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Saúde Mental relacionada ao Trabalho na Jurisprudência dos Tribunais Regionais do Trabalho do Estado de São Paulo
Silvio Beltramelli; Thalita Hage
Silvio Beltramelli; Thalita Hage
Saúde Mental relacionada ao Trabalho na Jurisprudência dos Tribunais Regionais do Trabalho do Estado de São Paulo
Work-related Mental Health in the precedents of the Regional Labor Courts of the State of São Paulo
La Salud Mental en el Trabajo en la Jurisprudencia de los Tribunales Regionales del Trabajo del Estado de São Paulo
Revista Opinião Jurídica, vol. 22, núm. 41, pp. 176-211, 2024
Centro Universitário Christus
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RESUMO

Objetivo: Trata-se de pesquisa que se propôs a compreender: (i) quais discussões processuais têm exigido dos TRTs da 2ª e da 15ª Regiões tratamento de temas ligados à saúde mental relacionada ao trabalho (SMRT); (ii) se os fundamentos decisórios, quando aludem ao assunto, o fazem tendo em perspectiva preceitos científicos oferecidos pela academia; e (iii) examinar se as decisões judiciais dos referidos Tribunais têm abordado a SMRT de uma forma central e decisiva ou perfunctória e não determinante para o resultado dos julgamentos.

Metodologia: Tratou-se de pesquisa empírica qualitativa do tipo estudo de casos descritivo exploratório, baseado em análise documental de acórdãos proferidos, entre os anos de 2020 e 2022, pelos TRTs da 2ª e da 15ª Regiões.

Resultados: Os resultados apontam para a necessidade de ampliação da compreensão por Magistradas e Magistrados do Trabalho oficiantes no Estado de São Paulo sobre a complexidade e a multifatorialidade do fenômeno da SMRT, bem como acerca das ferramentas de diagnóstico e eliminação dos diversos fatores e agentes de risco à saúde mental e ao bem-estar de quem trabalha.

Contribuições: A pesquisa relatada buscou provocar uma discussão sobre como a Justiça do Trabalho brasileira vem desempenhando a missão legal de proteção da SMRT, de forma a contribuir com a efetivação, pela via jurisprudencial, do direito humano ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável, sem que seja omitida ou deficientemente considerada sua dimensão atinente à saúde mental e ao bem-estar de quem trabalha.

Palavras-chave: Direitos humanos, trabalho decente, saúde mental relacionada ao trabalho, justiça do trabalho, estudo de casos.

ABSTRACT

Objective: This research aimed to understand: (i) which procedural discussions have required the TRTs of the 2nd and 15th Regions to deal with issues related to work-related mental health (WRMH); (ii) whether the decision grounds, when they allude to the subject, do so from the perspective of scientific precepts offered by academia; and (iii) examine whether the judicial decisions of these Courts have addressed WRMH in a central and decisive way or perfunctory and not decisive for the outcome of the judgments.

Methodology: This was qualitative empirical research of the exploratory descriptive case study type, based on documentary analysis of judgments handed down between 2020 and 2022 by the TRTs of the 2nd and 15th Regions.

Results: The results point to the need to broaden the understanding by Labor Magistrates officiating in the State of São Paulo about the complexity and multifactoriality of the phenomenon of WRMH, as well as about the tools for diagnosing and eliminating the various factors and agents of risk to the mental health and well-being of those who work.

Contributions: The research reported sought to provoke a discussion on how the Brazilian Labor Courts have been carrying out their legal mission to protect WRMH, in order to contribute to the realization, through jurisprudence, of the human right to a safe and healthy working environment, without omitting or deficiently considering its dimension relating to the mental health and well-being of those who work.

Keywords: Human rights, decent work, work-related mental health, labor justice, case studies.

RESUMEN

Objetivo: Esta investigación tuvo como objetivo conocer: (i) cuáles han sido las discusiones procesales que han obligado a los TRT de las Regiones 2ª y 15ª a abordar cuestiones relacionadas con la salud mental relacionada con el trabajo (SMRT); (ii) si los fundamentos de las decisiones, cuando aluden al tema, lo hacen desde la perspectiva de los preceptos científicos ofrecidos por la academia; y (iii) examinar si las decisiones judiciales de estos Tribunales han abordado la SMRT de forma central y decisiva o de forma somera y no determinante para el resultado de las mismas.

Metodología: Se trata de una investigación empírica cualitativa de tipo estudio de caso descriptivo exploratorio, basada en el análisis documental de las sentencias dictadas entre 2020 y 2022 por los TRT de las Regiones 2ª y 15ª.

Resultados: Los resultados apuntan a la necesidad de ampliar la comprensión por parte de los Magistrados del Trabajo que ofician en el Estado de São Paulo sobre la complejidad y multifactorialidad del fenómeno del SMRT, así como sobre las herramientas de diagnóstico y eliminación de los diversos factores y agentes de riesgo para la salud mental y el bienestar de quien trabaja.

Contribuciones: La investigación relatada buscó provocar una discusión sobre cómo los Tribunales Laborales brasileños vienen cumpliendo su misión jurídica de protección al SMRT, para contribuir a la realización, por vía jurisprudencial, del derecho humano a un ambiente de trabajo seguro y saludable, sin que su dimensión relativa a la salud mental y al bienestar de quien trabaja sea omitida o poco considerada.

Palabras clave: Derechos humanos, trabajo decente, salud mental relacionada con el trabajo, justicia laboral, caso de estudio.

Carátula del artículo

Artigo

Saúde Mental relacionada ao Trabalho na Jurisprudência dos Tribunais Regionais do Trabalho do Estado de São Paulo

Work-related Mental Health in the precedents of the Regional Labor Courts of the State of São Paulo

La Salud Mental en el Trabajo en la Jurisprudencia de los Tribunales Regionales del Trabajo del Estado de São Paulo

Silvio Beltramelli
Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (CESIT), Brasil
Thalita Hage
Comissão Especial de Bioética e Biodireito da OAB/SP, Brasil
Revista Opinião Jurídica, vol. 22, núm. 41, pp. 176-211, 2024
Centro Universitário Christus

Recepción: 18 Septiembre 2024

Aprobación: 04 Diciembre 2024

1 INTRODUÇÃO

O trabalho, como forma de inserção social, de construção de relações interpessoais, de comprometimento da subjetividade do indivíduo e de construção e desenvolvimento individual, traz consigo vivências de sofrimento e de prazer (Araujo et al., 2002, p. 37-49). Da mesma forma que o trabalho pode levar a expressões negativas de estresse, ansiedade, angústia e medo, pode também trazer vivências de bem-estar, de realização, de crescimento e satisfação pessoal, que vão impactar diretamente na estrutura física e psíquica do ser trabalhador.

Afirma a Organização Mundial da Saúde (OMS) que a saúde mental de trabalhadoras e trabalhadores deve ser entendida como um estado de bem-estar no qual o indivíduo realiza as suas capacidades, pode fazer face ao estresse normal da vida, trabalhar de forma produtiva e frutífera e contribuir para a comunidade em que se insere (OMS, 2002, p. 30). Esse conceito de saúde mental coaduna-se com a noção corrente (inclusive normativa) mais ampla de saúde, que, superando etapas pretéritas de preocupações limitadas à remediação de doenças e identificação de suas causas, expande seu campo de interesse para tudo que afronte a qualidade de vida de quem trabalha (Silva, 2008).

A saúde mental relacionada ao trabalho (SMRT) é considerada um campo do conhecimento que, presumindo a saúde mental indissociável da saúde geral — em razão da unicidade entre corpo e mente — tem como objeto a inter-relação entre o trabalho e o processo saúde-doença, com ênfase em suas manifestações na dimensão da mente (Seligmann-Silva, 2011).

Este artigo enfrenta a seguinte pergunta de pesquisa: quais são as matérias que suscitam a abordagem da SMRT em julgamentos dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) do Estado de São Paulo e de que modo essas abordagens têm acontecido? A intenção foi compreender:

  1. quais discussões processuais têm exigido dos TRTs da 2ª e da 15ª Regiões tratamento de temas ligados à SMRT;

  2. se os fundamentos decisórios, quando aludem ao assunto, o fazem tendo em perspectiva preceitos científicos oferecidos pela academia e;

  3. examinar se as decisões judiciais dos aludidos Tribunais têm abordado a SMRT de uma forma central e decisiva ou se valido de mera menção não determinante para o resultado dos julgamentos.

Trata-se de pesquisa empírica qualitativa do tipo estudo de casos descritivo exploratório, baseado em análise documental de acórdãos proferidos, entre os anos de 2020 e 2022, pelos TRTs da 2ª e da 15ª Regiões.

Este artigo se encontra estruturado em três partes para além dessa introdução, dedicadas, respectivamente, a uma breve contextualização teórico-prática sobre SMRT, à descrição metodológica da pesquisa realizada e aos resultados de pesquisa, apresentados na forma de inferências que, por sua vez, ensejaram a enunciação de hipóteses futuramente testáveis.

Todo o percurso investigativo esteve animado pelo propósito de se relevar o estado em que se encontram as discussões sobre a SMRT na Justiça do Trabalho paulista, assim contribuindo com o aperfeiçoamento das técnicas de análise e comportamentos jurisdicionais das instituições judiciárias frente a litígios que, por sua natureza, digam respeito à saúde mental no contexto laboral e, por conseguinte, à própria efetivação do direito humano ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável.

Ao fim e ao cabo, afirma-se que a investigação realizada “interpreta as informações quantitativas por meio de símbolos numéricos e os dados qualitativos mediante a observação, a interação participativa e a interpretação do discurso dos sujeitos – semântica” (Knechtel, 2014, p. 106). Para tanto, partiu-se da premissa segundo a qual o diálogo interdisciplinar (ou mesmo transdisciplinar) entre o Direito e as demais ciências (Ferraz Júnior, 2018, p. 59) é condição para o desenvolvimento de uma ciência jurídica que, ao deixar de ser plenamente ensimesmada quanto a conceitos, a análises e a procedimentos, aproxima-se cada vez mais da realidade impactada pelas interpretações e aplicações dos enunciados jurídicos definidas pelos agentes estatais investidos do poder de fazê-las valer na prática das relações político-sociais.

2 CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA, NORMATIVA E EPIDEMIOLÓGICA

Em se tratando de SMRT, é possível afirmar que, no âmbito das produções científicas brasileiras provenientes de diferentes áreas do conhecimento, dois autores se destacam como referenciais teóricos bastante difundidos: Christophe Dejours e Edith Seligmann-Silva1.

O médico psiquiatra e psicanalista francês Christophe Dejours, precursor da denominada “psicodinâmica do trabalho”, aponta que a saúde não pode ser considerada um estado, mas um objetivo a ser alcançado pelos trabalhadores por meio de sua tentativa de adaptação ao ambiente e às atividades laborais. Assim, o bem-estar tem lugar quando as condições de trabalho de certa organização2 proporcionam livre funcionamento do aparelho psíquico quanto ao conteúdo das tarefas realizadas e à possibilidade de o indivíduo adaptar sua atividade para desempenhá-la de maneira congruente com a sua história individual, isto é, com suas necessidades fisiológicas e seus desejos psicológicos (Dejours, 2018; Dejours; Dessors; Desriaux, 1993).

Sob a ótica dejouriana, a produção e a manutenção da saúde estão completamente ligadas às condições e à organização do trabalho, que determinarão as circunstâncias e as formas de realização de tarefas, estabelecerão o ambiente laboral e determinarão as possibilidades de convivência do indivíduo no locus de trabalho, possibilitando ou não a adaptação da atividade pelo trabalhador segundo seus desejos e suas capacidades (Dejours, 2018).

Desse modo, o indivíduo, inserido na organização e buscando realizar a atividade de maneira condizente com os impulsos próprios de sua subjetividade, pode ter vivências de prazer ou de sofrimento, a depender de sua possibilidade de alterar a forma de realização da tarefa e da sua faculdade psíquica de adaptação ao ambiente.

Edith Seligmann-Silva, médica psiquiatra e pesquisadora brasileira na área da saúde pública, concorda com Dejours no que se refere à possibilidade de a atividade laboral tanto fortalecer quanto prejudicar a saúde mental, nesse caso, gerando distúrbios não apenas no plano individual, mas também no plano da coletividade (Seligmann-Silva, 2011). Todavia, Seligmann-Silva preconiza um olhar mais amplo sobre SMRT em relação a Dejours, ancorada na proposta metodológica segundo a qual qualquer estudo sobre o tema deve considerar não apenas a dimensão da individualidade (subjetividade) mas também, e, em igual importância, as “determinações de natureza política, macrossocial e macroeconômica” atuantes no “interior dos processos de desgaste humano”, exigindo, portanto, a formação de um conhecimento fortemente interdisciplinar, sensível ao impacto da desigualdade social e de direitos macrossistêmicos no processo saúde-doença de cada pessoa que trabalha.

Toda a produção de Seligmann-Silva se caracteriza pela adoção da noção basilar de desagaste humano aplicada, nos anos 1980, à saúde do trabalhador pela socióloga mexicana Asa Cristina Laurell, noção conformada por uma percepção de que toda correlação desigual de poderes e forças que incide sobre a execução do trabalho impõe a quem trabalha perda (deformação) de capacidade potencial e/ou efetiva corporal e psíquica (inteligência e sentimentos), a cuja perda ou deformação corresponde à ideia de desgaste, que age, diretamente, no processo biopsicossocial saúde-doença (Seligmann-Silva, 2011, p. 135-136).

Para essa perspectiva, o desgaste mental se apresenta como um modelo de índole integradora aplicável aos estudos sobre SMRT, por se ocupar das interações entre três aspectos da vida no trabalho: os fatores ambientais e psicossociais do trabalho executado; a subjetividade e a identidade, avaliados dentro do micro e do macrocontexto; e as relações de poder nas diferentes esferas da vida social, capazes de gerar desgaste quando assimétricas (Seligmann-Silva, 2011)3.

Como desdobramento desse “paradigma integrador”, qualquer análise (teórica ou empírica) sobre SMRT deve considerar três patamares do processo de desgaste mental, em mútua interação:

  1. o local de trabalho (worksite), que abrange os ambientes físicos, químicos e biológicos, além dos aspectos organizacionais e ergonômicos, as relações interpessoais (comunicação e linguagem) e os sistemas socias (os espaços de comportamentos coletivos de defesa e de regulação);

  2. a empresa (o contratante), mais especificamente sua posição no mercado, na cultura organizacional e na política de pessoal (formas de contratação, critérios de valorização e desvalorização de trabalhadores, diálogo inter-hierárquico, políticas e práticas em relação à saúde e política de adoção de novas tecnologias vis-à-vis o trabalho humano);

  3. o “contexto regional/nacional e as relações assumidas por forças políticas, econômicas e sociais na esfera internacional”, manifestadas na conjuntura socioeconômica, notadamente conformada pelas políticas econômica, industrial, tecnológica, sociais (saúde, educação, previdência social, trabalho e emprego e promoção social) e qualquer outra que atinja as condições de vida e de trabalho da população (Seligmann-Silva, 2011, p. 116-121).

Na dimensão empírica, três são os níveis identificados de possível manifestação do desgaste mental: desgaste orgânico, expresso em quadros clínicos de desgaste literal do corpo; variações do “mal-estar”, como fadiga mental e/ou física; e afetação da subjetividade com afronta à identidade pessoal seja pelo ataque à dignidade da pessoa, seja pela corrosão de seus valores pessoais e de seu caráter (Seligmann-Silva, 2011, p. 139).

Por outro lado, as linhas de pensamento da psicodinâmica do trabalho e do desgaste mental concordam que o sofrimento ou desgaste provocado pelo trabalho pode não ser o suficiente para desencadear adoecimento mental, pois os modos de resistir e reagir e seus resultados variam de pessoa para pessoa.

Todavia, é certo que a presença do sofrimento — não coincidente com o adoecimento, embora o anteceda, necessariamente — causa impacto na saúde mental (Guimarães; Grubits, 2004), podendo até mesmo expressar-se em manifestações fisiológicas, desde dores de cabeça, dores de estômago até tontura, que podem ou não evoluir para transtornos de ansiedade e depressão (Soares; Oliveira, 2012).

O reconhecimento institucionalizado do adoecimento mental relacionado ao trabalho como resultado do impacto das condições e da organização do trabalho no processo saúde-doença é passo fundamental para avanços na proteção da saúde metal de quem trabalha.

Uma das ferramentas mais antigas de afirmação da concretude do potencial de afronta à saúde das condições de trabalho têm sido as chamadas “Listas de Doenças Relacionadas ao Trabalho” (LDRT), comumente tidas como instrumento facilitador de identificação da relação entre trabalho e agravos à saúde, no contexto sociocultural, tecnológico e ambiental de cada momento histórico (Silva-Junior et al., 2022).

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicou sua primeira LDRT em 1925 e já a atualizou diversas vezes, vigorando, atualmente, a versão revisada em 2010, que registra duas categorias:

  1. transtorno de estresse pós-traumático e;

  2. outras perturbações mentais ou comportamentais não mencionadas no ponto anterior, em que há uma relação direta, cientificamente estabelecida ou determinada por métodos apropriados às condições e às práticas nacionais, entre a exposição a fatores de risco decorrentes das atividades de trabalho e as perturbações mentais e comportamentais que acometem o trabalhador (ILO, 2010).

A edição, publicação e permanente atualização desse tipo de lista nos âmbitos nacionais é objeto da Recomendação nº 194 da OIT dirigida, em 2002, a todos seus Estados-membros, com o intuito de que seja uma providência voltada à prevenção, ao registro, à notificação e, se for caso disso, à indenização de pessoas (ILO, 2002).

O Estado brasileiro, desde a primeira versão de sua LDRT— publicada, em 1999, pelo Ministério da Saúde (Brasil, 1999), com utilização da taxonomia e codificação da décima versão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10)—, reconhece uma série de transtornos mentais e comportamentais relacionados ao trabalho, bem como ao desemprego, dentre os quais se pode citar Alcoolismo Crônico (Relacionado com o Trabalho), "Stress" Grave e Transtornos de Adaptação, Estado de "Stress" Pós-Traumático, Neurose Profissional, Transtorno do Ciclo Vigília-Sono Devido a Fatores Não-Orgânicos e Síndrome do Esgotamento Profissional, também conhecida por Síndrome de Burnout.

O estresse crônico relacionado ao trabalho é causa da Síndrome do Esgotamento Profissional (ou Síndrome de Burnout), a qual foi classificada, também em 2019, pela OMS como doença ocupacional integrada, tendo sido, em 2022, incluída na 11ª Revisão da CID (WHO, 2024).

A inclusão da Síndrome do Esgotamento Profissional no rol da CID-11 denota um importante, conquanto demorado, consenso internacional da comunidade médica no sentido de sua ocorrência exclusiva em âmbito ocupacional, jamais admitindo diagnóstico que a vincule exclusivamente, a condição clínica ou psíquica inerente ao indivíduo.

Ainda em 2001, quando o Brasil já discutia, de modo mais persistente, o esgotamento profissional, o Ministério da Saúde (Brasil, 2001) elaborou manual de procedimentos para os serviços de saúde intitulado “Doenças Relacionadas ao Trabalho”, no qual se encontra a definição da “sensação de estar acabado” (equivalente ao burnout) como “um tipo de resposta prolongada a estressores emocionais e interpessoais crônicos no trabalho”. A Síndrome do Esgotamento Profissional é, portanto, tema de atenção das autoridades públicas brasileiras há pelo menos mais de duas décadas.

Depois de mais de vinte anos sem alteração, a LDRT brasileira experimentou atualização por força da Portaria n.º 1.999, de 27 de novembro de 2023, assinada pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2023), tendo havido importante ampliação do rol de transtornos mentais e comportamentais ligados a diversas situações atinentes ao trabalho e ao desemprego, v.g. burnout, ansiedade, depressão e tentativa de suicídio, potencialmente decorrentes de diversos agentes e fatores de risco, inclusive de risco psicossocial, tais como deficiências na organização do trabalho, ausência de gestão adequada das relações interpessoais, conteúdo e exigências mentais e emocionais relacionadas à interação pessoas-tarefas, administração da duração da jornada de trabalho e dos períodos de descanso, bem como de situações de violência física ou psicológica relacionada a aspectos do trabalho, a exemplo dos assédios moral e sexual.

No plano da regulação, a saúde mental de trabalhadores e trabalhadoras encontrase inserta na abrangência factual das normas dedicadas, de modo mais geral, à proteção e à promoção da saúde de qualquer pessoa e, mais especificamente, à saúde de quem trabalha.

No plano internacional, a proteção jurídica da saúde mental no trabalho pode ser reconhecida a partir da concepção de Trabalho Decente, encapada pela OIT desde a 87ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, ocorrida em 1999, que a adotou, a partir de então, como fio condutor de todas as suas ações de cooperação internacional pensadas para fazer frente aos novos desafios do mundo do trabalho na contemporaneidade (Beltramelli Neto; Bonamim; Voltani, 2019).

A promoção do Trabalho Decente segundo a OIT suscita a formulação de políticas públicas nacionais voltadas ao cumprimento de quatro objetivos estratégicos:

  1. a proteção de direitos humanos nas relações de trabalho, especialmente aqueles enunciados na Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho da OIT de 1998;

  2. a geração de empregos de qualidade, isto é, com remuneração justa, livres de discriminação e de riscos às saúde de quem trabalha;

  3. a ampliação da proteção social e;

  4. a adoção do diálogo social como sistema democrático de deliberações de interesse público (OIT, 1999).

Assim que, conquanto a OIT, propositalmente, não se valha de uma definição cerrada de Trabalho Decente, à feição de um arquétipo jurídico que configure situações específicas de trabalho, sua finalidade dinamizadora de políticas públicas nacionais por meio de programas específicos conta com objetivos precisamente estabelecidos, denotando seu caráter essencialmente processual, de promoção flexível segundo realidades locais (Beltramelli Neto; Rodrigues, 2021).

Sob o ponto de vista da SMRT e seu tratamento jurídico, as condições em que o trabalho impacta a saúde física e mental de trabalhadoras e trabalhadores integram o espaço factual de incidência da proteção normativa ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável, recentemente guindado, no âmbito da cooperação internacional, pelas mãos da OIT à condição de previsão expressa no texto da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho de 1998 (OIT, 2022), e, assim, potencialmente reconhecível como norma de jus cogens — ou seja, exigível de qualquer Estado-membro da OIT, independentemente de ratificação expressa de qualquer tratado a respeito (Beltramelli Neto, 2023a).

Em termos lógico-normativos, a referida alteração na Declaração de 1998 tem por consequência dissipar qualquer dúvida no sentido de que a SMRT, enquanto assunto obviamente contemplado pela noção de meio ambiente de trabalho seguro e saudável, é pervasiva a todos os quatro objetivos estratégicos de promoção do Trabalho Decente, tornando-se, por conseguinte, plenamente contemplada pelas manifestações regulatórias e mobilizadoras de políticas públicas advindas dessa concepção internacionalmente consagrada.

Ainda no plano normativo internacional, o artigo 3º, alínea “e”, da Convenção nº 155 da OIT sobre Segurança e Saúde dos Trabalhadores e o Meio Ambiente de Trabalho — uma das nomeadas dez convenções fundamentais da OIT que densificam o primeiro objetivo estratégico da promoção do Trabalho Decente e que foi devidamente ratificada pelo Estado brasileiro, a teor do Decreto n.º 10.088/2019 — conceitua o termo “saúde”, com relação ao trabalho, como condição que “abrange não só a ausência de afecções ou de doenças, mas também os elementos físicos e mentais que afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a higiene no trabalho”.

Mais recentemente, a OIT, em 2019 (ano de seu centenário), aprovou a Convenção nº 190 sobre a Eliminação da Violência e do Assédio no Mundo do Trabalho (OIT, 2019c) e a Recomendação nº 206 sobre a Eliminação da Violência e do Assédio no Mundo do Trabalho (OIT, 2019b), relevantes passos de ordem normativa para enfrentamento de duas das situações mais agressivas para a saúde mental.

O mote da saúde (física e mental) no trabalho foi tratado com destaque na 109ª Convenção Internacional do Trabalho de 2019, que se dedicou a importantes debates acerca do presente e do futuro do trabalho no mundo e, por conseguinte, a respeito do papel das ações da OIT no cumprimento de sua missão precípua de promoção de justiça social, resultando no relatório Work for a brighter future e na aprovação pelos Estados Membros da “Declaração Centenária para o Futuro do Trabalho” (OIT, 2019a). No aludido relatório, o estresse relacionado ao trabalho é citado como um desafio que não é recente, mas atualmente suscetível à exacerbação pelas novas mudanças no mundo do labor (OIT, 2019, p. 18).

No âmbito da regulação nacional, a inferência é a mesma. Na Constituição Federal brasileira (Brasil, 1988), adensando os meta-princípios jurídicos constitucionais da dignidade humana (artigo 1º, inciso III) e do valor social do trabalho (artigo 1º, inciso IV, e artigo 170, caput), encontram-se o direito à saúde (artigo 6º) e, mais especificamente, o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene (artigo 7º, XXII).

Em termos infraconstitucionais, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê, em seu capítulo sobre Segurança e Medicina do trabalho (capítulo V), diversas medidas a serem adotadas pelo empregador para evitar acidentes e adoecimentos de qualquer natureza, como a criação da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), o uso obrigatório de equipamentos de proteção individual e coletivo, a manutenção de um ambiente hígido e equilibrado em edificações que proporcionem saúde física e mental aos trabalhadores (Brasil, 1943). Conferindo concretude aos aludidos comandos constitucionais e celetistas, as denominadas Normas Regulamentadoras, editadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego com supedâneo no art. 155, I, das CLT, impõem a empregadores e a tomadores de serviços uma série de obrigações voltadas ao gerenciamento (diagnóstico, avaliação e eliminação ou controle) de todo tipo de agentes e fatores de risco à saúde física e mental de trabalhadoras e trabalhadores.

A Lei n.º 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, em seu artigo 3º, parágrafo único, estabelece que “dizem respeito também à saúde as ações que, por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social” (Brasil, 1990, art. 3).

O conceito legal de acidente do trabalho, no Brasil, é dado pela Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social (Lei 8.213, de 24 de julho de 1991), em seus artigos 19 e 20, os quais estatuem que integram o conceito de acidente de trabalho o fato lesivo à saúde física ou mental, ligado ao exercício do trabalho, que resulte em morte ou em redução da capacidade laborativa (Brasil, 1991). A definição legal de acidente de trabalho, tal como posta, abarca duas modalidades de ocorrência, quais sejam, o acidente de trabalho típico e a doença ocupacional. O acidente de trabalho típico configura-se quando o evento lesivo se perfaz, por completo, em determinado momento temporal (v.g. traumas, cortes, quedas, queimaduras, etc.); já as doenças ocupacionais são constatadas ou ocasionadas pela execução do trabalho ao longo do tempo. Adoecimentos mentais relacionados ao trabalho são legalmente enquadrados, portanto, no Brasil, como doença ocupacional.

Mais recentemente, por obra da Lei nº 14.831, de 27 de março de 2024, instituiuse o “Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental”, concessível por comissão certificadora nomeada pelo Governo Federal brasileiro a empresas que desenvolvam ações e políticas fundamentadas em certas diretrizes especificadas na norma que contemplem promoção da saúde mental, bem-estar dos trabalhadores e transparência e prestação de contas.

Propulsores dos encaminhamentos e avanços teóricos, práticos e normativos em relação à SMRT são, certamente, os dramáticos desafios impostos pela maneira como o modelo societal hegemônico vigente encaminha a relação entre sujeito e trabalho.

Em perspectiva histórica, a transição do século XX para o século XXI foi marcada pela afirmação de um Capitalismo de faceta neoliberal, baseado em estratégias de captação e disciplinamento não mais apenas de corpos, mas sobretudo de mentes, consagrando a era da “subjetividade neoliberal”, com desafios novos e muito incisivos para a saúde mental de quem trabalha (Foucault, 2010).

Em termos práticos, com o advento da gerência científica taylorista do trabalho produtivo, no contexto do Capitalismo Industrial do início do século XX, estabeleceu-se a imposição de comportamentos físicos dos trabalhadores para aguentarem as longas jornadas, manusearem equipamentos pesados e realizarem movimentos repetitivos e coordenados sem qualquer interferência na concepção das tarefas (Braverman, 2015).

Já no atual momento, em decorrência do ethos econômico neoliberal alardeador de imperativos como o empreendedorismo de si mesmo, a máxima concorrência individual e a produção por metas em circunstâncias marcadas por alto desemprego estrutural, ampliação da informalidade e redução global de salários, exige-se cada vez mais da capacidade psíquica de cada trabalhador para suportar as pressões, inconstâncias do emprego e condições precárias para o desempenho do trabalho assalariado, a assolar com ainda mais gravidade os grupos sociais mais vulneráveis, especialmente nos mercados de trabalho menos estruturados e mais impactados pelo redesenho da divisão internacional do trabalho, como o brasileiro (Dardot; Laval, 2016; Han, 2020; Seligmann-Silva, 2011; Antunes; Praun, 2015; Praun, 2016).

Neste cenário desafiador contemporâneo, a SMRT vem sendo tratada como problema de saúde pública pela OMS. Como se não bastassem os desafios que a própria transformação recente do capitalismo impõe à saúde mental no trabalho, as dinâmicas adotadas em razão da pandemia de Covid-19 intensificaram a preocupação com o tema, a ponto de ter havido a publicação do relatório conjunto da OIT e da OMS específico sobre teletrabalho, intitulado “Healthy and safe telework: Technical brief”, apontando benefícios e malefícios desse tipo de labor, que se expandiu, enormemente, a pretexto do isolamento social adotado como medida não farmacológico de combate à disseminação do SARS-Cov-2 (OIT, 2021a).

Adicionalmente, a OIT ainda publicou o documento “Global call to action for a human-centred recovery from the COVID-19 crisis that is inclusive, sustainable and resilient”, em cuja análise indica a urgência do oferecimento de proteção social universal (terceiro objetivo estratégico da promoção do Trabalho Decente) como medida incontornável de uma retomada social e econômica pós Covid-19 centrada no ser humano, declarando que essa proteção deve reconhecer como mais importante do que jamais foi o direito de todas e todos ao gozo do mais alto padrão de saúde física e mental (OIT, 2021b).

Com relação ao cenário da SMRT no Brasil, importam os dados oficiais do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) referentes ao período entre 2012 e 2022 — obtidos e classificados pelo Observatório de Saúde e Segurança do Trabalho, mantido pelo Ministério Público do Trabalho e pela OIT (escritório Brasil) —, que registram 110.079 afastamentos por transtornos mentais e comportamentais com reconhecimento de nexo com o trabalho, correspondentes a 4,88% de todos os afastamentos previdenciários por acidente de trabalho e por adoecimento ocupacional, naquele interregno, no País — o Estado de São Paulo respondeu por 31.303 desses afastamentos (4,99% do total da unidade da federação) – (MPT; OIT, 2023a).

Mapeados os afastamentos por transtornos mentais e comportamentais com nexo causal com a atividade laboral reconhecido pelo INSS segundo as atividades econômicas, tem-se as seguintes prevalências, no País, entre 2012 e 2022: administração pública em geral (17.880 – 17,4%), bancos com carteira comercial (14.524 – 14,1%), transporte coletivo de passageiros (8.735 – 8,49%), atividades de atendimento hospitalar (8.379 – 8,14%), atividades de correio (4.569 – 4,44%), hipermercados e supermercados (4.157 – 4,04%), teleatendimento (2.601 – 2,53%), caixas econômicas (2.433 – 2,36%) e vigilância e segurança privada (2.172 – 2,11%). Para o mesmo período, no Estado de São Paulo, tem-se: bancos com carteira comercial (5.423 – 18,4%), administração pública em geral (4.073 – 13,8%), atividades de atendimento hospitalar (3.330 – 11,3%), transporte coletivo de passageiros (1.774 – 6%), hipermercados e supermercados (1.357 – 4,59%), atividades de correio (1.021 – 3,46%), atividades de assistência social em residências coletivas ou particulares (926 – 3.13%), vigilância e segurança privada (871 – 2,95%), caixas econômicas (716 – 2,42%) e teleatendimento (659 – 2,23%) - (MPT; OIT, 2023a).

Em termos epidemiológicos, portanto, a afronta à SMRT, no Brasil, é um fenômeno cada vez mais presente e se espraia pelas mais distintas atividades profissionais. O presente cenário teórico, normativo e epidemiológico oferece uma ideia basilar do complexo e multifacetado fenômeno cujo tratamento judicial foi objeto da pergunta de pesquisa.

3 METODOLOGIA DE PESQUISA

Pesquisas qualitativas, necessariamente empíricas, dedicam-se à compreensão de fenômenos sociais, preocupando-se em explicar como se desenvolvem e/ou por quais razões se verificam tais fenômenos (Yin, 2016). Dentre as possibilidades de execução de uma pesquisa qualitativa, o estudo de casos descritivo exploratório, observando procedimentos requisitos de validade cientificamente consagrados, presta-se ao exame de uma unidade de análise composta de um ou mais casos (fatos) justificadamente representativos do objeto de estudo, com vistas a extrair inferências sobre um objeto de pesquisa ainda não explorado pela literatura e, a partir da interpretação dessas inferências, formular uma ou mais hipóteses de pesquisa testáveis em futura nova investigação (Gomes Neto; Albuquerque; Silva, 2024; Yin, 2015).

A natureza do problema posto e o ineditismo dos resultados pretendidos suscitaram a realização de uma pesquisa empírica qualitativa do tipo estudo de casos descritivo exploratório, baseada em análise documental. A unidade de análise documental desta investigação foi conformada pelo inteiro teor de acórdãos exarados pelos Tribunais Regionais do Trabalho das 2ª e 15ª Regiões (TRT2 e TRT15), publicados entre os anos de 2020 e 2022, encontrados por meio das ferramentas digitais de pesquisa jurisprudencial disponibilizadas ao público pelas referidas cortes em seus respectivos sites oficiais.

O recorte temporal de três anos (2020 a 2022), aplicado à data de publicação dos acórdãos selecionados para exame, foi determinado por critério de contemporaneidade associado à correlação entre tempo disponível para execução de todas as etapas da pesquisa (1 ano, de setembro de 2022 a agosto de 2023) vis-à-vis a quantidade de acórdãos encontrados por ano de publicação.

Já o recorte espacial (institucional) estabelecido detém representatividade frente à classe mais ampla de todas as sentenças e de todos os acórdãos proferidos em ambos os TRTs enfocados, ao longo do interregno pesquisado. A investigação analisou mais de 1.000 acórdãos dos dois tribunais e, para fins de comparação, entre 2020 e 2022, foram produzidos pelo TRT2 466.978 sentenças e 422.698 acórdãos, totalizando 889.676 decisões (São Paulo, 2023a); no mesmo período, o TRT15 produziu 394.023 sentenças e 355.337 acórdãos, alcançando 749.360 decisões (São Paulo, 2023b).

Adiciona-se a essa justificativa o fato de que os TRTs eleitos à pesquisa, juntos, respondem por todas as ações trabalhistas propostas no Estado de São Paulo, que liderou, dentre as unidades da Federação, no ano de 2022, o número de pessoas que obtiveram afastamento previdenciário por transtornos mentais e comportamentais com reconhecimento de nexo com o trabalho, com 1.452 afastamentos (MPT; OIT, 2023b).

Ainda a esse respeito e em perspectiva temporal mais alongada, constata-se que, entre 2012 e 2022, proporcionalmente à somatória de afastamentos concedidos pelo INSS em todo o Brasil, o Estado de São Paulo respondeu por 28,4% de todos os afastamentos previdenciários por transtornos mentais e comportamentais com reconhecimento de nexo com o trabalho e 27,6% de afastamentos previdenciários em virtude do mesmo tipo de agravo à saúde sem admissão de nexo com o trabalho.

Lado outro, foram registrados, para o período de 2012 a 2022, 2.233.721 afastamentos por transtornos mentais e comportamentais sem reconhecimento de nexo com o trabalho, dos quais 616.827 (27,6%) havidos no Estado de São Paulo (MPT; OIT, 2023a). A estatística de afastamentos por transtornos mentais e comportamentais sem reconhecimento de nexo com o trabalho é de interesse por ser plausível imaginar que, dentro desse universo de afastamentos ditos pelo INSS sem relação com o labor, haja uma parcela importante de casos decorrentes das condições e/ou organização trabalho que assim não foram reconhecidos por ausência de uma investigação mais acurada pela assoberbada perícia previdenciária ou por omissão patronal na emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), legalmente exigida em caso de qualquer agravo à saúde física ou mental causada pelo trabalho, ainda que na forma de concausa (art. 169, CLT, e art. 22 da Lei nº 8.213/1991).

Tal omissão pode se justificar pela intenção patronal de não evidenciar, inclusive em termos epidemiológicos, uma conexão entre seu processo produtivo e o adoecimento mental, assim como de evitar que trabalhadores afastados, quando de seu retorno, gozem da garantia de emprego de um ano após o retorno ao trabalho que sucede afastamento previdenciário por acidente de trabalho ou adoecimento ocupacional, prevista no art. 118 da Lei 8.213/1991.

Diante desse cenário, é factível supor que o Estado de São Paulo é bastante suscetível a discussões judiciais acerca de SMRT para fins de reconhecimento declarado em Juízo do nexo entre agravo à saúde mental e atividades laborais, com a incidência dos direitos e das eventuais reparações (indenizações) cabíveis.

Segundo Gomes Neto, Albuquerque e Silva (2024, p. 92), quatro são as fases sucessivas pelas quais deve passar uma pesquisa qualitativa do tipo estudo de casos descritivo exploratório, quais sejam:

  1. especificação do objeto de exploração a partir da teoria sobre o tema;

  2. seleção dos casos que vão compor a unidade de análise;

  3. interpretação das informações obtidas da análise dos casos eleitos;

  4. identificação de uma hipótese testável a partir dos resultados da interpretação da unidade de análise.

Cumpriu-se a primeira etapa, nesta investigação, com a revisão bibliográfica de produções científicas nacionais e internacionais recentes sobre SMRT, sobretudo coletadas junto às bases Scielo, Scopus e Portal de Periódicos da CAPES, com ênfase para aquelas oriundas das seguintes áreas do conhecimento: Direito, Medicina Psiquiátrica, Psicologia e Ergonomia. Com esta revisão, procedida por meio de leitura flutuante e inferência pessoal (Bardin, 2022, p. 122), pretendeu-se identificar os marcos teóricos e as palavras-chaves atinentes à SMRT mais recorrentes nas diferentes áreas do conhecimento.

No geral, a revisão bibliográfica empreendida revelou a incipiência de estudos exclusivamente dedicados à SMRT produzidos pela área do Direito. Quanto aos marcos teóricos, como já relatado, percebeu-se, nas produções brasileiras das diferentes áreas do conhecimento, certa prevalência de menções às ideias de Dejours e de Seligmann-Silva.

No que se refere às palavras-chaves mais recorrentes, a fim de usá-las como descritores nas ferramentas de busca jurisprudencial dos tribunais, a pesquisa partiu do seguinte rol ampliado: “saúde mental”, “saúde mental no trabalho”, “saúde mental e trabalho”, “sofrimento mental”, “suicídio”, “autonomia”, “desgaste mental”, “adoecimento mental”, “patologia”, “psicopatologia”, “burnout”, “depressão no trabalho”, “depressão e trabalho”, “psicologia do trabalho”, “psicodinâmica do trabalho”, “estresse” e “riscos psicossociais”. A revisão bibliográfica e uma primeira varredura nas ferramentas digitais de busca de jurisprudência por palavras-chaves do TRT2 e do TRT15 permitiram a eliminação de termos sem resultados retornados, de forma que fosse determinado, finalmente, o seguinte grupo definitivo de descritores: “adoecimento mental”; “sofrimento mental”; “burnout”; “estresse no trabalho” (e sua variação “stress no trabalho”) e “psicossociais”.

A segunda etapa, dedicada à seleção dos casos com base no grupo definitivo de descritores, foi cumprida junto aos sistemas de pesquisa de jurisprudência a partir de palavras-chaves, disponibilizados à consulta pública pelos TRTs em questão em seus respectivos sites oficiais na internet. No TRT2, foi acessado o “Sistema de Jurisprudência”4 e, no campo “Contendo as palavras (e)”, foi digitado entre aspas um descritor por vez, com aplicação de filtros para o retorno de acórdãos com data de publicação entre 01/01/2020 e 31/12/2022. Já no site do TRT da 15ª Região, acessou-se a aba “Consulta de Jurisprudência”5 (já limitada apenas a acórdãos), também com a digitação entre aspas de um descritor por vez no campo “Busque todas as palavras”, selecionando-se os filtros “Inteiro Teor” (para que os resultados não fossem apenas das ementas dos acórdãos), e de limitação da data de publicação ao período entre 01/01/2020 e 31/12/2022.

É preciso admitir as limitações das bases de dados utilizadas para a coleta dos acórdãos que conformaram as unidades de análise. Não se encontrou, nos dois respectivos sites oficiais consultados, qualquer informação institucional pública a respeito do modo de alimentação dos bancos de dados postos à consulta por meio das ferramentas digitais de pesquisa jurisprudencial disponibilizadas. É de se presumir que se aplicam às bases de dados aqui utilizadas as constatações de Veçoso et al. (2014), em pesquisa empírica empregada junto às bases de dados jurisprudenciais do STF e do STJ, segundo as quais falta uniformidade dos mecanismos de busca digital, há diferenças nas formas de varredura de decisões, e não está contemplada nessas bases a totalidade das decisões proferidas (mas apenas uma amostra definida sem critérios claros e públicos) — circunstância que, por certo, prejudica a realização de investigações científicas mais acuradas sobre o comportamento de juízes e tendências decisórias, especialmente aquelas de cariz quantitativo, dependentes de acesso a todo o universo (totalidade) de dados dos processos.

Não obstante isso, sob o ponto de vista da realização de uma pesquisa de estudo de casos descritivo exploratório, a unidade de análise, pela quantidade de acórdãos encontrados, se mostra apta à extração de informações que permitam a elaboração de inferências e hipóteses futuramente testáveis, dado que os resultados foram obtidos desde uma “lógica inferencial qualitativa” e não de uma “lógica de inferência estatística por amostragem”, típica das pesquisas quantitativas e dependentes da precisa informação sobre a totalidade de eventos atinentes ao objeto de estudo, ainda que para delimitar a amostragem que ser efetivamente examinada (Gomes Neto; Albuquerque; Silva, 2024, p. 24).

A terceira etapa foi executada com a mineração de informações relevantes e sua categorização6. Diante do texto completo de cada acórdão que integrou a unidade de análise, fez-se o uso da ferramenta digital de localização de palavras (acionável pelo comando de teclas “ctrl+f”), disponível no aplicativo de leitura de arquivos com extensão “.pdf”, a fim de se identificar quantas vezes se repetiu e em quais trechos dos textos se encontrava o descritor que revelou a existência daquele aresto.

Cada identificação de presença do descritor ensejou:

  1. leitura atenta do trecho em que estava e, a seguir, a expansão dessa leitura para todo o tópico do acórdão — e, se preciso, de todo o documento — com a intenção de se constatar a qual causa de pedir (conjunto de fatos e fundamentos jurídicos discutidos no processo) o descritor se relacionava e;

  2. a interpretação do tipo de abordagem que os fundamentos de decisão do acórdão fizeram ao assunto correlato ao descritor frente à causa de pedir relacionada com este descritor, análise essa cujos resultados foram objeto de enquadramento em uma de duas categorias mutuamente excludentes denominadas ratio decidendi e obiter dictum7.

Integraram à categoria ratio decidendi as abordagens de assunto ligado à SMRT consideradas decisivas para o provimento ou não dos pedidos apreciados, denotando papel fundamental do exame da SMRT para o deslinde do julgamento; já obiter dictum foi a categoria à qual foram atribuídos os acórdãos em que sua fundamentação realizou mera menção ao descritor, com tratamento absolutamente perfunctório ou ilustrativo, sem que tenha havido análise de aspectos da SMRT como parte significativa da construção do posicionamento judicial final sobre a causa de pedir a que dizia respeito o descritor.

Diante da possibilidade da sistematização objetiva dos achados de pesquisa, confeccionou-se uma tabela para cada TRT, todas organizadas com uma primeira coluna especificando o descritor pesquisado e, entre parênteses, o número total de suas ocorrências (que equivale ao número de acórdãos daquele tribunal em que o descritor foi identificado ao menos uma vez); uma segunda coluna com a lista de causas de pedir a que se relacionava o descritor8 e uma terceira coluna com o número de vezes em que a ocorrência se verificou segundo a categoria que lhe foi atribuída (ratio decidendi ou obiter dictum). Portanto, cada descritor conta com dois extratos na tabela, um para cada categoria.

À guisa de consolidação de resultados, foi produzida uma quarta e última tabela, contendo os quantitativos acumulados por causa de pedir, considerando tanto cada TRT separadamente quanto os acumulados de ambos.

Finalmente, com base no que emergiu da sistematização e da classificação de informações da unidade de análise, foi possível cumprir a quarta etapa do estudo, com a enunciação de inferências e hipóteses testáveis acerca do problema de pesquisa, sem que, em qualquer estágio da investigação, tenha se realizado juízo de valor acerca das decisões examinadas.

4 RESULTADOS DE PESQUISA
4.1 SISTEMATIZAÇÃO E CATEGORIZAÇÃO DAS INFORMAÇÕES COLETADAS

As tabelas adiante apresentadas registram os resultados de pesquisa que expressam as classificações aplicadas às informações obtidos junto a cada acórdão integrante da unidade de análise e são a fonte das inferências e hipóteses que se seguem.

A opção pela consolidação dos resultados na forma de tabelas com expressões qualitativas e quantitativas foi inspirada pela pretensão de propiciar uma experiência de visualização mais clara e objetiva das informações tratadas, pretensamente mais favorecedora de inferências, bem como das hipóteses decorrentes, sem se prestar, entretanto, a desvirtuar a natureza da pesquisa que é, como antecipadamente esclarecido, qualitativa.

A primeira tabela evidencia a quantidade de acórdãos analisados por descritor, revelando que “saúde mental” conta com mais ocorrências do que a soma de todas as ocorrências dos demais descritores.

Tabela 1
Quantitativo de acórdãos encontrados por descritor (por TRT e acumulado)

Fonte: elaborada pelos autores.

A segunda tabela consolida informações sobre a quantidade de causas de pedir relacionadas a cada descritor aplicado na pesquisa de acórdãos, denotando que os descritores “saúde mental”, “psicossociais” e “burnout” têm aparecido em julgamentos sobre as mais diversas causas de pedir. Essa diversidade é notadamente maior quando a abordagem é do tipo obiter dictum.

Tabela 2
Quantitativo de diversidade de causas de pedir relacionadas a cada descritor (por TRT e acumulado)

Fonte: elaborada pelos autores.

A terceira tabela congrega as informações extraídas dos acórdãos selecionados junto ao TRT2, sistematizadas e categorizadas de modo desagregado, por descritor, sua relação com as causas de pedir e sua categorização quanto ao tipo de tratamento ou abordagem conferida ao tema de SMRT.

Tabela 3
Acórdãos do TRT2 segundo causas de pedir e categoria de abordagem por descritor

Fonte: elaborada pelos autores.

A quarta tabela segue o mesmo padrão da anterior, colacionando informações de acórdãos selecionados junto ao TRT15.

Tabela 4
Acórdãos do TRT15 segundo causas de pedir e categoria de abordagem por descritor

Fonte: elaborada pelos autores.

A quinta tabela e última consolida resultados das duas anteriores, ao contemplar os quantitativos de causas de pedir identificadas como mais recorrentemente relacionadas a descritores (desprezando-se os temas com ocorrência pontual), considerando cada um dos TRTs, separadamente, e o acumulado de ambos, denotando padrão quantitativo similar de ocorrências.

Examinadas todas essas informações, os resultados de sua interpretação passam a ser apresentados em forma de inferências e de decorrentes hipóteses presumivelmente testáveis em eventuais futuras pesquisas.

4.2 INFERÊNCIAS E HIPÓTESES

A leitura dos milhares de acórdãos que compõem a unidade de análise e as informações sistematizadas e categorizadas nas cinco tabelas apresentadas demonstram que os cenários dos TRTs pesquisados são muito similares em relação aos tipos e às quantidades de ocorrências de descritores, sua relação com as causas de pedir e categorias de tipo de abordagem.

É possível, assim, inferir que o modo como o TRT2 e o TRT15 têm lidado com a SMRT em suas decisões é coincidente (Inferência nº 1). Esta similaridade de cenários autoriza a formulação de inferências comuns para ambos os tribunais e, consequentemente, alusivos à Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo.

A pesquisa revelou que são discussões processuais quanto aos seguintes temas que têm, de modo mais recorrente, suscitado abordagem de temas pertinentes à SMRT, nesta ordem decrescente de maior incidência (cf. Tabela 5): doença ocupacional, reparação de danos, manutenção/extinção de contrato de trabalho, jornada de trabalho, insalubridade, nulidade de laudo pericial, periculosidade, transferência, afastamento, acúmulo de função e alteração de regime de teletrabalho para presencial (Inferência nº 2).

Tabela 5
Quantitativo de ocorrências de descritores por causa de pedir correlata e por categoria de abordagem

* Inclui pretensão de reparação de dano moral decorrente de doença ocupacional. ** Inclui "dano moral (exceto doença ocupacional)", "danos estéticos", "dano existencial" e "danos materiais (pensão)", que estão presentes em separado na tabela para fins de registro individualizado. *** Inclui "Extinção de contrato de trabalho (residual)", "dispensa discriminatória", "reintegração no emprego" e "Estabilidade no Emprego", que continuam presentes na tabela para fins de registro individualizado. Fonte: elaborada pelos autores.

O exame detido de todos os acórdãos componentes da unidade de análise evidenciou um quadro geral de ausência de diálogo ou adoção de premissas e propostas teóricas ou práticas oriundas das vertentes da psicodinâmica do trabalho, do desgaste mental ou de qualquer outra corrente de pensamento sobre SMRT. Mesmo quando aspectos ligados ao tema foram abordados de forma decisiva para o julgamento (ratio decidendi), não se verificou, nos arestos avaliados, a aplicação explícita de preceitos ou ferramentas de análise baseadas em um olhar mais ampliado para os fatores e agentes de risco para a saúde mental decorrentes das condições de trabalho e/ou da organização do trabalho, não tendo sido identificadas passagens apoiadas em produções técnicoacadêmicas interdisciplinares, tampouco digressões mais aprofundadas sobre o impacto das condições de trabalho e/ou da organização do trabalho no processo saúde-doença, excetos nos casos envolvendo acometimento de burnout9 (Inferência nº 3).

Também não foi possível encontrar, em quaisquer dos acórdãos examinados, abordagens de aspectos da SMRT que, expressamente, partissem da premissa de que há diferenciação entre sofrimento (ou desgaste) mental e adoecimento mental propriamente dito relacionados ao trabalho (Inferência nº 4).

O quadro informacional descortinado mostra que temas relacionados à SMRT têm se apresentado para apreciação da Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo correlatamente a uma gama diversificada de matérias (causas de pedir), que vão para além de lides diretamente atinentes à configuração de adoecimento ocupacional, alcançando controvérsias que digam respeito à jornada de trabalho, à manutenção do contrato de trabalho e à sua extinção, aqui incluídas situações de dispensa discriminatória (Inferência nº 5).

As informações totalizadas (cf. Tabela 5) indicam 733 abordagens de descritores relacionados à causa de pedir alusiva à doença ocupacional, 527 relativas à reparação de danos e 288 à manutenção ou à extinção de contrato de trabalho. Esse cenário mostra que pleitos judiciais pelo reconhecimento de nexo entre agravo à saúde e trabalho (com consequente declaração de ocorrência de adoecimento ocupacional ou agravo à saúde mental e/ou condenação ao pagamento de indenização) e reparação pecuniária de danos (moral, material, existencial e/ou estético) não coligados com situação de adoecimento ocupacional capitaneiam, com folga, as matérias enfrentadas pela Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo que suscitam algum tipo de abordagem de temas atinentes à SMRT, seja de maneira meramente incidental, seja de modo direta e detidamente decisivo para o desfecho do julgamento (Inferência nº 6).

Ainda sobre a causa de pedir alusiva a adoecimento ocupacional, esta se afigura absoluta protagonista na suscitação de exames de aspectos próprios da SMRT de maneira mais detida e decisiva para o desfecho de julgamentos na Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo, pois foram identificadas 103 abordagens desta natureza contra apenas 19 alusivas à reparação de danos não coligados com discussão sobre doença ocupacional, segunda causa de pedir com mais abordagens do tipo ratio decidendi (cf. Tabela 5) - (Inferência nº 7).

A despeito da grande ocorrência do descritor “saúde mental” nos acórdãos pesquisados, poucas são as decisões que, a seu propósito, desenvolveram fundamentação detida e decisiva para o desfecho do julgamento (ratio decidendi), sendo muito mais referida à expressão para designar, de modo genérico, dimensão da vida que pode ser afetada, por exemplo, em uma situação de dano moral individual (Inferência nº 8).

Na mesma linha, os descritores “sofrimento mental” e “adoecimento mental” eram costumeiramente mencionados uma ou duas vezes, ao longo do texto, na condição de consequência negativa presumida de doenças ocupacionais diversas, de danos morais ou estéticos de qualquer origem e de acidentes de trabalho de qualquer natureza (Inferência nº 9).

Já o descritor “psicossociais” recorrentemente constou uma única vez nos arestos em que foi encontrado e, majoritariamente, em virtude de transcrição de trecho de laudo pericial, portanto não como parte da fundamentação do julgado, como verificado como descritor “burnout” (Inferência nº 10).

Todavia, examinado o resultado da categorização aplicada, enquanto o tema da manutenção/extinção de contrato de trabalho oportunizou 20 abordagens sobre SMRT decisivas para o desfecho decisório do caso — dos quais 8 relacionados a situações de dispensa discriminatória —, o mote da jornada de trabalho não ensejou qualquer abordagem desse tipo dentro da unidade de análise, sendo que a totalidade de ocorrências identificadas para esta causa de pedir foram enquadradas na categoria obiter dictum. Tal constatação autoriza vislumbra-se que a correlação entre saúde mental e a manutenção/extinção do contrato de trabalho tem tido mais espaço de reconhecimento do que a correlação entre saúde mental e jornada de trabalho, no contexto dos julgamentos realizados pela Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo (Inferência nº 11).

Neste passo, o panorama global de informações registra enorme diferença entre o acumulado de 1.740 abordagens do tipo obiter dictum e 99 do tipo ratio decidendi, consideradas todas as causas de pedir correlatas, sugerindo que o tratamento de temas ou aspectos pertinentes à SMRT pela Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo tem acontecido, como regra, de forma incidental e não determinante para a formação da convicção que respalda o resultado dos julgamentos (Inferência nº 12).

Todas as inferências formuladas, tomadas em conjunto, são substrato para algumas hipóteses de cunho mais geral, a seguir enunciadas.

A Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo, há tempos, tem se referido, em suas decisões, a termos atinentes à SMRT, o fazendo, majoritariamente, ao modo de mera menção incidental e não decisiva, sem discussão aprofundada e sem caráter de essencialidade para o desfecho dos julgamentos.

Quando levada a enfrentar de maneira mais detida aspectos correlatos à SMRT, tem o feito, prevalentemente, em litígios envolvendo o reconhecimento de nexo entre agravo à saúde e trabalho e reparação de danos decorrentes de doença ocupacional, com especial destaque para litígios envolvendo o acometimento de burnout (Hipótese nº 1).

Não parece haver disposição generalizada de Magistrados e Magistradas da Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo para o conhecimento e a aplicação recorrente das contribuições oferecidas pelas produções científicas referenciais sobre SMRT na apreciação dos casos concretos levados a Juízo, à exceção de processos envolvendo decisão a ser tomada a respeito do acometimento de burnout (Hipótese nº 2).

Em virtude da ausência de conhecimento técnico apurado sobre SMRT, as Magistradas e os Magistrados da Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo ainda não desenvolveram um olhar mais atento para os impactos negativos que as mais diversas condições de trabalho e modos de organização do trabalho possam ter para a saúde mental de trabalhadoras e trabalhadores, especialmente quando causam sofrimento (desgaste) mental sem que, necessariamente, evoluam para um adoecimento mental ocupacional (Hipótese nº 3).

Por conseguinte, Magistradas e Magistrados da Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo, ao deixarem de trazer uma percepção atenta e ampliada sobre SMRT para os julgamentos, perdem a oportunidade de estabelecer um novo paradigma de exame judicial que confira à SMRT a mesma posição proeminente que vem conquistando nos debates interdisciplinares e normativos internacionais e nacional e que seja consentâneo com as complexidades e modos de enfrentamento preceituados pelas contribuições científicas interdisciplinares (Hipótese nº 4).

Por outro lado, a presença, nos acórdãos examinados, de casos com menções a descritores pertinentes à SMRT por ocasião de discussões envolvendo outras situações que não diretamente a doença ocupacional - v.g. manutenção/extinção de contrato de trabalho e jornada de trabalho - denota que a Justiça do Trabalho no Estado de São Paulo não está complemente alheia ao potencial impacto para a saúde mental de diversos fatores organizacionais do trabalho. Não obstante isso, há nuances na disposição de se fazer esse tipo de análise nas decisões judiciais, do que é evidência o fato de, por um lado, haver abordagens mais acuradas e decisivas sobre a relação entre saúde mental e diversas situações de extinção contratual (com destaque para casos de dispensas discriminatórias), e, por outro, não serem encontradas abordagens mais consistentes e aprofundadas acerca do liame entre jornada de trabalho e saúde mental, conquanto sejam produzidas ilações a respeito (Hipótese nº 5).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A SMRT é assunto que vem se estabelecendo como altamente relevante dentro dos debates e propostas relativas à saúde pública em geral, hodiernamente pautada pelos desafios da sociabilidade capitalista neoliberal corrente. Dados epidemiológicos reforçam a urgência da questão. Estudos e movimentos normativos institucionais no campo da cooperação internacional (vide OIT e OMS) lançam luzes sobre a centralidade do tema. O ordenamento jurídico brasileiro, composto por normas nacionais e internacionais devidamente incorporadas, conta com um instrumental normativo que consagra a proteção da saúde mental e do bem-estar no trabalho dentro do escopo de salvaguarda do direito humano ao meio ambiente seguro e saudável.

Paralelamente às discussões e às ações envolvendo regulação e políticas públicas, há todo um longevo esforço científico interdisciplinar empírico para a compreensão da SMRT enquanto fenômeno complexo e multifatorial, assim como para propor ferramentas de diagnóstico e eliminação dos fatores e agentes de risco que sejam compatíveis com a multifatorialidade desse fenômeno. A despeito das variadas correntes e posições, há certos consensos acadêmicos estabelecidos a respeito da SMRT enquanto objeto que não se reduz à ausência de doença, não se explica por condições psíquicas individuais pré-existentes e não é limitado apenas às condições ambientais de trabalho (exposição a fatores e a agentes físicos, químicos e biológicos).

A ciência tem mostrado que estratégias organizacionais se associam a aspectos socioeconômicos que se impõem, a partir dos planos micro e macrossistêmicos, à rotina de quem trabalha, impactando, diretamente, seu processo saúde-doença, com consequências para a saúde mental individual e coletiva.

No Brasil, incumbente que é da aplicação da lei às relações de trabalho, a Justiça do Trabalho desempenha papel fundamental, por meio dos standards jurisprudenciais, no estabelecimento de diretrizes de interpretação/aplicação das normas alusivas à SMRT, devendo ter por referencial basilar a proteção e a promoção do Trabalho Decente, com especial atenção para a salvaguarda dos direitos e dos princípios fundamentais nas relações laborais, contemplativos do meio ambiente de trabalho seguro e saudável.

A pesquisa relatada neste artigo intentou dar os primeiros passos no sentido de provocar uma discussão sobre como a Justiça do Trabalho brasileira vem desempenhando a missão legal de proteção da SMRT. Isso foi feito com a apresentação de inferências e hipóteses extraídas de informações que sugerem, em suma, a necessidade de ampliação da compreensão por Magistradas e Magistrados do Trabalho paulistas sobre a complexidade e a multifatorialidade do fenômeno da SMRT, bem como acerca das ferramentas de diagnóstico e eliminação dos diversos fatores e agentes de risco à saúde psíquica para que, então, a jurisprudência trabalhista possa exercer, adequadamente, o ônus da efetivação do direito humano ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável, sem que seja omitida ou deficientemente considerada sua dimensão atinente à saúde mental e ao bem-estar de quem trabalha.

Material suplementario
REFERÊNCIAS
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Notas
NOTA DE COAUTORIA
Considerando-se a Taxonomia CRediT, em termos de participação neste trabalho, os autores compartilharam as tarefas de conceitualização e metodologia e análise formal dos dados coletados, sendo que, adicionalmente, a autora Thalita Hage se incumbiu da curadoria de dados, da sua investigação e visualização e da escrita do rascunho original e Silvio Beltramelli Neto da administração do projeto de pesquisa, sua supervisão e da revisão e da edição do rascunho original, que contemplou a reestruturação e a adição de aportes conceituais e analíticos ao texto.
1 Esta conclusão emerge de revisão bibliográfica procedida como primeira etapa da pesquisa, segundo os critérios descritos no tópico seguinte.
2 “Por condição de trabalho, é preciso entender, antes de tudo, ambiente físico (temperatura pressão, barulho vibração, irradiação, altitude etc.), ambiente químico (produtos manipulados, vapores e gases tóxicos, poeiras, fumaças etc.), o ambiente biológico (vírus, bactérias, parasitas, fungos), as condições de higiene, de segurança e as características antropométricas do posto de trabalho. Por organização do trabalho, designamos a divisão do trabalho, o conteúdo da tarefa na medida em que ele dela deriva, o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações de poder, as questões de responsabilidade etc.” (Dejours, 2018, p. 29).
3 “A ideia de desgaste, tal como tentamos examiná-la, coloca-se em uma posição central nesse quadro pois permite entender que os processos coletivos e os processos psicossomáticos (individuais) interagem e se integram em um único processo de alta complexidade, porém, realmente uno” (Seligmann-Silva, 2011, p. 148).
4 Acessível pelo link: https://juris.trt2.jus.br/jurisprudencia/.
5 Acessível pelo link: https://trt15.jus.br/jurisprudencia/consulta-de-jurisprudencia.
6 “A categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo género (analogia), com os critérios previamente definidos. As categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos unidades de registro no caso da análise de conteúdo sob um título genérico (agrupamento) este efetuado em razão das características comuns destes elementos” (Bardin, 2022, p. 145).
7 A escolha dessa nomenclatura decorre de certa adaptação livre para este estudo de duas conhecidas expressões jurídicas correlacionadas, que dizem respeito a trechos de uma decisão judicial que vinculam ou não as partes. Como explica Nunes (2011, p. 41-82): “A ratio decidendi (elemento vinculante) justifica e pode servir de padrão para a solução do caso futuro; já o obiter dictum constituem-se pelos discursos não autoritativos que se manifestam nos pronunciamentos judiciais, de sorte que apenas as considerações que representam indispensavelmente o nexo estrito de causalidade jurídica entre o fato e a decisão integram a ratio decidendi, onde qualquer outro aspecto relevante, qualquer outra observação, qualquer outra advertência que não tem aquela relação de causalidade é obiter: um obiter dictum ou, nas palavras de Vaughan, um gratis dictum”.
8 Houve poucos achados em que o descritor fazia parte da razão social de uma das partes ou era mencionado simplesmente para designar uma área do conhecimento, portanto sem que tenha sido objeto de tratamento pelo acórdão. Essas ocorrências, embora não apresentem qualquer relação com a causa de pedir do processo, tiveram seu registro mantido nas tabelas para fins de completude da informação sobre os resultados de pesquisa.
9 A seguir, a transcrição de um trecho de um dos acórdãos que trouxe uma menção mais aprofundada sobre o impacto das condições de trabalho e/ou da organização do trabalho no processo saúde-doença: “A síndrome de burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, é um distúrbio psíquico que foi descrito em 1974 por Freudenberger [...] está registrado no Grupo V da CID-10 [...] síndrome de burnout caracteriza-se, sucintamente, como uma reação negativa ao estresse crônico provocado pelas condições de trabalho, manifestando-se a partir de sintomas, tais como, por fadiga persistente, ausência de energia para atividades, condutas de distanciamento afetivo, insensibilidade, indiferença ou irritabilidade relacionadas ao trabalho, além de sentimentos de ineficiência e baixa realização pessoal (VIEIRA, Isabela Maria Magali Mello. Conceito (s) de burnout: questões atuais da pesquisa e a contribuição da clínica. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 35, n. 122, p. 269-276, jul./dez. 2010.), podendo desaguar em um quadro clínico depressivo, resultando em perda de responsabilidade com as tarefas desenvolvidas, diminuição na motivação para realizar as atividades profissionais, recorrentes ausências (faltas) e aversão ao ambiente de trabalho ou qualquer elemento que faça remissão à profissão. A patologia também foi matéria de estudo pelo Hospital Einstein [...]” (BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (2ª Região). PJE nº. 1000436-81.2020.5.02.0511, Ministro Relator: Francisco Ferreira Jorge Neto, Data de Assinatura: 23 set. 2022).
Notas de autor
Editora responsável: Profa. Dra. Fayga Bedê

https://orcid.org/0000-0001-6444-2631

Tabela 1
Quantitativo de acórdãos encontrados por descritor (por TRT e acumulado)

Fonte: elaborada pelos autores.
Tabela 2
Quantitativo de diversidade de causas de pedir relacionadas a cada descritor (por TRT e acumulado)

Fonte: elaborada pelos autores.
Tabela 3
Acórdãos do TRT2 segundo causas de pedir e categoria de abordagem por descritor

Fonte: elaborada pelos autores.
Tabela 4
Acórdãos do TRT15 segundo causas de pedir e categoria de abordagem por descritor

Fonte: elaborada pelos autores.
Tabela 5
Quantitativo de ocorrências de descritores por causa de pedir correlata e por categoria de abordagem

* Inclui pretensão de reparação de dano moral decorrente de doença ocupacional. ** Inclui "dano moral (exceto doença ocupacional)", "danos estéticos", "dano existencial" e "danos materiais (pensão)", que estão presentes em separado na tabela para fins de registro individualizado. *** Inclui "Extinção de contrato de trabalho (residual)", "dispensa discriminatória", "reintegração no emprego" e "Estabilidade no Emprego", que continuam presentes na tabela para fins de registro individualizado. Fonte: elaborada pelos autores.
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