparada à dos modernos. Finaliza sem desmerecer a liberdade antiga de participação política, mas reafirma que ela simplesmente não é suficiente: “longe, então, senhores, de renunciar a alguma das duas espécies de liberdades de que vos falei. É preciso, já o demonstrei, aprender a combinar uma com a outra”, pois a liberdade política é indispensável à liberdade dos modernos, na medida em que “a liberdade individual é a verdadeira liberdade moderna. A liberdade política é a sua garantia; é, em consequência, é indispensável” (Constant, 2015, p. 96). Assim, pode Constant afirmar que “jamais é preciso exigir o sacrifício [da liberdade individual] para estabelecer a liberdade política” (Constant, 2015, p. 92). Pode-se dizer que Constant instrumentaliza a liberdade antiga, pois ela não se apresenta como um fim em si mesma.

Em boa medida, o que vemos em uma leitura acurada de Constant é que a tradição republicana passa a reconhecer duas formas de liberdade, uma alegadamente oriunda da tradição clássica, que preza pelo exercício da liberdade política – exercício muito caro a uma pensadora como Arendt, por exemplo – mas compreendida de modo instrumental apenas, e outra que, modernamente, estaria conectada com a vida de comercial, com o exercício da autonomia privada no mercado e com o sistema representativo que serviria para filtrar os ímpetos da soberania popular. Essa seria a verdadeira liberdade.

Será que podemos mesmo pensar em uma tradição republicana exclusivamente moderna calcada na liberdade privada como algo oposto à tradição antiga? Não seria mais adequado olhar para a tradição republicana como uma conjugação de vida e liberdade privadas com o dever cívico de participação política? Nosso argumento, como será demonstrado, pretende destacar que, na tradição republicana, a liberdade dos antigos não tem uma faceta meramente instrumental. A liberdade republicana, então, é uma liberdade “complexa”, dual, que só possui sentido ao ser compreendida de um como articulado dentro de uma tradição que, mesmo sendo moderna, remonta à filosofia política clássica, conformando uma “tradição republicana ocidental”.

3 A CONSOLIDAÇÃO DA TERMINOLOGIA LIBERAL COM BERLIN

Governo representativo, em Constant, é moderno. Tal regime, consequentemente, está a serviço da liberdade dos modernos. Contudo, Constant (2015, p. 96) não se mostra como um radical, na medida em que expressamente afirma que não busca, “em hipótese alguma, diminuir a importância da liberdade política”. Agora, quando olhamos para a abordagem de Isaiah Berlin, vemos algo diferente, e muito mais radical. Em que pese à continuação de seu trabalho com uma dualidade parecida com a de Constant, sua abordagem assume uma nova terminologia. A liberdade dos antigos será descrita como uma liberdade “positiva” e a dos modernos como uma liberdade “negativa”1. Aliás, devemos notar, desde já, que, em boa medida, será contra a concepção de liberdade de Berlin para a qual neorrepublicanos, como Skinner e Pettit, irão se voltar.

Pois bem, agora, um dos pontos que se destacam na apreciação de Berlin é a ausência de conexão entre a liberdade e a política. Traço de sua abordagem liberal, Berlin acredita, por exemplo, que “não há conexão necessária entre liberdade individual e governo democrático”. Isso porque, diz ele, perguntar “quem me governa?” é diferente de perguntar “até que ponto o governo interfere comigo?” (Berlin, 2002, p. 177). Sendo perguntas diferentes, o sentido “positivo” de liberdade estaria preocupado com aquele que exerce o governo – uma preocupação dos antigos – enquanto o sentido “negativo” de liberdade estaria preocupado apenas com as interferências sofridas pelo agente – uma preocupação moderna –, de modo que o regime político pareceria pouco importar para uma análise da liberdade. Assim, em Berlin, a liberdade dos antigos, de vida ativa e participação política, parece perder o sentido. Quando se fala de liberdade, portanto, não se fala mais em participação política.

Ao trabalhar com os dois conceitos de liberdade, Berlin opõe duas preposições diferentes. A liberdade negativa, tipicamente moderna e única coerente, é uma liberdade de (liberty from), de modo que denota uma espécie de imunidade. Por sua vez, liberdade positiva, em vez de ser uma liberdade em relação a constrições e a interferências, ao contrário, é uma liberdade para (liberty to), ou seja, é uma capacidade para agir de um modo previamente prescrito (Berlin, 2002, p. 174, 178). O objetivo de Berlin, como já está claro, é defender o primeiro e rechaçar o segundo conceito de liberdade.

A liberdade negativa, liberty from, “significa a ausência de interferência de outros” (Berlin, 2002, p. 170). A expressão “não interferência”, assim, será um rótulo para descrever a forma “liberal” de compreender a liberdade e será amplamente criticada por Pettit (1997), por exemplo, para defender uma concepção diferente, e neorrepublicana, da liberdade. É justamente com a suposta insuficiência da “liberdade enquanto não interferência” que o republicanismo está insatisfeito, pois vislumbra, nesse modo de compreender a liberdade, uma desconexão com o sistema político vigente. Berlin, como citado acima, é literal ao afirmar tal desconexão:

a liberdade nesse sentido [negativo] não é incompatível com alguns tipos de autocracia, ou de qualquer forma com a falta de um autogoverno. Liberdade, nesse sentido, é a preocupação principal com a área de controle, não com sua fonte... é perfeitamente concebível que um déspota de mente liberal permita que seus súditos tenham grande liberdade pessoal... Liberdade, neste sentido, não é, em todo caso, logicamente, conectada com democracia ou autogoverno (Berlin, 2002, p. 176-177).

Berlin está preocupado com a pretensa tirania que a busca “romântica” por um sentido substancial na vida, a seu ver gerado por uma concepção positiva da liberdade, pode causar. Prefere uma liberdade em relação às interferências do que uma liberdade para (liberty to) buscar um sentido nas ações, visto que concepções materiais de como a vida deve ser vivida teriam um potencial totalitário. Por isso ele entende que a liberdade positiva, que atribui à liberdade um desejo de que “a minha vida e minhas decisões dependam de mim mesmo e não de forças externas de qualquer tipo” (Berlin, 2002, p. 178), seria tão perigosa. Para o conceito de liberdade positiva, “sou livre não só quando ninguém me impede, mas quando ajo” (Berlin, 2009, p. 254). Para Berlin, embutida na noção de liberdade positiva haveria a ideia de que seria lícito coagir outrem desde que seja para um objetivo “legítimo” – e mais ainda quando se formula o argumento de tal forma que essa coerção se apresenta justamente para o bem daqueles que estão sendo coagidos. Um liberal moderno como ele não está disposto a aceitar essa visão de liberdade.

Ao chamar a liberdade positiva de “romântica”, Berlin pretende ilustrar o potencial tirânico de tal conceito de liberdade. A primeira postura que ele descreve é a auto abnegação, consistente em acreditar que devo me liberar dos desejos que não posso alcançar, de modo que assim serei livre, pois estarei obedecendo ao meu “verdadeiro eu” e não a desejos externos ou desviados. No limite, diz ele, a liberdade verdadeira sob tal perspectiva seria apenas a morte, o suicídio (Berlin, 2002, p. 181-187). A segunda postura decorrente de concepções positivas de liberdade seria a autorrealização por meio do uso da razão. Aqui a postura é aquela do matemático ou do músico que, ao compreender o sentido das coisas, não se sente mais restringido por elas, mas passa a viver e a fazer parte daquela liberdade. Compreendemos quando alguém diz que a partitura, para um iniciante em música, representa uma restrição, uma heteronomia. Contudo, para um músico profissional, ela é o modo pelo qual ele exerce sua verdadeira liberdade (autonomia). A liberdade se dá, enquanto autorrealização, pela compreensão da racionalidade do mundo. Entender o mundo é ser realmente livre. Logo, se o mundo é racional e o agente tem conhecimento disso, não sofre coerção, pois está ao lado da razão. A razão (correta) liberta. Mas um mundo plural tem dificuldades em aceitar tal juízo de valor, pois, do ponto de vista da liberdade política, uma visão de liberdade baseada nessa compreensão presumiria um único modo correto e racional de resolver os problemas políticos. Há um mundo perfeito, ou no passado, ou no futuro. Para Berlin, o caminho entre isso e a ideia de que o agente que compreendeu a verdade deve moldar todos os demais integrantes da sociedade, seria apenas um passo lógico, uma vez que liberdade não é para que se aja de modo “irracional”. Forçar as pessoas para as ações certas, “racionais”, não seria tirania, mas sim libertação. Liberdade se tornaria, então, idêntica – e não contraposta – à autoridade (Berlin, 2002, p. 187-200). Essa é a crítica que ele articula contra a “romântica” visão de liberdade enquanto liberdade positiva.

Berlin repete o argumento de Constant no sentido de que os abusos da Revolução foram causados por uma noção positiva de liberdade, a qual buscava incutir nos demais uma visão de mundo específica (Berlin, 2002, p. 208). Dessa visão positiva acerca da liberdade pode-se, assim, extrair a conclusão de que, até mesmo, uma democracia pode ser tirânica (ainda mais se for baseada em ideias racionalistas e românticas como a “vontade geral” – a crítica a Rousseau é forte em Berlin). Logo, uma vez mais, vemos o argumento de que liberdade e democracia não se implicam necessariamente. Justamente por isso a ideia liberal do constitucionalismo seria justamente a de impor limites ao poder, de modo que uma mínima esfera de liberdade negativa, como não interferência, por exemplo imunidade, fosse preservada. O valor da liberdade positiva, para ela ter sentido, seria a preservação a liberdade negativa. A liberdade positiva parece, dessa forma, no máximo, ser admitida como uma espécie de meio para o fim legítimo que é a liberdade negativa. Essa última é que parece merecer, de fato, a proteção (Berlin, 2002, p. 211).

Portanto, tanto Berlin quanto Constant, ao final, parecem até reconhecer algum valor, ainda que instrumental, à liberdade dos antigos ou à liberdade positiva. Manent, por exemplo, chega a dizer que Constant

não afirma de modo algum aqui a superioridade do princípio dos ‘modernos’ sobre o dos ‘antigos’; simplesmente, as condições sociais e políticas da felicidade humana eram, na cidade antiga, radicalmente diferentes das que prevalecem nos Estados modernos ... ele apenas afirma que a aplicação da política antiga ao estado social moderno faz sofrer terrivelmente os homens, porque os faz viver contradição (Manent, 2020, p. 164-165).

Mas tal valor é sempre apenas como uma espécie de meio, e não de fim em si próprio – e, certamente, Berlin é bem mais crítico da liberdade positiva do que Constant era em relação à liberdade dos antigos. Então, por mais que se possa até correlacionar a liberdade dos antigos descrita por Constant com a conceito positivo de liberdade, e se possa fazer o mesmo com a liberdade dos modernos e o conceito negativo de liberdade, em verdade, Berlin apresenta uma separação muito mais estanque: a única forma de liberdade coerente seria a liberdade negativa.

4 UMA TERCEIRA FORMA DE ENTENDER A LIBERDADE?

A retomada do pensamento republicano se deu em vista de uma tentativa, iniciada por historiadores nos meados da década de 1970, que objetivava

investigar as origens teóricas da tradição político-institucional anglo-americana em fontes até então não consideradas”. A ideia, portanto, era “desafiar a crença, até então compartilhada, segundo a qual as principais influências intelectuais dessa cultura política vinculavam-se, quase com exclusividade, a um pensamento liberal e individualista (Gargarella, 2020, p. 183-184).

Assim, Gargarella diferencia o “republicanismo contemporâneo” – o qual temos chamado de neorrepublicanismo – tanto do liberalismo, como do comunitarianismo. O neorrepublicanismo seria uma nova corrente nesse consagrado debate. Os ícones de tal pensamento republicano contemporâneo, como anteriormente referido, são Quentin Skinner, Philip Pettit e Maurizio Viroli.

Gargarella retrata o neorrepublicanismo como sendo uma simples retomada da tradição republicana e, em especial, do ideal de autogoverno. Em nome da tradição republicana vamos contestar essa aparente continuidade que supostamente estava presente no projeto neorrepublicano. Parece-nos que o neorrepublicanismo nega, ou ao menos negligencia, a origem clássica do republicanismo.

Nossas notas sobre o neorrepublicanismo envolverão dois aspectos. Em primeiro lugar, de fato, vamos reconhecer que o neorrepublicanismo, ao menos em discurso, apresenta uma pretensão de restabelecer as considerações sobre o regime político nas discussões sobre a liberdade que, como vimos, liberais como Berlin (e em alguma medida Constant), se rejeitavam a fazer. Pode-se dizer, então, como faz Gargarella, que o “ideal de autogoverno – objeto central da política republicana – parece rejeitado, em contrapartida, pela política liberal: uma ênfase nele tenderia a abrir a porta para aquela temida tirania da maioria” (Gargarella, 2020, p. 202). Mas, compreendido o projeto neorrepublicano, em segundo lugar, veremos que o modo como seguem falando da liberdade, ao fim e ao cabo, contraditoriamente, parece rejeitar as considerações sobre a participação política como sendo centrais para a tradição republicana. Por mais que tentem se valer da ideia de virtude cívica e de vida ativa, acabam se apoiando, modernamente, de modo excessivo, na liberdade negativa e, assim, parecem muito mais perto de romper com a tradição republicana do que de resgatá-la.

O traço comum do neorrepublicanismo com a tradição republicana como um todo, aquilo que nos permite utilizar um mesmo rótulo, envolve a noção de que o republicanismo almeja rejeitar, politicamente, a “dominação” – e isso por meio de virtudes, que operam instituições políticas adequadas. Há, portanto, no neorrepublicanismo, uma preocupação institucional assim como uma consideração sobre o respectivo papel das virtudes nesse arranjo. Assim, para os fins da discussão aqui proposta, importa salientar também que a neorrepublicana defesa da liberdade envolve a não apenas a “rejeição da dominação e da tirania”, mas também, ao reivindicar “uma ideia vigorosa de liberdade ... [o republicanismo] precisava, para sua preservação, da virtude dos cidadãos; e essa virtude, por sua vez, necessitava de certas precondições políticas e econômicas” (Gargarella, 2020, p. 190). A virtude, então, exercerá um papel central no funcionamento das instituições republicanas – e esse é o traço característico que conforma a sua tradição – de um modo bastante diferente daquele apresentado por Berlin, por exemplo, em que qualquer tentativa de educação para a virtude parece ser uma interferência indevida na esfera de liberdade enquanto imunidade. Assim, “liberdade” e “não dominação” passam a ser utilizados como conceitos-chave do pensamento neorrepublicano, em especial para se opor à ideia de liberdade enquanto “não interferência” que discutimos na sessão anterior.

Quando o neorrepublicanismo se propõe a questionar a liberdade negativa dos liberais, esse parecia ser o único modo modernamente coerente de entender a liberdade. MacCallum Junior (1967, p. 312-334), por exemplo, ao elaborar o argumento de que liberdade seria ausência de impedimentos para perseguir seus próprios fins, ou ao menos de escolher entre diferentes opções, tem a afirmação da liberdade negativa e a rejeição da liberdade positiva como dadas. Ele passa, então, a demonstrar como qualquer consideração que se pretenda racional sobre a liberdade seria uma consideração tríade sobre agentes, restrições e fins da ação. Sua pretensão é mostrar que as divergências a respeito dos conceitos de liberdade são sempre discussões sobre quem pode ser entendido como agente, sobre o que conta como restrição ou sobre o tipo de objetivo que o agente pode ter para fazer, ser ou se tornar. Consequentemente, as discussões sobre a liberdade não seriam mais discussões em torno do seu conceito positivo, mas sempre sobre o conceito negativo de liberdade.

Nesse cenário é que o neorrepublicanismo se propõe a substituir a terminologia da “não interferência” pela terminologia da “não dominação”. Mas curiosamente pretende fazer isso sem recorrer a uma ideia de liberdade positiva. Por isso, consideram que se trata de uma terceira forma de entender o conceito de liberdade (Pettit, 1997, p. 21-51). Para os neorrepublicanos, a noção liberal de liberdade negativa meramente enquanto “não interferência” seria incompleta. Ao mesmo tempo, contudo, eles não aceitam uma concepção positiva de liberdade. É certo que Skinner – diferentemente de MacCallum – até admite que pode existir uma noção coerente de liberdade positiva oriunda da tradição aristotélico-tomista, remontando à filosofia política clássica e à escolástica, mas, em verdade, ele diferencia (equivocadamente, acrescentamos) essa tradição do pensamento republicano (Skinner, 1984, p. 230-232). Parece haver, em seu pensamento, uma necessidade de apresentar o pensamento republicano como algo moderno e sem conexão com a tradição clássica. Então, ainda que retoricamente reconheça o fato de que a tradição republicana repousa sobre Cícero e a Roma Antiga, ele nitidamente crê que se trata de algo característico da modernidade, praticamente sem conexão com o mundo clássico, ou seja, Skinner (1984, p. 238) e Pettit (1997, p. 5-19) remontam a tradição republicana a Cícero, mas ignoram toda a influência que a filosofia política grega exerceu sobre ele. Parece que res publica não teria nenhuma conexão com politeia. Parece-nos que esse não é exatamente o caso.

Os neorrepublicanos, então, rejeitam a concepção de liberdade atribuída aos antigos, para apresentar uma espécie de terceira leitura sobre a liberdade. Se, de um lado, há a liberdade dos antigos, ou a liberdade positiva; e, de outro lado, há a liberdade dos modernos ou a liberdade negativa; Skinner – e depois Pettit – defendem que a liberdade republicana é moderna, negativa, e ainda assim diferente da concepção liberal.

Como forma de criticar a concepção liberal de liberdade, os neorrepublicanos acreditam que há um conceito de “liberdade antes do liberalismo” (Skinner, 1984, 1999) que, ao mesmo tempo, é apenas uma liberdade negativa, que enfrenta a questão da liberdade política de uma forma que liberais, como Berlin, não conseguiram. Argumentam, portanto, que o liberalismo nada mais é do que uma assunção parcial e incompleta de valores republicanos os quais são historicamente anteriores, mas não foram completamente assumidos pelo liberalismo no final da modernidade. Viroli (2002, p. 6-7), por exemplo, acredita que o liberalismo não seria um rival ou opositor do republicanismo, mas, ao contrário, seria uma derivação parcial e incompleta deste, pois assumiria apenas algumas das ideias republicanas. A pretensão neorrepublicana, portanto, é apresentar uma noção de liberdade que ainda pode ser considerada negativa, que se mostra “republicana” e, nesse sentido, diferente da liberal liberdade enquanto não interferência, pois alega que jamais aceitaria a desconsideração pelo regime político como faz Berlin, assim como também se mostraria diferente da liberdade dos clássicos, pois não aceitaria que considerações substanciais sobre a “vida boa” ou sobre os fins “corretos” da ação humana possam ser incluídos na discussão sobre a liberdade. Como Viroli explica em diálogo com Bobbio, para o neorrepublicanismo, “quem ama a verdadeira liberdade no indivíduo não pode não ser liberal, mas não pode ser apenas liberal” (Bobbio; Viroli, 2007, p. 28, grifos no original). Liberdade seria, então, “simplesmente estar livre de restrições para perseguir qualquer objetivo que a gente possa ter estabelecido para nós mesmos” (Skinner, 1984, p. 240).

Nossa hipótese aqui é a seguinte: se, por um lado, o neorrepublicanismo tem o mérito de efetivamente resgatar fontes e reflexões políticas em termos republicanos, ao fim, acaba por desmerecer a própria tradição na qual pretende estar. Diz que republicanismo consiste em autogoverno, mas apresenta um conceito de liberdade que não permite reconhecer e dar espaço verdadeiro para a vida cívica.

5 PARADOXOS DO CONCEITO DE LIBERDADE

Skinner (1984, p. 229) inicia seu argumento afirmando que há dois paradoxos na noção liberal de liberdade – paradoxos esses que a noção neorrepublicana de liberdade se propõe a resolver sem apelar para uma noção de liberdade positiva. O primeiro paradoxo envolveria a conexão entre liberdade política e autogoverno. Uma noção de liberdade negativa não consegue dar conta do link entre liberdade e obrigações cívicas, por exemplo. O segundo paradoxo envolveria a conexão entre liberdade e coerção, na medida em que a ideia de ser “forçado a ser livre” se apresenta como contraditória e inaceitável para a liberdade negativa, em que pese articulada pelo republicanismo como conexa à liberdade (Skinner, 1984, p. 229-230). Skinner não apresenta um exemplo, mas podemos imaginar que ele estaria pensando em algo como o voto obrigatório em que há uma obrigação jurídica a qual força o indivíduo a exercer sua liberdade política. Colocar, na mesma sentença, liberdade e coerção seria impossível na terminologia liberal – e, portanto, seria um paradoxo – do ponto de vista de liberdade negativa. Logo, aqueles que defendem um conceito negativo de liberdade seriam rápidos em apontar esses dois casos – autogoverno e coerção trabalhando em prol da liberdade – como sendo situações incoerentes e paradoxais, consequentemente incompatíveis com a liberdade.

Uma noção de liberdade positiva ou dos antigos resolveria os paradoxos. As teorias da liberdade que levam em consideração uma visão aristotélico-tomista da liberdade não são contraditórias, assim como não caem nos paradoxos apontados, na medida em que conectam liberdade com política e participação no espaço público de um modo coerente, assim como também possuem uma explicação para a ideia de que a coerção poderia levar à liberdade. É o que o pensamento de Arendt representa. Skinner admite a coerência da liberdade positiva e seus advogados expressamente, mas não é a solução que ele apresenta. Ele crê que “os dois paradoxos apresentados podem, de fato, ser acomodados dentro de uma ordinária teoria negativa de liberdade”, e isso se daria por meio do resgate do “republicanismo clássico” (Skinner, 1984, p. 229-237).

Tal resgate envolve a recordação de que as considerações sobre a liberdade republicana não começam no indivíduo ou nos seus “direitos” – como ocorre nas liberais teorias do contrato social – mas sim no Estado e na ideia de que apenas Estados livres podem alcançar aos seus cidadãos liberdade pessoal (Skinner, 1984, p. 237-238). Se “o triunfo ideológico do liberalismo deixou a teoria neorromana amplamente desacreditada [e] a concepção rival de liberdade embutida no liberalismo clássico veio a obter uma preponderância na filosofia política anglófona” (Skinner, 1999, p. 10) se mostrava necessário resgatar a teoria dos “Estados livres”. Tal teoria era um “espinho para as teorias de governo contratualistas” (Skinner, 1999, p. 23). A abordagem histórica de Skinner, dando ênfase para o Renascimento e o começo da modernidade (Skinner, 1996, 1999), se assemelha com a abordagem histórica de Pettit que busca demonstrar como a noção republicana de liberdade supostamente se perdeu no âmbito do debate da Revolução Americana (Pettit, 1997, p. 17-50).

Daí se justificaria a preocupação de Maquiavel, por exemplo, com a manutenção da liberdade da república: essa se justifica, pois o regime livre, republicano, seria capaz de gerar riqueza que efetivamente chega aos seus cidadãos, ao mesmo tempo em que também seria a única forma de garantir a liberdade. Assim, a liberdade individual depende de se estar vivendo sob a égide de um “Estado livre”. Portanto, antes de se falar em liberdade do ponto de vista do indivíduo, seria necessário falar da liberdade do ponto de vista do Estado. “A república autogovernada é o único tipo de regime sob o qual uma comunidade pode esperar atingir grandeza e ao mesmo tempo garantir aos seus cidadãos uma respectiva liberdade individual” (Skinner, 1984, p. 240-241), diz ele, sendo que tal regime apenas poderia ser mantido pelo cultivo da virtude por parte dos cidadãos (virtus, para Cícero; virtù para os Renascentistas e civic virtue para os ingleses). Assim, o primeiro paradoxo ficaria resolvido: se a liberdade individual é decorrente de se estar vivendo sob o “Estado livre”, então o autogoverno é necessário para a própria liberdade.

Esse é o modo pelo qual Skinner apresenta o argumento. Abre-se um parêntesis aqui para registrar que a hipótese aqui desenvolvida trabalha com a ideia de que o conceito de liberdade dos neorrepublicanos não servirá para dar conta desse ideal de autogoverno acerca do qual os neorrepublicanos tanto falam e que, efetivamente, é central para a tradição republicana.

Berlin e Constant, para Skinner, não conseguiram visualizar que a teoria dos Estados livres era uma teoria em prol da liberdade individual (Skinner, 1999, p. 56), por isso rechaçam a participação política como sendo parte integrante da liberdade negativa. Mas é justamente essa consideração pela prioridade lógica do “Estado livre” para o gozo da liberdade individual que, na visão de Skinner, faz que o republicanismo possa “ser tratado como uma escola de pensamento separada” (Skinner, 1984, p. 240) e superior ao liberalismo.

Agora, para além disso, Skinner demonstra como as instituições, entre elas “o poder coercitivo do direito”, sempre exerceram um papel relevante para os pensadores do republicanismo. Instituições – como a coerção jurídica – geram virtudes, e virtudes mantêm boas instituições. Assim, o segundo paradoxo também ficaria resolvido: “ao coagir o povo a agir de uma forma que mantenha as instituições de um Estado livre, o direito cria e preserva um grau de liberdade individual que, a sua ausência, rapidamente colapsaria em servidão absoluta” (Skinner, 1984, p. 244-245).

Em vista do resgate do ideal de “Estado livre”, Skinner conclui que “é um erro supor que os dois paradoxos considerados não possam ser acomodados dentro de uma regular análise negativa da liberdade”, pois os autores republicanos supostamente

nunca apelam para uma perspectiva positiva de liberdade social. Eles nunca alegam que somos seres morais com certos propósitos determinados e que, portanto, estamos apenas no completo exercício da nossa liberdade quando tais propósitos são realizados ... eles trabalham apenas com uma visão negativa da liberdade como a ausência de impedimentos para a realização dos fins escolhidos (Skinner, 1984, p. 247-248).

6 O ARGUMENTO NEORREPUBLICANO SOBRE A LIBERDADE

Philip Pettit, influenciado e em diálogo com os apontamentos de Skinner, passa, então, a articular o argumento neorrepublicano de um modo mais organizado e coeso. Para além de uma abordagem histórica similar à de Skinner – que ele afirma que também faz (vide esp.Pettit, 1997, p. 17-50) – seu argumento se propõe a apresentar uma linha “mais filosófica” em torno da ideia de “liberdade como não dominação”. Ele diz literalmente que a liberdade republicana, a liberdade enquanto não dominação, é uma terceira forma de compreender a liberdade, diferente das noções de liberdade positiva e negativa apresentadas por Berlin (Pettit, 1997, p. 21-51).

Assim, a tese neorrepublicana sobre a liberdade vem formulada da seguinte maneira: há uma terceira opção na taxonomia consagrada, uma vez que “é possível ter dominação sem interferência e interferência sem dominação” (Pettit, 1997, p. 22). Assim, enquanto a noção liberal de liberdade negativa é descrita como uma “não interferência”, a liberdade neorrepublicana é descrita como “não dominação”. O problema levantado pelo neorrepublicano pode ser ilustrado pelo exemplo do senhor e do escravo, ao qual Pettit remonta várias vezes: o escravo nem sempre é obrigado a fazer algo, ele pode até enganar seu senhor, por exemplo, ou pode ter um senhor “benevolente”. Nesse caso, na liberal terminologia consagrada, ele poderia ser considerado um escravo, mas com liberdade, na medida em que não sofre efetivas interferências na prática. Lembre-se que Berlin falava do “déspota de mente liberal [que permite que] seus súditos tenham grande liberdade pessoal” (Berlin, 2002, p. 176-177). Do ponto de vista neorrepublicano, parece haver uma contradição aqui: como um escravo pode ser considerado “livre” apenas por não sofrer interferências se continua à mercê do poder arbitrário de seu senhor, o qual efetivamente pode vir a ser exercido a qualquer momento? Em vista desse problema é que os neorrepublicanos, então, preferem dizer que liberdade é a ausência de “dominação”, em vez de afirmar que liberdade é apenas ausência de “interferência” nas ações (Pettit, 1997, p. 5, 31-35).

Contudo, algo deve ficar claro: a ideia de liberdade enquanto “não dominação” continua sendo uma espécie de “ausência de interferência”, mas trata-se de uma ausência de interferência arbitrária, ou seja, as “interferências não arbitrárias” seriam aceitas sem que se violasse o conceito de liberdade, de tal modo que os neorrepublicanos não teriam problemas com a coerção legítima, como a que vem do direito, por exemplo. O ponto, para eles, é diferenciar as interferências legítimas das ilegítimas. A interferência legítima, claro, até é uma restrição, mas não seria uma violação à liberdade (Pettit, 1997, p. 35-41). Como coloca Viroli, “ser livre, de um ponto de vista republicano consiste, mais do que não estar oprimido ou livre de impedimentos, em não estar dominado, isto é, em não encontrar-se submetido ao poder arbitrário de outra pessoa ou de outras pessoas” (Viroli, 2014, p. 41-42)2. Daí é possível identificar a importância do governo das leis para o neorrepublicano, que, na prática, vai se mostrar mais importante, e, até mesmo, superior, enquanto parte da liberdade negativa, do que a participação política. A ausência de dominação “significa que se respeita escrupulosamente o governo das leis, nenhum indivíduo pode impor de maneira arbitrária sua vontade aos demais indivíduos”, mas claramente não se tem, como era de se esperar em uma tradição republicana, o exercício de direitos políticos como algo central (Viroli, 2002, p. 47). Portanto, na verdade, o que se observa é uma ênfase neorrepublicana na importância de liberdade jurídica, ou seja, na liberdade negativa, deixando-se de lado o autogoverno. Ora, se não há participação popular, ou seja, se não há governo misto que leve em consideração também o governo dos muitos, não haveria república, e, assim, não haveria liberdade. O destaque para o governo das leis feito pelos neorrepublicanos parece deixar a tradição republicana incompleta.

A forma como o argumento neorrepublicano é, de início, articulado, em termos verdadeiramente republicanos, é bastante evidenciada. O problema é como ele termina. A reiterada tentativa de enquadrar a participação política como sendo parte da liberdade negativa é incongruente e esvazia o autogoverno. Skinner (1984, p. 246), Pettit (1997, p. 27) e Viroli (2002) repetem a mesma afirmação de que a liberdade republicana não é positiva. Nas palavras deste último:

tanto Skinner como Pettit rechaçaram a ideia segundo a qual ser livre significa obedecer a leis que nós mesmos aprovamos; e sublinharam que a concepção republicana ou neorromana da liberdade positiva não é uma concepção positiva da liberdade consistente no exercício direto de direitos políticos (Viroli, 2002, p. 47).

Afirmar que ser cidadão de uma república não envolve o “exercício direto de direitos políticos” não é uma assertiva condizente com a tradição republicana.

Não parece ser difícil compreender que a grande divergência dos neorrepublicanos com os liberais modernos deveria ser, justamente, a participação política. Quando há ênfase na ação política – como Arendt apresenta tão bem – a noção de liberdade negativa da forma como pensada pelos liberais, e mesmo na terminologia de Constant, parece incompleta na medida em que desdenha de considerações sobre o regime político. Assim, ser livre, para um pensador da tradicional tradição republicana, não pode ser apenas estar isento, ou imune, de interferências arbitrárias. A posição de “escravo de um senhor benevolente” ou de “súdito de um déspota de mente liberal” não atende a aspiração de liberdade do republicano. Até aqui não parece haver problema com o argumento neorrepublicano. O ponto é que se isso for realmente verdadeiro, então a liberdade não pode ser apenas liberdade negativa. Como diz Arendt (2011, p. 60-61), isso poderia até ser uma parcial e incompleta “libertação”, mas não será o efetivo exercício da liberdade, pois “o republicanismo tende a conceber a liberdade não como liberdade contra as maiorias, mas como consequência do autogoverno da comunidade” (Gargarella, 2020, p. 202) – ou seja, pressupõe a participação e a ação política virtuosas.

Assim, temos que, primeiro, a verdadeira tradição republicana leva em consideração os aspectos relacionados ao regime e à vida política; e, segundo, que a virtude importa, de modo que é necessária uma educação para a vida virtuosa. Portanto, pareceria simples para o neorrepublicanismo afirmar que a tradição republicana aceita uma forma dual de liberdade, conjugando no mesmo conceito a liberdade política e a liberdade jurídica, ou seja, a liberdade positiva dos antigos e a liberdade negativa dos modernos. Curiosamente, contudo, os neorrepublicanos não aceitam tal descrição. Acreditam, como visto, que a liberdade republicana é apenas uma liberdade negativa – almejam ser modernos, rejeitando a concepção clássica de liberdade. Pettit é direto nesse sentido, ao afirmar que seu ideal de liberdade republicana enquanto não dominação é “compatível com formas modernas e pluralistas de sociedade” (Pettit, 1997, p. 8). Ele almeja, de modo bastante claro, se desvincular do pensamento clássico. O mesmo é claramente perceptível em Skinner. Como dito anteriormente, não deixa de ser curioso, entretanto, que ambos, tanto Pettit (1997, p. 5-19) quanto Skinner (1984, p. 238) remontam a tradição republicana a Cícero e a Maquiavel, mas ignoram toda a influência que a filosofia política grega exerce sobre eles.

Pois bem, justamente em vista de tal constatação é que os autores que integram esse pensamento neorrepublicano parecem se contradizer e, mais, parecem até se afastar da própria tradição republicana que buscam resgatar. A negação da liberdade positiva parece fazer que eles se afastem demais da tradição clássica, da vida ativa e da própria participação política enquanto autogoverno. Pettit chega a afirmar que “as principais figuras da tradição republicana não se interessaram primordialmente pela liberdade no sentido de participação democrática” (Pettit, 1997, p. 31). Mas o próprio conceito de republicanismo parece indicar o contrário. Cícero – para não pegar inúmeras citações que poderíamos extrair de Montesquieu ou do Federalista, falando do autogoverno e da origem popular do poder3 – afirma que “a liberdade só pode existir verdadeiramente onde o povo tem o poder supremo ... os cidadãos se dizem livres porque tem o direito de sufrágio, elegem os magistrados e são elegíveis” (Cicero, 2006, Rep., I, 47). Portanto, o próprio conceito de cidadania, fortemente e obviamente vinculado à tradição republicana, já seria suficiente para provar o argumento: há uma evidente preocupação com a participação política em toda a tradição republicana, mas a ânsia por rejeitar o argumento clássico faz que os neorrepublicanos se afastem demais da tradição. Afirmam que estão mais preocupados com a dominação do que com as interferências – pois estas podem ser legítimas – mas não tratam verdadeiramente delas, visto que enfatizam apenas o aspecto negativo da liberdade. Não percebem que, para haver, na sua própria linguagem, interferência legítima, é preciso tratar da legitimidade democrática do justo político. Eles nem sequer chegam a fazer, de modo claro, o que faz Constant – ainda que timidamente – ao conceder que a liberdade política é, no mínimo, uma garantia do exercício de uma liberdade individual. Os neorrepublicanos parecem ser tão liberais quanto Berlin4 (que acreditam criticar) e aduzem que a liberdade republicana seria apenas uma liberdade exclusivamente moderna e sem preocupação efetiva com a participação política. Se o “foco é evitar interferência em vez de alcançar participação” (Pettit, 1997, p. 28), então parecem negar as raízes clássicas do republicanismo.

7 CONCLUSÃO

É claro que a tradição republicana tem um receio com a forma pura de democracia, pois se trata de uma forma não moderada de governo, que ignora a necessidade de um governo misto. Isso é bastante claro em vários pensadores da tradição política ocidental, desde Platão e Aristóteles até Montesquieu e Publius. Agora, o modo como Pettit descreve a descrença na democracia e o seu conceito de liberdade enquanto não dominação como algo exclusivamente moderno e negativo, busca negar a importância do governo dos muitos em abstrato, o que não nos parece condizente com a tradição republicana. Isso porque não parece haver dúvidas de que a ideia de governo dos muitos faz sim parte da tradição republicana. Procuramos demonstrar, assim, que a tradição republicana da liberdade é dual e complexa, preocupada, sim, com a liberdade também no sentido de participação política. Todo o debate institucional republicano pressupõe não apenas uma consideração pelas virtudes, mas um cidadão e um sujeito de direito. Se é verdade que o liberal pensa apenas no indivíduo signatário do contrato social – o que se admite para fins argumentativos na terminologia neorrepublicana – o neorrepublicano parece, então, se preocupar apenas com o sujeito de direito, no fim das contas, ignorando o cidadão. A noção republicana de liberdade é dual, admitindo a vida ativa e também esferas de imunidade. Os neorrepublicanos, indevidamente, se afastam de tal tradição da liberdade.

REFERÊNCIAS

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CICERO. On The Republic, On The Laws. Translated by Clinton W. Keyes. Cambridge: Loeb Classical Library – Harvard University Press, 2006.

CONSTANT, Benjamin. A liberdade dos antigos comparada à dos modernos. Organização, estudo introdutório e tradução de Emerson Garcia. São Paulo: Atlas, 2015.

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GARGARELLA, Roberto. As Teorias da Justiça depois de Rawls: um breve manual de filosofia política. Tradução Alonso Reis Freire. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2020.

HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O Federalista. Tradução, introdução e notas de Viriato Soromenho-Marques e João C. S. Duarte. Prefácio de Adriano Moreira. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011.

MACCALLUM JUNIOR, Gerald C. Negative and Positive Freedom. The Philosophical Review, v. 76, n. 3, p. 312-334, Jul. 1967.

MANENT, Pierre. História Intelectual do Liberalismo: dez lições. Lisboa: Edições 70, 2020.

PETTIT, Philip. Republicanism: a theory of freedom and government. Oxford: Oxford University Press, 1997.

SKINNER, Quentin. As fundações do pensamento político moderno. Tradução Renato Janine Riberto, Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

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SKINNER, Quentin. The paradoxes of political liberty. The tanner lectures on human values, p. 226-250, 25 Oct. 1984.

TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracy in America. Translated by Harvey C. Mansfield and Delba Winthrop. Chicago: University of Chicago Press, 2000.

VIROLI, Maurizio. Republicanism. Translated from the Italian by Antony Shugaar. New York: Hill and Wang, 2002.

VIROLI, Maurizio. Republicanismo. Traducción de Romina di Carli e Marina López. Prólogo Manuel Suárez Cortina. Santander: Editorial de la Universidad de Cantabria, 2014.

Notas

1 Para evitar confusões, deve ser registrado que “positiva” e “negativa” não denotam juízo de valor. Negativo, aqui, tem o sentido de espaço de imunidade. Positivo tem o sentido de participação, ação no âmbito político.
2 A passagem está no prefácio escrito pelo autor especificamente para a edição em espanhol, de modo que não se encontra na edição em inglês que utilizamos para as demais referências.
3 Mas, para não deixar de referir algumas passagens mais representativas:

A definição do direito de sufrágio é muito justamente vista como um artigo fundamental do governo republicano” (Madison, O Federalista nº 54);

“[...] podemos definir, ou ao menos designar por esse nome, uma república como sendo um governo que deriva todos os seus poderes direta ou indiretamente do grande corpo do povo e é administrado por pessoas que detêm os seus cargos enquanto aprouver ao povo, por um período limitado, ou enquanto procederem bem. É essencial a um governo assim que ele seja derivado de uma grande parte da sociedade, e não de uma proporção não considerável, ou de uma classe favorecida dela” (Madison, O Federalista nº 39).

É somente a razão do povo quem deve controlar e regulamentar o governo” (Madison, O Federalista nº 49). A edição de referência é: HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O Federalista. Tradução, introdução e notas de Viriato Soromenho-Marques e João C. S. Duarte. Prefácio de Adriano Moreira. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011.

O republicanismo norte-americano possuía uma desconfiança do regime puro, ou seja, da pura e simples democracia, sem o republicano regime misto. Isso, contudo, como visto, não significa que a liberdade não possuía valor democrático, como aponta Pettit. Ao contrário, era na confiança da virtude do povo que se baseada toda a ideia de república:

“Eu sigo este grande princípio republicano de que o povo terá virtude e inteligência para escolher pessoas de virtude e sabedoria. Não haverá virtude entre nós? Se não há, estamos em uma situação desventurada. Nenhum controle teórico, nenhuma forma de governo, podem tornar-se seguros. Supor que alguma forma de governo assegurará a liberdade ou a felicidade sem qualquer virtude no povo é uma ideia quimérica” (Madison apudDiamond, 1986, p. 235).

4 Veja-se a semelhança das passagens já citadas de Berlin e de Pettit, por exemplo: “não há conexão necessária entre liberdade individual e governo democrático” (Berlin, 2002, p. 177) e “as principais figuras da tradição republicana não se interessaram primordialmente pela liberdade no sentido de participação democrática” (Pettit, 1997, p. 31).

Notas de autor

Editora responsável: Profa. Dra. Fayga Bedê

https://orcid.org/0000-0001-6444-2631



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