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Os desacordos de moralidade política entre executivo e judiciário: uma análise do recurso extraordinário nº 657.718/MG
Disagreements of political morality between executive and judiciary: an analysis of extraordinary resource nº 657.718/MG
Revista Eurolatinoamericana de Derecho Administrativo, vol. 7, núm. 1, pp. 207-230, 2020
Universidad Nacional del Litoral

Artículos


Recepción: 30 Junio 2020

Aprobación: 18 Octubre 2020

Resumo: O presente trabalho analisa, a partir do RE nº 657.718/ MG, a existência de desacordos morais entre o Executivo e o Judiciário, e como esses Poderes têm se posicionado para solucionar essas questões. Busca-se compreender em que consistem os descordos de moralidade entre esses Poderes, elucidando que o Judiciário não tem sido o espaço mais adequado para a solução dessas controvérsias, haja vista a existência de uma cultura institucional em deliberar de forma pragmática e não integrativa, aplicando a teoria da decisão judicial desenvolvida por Ronald Dworkin de forma parcial. Com isso, concluiu-se que para aprimorar a solução de desacordos morais entre Executivo e Judiciário deve-se recorrer à utilização dos diálogos interinstitucionais. O diálogo possibilita a construção de decisões mais integradas ao ordenamento jurídico, bem como permite que se compreenda de forma mais adequada os contornos da divergência moral. No caso do RE nº 657.718/MG, identificou-se que os Ministros apresentaram uma compreensão errônea do desacordo. Para o desenvolvimento do presente trabalho, utilizou-se a metodologia indutiva, qualitativa, com análise bibliográfica e documental, mediante coleta de dados secundários, o que se deu com a degravação da sessão plenária de julgamento do RE nº 657.718/MG.

Palavras-chave: RE nº 657.718/MG, desacordos morais, moralidade política, diálogo interinstitucional, Ronald Dworkin.

Abstract: This paper analyzes, starting from RE 657.718 / MG, the existence of moral disagreements between the Executive and the Judiciary, and how these Powers have been positioned to solve these issues. It seeks to understand what the disagreements of morality consist between these Powers, elucidating that the Judiciary has not been the most adequate space for the solution of these controversies, given the existence of an institutional culture in deliberating in a pragmatic and non-integrative way, applying the theory of judicial decision developed by Ronald Dworkin in a partial way. Thus, it was concluded that to improve the solution of moral disagreements between the Executive and the Judiciary, the use of interinstitutional dialogues should be resorted to. Dialogue makes it possible to build decisions that are more integrated into the legal system, as well as allowing for a better understanding of the contours of moral divergence. In the case of RE 657,718 / MG, it was identified that the Ministers presented an erroneous understanding of the disagreement. For the development of this work, we used the inductive, qualitative methodology, with bibliographic and documentary analysis, through the collection of secondary data, which happened with the recording of the plenary judgment session of RE nº 657.718 / MG.

Keywords: RE nº 657.718/MG, moral disagreements, political morality, interinstitutional dialogue, Ronald Dworkin.

SUMÁRIO:

1. Introdução; 2. Compreendendo o que são os desacordos morais entre o Executivo e o Judiciário; 2.1. O dissenso sobre os valores sociais: os desacordos de moralidade política; 2.2. Desacordos morais e o acesso à saúde; 3. Os desacordos morais no Recurso Extraordinário nº 657.718/MG; 4. Os atuais entraves na resolução de desacordos morais pelo Judiciário: a importância do diálogo interinstitucional; 5. Conclusões; 6. Referências.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo analisa a natureza dos desacordos existentes entre o Executivo e o Judiciário, e como o diálogo interinstitucional pode contribuir com a superação de divergências de moralidade política entre esses dois Poderes.

No âmbito dos estudos constitucionais, um dos temas mais polêmicos é a divergência sobre o papel do Judiciário na resolução dos desacordos de moralidade política. As instâncias judiciais devem dar a última palavra sobre o sentido da Constituição? Elas são o fórum mais legítimo para decidir questões fundamentais da moralidade comunitária? Essas são perguntas que precisam ser respondidas, tendo em vista o crescente processo de judicialização da política. Afinal, matérias que até então eram tradicionalmente analisadas e decidias pelos setores exclusivamente político-partidários, agora o são pelos órgãos judiciais, destacando-se o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) na resolução dessas divergências, mediante a utilização ampla dos princípios constitucionais, que ganham validade jurídica por seu peso moral.

O tema dos desacordos morais costuma ser abordado na relação entre o Legislativo e o Judiciário. Quando se trata, contudo, de divergências entre o Executivo e os órgãos judiciais, é comum o pensamento de que a natureza desses desacordos é simplesmente fática. Qual a política pública adequada para solucionar uma omissão estatal? Os meios escolhidos pelo Poder Público são suficientes para garantir a efetivação dos direitos fundamentais?

São alguns exemplos de questões fáticas que costumam surgir no controle judicial de políticas públicas.

Este trabalho, todavia, pretende mostrar que não é possível limitar as divergências entre o Executivo e o Judiciário às questões fáticas. Na verdade, essa redução é fruto de uma visão simplista e incompleta do fenômeno jurídico. Muitos desses desacordos escondem questões mais profundas, diretamente ligadas à moralidade política da comunidade expressa por meio de princípios jurídicos, e que são tão relevantes quanto as divergências normalmente estudadas entre o Legislativo e o Judiciário.

Ao exercer o controle sobre as políticas públicas, mais do que divergir sobre a eficácia de determinadas medidas, o Judiciário pode discordar de quais valores públicos estão sendo priorizados pelo Executivo, e é essa divergência que leva ao reconhecimento da inconstitucionalidade de determinada política estatal.

A fim de compreender melhor a natureza desses desacordos, a pesquisa realizada se deu sobre a bibliografia ao respeito do tema, com o intuito de esclarecer os conceitos necessários à compreensão das questões que serão apresentadas. Além disso, estuda-se o Recurso Extraordinário nº 657.718/MG, referente ao direito à saúde. Por meio da análise desse caso, pretende-se demonstrar a existência de desacordos de moralidade política e, consequentemente, desacordos teóricos em torno do Direito (nas expressões propostas por Dworkin) entre o Executivo e o Judiciário, bem como entre os próprios Ministros. Por fim, realizouse análise documental, mediante coleta de dados secundários, o que se deu com a degravação da sessão plenária de julgamento do RE nº 657.718/MG.

2. COMPREENDENDO O QUE SÃO OS DESACORODOS MORAIS ENTRE O EXECUTIVO E O JUDICIÁRIO

Antes de analisar os argumentos utilizados pelo Judiciário e pelo Executivo em litígios que envolvem serviços públicos, é necessário compreender o que são os desacordos morais e como eles podem surgir em demandas sobre políticas públicas. Por isso, neste primeiro tópico, serão esclarecidas as diferenças entre os desacordos fáticos, teóricos e de moralidade, bem como serão apresentados os fatos analisados pelo Recurso Extraordinário nº 657.718/MG.

2.1. O dissenso sobre os valores sociais: os desacordos de moralidade política

É comum o pensamento, especialmente para aqueles não são da área jurídica, de que a atividade jurisdicional trata, principalmente, de divergências interpretativas. Quais leis devem ser aplicadas ao caso concreto? Há previsão legal para os pedidos formulados pelas partes? Mas, na verdade, esse é apenas um tipo de divergência que os juízes devem enfrentar.

Segundo Dworkin1, os juízes podem se deparar com três tipos de divergências: de fato, de direito, e de moralidade. Os desacordos fáticos tratam de questões empíricas relacionadas ao caso concreto. O que aconteceu? As alegações fáticas realmente ocorreram, ou não? São algumas das perguntas a serem respondidas quando os juízes se deparam com questionamentos fáticos.

Interessante notar que, quando se fala de controle judicial de políticas públicas, geralmente se pensa nesse tipo de divergência. O Executivo falha em sua atuação e, para assegurar a proteção de direitos fundamentais, o Judiciário intervém. Nesses casos, costuma haver divergência sobre qual a solução mais adequada para remediar o problema enfrentado, e o órgão judicial pode acabar impondo medidas que, na visão do Executivo, não são apropriadas. Por essa razão, uma das clássicas críticas ao controle judicial de políticas públicas é a incapacidade técnica do Judiciário para realizar essas intervenções2, por desconhecimento dos detalhes de como funciona a política em questão. Nessa perspectiva, havendo desacordos fáticos sobre políticas públicas, a competência para determinar o que deve ser feito pertence ao Executivo.

Já as questões de direito, ou desacordos teóricos, dizem respeito às diferentes afirmações e alegações que as pessoas fazem sobre aquilo que a lei lhes permite, proíbe ou autoriza3. Qual a lei pertinente ao caso concreto? Quais direitos ela atribui? Quais as possibilidades interpretativas? São questionamentos teóricos que os juízes, geralmente, precisam responder. Esse tipo de divergência pode, inclusive, conduzir a desacordos de moralidade.

Por fim, o terceiro tipo de questão que pode ser suscitada são os desacordos sobre a moralidade política comunitária, ou seja, divergências sobre os princípios políticos básicos de uma comunidade, e que englobam concepções sobre justiça e direitos4. Os dispositivos legais, a respeito dos quais há um acordo sobre seu sentido e alcance, são injustos? Em caso positivo, o Judiciário deve aplicálos? Determinado grupo social deveria ter o direito que lhe é assegurado por lei? Para Dworkin5, esses questionamentos dizem respeito à moralidade política comunitária, subjacente às leis e às instituições da sociedade, e podem ser solucionados pelos tribunais.

Atualmente, há uma grande confiança nos meios jurisdicionais para resolver controvérsias morais fundamentais e questões políticas altamente contenciosas, transformando os tribunais superiores em influentes órgãos políticos de tomada de decisão6. Na medida em que o Judiciário tem maior importância na mediação das relações sociais, o fenômeno da judicialização da política tem se fortalecido, ou seja, cada vez mais questões de grande repercussão social são decididas por instâncias judiciais, e não mais pelos setores políticos tradicionais7. Essa transição engloba não só a reanálise de decisões do Legislativo, mas também do Executivo.

No presente trabalho, adotase a tríplice classificação de Dworkin, focando no estudo do terceiro tipo de divergência, isto é, nos desacordos de moralidade política entre o Executivo e o Judiciário. Como explica Waldron8, um desacordo moral ganha caráter político quando a comunidade precisa adotar uma das concepções morais como sua, a fim de resolver problemas concretos já existentes, ou que ainda possam surgir. Questões sobre direitos sempre existirão, e uma base comum para a ação pública precisa ser construída em meio às discordâncias, ainda que o dissenso não acabe9. Nesses casos, até quem discorda quanto ao mérito da divergência moral, concorda que a comunidade precisa de uma solução para a questão. Assim, uma ampla diversidade de temas pode ser enquadrada no conceito de desacordos de moralidade política, como divergências sobre políticas públicas, justiça social e direitos individuais10, e são exatamente algumas dessas questões que serão abordadas no caso estudado.

Os desacordos morais, especialmente em sociedades hipercomplexas como as contemporâneas, são intermináveis11. Quer tenham caráter político, econômico ou social, a moralidade está sempre presente, já que são inúmeras as concepções de bem comum existentes na sociedade. Como será demonstrado, a divergência entre Executivo e Judiciário, em matéria de políticas públicas, pode ir além de simples divergências fáticas, englobando também desacordos morais.

Quais grupos sociais devem ser priorizados na realização de políticas públicas? Quais as necessidades mais relevantes? É justo que uma atuação estatal, legalmente amparada, seja mantida, ainda que protegendo de forma insuficiente segmentos sociais vulneráveis? A regulamentação de uma política pública pode ser afastada em nome da Justiça? Esses questionamentos não podem ser respondidos apenas com a análise empírica sobre o caso concreto. Apesar de iniciarem com uma divergência fática, dizem respeito a importantes valores públicos, consistindo em desacordos de moralidade. No próximo subtópico, será apresentado o RE nº 657.718/MG, que bem indica como esse tipo de desacordo pode estar subjacente em litígios que envolvem serviços públicos.

2.2. Desacordos morais e o acesso á saúde

No âmbito dos direitos socioeconômicos, assegurados pela Constituição Federal, o direito à saúde se destaca como uma das principais motivações para a judicializacão das políticas públicas. Isso se deve, em grande medida, ao descompasso entre as promessas constitucionais e a deficiência das instituições encarregadas de prestar os serviços de saúde pública12. Frustrados com a ineficiência estatal, os cidadãos que dependem dessas políticas veem no Judiciário a esperança de alcançar a realização das promessas frustradas13.

Conforme dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2019, entre os anos de 2009 e 2017, houve um aumento de cerca de 85% no número de litígios relacionados ao direito à saúde14. Isso significa que o crescimento dessas ações foi mais do que o dobro do observado, no mesmo período, para o total de processos, que aumentou em 40%. Das decisões proferidas em segunda instância sobre o tema, 69,1% tratam de fornecimento de medicamentos, e não costumam mencionar as listas de medicamentos aprovadas pelo Ministério da Saúde ou pelas Secretarias Municipais de Saúde. Além disso, em sete anos, houve um crescimento de aproximadamente 13 vezes nos gastos da União com essa espécie de demanda, e, em 2016, o gasto foi de R$ 1,6 bilhões15.

O recurso estudado está inserido nesse complexo contexto. O RE nº 657.718/MG, da relatoria do Ministro Marco Aurélio, trata da obrigatoriedade do Estado, gratuitamente, fornecer o medicamento Mimpara 30mg, utilizado para o tratamento de insuficiência renal, mas que não estava registrado junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Na ação, o Estado argumentou que seria prejudicial investir milhares de reais para atender a apenas um cidadão, autorizando a utilização de medicamento cuja eficácia ainda não foi comprovada pela agência reguladora nacional, quando os recursos públicos poderiam ser utilizados na realização de políticas relevantes, que beneficiariam um grupo maior de indivíduos, com maior segurança e efetividade16. O STF reconheceu a repercussão geral do recurso, cujo tema é o dever do Estado de fornecer medicamento não registrado pela ANVISA. Em 22/05/2019, o Tribunal, por maioria, conferiu parcial provimento ao recurso, fixando a tese de nº 500, a qual será mais bem debatida no tópico subsequente.

No próximo tópico, a análise dos argumentos apresentados nesse recurso será aprofundada, a fim de esclarecer como as divergências morais entre Executivo e Judiciário ocorrem em casos concretos, e como esses dois Poderes justificam as suas decisões.

3. OS DESACORDOS MORAIS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 657.718/MG

Conforme exposto no tópico anterior, realizar-se-á, a partir de então, a análise dos argumentos expostos pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 657.718/MG, a fim de apontar a existência de desacordos morais entre o Executivo e o Judiciário, noticiando que este último tem se tornado lócus não apenas de deliberações sobre desacordos fáticos ou de direito, mas, também, de moralidade, evidenciando uma verdadeira judicialização da moral.

No caso específico do RE nº 657.718/MG, o Supremo Tribunal Federal instituiu a tese de nº 500, a qual dispõe que:

1.O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);(ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União17.

Diferentemente do que se possa pensar, essa tese não reflete a existência de uma unanimidade entre os Magistrados, bem como deixa claro que a razão pela qual o STF autorizou a concessão de medicamentos não registrados pela ANVISA, ainda que em situações excepcionais, foi uma divergência de moralidade, resolvendo-se por afastar a incidência da literalidade normativa, por entender que, em alguma circunstâncias, a aplicação das disposições legais poderia ensejar uma situação de extrema injustiça.

A divergência entre os Ministros fica nítida, em um primeiro momento, no que diz respeito ao provimento, ou não, do Recurso. Em 2016, quando teve início a sessão de julgamento do RE nº 657.718/MG, em conjunto com o RE nº 566.471/RN, houve o proferimento de três votos, quais sejam: do Ministro Marco Aurélio, do Ministro Luís Roberto Barroso e do Ministro Edson Fachin. Cada um desses votos inaugura uma posição distinta acerca da possível conclusão do julgamento.

O Ministro Marco Aurélio (Relator do Recurso Extraordinário em análise) votou por negar provimento ao recurso, sugerindo a seguinte tese: “o Registro de Medicamentos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA é condição inafastável, visando concluir pela obrigação do Estado ao fornecimento.”18. O Relator elaborou um voto suscinto, consignando, em linhas gerais, que a autorização, pelo Judiciário, para o fornecimento de medicamentos não registrado na ANVISA enseja uma situação de extrema insegurança jurídica, uma vez que, conforme os delineamentos do Art. 12 da Lei nº 6.360/76, o registro é condição peremptória para a industrialização, comercialização e importação de medicamentos19.

Assim, conceder a dispensação de fármacos cuja segurança, eficácia e qualidade terapêutica ainda não foram atestadas pela agência reguladora competente, induz a uma situação que pode colocar a saúde dos jurisdicionados em risco, haja vista a ausência de consenso da comunidade científica.

Em linha diametralmente oposta à prescrita pelo Ministro Marco Aurélio, o Ministro Edson Fachin conferiu, ainda na sessão de 2016, integral provimento ao Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Já no início de seu voto, o Ministro Fachin revela que a interpretação cabível ao Direito à saúde transborda a literalidade da lei. Dessa forma, o Ministro constrói a argumentação no sentido de que os indivíduos têm direito não apenas ao mínimo existencial, mas também têm a faculdade de demonstrar suas percepções sobre os procedimentos de alocação de recursos e insumos.

Isso porque o Estado tem o dever não apendas de fornecer, mas, também, de garantir a participação das pessoas nos processos alocativos20.

Mais à frente, o Ministro Fachin inicia a exposição de uma divergência com o Ministro Marco Aurélio e aponta que o papel da ANVISA no registro de medicamentos não é apenas um exame quanto à segurança, à eficácia, à qualidade e ao custo, mas, também, demonstra uma discussão sobre as evidências econômicas21. Assim, se os indivíduos, na ótica do Ministro, devem participar das deliberações alocativas, e se a atuação da ANVISA não é puramente técnica-científica, mas também é econômica, então, pelo desenvolvimento do argumento, seria possível o Judiciário intervir na dispensação de medicamentos não registrados na Agência Reguladora, a fim de garantir a participação popular nesses processos de alocação.

Vê-se, assim, que os Ministros Marco Aurélio e Edson Fachin apresentam um desacordo de Direito sobre a atuação da ANVISA nos procesos de registro de medicamento. O primeiro julgador apenas elucida o papel técnico, de teste de eficácia e segurança realizado pela Agência Reguladora, o segundo já traz a foco o papel distributivo desempenhado pela Autarquia Federal.

Na sequência de seu voto, Fachin elucida que, em razão desse papel alocativo que as atividades regulatórias apresentam, é possível realizar um controle judicial dessas decisões. Afinal, a sociedade brasileira é extremamente plural, com muitos desacordos sobre quais deveriam ser as prioridades no atendimento à saúde, mas esse aspecto não é um óbice a tomada de decisão. A bem da verdade, essa constatação permite evidenciar a importância da participação popular, a fim de analisar a adequabilidade da racionalidade regulatória22.

Assim, a proposta de Fachin não é substituir a epistemologia da ciência pelos anseios populares, mas sim garantir que a comunidade nacional participe dos processos deliberativos sobre alocação de recurso, garantindo um adequado nível de democracia na racionalidade distributiva da agência reguladora23.

Por fim, o Ministro elucida como proposta de tese que:

(...) no âmbito da política de assistência à saúde, é possível ao Estado prever, como regra geral, a vedação da dispensação, do pagamento, do ressarcimento ou do reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa24.

Portanto, caberia a intervenção judicial apenas para controlar o processo de regulação quando se perceber desvios na aplicação da lei, na motivação, na instrução probatória e no tempo de resposta, mas, de todo modo, a regulação de medicamento deveria contar com a oitiva popular no que diz respeito a alocação de recursos.

Como terceira via, surge a proposta de Ministro Luís Roberto Barroso, o qual admite que o Estado pode ser excepcionalmente compelido a fornecer medicamentos sem registro na ANVISA. Diferentemente dos votos anteriormente analisados, em que os Ministros demonstram um desacordo de direito sobre o papel regulatório da ANVISA e os limites da intervenção judicial nesse processo de regulação, Barroso muda o foco do embate para um desacordo de moralidade política.

Conforme se depreende do voto do Ministro, entendese que há a possibilidade do Estado fornecer medicamentos sem registro na agência reguladora, caso essa entidade ultrapasse o prazo legal para apreciação do pedido de registro. Assim, diferentemente do que foi proposto pelo Ministro Edson Fachin, de que o Judiciário pode intervir apenas para comunicar a Administração Pública de que há uma mora irrazoável na apreciação do pedido de registro, sem se imiscuir nos processos técnicos da regulação; Barroso constrói a possibilidade de uma intervenção propositiva nos seguintes termos: se a ANVISA ultrapassa o prazo regulamentar de pedidos de registro, surge a possibilidade do Estado fornecer medicamentos sem essa autorização, se forem identificados três requisitos cumulativos: I. A existência prévia de pedido de registro do medicamento no Brasil, II. A Existência de registro de medicamento em renomadas agências de regulação no exterior e III. A inexistência de substituto terapêutico registrado na ANVISA25.

Não obstante reconheça os riscos em se autorizar o fornecimento de medicamentos sem o registro sanitário, tanto em termos de desequilíbrio na política pública, quanto em relação ao papel de deferência que o Judiciário deve ter com relação a deliberação dos demais Poderes, o Ministro Barroso justifica que a interferência do Judiciário seria cabível diante de um cenário de irrazoável mora administrativa na apreciação dos pedidos de registro, o que, segundo ele, autorizaria as instâncias judiciais a determinar prestações positivas, para garantir a efetividade das normas constitucionais26.

A tese originalmente proposta por Barroso foi, portanto, no sentido de que fornecimento e importação de medicamentos experimentais jamais serão justificados. Já os medicamentos com segurança e eficácia comprovadas, mas sem registro na ANVISA, poderão ter seu fornecimento e importação autorizados na hipótese de irrazoável mora da Agência Reguladora em apreciar o pedido de registro, desde que: I. o medicamento tenha sido submetido a registro no Brasil, mas a Anvisa ainda não tenha se pronunciado; II.se esteja diante de ausência de substituto terapêutico registrado na Anvisa e III. O medicamento pleiteado tenha registro em renomadas agências reguladoras fora do Brasil.

Pelo exposto, observa-se que o Ministro Barroso considera a mora da ANVISA em analisar o registro de medicamentos um problema estrutural, uma vez que há legislação definindo os prazos para que a agência se manifeste, mas, ainda assim, esse prazo não é cumprido, havendo um reiterado desrespeito à legislação, que, contudo, não traz uma sanção específica nem uma consequência bem delineada em face dessa demora. Essa suposta omissão não normativa por parte da ANVISA, justificaria, na perspectiva do Barroso, uma flexibilização dos contornos da política pública de dispensação de medicamentos. Na lógica suscitada pelo Ministro, a não observância do prazo regulamentar pela agência reguladora embasaria uma interferência positiva do Judiciário, levando a um afastamento da legislação, sobretudo do art. 12 da Lei nº 6.360/76, o qual fixa que o registro é condição peremptória para a industrialização, comercialização e importacao de medicamentos.

Em síntese, a não observância da legislação pelo Executivo, justificaria, sobre a intenção de implementação de uma solução justa e adequada, o afastamento da aplicação da legislação pelo Judiciário, e é nesse ponto que começa a surgir o desacordo moral entre esses poderes, já que não se traduz em uma indefinição do que o Direito prescreve, mas a justiça daquilo que ele prescreve, a qual é aferida por princípios.

Ora, se o Executivo não consegue implementar a política pública por ele delineada, cabe ao Judiciário, enquanto guardião da Constituição, intervirnas prescrições regulamentares da política pública para conferir efetividade ao texto constitucional, ainda que isso resulte em uma desconsideração da legislação previamente firmada pelos Poderes competentes.

Nessa lógica, o desrespeito à legislação pelo Executivo serviria de base ao desrespeito a essa mesma legislação pelo Judiciário, tudo em busca de uma solução justa. Após o voto do Ministro Barroso, a sessão de julgamento do RE nº 657.718/MG, iniciada em 2016, foi suspensa por ter o Ministro Teori Zavascki pedido vista dos autos antes de proferir seu voto. Assim, a sessão foi retomada em 22 de maio de 2019, iniciando pelo voto-vista do Ministro Alexandre de Moraes, em razão do óbito do Ministro Teori.

O Ministro Alexandre revela um alinhamento com as proposicoes do Ministro Barroso, mas acrescenta outras observacoes acerca da possibilidade de o Estado autorizar o fornecimento de medicamentos ainda nao registrado na ANVISA. Na sessao plenária, o Ministro elucida, na exposição oral de seu voto, que o juiz deve oficiar a ANVISA para que essa delibere sobre o registro do medicamento, observando os prazos previstos na lei regulamentar. Findo o prazo legal, sem manifestação do órgão administrativo, a tutela judicial poderia ser conferida, desde que o medicamento conte com registro em agências internacionais e sem substituto terapêutico no Brasil28.

Para o caso de doenças raras e ultrarraras, o Ministro Alexandre consignou que caso não haja pedido de registro perante a ANVISA, a agência reguladora deveria oficiar a empresa responsável pela produção do medicamento, indagando se essa teria interesse em empreender com o registro do fármaco.

Caso não houvesse retorno da empresa ao ofício da ANVISA, e o pedido de registro não fosse realizado, poderia o Judiciário conferir o fornecimento desse medicamento, caso ele já contasse com registro em agências internacionais e não houvesse substituto no Brasil. Esse ponto, levantado pelo Ministro Alexandre, foi posteriormente incorporado pelo Ministro Barroso em seu voto, estando presente na tese final29. Ocorre que na tese não aparece a menção ao fato de que a ANVISA deveria, antes do pronunciamento judicial, oficiar a empresa formuladora do remédio, na tentativa de que essa requeresse o registro junto à Agência Reguladora.

Na sequência de exposição de votos orais na sessão plenária, o Ministro Ricardo Lewandowski suscita que o fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA é excepcional, mas não impossível, uma vez que a própria legislação dispõe que, em determinadas situações, pode haver o fornecimento sem registro no órgão regulamentar. Essa previsão está contida, por exemplo, no art. 8º, parágrafo 5º da Lei nº 9782/99. O Ministro também revela um alinhamento com a tese proposta por Luís Roberto Barroso, evidenciando que o cidadão não pode restar prejudicado em razão da demora infundada da Administração em apreciar os pedidos de registro.

O Ministro Lewandowski aponta em seu voto que é necessária a comprovação periódica da eficácia do tratamento para manter o seu fornecimento pelo Judiciário30. Assim, além de desbordar as previsões legais, autorizando o fornecimento de medicamento sem registro na ANVISA, o Ministro também adiciona uma outra atribuição ao Judiciário, qual seja: fiscalizar se o medicamento concedido tem produzido os efeitos esperados.

As observações anteriores bem atestam a existência de desacordos morais entre Executivo e Judiciário. Afinal, em momento nenhum durante o julgamento do caso foi questionada a competência da ANVISA para validar a eficácia e segurança de um medicamento. Também não houve desacordo entre os magistrados sobre o fato de que a legislação veemente proíbe a concessão de fármacos sem registro, tendose inclusive reiterado a declaração de constitucionalidade desse dispositivo31.

Vêse, assim, que o foco da divergência residiu no fato de que, em razão de omissões não normativas por parte do órgão regulamentar, surgiria uma suposta autorização ao Judiciário de desconsiderar, ainda que parcialmente, as determinações legais em prol de um bem maior: permitir a concretização do texto constitucional por meio da efetivação do direito fundamental à saúde. Com isso, observa-se que a atuação do Judiciário ao desconsiderar os dispositivos legais seria para combater injustiças, permitindo que determinado grupo social tenha acesso ao direito que lhe é assegurado constitucionalmente, revelando que os desacordos entre Judiciário e Executivo não são apenas fáticos, mas, sobretudo, de moralidade.

Por fim, suscita-se o voto do Ministro Dias Toffoli, o qual concordou com o voto do Ministro Relator, no sentido de não ser a possível a concessão de medicamentos sem registro na ANVISA. O Ministro afirma que todo medicamento implica a presença de uma droga, o que representa, por si só, um risco à vida32. Nesse sentido, a ausência de registro sanitário impõe desequilíbrios econômicos, já que não haveria a regulação do preço, bem como suscita a impossibilidade de acompanhamento da eficácia da droga na cura da doença. Diferentemente do que foi proposto pelo Ministro Lewandowski, Dias Toffoli entende que a comprovação de eficácia do fármaco deve ser realizada pela própria agência reguladora e não pelo Poder Judiciário.

Outro ponto apresentado por Dias Toffoli diz respeito ao fato de que nem mesmo a validação por órgãos de outros países seria suficiente, já que a ANVISA apresenta um procedimento próprio de verificação da segurança de fármacos, envolvendo, inclusive, a análise dos efeitos desse medicamento na população brasileira, o que não poderia ser substituído pela análise de instituições internacionais congêneres33.

Pela análise realizada, constata-se que o STF buscou empreender uma intervenção estrutural por meio do RE nº 657.718/MG na política de dispensação de medicamentos. Ocorre que a intervenção judicial acabou ocorrendo sem a devida oitiva da Administração Pública, revelando, na verdade, um desacordo moral entre Executivo e Judiciário, na medida em que os Magistrados, ao imporem princípios de moralidade política, desconsideraram as previsões legais e técnicas cabíveis ao caso.

Temse, assim, um embate de valores: enquanto o Poder Executivo apregoa que o valor a preponderar é a legalidade, com a observância das recomendações técnicas do órgão competente, o Judiciário dispõe que o valor a ser observado é a Justiça, devendo o irrestrito acesso à saúde ser oportunizado, ainda que isso envolva a desconsideração das recomendações técnicas e uma inobservância à legalidade. Essa constatação sus cita algumas inquietações, as quais serão melhor delineadas no tópico subsequente: quais as dificuldades em se delegar a resolução de desacordos de moralidade ao Judiciário? Como estabelecer decisões judicias efetivas em questões similares às analisadas?

4. OS ATUAIS ENTRAVES NA RESOLUÇÃO DE DESACORDOS MORAIS PELO JUDICIÁRIO: A IMPORTÃNCIA DO DIÁLOGO INTERINSTITUCIONAL

Seguindo o exposto no tópico anterior, observase a existência de um embate entre a Racionalidade Política e a Racionalidade Deontológica. Esse confronto pode ser traduzido, tomando por base as construções categóricas formuladas por Dworkin, como uma divergência entre os argumentos de política (policy) e os argumentos de princípios (principle).

Em consonância com esse modelo, os argumentos de política tentariam demonstrar que a comunidade estaria melhor, como um todo, se um programa, articulado pelos órgãos deliberativos, fosse seguido. Já os argumentos de princípio apelam para a proteção do indivíduo, ainda que isso leve ao abandono do programa formulado pela política e até mesmo resulte em uma piora na qualidade de vida dos cidadãos34.

No mesmo sentido, Dworkin argumenta que as decisões dos tribunais devem seguir uma racionalidade principiológica. Assim, diante de um conflito entre uma política e um princípio, no âmbito do processo administrativo, tem-se que o princípio deve preponderar:

Minha visão é que o Tribunal deve tomar decisões de princípios, não de política decisões sobre que direitos as pessoas têm sob nosso sistema constitucional, não decisões sobre como se promover melhor o bem estar gerale que deve tomar essas decisões elaborando e aplicando a teoria substantiva da representação, extraída do princípio básico de que o governo deve tratar as pessoas como iguais35.

Enquanto os Ministros Marco Aurélio e Dias Tofffoli aplicaram em seus votos uma racionalidade mais próxima da racionalidade política, defendendo a observância à policy da forma como foi idealizada pelo Poder Executivo, os Ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes apresentaram uma racionalidade pragmatista, defendendo o afastamento das prescrições da política pública para assegurar a dignidade da pessoa humana, como se a conservação da política pública, tal como idealizada, e a preservação desse valor, na perspectiva individual, fossem inconciliáveis.

Assim, sob a estreita perspectiva da racionalidade a ser adotada pelo Judiciário, aparenta-se, em uma observação mais desatenta, que o raciocínio apresentado pelos Ministros Barroso e Alexandre teriam sido os mais adequados para solucionar o desacordo moral suscitado, visto que se filiaram de forma mais próxima à racionalidade principiológica, permitindo ao indivíduo o acesso a uma política que, em um plano geral, lhe fora negado.

Entrentanto, a possibilidade de inobservância da Lei, em prol do benefício individual, deve perpassar pelas discussões acerca do dever de integridade que as decisões judiciais têm de observar. O dever de integridade impõe, portanto, a seguinte reflexão:

(...) se os tribunais tivessem o poder discricionário para modificar as regras estabelecidas, essas regras certamente não seriam obrigatórias para eles e, dessa forma, não haveria direito, já que o Direito é composto por um conjunto de padrões previamente fixados. [...] Existem padrões, obrigatórios para os juízes, que estabelecem quando um juiz pode e quando ele não pode revogar ou mudar uma regra estabelecida36.

Pelo exposto, depreende-se que Dworkin, ao argumentar que o Judiciário deve adotar a racionalidade principiológica para a tomada de decisões, não está defendendo o ativismo judicial injustificado e antidemocrático. Em verdade, o que o autor propõe é que o julgador pode realizar uma leitura moral da Constituição, o que não significa que o Magistrado tem autonomia para interpretála de forma subjetiva. Nesse sentido, os operadores do direito estão inseridos em uma prática interpretativa que deve obediência à integridade, de modo que as decisões políticas ou judiciais do passado, como leis, precedentes e constituição, devem resultar em um conjunto coerente de princípios a serem observados pelas decisões judiciais subsequentes37.

Dworkin desenvolve, assim, a ideia de que o direito como integridade nega que as manifestações do direito sejam relatos factuais, voltados para o passado, ou programas instrumentais, voltados para o futuro. Em síntese, os juízes:

(...) não podem pensar que os dispositivos morais abstratos expressem um juízo moral particular qualquer, por mais que esse juízo lhe pareça correto, a menos que tal juízo seja coerente, em princípio, com o desenho industrial da Constituição como um todo e também com a linha de interpretação constitucional predominantemente seguida por outros juízes no passado38.

No caso em análise, restou nítido que o desacordo entre os Magistrados e entre os Poderes Executivo e Judiciário era de cunho moral, podendo ser resumido no seguinte questionamento: é possível afastar uma expressa determinação legal em busca de uma solução supostamente mais justa para o indivíduo promovente da ação judicial? Ao se adotar a racionalidade de princípios, proposta por Dworkin no exercício da jurisdição constitucional, a resposta para a pergunta anteriormente apresentada parece ser positiva. Contudo, não se pode esquecer que essa racionalidade deve vir acompanhada da noção de integridade, o que não ocorreu no caso em questão.

Observase que, em diversos momentos durante o proferimento de seus votos na sessão plenária, os Ministros entenderam por constitucional as disposições legais que determinam a necessidade de prévio registro sanitário do medicamento perante a ANVISA, antes do medicamento ser importado e utilizado em território nacional. Em diversas oportunidades, elucidam que a ANVISA é agência reguladora com competência institucional para verificar a segurança e a eficácia de um fármaco, mas na contramão dos precedentes que dispõem sobre o dever de deferência para com as elucidações das agências reguladoras, o Supremo Tribunal Federal achou por bem afastar a incidência da norma legal, revelando uma solução pragmatista para o desacordo moral suscitado.

Pelo exposto, tem-se que a decisão judicial foi pragmatista, mostrando-se, por isso, inegavelmente ativista. Nas próprias palavras de Dworkin:

O ativismo é uma forma virulenta de pragmatismo jurídico. Um juiz ativista ignoraria o texto da Constituição, a história de sua promulgação, as decisões anteriores da Suprema Corte que buscaram interpretá-la e as duradouras tradições de nossa cultura política ativista ignoraria tudo isso para impor a outros poderes do Estado o seu próprio ponto de vista sobre o que a justiça exige39.

Se a decisão tivesse sido íntegra, os Ministros deveriam ter deliberado no sentido de assegurar que a própria ANVISA verificasse a possibilidade de registro ou não do medicamento, sem criar novas hipóteses de utilização do fármaco em território nacional que não fosse pela autorização da agência reguladora competente.

A decisão íntegra, nos termos anteriormente elucidados, não implicaria em uma substituição da racionalidade de princípio pela racionalidade de política, uma vez que a política pública existente é perfeitamente compatível com os princípios constitucionais. O que se observa, a bem da verdade, é uma má execução da política, quando a ANVISA ultrapassa os prazos legais para observância do pedido de registro de medicamento. Logo, para solucionar essa ineficiência da política pública, a que podemos chamar de omissão inconstitucional não normativa, o Judiciário teria outras inúmeras formas de intervir e, ainda assim, observar seus posicionamentos anteriores e respeitar as demais disposições normativas.

Entre essas inúmeras soluções alternativas, poderia ter se adotado um diálogo interinstitucional, em que os órgãos competentes seriam intimados a formular um plano de ação conjunto com o Judiciário. No entanto, essa não foi a solução priorizada. O Poder Judiciário optou em formular uma decisão pragmatista, pensando em garantir o direito à saúde em casos futuros análogos, segundo, exclusivamente, uma lógica de eficiência e resultado.

Ocorre que a interpretação jurídica, formulada por um juiz ou tribunal, não pode substituir por completo a deliberação realizada pelo Executivo, sobretudo no que diz respeito ao delineamento de políticas públicas.

Logo, o real embate principiológico existente no caso em tela seria entre o princípio da eficiência administrativa (em razão da mora da ANVISA em apreciar determinados pedidos de registro) e o princípio da legalidade (o que no caso em concreto corresponde a necessidade de prévio registro no órgão sanitário para que o Estado seja compelido a autorizar a dispensação do fármaco).

O STF suscitou esse embate principiológico como um desacordo moral envolvendo o direito à saúde e o princípio da legalidade, em que, de um lado, teríamos o Judiciário resguardando o direito individual à vida, por meio da concretização do direito à saúde, e de outro lado, teríamos a Administração Pública prescrevendo a necessidade em se observar às normas legais específicas que regem a política pública. Essa forma de enxergar a lide elucidou uma decisão pragmática, claramente preocupada em reduzir o número de ações judiciais com questionamentos semelhantes.

Essas reflexões nos permitem responder a duas das perguntas formuladas no tópico anterior. No que diz respeito às dificuldades em se delegar a resolução de desacordos de moralidade ao Judiciário, constata-se que esse Poder tem revelado um tendência de proferir decisões pragmáticas, com o objetivo de condicionar comportamentos futuros, sem se ater às suas próprias decisões anteriores, bem como às demais disposições do ordenamento jurídico.

O caso do RE nº 657.718/MG não é o único exemplo em que o Judiciário nacional solucionou um desacordo de moralidade por meio de uma decisão pragmática e não íntegra. Outro exemplo que podemos suscitar é a decisão cautelar proferida no bojo da ADPF nº 347. Nesse caso, o STF interveio na política carcerária sem considerar as demais normas jurídicas que a regulamentavam, o que culminou na produção de uma decisão jurídica pouco eficaz40.

Além dos modelos citados, seria possível indicar várias outras decisões do Supremo que não observaram os conceitos de integridade e solucionaram dilemas morais de forma pragmática, mas o escopo deste trabalho nos impede de aprofundar essas questões. Com isso, é possível constatar uma primeira conclusão: o Judiciário não tem se mostrado como o lócus adequado para solucionar desacordos de moralidade, em razão dos procedimentos adotados na organização de suas decisões, evidenciando uma postura muito mais pragmatista que integra.

Assim, é possível passar à análise do segundo questionamento exposto no tópico anterior: como estabelecer decisões efetivas? O diálogo com as instituições envolvidas no litígio, antes do Judiciário deliberar, surge como uma possível resposta a esse questionamento. A utilização dos diálogos interinstitucionais rompe com a lógica tradicional de que os poderes apenas controlam uns aos outros, estabelecendo que esses podem aliás, devem deliberar conjuntamente na busca de decisões que sejam mais efetivas ao conferir voz institucional às mais diferentes perspectivas41.

O expoente dessa ideia de deliberação conjunta foi Jeffrey Tulis, o qual explica que “(...) nenhuma instituição democrática específica é suficiente para assegurar a consideração de todas as preocupações relevantes na sustentação da democracia”42, por isso a relevância da implementação de diálogos institucionais quando se pretende estabelecer decisões que irão atingir coletividades e que versem sobre as mais diversas funções dos poderes constituídos.

Logo, estabelecer técnicas de diálogo entre os Poderes, e destes com a própria sociedade, é uma forma de garantir minoração da revisão judicial hermética, distanciada da realidade social. O Judiciário pode atuar de forma consentânea à separação de poderes, sem formular políticas públicas, e, ao mesmo tempo, promover a concretização dos direitos fundamentais43. Dessa forma, os diálogos institucionais visam solucionar problemas coletivos, evitando que o poder da última palavra se centre, exclusivamente, no Judiciário44.

Como exposto anteriormente, o Ministro Edson Fachin esboçou em seu voto a importância da participação popular nas deliberações alocativas realizadas pela ANVISA. A tese do Ministro entendia que, para serem comercializados em âmbito interno, os medicamentos precisavam ser previamente registrados no órgão de registro sanitário, mas esse processo deveria vir acompanhado da oitiva da população no que diz respeito às decisões de alocação. O Ministro Fachin iniciou o esboço de uma resposta que envolvia a realização dos diálogos institucionais, mas essa não foi a tese vencedora, tendo os Ministros optado em realizar uma intervenção direta na política pública, sem qualquer espécie de diálogo.

Essa intervenção, como dito, transformou o desacordo de moralidade entre eficiência e legalidade, em um desacordo entre legalidade e direito à saúde, como se a manutenção da política pública, da forma como foi traçada, estivesse violando o direito à saúde e, por isso, poderia ser afastada. O mesmo Tribunal, no entanto, suscitou, durante a sessão plenária de julgamento do RE nº 657.718/MG, que os dispositivos legais que vedam a comercialização e o fornecimento de medicamentos não autorizados pela ANVISA são constitucionais.

Por essa razão, acredita-se que se tivesse sido utilizada a sistemática dos diálogos institucionais, o desacordo de moralidade existente teria sido adequadamente compreendido e a solução desenvolvida teria sido mais íntegra ao restante do sistema jurídico. Assim, prescreve-se que as decisões judiciais devem estar inseridas em um paradigma coerentista, em que “não se aplicam mônadas jurídicas, partículas autossignificativas descompromissadas com as demais partes do sistema; aplicam-se as partes mediante referência adequada com o todo”45.

Além de contribuir para observância ao paradigma coerentista, os diálogos institucionais também são um importante instrumento de desjudicialização da saúde. Como alertam Clara Machado e Sandra Regina Martini46, os conteúdos da integralidade e da assistência do sistema devem ser definidos de forma conjunta entre a sociedade e o Estado, numa contínua cooperação por meio de diálogos interinstitucionais. Com isso, surgem deveres de conduta tanto para os Poderes Públicos como para toda a sociedade, decorrentes da responsabilidade que cada uma dessas entidades terá na resolução dos problemas que lhe são apresentados. Essas autoras bem apontam que:

Deve-se ter em mente que o papel do Judiciário não é substituir o Legislativo ou o Executivo na elaboração e execução de políticas públicas, mas cooperar com esses poderes a fim de alcançar e materializar o princípio jurídico da cooperação e da fraternidade47.

Nessa sistemática, como elucida Mário Schapiro48, a atuação do Judiciário não deve ser concorrencial às decisões tomadas pelos poderes políticos Executivo e Legislativo, mas cooperativa, na tentativa de ampliar a efetivação dos direitos fundamentais. A desconfiança nos poderes políticos e a usurpação de suas atribuições pelo Judiciário não deve ocorrer, pois poderá ensejar o reforço ao ativismo predatório49.

Pelo exposto, tem-se que os diálogos interinstitucionais surgem como uma via que busca compatibilizar o raciocínio com base em princípios e o raciocínio com base em políticas. Nessa perspectiva, as decisões judiciais tendem a ser mais eficientes pelo fato de se tornarem mais íntegras, por estarem alinhadas com o restante do ordenamento jurídico.

Concluise, dessa forma, que o Judiciário não tem se mostrado como o melhor espaço para a resolução dos desacordos morais, tendo em vista a sua tendência em tomar decisões pragmáticas e não integrativas. À vista disso, os diálogos institucionais surgem como um importante mecanismo de construir decisões mais coerentes com o restante do ordenamento jurídico, auxiliando os Poderes a compreenderem em que efetivamente constitui o desacordo. O foco seria construir um diálogo interinstitucional, para que os entes estatais responsáveis atuem conforme as suas atribuições típicas, construindo soluções adequadas dentro de suas esferas de competência. Consequentemente, ao adotar uma postura dialogal, o Judiciário não usurparia os poderes administrativos ou legislativos50.

Defende-se, por isso, que o Judiciário, apesar de não ter sido, pode se tornar o espaço adequado para solucionar os desacordos morais. Atuando de forma dialógica com os demais Poderes, sem substituílos em suas competências decisórias, exerceria um claro ativismo dialogal, visando, sobretudo, evitar a produção de decisões simbólicas como expressão de um poder meramente retórico51.

5. CONCLUSÕES

Com base nos argumentos expostos, é possível traçar algumas conclusões. Primeiro, é necessário ultrapassar a tradicional visão de que os desacordos morais prevalecem entre o Judiciário e o Legislativo, enquanto as instâncias judiciais e o Executivo discordam apenas de questões fáticas. De fato, a judicialização das políticas públicas levanta diversas divergências fáticas, sobre qual a solução mais eficiente para o caso concreto. Muitas vezes, no entanto, esse desentendimento é sustentado em uma divergência ainda mais profunda, isto é, em um desacordo de moralidade.

Para exemplificar como isso pode ocorrer, analisouse o Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Com base no estudo do caso, ficou claro não só que existem desacordos morais no âmbito do controle judicial de políticas públicas, mas que o STF resolve essas divergências de forma pragmática, focando em soluções ad hoc e desconsiderando os precedentes do próprio Tribunal. O resultado são decisões solipsistas, que não respeitam a integridade do sistema jurídico e não buscam o diálogo com os setores políticos. Por essa razão, enquanto se mantiver fechado a um diálogo efetivo com o Executivo, o Judiciário não poderá ser considerado como o lócus adequado para solucionar desacordos de moralidade política. No caso em análise, o único a visualizar a necessidade de um amplo diálogo sobre o tema, inclusive com a inclusão da sociedade civil, foi o Ministro Edson Fachin, cuja opinião, infelizmente, não foi seguida pelos demais membros do Tribunal.

Em face dessas considerações, qual seria a alternativa possível? Acredita-se que a solução para os problemas apresentados perpassa por uma atuação judicial dialógica, na qual o Judiciário reconhece sua limitação para resolver, unilateralmente, desacordos morais complexos. Portanto, sem um adequado diálogo interinstitucional, com a inclusão da sociedade civil sempre que possível, decisões ad hoc, sem respeito à integridade e às competências próprias do Executivo, a exemplo do que ocorreu no RE nº 657.718/ MG, serão cada vez mais comuns.

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Notas

1 DWORKIN, Ronald O império do direito. Trad: Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 6.
2 VITORELLI, Edilson. Litígios Estruturais: decisão e implementação de mudanças socialmente relevantes pela via processual. In: ARENHART, Sérgio Cruz; JOBIM, Marco Félix (Org.). Processos Estruturais. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 369-422, p. 372.
3 DWORKIN, 1999. p. 6.
4 CARDOSO, Renato César; CORTES, Pâmela de Rezende; OLIVEIRA, André Matos de Almeida. O caminho para o consenso – análise da crítica de Waldron a Rawls sobre desacordos políticos. Veritas, [s.l.], v. 64, n. 3, p. 1-27, p. 7, 31 dez. 2019.
5 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 125-126.
6 HIRSCHL, Ran. A judicialização da megapolítica e o surgimento dos tribunais políticos. Judicialização da Política. São Paulo, v. 22, 2012. p. 27-62, p. 29.
7 MACHADO, Clara; MARTINI, Sandra Regina. Desjudicialização da saúde, diálogos interinstitucionais e participação social: em busca de alternativas para o sistema. Revista Estudos Institucionais, v. 4, n. 2, p. 774796, p. 778, 2018.
8 WALDRON, Jeremy. A dignidade da legislação. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulos: Martins Fontes, 2003. p. 43-44.
9 WALDRON, Jeremy. A essência da oposição ao judicial review. In: BIGONHA, Antonio Carlos Alpino; MOREIRA, Luiz (Org.). Legitimidade da Jurisdição Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2010. p. 93-157, p. 116.
10 WALDRON, Jeremy. Law and Disagreement. Oxford: Oxford University Press, 1999. p. 199.
11 STRECK, Lenio Luiz; MORBACH, Gilberto. (Autonomia do) Direito e desacordos morais. Revista Brasileira de Estudos Políticos, [s.l.], n. 119, p. 253-289, p. 265, nov. 2019.
12 SANT’ANA, Ramiro Nóbrega. A judicialização como instrumento de acesso à saúde: propostas de enfrentamento na saúde pública. 2017. 455 f. Tese (Doutorado) Curso de Direito, Centro de Ensino Universitário de Brasília, Brasília, 2017. p. 13.
13 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Entre o Guardião de Promessas e o Superego da Sociedade: Limites e Possibilidades da Jurisdição Constitucional no Brasil. Revista de Informação Legislativa, v. 51, p. 159-179, p. 176-177, 2014.
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15 INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA. Judicialização da saúde no Brasil: perfil das demandas, causas e propostas de solução. São Paulo, 2019. 174 p., p. 13. Pesquisa realizada para o Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wpcontent/uploads/2019/03/66361404dd5ceaf8c5f7049223bdc709. pdf>. Acesso em: 26 mai. 2020.
16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016a. Voto do Ministro Marco Aurélio. p. 4. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/ cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE657718.pdf>. Acesso em: 26 mai. 2020.
17 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be>. Acesso em: 26 mai. 2020.
18 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016a. Voto do Ministro Marco Aurélio. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/ noticiaNoticiaStf/anexo/RE657718.pdf. p. 5. Acesso em: 26 mai. 2020.
19 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016a. Voto do Ministro Marco Aurélio. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/ noticiaNoticiaStf/anexo/RE657718.pdf. p. 3-4. Acesso em: 26 mai. 2020.
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22 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016b. Voto do Ministro Edson Fachin. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2016/9/ art20160929-02.pdf. p. 18-20. Acesso em: 26 mai. 2020.
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24 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016b. Voto do Ministro Edson Fachin. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2016/9/ art20160929-02.pdf. p. 32. Acesso em: 26 mai. 2020.
25 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016c. Voto do ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/ arquivos/2016/9/art20160929-01.pdf. p. 2-3. Acesso em: 26 mai. 2020.
26 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016c. Voto do ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/ arquivos/2016/9/art20160929-01.pdf. p. 18-19. Acesso em: 26 mai. 2020.
27 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2016c. Voto do ministro Luís Roberto Barroso. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/ arquivos/2016/9/art20160929-01.pdf. p. 15-16. Acesso em: 26 mai. 2020.
28 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
29 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
30 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
31 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
32 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
33 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 657.718/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 2019. Degravação da sessão plenária. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=3xrJd49jGGc&feature=youtu.be. Acesso em: 26 mai. 2020.
34 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípios. Trad. Luís Carlos Borges. 2. ed. São Paulo: M. Fontes, 2005. p. 9.
35 DWORKIN, 2005. p. 101.
36 Ibid., p. 59.
37 DWORKIN, 1999. p. 200-203.
38 DWORKIN, 2005. p. 15.
39 DWORKIN, 1999. p. 451-452.
40 MAIA, Isabelly Cysne Augusto. Análise da ADPF n° 347e da inadequabilidade do Estado de Coisas Inconstitucional para a efetivação dos serviços públicos: por novos protagonistas na esfera pública democrática. 2018. 177 f. Dissertação (Mestrado) Curso de Direito, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018. Disponível em: http://www.repositoriobib.ufc.br/000049/0000492f.pdf. Acesso em: 03 jun. 2020.
41 MENDES, Conrado Hubner. Direitos fundamentais, separação de poderes e deliberação. 2008. 224 f. Tese (Doutorado) Curso de Ciência Política, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. p. 190.
42 (...) no one democratic institution would be sufficient to ensure consideration of all concerns relevant to democratic sustenance TULIS, Jeffrey K.. Deliberation Between Institutions. Debating Deliberative Democracy, [s.l.], Blackwell Publishing Ltd, p. 200-211, p. 201, 2003.
43 ROACH, Kent. Dialogic judicial review and its critics. Supreme Court Law Review (2nd), v. 23, p. 49-104, p. 103-104, 2004.
44 VALLE, Vanice Regina Lírio do. Dialogical constitutionalism manifestations in the Brazilian judicial review. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, v. 1, n. 3, p. 59-90, p. 85, set./dez. 2014.
45 LOPES FILHO, Juraci Mourão. Os precedentes judiciais no constitucionalismo brasileiro contemporâneo. 2. ed. Salvador: Juspodium, 2016. p. 267.
46 MACHADO, Clara; MARTINI, Sandra Regina. Desjudicialização da saúde, diálogos interinstitucionais e participação social: em busca de alternativas para o sistema. Revista Estudos Institucionais, v. 4, n. 2, p. 774796, 2018. p. 787.
47 Ibid., p. 789.
48 SCHAPIRO, Mario G. Discricionariedade desenvolvimentista e controles democráticos: uma tipologia dos desajustes. Revista Direito GV, v. 12, n. 2, p. 311-344, p. 337, 2016.
49 MARIANO, Cynara Monteiro; MAIA, Isabelly Cysne Augusto. Possíveis contribuições do Estado de Coisas Inconstitucionais para efetivação do serviço público de acesso a medicamento de alto custo: Análise dos recursos extraordinários nº 566.471/RN e n° 657.718/MG. Revista do Programa de Pós-graduação em Direito da UFC, Fortaleza, v. 38, n. 1, p. 391-416, p. 406, jun. 2018.
50 MARMELSTEIN, George. O Estado de Coisas Inconstitucional: uma análise panorâmica. In: OLIVEIRA, Pedro Augusto de; LEAL, Gabriel Prado (Org.). Diálogo Jurídicos Luso Brasileiros Volume 1 perspectivas atuais de Direto Público: o Direito em tempos de crise. Salvador: Faculdade Baiana de Direito, 2015b, p. 241264, p. 250-251.
51 BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 9. ed. Trad. Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.

Notas de autor

* Professor da graduação e da pós-graduação stricto sensu do Centro Universitário Christus (Fortaleza, Ceará, Brasil), sendo coordenador do programa de mestrado da instituição. Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Mestre e graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Procurador do Município de Fortaleza e advogado. E-mail: juracimourao@gmail.com.
** Doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com área de concentração em Direito, Estado e Pensamento Jurídico. Professora da Faculdade Ari de Sá (Fortaleza, Ceará, Brasil). Mestre e graduada em Direito pela UFC. Especialista em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Advogada. E-mail: isabellycysne@gmail.com.
*** Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Ceará (Fortaleza, Ceará, Brasil), com área de concentração em Direito, Estado e Pensamento Jurídico. Pós-graduando lato sensu em Filosofia e Teoria do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Graduado em Direito pela UFC. Advogado. E-mail: mcgserafim@gmail.com.


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