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Reconfigurando a cidade: arte e ocupação no Hotel Cambridge em São Paulo
Alex Flynn
Alex Flynn
Reconfigurando a cidade: arte e ocupação no Hotel Cambridge em São Paulo
Reconfiguring the city: art and occupation at the Hotel Cambridge in São Paulo
Plural - Revista de Ciências Sociais, vol. 25, núm. 2, pp. 20-45, 2018
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
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Resumo: Neste artigo, exponho como os praticantes da arte contemporânea incorporam desobediência epistêmica e o conceito de ocupação para proporem uma reconfiguração da cidade. Primeiro, argumento que há cada vez mais reflexão sobre a ressignificação do espaço urbano, provocada por um tipo particular de prática de arte contemporânea intersticial; em seguida, defendo que os contextos em que essas práticas ocorrem sugere que artistas trabalhando com tais paradigmas encontram, e respondem a, uma noção totalmente diferente de “participação” do que aquela articulada por Claire Bishop (2004, 2012) ou Nicolas Bourriaud (2002). A localização é essencial ao que caracteriza e forma a prática artística. Situadas na fronteira porosa entre espaços de arte contemporânea institucionais e não-institucionais e frequentemente integradas às complexas lutas pelo direito à cidade, essas práticas ocorrem dentro de redes e hierarquias, que derivam de múltiplos modos de vida. É esta encruzilhada de eixos - o horizontal e o vertical, o efêmero e o utópico - que dá a tal reconfiguração seu potencial único, enquanto também oferece uma teorização da já amplamente observada iminência da arte.

Palavras-chave: Fazer-cidadeFazer-cidade,Arte contemporâneaArte contemporânea,Desobediência epistêmicaDesobediência epistêmica,Hotel CambridgeHotel Cambridge,Política prefigurativaPolítica prefigurativa.

Abstract: In this article, I present how contemporary art practitioners engage with epistemic disobedience and the concept of occupation in order to propose a reconfiguration of the city. First, I argue that there is ever more reflection on the resignification of urban space brought about by a particular type of interstitial practice of contemporary art; and second, that the contexts in which these practices occur mean that artists working with such paradigms encounter, and respond to, an entirely different notion of ‘participation’ than that articulated by Claire Bishop (2004, 2012) or Nicolas Bourriaud (2002). Central to what characterizes and forms this artistic practice is its location: situated on the porous border between institutional and non-institutional spaces of contemporary art, and often embedded in complex struggles regarding the right to the city, such processes occur within networks and hierarchies, deriving of multiple modes of life. And it is this crossing of axes - the horizontal and the vertical, the ephemeral and the utopian - that gives such reconfiguration its unique potential, while also putting forward a theorisation of the widely observed imminence of art.

Keywords: Right to the city, Contemporary art, Epistemic disobedience, Hotel Cambridge, Prefigurative politics.

Carátula del artículo

ARTIGO

Reconfigurando a cidade: arte e ocupação no Hotel Cambridge em São Paulo

Reconfiguring the city: art and occupation at the Hotel Cambridge in São Paulo

Alex Flynn
Durham University, Reino Unido
Plural - Revista de Ciências Sociais, vol. 25, núm. 2, pp. 20-45, 2018
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO

O direito à cidade foi originalmente conceitualizado por Henri Lefebvre em Le droit à la ville, publicado em 1968. Lefebvre estimula uma definição pela qual este direito é entendido como uma “demanda… [por] um acesso transformado e renovado à vida urbana” (1996, p. 158). Representante de outra geração, se não de uma outra tradição crítica, David Harvey enfatiza a dimensão coletiva dentro deste processo:

O direito à cidade está muito longe da liberdade individual de acesso a recursos urbanos: é o direito de mudar a nós mesmos pela mudança da cidade. Além disso, é um direito comum antes de individual já que esta transformação depende inevitavelmente do exercício de um poder coletivo de moldar o processo de urbanização (HARVEY, 2008, p. 23).

A proposta desta edição especial pedia de seus participantes uma pesquisa empírica e/ou reflexões teóricas para discutir relações contemporâneas neste processo coletivo de “fazer a cidade”. A chamada indicava uma preferência por textos que refletissem sobre a mobilidade de pessoas, imagens, conhecimento e objetos na trama urbana e/ou análises da circulação das relações de poder, da produção do espaço público, das definições de fronteiras, criação artística, políticas de identidade e paradigmas epistemológicos. A lista de subtemas era extensa: fluxos migratórios e o direito à cidade; desafios da mobilidade nas metrópoles; a dicotomia centro-periferia em tensão; produção social de espaço e cidadania; imaginários urbanos e práticas culturais, e foco na cidade como uma forma social de pensar, entre outros.

Partindo-se de uma abordagem tão ampla, deve estar claro, portanto, que tanto para os editores como também para um ainda mais amplo corpo de estudiosos, o espaço urbano é socialmente produzido fundamentalmente por forças desiguais e contraditórias (Beauregard, 2018; Jacobs, 1961; Caldeira, 2000; Sa, 2008). Na cidade, experimentamos uma série de convergências: infraestruturas ligadas ao capital; agentes que são empoderados ou destituídos de poder por certos tipos de conhecimentos técnicos; e relações que alternadamente conectam ou rompem a mais ampla matriz de sociabilidade, com diretas consequências para a produção de subjetividades. É dentro destas redes assimétricas que os processos sociais abstratos, muitas vezes apresentados como um discurso supostamente tecnocrático e neutro, se tornam sedimentados no espaço concreto urbano, resultando em situações de contrastes sociais brutais: cidades se transformaram, nos últimos anos, em índices reconhecíveis na perpetuação de condições de dominação, segregação e exploração desumana do trabalho assalariado. Contudo, qualquer análise produtiva deve também considerar a cidade como um caldeirão: ao mesmo tempo um espaço de degradação humana e ambiental e uma série de alianças instáveis que criam espaços produtivos de antagonismo e dissonância e cenário para uma rica negociação de experimentação social de esforços inventivos, e até mesmo de um imaginário que está sempre buscando novas formas de participação e sociabilidade.

A proposta deste artigo é construir, por meio de uma abordagem etnográfica, uma crítica de possibilidades imbuídas de criatividade para uma cidade socializada. Para este fim, o artigo defende que, de um quadro de contradições, o trabalho de praticantes de arte contemporânea propõe noções de desobediência epistêmica e produção de conhecimento, em ambos os casos respondendo a insights teóricos (e os gerando), à ressignificação e, em última instância, à reconfiguração do espaço urbano. Este estudo, situado em um interstício particular de estética e instanciações sociais da forma, complementa trabalhos similares de Teresa Caldeira (2014) sobre como grupos de jovens e suas intervenções artísticas ressignificam espaços da cidade; de Derek Pardue (2008) acerca da importância do urbano marginalizado como lugar e ideologia para os praticantes do hip hop em busca de transformação para si mesmos e suas comunidades; de Pedro Costa, Paula Guerra e Pedro Soares Neves (2017) sobre universos criativos e cenas culturais nos espaços urbanos contemporâneos; e da monografia de Marina Peterson (2010) sobre renovação urbana em Los Angeles e as tensões inerentes a projetos desse tipo. O estudo também dialoga com um amplo escopo de literatura que foca em performance de um lugar específico (Schechner, 2017; Pearson, 2010) e instalações urbanas de lugares específicos de arte contemporânea (Kwon, 2002), mais geralmente e especificamente na América Latina (Fábregas et al., 2013).

Contribuindo para esses estudos, argumento que a teoria e a prática da arte contemporânea reconfiguram a cidade ao agir sobre o imaginário por meio do qual seus habitantes reivindicam transitar (por) e ocupar seus diversos espaços. A ênfase que esta edição especial oferece sobre o direito à cidade destaca como a noção de ressignificação artística encontra e reage a um conceito inteiramente diferente de participação daquele articulado por Claire Bishop (2004, 2006, 2012) ou Nicolas Bourriaud (2002). Argumento ainda que o que caracteriza e dá forma a esses processos é sua localização. Posicionadas na fronteira porosa entre os espaços de arte contemporânea institucional e não-institucional, essas práticas ocorrem dentro da trama de redes e hierarquias que derivam de múltiplos modos de vida urbana. É essa encruzilhada de eixos - o horizontal e o vertical, o efêmero e o utópico - que oferece à tal reconfiguração seu potencial único, enquanto também expõe uma teorização da já amplamente observada iminência da arte.


Figura 1
A Ocupação Hotel Cambridge.
Foto: Alex Flynn

A RESIDÊNCIA ARTÍSTICA CAMBRIDGE

Uma estrada de oito faixas no meio do centro de São Paulo. Sob o asfalto, um rio escondido, apenas um entre centenas de riachos que atravessam os subterrâneos da cidade. Às sextas e sábados, nesta intersecção em particular, há um clube de rock para jovens. A calçada lota e a bateria do Led Zeppelin ecoa aos quatro ventos. Ao lado, há o boteco do Bin Laden, cujo dono inspira seu visual em Osama Bin Laden: usa uniforme militar o dia todo, uma longa barba grisalha e um turbante. Há também o churrasco de gato, espaço onde vendedores ambulantes vendem carne grelhada ilegalmente, ao lado de uma boate chamada Caravaggio’s. A seção para fumantes da boate disputa espaço com um restaurante estabelecido por imigrantes palestinos, que já sofreram ataques de gás lacrimogêneo da polícia, a qual se localiza próxima a uma comunidade de sem teto, que vive sob um viaduto. Em meio a essa densa confluência humana, situa-se um prédio alto, a Ocupação Hotel Cambridge.

Abandonado em 2002, este prédio receberá um prêmio na categoria de “apropriação urbana”. O evento desta noite é uma palestra com Raquel Rolnik, professora de Arquitetura na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e ex-relatora especial da ONU pelo Direito à Moradia Adequada. Ela está falando sobre seu novo livro, Guerra dos Lugares (2015), como parte da residência artística de Ícaro Lira na Residência Artística Cambridge.

Ícaro é o primeiro dos quatro artistas em residência e em seguida virão a dupla Jaime Lauriano e Raphael Escobar, Júlian Fuks e, finalmente, Virginia de Medeiros. Cada residência dura em média três meses. A Residência tem lugar na Ocupação Hotel Cambridge, que foi de hotel luxuoso onde se hospedaram celebridades como Bing Crosby e Nat King Cole nos anos 1950, para lugar onde se alugavam quartos por hora nos anos 1980 e 1990, antes de se transformar em nightclub e, finalmente, num espaço vazio e abandonado. Apesar de sua aparência cavernosa, o espaço é limitado: os artistas usam um quarto de 9 metros quadrados no 15o andar em um edifício sem elevador. Escobar vai dormir lá por um período curto de tempo e Virgínia vai reformá-lo para passar as celebrações de Natal e Ano Novo no prédio em 2016.

Quinze andares abaixo, na entrada, há degraus em mármore, grades de ferro em frente a uma enorme porta vermelha feita inteiramente de metal, que tem uma parte corrediça para se ver quem está do outro lado. Foi atrás desta porta que, em 2012, o Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC) se abrigou contra a polícia para ocupar este prédio. Depois, residentes me contam que, ao ocuparem o imóvel, suas equipes coletivamente removeram 15 toneladas de entulho, antes que 170 famílias pudessem mudar-se propriamente: 500 pessoas foram alojadas em um edifício de 15 andares sem elevadores, saneamento, eletricidade ou privacidade neste período inicial.


Figura 2
Carmen da Silva Ferreira, líder do MSTC.
Foto: Luiza Sigulem

No lobby, uma líder do MSTC, Carmen, me chama do mezanino. “Vem Alex, eles estão aqui”. Carmen conheceu Eliane Caffé, uma cineasta de São Paulo, e juntas trabalharam em um filme sobre a ocupação, “Era o Hotel Cambridge”. Juliana Caffé, sobrinha de Eliane, acompanhou o processo e, tendo discutido várias ideias com Yudi Rafael, os dois curadores abriram discussões bem-sucedidas com a liderança do MSTC sobre a possibilidade de um ano de programa de residência artística dentro da ocupação.

Um lance de escadas acima fica o espaço chamado de biblioteca, que está absolutamente lotado. Raquel Rolnik está em pé à frente, segurando um microfone de plástico conectado a uma caixa de som sobre rodas. Ao lado dela está Ícaro, um dos artistas. Nós já estávamos trabalhando juntos quando ele, ao aceitar o período de residência, me pediu para acompanhar o processo como um interlocutor. Há grandes bandeiras vermelhas esticadas nas paredes e o som do tráfego da avenida abaixo entra pelas janelas abertas. Estamos em 19 de abril de 2015, no primeiro evento de Ícaro em seus três meses de programa, o primeiro evento da Residência Artística Cambridge. Quanto a mim, não fazia a menor ideia de que permaneceria trabalhando neste espaço pelos próximos 12 meses, assumindo um papel de curadoria ao lado de Yudi e Juliana, enquanto o projeto avançava.

Ícaro falou primeiro. O público é misto, incluindo urbanistas, residentes da ocupação, estudantes, artistas, jornalistas, curadores e pesquisadores universitários. Ícaro fala sobre um tipo diferente de trabalho de arte e a importância de ter Raquel falando aqui, neste espaço, neste momento. Ele agradece algumas pessoas, entre elas Carmen, que está sentada à frente, de braços cruzados. Ele então conclui entregando o microfone rapidamente a Juliana e Yudi. Yudi e Juliana estão vacilantes. Talvez pareça estranho apresentar um trabalho de arte, que tomará a forma de uma palestra de alguém tão ilustre, de dentro de uma ocupação. As dimensões da estratificação social são visíveis na sala: os residentes da ocupação chegam atrasados, porque vêm do trabalho. Há uma diferenciação facilmente observável na forma como se vestem, comparada aos acadêmicos, artistas e estudantes. De fato, em sua pequena abertura, Ícaro ressalta ser uma vergonha que não haja mais residentes da ocupação presentes.

Raquel, em contraste, depois dos discursos preliminares, domina o palco e comunica, sem esforço, complexas ideias acadêmicas para um público tão diverso, argumentando como condições de moradia adequadas são um direito de todos os cidadãos e como sistemas políticos e econômicos pelo mundo têm falhado em prover esses direitos à maioria dos cidadãos. Ela explica que São Paulo vive uma situação de emergência habitacional com um déficit de 230 mil moradias. Assinalando as tendências predatórias do mercado imobiliário global, Raquel fala diretamente aos residentes da ocupação, defendendo que somente por meio da ação direta, em consonância com diferentes setores da sociedade, pode-se combater a colonização da terra e lutar por melhores condições de moradia.

Depois da fala de Raquel,1 Carmen, inesperadamente, toma o microfone fazendo um discurso forte que leva as pessoas a aplaudirem, dominando o palco e exigindo a atenção de todos os presentes. É impossível não se impressionar com sua incrível performance. Quando Carmen termina seu discurso, há tempo para questões e discussão. Há algumas questões específicas sobre urbanismo assim como comentários em solidariedade ao discurso de Carmen a respeito da necessidade de lutar. Como afirma o slogan do MSTC: Quem Não Luta Tá Morto.


Figura 3
‘Quem Não Luta Tá Morto’.
Foto: Luiza Sigulem

Mais tarde, a equipe de curadores e amigos foram a um bar e todos pareciam aliviados e surpresos com o sucesso do evento. O discurso de Raquel alcançou diferentes tipos de público e ao final houve momentos de confraternização: os curadores conversaram com residentes, se apresentaram e delinearam o que era a Residência e o que eles poderiam esperar disso. Ícaro me convidou para o projeto, inicialmente, com este espírito exatamente, ou seja, para trocar ideias, oferecer um ângulo diferente. O que eu não sabia é que no final trabalharia na Residência por todo o ano seguinte. No bar, o principal tema de conversa foi como a Residência poderia comunicar-se melhor - via pôsteres e vídeos - para tentar alcançar pessoas diferentes. Havia uma preocupação grande sobre a audiência e como envolver mais residentes com o programa de Ícaro.

Enquanto os curadores pediam mais bebidas, eu me surpreendia em vê-los tão reflexivos sobre suas próprias práticas. Três da manhã e eles continuavam falando sobre o significado de se conduzir eventos de arte em uma ocupação no centro de São Paulo: o que significava o fato de Carmen ter tomado o microfone; como a presença dela como líder havia criado uma certa dinâmica; como poderíamos facilitar melhor a participação do público sem pressões. A principal preocupação é a estrutura vertical da liderança do movimento, e se Carmen irá “forçar” os residentes a assistir às atividades do projeto. Pensávamos em antecipação a eventos futuros: como o projeto pode melhor facilitar a troca livre de opiniões?

Foi uma boa noite, mas compreendi, com eles, que aquele era apenas o começo, um sentimento reforçado por um esboço no caderno de notas de Ícaro, que ele me mostrou alguns dias depois, detalhando as atividades que estava propondo para os dois meses de residência que lhe restavam:


Figura 4
Planejando uma residência, do caderno do Ícaro Lira.
Foto: Alex Flynn

Mais cinco palestras públicas; visitas a projetos parceiros de outras ocupações do MSTC; um censo sobre filmes alcançando todas as 170 famílias; um grupo de psicoterapeutas que deve se encontrar a cada duas semanas e oferecer terapia de grupo dentro da ocupação a pedido dos residentes; um grupo de trabalho para investigar o potencial de uma biblioteca, como espaço de aprendizado comunitário; cineclube quinzenal, com mostra de filmes ligados às palestras; oficinas com editoras independentes para as crianças da ocupação; e um livro contendo contribuições de todos os que participassem do projeto, com textos críticos e reflexivos. Em suma, um período bem ocupado.

A ARTE PARA ALÉM DO MUSEU

A Residência Artística Cambridge teve lugar no antigo Hotel Cambridge, uma das nove ocupações administradas pelo MSTC, que por sua vez faz parte de um coletivo maior, a Frente de Luta por Moradia (FLM). A FLM articula a luta pelo direito à moradia dentro de um contexto muito específico e hostil: São Paulo é uma das cidades com maior desigualdade do mundo e, de acordo com dados coletados no Censo de 2010, o número de residências vazias na cidade totalizava quase 290 mil propriedades. De acordo com a Secretaria Municipal de Habitação, 130 mil pessoas não têm um lugar para morar. É também importante notar que, segundo esses dados, aqueles vivendo em moradias irregulares ou precárias, tais como cortiços, não entraram nesse total. Em tal contexto, portanto, a Residência correspondia a uma forma muito diferente de entender e de articular a prática de arte contemporânea: havia uma urgência e uma pressão imediata de assumir uma posição política em face da realidade.

Mas como podemos teorizar estas intervenções estéticas e políticas que, tendo o urbano como contexto, objetivam abrir outros espaços dentro de um coletivo imaginário? Fica claro que a defesa do chamado “fim da arte” (DANTO, 1998) foi superestimada: achamos, pelo contrário, que os processos artísticos que colocam praticantes de arte contemporânea em contato com interlocutores urbanos, eles próprios atores altamente reflexivos, geralmente com objetivos em comum, são mais frequentes. A noção de Jacques Rancière de uma “partilha do sensível” é uma abordagem útil para construir a compreensão deste tipo de prática intersticial. A “partilha do sensível” designa “um sistema de fatos auto-evidentes do sentido de percepção” que separa “algo comum” de “partes exclusivas”, o compartilhado do privado (RANCIÈRE, 2013, p. 7). Práticas artísticas, como narra Rancière, não são meios privilegiados de entender a “realidade”, mas “formas de fazer e construir” que intervêm na distribuição geral de tais formas, assim como nos relacionamentos que eles mantêm com “modos de ser e formas de visibilidade” (RANCIÈRE, 2013, p. 8). Toda arte, nesse sentido, é política - e, em contrapartida, “há [...] uma estética no cerne das políticas” - porque é construída sobre a percepção sensorial, sobre o “que é visto e o que é dito, em torno de quem tem a habilidade de ver e o talento de falar” (RANCIÈRE, 2013, p. 8). São capazes de produzir igualdade e desigualdade, inclusão e exclusão e práticas artísticas, ao oferecer formas alternadas de ver, são capazes de “intervir” em diferentes arranjos e distribuições. O conceito de García Canclini da arte pós-autônoma, que deve muito ao pensamento de Rancière, fala mais concretamente sobre como uma história da arte seria “uma combinação paradoxal de condutas dedicadas a assegurar independência do seu campo próprio e condutas comprometidas em acabar com os limites que separam esses campos” (CANCLINI, 2014, p. xvi). García Canclini sugere que a cidade é apenas um dos muitos espaços nos quais as práticas de arte estão sendo deslocadas dos arredores institucionalizados da “arte contemporânea” e propõe a definição “prática de arte pós-autônoma” como forma de refletir sobre o arranjo particular das fronteiras porosas que caracterizam a produção artística:

Com esta terminologia eu me refiro aos processos das últimas décadas nos quais os deslocamentos de práticas artísticas baseadas em objetos para práticas baseadas em contextos aumentaram, a ponto de conseguir inserir os trabalhos em mídia de massa, espaços urbanos, redes digitais e formas de participação social, onde a diferença estética tende a desaparecer. Muitos trabalhos ainda são exibidos em museus e bienais, ainda são assinados por artistas e alguns deles vencem prêmios de arte, mas prêmios, museus e bienais compartilham a difusão e a consagração com revistas de moda e a televisão. A assinatura única, a noção de autor, permanece meio submersa em campanhas publicitárias, mídia de massas e grupos não artísticos (CANCLINI, 2014, p. xviii).

Para García Canclini, uma realidade que tinha sido previamente teorizada como um “sistema” hermético, ou um “mundo de arte” com margens e convenções definíveis, não pode mais ser contida dentro desses termos. A arte não é mais um campo singular, com uma gama limitada de atores, tais como o artista idealizado, o galerista ou o curador, atuando dentro de uma série de locais determinados, como a chamada “white cube”, o museu ou o espaço privado dos colecionadores. Os trabalhos estão agora em busca de públicos radicalmente diferentes e almejando criar diálogo com estruturas de recepção heterogêneas.

De acordo com García Canclini, esta condição pós-autônoma é caracterizada por uma posição intersticial, uma oscilação “entre a inevitabilidade de estar inserido na sociedade e o desejo de autonomia” (CANCLINI, 2014, p. xxiv). Para ele, o significado do urbano neste desalojamento processual de práticas artísticas baseadas em objetos para aquelas baseadas em contexto é chave para sua teorização do trânsito entre a autonomia e o que constitui a iminência da arte: obras que “não simplesmente suspendam a realidade mas se encontram em um momento prévio, quando o real é possível, quando ainda não se desfez” (CANCLINI, 2014, p. xiv).

Muito do que García Canclini identifica já havia, claro, sido teorizado a partir dos anos 1990; porém nos campos da História da Arte, primariamente por meio de duas perspectivas, as de Nicolas Bourriaud e Claire Bishop, servindo de sua compreensão de uma arte mais socialmente engajada. Examinando, por exemplo, as obras de arte dos anos 1990 (muitas das quais com curadoria dele), Bourriaud argumenta em Relational Aesthetics (2002) que a arte deve ser considerada em referência às relações que a obra viabiliza e aos modelos de sociabilidade que ela propõe. Nesse sentido, uma obra de arte “toma como horizonte teórico a esfera das relações humanas e seu contexto social” (BOURRIAUD, 2002, p. 14), criando “micro utopias”, espaços nos quais as pessoas podem entrar em diálogo e criar significado de maneira democrática. Claire Bishop, contudo, contestou essa posição rebatendo que Bourriaud coloca ênfase demais na mediação de relações intersubjetivas, deixando inteiramente de fora a questão maior sobre quais tipos de relações estão sendo criadas e por quem (BISHOP, 2004, 2012). Desse modo, Bishop implicitamente questiona o potencial emancipatório da participação, argumentando que a arte relacional, por mais que proclame sua horizontalidade, pode na verdade terminar sendo nada mais do que outra esfera de arte exclusiva, onde as únicas relações permitidas são “fundamentalmente harmoniosas”, uma arte “dirigida a uma comunidade já com alguma coisa em comum” (BISHOP, 2004, p. 68). Já me detive sobre esse debate com maior produtividade (Flynn, 2016), mas neste momento quero salientar que uma das contribuições deste artigo consiste em demonstrar como as atividades da Residência exigem um entendimento da participação completamente diferente daqueles propostos por Bourriaud e Bishop, o que será descrito nos próximos parágrafos.

DESOBEDIÊNCIA EPISTÊMICA

Se aceitarmos, portanto, que a arte é cada vez mais praticada em contextos do que em objetos, no domínio das interações humanas e sociais, como podemos conectar isso às noções de resignificação e plasticidade em qualquer dado contexto no qual um artista possa trabalhar? Aqui o conceito de Walter Mignolo de desobediência epistêmica (MIGNOLO, 2009) pode ser frutífero, ligando o caráter extra-institucional da arte praticada na cidade aos processos de ressignificação que podem ocorrer em tal espaço. Mignolo, junto a estudiosos latino-americanos da rede modernidade/colonialidade, incluindo Aníbal Quijano (2000, 2007), Arturo Escobar (2007, 2008) e Enrique Dussel (2008), apresenta uma série de ferramentas teóricas e práticas que apoiam o que se tornou conhecido como a plataforma “Sul Global”. Em particular, Mignolo defende que para perceber mundos alternativos, aqueles que existem além do imaginário do imperial, deve-se começar com um processo de desobediência epistêmica. Rejeitar o pensamento de um conhecimento imperial/colonial, cuja premissa é a mercantilização da vida, exige modelos alternativos de produção de conhecimento, e um aspecto-chave da plataforma Global South é que ela busca descolonizar não somente o conhecimento, mas sobretudo a indumentária dos “fazedores de conhecimento”. Esse segundo momento, portanto, almeja criar condições pelas quais a redefinição de significado seja possível, distinta da “teia do conhecimento imperial/moderno e da matriz de poder colonial” (MIGNOLO, 2009, p. 23).

A desobediência epistêmica foi praticada na Residência em uma variedade de maneiras: o sentimento de atravessar o institucional acontecia em múltiplos níveis e era explícito e implícito em termos do seu posicionamento e prática. Em seu aspecto mais simples, a Residência foi um programa de residência artística que convidou quatro artistas para que cada um trabalhasse por um período, teoricamente flexível, de três meses de um calendário anual.2 A localização da Residência era crucial para a prática dos artistas: removidos dos típicos espaços de arte contemporânea, a Residência convidou artistas a trabalhar dentro de um movimento social radical, a entrar em um diálogo diário, não mediado, em um edifício residencial que abriga 500 pessoas e a conduzir um processo de pesquisa em um local profundamente estigmatizado, no centro de São Paulo.

A Residência foi também feita sem nenhum financiamento: curadores, artistas e colaboradores trabalharam gratuitamente. A ausência de relações financeiras ou de patrocinadores não é usual para um projeto que é inteiramente sem fins lucrativos e, para a Residência, isso significava que o projeto tinha acesso limitado a apoio técnico, embora fotocópias, impressões e A/V básico tenham sido oferecidos pelo escritório do MSTC. Essa falta de patrocínio não foi acidental. Em repetidas entrevistas com os curadores ficou claro que a Residência buscava se colocar explicitamente contra iniciativas de arte contemporânea comercializadas. O time de curadores voltou mais de uma vez ao tema da fetichização do objeto e da mercantilização do trabalho artístico e à medida que o programa de residência avançou, a direção curatorial do projeto começou a se orientar em direção a uma compreensão pós-material da arte contemporânea: muitas vezes fui informado de que, sem objetos tangíveis, não é somente mais difícil fazer uma venda, mas que qualquer intervenção estética deveria responder ao espaço ao qual ela esteja integrada, mais do que ao mercado, supostamente além do espaço de ocupação.

Situada assim nas fronteiras do espaço da arte contemporânea em muitos sentidos, o projeto, em si considerado extra-institucional, mas também experimental, busca não somente desconectar-se das instituições de arte mundial mais voltadas para o mercado, como também criar horizontalidade nos relacionamentos do projeto e deste modo abrir um espaço reflexivo que proponha uma crítica contínua do projeto, de suas atividades e dos parâmetros sob os quais opera.

As condições de precariedade da Residência, sua estrutura organizacional não- hierárquica e seu foco na arte não-comercial apontam, portanto, para uma desobediência, mas em que medida poderia um projeto de arte contemporânea realisticamente “ir além” - como expressa o discurso da Residência - da arte contemporânea mundial na qual está inserida? Todos os artistas dentro do programa da Residência foram contratados por poderosas galerias comerciais, e surgiu a questão de como esses relacionamentos se manifestariam no futuro. Os participantes também se perguntaram se o projeto poderia ser realmente considerado extra-institucional, quando é operado dentro de um movimento social centralmente concebido e organizado. Tornou-se questão recorrente: o que o desejo de atuar horizontalmente implicaria diariamente? Que tipo de conhecimento, arte ou resultado poderia ser produzido a partir de um projeto horizontalizado que operava em espaços intersticiais caracterizados por sua verticalidade?

Pensando por meio de processos de ressignificação, é marcante como esses espaços contestados se transformaram em temas centrais de pesquisa do projeto. Por exemplo, trabalhando no contexto de um movimento social que é centralmente concebido e organizado, a Residência encontrou e respondeu a uma noção inteiramente diferente de “participação” daquelas articuladas por Claire Bishop ou Nicolas Bourriaud.

PARTICIPAÇÃO

A participação sempre foi um foco teórico para a Residência, como exemplifica um comentário de Ícaro por ocasião do primeiro evento, desejando ver mais habitantes da ocupação em eventos futuros. Mas que tipo de participação poderia ocorrer onde eixos de verticalidade e horizontalidade se cruzavam, o ponto que em matemática é chamado de “origem”?

Com o passar dos meses, ficou cada vez mais claro que a Residência estava operando dentro e fora da lógica de um movimento social que busca mobilizar e massificar seus membros e estruturas. Esta tecnologia de movimento social pressupõe uma estrutura piramidal de poder e o carisma dos líderes para colocar um grande grupo dentro de uma proposta definida e, no mais das vezes, utópica. Este paradigma está presente em análises acadêmicas diversamente focadas no “comportamento coletivo” (Park, 1967), “mentalidade da multidão” (Arendt, 1951), ou “escolha racional” (Olson, 1965), mas as atividades articuladas pela Residência foram, desde o princípio, baseadas em uma compreensão bem diferente do que significa participar. A natureza não-obrigatória das atividades dos artistas se situava em contraste total a muitas das tarefas coletivas organizadas pela liderança do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Para assegurar o funcionamento tranquilo de um espaço residencial, e em um paradigma de um movimento social que já foi descrito como pragmático (Carter, 2005; Meszaros, 2000), havia tarefas de limpeza obrigatórias, grupos de trabalho coletivizado e assembleias gerais, assim como um nível de disciplina no que concerne a bebidas, festas e barulho. O primeiro artista residente, Ícaro Lira, e os dois subsequentes, a dupla Jaime Lauriano e Raphael Escobar, trabalharam com um processo artístico totalmente não-compulsório. Enquanto Ícaro organizou palestras públicas, oficinas para as crianças da ocupação e noites de cineclube para o público em geral, entre outras atividades, Jaime e Escobar se concentraram em preparar uma série de três jantares comunitários, cada um recebendo em torno de quarenta dos residentes da ocupação, como forma de construir relacionamentos e a partir deles estabelecer conexões entre esses atores e a cidade em seu sentido mais amplo.

Ambas as abordagens, a de Ícaro e a de Jaime e Escobar, entraram em um certo diálogo com o paradigma de estéticas relacionais de Bourriaud: o foco, no discurso da Residência, na arte pós-material significava que uma associação com esse paradigma era inevitável, embora nenhum dos artistas jamais o tenha referido como uma influência. De fato, o que distinguia o trabalho desses artistas do paradigma de estéticas relacionais era a dimensão temporal estendida nas quais as atividades tiveram lugar, o “público” com o qual eles trabalhavam e o espaço no qual seus processos eram desempenhados.

À sua própria maneira, as duas primeiras residências focaram nos relacionamentos, redes de trabalho e na criação de um espaço no qual a ressignificação poderia ser elaborada, oferecendo um toque em direção da micro utopia, como na terminologia de Bourriaud. Mas trabalhar ao lado dos habitantes do prédio por um período de meses tornou possível um redesenhar simbólico das linhas e práticas não somente de como a ocupação era percebida, mas como era experienciada. Os processos artísticos que foram conduzidos dentro da Residência, seja em forma de convites para jantares ou palestras, deixaram claro que a participação não era nem uma visita a um museu ou a uma galeria particular para se engajar com dada obra de arte, como no paradigma de Bourriaud, nem o experienciar que Claire Bishop (2004) chama de uma experiência mais antagônica, motivada por razões de autoria ou comunidade (BISHOP, 2006, p. 12).


Figura 5
Raphael Escobar e Jaime Lauriano.
Foto: Juliana Caffé

O que emergiu do posicionamento da Residência no coração de um movimento social e em suas conflitantes lógicas de organização foi que a participação definia-se a priori para os residentes da ocupação, uma condição ausente das análises de Bourriaud e Bishop em decorrência de seu foco no artista, em oposição ao conteúdo do trabalho em si, às pessoas, que por fim constituem sua legitimação. Este foco, que é particular a um certo tipo de prática artística, pode ser sintetizado pela descrição de Liam Gillick sobre seu próprio trabalho: “Meu trabalho é como a luz do refrigerador. Só funciona quando alguém abre a porta. Sem gente não é arte - é outra coisa - são objetos em uma sala” (GILLICK, 2000, p. 16).

Gillick foi um dos artistas com quem Bourriaud trabalhou enquanto conceitualizava as estéticas relacionais, e suas suposições acerca de participação e temporalidade são reveladas nessa citação. Para Gillick, o trabalho somente se torna arte quando alguém “abre a porta da geladeira”. Nessa concepção, uma outra pessoa pode abrir a porta, ou ainda outra, mas será apenas por um breve momento, no qual a luz vai brilhar sobre seu trabalho, e nesse sentido a capacidade de cada pessoa, ou a maneira como ela “abre a porta da geladeira”, presume-se ser a mesma. Em outras palavras, para Gillick as pessoas são intercambiáveis, a função delas é meramente “iluminar” e então transformar coisas em arte. Por contraste, na Residência, onde o horizontal encontra o vertical, a participação é um recurso infinito para ser arrebanhado por um oficial da polícia montada perto da galeria londrina Tate Modern, como na obra de Tania Bruguera, “Tatlin’s Whisper #5”, que ilustra a capa da monografia de Bishop, ou por uma abertura e fechamento mecânicos que possam ser desempenhados por um autômato. A participação era mais propriamente uma moeda corrente que sustentava a razão primeira para alguém ser um membro do MSTC, na qual era negociada pelo e, em termos incrementais, subjetivamente igualada ao direito a um lar. Sem ter participado ativamente, primeiro, em uma das muitas comunidades de base do MSTC pelos subúrbios de São Paulo e mais tarde, se selecionado para um apartamento, em uma ocupação, não haveria um relacionamento sustentável e de longo prazo entre membro e movimento. Isso levou a uma ressignificação do termo participação, à medida que os residentes da ocupação começaram a entender, tácita e pessoalmente, as propostas dos eventos propostos pela residência, se eram obrigatórios e, se não, se valia a pena participar deles.

Uma das iniciativas de Ícaro era convidar um grupo de psicoterapeutas para oferecer aconselhamento gratuito na ocupação, em resposta ao feedback dos residentes, dando conta de que era isso o que faltava ao espaço. Em um evento de terapia de grupo, os terapeutas ficaram intrigados com a presença de quarenta residentes, quando a frequência normal seria de menos de 10 pessoas. Como era de rotina, um grupo de discussão foi convidado a se apresentar e quando perguntados por que queriam fazer parte, um deles explicou que estava presente porque os líderes tinham dito a ele que era uma boa ideia e que valia “pontos”. Teoricamente, este modelo aproxima-se das noções de participação como destacadas pela etnografia de Angelique Haugerud sobre o movimento dos Bilionários nos Estados Unidos, no qual, como um dos membros executivos do comitê afirma: “Surpresa, surpresa! - as pessoas que fazem a maior parte do trabalho têm o maior poder” (HAUGERUD, 2015, p. 153) -, do que daquela dos ativistas da chamada alter globalization detalhados por Marianne Maeckelbergh. Ela vê a participação como crucial para o processo de política pré-figurativa (MAECKELBERGH, 2009, p. 72). Mas, fundamentalmente, focando nas pessoas que participam, em oposição à participação de quem exibe, como a dos curadores, revela que nos interstícios do movimento social e da prática artística, a participação tem uma posição simbólica em uma relação complexa, estruturada pelo intercâmbio: os residentes reservam energia e tempo para participar, em troca do direito de terem um lar.

Para muitos residentes, investir em participação era um presente diferenciado que eles permutavam em troca de uma solução de moradia economicamente acessível. Entretanto, em uma compreensão antropológica e tendo em mente trabalhos acadêmicos recentes (SANSI, 2015), tal presente, aqui sob a forma de participação, deve conter um hau, o espírito que vive dentro de todos os presentes e que busca retornar a quem presenteou. Mas qual é o retorno para o artista que entrou casualmente em uma série complexa de relações anteriores? Como pode a arte almejar a não ser mercantilizada e evitar ser reduzida a uma commodity e ainda oferecer um retorno claramente definido? Que forma terá o hau para o artista?

DE RESSIGNIFICAÇÃO A RECONFIGURAÇÃO

A desobediência epistêmica, implícita e explícita, inerente ao projeto da Residência, criou uma certa fricção em sua interação com pelo menos duas esferas: a mais ampla, de ecologia política, como Arturo Escobar definiria, da arte contemporânea mundial e a da lógica pragmática do MSTC. Mas como isso funciona na ressignificação do ato de ocupação? Uma das práticas diárias que respaldava o desejo mais amplo de horizontalidade dentro da Residência era a forma como os praticantes buscavam conceitualizar as estruturas nas quais operavam. Por meio de seus trabalhos, os artistas Ícaro Lira, e Jamie Lauriano e Raphael Escobar (este artigo foca somente nessas duas primeiras residências) questionavam, por um lado, como o projeto trabalhava com a lógica piramidal de mobilização e como a mitigava e, por outro, a lógica do sistema de arte contemporânea conduzida pelo mercado, recentemente submetida à revigorada crítica de Suhail Malik (2018). Esses artistas negociavam continuamente com a equipe de curadores, suas galerias, a liderança do MSTC e os residentes da ocupação, para tentar de fato entender o que constituía uma ocupação com conotações estéticas, e como noções como participação poderiam ser repensadas por meio de intervenção artística.

Nesse sentido, a Residência abordou noções de participação através de atividades de seus artistas residentes, mas também ofereceu a possibilidade de comentário sobre o que é a ocupação e como, por meio da interação com 500 indivíduos todos os dias por um ano todo, o papel da arte contemporânea poderia ser produtivamente ressignificado. Os curadores, Juliana e Yudi, rejeitaram a noção de que o que eles estavam fazendo se constituía em um tipo de ativismo, como fizeram os artistas. A atividade central para esses praticantes era baseada na plataforma estética, embora em uma que criasse múltiplas sobreposições com formas sociais paralelas. O artista Hito Steyerl analisa o que uma ocupação pode significar e onde ela pode existir:

O território de ocupação não é só um espaço físico, e certamente não é para ser encontrado dentro de qualquer território ocupado já existente. É um espaço de afeto, materialmente apoiado por uma realidade arruinada. Pode se materializar em qualquer lugar e a qualquer tempo. Ele existe como uma experiência possível (STEYERL, 2011, 2).

Os praticantes da Residência buscaram se afastar da reificação da arte e do artista. Eles abriram e sustentaram, ainda que em curto período de tempo, possibilidades de diálogo com o dia-a-dia, o relacional e o que era aparentemente invisível. E, de fato, isso é o que tornou possível um redesenhar simbólico das linhas em relação a como a ocupação era percebida e experienciada.

No entanto, tais transformações simbólicas eram somente parte de uma reconfiguração maior da ocupação e de seus relacionamentos com a cidade na qual se insere. A ressignificação das “representações espaciais” da ocupação, tomando emprestada a terminologia de Lefebvre, foi acompanhada por transformações afetivas e materiais para os “espaços representacionais” e as “práticas espaciais”, transformações que propunham uma reconfiguração do ato de ocupação dentro da própria cidade. A equipe de curadores argumentou que o projeto fez avançar uma proposta mais ampla que foi além da sua localização marginalizada, o que em qualquer caso não é nada novo,2 ao buscar pôr em prática políticas pré-figurativas: para fomentar novas formas de participação e sociabilidade, cujas dimensões materiais e incorporadas foram reconhecidas por meio dos convites do projeto, para pessoas de dentro e de fora do local da ocupação, para “ocupar” e ser desobediente em uma miríade de diferentes maneiras. Nesse sentido, passou a existir um reconhecimento da ressonância e importância políticas únicas do Hotel Cambridge para um espaço urbano alargado e por meio da implementação da reconfiguração urbana e artística que ele apresentou. Esta abordagem foi apoiada por um fluxo constante de diversos colaboradores, atraídos de dentro e de fora da ocupação, dentro e fora de seu espaço físico. Ícaro descreveu seu projeto como a instalação de uma rede de trabalho (network) enquanto a motivação mais forte de Jaime e Escobar foi facilitar melhores conexões entre os residentes da ocupação e os diversos atores na cidade, em sua forma mais ampla. À medida que o projeto avançava, foi a especificidade dessas conexões que sustentou as tentativas de reconfigurar a posição da ocupação, dentro de um panorama político hostil. O livro de Alexandra Boutros e Will Straw, Circulation and the City (2010), reconhece a importância de como a matriz da sociabilidade urbana é ao mesmo tempo constituída e separada por meio de diferentes tipos de relações. Eles afirmam em seu conceito central:

A circulação pode designar o controle de condutas (sua integração dentro de circuitos rigidamente regulados) assim como sua flexibilização (a capacidade de se libertar da autoridade). A diferença entre estes usos materializa uma tensão de longa data na escrita sobre cidades, a qual inevitavelmente se esforça para capturar a ordem reguladora e a efemeridade fugaz da vida urbana moderna (BOUTROS E STRAW, 2010, p. 1)

Quando a Residência teve início na ocupação, além das portas e grades de metal, todas as janelas dos fundos do prédio eram não só externamente protegidas por barras de metal, como também eram cobertas internamente por grandes placas de compensado. A ocupação, em seus primeiros momentos em 2012, era um tipo de forte, uma vez que a liderança temia o despejo por uma Polícia Militar hostil.3 Os projetos de Ícaro e de Jaime e Escobar buscavam, ambos, construir conexões entre a ocupação e o cenário urbano no qual estavam inseridos e marginalizados, e essa circulação, mantida em tensão, entre a cidade e o espaço da ocupação, foi fundamental para a prática dos artistas. Para Boutros e Straw, a mutabilidade de tal conjunto é inerente à noção de cidade em si mesma: “A circulação não é algo que simplesmente acontece para a cidade, nem é alguma coisa que acontece exclusivamente na cidade. Mais do que isso, a cidade em si mesma é constituída pela circulação” (BOUTROS E STRAW, 2010, p. 9).

Um dos mais notáveis exemplos de como essa circulação levou à reconfiguração foi a matéria sobre a Residência em um dos jornais mais conservadores de São Paulo, O Estado de S. Paulo.4 No artigo, destacado na capa do suplemento de cultura, o Hotel Cambridge é referido como uma ocupação e não como invasão, na manchete e, repetidamente, ao longo do artigo. Isso em grande parte graças ao reconhecimento, por parte da repórter do jornal, das práticas e intencionalidades incorporadas e afetivamente imbuídas que ela própria testemunhou em sua visita ao espaço físico. Confrontada com a escala de atividades acontecendo entre o Hotel Cambridge e a cidade, da qual ela própria fazia parte, e que previamente seria impensável, a linguagem de invasão se tornou insustentável para a repórter, mesmo que isso significasse lutar sua própria batalha dentro da redação antagonista de seu jornal. A distinção entre “invasão” e “ocupação” pode parecer pequena para alguns, mas no ambiente profundamente politizado de São Paulo é de alta importância e uma indicação para uma série de posições ferozmente contestadas: a palavra “ocupação” confere ao Hotel Cambridge a legitimidade que tem sido vastamente negada a outras ocupações. “Ocupar” e “invadir” também têm diferentes conotações legais, sendo que a primeira refere-se a uma cláusula constitucional e, portanto, à possibilidade de legalidade, enquanto a segunda invoca a noção de transgressão, que coloca o “invasor” sob o imediato jugo da ação policial (HAMMOND, 2004). O artigo 7 da Constituição Brasileira explicitamente garante o direito a um lar, estabelecendo que um salário mínimo deve cobrir todas as necessidades básicas, incluindo condições de vida dignas. Com relação às ocupações, advogados de Direito Constitucional têm discutido o que o direito à casa envolve, além do direito de ocupar um espaço e de transformá-lo em um lar, em virtude do fato de que morar constitui uma faceta básica do caráter humano (SARLET, 2008), fornecendo uma conexão interessante entre enquadramentos legais e teorias desenvolvidas por Lefebvre e Harvey. Duas semanas depois da publicação do artigo de jornal, a líder do MSTC, Carmen, afirmava que a cobertura foi uma vitória, e que o MSTC nunca havia sido representado desta forma por nenhum jornal.

A partir desse momento, os participantes do projeto começaram a considerar a reconfiguração do espaço do Hotel Cambridge e como as conotações estéticas de seu trabalho tinham facilitado esse processo. Essas reflexões foram complementadas por uma enorme expansão da atividade: no período imediatamente posterior à publicação, ocorreu um processo incremental de eventos, palestras públicas, manchetes em jornais e revistas, como os habitantes do Hotel Cambridge tornaram possível a reconfiguração do que uma ocupação poderia ser. Nesse período, o prefeito de São Paulo fez um discurso na biblioteca da ocupação, que por sua vez requisitou reconhecimento formal como um espaço cultural. Camila Márdila, uma atriz de cinema brasileira, falou em um evento no cineclube, no qual o filme em que ela atuou, “Que horas ela volta”, foi mostrado, e uma série de relacionamentos entre os residentes e os participantes do projeto foram criados, evidência da materialidade e corporeidade da circulação dentro e fora do espaço físico da ocupação.

O que esses exemplos demonstram é que as atividades da Residência envolveram mais do que entendimento e promoção da produção de conhecimento artístico como a representação variável das realidades já presentes e foram além de meramente enfatizar a enunciação de um porvir. Enquanto o redesenhar simbólico resultante do projeto foi sem dúvida significante, a série de jantares organizados por Jaime e Escobar, por exemplo, criou circulação de ideias, todas decorrentes dos relacionamentos entre artistas e residentes da ocupação, como o tipo de futuro que poderia ser realizado dentro do espaço, entre suas paredes e para além delas, na cidade. Nos jantares, e por meio de longas conversas não só à mesa, mas no processo de convidar todos os residentes pessoalmente porta a porta, os artistas desenvolveram uma compreensão dos tipos de serviços profissionais que eram oferecidos pelos membros da ocupação. Jaime e Escobar construíram uma rede de trocas e aptidões, com o objetivo de criar uma espécie de “páginas amarelas” estetizada. A meta deles era destacar como a ocupação era marginalizada do fluxo diário de pequenas trocas comerciais que caracterizam São Paulo, ou qualquer outra cidade, e reforçar a ideia de que aos residentes da ocupação não faltavam competências e que eles não precisavam necessariamente de caridade e doações, mas que eram indivíduos com talentos e agência e que queriam participar do comércio diário. O conceito de uma forma de “páginas amarelas” levou Escobar a criar uma série de cartões de visita para pequenos negócios dentro da ocupação, incluindo uma confeitaria, um salão de beleza e uma alfaiataria e, finalmente, uma série de logotipos iluminados que foram colocados sobre cada um dos locais de trabalho dos comerciantes residentes.

CONCLUSÃO

As atividades da Residência foram resultado de uma série de conversas, mas também se constituíram delas. Essas conversas, de perspectivas radicalmente diferentes, eram centradas não somente nas formas de viver na cidade, mas de ativamente fazer a cidade na qual se vive. Essas diversas atividades promoveram a noção de que tal conhecimento adquirido não era alguma coisa restrita aos espaços institucionais, mas que poderia inevitavelmente irradiar a partir da comunidade, através da ativação de relações de mundos que existem e que ainda estão por existir. David Harvey enfatiza fortemente a dimensão coletiva do processo “fazer a cidade”, e o que aconteceu no Hotel Cambridge oferece um exemplo tangível de tal teoria: o espaço foi reconfigurado por muitos e diferentes coletivos trabalhando juntos, e colocado em diálogo, no fundo, por uma proposição artística.

O “fazer a cidade” é, no entanto, processual, e sugiro que este tipo particular de prática de arte contemporânea aberta, imbuída no relacional e articulada dentro de um certo enquadramento temporal, fornece um exemplo concreto da noção de García Canclini de iminência da arte: processos que “se situam em um momento anterior, quando o real é possível, quando ele ainda não se quebrou” (Canclini, 2014, p. xiv). As dimensões explícitas e implícitas da desobediência epistêmica da Residência facilitaram certas transformações simbólicas que somente foram parte de um reordenamento ou uma reconfiguração da ocupação e de seus relacionamentos mais amplos com a cidade em que se situa. Práticas artísticas, como “formas de fazer e realizar” na terminologia de Rancière, aconteceram por meio de uma rede de trabalho especificamente contextualizada, um tipo de conhecimento particularmente situado que seria diferente em um outro contexto: o que transgride hierarquias em São Paulo será diferente em processos similares em Berlim, Bangkok ou Nova York. Nesse sentido, a dissonância que a Residência e, claro, a mais ampla ocupação do Hotel Cambridge criaram, oferece um contraponto ao tipo de completa “desvinculação” (de-linking) que Mignolo tem defendido em seu trabalho estético, no sentido de que tal processo limita resultados mais produtivos que emergem como resultado de sua instanciação em situações contestadas. O que emprestou ressignificação e, por fim, uma reconfiguração tão atraente aos processos de participação na Residência, foi precisamente o entendimento de que isso estava ocorrendo em inevitáveis pontos de conflito: uma das motivações principais do programa era dar visibilidade às contradições sobre as quais ele próprio se baseava, deixando claro como qualquer direito à cidade, qualquer “fazer-cidade” é pressuposto em movimento e condicionalidade (AGIER, 2015). Nesse sentido, o urbano, a participação e a prática artística colidiram sob circunstâncias muito específicas: paradigmas diferentes do vertical e do horizontal, do efêmero e do utópico, possibilitaram que invasão se tornasse ocupação, ocupação se transformasse em apropriação, e um prédio abandonado se convertesse, pelo menos por um breve momento, num dos pontos centrais da cidade. Esse ponto, sobre os quais esses eixos se cruzam, que em matemática é chamado “origem”, é um aspecto da “iminência”: para o real ser invocado e mesmo por um curto período se manter intacto, como se dentro de uma elípse entre o presente e o futuro, uma série de oposições devem estar presentes, oposições que um tipo particular de prática de arte contemporânea aberta (open-ended) e intersticial pode colocar em movimento e sustentar.

Material suplementar
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Notas
Notas
1 Palestra completa disponível online: https://www.youtube.com/watch?v=4Rq_naj24HI. Acessado em 2 fevereiro 2017.
2 No começo dos anos 1990, um grupo de artistas afro-americanos em Houston, Texas, incluindo Rick Lowe, mobilizou o conceito de Joseph Beuys de “escultura social”, fundando o Project Row Houses. Essa instalação permanente abriu em 1994 em uma área marginalizada, composta por um conjunto de sete ou oito shotgun houses renovadas, dedicadas aos artistas dos projetos.
3 Um dos exemplos mais marcantes da ação da polícia militar contra ocupações no Brasil ocorreu em Brasília, em junho de 2016. Dois helicópteros da Polícia Militar abriram fogo contra o prédio do Hotel Torre Palace, antes que uma tropa de choque baixasse ao telhado. Cf. https://www.youtube.com/watch?v=jOliJ_P3Qus. Acessado em 2 fevereiro 2017.
4 Artigo completo disponível online: cultura.estadao.com.br/noticias/artes,artistas-criam-no-antigo-hotel-cambridge-de-sao-paulo,10000048707. Acessado em 2 fevereiro 2017.

Figura 1
A Ocupação Hotel Cambridge.
Foto: Alex Flynn

Figura 2
Carmen da Silva Ferreira, líder do MSTC.
Foto: Luiza Sigulem

Figura 3
‘Quem Não Luta Tá Morto’.
Foto: Luiza Sigulem

Figura 4
Planejando uma residência, do caderno do Ícaro Lira.
Foto: Alex Flynn

Figura 5
Raphael Escobar e Jaime Lauriano.
Foto: Juliana Caffé
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