ARTIGO
DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2176-8099.pcso.2018.153617
Resumo: A partir de uma pesquisa etnográfica em dois distritos da periferia de São Paulo, o objetivo deste artigo é realizar uma análise a respeito das concepções de “cidadania” e “direito à cidade” formuladas a partir de uma perspectiva periférica. O texto argumenta que a cidadania deve ser entendida como estratégia política e dentro de uma luta pelo “direito a ter direitos”. Dessa maneira, promove-se uma leitura histórica em torno das lutas pela cidadania e de como elas têm se transformado recentemente nas periferias urbanas no Brasil. Ao fim, é apresentada a ideia de “direito à periferia” como forma de compreender o “direito à cidade” contemporaneamente na perspectiva dos sujeitos que buscam se articular e entrar na cena política nas periferias. A ideia de um “direito à periferia” emerge do fortalecimento de movimentos culturais de cunho identitário que buscam valorizar o “ser periférico” como parte fundamental da formação política de moradores de periferias. Desse modo, a mobilização política e social nas periferias aponta para uma luta que busca garantir o direito à igualdade de forma concomitante com o direito à diferença. O “direito à periferia” articula a luta política e a luta cultural de modo a reconhecer uma relação intrínseca e não oposta entre a igualdade e a diferença.
Palavras-chave: Direito à Cidade, Periferia, Cidadania, Luta Política.
Abstract: Based on ethnographic research in two neighborhoods situated in São Paulo’s peripheries, the aim of this article is to analyze the conceptions of citizenship and “right to the city” from a peripherical perspective. The text argues that citizenship should be understood as a political strategy and as part of a struggle for the “right to have rights”. Therefore, it will be promoted a historical reading on the struggle for citizenship and how it has changed recently in Brazilian urban peripheries. In the end, will be introduced the idea of “right to the periphery” as a way to understand the “right to the city” from the perspective of urban peripheries’ contemporary political activists. The idea of “right to the periphery” emerges from the strengthening of identity and cultural movements that seek to value the peripheral belonging as a fundamental part of the political formation of the inhabitants of these areas. In this way, the political mobilization in the urban peripheries points to a struggle that seeks to assure the right to equality as much as the right to difference. Thus, the “right to the periphery” seeks to articulate both political and cultural struggle in order to recognize an intrinsic and non-opposing relationship between equality and difference.
Keywords: Right to the City, Periphery, Citizenship, Political Struggle.
INTRODUÇÃO
Era uma tarde de quinta-feira, 12 de maio de 2016, estava no Jardim Ângela realizando mais um dia de pesquisa para minha tese de doutorado e assistia a um debate com a temática “direito à cidade” organizado pela Paróquia Santos Mártires e pela Fundação Tide Setúbal. O salão paroquial estava lotado, contei mais de 60 pessoas sentadas em roda, a grande maioria ansiosa por participar do debate e dar sua visão a respeito daquele tema tão rico e controverso.
Na ocasião da roda de conversa, como os organizadores denominaram o debate, os temas tratados foram variados: educação, saúde, moradia, violência, segregação urbana, cultura, em suma, as carências e as dificuldades em acessar certos direitos típicas das periferias e que apontavam para a diversidade de possibilidades de interpretações da noção de direito à cidade.
Diferentemente do que vinha notando na maioria dos fóruns e debates de que participei, organizados pela Santos Mártires ou em instâncias oficiais de participação política, a presença de jovens era bem mais marcante. Na maior parte dos casos que observara até então, as pessoas que atuam de forma mais sistemática nesses canais de interlocução com o poder público tinham, em geral, de 40 anos para mais, muitas já aparentavam ser sexagenários. Essa realidade vinha me dando a crescente impressão de que os movimentos sociais das periferias da cidade e os espaços que haviam conquistado ao longo de décadas de atuação política vinham passando por um processo de envelhecimento, deixando de ser atrativos para os mais jovens.
A ausência de jovens nesses fóruns coincidia com o que parece ser um consenso crescente na literatura que se debruça sobre movimentos sociais ou sobre as periferias urbanas de que “a narrativa político-partidária, ou mesmo movimentista” é desinteressante para esses sujeitos (FELTRAN, 2011b, p. 261). Esse fato isoladamente não pode, contudo, ser interpretado como mera apatia ou desinteresse dos mais jovens por temas políticos ou coletivos de maneira geral.
No intervalo da roda de conversa, entre um café e outro, conversava com Karina, de 36 anos, professora de uma escola municipal de educação infantil e uma das minhas interlocutoras de pesquisa naquela região. Karina me contava que sua filha de 17 anos não estava ali, pois estava em uma ocupação de uma Escola Técnica Estadual (ETEC) reivindicando a garantia de merenda para os alunos pelo governo, dentre outras demandas, em um movimento que buscava repetir o sucesso da ocupação de escolas públicas do ano anterior e que havia impedido a “reorganização escolar” proposta pelo governo estadual1.
Em meio a muitas reflexões e lamentos a respeito dos problemas que o país enfrentava e da falta de perspectivas positivas que se avizinhavam, Karina me disse com um ar de esperança: “nunca, em toda minha vida, vi tanta gente, em tantos contextos diferentes, falar em lutar por seus direitos como agora, especialmente os jovens”.
Eu já estava em campo há mais de um ano e não tive dúvidas em concordar com ela. O Brasil que vinha observando desde que iniciara minha pesquisa de doutorado nas periferias de São Paulo, no primeiro semestre de 2015, era muito diferente do país que cientistas políticos e sociais descreviam a partir do sucesso do lulismo no fim dos anos 2000.
O Brasil adentrou na década de 2010 em meio a um período de crescimento econômico e mobilidade social ascendente, no qual as promessas de inclusão social e ampliação do acesso a direitos pareciam que finalmente se realizariam para os mais pobres. Entre os analistas da cena social havia, de um lado, certo ufanismo em torno da ideia de que o Brasil estaria se tornando “um país de classe média” (NERI, 2008; 2010); de outro, surgiam críticas, sobretudo à esquerda, que apontavam para certa “pacificação social”, por meio de uma “cooptação” de setores populares para que aderissem ao “pacto conservador” em troca de um “reformismo fraco” com concessões pontuais e centradas apenas na ampliação das oportunidades de consumo por parte das classes populares2.
O Brasil que saía das manifestações de junho de 2013, contudo, era bastante diferente desse país “pacificado” a partir da integração pelo consumo3. Os acontecimentos daquele ano acabavam, em alguma medida, por contradizer ou ao menos questionar a tese de que a mobilidade social produzida nos anos “lulistas” tinha como principal consequência a despolitização dos mais pobres e a passividade das diferentes camadas da sociedade. Além disso, ao ter como pauta central, ao menos em seu momento inicial, a questão do transporte coletivo, junho de 2013 trouxe a questão urbana de volta para o centro do debate político.
Desde então, diversos movimentos ligados a temática racial, de gênero, à habitação ou à questão urbana de maneira geral - além de mobilizações articuladas por movimentos tradicionais como partidos, sindicatos ou ainda as mencionadas ocupações de escolas públicas por estudantes secundaristas em 2015 - vinham expressando suas demandas de diferentes formas4. Desse modo, minha experiência de campo e as diversas mobilizações que vinham ocorrendo nos últimos anos apontavam para um “espalhamento da noção de direitos” (NOVAES; ALVIM, 2014), com o retorno às ruas de diversos movimentos e coletivos sociais de diversas matizes políticas e com variadas agendas de reivindicação.
Diante desse cenário, faz-se necessário realizar um esforço mais sistemático de interpretação a respeito das origens desse discurso recente em torno da reivindicação dos direitos de modo a analisar qual a noção de cidadania e, mais especificamente, de direito à cidade é mobilizada pelos jovens que têm protagonizado as manifestações políticas recentes.
Este artigo pretende contribuir nesse sentido. O intuito aqui é olhar para a emergência dessa nova cultura em torno dos direitos, que parece se reafirmar no Brasil atualmente, a partir da minha experiência de pesquisa nas periferias de São Paulo. Ao elaborar algumas reflexões a respeito do status da cidadania nas periferias urbanas, a temática do direito à cidade surge como central.
Parto, portanto, do pressuposto de que a noção de cidadania deve estar intrinsecamente ligada à experiência concreta dos movimentos sociais (DAGNINO, 1994) ou, de forma mais ampla, à experiência daqueles que lutam para conquistar e/ou consolidar seus direitos, destacando, com isso, a necessária articulação entre as dimensões da cultura e da política. Dessa forma, é preciso construir uma noção de direito à cidade que dialogue com a concretude das reivindicações políticas e das lutas sociais atualmente em curso de modo a analisar conjuntamente os processos de luta cultural e de luta política.
Para realizar tal esforço de interpretação, utilizo o material que colhi ao longo da já mencionada pesquisa de doutorado que realizei em dois distritos periféricos de São Paulo: Jardim Ângela, na zona sul da cidade, e Brasilândia, na zona norte. Nessas regiões, realizei, ao logo de um ano e meio, cerca de 80 entrevistas em profundidade a partir de um roteiro semiestruturado5, que foram gravadas e transcritas, além conversas informais e observações participantes em variados fóruns e espaços de participação política6.
Como recurso expositivo, minha experiência etnográfica no Jardim Ângela, junto à Paróquia e à Sociedade Santos Mártires e a outros atores locais terá maior destaque, uma vez que aquela região expressa de forma bastante eloquente a história de luta e organização política de parcela relevante dos moradores das periferias de São Paulo, justificando, assim, a abertura do texto com o evento sediado por essa organização7.
O texto que segue se divide em mais quatro partes além desta introdução. Na segunda seção, trato brevemente dos caminhos e características da cidadania no Brasil e procuro argumentar como a expansão dos direitos por aqui acabou por reproduzir, de diferentes formas, relações hierárquicas entre as pessoas, relegando uma parcela da população à condição de subcidadãos que tem seu “direito a ter direitos” negada frequentemente. Na terceira parte, argumento em favor do entendimento dos conceitos de cidadania e de direito à cidade como estratégia política, enfatizando, com isso, o caráter histórico desses conceitos e procurando articulá-los concretamente com as lutas políticas de cada momento histórico. Na quarta parte, apresento o conceito de direito à periferia como tentativa de articular as demandas por direito à igualdade com a reivindicação de um direito à diferença que advém de movimentos culturais e identitários que se fortalecem nas periferias atualmente. Por fim, reservo algumas linhas para tecer considerações finais.
OS TORTUOSOS CAMINHOS DA CIDADANIA NO BRASIL E A NEGAÇÃO DO “DIREITO A TER DIREITOS”
Ao tratar da temática da cidadania, a referência à obra de Marshall (1967) é inevitável. Ainda que se trate de uma leitura liberal e formalista da temática dos direitos, seu pioneirismo e o fato de ter construído uma tipologia e uma linha argumentativa bastante influentes justificam sua importância.
Por meio de um estudo histórico a respeito da conquista de direitos na Inglaterra, Marshall divide os direitos de cidadania em três grandes grupos: civis, políticos e sociais. Além disso, ele aponta que, naquele caso histórico concreto, houve um alcance progressivo, primeiramente de direitos civis, em seguida dos direitos políticos e, finalmente, dos direitos sociais, argumentando que a consolidação de uns serviu como base para a conquista dos demais.
José Murilo de Carvalho (2002) procurou aplicar esse modelo ao caso brasileiro de modo a apresentar suas especificidades. A constatação do autor é que aquela sequência construída por Marshall operou de maneira invertida no Brasil, uma vez que boa parte dos direitos sociais, como a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e a expansão desses direitos aos trabalhadores rurais, foram assegurados durante períodos não democráticos, quando boa parte dos direitos civis e políticos estavam suspensos. Dessa forma, a cidadania no Brasil apresentaria um percurso bastante peculiar, colocando um papel preponderante para sua consolidação no Estado e não na sociedade civil.
Diversas críticas podem ser levantadas a essa leitura de Carvalho. A principal delas se deve justamente à visão demasiadamente formalista dos direitos e a consequente desconsideração de importantes movimentos sociais que atuavam, mesmo em contextos ditatoriais, na reivindicação e conquista dos direitos políticos e sociais8.
Contudo, o objetivo aqui não é fazer essa discussão histórica detalhada a respeito da cidadania no Brasil, mas sim apontar para outro de seu aspecto central: a permanente exclusão formal e/ou prática de parcela expressiva da população do status de cidadão. Mesmo quando se trata de direitos minimamente consolidados parece sempre haver “pré-requisitos” que operam como uma espécie de barreira invisível para o acesso de toda população à cidadania plena.
Quem melhor expressou isso foi Wanderley Guilherme dos Santos (1979) ao elaborar o conceito de “cidadania regulada”. Analisando a forma como os direitos de cidadania foram constituídos a partir da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o autor apontou que a conquista do status de cidadão e do acesso a diversos direitos sociais, naquele contexto, não advinha da simples participação em uma comunidade política, mas dependia da inserção produtiva dos indivíduos em profissões previamente regulamentadas pelo Estado.
A ideia de uma “cidadania regulada” é definida, então, como “o conceito de cidadania cujas raízes encontram-se, não em um código de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional [...] definido por norma legal.” (SANTOS, 1979, p. 75). Dessa maneira, no período pré-constituição de 1988, a cidadania no Brasil estava “embutida na profissão” e os direitos dos cidadãos restringiam-se “aos direitos do lugar que ocupa[vam] no processo produtivo, tal como reconhecido por lei” (SANTOS, 1979, p.76). Três seriam, portanto, os parâmetros definidores da cidadania regulada: a regulamentação das profissões, a carteira profissional e o sindicato público, uma vez que estes seriam os requisitos necessários para que as pessoas pudessem acessar toda uma gama de direitos sociais.
Em suma, o acesso à dimensão social da cidadania (ROBERTS, 1997) trazia, como pré-requisito, a inserção formal no mercado de trabalho e em determinadas profissões, excluindo, por consequência, a maior parte da população desses direitos. Essa realidade de restrição do acesso a direitos não é exclusividade deste momento histórico. Desde o instituto da escravidão é possível observar, em diferentes períodos da história brasileira, o estabelecimento de determinadas pré-condições para que todos os brasileiros fossem considerados cidadãos plenos, mesmo se levarmos em conta os já restritos direitos então em voga. Tal padrão de exclusão vem sendo reproduzido de diferentes formas ao longo de nossa história. Como bem aponta Vera Telles (2001), não se trata propriamente de leis que não funcionam e que seriam “revogadas” pela própria realidade, mas sim da própria maneira como as leis são postas, criando hierarquias e reproduzindo desigualdades. Em outras palavras, é possível dizer que há, no Brasil, um “autoritarismo social” (DAGNINO, 1994), que organiza as relações sociais de forma hierárquica e desigual de modo a estabelecer diferentes categorias de pessoas, dispostas nos seus respectivos lugares na sociedade e cuja eliminação é fundamental para efetiva democratização da sociedade.
Essas contradições são especialmente visíveis quando nos debruçamos sobre a realidade das periferias urbanas no Brasil. Não são poucos os autores que têm apontado para os aspectos inacabados de nossa democracia (ZALUAR, 2007), para a fragmentação de nossa integração social (MACHADO DA SILVA, 2004), ou para os aspectos disjuntivos (HOLSTON; CALDEIRA, 1999) de nossa cidadania.
No caso específico do contexto urbano, um dos principais elementos apontados pela maior parte dos autores, sobretudo por aqueles que se debruçam sobre a temática da violência urbana, está na constante violação dos direitos civis dos moradores de favelas e periferias das cidades brasileiras, tanto por parte do “mundo do crime”, quanto do próprio Estado, por meio das forças policiais.
A essas violações sobrepõem-se diversas outras, como a permanente desigualdade social, a precariedade dos serviços públicos ou a desconsideração da opinião daqueles que habitam as margens da cidade tida muitas vezes como politicamente menos relevante por políticos ou pela “opinião pública” de forma mais ampla. Desse modo, uma parte expressiva da população, em especial a parcela negra, pobre e periférica, segue tendo seu “direito a ter direitos” negada cotidianamente9.
Conforme argumenta Hannah Arendt (1989), a existência do “direito a ter direitos” significa fundamentalmente que os indivíduos vivam em uma estrutura onde são julgados por suas ações e opiniões e possuem o direito de pertencer a algum tipo de comunidade organizada. O contrário disso, ou seja, a negação de direitos humanos fundamentais, estaria manifestada na “privação de um lugar no mundo que torne a opinião significativa e a ação eficaz” (ARENDT, 1989, p. 330). Nessa situação em que privilégios (em alguns casos) e injustiças (na maioria das vezes) independem das ações concretas dos sujeitos, estes perdem mais do que a liberdade, perdem o status de pessoa e até mesmo a possibilidade de lutar pela liberdade, uma vez que se tornam subcidadãos.
Essa situação de negação do pertencimento básico à comunidade em que nasceram, que no caso em análise por Arendt estava relacionada aos povos apátridas e refugiados, está intimamente ligada, no caso aqui em questão, à desigualdade socioeconômica e à estrutura de segregação residencial de nosso espaço urbano que dificultam contatos mais permanentes entre as classes sociais, inibem a troca de noções de civilidade10, a construção de empatias e exclui a maior parte da população de uma série de direitos e bens de consumo coletivo - tais como saúde, educação, transporte etc. -, além de dificultar o acesso a bens de ordem privada - como postos de trabalho de qualidade. A forma como nossas cidades estão organizadas, “tem funcionado como um importante limitador do pleno uso popular do potencial político inerente aos regimes democráticos”, tornando-se uma causa importante da reprodução e até do aprofundamento da desigualdade social (BURGOS, 2005, p. 191).
Em suma, a separação da cidade entre centro e periferia é ainda um fenômeno bastante relevante para explicar a dificuldade de acesso de parcela expressiva da população a alguns direitos fundamentais, como os direitos civis que são desrespeitados pela atuação da polícia e do “mundo do crime” nas periferias, os direitos políticos, muitas vezes limitados ao voto periódico e os direitos sociais com alcance ainda bastante limitado nesses territórios.
CIDADANIA E DIREITO À CIDADE COMO ESTRATÉGIA POLÍTICA
Diante do que foi até aqui exposto e tendo em vista que a cidadania e a conquista de direitos no Brasil é, por vezes, expressa por meio da reafirmação de desigualdades, faz-se necessário compreender a cidadania como “estratégia política” (DAGNINO, 1994), enfatizando seu caráter histórico e a contínua transformação de seu conteúdo e das formas de luta por sua conquista, a partir dos interesses em jogo e práticas de luta. Em outras palavras, o conteúdo, o significado e os meios para alcançar os direitos vinculados à ideia de cidadania - e no caso específico deste artigo, do direito à cidade - não são universais nem definidos previamente, mas devem estar em diálogo com os conflitos sociais vividos em cada momento histórico de acordo com a luta política que se trava naquele contexto.
Nesse sentido, a luta pela cidadania deve ser entendida não apenas pela ótica da incorporação ao sistema político no seu sentido estrito ou pela conquista formal de algum direito, mas também enquanto uma busca pela construção de novas formas de sociabilidade, a partir de um desenho mais igualitário das relações sociais em todos os seus níveis (DAGNINO, 1994).
Dessa maneira, a questão central proposta aqui está em pensar como a noção de direito à cidade dialoga concreta e historicamente com as lutas por cidadania entre os moradores das periferias paulistanas e como podemos atualizá-lo a partir das práticas e reivindicações que têm emergido contemporaneamente nesses territórios. Afinal, a realidade concreta dos moradores das periferias urbanas só pode ser entendida se vista também por meio de seu viés simbólico e valorativo, atribuído pela experiência daqueles que sofrem as opressões e que têm seus direitos negados cotidianamente. É preciso, portanto, conectar o conceito de direito à cidade com os problemas públicos (public issues) (CEFAÏ, 2017) que são postos em cada momento histórico e das gerações11 que são cristalizadas por esses processos. Retorno, então, ao debate que assisti no Jardim Ângela em maio de 2016 justamente a respeito do “direito à cidade”, mencionado na parte introdutória deste texto.
A abertura dos debates foi feita com uma fala do Padre Jaime, pároco da região e que acompanha, apoia e organiza os movimentos políticos e sociais das periferias desde os anos 1980. Em sua breve colocação, Jaime contou uma anedota em que dizia mais ou menos o seguinte: “Se perguntarmos à Dona Maria, que está agora no ponto de ônibus aqui da frente pra onde ela está indo, a resposta dela será ‘vou para a cidade’. Isso significa que para ela, a cidade não está aqui, a cidade fica pra lá da ponte.” Assim, o padre conclui que, na perspectiva desses moradores, ter direito à cidade significa “trazer a cidade para mais perto das pessoas”, ou seja, garantir a infraestrutura urbana e os serviços públicos próximos de onde elas moram.
As periferias de São Paulo foram formadas ao longo do período que Caldeira (2000) classifica como sendo um segundo padrão de segregação residencial, que perdurou sobretudo entre as décadas de 1940 e 1980 e foi caracterizado pelas grandes distâncias que apartavam os habitantes mais ricos do centro dos mais pobres, moradores das precárias periferias. A partir do Plano de Avenidas desenvolvido pelo engenheiro Francisco Prestes Maia, estruturou-se um modelo de desenvolvimento urbano radial e concêntrico responsável, em grande medida, pela atual estrutura de segregação residencial que assistimos na capital paulista12. O Plano de Prestes Maia que previa a construção de novas avenidas principalmente sobre os leitos de rios canalizados possibilitou o estabelecimento de amplas conexões rodoviárias entre a região central da cidade, onde estavam a maioria dos postos de trabalho, e as periferias, onde foram progressivamente se instalando aqueles que buscam “melhorar de vida” em São Paulo.
Com isso, o rápido crescimento populacional do período foi sendo absorvido por essas regiões periféricas onde praticamente inexistia infraestrutura básica como serviços de água, luz, esgotamento sanitário, calçamento, transporte coletivo etc. Desse modo, para boa parte dos moradores das periferias paulistanas, em especial aqueles membros da primeira geração que se mudaram para essas regiões nas décadas de 1960, 1970 e 1980, “a cidade” funcionava como uma categoria nativa que representava a região central de São Paulo.
O uso da cidade que essas pessoas historicamente praticaram desde que firmaram residência nas regiões periféricas de São Paulo, ao se deslocarem cotidianamente para as regiões centrais onde estava localizada a maioria dos postos de trabalho e os serviços públicos, revelava-lhes um nítido contraste em termos de paisagem urbana. Assim, “trazer a cidade para mais perto”, como disse Padre Jaime, significava garantir “toda uma série de benefícios urbanos” (FONTES, 2008, p.48), nas proximidades de onde viviam, para que pudessem desfrutar dessa urbanidade, até então ausente em seus bairros.
Desse modo, o afastamento das classes populares para longe do centro da metrópole fez com que essas pessoas perdessem o “sentido da obra”, por meio desse distanciamento entre “bairro” e “cidade”, de modo a criar uma “periferia desurbanizada”, mas dependente da cidade (LEFEBVRE, 1991). Assim, para alcançar o direito à cidade, seria preciso superar essa condição de separação e afastamento social, a fim de garantir a todas as classes o direito “à vida urbana, à centralidade renovada, aos locais de encontro e de trocas, aos ritmos da vida e empregos de tempo que permitem o uso pleno e inteiro desses momentos e locais”, conforme aponta a leitura pioneira de Lefebvre (1991, p. 143) sobre o tema.
Essa visão sobre direito à cidade exposta de forma didática pelo Padre Jaime, e que em alguma medida se encontra presente na leitura lefebvriana, serviu de base para a reivindicação de acesso a bens e direitos que estavam associados ao “progresso” da cidade. É nesse período que Padre Jaime, nascido na Irlanda, chega ao Brasil. Sob forte influência das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), diversos movimentos de bairro passaram a se organizar e reivindicar direitos sociais ausentes nas periferias.
A partir de leituras bíblicas embasadas na teologia da libertação, uma forma de organização horizontal que dividia o protagonismo da celebração religiosa com “o povo” e com o explícito objetivo de “manter uma trama de relações humanas fraternas e solidárias” (CAMARGO; SOUZA; PIERUCCI, 1980, p. 69), as CEBs estiveram na base de um intenso processo de politização do cotidiano das classes populares que habitavam as periferias urbanas naquele período (SADER, 1988). Com isso, os problemas mais graves das periferias, como a falta de saneamento, iluminação, segurança, calçamento, creches, postos de saúde, entre outros, passaram, pouco a pouco, a ser percebidos como problemas que afetavam toda a comunidade e não apenas suas vidas privadas.
A conscientização dos problemas do bairro e da importância de lutar para conquistar melhores condições de vida produziu, nos membros das Comunidade Eclesiais, uma forte atitude crítica e uma disposição, inédita até então entre as classes populares que habitavam as periferias urbanas, em reivindicar seus direitos. Desse modo, as atividades internas das CEBs, centradas na reflexão ou na resolução dos problemas da própria comunidade, por meio de creches comunitárias, doações, mutirões para limpeza ou construção de centros comunitários, foram dando lugar a ações “para fora”, de reivindicação junto aos poderes públicos (SADER, 1988, p. 207).
Assim, se em um primeiro momento consolidou-se uma consciência de que os problemas antes tidos como privados e naturais eram, na verdade, problemas sociais compartilhados por diversas famílias e que poderiam ser amenizados com o apoio mútuo; em um segundo momento, passou-se a perceber que esses problemas eram fruto de direitos que lhes eram negados e que poderiam ser alterados a partir da luta política coletiva. Com isso, a concepção de direito à cidade produzida nessas lutas das décadas de 1970 e 1980 aproxima-se da reivindicação pelo acesso a bens de consumo coletivo associados à reprodução da força de trabalho mostram sua relevância.
De acordo com a formulação de Castells (2009), a cidade é um espaço fundamentalmente de reprodução da força de trabalho e, desse modo, as políticas públicas que poderiam funcionar como “salário indireto” para os trabalhadores, teriam papel crucial nesse processo. Desse modo, o conceito de direito à cidade que emerge das lutas políticas e sociais daquele período acaba por se aproximar da dimensão social da cidadania13.
Havia, contudo, na emergência desses movimentos, uma dimensão mais ampla de construção da democracia e de sua extensão e aprofundamento. Assim, com a redemocratização do país e a abertura de canais de participação política, observa-se um processo de institucionalização dos movimentos sociais nas décadas de 1990 e 2000, quando se consolidou uma segunda geração de moradores das periferias. É o que ocorre com os movimentos originados nas Comunidades Eclesiais de Base nas periferias de São Paulo.
É deste processo que surge a Sociedade Santos Mártires, vinculada diretamente à Paróquia de mesmo nome e coordenada pelo Padre Jaime, no Jardim Ângela. A atuação da Santos Mártires nos projetos sociais é contada por muitos de seus militantes como um prolongamento das ações que as CEBs desenvolviam até o fim dos anos 1980. A partir da redemocratização do país e com a chegada ao governo municipal de governos progressistas, diversos movimentos e organizações surgidas no seio das Comunidades de Base passaram a atuar em parceria e diálogo com o poder público, sobretudo no nível municipal.
A Sociedade Santos Mártires constituiu-se nesse período como uma associação civil sem fins lucrativos e passou a atuar não apenas na mobilização dos moradores da região, mas também na construção e gestão de projetos e serviços públicos em parceria com o Estado, sobretudo na gestão de convênios com a prefeitura, mas também incentivando e articulando a participação de seus membros nos diversos canais de consulta e fiscalização das atividades do Estado.
A luta por mais e melhores serviços públicos nas periferias da cidade seguiram presente, mas, ao seu lado, ampliaram-se as reivindicações em torno da garantia e efetivação de espaços de participação política por meio dos quais a população pudesse influenciar permanentemente nos rumos das políticas e dos serviços públicos e não apenas em sua conquista. Assim, para além da reivindicação de serviços públicos e de infraestrutura urbana presente nas concepções anteriores, tratava-se, agora, de demandar novos direitos políticos de participação popular que permitiriam ampliar a influência das classes populares sobre os rumos das políticas públicas e na efetivação de direitos sociais.
Nesse contexto, o direito à cidade para essa segunda geração não aparece mais apenas como um direito condicional de acesso àquilo que já existe, mas, sobretudo como um direito ativo e coletivo, e, portanto, político, de fazer a cidade diferente e de formá-la de acordo com nossos desejos e necessidades, na linha em que argumenta Harvey (2009). Nesse sentido, o “direito à cidade” poderia ser entendido como “o direito de mudar a cidade mais de acordo com o desejo de nossos corações” ou como “o direito de mudar a nós mesmos pela mudança da cidade” (HARVEY, 2012, p. 74).
Como dito no início do texto, é nítido um envelhecimento dos que participam desses espaços de deliberação e influência sobre os rumos políticos da cidade. Paralelamente, têm crescido um diagnóstico, entre militantes históricos das periferias de São Paulo e que há décadas ocupam de forma ativa e combativa essas esferas públicas a respeito de um esgotamento das possibilidades em termos de conquistas de direitos que esses espaços poderiam oferecer.
É neste contexto que as manifestações de junho de 2013 adquirem centralidade para a formação e consolidação de uma terceira geração de moradores das periferias urbanas no que se refere ao ativismo político. Ao mesmo tempo em que os protestos de junho de 2013 trouxeram à tona diversas questões associadas aos problemas urbanos e, desse modo, colocaram a temática do direito à cidade no centro da agenda política do país, eles expuseram de forma latente a necessidade de renovação das formas e conteúdos da luta pela cidadania no espaço urbano.
Os acontecimentos que tomaram o Brasil naquele mês tiveram início a partir de uma convocação do Movimento Passe Livre (MPL) que reivindica o “direito à cidade” por meio do direito à mobilidade urbana gratuita14. As primeiras manifestações se opunham ao aumento da passagem de ônibus de R$ 3,00 para R$ 3,20 em São Paulo e no Rio de Janeiro e ganharam grandes proporções, inclusive em nível nacional, após a forte repressão policial contra a manifestação do dia 13 de junho, ocorrida no centro da capital paulista.
Dessa forma, as manifestações de junho de 2013 traziam à tona, de imediato, três questões que até então recebiam pouca atenção do debate público e que dialogam diretamente com questões urbanas, em especial com as periferias da cidade: a mobilidade urbana, a violência policial e o direito à participação política nas decisões ligadas à vida na cidade, aspectos centrais para despertar a identificação e o desejo de participação nas decisões políticas.
Diante desse cenário, não foram poucos os autores e os próprios movimentos sociais que buscaram associar as reivindicações ali presentes à ideia de direito à cidade. É o caso de Maricato (2013), que destaca a centralidade das cidades na melhoria da qualidade de vida das pessoas, para além dos ganhos monetários de renda. Para ela,
as cidades são o principal local onde se dá a reprodução da força de trabalho. [Por isso,] nem toda melhoria das condições de vida é acessível com melhores salários ou com melhor distribuição de renda. [...] a cidade não fornece apenas o lugar, o suporte ou o chão para essa reprodução social. Suas características, e até mesmo a forma como se realizam, fazem a diferença. (pp.19-20).
No mesmo sentido, Rolnik (2013), argumenta que não se compra o direito à cidade em concessionárias de automóveis e no Feirão da Caixa: o aumento da renda que possibilita o crescimento do consumo não resolve nem o problema da falta de urbanidade nem a precariedade dos serviços públicos de educação e saúde, muito menos a inexistência total de sistemas integrados eficientes e acessíveis de transporte ou a enorme fragmentação representada pela dualidade da nossa condição urbana. (p.9)
Essas leituras, embora pertinentes e em diálogo com o que estava em pauta naquela ocasião, capturaram apenas aspectos parciais daquelas mobilizações. Mais do que isso, do ponto de vista dos sujeitos que habitam as periferias da cidade e lutam pela conquista da cidadania, pensar o direito à cidade atualmente não se limita ao acesso a melhores condições de transporte ou mesmo aos aspectos ligados à reprodução da força de trabalho, como essa leitura baseada no histórico de luta dos movimentos sociais urbanos parece indicar. Afinal, a negação da cidadania aos moradores das periferias urbanas está relacionada a aspectos muito mais amplos, incluindo seu status fundamental de cidadão, enquanto portador do “direito a ter direitos”, como argumentado acima.
Além disso, é preciso lembrar que, entre as condições materiais de vida e a ação social dos grupos que reivindicam direitos de cidadania, há todo um “processo de produção de experiências” que não está dado pelas condições materiais objetivas (KOWARICK, 1991, p. 3). Sendo assim, não basta apontar a carência estrutural de um direito para afirmar que esta é a base de uma reivindicação, afinal, elementos como justiça, dignidade, carência, moralidade são questões produzidas historicamente e não automaticamente dados pela realidade material.
É preciso, portanto, pensar um conceito atualizado de direito à cidade que dialogue com as demandas e anseios dos movimento e coletivos que têm emergido nas periferias urbanas contemporaneamente e que dialogue com a estratégia política dos sujeitos que atualmente se mobilizam em torno dessa luta.
DO DIREITO À CIDADE AO DIREITO À PERIFERIA
Como dito, analisar em detalhes as manifestações de junho de 2013 fugiria do escopo proposto por este trabalho. Cumpre apenas dizer que elas serão entendidas aqui como um “acontecimento” que “cristalizou” uma nova geração política (NUNES, 2014). Desse modo, mais do que nos prolongarmos sobre aquele momento específico, é preciso compreender qual o conceito de cidadania e de direito à cidade que essa geração, cristalizada naquela ocasião, traz consigo, em especial aqueles que olhar para a cidade de uma perspectiva periférica.
Dessa forma, a relevância de junho de 2013 para o tema aqui em questão está tanto na explicitação das fissuras existentes nas formas de participação política tradicionais quanto por possibilitar que diversos jovens tivessem suas primeiras experiências de participação política mais efetiva, o que lhes proporcionou uma oportunidade inédita de politização e de expressarem seus anseios. Como apontam Bringel e Pleyers (2015, p.11), as manifestações de junho produziram “‘marcas’ nos participantes, reforçando a propensão a que possam se engajar politicamente no futuro e podendo, ademais, transformar, no médio e longo prazo, suas identidades sociais e seus valores políticos” 15.
De outro lado, do ponto de vista coletivo, aquelas manifestações acabaram mostrando para esses jovens das periferias a possibilidade de recorrer a outras táticas de luta e reivindicação política, alternativos à via negocial dos canais de participação institucionalizados, típicas das gerações anteriores e que para eles sempre pareceu pouco atrativa e ineficiente.
Nesse sentido, o momento político pelo qual passa o Brasil atualmente é prenhe de significados. Para além das frustrações econômicas com os limites e com os retrocessos na mobilidade social que foi vivenciada pelas classes populares no Brasil ao longo da última década e das frustrações com os tradicionais canais de participação política (FONTES, 2018b), é latente a ameaça a uma série de direitos que até então pareciam consolidados. Desse modo, as crises política, econômica e social parecem se sobrepor de modo a produzir uma crise que não é apenas de representação política, mas também de formas e conteúdos das lutas políticas e sociais.
Trata-se, portanto, de um momento de interrogarmos menos a arte de governar e suas condições institucionais e nos debruçarmos mais sobre a constituição de uma “sociabilidade política democrática na experiência histórica, coletiva, da sociedade brasileira”, o que não significa deixar de lado o entendimento do funcionamento do poder do Estado, mas “interroga-lo a partir das formas de cultura e dos universos simbólicos que perpassam a sociedade” (PAOLI, 1989, p. 40).
Entender a questão da cidadania e do direito à cidade enquanto uma luta pelo “direito a ter direitos” não se limita, portanto, a analisar as conquistas legais ou o acesso a direitos previamente definidos, nem mesmo à implementação efetiva de direitos abstratos e formais. Trata-se de incluir a invenção e a criação de novos direitos que emergem de lutas específicas e da sua pratica concreta (DAGNINO, 1994). Retorno, então, ao evento que discutiu a questão do direito à cidade na Paróquia Santos Mártires, mencionado no início deste texto com o intuito de buscar algumas pistas a respeito de como esse conceito pode ser entendido a partir da estratégia política daqueles que atualmente se mobilizam politicamente nas periferias de São Paulo. Dentre as vozes que se expressaram naquela roda de conversa, duas me chamaram especial atenção por defenderem uma concepção de direito à cidade diferente do que tradicionalmente se entende pelo conceito e destoante de boa parte das vozes ali presentes.
O primeiro deles, vinda de uma educadora da região, argumentava que, ao invés de falar em direito à cidade, deveríamos falar em “direito da periferia dentro da cidade”, ressaltando a importância da perspectiva periférica que se deve atribuir à ideia. De forma complementar, um militante do movimento negro afirmou que, ao falarmos em ter direito à cidade, estaríamos trazendo implicitamente a noção de que queremos ter acesso à “cidade deles” e em seguida questionou: “a gente quer ter direito a essa cidade ou a gente quer construir a nossa?”.
Essas falas dialogam diretamente com o que tenho observado nas periferias de São Paulo em termos de conteúdo político e das formas de mobilização coletiva que emergem atualmente. Desde pelo menos o início dos 1990, e com mais força nas duas últimas décadas, têm crescido de forma expressiva a quantidade de coletivos artísticos que surgiram nos bairros periféricos de São Paulo, em grande medida, sob influência do movimento hip-hop.
Como bem aponta D’Andrea (2013, p.16), “estes coletivos exaltam o orgulho periférico do mesmo modo que são fenômenos decorrentes desse orgulho”. O movimento hip-hop, em especial por meio das letras e canções de rap, esboçou, ao longo das últimas décadas, uma crítica profunda e contundente à realidade social a que os moradores dessas regiões estavam submetidos.
Os problemas sociais como a violência policial, a violência do “mundo do crime”, o desemprego, a segregação residencial, a ausência de infraestrutura urbana, de espaços de lazer, e a ausência de reconhecimento social constituem uma experiência comum entre os jovens periféricos que passam, então, a compartilhar os elementos culturais associados ao hip-hop, fortalecendo “uma ideia de pertencimento e identidade”. A periferia passa progressivamente de signo de estigmatização a elemento identitário, constituindo-se como um “espaço social e geográfico que gera um denominador comum para jovens negros, mestiços, nordestinos e brancos: a classe pobre” (MACEDO, 2014, p. 9).
Dessa maneira, além de oferecer elementos para a crítica da situação social e de conscientização com relação aos processos experienciados e da construção identitária em torno da periferia, o hip-hop desempenhou também um importante papel na elevação da autoestima dos moradores dessas regiões.
Mais recentemente, outro movimento cultural tem contribuído com o fortalecimento desse orgulho de ser da periferia e de atuar politicamente em suas próprias regiões de origem. Falo da autodenominada “literatura marginal”, que se consolida a partir da organização da edição especial da revista Caros Amigos, em 2001, que tinha como título “Caros Amigos/Literatura Marginal: a cultura da periferia”. De acordo com Nascimento (2011, p. 9), por traz dessa articulação haveria
um projeto intelectual comum de dar voz ao seu grupo social de origem, através de relatos dos problemas que os acomete em textos literários. Além de procurar dar novos significados à ideia de periferia por meio da valorização do que seria a cultura singular de tal espaço e de intervenções pragmáticas que visam estimular a produção, o consumo e a circulação de bens culturais.
No seio do crescimento da produção cultural das periferias e derivada do movimento da “literatura marginal”, os saraus de poesia aparecem, conforme o relato de muitos jovens que têm se engajado politicamente, inclusive nas manifestações de 2013 e nas ocupações de escolas públicas em 2015 e 2016, como experiência mais marcante em seus processos de formação pessoal e coletiva.
“A lógica básica do hip-hop tanto quanto da literatura marginal é diretamente identitária”, o que “requer e produz espaço” (PARDUE, 2017, p. 165). Dessa forma, o sarau pode ser visto como um desenvolvimento “sócio-geográfico” da empreitada dos hip-hoppers, que “têm mudado a geografia cultural de São Paulo” (PARDUE, 2017, p. 165).
A proximidade dos saraus com o rap fica ainda mais evidente quando se observam as semelhanças em muitas declamações de textos construídos em sintonia com as letras de rap e declamados com as rimas e os gestos corporais típicos de rappers. Do mesmo modo, “a conformação de um ‘ser periférico’ ressignificado também se articula nas poesias que circulam nos saraus por meio da conformação de um sujeito lírico como representante de um coletivo que tem o mesmo inimigo” (TENNINA, 2013, p.17).
Os saraus de poesia não são, em São Paulo, um fenômeno exclusivo das periferias, uma vez que diversos eventos do tipo são organizados em regiões centrais da cidade e com um público formado pelas mais diversas classes sociais. De toda forma, sua presença nas periferias é marcante e, por isso, os saraus devem ser entendidos como um fenômeno sintomático da “efervescência cultural que vem modificando as representações sobre os espaços sociais que margeiam centros geográficos e simbólicos” (NASCIMENTO, 2011, p.110). Além disso, os interlocutores com quem conversei ao longo da minha pesquisa de campo, e que fazem parte dos coletivos culturais que organizam ou participam de saraus na periferia, fazem questão de frisar o caráter periférico - ou “de quebrada” de seus saraus.
A “quebrada” funciona atualmente como uma categoria nativa que trata de localizar os sujeitos “numa rede bem concreta de pertencimentos e, ao mesmo tempo, como participante de uma condição geral de vida” (MAGNANI, 2006, p. 39). Com isso, busca-se apontar para uma “rede de relações particularizadas”, mas também para uma universalização da experiência daqueles que vivem nas periferias (PEREIRA, 2010), em que se ressalta principalmente a capacidade de superação de condições adversas e a valorização de uma determinada estética.
Independente das diferenças nos formatos que cada sarau adota, o clima, em geral, é de grande proximidade. Trata-se de um espaço essencialmente de criação de laços, de sociabilidade e, claro, de formação cultural e política. É comum, nos saraus, como em qualquer festa, as pessoas conversarem e até compartilharem a mesa com pessoas desconhecidas, fazerem novas amizades e construírem novas relações. Foi também Karina, mencionada anteriormente, que me chamou atenção para esse aspecto do sarau enquanto espaço de sociabilidade por excelência:
É meio aquele lance de as pessoas saírem de casa pra ter contato com outras, que na minha geração a gente fazia isso na Igreja. E essa geração tem um espaço que é muito mais bacana que eu acho que são os saraus. Então, o sarau acolhe a molecada do rap, que com música e rima eles conseguem refletir sobre questões políticas que são fundamentais. Tem aquele lance da poesia, que é isso de você sair dessa coisa concreta, em que ao mesmo tempo que você faz aquela movimentação com as palavras você tá fazendo isso com seu olhar, que eu acho que também ajuda muito. E tem o fato de as pessoas poderem estar em contato em um lugar que é alegre, sabe? Desenvolver vínculo mesmo, porque eu acho que você só começa a se importar com o meio quando você desenvolve vínculo, com as pessoas e com o lugar. É aquela noção de pertencimento, né? Acho que os saraus fazem isso de uma forma muito bacana. (Karina, 36 anos, Jardim Ângela, depoimento ao autor, 2016).
Desse modo, na confluência entre a tradição literária marginal e o hip-hop, representada pelos saraus de poesia, emerge uma cultura periférica, consolidada e expandida pelos movimentos culturais das periferias. Chamo essa manifestação cultural de cultura periférica, seguindo Nascimento (2011), não porque ela seja capaz de representar toda a diversidade cultural das cada vez mais heterogêneas periferias de São Paulo. Tampouco quero defender que ela seja mais “verdadeira” ou “autêntica” do que qualquer outra. A alcunha se deve ao fato de ela se reivindicar como tal, isto é, como sendo representante de um modo de vida próprio da periferia, o que abarca comportamentos, valores, práticas, linguajares, modos de se vestir, visões de mundo, colocando-se em luta com a “cultura dominante”.
Compreendo, então, a cultura periférica de forma semelhante a que Stuart Hall (2003) conceitua a “cultura popular”, isto é, sem a preocupação de encontrar seu “sentido puro”, uma vez que se trata, na realidade, do “terreno sobre o qual as transformações são operadas”. É necessário, portanto, compreender a conformação dessa cultura dentro da “dialética da luta cultural” entre a cultura dominante e as formas de resistência que a cultura periférica apresenta. Desse modo, o foco da análise deve estar no processo pelo qual as relações de dominação e subordinação são articuladas: “o processo pelo qual algumas coisas são ativamente preferidas para que outras possam ser destronadas”. Em outras palavras, ao analisar a cultura periférica, o foco deve estar na “relação entre cultura e as questões de hegemonia” (HALL, 2003, pp. 248-258).
A ideia de uma cultura periférica procura trazer para “o centro do debate público sujeitos políticos que se colocam como portadores de demandas dos moradores da periferia num contexto amplo de luta por direitos sociais e de afirmação da particularidade de suas produções culturais” (NASCIMENTO, 2011, p.162). Em outras palavras, trata-se de um esforço para transformar os problemas típicos das periferias urbanas em problemas públicos.
Como aponta Cefaï (2009, p. 27), a descoberta de “pontos comuns” a e “constituição de uma linguagem comum, na enunciação de repertórios de identidade coletiva e na confecção de modos de engajamento público”, são elementos essenciais para converter disputas privadas e mal-estares pessoais em causas coletivas e, assim, construir um “problema público”. Afinal, esta construção do que é algo que deve ser publicamente debatido enquanto problema da sociedade “não ocorre no vazio, mas é formado por precedentes e encontra suas marcas numa “cultura pública” em que se sedimentam respostas a problematizações anteriores” (CEFAÏ, 2017, p. 193).
É com base nessa cultura pública, portanto, partilhada por um número crescente de jovens periféricos, que eles passam a tomar partido, definir seus lugares nas lutas políticas e adotar determinadas formas e expressão que buscam não mais apenas acessar os direitos ligados à cidade, mas também reivindicar a construção de uma “cidade” própria, a partir da valorização de um modo de vida próprio das periferias. Como disse um dos participantes do debate no Jardim Ângela, mencionado acima, mais do que ter acesso à “cidade deles”, o que esses novos sujeitos políticos que buscam se articular nas periferias de São Paulo recentemente têm apontado é a necessidade de construir uma cidade que seja “nossa”.
Abrir espaço para a construção de uma cidade “nossa”, nos obriga a reconhecer a existência de um vínculo intrínseco entre a reivindicação por igualdade, na luta pela conquista de direitos negados aos moradores das periferias, e luta por um direito à diferença.
Assim, se o direito à cidade tem como elemento central a “individualização na socialização” (LEFEBVRE, 1991), é preciso compreender a integração social para além da pura formalidade, algo que surgiria automaticamente do simples oferecimento de oportunidades políticas ou econômicas e que obriga os “novos integrados” a uma assimilação cultural à realidade a qual se integram. É preciso que esse processo integrativo ofereça espaço para a identidade e para diferença dos grupos sem que isso signifique isolamento ou hostilidade (LEFEBVRE, 2003).
É justamente nesse sentido que apontam as demandas dessa nova geração de sujeitos políticos que buscam se organizar atualmente nas periferias de São Paulo. Ao mesmo tempo em que buscam uma integração política, econômica e social e querem ter acesso a novos direitos, o querem sem precisar abrir mão de suas diferenças. Buscam, assim, na contramão de toda a história da cidadania brasileira, estabelecer uma cidadania sem pré-requisitos, isto é, que não estabeleça, ainda que de modo tácito, distinções hierárquicas entre cidadãos que não estejam descumprindo a lei16. Uma cidadania em que para ter seus direitos civis respeitados, por agentes privados ou estatais, não seja necessário deixar de se vestir como gostam pelo simples fato de serem “roupas de bandido”, ou que precisem esconder traços ou características de sua ascendência étnico-racial para serem aceitos nos padrões estéticos estabelecidos, ou que para terem suas opiniões e vontades políticas respeitadas precisem primeiro se tornar alguém de “classe média”.
A diferença, no Brasil, apareceu historicamente como (re)afirmação de privilégios e, portanto, como reforço da desigualdade. Contudo, a demanda atual articulada por esses movimentos que atuam no espaço urbano a partir de uma perspectiva periférica coloca a diferença enquanto reivindicação, precisamente na medida em que ela determina desigualdade. Assim, é a partir da defesa de um direito à diferença que as lutas pela cidadania se estabelecem. A afirmação da diferença aparece conectada com a reivindicação de que ela possa simplesmente existir como tal sem que tenha como consequência o tratamento desigual ou a discriminação (DAGNINO, 1994).
Assim, ao lado e em complemento à ideia de direito à cidade o que esses sujeitos parecem reivindicar é um direito à periferia. Um direito a serem quem são do ponto de vista de suas histórias e do modo de vida que consideram típico das periferias, representado por um imaginário de relações de proximidade e reciprocidade que marcaram a constituição dessas regiões e, desse modo, oposto em muitos aspectos ao modo de vida individualista da cidade capitalista.
A ideia de um direito à periferia busca, portanto, consolidar dois elementos que são centrais na mobilização política e social dessa nova geração de sujeitos políticos que buscam entrar em cena atualmente e que são duas faces de uma mesma moeda. De um lado, a “luta cultural” (Hall, 2003b) pela afirmação de um modo de vida próprio e, de outro, a reivindicação do “direito a ter direitos”, de ser parte de uma comunidade política de forma plena, sem precisar deixar de ser pobre, negro, favelado, periférico. Não se trata, portanto, de um abandono da luta pelos direitos civis, sociais e políticos que marcou a história das lutas políticas nas periferias da cidade. Mas de garantir que a conquista desses direitos ocorra mediante o respeito à diferença, de modo que as particularidades não se dissolvam em uma universal abstrato e vazio de significados históricos e sociais para esses sujeitos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procurei argumentar, ao longo deste texto, que a cidadania no Brasil foi historicamente estruturada de forma a negar o “direito a ter direitos” de parcela expressiva da população. Nas periferias urbanas, essa negação aparece sob a violação de direitos civis, a carência de direitos sociais e na desconsideração das opiniões políticas dos que habitam essas regiões.
A partir dessa permanente exclusão do status de cidadãos plenos, argumentei que a cidadania e o direito à cidade devem ser compreendidos como estratégia política, com o objetivo de ressaltar o caráter histórico desses conceitos e suas relações com as lutas políticas de cada momento. Desse modo, procurei analisar as mudanças pelas quais o conceito de direito à cidade passou de forma a apontar as conexões entre leituras teóricas e as experiências concretas de luta historicamente travadas por movimentos sociais das periferias urbanas.
O direito à cidade, entendido na chave do “direito a ter direitos”, aponta para além da conquista formal ou do acesso a direitos previamente definidos. Ele traz, como tema fundamental, a possibilidade de invenção ou criação de novos direitos e o reconhecimento do direito a ser visto e respeitado sem que haja qualquer tipo de pré-condição para isso.
No atual contexto em que movimentos culturais e identitários ganham força nas periferias urbanas, o direito à diferença emerge como tema central e complementar ao direito à igualdade historicamente reivindicado nessas regiões. Dessa maneira, trago a ideia de direito à periferia como categoria capaz de articular e reconhecer “a existência de um vínculo intrínseco entre a igualdade e a diferença” (DAGNINO, 1994). Trata-se de reconhecer uma luta que é, ao mesmo tempo, pelo acesso aos direitos associados à vida urbana, mas também pelo direito de ser reconhecido e respeitado como cidadão pleno em seu território e em seu modo de vida e que coloca a luta política e luta cultural em uma relação indissociável.
Encero este texto com a fala de um de meus interlocutores na Brasilândia, que resume bem essa reivindicação pelo direito à diferença como dimensão inseparável da luta por igualdade ou pelo direito à periferia como parte fundamental do direito à cidade. O rapaz em questão, um jovem de 18 anos que participava das ocupações de escolas públicas no fim 2015 e que, como tantos outros, fazia parte de alguns coletivos culturais e tinha feito seu debate político em junho de 201317. Ele se queixava justamente do fato de que movimentos sociais consolidados organizavam atos e manifestações políticas apenas na região central da cidade. Assim, ele resumiu sua indignação da seguinte forma: “Tudo [acontece] no centro, sabe, tudo, tudo, porque só lá vai ser visto. Beleza, mas eu quero ser visto aqui. [Então], vou ficar aqui!”.
A frase “mas eu quero ser visto aqui” não poderia ser mais significativa. Para ele, sua cidadania só será plenamente reconhecida - cidadania essa representada pela lógica do “ser visto” e, portanto, ser reconhecido como alguém que merece ter suas demandas ouvidas - quando ele for visto em sua própria condição de morador da periferia e na periferia. A ideia de “ser visto” sem ter que sair das periferias mobiliza, assim, a lógica do “direito a ter direitos”.
Como aponta Dayrell (2002, p. 144), esses jovens “querem ser reconhecidos, querem uma visibilidade, querem ser alguém num contexto que os torna invisíveis, ninguém na multidão. Querem ter um lugar na cidade, usufruir dela, transformando o espaço urbano em um valor de uso.” Acrescentaria, ainda, que eles querem ser vistos sem precisar se deslocar para o centro da cidade, uma vez que o orgulho de ser da periferia é central em suas identidades. O valor de uso que querem conferir ao espaço urbano não está na cidade de forma abstrata, mas sim nas periferias, local concreto de suas experiências formadoras. A concepção de cidadania que expressam, portanto, não abandona ou se contrapõe às demandas por ampliação dos canais de participação popular e pela consolidação e efetivação de direitos sociais, mas aponta os limites que essa integração poderia proporcionar reafirmando suas diferenças enquanto forma de reivindicar a igualdade.
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Notas