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O núcleo essencial do direito à liberdade de expressão no esporte a partir dos casos Colin Kaepernick e Carol Solberg
LUCAS BOSSONI SAIKALI
LUCAS BOSSONI SAIKALI
O núcleo essencial do direito à liberdade de expressão no esporte a partir dos casos Colin Kaepernick e Carol Solberg
The essential core of the right to freedom of expression in sports through the lens of the Colin Kaepernick and Carol Solberg cases
Revista Eurolatinoamericana de Derecho Administrativo, vol. 9, núm. 2, 2022
Universidad Nacional del Litoral
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Resumo: O posicionamento político dos esportistas é cada vez mais verificado nas arenas, campos e quadras do mundo. Atletas têm sido porta-vozes no meio político-social. No entanto, o que se percebe é que estas manifestações são limitadas tanto pela própria lex esportiva quanto pelas federações e instituições locais ligadas ao desporto. Neste sentido, a proposta deste estudo é a de verificar o núcleo essencial do direito fundamental à liberdade de expressão no esporte. Busca-se analisar os casos de Colin Kaepernick, atleta de futebol americano, e de Carol Solberg, atleta de vôlei de praia, especialmente no que toca à repercussão jurídica nos tribunais estadunidense e brasileiro. Baseado na pesquisa indireta de livros, artigos científicos e decisões judiciais, o artigo analisa, inicialmente, os casos supracitados com a finalidade de investigar quais os limites ao entendimento que foi dado ao direito à liberdade de expressão no esporte. Na sequência, demonstra-se que o esporte é parte importante do meio social, cultural e político, ainda que o Movimento Olímpico preze pela neutralidade política. Por fim, o estudo analisa qual o conteúdo essencial do direito fundamental à liberdade de expressão no âmbito esportivo, analisando os limites e restrições da Carta Olímpica e de tratados internacionais.

Palavras-chave: direito fundamentais, liberdade de expressão, restrições e limites, manifestação política no esporte, Carta Olímpica.

Abstract: The political stance of athletes is increasingly verified in arenas, fields and courts around the world. Athletes have been spokespersons in the political and social milieu. However, what can be seen is that these manifestations are limited both by the sports law itself and by the federations and local institutions linked to sports practice. In this sense, the purpose of this study is to verify the essential core of the fundamental right to freedom of expression in sport. It seeks to analyze the cases of Colin Kaepernick, American football athlete, and Carol Solberg, beach volleyball athlete and Wallace, especially with regard to legal repercussions in the US and Brazilian courts. Based on the indirect research, the article initially analyzes the aforementioned cases with the purpose of investigating the limits to the understanding given to the right to freedom of expression in sports. It is shown that sport is an important part of the social, cultural and political environment, even though the Olympic Movement values ​​its political neutrality. Finally, the study analyzes the essential content of the fundamental right to freedom of expression in sports, analyzing the limits and restrictions of the Olympic Charter and international treaties.

Keywords: fundamental rights, freedom of speech, restrictions and boundaries, political manifestation in sport, Olympic Charter.

Carátula del artículo

O núcleo essencial do direito à liberdade de expressão no esporte a partir dos casos Colin Kaepernick e Carol Solberg

The essential core of the right to freedom of expression in sports through the lens of the Colin Kaepernick and Carol Solberg cases

LUCAS BOSSONI SAIKALI**
Universidade Federal do Paraná, Brasil
Revista Eurolatinoamericana de Derecho Administrativo, vol. 9, núm. 2, 2022
Universidad Nacional del Litoral

Recepción: 04 Julio 2022

Aprobación: 15 Octubre 2022

1. INTRODUÇÃO

Duas situações chamaram a atenção durante a realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em julho e agosto de 2021. A primeira se refere à investigação do Comitê Olímpico Internacional acerca de um gesto da atleta Raven Saunders, dos Estados Unidos da América, durante a cerimônia do pódio de uma das competições. Saunders, após receber a medalha de prata, pôs seus braços sobre a cabeça imitando um “x”, o que poderia ser considerado uma infração à proibição de protestos durante as premiações.[1] O segundo caso diz respeito à recusa da atleta bielorrussa Kryscina Tsimanouskaya em embarcar num voo de volta ao seu país após ter sido retirada do seu quarto, na vila olímpica, por membros da delegação olímpica de seus país. Segundo a atleta, sua saída da equipe olímpica, ainda durante os Jogos, estava relacionada às críticas, feitas por Kryscina em sua rede social, sobre a negligência da comissão técnica.[2]

Numa primeira análise, os casos não parecem ter qualquer conexão, visto que tratam de atletas de diferentes nações e cujo protesto não se assemelha materialmente. Enquanto a estadunidense protestou contra a opressão racial e social, a atleta de Belarus denunciou que estaria sendo forçada por autoridades de Belarus a deixar os Jogos Olímpicos por conta de críticas aos seus treinadores. No entanto, parece evidente que há um ponto em comum: a luta política. Para a atleta estadunidense, seu gesto representa uma forma de lutar contra preconceitos e estereótipos. Para a atleta da Bielorússia, sua voz é uma forma de combater o cerceamento à sua liberdade de expressão e de opinião.

Seja como uma forma de apoiar uma causa ou de denunciar alguma injustiça, cada vez mais esportistas passaram a se posicionar politicamente. Foi exatamente isso que aconteceu durante a fase final da temporada 2019-2020 da liga estadunidense de basquetebol, a National Basketball Association (NBA). Naquela ocasião, o time Milwaukee Bucks se recusou a enfrentar o Orlando Magic após uma ação policial na qual um policial branco disparou sete vezes, pelas costas, contra um cidadão negro. Esta decisão teve um grande impacto e levou à uma série de movimentos, apoiados pela associação dos jogadores da liga, de suporte ao movimento Black Lives Matter e que buscavam conscientização sobre a importância do voto popular.

O que se percebe é que o ambiente esportivo vem se tornando cada vez mais um espaço de liberdade de expressão, de forma que os atletas se transformam também em vozes ativas no cenário político-social e cultural em nível nacional e mundial.[3] Contudo, há vozes populares que não concordam que as arenas, quadras, estádios ou ginásios sejam espaços para a liberdade de fala dos competidores e das atletas.[4] O próprio Comitê Olímpico Internacional (COI) também não é a favor de que mensagens de cunho político sejam transmitidas durante eventos oficiais, vide Regra 50 da Carta Olímpica, que será analisada com mais cuidado no decorrer deste texto.

O presente estudo está inserido neste contexto da liberdade de expressão no esporte. Busca-se compreender quais são os limites e restrições (e se eles existem) para a concretização deste direito fundamental, bem como qual o núcleo essencial deste direito. Com este intuito, o artigo possui quatro capítulos principais. Inicialmente serão analisados dois casos em que esportistas tiveram seu direito à liberdade de expressão discutido no âmbito judicial. O primeiro caso é o de Colin Kaepernick, atleta de futebol americano que passou a se ajoelhar na hora do hino estadunidense. O segundo caso é o da brasileira Carol Solberg, atleta de vôlei de praia que, ao final de uma partida, se manifestou contra o Presidente da República. O terceiro e último caso é acerca de publicação realizada nas redes sociais pelo atleta de vôlei brasileiro Wallace. Após, discorre-se acerca do impacto do esporte para a cidadania e como a prática esportiva, enquanto fenômeno cultural e social, está envolta no meio político, mesmo que a Carta Olímpica busque a neutralidade política como princípio do olimpismo. Finalmente, o artigo investiga quais as restrições e os limites à liberdade de expressão no esporte, de forma a entender os limites no âmbito nacional e internacional, bem como compreender o conteúdo essencial deste direito fundamental. Conclui-se, ao final, que a vedação à promoção de discursos, ideais e pensamentos que podem ser verdadeiros catalisadores de direitos fundamentais infringe o núcleo essencial do direito à liberdade de expressão.

A metodologia empregada no estudo é a indutiva, por meio da qual se analisam dois casos concretos e as normas sobre o tema para, então, chegar à uma conclusão sobre o conteúdo essencial do direito fundamental à liberdade de expressão no esporte. O método de pesquisa é a documentação indireta, por meio da leitura e análise de livros, artigos científicos, decisões judiciais, dentre outros.

2. O CASO COLIN KAEPERNICK: BANDEIRA AMARELA PARA O ATO DE SE AJOELHAR DURANTE O HINO

O ato do árbitro jogar uma flanela amarela em campo representa, no futebol americano, a ocorrência de uma falta. Esta falta pode se dar tanto por um contato proibido de jogo quanto por uma atitude considerada antidesportiva pela arbitragem. A punição é a perda de jardas (possibilitando que o adversário avance em direção à endzone, isto é, a área de pontuação) ou, em casos mais graves, a expulsão do jogador da partida. O caso de Colin Kaepernick envolve esta segunda forma de punição. Contudo, a "bandeira amarela" foi jogada fora das quatro linhas.

Durante a pré-temporada da liga de futebol americano estadunidense (National Football League ou NFL), Colin Kaepernick – então Quarterback reserva do San Francisco 49ers – optou por sentar, em vez de se manter de pé, durante a apresentação do hino nacional do Estados Unidos da América. No jogo seguinte, o jogador decidiu se ajoelhar durante o hino. Uma foto do jogador nesta posição foi publicada nas redes sociais e, em questão de horas, a imagem viralizou. Após a partida, Kaepernick esclareceu que o ato de se ajoelhar era uma forma de protestar contra a injustiça racial no país, uma vez que ele não iria “se levantar e demonstrar orgulho à uma bandeira por um país que oprime pessoas negras e pessoas de cor”.[5] Embora Colin tenha sido o maior representante desse movimento, uma série de jogadores da NFL passou a se ajoelhar durante a execução do hino nacional.[6]

Nenhuma pena disciplinar foi endereçada ao jogador tanto pela NFL quanto pela sua equipe. Inclusive, a própria liga chegou a afirmar que os jogadores são encorajados, mas não obrigados, a se manter de pé durante o hino dos EUA.[7] Contudo, após optar por não renovar seu contrato em meados de março de 2016, o jogador nunca mais foi contratado por outro time da liga e nem, ao menos, convidado para participar de um try-out (uma espécie de entrevista de emprego, onde o jogador demonstra suas habilidades durante um treinamento) por nenhuma das outras trinta e uma equipes da liga.

Diante dessa situação, em meados de 2017, Colin Kaepernick ajuizou uma ação, no formato de uma queixa,[8] requerendo também uma solução pela método da arbitragem, alegando que os donos e os diretores das equipes, além da própria NFL, conspiraram para impedi-lo de trabalhar, treinar e até mesmo de realizar try-outs (testes) para as equipes da NFL. Segundo o atleta, isto foi uma resposta aos seus protestos durante o hino nacional, bem como uma resposta às pressões do então Presidente Donald Trump.[9] Em suma, a queixa de Kaepernick sustentava que o conluio era evidente na medida em que (i) era estaticamente impossível que ele não tivesse sido contratado ou chamado para um treino e que (ii) uma das causas para essa negligência era o racismo dos donos das equipes, bem como que (iii) não havia qualquer regra que proibisse qualquer jogador de se ajoelhar durante o hino e que (iv) o direito ao protesto era garantido pela Primeira Emenda.[10]

A queixa de Kaepernick também afirma que as equipes violaram o Artigo 17, Seção 1, do Acordo Coletivo de Trabalho (Collective Bargaining Agreementou CBA) da NFL, que proíbe os clubes de concordarem entre si, expressa ou implicitamente, para limitar as negociações, ofertas ou termos de condições de emprego em relação a qualquer jogador. No entanto, de acordo com a CBA, as equipes são livres para negar conversas ou negociações com qualquer jogador sob qualquer contexto não abarcado pela Seção 1 do Artigo 17. Ademais, a Seção 2 deste mesmo artigo não requer que as equipes revelem seus motivos para negar a contratar um jogador. Isto é, os clubes são absolutamente livres para contratar e negociar com quaisquer jogadores que quiserem, a seu bel-prazer, desde que esta negativa não seja uma consequência de um conluio entre as equipes.

Ao analisar o fundamento constitucional da queixa ajuizada por Kaepernick, Marc Edelman investigou se o Direito Constitucional estadunidense protege um jogador da NFL de ser demitido (ou não contratado) por protestar politicamente durante a execução do hino nacional. Em uma primeira análise, o autor debateu a Primeira Emenda à Constituição dos EUA, segundo a qual o governo não poderá “restringir a liberdade de expressão ou de imprensa, bem como o direito da população de se reunir pacificamente e de demandar ao Estado uma queixa para reparação de dados”.[11] Para Edelman, a Primeira Emenda não protege qualquer empregado que é demitido por conta de sua opinião, mas proíbe que o Estado limite o direito à liberdade de expressão de um empregado em matéria de interesse público, desde que este direito não interfira substancialmente no ambiente de trabalho. No caso da NFL, os clubes não são agentes públicos ou estatais, mas sim agentes privados, e, portanto, não teriam nenhuma obrigação constitucional de garantir aos seus empregos a liberdade de se expressar a qualquer momento, a não ser que exista um nexo entre a negativa do empregador, agente privado, e do Governo.[12]

Por outro lado, Edelman também analisou se a demissão de um jogador da NFL por protestar pode ser considerada uma ação estatal. Embora em um momento inicial conclua-se que não há qualquer relação entre a demissão e o Estado, o professor estadunidense entende que podem haver dois argumentos neste sentido. O primeiro é o de que algumas equipes da NFL jogam suas partidas em estádios públicos ou então, ao menos, em estádios que são subsidiados pelos municípios.[13]A segunda possibilidade envolve as repetidas afirmações do então Presidente Donald Trump, que, por vezes, ameaçou a remover isenções tributárias das equipes caso elas não demitissem os atletas que protestaram durante a execução do hino. Para Edelman, isto pode equivaler a uma ação estatal, diretamente pelo Poder Executivo, para conter o discurso político, aplicada por intermédio dos proprietários de times da NFL.[14]

De toda forma, independentemente do fundamento constitucional para a sua alegação, bem como do difícil ônus de prova em evidenciar a existência de um conluio entre os proprietários das equipes e a NFL,[15] as partes anunciaram que as queixas foram resolvidas e que o conteúdo do seu acordo extrajudicial era confidencial.[16]

3. O CASO CAROL SOLBERG: O APITO CONTRA A MANIFESTAÇÃO POLÍTICA NAS AREIAS

No vôlei de praia existem dois tipos de punições: as advertências e as sanções. Elas são aplicadas pela arbitragem no decorrer do jogo. As advertências são de caráter preventivo e as sanções de caráter definitivo. As sanções mais graves são a penalidade, expulsão e desclassificação. No caso da jogadora de vôlei de praia Carol Solberg, contudo, a sanção – assim como no caso de Kaepernick – foi imposta fora das areias, sem qualquer envolvimento do árbitro da partida.

A atleta foi denunciada pela Procuradoria vinculada ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) porque no dia 20 de setembro de 2020, durante uma etapa do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, nos termos da peça acusatória, “ao término da partida (...), pegou o microfone da estrutura do evento que estava até então sendo utilizado por sua parceira de dupla, a atleta Talita, para se manifestar politicamente gritando as palavras ‘só para não esquecer: fora Bolsonaro’”. Esta atitude, segundo a Procuradoria, seria incompatível aos artigos 191, inciso III (deixar de cumprir o regulamento da competição),[17] e 258 (assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras do código) do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), passíveis de punição até cem mil reais e de suspensão de até seis partidas, respectivamente.[18]

A dispositivo do regulamento do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia - OPEN que Carol teria – de acordo com a denúncia – descumprido sustenta que a atleta participante da competição “se compromete a não divulgar, através dos meios comunicações, sua opinião pessoal ou informação que reflita críticas ou possa, direta ou indiretamente, prejudicar ou denegrir a imagem da CBV e/ou os patrocinadores e parceiros comerciais” da competição.[19]

No dia 13 de outubro de 2020, a 1ª Comissão Disciplinar do STJD deu procedência à denúncia, confirmando a infração da atleta ao regulamento por 3 votos a 2. Também foi aplicada uma multa de R$ 1.000,00 (mil reais) à Carol Solberg, convertida em advertência.[20] Após recurso da atleta, o caso foi então julgado pelo Pleno do tribunal desportivo. No dia 16 de novembro, o Tribunal Pleno da Corte Desportiva reverteu a decisão da 1ª Comissão Disciplinar em favor de Carol Solberg, dando provimento ao recurso para reformar a decisão e absorver a jogadora de vôlei por 5 votos a 4.[21]

Os votos favoráveis à manutenção da sanção de advertência foram dos auditores Eduardo Affonso de Santis Mendes de Farias Mello, relator do caso, Célio Salim Thomas Junior, Vantuil Gonçalves e de Alexandre Beck Monguilhott, Presidente do Tribunal Pleno. Em suma, os argumentos contrários à Carol Solberg sustentavam que: (i) eventos esportivos não são o local apropriado para manifestação política; (ii) o regulamento da competição é claro ao impedir que atletas manifestem opiniões políticas pessoais nos eventos esportivos organizados pela Confederação Brasileira de Vôlei; e (iii) as falas da atleta tinham o potencial de prejudicar as marcas patrocinadoras ou parceiras do evento.

Favoráveis à absolvição, votaram os auditores Gilmar Nascimento Teixeira, Raquel Lima, Julia Gelli Costa, Tamoio Athayde Marcondes e Milton Jordão. Na visão destes auditores do STJD, a fala da autora em momento algum prejudicou ou ofendeu a CBV, patrocinadores ou parceiros da competição, na medida em que a opinião destilada pela atleta não reflete, necessariamente, a opinião da confederação e dos demais atores envolvidos na execução do evento. Inclusive, entenderam que a demonstração do prejuízo causado à CBV e aos patrocinadores seria essencial para a condenação de Carol Solberg. Ademais, sustentaram que não há proibição explícita no regulamento da confederação que impeça a manifestação da atleta, não sendo possível adverti-la sob este argumento.[22]

Embora tenha sido absolvida pelo Tribunal Pleno do STJD, a mera denúncia contra Carol Solberg expõe o ambiente conflituoso que pode ser o entrelaçamento entre esporte e política.[23] A denúncia também aponta para uma falta de isonomia da Procuradoria vinculada ao tribunal esportivo. Isto porque, em 2018, durante as eleições presidenciais, dois jogadores de vôlei da Seleção Brasileira (Wallace e Maurício Souza) expressaram apoio ao atual Presidente da República ao indicarem o número 17 (em referência ao número partidário do PSL, então partido de Jair Bolsonaro) para câmeras após um jogo da equipe nacional. Na ocasião, embora uma foto deste momento tenha sido publicada pela própria Confederação Brasileira de Vôlei nas redes sociais da organização (e pouco tempo depois deletada), nenhum dos atletas foi denunciado ao STJD. Além da foto ter sido deletada, a Confederação Brasileira de Vôlei soltou uma nota afirmando que não compactua com manifestações políticas dos atletas, mas que "a entidade acredita na liberdade de expressão e, por isso, não se permite controlar as redes sociais pessoais dos atletas, componentes das comissões técnicas e funcionários da casa", apenas visando garantir que não sejam mais verificadas manifestações coletivas.[24] Embora a nota comente sobre a impossibilidade de controle das redes sociais dos atletas, vale notar que a publicação da imagem com a suposta manifestação pró-Bolsonaro foi realizada nas redes sociais da própria Confederação.

No caso da Carol Solberg, a nota publicada pela CBV teve um tom mais crítico. A entidade afirmou que repudia "de forma veemente (...) a utilização dos eventos organizados pela entidade para realização de quaisquer manifestações de cunho político". Para a confederação, a atitude da atleta "em nada condiz com a atitude ética que os atletas devem sempre zelar" e manchou a primeira etapa do campeonato por conta de "um ato totalmente impensado praticado". Afirmou, ainda, que tomaria todas as medidas cabíveis para evitar que atos como esse, "que denigrem a imagem do esporte", não voltassem a ser praticados.[25]

Embora o Código de Ética da CBV estabeleça que o combate à discriminação de qualquer gênero, dentre os quais à preferência política de cada um, é um princípio ético do voleibol brasileiro,[26] é possível afirmar que a reação aos fatos ocorridos em 2018 e 2020 foram de intensidades diferentes. Inclusive, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro cobrou explicações à Confederação antes do julgamento de Carol Solberg na 1ª Câmara Disciplinar do STJD. O MPF-RJ solicitou esclarecimentos sobre como a entidade procedeu "em relação a casos análogos de manifestação política por parte de atletas, notadamente o ocorrido em setembro de 2018, em que dois jogadores da seleção brasileira de vôlei comemoram uma vitória da equipe fazendo alusões a número de candidato à presidência".[27]

O órgão, inclusive, ressaltou que o Supremo Tribunal Federal, no bojo do Recurso Extraordinário 201.819/RJ, já esclareceu que os direitos fundamentais se aplicam também às relações privadas, de forma que a atividade disciplinar de uma confederação esportiva deve atender ao princípio da isonomia, vedado tratamento desigual, no qual alguns são favorecidos e outros perseguidos.[28]

No caso da Carol Solberg, parece ser correto afirmar a existência de um conflito entre o art. 5º, inc. IV, da Constituição de 1998 – que garante a livre manifestação do pensamento – com o regulamento da confederação desportiva e com o regramento da competição. Estes proíbem a livre manifestação da atleta, limitando sua liberdade de expressão. Numa primeira análise, a inconstitucionalidade desses dispositivos parece evidente. Questiona-se, nesse sentido, o poder e a possibilidade de regulamentos desportivos proibirem a livre expressão de ideias dos atletas em benefício do interesse comercial das marcas patrocinadoras.[29]

De toda forma, é necessária uma análise mais cuidadosa com a finalidade de compreender o impacto do esporte como um fenômeno social e da sua importância para a cultura do povo, bem como quais os limites e as restrições ao direito à liberdade de expressão no cenário esportivo.

4. O CASO WALLACE: A INCITAÇÃO PARA ALÉM DO ÂMBITO DESPORTIVO

Ao contrário do caso de Carol Solberg e de Colin Kaepernick, o caso de Wallace não decorre de uma atitude dentro dos campos ou das quadras desportivas, mas sim de uma postagem realizada pelo atleta na rede social Instagram. Em publicação (de stories) no dia 30 de janeiro de 2023 (e poucas horas depois deletada), o oposto, atleta olímpico pela Seleção Brasileira, indagou se algum dos seus seguidores “daria um tiro na cara” do atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

A repercussão social, política e jurídica da postagem foi rápida. Além de ter sido objeto de comentários da atual Ministra do Esporte do Brasil,[30] a Advocacia-Geral da União (AGU) solicitou ao Comitê Olímpico do Brasil (COB) e à CBV a instauração de procedimentos administrativos em desfavor do jogador.[31] Na visão da AGU, Wallace teria violado o art. 243-D do Código Brasileiro de Justiça Desportiva,[32] os artigos 8º e 34 do Código de Conduta Ética do COB,[33] o art. 43 do Código de Ética e Disciplina da CBV,[34] bem como art. 286 do Código Penal Brasileiro (ao ter incitado o cometimento de crime).[35]

No âmbito do procedimento instaurado pelo Comitê Olímpico Brasileiro, o Conselho de Ética do COB (CECOB), em decisão no bojo do Processo Ético nº 001/2023, suspendeu o atleta por 90 (noventa) dias de todas as atividades relacionadas ao COB, “bem como as entidades/organizações esportivas que estão sob a égide do sistema olímpico brasileiro, tal como a Confederação Brasileira de Voleibol e as Federações estaduais e locais de voleibol”. Além disso, suspendeu o jogador por 1 (um) ano de representar a Seleção Brasileira de Voleibol.[36]

Tendo em vista que a suspensão determinada pelo CECOB o impediria de participação da fase final da Superliga (campeonato nacional de voleibol), Wallace buscou reverter a decisão no Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol. E obteve sucesso.[37] De toda forma, a CBV, mesmo com a decisão favorável do STJD, optou por levar a disputa para análise do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA). O órgão privado entendeu que a decisão do STJD prevalece até julgamento final do Mandado de Garantia ou de eventual análise de mérito de eventual recurso.[38] Com decisão favorável, Wallace atuou nas partidas finais da Superliga e, ao fim e ao cabo, sagrou-se – junto de sua equipe, Sada Cruzeiro – campeão.

Entretanto, o descumprimento da decisão do CECOB levou à publicação de nova decisão do Comitê de Ética do COB. Em sua nova decisão no bojo do Processo nº 001/2023, o CECOB argumentou, em suma, que: (i) a atitude de Wallace rompeu com padrões éticos esperados de um esportista e que vão além de intercorrências contratuais ou do jogo; (ii) a CAMB era terceiro alheio ao processo em curso, “sem legitimidade ou efetividade para qualquer opinião de sua parte, ou de seus árbitros, sobre o caso”; (iii) não há qualquer disposição que autorize que a decisão do Tribunal Desportiva da própria entidade interessada tenha prevalência sobre decisão do Conselho de Ética do COB, que é entidade superior no sistema; e (iv) as atitudes da CBV na tentativa de se evadir das sanções impostas pelo CECOB são perigosas para “a educação e para o sistema olímpico”.[39]

A partir do exposto, o CECOB determinou o agravamento das sanções previamente estabelecidas, decidindo, por unanimidade, dentre outras sanções:

  • agravar as suspensões punitivas de 90 dias para 5 (cinco) anos e de 1 (um) ano para 5 (cinco) anos aplicadas ao atleta Wallace Leandro de Souza, mantendo-o afastado por este período de todo e qualquer evento referente ao voleibol e que seja caracterizado como evento de Federação, ou Confederação ou Comitê Olímpico, e por via de consequência:

    • Oficiar ao senhor ministro da Justiça dando conta do presente procedimento, e perquiridor acerca da existência de inquérito policial, representação criminal ou ação penal acerca dos fatos aqui noticiados, tendo por inculpado o referido atleta.

  • Suspender por 6 (seis) meses a Confederação Brasileira de Voleibol do sistema COB, e por via de consequência:

    • Determinar ao Comitê Olímpico do Brasil que suspenda todo e qualquer repasse financeiro - de quaisquer fontes, origens ou rubricas - à Confederação Brasileira de Voleibol, inclusive referentes à lei Agnello/Piva e decorrentes de loterias e jogos de prognósticos.

    • Determinar ao Comitê Olímpico do Brasil que suspenda o auxílio material à Confederação Brasileira de Voleibol, aí incluído cessão de espaços físicos, material humano, auxílio tecnológico ou de know how.

    • Oficiar ao Ministério dos Esportes comunicando a suspensão de todo e qualquer vínculo entre a CBV e o COB - e por via de consequência do movimento olímpico, por idêntico prazo, para fins de cancelamento de todo e qualquer financiamento ou ajuda material à referida Confederação que tenha por pressuposto a sua vinculação ao Comitê Olímpico do Brasil e ao movimento olímpico. Tudo sem prejuízo de outras sanções que a senhora ministra entender cabíveis.

    • Oficiar ao Banco do Brasil e demais entidades - públicas ou privadas - que tenham vínculo com a CBV comunicando a suspensão por 6 (seis) meses da Confederação Brasileira de Voleibol da sua relação com o COB e movimento olímpico para fins de cancelamento de todo relacionamento patrimonial ou não patrimonial que as entidades privadas possuam com a CBV e que tenha por pressuposto a participação da entidade no sistema Olímpico, cujo vínculo deixa de existir na presente data. Tudo sem prejuízo das demais medidas que quaisquer entidades desejem tomar.

    • Oficiar ao TCU - Tribunal de Contas da União - comunicando a suspensão do vínculo por 6 (seis) meses sugerindo Tomada de Contas Especial tendo por objeto os valores públicos federais aplicados sob o pálio da entidade ora suspensa, inclusive acerca dos valores pagos pela entidade à guisa de honorários e serviços de arbitragem ao CBMA, com o objetivo de frustrar decisão da Entidade Máxima do Olimpismo Brasileiro.

  • Suspender por 1 (um) ano de todas as atividades esportivas vinculadas ao COB e seus filiados o senhor Radamés Lattari Filho, presidente em exercício da CBV, que não poderá exercer a função de presidente de Confederação, ou quaisquer outra vinculada - direta ou indiretamente - ao Comitê Olímpico do Brasil por idêntico prazo e a partir da presente data.

Agravou-se a pena de seis meses de suspensão ao atleta Wallace para uma pena de suspensão de cinco anos, proibindo o atleta de participar de qualquer evento referente ao voleibol ligado à Federação, à Confederação ou ao Comitê Olímpico. Em relação ao CBV, a decisão, além de suspender a Confederação do sistema olímpico por seis, determinou que o Comitê Olímpico do Brasil, o Ministério dos Esportes e o Banco do Brasil cessassem qualquer tipo de financiamento ou contrato de relacionamento que tivessem com a entidade. O Presidente, em exercício, da CBV também penalizado com a impossibilidade de presidir qualquer Confederação ou entidade ligada ao COB por um ano. A AGU manifestou, em publicação em sítio eletrônico oficial, integral apoio à decisão do CECOB e afirmou que, no que coubesse à entidade, auxiliaria o COB no cumprimento da decisão.[40]

Malgrado a rígida decisão prolatada pelo, o Comitê Olímpico Brasileiro, a CBV e o atleta Wallace Souza, no dia 15 de maio de 2023 (treze dias após a decisão), firmaram Termo de Compromisso e Transição Ético-Disciplinar com a finalidade de encerrar o litígio entre as partes no âmbito do CECOB.[41] De maneira geral, as partes concordaram em diminuir as penalidades impostas ao atleta, retirar todas as penalidades determinadas à CBV e ao Presidente, em exercício, da entidade, além de obrigar a CBV a arcar, com recursos próprios, com campanhas junto aos atletas de postura ética nas redes sociais e de esclarecer que o COB não reconhece – pelo menos para fins do Movimento Olímpico – de jogo realizado pelo atleta enquanto vigente a suspensão inicialmente imposta. Veja-se:

  1. 1. Pelo presente Termo, as Partes buscando encerrar o litígio de ordem ético-disciplinar analisado pelo CECOB, resolvem transacionar e estabelecer a pena final ao Atleta em 1 (um) ano de suspensão da participação do Atleta em todo e qualquer competição sob a responsabilidade do COB, nos termos do artigo 3º inciso VI do Estatuto do COB (Jogos Olímpicos, Jogos Pan-Americanos, Jogos Sul-americanos e outros de igual natureza) e, ainda, 90 (noventa) dias à contar da data de 02/05/2023, data da última decisão do CE, de qualquer outra competição oficial do sistema brasileiro de voleibol, incluindo competições da CBV e Federações de voleibol.
  2. 2. O COB não reconhece a validade do resultado do jogo Minas Tênis x Sada/Cruzeiro realizado em 30/04/2023, em razão da participação do Atleta afastado por determinação do CECOB, resultado que permanece nulo, em todos os efeitos, para o Movimento Olímpico.
  3. 3. Como medida pedagógica, a CBV se obriga a arcar com campanha de valorização da postura ética de atletas nas redes sociais, sob a coordenação do Compliance Officer do COB, sendo que a origem dos valores que serão utilizados para o custeio da campanha, deverão ser oriundos de receitas próprias da CBV.
  4. 4. O COB - através do CECOB - se compromete a retirar qualquer pena imposta à CBV.
  5. 5. COB - através do CECOB - se compromete a retirar qualquer pena imposta ao Presidente em exercício da CBV, o Sr. Radamés Lattari Filho.
  6. 6. As Partes se comprometem a não questionar o presente Termo em nenhum juízo, instância ou Tribunal, seja no âmbito esportivo ou na justiça comum, bem como de desistir e renunciar a todas as medidas judiciais e quaisquer outros recursos ou ações referentes ao presente objeto, fazendo cumprir os termos aqui estabelecidos na sua totalidade.

A análise do caso do atleta Wallace traz à baila a seguinte questão: o atleta também pode ser julgado enquanto atleta, sendo sancionado nas normas de Direito desportivo, mesmo por atitudes fora do âmbito do esporte? O oposto do Sada Cruzeiro fez a publicação em sua rede social, privada. Este, inclusive, foi o argumento utilizado pela Procuradoria do STJD do Voleibol para arquivar a denúncia realizada pela AGU. De acordo com a referida Procuradoria, o único elo entre Wallace a o tribunal desportivo é o fato dele ser um atleta, não havendo, portanto, requisitos suficientes para justificar eventual processo desportivo disciplinar.[42] A AGU requereu ao STJD do Voleibol a reconsideração do arquivamento da denúncia.

Arguiu a AGU, no pedido de reconsideração, que o caput do art. 293-D do Código Brasileiro de Justiça Desportiva não exige que a conduta de incitação ao ódio ou à violência seja realizada no âmbito esportivo ou competitivo. Da mesma maneira, argumentou que o parágrafo único do referido artigo é claro ao indicar que há um tipo específico para aqueles que incitam o ódio ou a violência “por meio da imprensa, rádio, televisão, Internet ou qualquer meio eletrônico”.[43]

Parece ser correto concluir que a conduta de Wallace se amolda perfeitamente ao tipo apresentado no art. 243-D da CBJD. O atleta, figura pública e de sucesso, utilizou de suas redes sociais não apenas para externar sua opinião política, mas também para incitar o ódio e a violência contra o Presidente da República. Também parece ser certo aduzir que a segunda decisão emitida pelo CECOB no caso – após o descumprimento das sanções pelo atleta e pela CBV – implicaria em graves consequências para o voleibol brasileiro, especialmente diante do ciclo olímpico com vistas às Olimpíadas de Paris, em 2024.

Para além desta questão, cumpre ressaltar que a celebração do Termo entre as partes envolvidas impediu, ao fim e ao cabo, que uma conduta específica de um único atleta – passível de punição nas esferas administrativa e criminal – tivesse impactos que iriam muito além de eventuais sanções ao jogador.

Por conta disto, e com base nos três casos expostos, faz-se necessária uma análise cuidadosa com a finalidade de compreender o impacto do esporte como um fenômeno social e da sua importância para a cultura do povo, bem como quais os limites e as restrições ao direito à liberdade de expressão no cenário esportivo.

5. ESPORTE: DIREITO SOCIAL E PLATAFORMA PARA O PENSAMENTO POLÍTICO

Em estudo elaborado por Felipe Capan e Fernando Augusto Starepravo, verificou-se que o esporte somente teria adquirido um status constitucional a partir da preocupação das Constituições com o bem-estar social, assumindo o esporte como um direito social por conta de sua relação com a qualidade de vida.[44] No Brasil, a Constituição de 1988 garante no artigo 217 que é dever do Estado fomentar as práticas desportivas formais e não-formais, sendo necessário também que o Poder Público incentive o esporte enquanto lazer como forma de promoção social (§ 3º). Neste liame, a novel Lei Federal nº 14.597, de 14 de junho de 2023 (conhecida como Lei Geral dos Esportes), no seu art. 3º, § 1º, dispôs que “a promoção, o fomento e o desenvolvimento de atividades físicas para todos, como direito social, notadamente às pessoas com deficiência e às pessoas em vulnerabilidade social, são deveres do Estado e possuem caráter de interesse público geral”.

De toda forma, é importante destacar a diferença entre o direito à prática esportiva e o direito de acesso à prática esportiva. Segundo Pachot Zambrana, o primeiro caso se refere a um direito de primeira dimensão, isto é, de liberdade. O segundo caso, contudo, se refere à um direito de segunda dimensão, ou seja, tomado por um caráter social que demanda prestações por parte do Estado.[45] Nesse liame, Jorge Reis Novais lembra que a natureza reguladora e integradora das Constituições de Estado social de Direito, aliadas às virtualidades expansionistas da consagração dos direitos fundamentais econômicos, sociais e culturais, tende a elevar à natureza de bens constitucionais praticamente todos os valores relevantes da vida em comunidade.[46]

A prática desportiva, embora seja uma forma de garantir o lazer ao povo, não se limita a um mero exercício físico: representa, além da profissão dos atletas e de todos aqueles que, de alguma, forma estão envolvidos com esta prática em nível amador e profissional, uma maneira de desenvolver e aprimorar o ambiente social.[47] A prática desportiva está ligada ao caminhar histórico da própria civilização, o que pode ser constatado pela evolução do esporte ao longo do tempo. Na antiguidade, os Jogos Olímpicos homenageavam deuses e deusas por meio de cerimônias religiosas. Na idade média, embora as homenagens às divindades não fizessem mais parte da agenda desportiva, a vinculação entre esportes e religiosidade se manteve por conta do papel da Igreja. Hoje, por sua vez, com o retorno dos Jogos Olímpicos na Idade Moderna, é possível verificar que as Olimpíadas, marcadas pela competitividade entre atletas, enfatizam o nacionalismo.

Para Eneida Desiree Salgado e Guilherme Charles, esta mudança levou a "uma politização na conquista de recordes e de número de medalhas".[48] No mesmo sentido, Filipe Mostaro entende que, com a mudança de postura dos Estados a partir do século XX, os Jogos Olímpicos "não representam apenas a confraternização entre os povos ou a busca de um melhor desenvolvimento humano, mas também a disputa de interesses políticos e econômicos de Estados e corporações".[49]

De acordo com James Nafziger, a intervenção política no esporte pode ser descrita como um paradigma de três níveis. O primeiro nível envolve mera assistência financeira governamental, que é aceitável e frequentemente incentivada; o segundo nível incorpora a administração governamental direta ou indireta do esporte, que geralmente é controlada por leis e políticas nacionais; e o terceiro nível de intervenção política engloba a exploração do esporte pelo governo tanto por eventualmente sediar grandes eventos esportivos quanto por meios como boicotes, propaganda nacionalista, recusa de vistos e atividades de inteligência secretas.[50]

Este espaço de disputa, tanto pela competição desportiva quanto pela competição política, evidencia que o espaço cosmopolita e globalizado do esporte está posicionado para conectar pessoas, nações, culturas e religiões.[51] A arena esportiva parece ser, portanto, um espaço ideal para a disseminação de ideias e de pensamentos – que, inclusive, com o avançar dos anos, possui cada vez mais espectadores.[52] Segundo Genevieve Lakier, este espaço, além de ter o potencial para alcançar a audiência por meio de transmissão de ideias, também é um ambiente naturalmente expressivo, na medida em que "há uma orientação explícita nos esportes direcionados ao público, estabelecendo uma forte presunção de uma mensagem está sendo transmitida".[53] Isto parece explicar o motivo pelo qual atletas são usualmente vistos como heróis e heroínas na sociedade, de tal maneira que seus comportamentos têm um forte impacto social e cultural, na medida em que podem influenciar o comportamento de seus fãs.[54] Portanto, parece ser correto afirmar que as decisões e preferências dos(as) atletas, políticas ou morais, têm efeitos sociais e políticos.

Um exemplo marcante do impacto do posicionamento político no esporte ocorreu durante os Jogos Olímpicos de 1968, realizados na Cidade do México. Marcado por uma atmosfera política tensa, haja vista o contexto de bipolarização mundial na Guerra Fria, dois atletas estadunidenses protestaram no pódio da prova dos 200 metros rasos (do Atletismo). Tommie Smith e John Carlos levantaram um de seus braços, cerrando os punhos vestidos com uma luva preta, com o propósito de chamar a atenção para a violência e a discriminação raciais no seu país. Como resposta a esta manifestação, mesmo que silenciosa, os atletas foram expulsos da delegação dos Estados Unidos da América.[55] De maneira diametralmente oposta, nestes mesmos Jogos de 1968, George Foreman, pugilista negro dos EUA, após vencer a luta final e ganhar a medalha de ouro, passeou pelo ringue tremulando a bandeira estadunidense diante dos aplausos do comitê olímpico de seu país.[56]

Veja-se, portanto, que o impacto do posicionamento político dos atletas vai além do âmbito desportivo. Haja vista que a prática desportiva é um fenômeno social, cultural e, também, político, as arenas, estádios e quadras ganham o espaço da mídia (e, assim, do mundo). No entanto, para Anmol Jain, embora esse poder intrínseco das atividades esportivas para promover os direitos sociais e direitos humanos seja reconhecido, a ideia de que o esporte possa atuar como um instrumento ou ferramenta para garantir estes direitos têm sido constantemente negligenciada.[57]

No caso de Colin Kaepernick, seu protesto durante a execução do hino nacional dos EUA voltou a ganhar atenção quando o atleta se tornou o rosto de um comercial de sucesso da Nike intitulado "Acredite em algo, mesmo que isso signifique sacrificar tudo".[58] A campanha publicitária parecia indicar que o atleta havia perdido a posição de Quarterback na NFL não por ser pior do que outros jogadores, mas por conta do seu ativismo social, o que levou a uma série de críticas por parte daqueles que entendiam que a Nike desrespeitou a bandeira dos EUA.[59] Um estudo empírico realizado em relação à reação popular (por parte da população dos Estados Unidos da América) do comercial, identificou que as pessoas que se identificam como Democratas com níveis mais altos de educação aprovam a politização do esporte, enquanto Republicanos, homens com mais de 50 anos de idade, têm níveis mais baixos de aprovação. Segundo a pesquisa, a descoberta reflete a verdadeira resposta do público à campanha de marketing da Nike, na medida em que o próprio Colin Kaepernick e várias figuras políticas Democratas falaram publicamente sobre a importância de se concentrar nas questões sociopolíticas mais amplas que sublinham o propósito da campanha como um todo, enquanto homens republicanos mais velhos, dentre os quais o então Presidente, Donald Trump, criticaram persistentemente essa atitude, argumentando que a arena esportiva não deve ser politizada.[60]

Como bem apontam Salgado e Charles, "se os atletas são seres humanos historicamente situados, sua autonomia individual e sua liberdade de expressão acabam alcançando também a esfera política". Portanto, acreditar numa lógica esportiva segundo a qual a harmonia entre povos somente seria mantida se isolada de quaisquer manifestações políticas, faz calar essa relevante dimensão da cidadania, "tratando como instrumentos de países e corporações pessoas cuja dignidade deve ser garantida na esfera pública e no âmbito privado".[61] Contudo, embora pareça evidente que esta esfera da personalidade e que o posicionamento político são maneiras de garantir o uso das arenas esportivas como plataformas sociais,[62] o Comitê Olímpico Internacional não parece enxergar dessa maneira.

É a Carta Olímpica que rege o Movimento Olímpico e que serve de norma-base para a regulação da grande maioria dos esportes ao redor do mundo, estabelecendo desde os princípios do olimpismo até os impactos externos (sociais, políticos, dentre outros) sobre a prática desportiva. Dentre os princípios fundamentais do Movimento Olímpico está a previsão de que as entidades desportivas devem ser politicamente neutras, ainda que se reconheça que o esporte ocorra dentro da estrutura da sociedade,[63] isto é, que a prática desportiva não é um fenômeno isolado.[64] Para além de outras determinações que envolvem, por exemplo, a manutenção da unidade do Movimento Olímpico por meio da neutralidade política (Regra 2.5), o dispositivo que coíbe as manifestações políticas no esporte é a Regra 50 da Carta Olímpica, com conteúdo amplo, veja-se:

50 Advertising, demonstrations, propaganda

1. Except as may be authorised by the IOC Executive Board on an exceptional basis, no form of advertising or other publicity shall be allowed in and above the stadia, venues and other competition areas which are considered as part of the Olympic sites. Commercial installations and advertising signs shall not be allowed in the stadia, venues or other sports grounds.

2. No kind of demonstration or political, religious or racial propaganda is permitted in any Olympic sites, venues or other areas.[65] (o grifo é nosso)

Da análise da Regra 50.2, conclui-se que não são permitidas manifestações ou propagandas políticas, religiosas ou raciais em qualquer local que componha a estrutura das Olimpíadas. Aqueles casos que não sejam regulamentados pela bye-law do Rule 50(que esmiúça detalhes da aplicação deste dispositivo) poderão ser abordados por meio das Diretrizes elaboradas pelo COI para a realização dos Jogos Olímpicos. Como bem lembram Salgado e Charles, para as Olimpíadas de Tóquio, em 2021, o documento autorizou “a expressão de opinião pelos atletas durante as coletivas de imprensa e entrevistas nas zonas mistas, nas reuniões da equipe e nas plataformas de mídia, digitais ou tradicionais”.[66] Segundo o documento, a possibilidade de se expressar não se confunde com ato de protestar (classificados como atos de natureza política, como se ajoelhar, realizar movimentos com os braços, dentre outros).[67]

Isto posto, conclui-se que há uma restrição do direito à liberdade de expressão no âmbito desportivo, fomentada pelo Movimento Olímpico e concretizada na Carta Olímpica, em benefício dos princípios do olimpismo. Por conta disso, é necessário compreender qual o núcleo essencial do direito fundamental à liberdade de expressão.

6. A PROTEÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO: LIMITES E RESTRIÇÕES

De acordo com o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), “toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.[68] Veja-se, portanto, que o direito à liberdade de expressão é considerado de máxima importância para a dignidade da pessoa humana.

Segundo Luís Roberto Barroso, a liberdade de expressão (ligada aos cidadãos, artistas e escritores) e de comunicação (ligada à imprensa) é um direito individual, de caráter subjetivo, que contribui para o desenvolvimento da personalidade e da cidadania. Para o autor, este direito também possui um aspecto objetivo, de caráter coletivo, por meio do qual há uma circulação de ideias e o debate público.[69] Para Indiara Luz, a liberdade de expressão é ampla e genérica, se referindo à “exteriorização de pensamentos, crenças e juízos de valor”, compondo a gama de direitos subjetivos de manifestação de um indivíduo.[70] O que se percebe, então, é que o direito à liberdade de expressão é um direito humano fundamental para que a cidadania possa ser exercida ao máximo, possibilitando a disseminação de ideias, de cultura e de pensamento e refletindo a autonomia individual como expressão de dignidade humana.[71] Neste mesmo sentido parece ser correto afirmar que a liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais dos sistemas democráticos, uma vez que “permite o intercâmbio de ideias, o controle do poder, o diálogo político e inclusive a formação da identidade individual e coletiva”.[72]

Jorge Reis Novais esclarece que os direitos fundamentais são trunfos ou armaduras que conferem proteção reforçada ou privilegiada a comportamentos, posições ou bens de liberdade. Contudo, lembra que nenhuma armadura cobre todo o corpo e alguns trunfos podem ser vencidos por trunfos mais altos. Da mesma forma, o legislador constitucional não pode prever todas as circunstâncias do futuro.[73] Por conta disso é imperioso que seja analisado qual o conteúdo essencial deste direito.

Segundo Marcelo Schenk Duque, o conceito de conteúdo essencial não é fixado nem no curso da linguagem coloquial, nem no curso da linguagem técnico-jurídica. Trata-se, na verdade, de uma garantia que encontra sólido apoio e desenvolvimento na dogmática dos direitos fundamentais. Para o autor, ela possui uma eficácia em três direções: (i) garante um âmbito nuclear de cada direito fundamental de forma pura, independente de interesses gerais empregados para a justificação de restrições; (ii) no sentido de que nenhum direito fundamental pode vir a ser restringido de maneira mais intensa do que se faça necessário em consideração a interesses coletivos de hierarquia superior ou semelhante; e (iii) de que toda restrição imposta um direito fundamental deve ser passível de exame ou medição.[74] Em busca de uma definição, o autor afirma que o conteúdo essencial de um direito fundamental “pode ser descrito como o pensamento fundamental desse direito, seu núcleo essencial, de modo que a proteção desse conteúdo visa a impedir o não funcionamento dos direitos fundamentais”.[75] Isto significa que “enquanto princípio expressamente consagrado na Constituição ou enquanto postulado constitucional imanente, o princípio da proteção do núcleo essencial destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental decorrente de restrições descabidas, desmesuradas ou desproporcionais”.[76]

Para Virgílio Afonso da Silva, o conteúdo essencial de um direito fundamental possui uma dimensão objetiva e outra subjetiva. A partir de uma dimensão estritamente objetiva, o conteúdo essencial de um direito fundamental deve ser definido com base no significado desse direito para a vida social como um todo. Neste sentido, proteger o conteúdo essencial de um direito fundamental implica proibir restrições à eficácia desse direito que o tornem sem significado para todos os indivíduos ou para boa parte deles. Por sua vez, a noção subjetiva defende que os direitos fundamentais têm como função proteger sobretudo condutas e posições jurídicas individuais, sendo perfeitamente possível que uma restrição, ou até mesmo uma eliminação, da proteção de um direito fundamental em um caso concreto individual não afete sua dimensão objetiva, mas poderia significar uma violação ao conteúdo essencial daquele direito naquele caso concreto.[77]

Portanto, o que se pode afirmar que é o núcleo essencial trata-se, ao fim e ao cabo, do mínimo de proteção ou de garantia de um direito, ou seja, de um traço deste direito que não pode ser obstaculizado e que deve ser garantido pelo Estado. Nesse liame, como bem alertam Canan e Starepravo, os limites dizem respeito às possibilidades que o Estado ou outros destinatários têm de restringir a garantia do direito.[78] No que se refere ao direito à liberdade de expressão, Gustavo Lopes entende que, como qualquer outro direito fundamental, este encontra limites sem que ocorra censura ou patrulhamento. Trata-se tão somente de aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade – que deverão “resguardar e proteger direitos fundamentais tão relevantes quanto a liberdade de expressão e que devem ser respeitados no caso concreto”.[79] Duque afirma que, em qualquer caso de conflito entre direitos fundamentais, sempre deve haver a preocupação em se garantir um patamar mínimo satisfatório de promoção de todos os direitos que incidem na relação concreta.[80]

No que se refere à liberdade de expressão, cumpre ressaltar que Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, mesmo que tome como base a Declaração Universal dos Direitos Humanos, estabelece restrições a este direito humano. Segundo o artigo 19 do Pacto, estas restrições devem estar expressamente previstas em lei e terão como finalidade assegurar o respeito dos direitos e das reputações das demais pessoas ou proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral públicas.[81]

De toda forma, mesmo que este direito fundamental esteja imune a restrições, não sendo, portanto, absoluto, é necessário destacar o entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos quando da publicação da Opinião Consultiva nº 05/85. Segundo este documento da Corte, o conteúdo do artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos (de leitura quase idêntica ao artigo 19 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos) compreende a liberdade de expressão como uma ação que vai além da mera manifestação do pensamento, mas que também está ligada à procura, ao recebimento e à transmissão de informações e ideias.[82] Segundo Indiara Fazolo Pinto, isto significa dizer que a restrição ilegal à liberdade de expressão viola tanto o direito do indivíduo expressar seu pensamento quanto o da comunidade ter acesso a ele.[83]

Ao abordar a aplicabilidade dos tratados internacionais, Felipe Gussoli entende que o paradigma do princípio da supremacia absoluta da Constituição cede às normas de Direito Internacional de Direito Humanos, jus cogensou não. Nesse sentido, seu pensamento adere à corrente da supraconstitucionalidade das normas previstas em tratados internacionais de direitos humanos incorporadas ao Direito brasileiro, propondo, inclusive uma supraconstitucionalidade a priori ou relativa. Trata-se de uma abordagem relativa “porque a solução hierarquizante para a solução de conflitos não é absoluta”, na medida em que ela cede ao critério pro persona e às interpretações jurisprudenciais internacionais e nacionais vinculantes aos Poderes de Estado.[84]

A partir das lições de Gussoli, parece ser correto afirmar que a DUDH deve prevalecer sobre normas nacionais, especialmente em regulamentos privados de confederações e demais associações esportivas. Ainda que seja compreensível a existência de restrições à liberdade de expressão, desde que elas sejam permitidas na legislação de cada país, este direito é uma ferramenta essencial para a democracia,[85] uma vez que serve como fundamento para atingir outros direitos fundamentais, pois permite, por exemplo, a denúncia a violações desses direitos.[86] O esporte é parte indissociável de nossa sociedade e, portanto, não é prudente que a sociedade se feche, sob um pretexto neutralidade política, neste ambiente.[87]

7. EM DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO ESPORTE

Ainda que a menção e análise dos casos Kaepernick e Solberg não tenha sido utilizada com o propósito de comparar o sistema constitucional dos Estados Unidos da América e do Brasil, respectivamente, e ainda que os remédios jurídicos utilizados em cada situação reflitam a diferença de abordagem legal entre eles,[88] em ambos casos o direito fundamental humano à liberdade de expressão foi restringido por conta de limitações normativas (no caso de Carol Solberg) e, conforme o que é sustentado pelo atleta em questão, por um suposto conluio contra os atletas protestantes (no caso de Colin Kaepernick).

Como bem afirma Emerson Gabardo, “o equilíbrio entre o público e o privado, entre a sociedade e o Estado, e entre o indivíduo e a coletividade está na colocação de diferentes pesos em todos os lados”. Por conta disso, o autor sustenta que é neste ponto que surge a figura da ponderação jurídica,[89] por meio da qual buscará preservar o interesse público, “inibindo qualquer tentativa de, pela negativa de sua incidência, ser preconizado o interesse privado”.[90] Nesse sentido, deve ser realizado um exercício de ponderação do próprio direito da liberdade de expressão no esporte para que possa se verificar seu núcleo essencial.[91] Embora a ordem constitucional brasileira não tenha contemplado qualquer disciplina direta e expressa sobre a proteção do núcleo essencial de direitos fundamentais, é evidente que o texto constitucional veda expressamente qualquer proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais – art. 60, § 4º, inc. IV.[92]

Ademais, é verificável, no âmbito desportivo nacional e no mundial, que há definição prévia solidificada do que é considerado um ato político. A própria Carta Olímpica e até mesmo as diretrizes para os Jogos Olímpicos de Tóquio não são claras acerca do que é um ato político, ora admitido certos movimentos ou gestos, ora negando. Defendendo que “tão importante quanto a neutralidade política intentada pela Lex Sportiva, é a exata definição acerca de como garanti-la, delimitando as possibilidades aferidas a cada integrante do sistema desportivo ao passo que lhes é tolhido (...) um direito fundamental também transnacionalmente reconhecido”, Salgado e Charles questionam se as manifestações em aversão ao racismo ou à homofobia, como foi o caso de Colin Kaepernick, devem ser enquadradas nas previsões da Regra 50 da Carta Olímpica e, portanto, coibidas pelas entidades desportiva; ou então se os atos políticos em defesa de direitos fundamentais são tratados da mesma forma que aqueles tomados em favor de correntes ideológicas.[93]

Na medida em que os ideais do olimpismo estão diretamente alinhados à plena garantia dos Direitos Humanos,[94] conclui-se que a vedação à promoção de discursos, ideais e pensamentos que podem ser verdadeiros catalisadores de direitos fundamentais infringe o núcleo essencial do direito à liberdade de expressão. O esporte é, enquanto espaço público e de cultural, também um espaço político, por meio do qual há uma função instrumental das liberdades individuais na promoção e proteção de direitos. Esta função é a de aumentar (ou potencializar) o alcance da fala de esportistas, que podem utilizar das plataformas que lhe são dadas para garantir direitos aos grupos minoritários. E, diante deste cenário, fica evidente a relevância da liberdade de expressão para a constituição da democracia. Nas arenas, quadras, estádios e circuitos, ou seja, nos espaços desportivos, o debate aberto, plural e democrático é certamente possível.[95] Fomentar o debate parece ser, sem dúvida, a medida de interesse público adequada para o conflito entre a restrição ou a liberdade de expressão no esporte.

Não se pretende defender que toda e qualquer ação durante a prática esportiva deve ser considerada um ato político, nem que os eventos desportivos se tornem palanques para propaganda política e, muito menos, que ofensas a outros direitos humanos fundamentais sejam cometidas sob o argumento da liberdade de expressão. A ideia apresentada neste artigo certamente não enquadra como válida a manifestação política que implique incitação ao ódio durante o uso das redes sociais, por exemplo.

O que se busca é demonstrar que a liberdade de expressão do atleta não pode ser tolhida com base numa regra da Carta Olímpica que não define o que será ou não considerado um ato político. É necessário que se determine de forma mais precisa quais os limites e restrições desse direito humano. Na medida em que para certos abusos e práticas observadas, o silêncio é significado de consentimento,[96] é dentro do ambiente esportivo que atletas têm voz para denunciar injustiças sociais.

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Como citar este artículo | How to cite this article: SAIKALI, Lucas Bossoni. O núcleo essencial do direito à liberdade de expressão no esporte a partir dos casos Colin Kaepernick e Carol Solberg. Revista Eurolatinoamericana de Derecho Administrativo, Santa Fe, vol. 9, n. 2, p. 291-316, jul./dic. 2022. DOI 10.14409/redoeda.v9i2.12394

Referências
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Notas
Notas
[1] REUTERS. IOC says looking into gesture used by U.S. athlete Saunders on podium. 02 ago. 2021. Disponível em: . Acesso em 03 ago. 2022. De acordo com a atleta, conforme postagem em suas redes sociais, o gesto simboliza a “intersecção onde todas as pessoas que são oprimidas se encontram” (tradução livre de “it’s the intersection of where all people who are oppressed meet”).
[2] THE GUARDIAN. Belarus athlete who refused to fly home is granted Polish visa. 02 ago. 2021.Disponível em: . Acesso em 03 ago. 2022.
[3] VIEIRA, Marcelo Palladino Machado. Liberdade de expressão no esporte: o 'caso Carol Solberg'. Consultor Jurídico (ConJur). 21. out. 2020. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-out-21/marcelo-vieira-liberdade-expressao-esporte>. Acesso em: 28 mai. 2022.
[4] Em um artigo de opinião, Tiago Leifert, conhecido por já ter apresentado inúmeros programas esportivos na televisão aberta brasileira, defendeu que esporte e política não podem se misturar, sob pena de que os eventos esportivos sejam contaminados. Para acesso à coluna em sua integralidade, ver: LEIFERT, Tiago. Evento esportivo não é lugar de manifestação política. 26 fev. 2018. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2022.
[5] Tradução livre de: "I am not going to stand up and show pride in a flag for a country that oppresses black people and people of color". Cf.: BIASI, Marco. The Athlete’s Right to Free Speech vs. the Teams’ Liberty of Contract in Professional Sport. A Labor Law (re)view of the Colin Kaepernick Case. Disponível em: . Acesso em 30 jul. 2022.
[6] Para uma análise mais detalhada dos protestos dos atletas, ver, por todos: McELVENNY, Matthew. The eyes of the world are watching you now: Colin Kaepernick's collusion suit against the NFL. Jeffery S. Moorad Sports Law Journal, v. 26, n. 1, 2019, p. 115-155.
[7] Por sua vez, jogadores e comissão técnica da NBA são obrigados, conforme as Diretrizes da Liga, a "ficar em pé e se alinhar em uma postura digna ao longo das linhas laterais ou na linha da falta durante a execução do hino nacional" (tradução livre de "stand and line up in a dignified posture along the sidelines or on foul line during the playing of the National Anthem"). Em 1996, Mahmoud Abdul-Rauf, jogador da NBA, se recusou a se levantar para a execução do hino, pois acreditava que a bandeira dos EUA era um símbolo de opressão contra sua crença muçulmana. Embora o jogador tenha sido imediatamente suspenso pela liga, a pena foi retirada após o jogador ter aceitado simplesmente olhar para a baixo durante o hino. Para uma comparação entre o caso de Abdul-Rauf e de Colin Kaepernick, cf.: BRACKETT, LaToya. Kaepernick flips the script: empowering the silenced black athlete. Fair Play: Revista de Filosofía, Ética y Derecho del Deporte, v. 10, oct. 2017, p. 4-25. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2022.
[8] A queixa ajuizada por Colin Kaepernick trata-se de uma grievance, isto é, uma ação judicial na qual existe um dano (moral ou material) sofrido por um indivíduo que requer compensação.
[9] Na época dos protestos (em que os atletas estavam se ajoelhando durante o hino nacional), Donald Trump afirmou que adoraria que os atletas que "desrespeitaram" a bandeira do país fossem demitidos e que o proprietário do time que assim o fizesse seria a pessoa mais popular do país. Cf.: BIASI, Marco. The Athlete’s Right to Free Speech vs. the Teams’ Liberty of Contract in Professional Sport. A Labor Law (re)view of the Colin Kaepernick Case. Disponível em: . Acesso em 30 set. 2022.
[10] McELVENNY, Matthew. The eyes of the world are watching you now: Colin Kaepernick's collusion suit against the NFL. Jeffery S. Moorad Sports Law Journal, v. 26, n. 1, 2019, p. 115-155.
[11] Tradução livre do trecho final da Primeira Emenda à Constituição dos Estados Unidos da América: "Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free exercise thereof; or abridging the freedom of speech, or of the press; or the right of the people peaceably to assemble, and to petition the Government for a redress of grievances".
[12] ] EDELMAN, Marc. Standing to kneel: analyzing NFL players’ freedom to protest during the playing of the U.S. National Anthem. Fordham Law Review Online, v. 86, n. 1, 2018. Em sentido semelhante, Mary Becker entende que a cláusula de liberdade de expressão da Primeira Emenda protege apenas contra a ação do Estado e, portanto, não oferece proteção quando empregadores privados retaliam contra funcionários privados por expressarem suas opiniões. In: BECKER, Mary E. How free is speech at work? University of California at Davis Law Review, v. 29, 1996, p. 815-873.
[13] Marc Edelman defende esta possibilidade ao lembrar da decisão do caso Ludtke v. Kuhn, de 1978, na qual o Distrito Sul de Nova Iorque considerou que os direitos de propriedade da cidade de Nova Iorque sobre o arrendamento do Yankee Stadium transformaram a proibição dos Yankees contra repórteres mulheres do Yankees Clubhouse, de uma ação privada em uma ação pública de acordo com a Cláusula de Proteção Igualitária da Quinta e Décima Quarta Emendas. In: EDELMAN, Marc. Standing to kneel: analyzing NFL players’ freedom to protest during the playing of the U.S. National Anthem. Fordham Law Review Online, v. 86, n. 1, 2018.
[14] EDELMAN, Marc. Standing to kneel: analyzing NFL players’ freedom to protest during the playing of the U.S. National Anthem. Fordham Law Review Online, v. 86, n. 1, 2018.
[15] Por se tratar de uma ação judicial que necessitava de evidência inequívoca do conluio com a finalidade de prejudicar Kaepernick, acreditava-se, tendo em vista as próprias determinações da CBA, que a argumentação do autor da queixa era de difícil prova. Ver, por todos: McELVENNY, Matthew. The eyes of the world are watching you now: Colin Kaepernick's collusion suit against the NFL. Jeffery S. Moorad Sports Law Journal, v. 26, n. 1, 2019, p. 115-155.
[16] WASHINGTON POST. Colin Kaepernick, Eric Reid settle collusion grievances against NFL and teams. 15 fev. 2021. Disponível em: . Acesso em: 10 jul. 2022. Dias após o anúncio do acordo, foi reportado pelo Wall Street Journal que o acordo com Colin Kaepernick envolvia uma reparação financeira de aproximadamente dez milhões de dólares (cf. WALL STREET JOURNAL. NFL paid under $10 million to settle Colin Kaepernick grievance. Disponível em: . Acesso em: 24 jul. 2022). No entanto, haja vista se tratar de um acordo confidencial, não foi possível acessar o referido documento.
[17] Art. 191. Deixar de cumprir, ou dificultar o cumprimento: (...) III - de regulamento, geral ou especial, de competição. (AC). PENA: multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), com fixação de prazo para cumprimento da obrigação. (AC). § 1º É facultado ao órgão judicante substituir a pena de multa pela de advertência se a infração for de pequena gravidade. (AC).
[18] Art. 258. Assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código. (Redação dada pela Resolução CNE nº 29 de 2009). PENA: suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de quinze a cento e oitenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código. (NR). § 1º É facultado ao órgão judicante substituir a pena de suspensão pela de advertência se a infração for de pequena gravidade. (AC)
[19] CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VÔLEI. Regulamento do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia - OPEN 2020/2021. p. 28. Disponível em: . Acesso em 8 jun. 2022.
[20] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Processo nº 010/2020. Primeira Comissão Disciplinar. Auditor Rel.: Robson Luiz Vieira, 13 out. 2020. Disponível em: . Acesso em 17 jun. 2022.
[21] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Processo nº 003/2020 - Recurso Voluntário. Primeira Comissão Disciplinar. Auditor Rel.: Eduardo Mello, 16 nov. 2020. Disponível em: . Acesso em 17 jun. 2022.
[22] Vale mencionar que, nos termos do artigo 2º, inc. XI, do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, a oralidade é um dos princípios que norteia a interpretação e aplicação do Código. Por conta disso, as decisões do Tribunal Pleno do STJD não possuem Acórdãos que, na íntegra, abordam o relato, a fundamentação e o dispositivo do julgamento da Corte. Nesse sentido, haja vista a aplicação do princípio da publicidade (art. 2º, inc. XIII), a sessão de julgamento do caso Carol Solberg pode ser acessada na plataforma de vídeos YouTube. Cf.: STJD VOLEIBOL. Sessão de Julgamento - Tribunal Pleno - STJD - Recurso Carol Solberg nº 003/2020. Youtube, 17 nov. 2020. Disponível em: . Acesso em: 15 jul. 2022.
[23] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[24] FOLHA DE S. PAULO. Após suposta manifestação pró-Bolsonaro, CBV proíbe expressões políticas. 14 set. 2018. Disponível em: . Acesso em: 28 jun. 2022.
[25] CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VOLEIBOL. CBV se expressa contra manifestação de cunho político. 20 set. 2020. Disponível em: . Acesso em 30 jun. 2022.
[26] CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VOLEIBOL. Código de Ética do Voleibol Brasileiro - CBV. 17 jul. 2017. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2022.
[27] O GLOBO. Carol Solberg: Ministério Público pede explicações à CBV e cita '17' na seleção masculina em 2018. 10 out. 2020. Disponível em: . Acesso em 30 jun. 2022.
[28] EMENTA: SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. (...) A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. (RE 201819, Relator(a): ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 11/10/2005, DJ 27-10-2006 PP-00064 EMENT VOL-02253-04 PP-00577 RTJ VOL-00209-02 PP-00821)
[29] ALMEIDA, Bárbara Schausteck de; VLASTUIN, Juliana; MARCHI JÚNIOR, Wanderley. Proteção à marca versus liberdade de expressão? Discursos emergentes a partir dos megaeventos esportivos no Brasil? Esporte e Sociedade, Rio de Janeiro, ano 6, n. 18, set./2011.
[30] A atual Ministra de Estado do Esporte e ex-atleta Olímpica, Ana Moser, declarou, em postagem na rede social Twitter, que “antes de atleta, o jogador Wallace é um cidadão brasileiro e deve responder às nossas leis e instituições”. MOSER, ANA. Antes de atleta, o jogador Wallace é um cidadão brasileiro [...]. Brasília, 31 jan. 2023. Twitter: @anabmoser. Disponível em: . Acesso em: 12 jun. 2023.
[31] ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. AGU pede ao Comitê Olímpico do Brasil (COB) e à Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) instauração de processo disciplinar em desfavor do jogador de vôlei Wallace Leandro. 01 fev. 2023. Disponível em: . Acesso em: 10 jun. 2023.
[32] Art. 243-D. Incitar publicamente o ódio ou a violência. (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009). PENA: multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), e suspensão pelo prazo de trezentos e sessenta a setecentos e vinte dias. (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

Parágrafo único. Quando a manifestação for feita por meio da imprensa, rádio, televisão, Internet ou qualquer meio eletrônico, ou for praticada dentro ou nas proximidades da praça desportiva em que for realizada a partida, prova ou equivalente, o infrator poderá sofrer, além da suspensão pelo prazo de trezentos e sessenta a setecentos e vinte dias, pena de multa entre R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 100.000,00 (cem mil reais). (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

[33] Art. 8° - É indevido o uso de expressões verbais ou escritas que sejam discriminatórias, especialmente quanto à origem, cor, religião, idade, sexo ou orientação sexual de qualquer pessoa.

Parágrafo único - O uso de redes sociais por atletas, comissão técnica e dirigentes deve obedecer ao equilíbrio e à proporcionalidade, evitando-se o uso conflituoso e polêmico.

Art. 34 - É indevida a prática de atos de violência, bem como a doutrinação, a incitação ou a orientação para a sua realização, no ambiente administrativo, de treinamento e competição ou fora dele.

Parágrafo único - Estão abrangidos por este artigo os atos de violência verbais ou escritos, inclusive praticados por meios eletrônicos ou através de redes sociais.

[34] Art. 43º - rejeitar com energia e transparência qualquer tendência ou manifestação de violência, oriunda de diferenças étnicas, de cor, gênero, crença religiosa, portadores de deficiência, preferência política, condição financeira, social, intelectual, opção sexual, idade, condição marital, e o uso de drogas, estimulantes químicos desautorizados, a corrupção passiva ou ativa, tanto no âmbito esportivo, quanto fora dele.
[35] Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime:

Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.

[36] CONSELHO DE ÉTICA DO COMITË OLÍMPICO BRASILEIRO. Processo Ético nº 001/2023. Ementa da Decisão. 03 abr. 2023. Disponível em: . Acesso em: 17 jun. 2023.
[37] A liminar concedida por decisão do Presidente, em exercício, foi confirmada em ulterior análise da Corte desportiva. No dia 12 de maio de 2023, o STJD do Voleibol sustentou que, “por maioria de votos, restou determinado à CBV que se abstenha da prática de atos que visem limitar direitos desportivos dos impetrantes, consubstanciados nos efeitos das sanções do Conselho de Ética do COB”. Cf.: STJD VOLEIBOL. Sessão de Julgamento – Processo 004/2023 – Mandado de Garantia. 12 mai. 2023. Disponível em: . Acesso em: 18 jun. 2023.
[38] CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VOLEIBOL. Decisão do CBMA sobre caso do atleta Wallace. 19 abr. 2023. Disponível em: . Acesso em: 12 jun. 2023.
[39] CONSELHO DE ÉTICA DO COMITË OLÍMPICO BRASILEIRO. Processo Ético nº 001/2023. Decisão. 02 mai. 2023. Disponível em: < https://www.cob.org.br/pt/documentos/download/d8a3916dfe22b/>. Acesso em: 17 jun. 2023.
[40] ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. Nota sobre o caso Wallace de Souza. 02 mai. 2023. Disponível em: . Acesso em: 13 jun. 2023.
[41] CONSELHO DE ÉTICA DO COMITË OLÍMPICO BRASILEIRO. Processo Ético nº 001/2023. Termo de Compromisso e Transição Ético-Disciplinar. 15 mai. 2023. Disponível em: . Acesso em: 18 jun. 2023.
[42] AGÊNCIA BRASIL. STJD do vôlei arquiva denúncia contra o jogador Wallace. 28 fev. 2023. Disponível em: . Acesso em: 07 jun. 2023.
[43] ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. Pedido de reconsideração. 02 mar. 2023. Disponível em: . Acesso em: 17 jun. 2023.
[44] CANAN, Felipe; STAREPRAVO, Fernando Augusto. O direito constitucional ao esporte em perspectiva comparada. Cuestiones constitucionales, Ciudad de México, n. 42, ene./jun. 2020. Sobre o tema, ver também: MIRANDA, Martinho Neves. O direito no desporto. 2. ed. Rio de Janeiro: Lamen Juris, 2011. p. 18-22.
[45] PACHOT ZAMBRANA, Karel Luis. El derecho constitucional al deporte en la doctrina y el derecho comparado. Cuestiones constitucionales, Ciudad de México, n. 35, jul./dic. 2016.
[46] NOVAIS, Jorge Reis. As restrições aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 2003. p. 611-612. De acordo com o autor, este é um dos prismas dos direitos fundamentais. O segundo seria o de que "por meio da doutrina e da jurisprudência são desenvolvidos princípios estruturantes dos quais são retiradas correspondentes consequências jurídicas, possibilitando um infindável leque de bens que de alguma maneira estão correlacionados à dignidade de bem de valor constitucional”.
[47] JAIN, Anmol. Political speech in sports: a case for non-prohibition. Journal of Sports Law, Policy and Governance, v. 2, n. 1, dez. 2020, p. 61-73.
[48] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[49] MOSTARO, Filipe Fernandes Ribeiro. Jogos Olímpicos de Berlim 1936: o uso do esporte para fins nada esportivos. LOGOS – Comunicação e Entretenimento: Práticas Sociais, Indústrias e Linguagens, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 95-108. jan./jun. 2012. p. 98.
[50] NAFZIGER, James A. R. International sports law. 1. ed. Transnational Publishers: Ardseley, N.Y, 2004. p. 198.
[51] SHAHLAEI, Faraz. When sports stand against human rights: regulating restrictions on athlete speech in the global sports arena. Loyola of Los Angeles Entertainment Law Review, v. 38, n. 1, 2017, p. 99-120.
[52] O Comitê Olímpico Internacional divulgou que mais da metade da população mundial assistiu às transmissões dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016. Cf.: INTERNATIONAL OLYMPIC COMMITTEE. How do we know that Rio 2016 was a success. 06 dez. 2016. Disponível em: . Acesso em: 01 ago. 2022.
[53] LAKIER, Genevieve. Sport as speech. University of Pennsylvania Journal of Constitutional Law, v. 16, n. 4, p. 1109-1160, abr. 2014.
[54] TRIVIÑO, José Luiz Pérez; FRÍAS, Francisco J. López. El deportista político ¿o politizado? El caso de Colin Kaepernick. Fair Play: Revista de Filosofía, Ética y Derecho del Deporte, v. 10, oct. 2017. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2022.
[55] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[56] EDWARDS, Harry. Perspectives on Olympic Sportpolitics: 1968-1984. Black Law Journal, v. 9, n. 1, Winter 1984, p. 38-50. O impacto da política no esporte não é apenas verificado durante os Jogos Olímpicos. Durante o século XX, um estudo analisou de que maneira o regime ditatorial espanhol, a Ditadura Franquista, influenciou no desenvolvimento do Real Madrid FC. Sobre o tema, ver: CALLEJA, Eduardo González. Él Real Madrid, ¿"equipo del régimen"?. Esporte e Sociedade, Rio de Janeiro, ano 5, n. 14, mar./jun. 2010.
[57] JAIN, Anmol. Political speech in sports: a case for non-prohibition. Journal of Sports Law, Policy and Governance, v. 2, n. 1, dez. 2020, p. 61-73. Para a autora, se ações como a dos medalhistas estadunidenses de 1968 forem estranguladas em seu momento de início, estas atitudes não representarão nada além de um movimento para que manteria o status quo e apenas reforçaria as falhas sociais existentes.
[58] Tradução livre de "Believe in something, even if it means sacrificing everything".
[59] BIASI, Marco. The Athlete’s Right to Free Speech vs. the Teams’ Liberty of Contract in Professional Sport. A Labor Law (re)view of the Colin Kaepernick Case. Disponível em: . Acesso em: 30 jul. 2022.
[60] KIM, Joon Kyoung; BHALLA, Holly Overton, Nandini Bhalla; LI, Jo-Yun. Nike, Colin Kaepernick, and the politicization of sports: examining perceived organizational motives and public responses. Public Relations Review, v. 46, n. 2, 2020.
[61] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[62] Sobre o poder influenciador dos grandes eventos esportivos, como os Jogos Olímpicos, ver, por todos: LIU, Julie H. Lighting the Torch of Human Rights: The Olympic Games as a Vehicle for Human Rights Reform. Northwestern Journal of International Human Rights, v. 5, n. 2, p. 213-235, Spring 2014.
[63] CÔMITE OLÍMPICO INTERNACIONAL. Olympic Charter. jul. 2020. Disponível em: . Acesso em: 06 ago. 2022.
[64] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[65] O trecho grifado dispõe que “Nenhum tipo de manifestação ou propaganda política, religiosa ou racial é permitida em quaisquer locais, instalações ou outras áreas olímpicas” (Tradução livre).
[66] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[67] COMITÊ OLÍMPICO INTERNACIONAL. Rule 50.2 Guidelines – Olympic Games Tokyo 2020. Disponível em: . Acesso em: 05 ago. 2022.
[68] Tradução livre de: “Everyone has the right to freedom of opinion and expression; this right includes freedom to hold opinions without interference and to seek, receive and impart information and ideas through any media and regardless of frontiers”. Cf. UNITED NATIONS. Universal Declaration of Human Rights. Disponível em: . Acesso em: 01 ago. 2022.
[69] BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade. Critérios de ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do Código Civil e da Lei de Imprensa. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 1, p. 1-36, jan./mar. 2004.
[70] PINTO, Indiara Liz Fazolo. Liberdade de expressão, Lei de Imprensa e discurso do ódio: da restrição como violação à limitação como proteção. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 13, n. 53, p. 195-229, jul./set. 2013. p. 199.
[71] Sobre o tema da autonomia individual enquanto dignidade humana, ver: LOURENÇO, Cristina Sílvia Alves; GUEDES, Maurício Sullivan Balhe. O STF e o ensino religioso em escolas públicas: pluralismo educacional, laicidade estatal e autonomia individual. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 4, n. 3, p. 145-165, set./dez. 2017.
[72] HONÓRIO, Cláudia; KROL, Heloísa. Jurisdição constitucional, democracia e liberdade de expressão: análise do caso Ellwanger. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, p. 77-92, abr./jun. 2008. p. 88.
[73] NOVAIS, Jorge Reis. As restrições aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 2003. p. 586-587.
[74] DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de Direitos Fundamentais: teoria e prática. São Paulo: RT, 2014. p. 230-231.
[75] DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de Direitos Fundamentais: teoria e prática. São Paulo: RT, 2014. p. 231.
[76] MENDES, Gilmar Ferreira. Limitações dos direitos fundamentais. In: MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 58. Neste ponto, Gilmar Mendes diferencia o pensamento das duas principais escolas: a da teoria absoluta e da teoria relativa. Para a primeira, o núcleo essencial dos direitos fundamentais deve ser entendido como unidade substancial autônoma que, independentemente de qualquer situação concreta, estaria a salvo de eventual decisão legislativa. A segunda afirma que o núcleo essencial deve ser definido conforme o caso, tendo em vista o objetivo perseguido pela norma de caráter restritivo, sendo aferido a partir de um processo de ponderação entre meios e fins e com base no princípio da proporcionalidade. Embora tenham diferenças, ambas pretendem assegurar maior proteção dos direitos fundamentais, na medida em que buscam preservar os direitos fundamentais contra uma ação legislativa desarrazoada
[77] SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 185-186.
[78] CANAN, Felipe; STAREPRAVO, Fernando Augusto. O direito constitucional ao esporte em perspectiva comparada. Cuestiones constitucionales, Ciudad de México, n. 42, ene./jun. 2020.
[79] LOPES, Gustavo. Liberdade de expressão no esporte. fev. 2021. Disponível em: . Acesso em: 31 mai. 2022.
[80] DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de Direitos Fundamentais: teoria e prática. São Paulo: RT, 2014. p. 234-235.
[81] ARTIGO 19. 1. ninguém poderá ser molestado por suas opiniões. 2. Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio de sua escolha. 3. O exercício do direito previsto no parágrafo 2 do presente artigo implicará deveres e responsabilidades especiais. Conseqüentemente, poderá estar sujeito a certas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para: a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas; b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral públicas.
[82] CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Opinión Consultiva OC-5/85 del 13 de noviembre de 1985. Disponível em: . Acesso em: 31 jul. 2022. O parecer também aduz que “a liberdade de expressão é uma pedra angular na existência de uma sociedade democrática. É indispensável para a formação da opinião pública. É também condição sine qua non para que os partidos políticos, os sindicatos, as sociedades científicas e culturais e, em geral, quem deseje influenciar sobre a coletividade possam desenvolver-se plenamente. É, enfim, condição para que a comunidade, no momento de exercer suas opiniões, esteja suficientemente informada. Por isso, é possível afirmar que uma sociedade que não está bem informada não é plenamente livre”.
[83] PINTO, Indiara Liz Fazolo. Liberdade de expressão, Lei de Imprensa e discurso do ódio: da restrição como violação à limitação como proteção. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 13, n. 53, p. 195-229, jul./set. 2013.
[84] GUSSOLI, Felipe Klein. Hierarquia supraconstitucional relativa dos tratados internacionais de direitos humanos. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 6, n. 3, p. 703-747, set./dez. 2019. Ao explicar o princípio pro persona, o autor esclarece que há três critérios para a sua aplicação: (i) aplicação da norma mais protetiva; (ii) conservação da norma mais protetiva; e (iii) interpretação protetiva. Como consequência da aplicação desse princípio, tem-se (a) a redução de potenciais conflitos normativos; (b) maior coordenação entre normas na dimensão vertical entre tratados e normas internas; e (c) maior coordenação entre normas na dimensão horizontal entre dois ou mais tratados.
[85] SHAHLAEI, Faraz. When sports stand against human rights: regulating restrictions on athlete speech in the global sports arena. Loyola of Los Angeles Entertainment Law Review, v. 38, n. 1, 2017, p. 99-120.
86] Sobre o tema, cf.: O’FLAHERTY, Michael. Freedom of Expression: Article 19 of the International Covenant on Civil and Political Rights and the Human Rights Committee’s General Comment. Human Rights Law Review, v. 12, n. 4, p. 627-654, dez. 2012.
[87] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[88] Como bem afirma Pierre Legrand, "o Direito é parte do aparato simbólico pelo qual comunidades inteiras tentam se entender melhor”, sendo, portanto, um fenômeno culturalmente situado. Cf.: LEGRAND, Pierre. A impossibilidade de “transplantes jurídicos”. Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGDir./UFRGS, Porto Alegre, v. 9, n. 1, p. 11-39, jan./jul. 2014. No mesmo sentido, e com enfoque no estudo da liberdade de expressão, Adrienne Stone sustenta que o método de Direito Comparado bem-sucedido no campo da liberdade de expressão requer um engajamento bastante profundo e crítico com o direito estrangeiro, que abrange literatura jurídica e filosófica crítica sobre liberdade de expressão, bem como jurisprudência. Cf.: STONE, Adrienne. The Comparative Constitutional Law of Freedom of Expression. University of Melbourne Legal Studies Research Paper n. 476. 01 jul. 2010. Available at SSRN: . Acesso em 29 jul. 2022.
[89] Sobre o instituto da ponderação, ver: BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005; BERNAL PULIDO, Carlos. El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales. 3. ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2007.
[90] GABARDO, Emerson. O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado como fundamento do Direito Administrativo Social. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 6, n. 3, p. 95-130, mai./ago. 2017.
[91] DUQUE, Marcelo Schenk. Curso de Direitos Fundamentais: teoria e prática. São Paulo: RT, 2014. p. 233-235.
[92] MENDES, Gilmar Ferreira. Limitações dos direitos fundamentais. In: MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 61.
[93] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[94] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
[95] SARMENTO, Daniel. Liberdade de expressão, pluralismo e o papel promocional do Estado. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, n. 16, maio/ago. 2007.
[96] SALGADO, Eneida Desiree; CHARLES, Guilherme Consul. Liberdade de expressão de atletas vs. harmonia esportiva. Revista Forense, ano 116, v. 432, jul./dez. 2020. Disponível em: . Acesso em 27 mai. 2022.
* O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001”/"This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Finance Code 001.
Notas de autor
** Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Paraná (Curitiba, Brasil), com período de estágio de doutoramento na Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne (Paris, França). Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Núcleo de Investigações Constitucionais (NINC-UFPR) e da Rede de Pesquisa em Direito Administrativo Social (REDAS). Editor-Adjunto do International Journal of Digital Law.
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