ARTIGOS

RELAÇÃO FAMÍLIA - ESCOLA: Experiência de Uma Extensão Universitária

Family - school relationship: experience of a university extension

Ana Paula Taigy Amaral
Universidade Federal da Paraíba, Brasil

RELAÇÃO FAMÍLIA - ESCOLA: Experiência de Uma Extensão Universitária

Revista Tópicos Educacionais, vol. 25, núm. 2, pp. 87-108, 2019

Centro de Educação - CE - Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

RESUMO: O presente trabalho é fruto de reflexões resultantes de um projeto de extensão universitária, realizado em 2017, pelo Campus IV da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), denominado “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”, que teve como objetivo o estímulo à participação familiar no acompanhamento da aprendizagem de estudantes matriculados no II ciclo do ensino fundamental de escolas da rede pública do Município de Mamanguape - PB. Utilizou- se, primeiramente, de uma pesquisa bibliográfica para o estudo do tema, em seguida, apresentou- se o relato de experiência vivido na extensão universitária, a partir do qual se concluiu que é possível a construção de um diálogo com as famílias do alunado de baixa renda, no intuito de aproximá-las do cotidiano escolar do menor, mas que esta prática exige uma mudança de postura por parte da escola e de um trabalho em conjunto com a secretaria de educação, que deve disponibilizar recursos e dar suporte para que os profissionais da educação desenvolvam esse trabalho.

Palavras-chave: Relação Família-Escola, Natureza, Diálogo..

ABSTRACT: This work is the result of reflections resulting from a university extension project, carried out in 2017, by Campus IV of the Federal University of Paraíba (UFPB), called “Family, school and learning development”, which aimed to encourage participation family in monitoring the learning of students enrolled in the second cycle of elementary school in public schools in the city of Mamanguape - PB. First, we used a bibliographic research to study the theme, then presented the report of the experience lived in the university extension, from which it was concluded that it is possible to build a dialogue with the students' families low income, in order to bring them closer to the minor's daily life, but that this practice requires a change of attitude on the part of the school and a work in conjunction with the department of education, which should provide resources and support so that education professionals do this work.

Keywords: Family-School Relationship, Nature, Dialogue..

1 INTRODUÇÃO

A família e a escola são as duas principais instituições de formação do ser humano e como toda relação de poder, há entre elas expectativas recíprocas, especialmente no que se refere à competência e à divisão do trabalho em relação à educação da criança. Nesse contexto, reconhece-se a diversidade de organizações familiares existentes na atualidade e toma-se como referência de “família” toda unidade ou configuração composta por, pelo menos, um adulto e uma criança ou adolescente (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2010).

Partindo desta concepção, compreende-se a relação família - escola, segundo Silva (2010), como sendo constituída por duas vertentes (escola e lar) e por duas dimensões de atuação (individual e coletiva). A primeira vertente, denominada “escola”, é a mais visível, e implica toda atividade realizada pelos pais/responsáveis na instituição de ensino, por exemplo, conversas ou encontros com a direção ou corpo docente, participações em reuniões, eventos, órgão de gestão, etc. A segunda (lar), menos visível, engloba as ações desempenhadas em casa, com a participação familiar e do estudante, e se refere ao acompanhamento e auxílio nas atividades escolares, deveres de casa, leituras, revisão do conteúdo, ou seja, as ações fomentadas por algum membro da família, fora da escola, que promovem o apoio e o incentivo da aprendizagem do educando.

Quanto às dimensões de atuação, a relação família-escola, quando acontece numa dimensão individual, diz respeito a qualquer ação que o familiar toma em relação à educação e no interesse do educando. Quando se dá numa dimensão coletiva, envolve práticas em defesa de interesses difusos, por exemplo, quando o responsável atua em nome ou na esfera de uma associação de representantes parentais, em órgãos colegiados na escola, no governo, etc.

O presente trabalho, portanto, é fruto de reflexões resultantes de um projeto de extensão universitária, realizado em 2017 pelo Campus IV (Litoral Norte) da UFPB, denominado “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”, que tinha como fim estimular a participação familiar no acompanhamento da aprendizagem da criança, no caso específico, jovens matriculados no II ciclo do ensino fundamental de duas escolas da rede pública de ensino do município de Mamanguape - PB.

Apesar das ações terem ocorrido em duas escolas públicas da zona da mata paraibana, o cenário social encontrado se repete em contextos semelhantes em qualquer região do Brasil. Destarte, partindo dessa experiência local, percebeu-se a dificuldade existente no âmago desta relação (família - escola) em escolas públicas com famílias de baixa renda.

As universidades públicas são ancoradas no princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (CF, art. 207; LDB, art. 43). As ações de extensão têm por finalidade, dentre outras, a de “estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade” (BRASIL, Lei nº 9.394/1996, art. 43, VI). Portanto, desta experiência acadêmica, que proporcionou um contato com as instituições de ensino da rede pública do município de Mamanguape e os familiares de alunos de baixa renda, surgiram as seguintes inquietações: É possível aprimorar a relação “família-escola” e construir um diálogo construtivo entre essas duas esferas?

O Brasil é um dos países participantes do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), coordenado pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), e, segundo o relatório de 2015, o desempenho dos estudantes brasileiros na prova, que avalia três áreas de conhecimento (Leitura e Língua Portuguesa; Matemática e Ciência, além de Competências Financeira e Resolução Colaborativa de Problemas) está abaixo da média geral dos países integrantes da OCDE.

De acordo com o estudo desenvolvido pelo Centro de Políticas Públicas do Insper e da USP (SASSAKI, A. H.; at al., 2018), este baixo desempenho pode ter como causa não apenas a falta de domínio e falhas no aprendizado do conteúdo, mas, também, a ausência de habilidades socioemocionais, como, por exemplo, perseverança, motivação, confiança, resiliência. Neste aspecto, a educação primária (familiar) é de vital importância para a construção da base emocional do educando. O que demonstra, mais uma vez, a importância dessa relação família - escola, principalmente como objeto de estudo para pesquisas acadêmicas.

Destarte, o presente trabalho foi desenvolvido como fruto de uma experiência de extensão universitária, com o intuito de apresentar algumas reflexões sobre o respectivo tema. Para tanto, utilizou-se do método bibliográfico, bem como do relato de experiência, para abordar a relação família - escola, em um contexto com pessoas de baixa renda.

2 METODOLOGIA

O presente trabalho foi desenvolvido em três etapas. A primeira se refere à apresentação do estudo de caso - o projeto de extensão universitária “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem” -, que motivou as reflexões e questionamentos que resultaram nesta pesquisa.

No segundo momento, realizou-se a apuração e análise de alguns dados socioeconômicos da região, coletados a partir de fontes secundárias (IBGE; PNAD, 2018), os quais serviram como pano de fundo para a contextualização acerca da realidade social e educacional das famílias participantes do projeto; a fim de auxiliar na compreensão do contexto social e da realidade local e como isto pode interferir na relação das famílias com a escola.

Por fim, uma vez realizada a observação crítica da realidade local, partiu-se para uma análise macro da situação, a fim de compreender a natureza das instituições, baseadas sob a perspectiva de autores clássicos como Pierre Bourdieu e Passeron, Saviani, Pedro Silva, entre outros autores contemporâneos, para, contudo, compreender o que está por trás desta relação (função social e natureza simbólica existente), por fim, apontar algumas sugestões para a construção de um diálogo possível, baseado, especialmente, em uma experiência bem sucedida, realizada pela Secretaria de Educação do Município de Lagoa de Dentro - PB.

No campo científico, Richardson e colaboradores (1999, p. 70) definem o método como “a escolha de procedimentos sistemáticos para a descrição e explicação de fenômenos”. Esses procedimentos podem configurar as chamadas abordagens quantitativas ou qualitativas, muito embora autores como Goode e Hatt (1973, p. 398), por exemplo, discordem desta dicotomia, e chegam a afirmar que:

A pesquisa moderna deve rejeitar como uma falsa dicotomia a separação entre estudos ‘qualitativos’ e ‘quantitativos’, ou entre ponto de vista ‘estatístico’ e não ‘estatístico’. Além disso, não importa quão precisas sejam as medidas, o que é medido continua a ser qualidade.

Neste trabalho, optou-se pelo método qualitativo diante de uma perspectiva iniciada a partir de um caso específico (projeto de extensão universitário “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”). Para Yin (2005, p. 19), o Estudo de Caso torna- se particularmente adequado “quando o pesquisador tem pouco controle sobre os acontecimentos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real”.

O projeto de extensão universitária, ora relatado, foi realizado durante os anos de 2017/2018, correspondentes aos períodos acadêmicos 2017.2 - 2018.1, no Campus IV (Litoral Norte) da UFPB, denominado “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”, que tinha como fim estimular a participação familiar no acompanhamento da aprendizagem da criança, no caso específico, jovens matriculados no II ciclo do ensino fundamental de duas escolas da rede pública de ensino do município de Mamanguape - PB.

A ação do projeto consistia em realizar oficinas pedagógicas para os pais/responsáveis dos alunos matriculados no II ciclo de ensino fundamental dessas escolas para discutir e refletir o papel de cada instituição (família e escola), no intuito de despertar neles a relevância do acompanhamento familiar em relação à aprendizagem do educando.

A seguir, apresentar-se-á um resumo sobre o projeto, o perfil das escolas visitadas e o conteúdo abordado nas oficinas pedagógicas.

3 O PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA “FAMÍLIA, ESCOLA E DESENVOLVIMENTO DE APRENDIZAGEM”

A ação de extensão tratou da relação entre a família e a escola, e teve como público alvo os pais/responsáveis por estudantes matriculados no II ciclo do ensino fundamental de duas escolas da rede pública de ensino do município de Mamanguape - PB: a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) Umbelina Garcez e a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Prof. Adailton Coelho Costa. A escolha desta faixa etária se justifica pelo fato de que experiências demonstram que é a partir desta fase que se observa um afastamento gradativo das famílias quanto ao acompanhamento da vida escolar de seus filhos(as)/tutelados(as).

O projeto consistia na realização de oficinas pedagógicas desenvolvidas com o intuito de tratar da relevância do acompanhamento familiar para o desempenho escolar do educando e da participação da família no ambiente escolar. Além das oficinas pedagógicas, foi-se desenvolvida uma cartilha educativa com informações jurídicas sobre o direito à educação dos menores, bem como dicas e sugestões de atividades para serem executadas no seio familiar e que funcionariam como estímulos positivos para o desenvolvimento e aprendizagem do estudante. Em um segundo plano, as ações visaram também sensibilizar a comunidade escolar em prol de promover uma maior participação das famílias dos estudantes na vivência/gestão escolar, bem como avaliar o trabalho de incentivo à participação familiar nas instituições visitadas.

Por ser a sede da região metropolitana denominada Vale do Mamanguape, as escolas estaduais da rede pública de ensino de Mamanguape costumam receber alunos advindos das diversas prefeituras da região, especialmente aqueles que residem em zonas rurais. Este é, por exemplo, o cenário vivenciado na EEEFM Umbelina Garcez, onde se realizaram as primeiras oficinas pedagógicas. Ao todo, a escola possuía, à época do projeto, 187 (cento e oitenta e sete) alunos matriculados no II ciclo do Ensino Fundamental no turno da manhã e 155 (cento e cinquenta e cinco) matriculados no turno da tarde. De forma que, optou-se por se realizar duas oficinas, uma para cada turno (fonte: direção da escola).

Já a EMEF Prof. Adailton Coelho Costa está localizada em uma zona mais periférica do município de Mamanguape, cujas famílias vivem em condições desfavoráveis e com baixa renda per capita. Ao todo, segundo informações da diretoria da escola, são apenas 04 (quatro) turmas (uma para cada ano do II ciclo do ensino fundamental: 6º, 7º, 8º e 9º), todas no horário vespertino, com uma com uma média de 15 (quinze) a 20 (vinte) alunos cada, todas bastante heterogenias (diversas faixas etárias numa mesma classe e com alunos repetentes).

Foram impressos cartas-convites (já que este era o meio de comunicação de ambas escolas com os pais/responsáveis), que continham informações sobre o tema a ser abordado, data, hora, local e chamando-os para participarem de um lanche ao final das oficinas. As entregas foram feitas pelas monitoras do projeto que visitaram as escolas citadas em ocasiões dias/horas distintos: na primeira instituição (EEEFM Umbelina Garcez) em 06 (seis) oportunidades (três vezes em cada turno - manhã e tarde) e, na segunda (EMEF Prof. Adailton Coelho), em três momentos distintos. Oportunidades em que as monitoras entravam nas classes e se comunicavam diretamente com os alunos, explicando o projeto, a importância da presença dos pais/responsáveis, apresentavam o conteúdo a ser abordado nas oficinas e finalizavam com a entrega dos convites.

Entretanto, percebeu-se que os estudantes tinham receio da presença dos pais/responsáveis na escola. Afirmavam que não iriam chamá-los, pois tinham medo que eles fossem informados sobre seus comportamentos ou sobre seus rendimentos escolares. Foi preciso reforçar que as oficinas pedagógicas não tinham esse objetivo. Destarte, detectou-se, neste momento, um dos primeiros problemas da relação entre as instituições e os familiares: os pais/responsáveis só eram convidados para irem até a escola quando, ou da entrega dos boletins dos alunos, ou quando da presença de algum problema de relacionamento/comportamento com o menor. Segundo depoimentos colhidos repetidamente nas oficinas, os responsáveis eram chamados apenas para “ouvirem reclamação” sobre os seus filhos(as)/tutelados.

Não obstante, apesar do empenho da equipe na divulgação e preparo das oficinas/cartilhas, a adesão às mesmas foi significativamente baixa em ambas as escolas. Menos de 3% (três por cento) dos representantes estiveram presentes, conforme registro de assinaturas em lista de presença, no dia da realização da oficina. Ao fim do projeto, percebeu-se o baixíssimo nível de envolvimento real entre as duas esferas em ambas as escolas. As instituições promovem poucas (ou quase nenhuma) ações no sentido de se reverter o quadro.

Por outro lado, constatou-se que existe um anseio dos pais/responsáveis por mais informações sobre a vida/gestão escolar de seus filhos/tutelados, entretanto, há também uma resistência deles no sentido de se integrar à comunidade escolar (talvez ou principalmente pela barreira, dificuldade e/ou pouca receptividade que encontram). Julgam-se, muitas vezes, como se não pertencessem àquele ambiente ou como se os problemas ali existentes (inclusive em relação à aprendizagem/comportamento dos menores) não lhes fossem de sua responsabilidade, mas sim da escola (um campo autônomo e independente).

É certo que este resultado (em relação à baixa adesão por parte dos pais/responsáveis) pode ter se dado por inúmeros fatores, contudo, é preciso observar esta relação em sua natureza, para enxergar o viés do problema que se põe, que é o distanciamento e a pouca participação da família na vida escolar e no processo de aprendizagem do educando de baixa renda. Os desafios e as dificuldades que surgem desta relação produzem distorções importantes à formação, com prejuízos para as práticas de inclusão das famílias nas escolas. É preciso refletir, portanto, sobre projetos de como melhorar a convivência e a relação dessas duas entidades (família e escola).

3.1 A REALIDADE SOCIAL DAS FAMÍLIAS E DOS ESTUDANTES DAS ESCOLAS PÚBLICAS EM MAMANGUAPE

O Nordeste brasileiro se destaca como a região que apresenta os maiores índices de analfabetismo, segundo aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2017. Em comparação com os demais estados nordestinos, a Paraíba se coloca na quarta posição, registrando a taxa de 16,5% da sua população com quinze anos ou mais analfabeta, atrás apenas dos estados de Alagoas, Maranhão e Piauí. Enquanto o índice nacional, neste quesito, é de apenas 7% (sete por cento). Regiões como Sul e Sudeste, por exemplo, apresentam os melhores índices do país com somente 3,5% (três e meio por cento).

Em relação ao analfabetismo funcional, conforme os dados da PNAD Anual, em 2016, a taxa para o Brasil foi de 16,6% (dezesseis vírgula seis por cento), entre a população de 15 (quinze) anos ou mais. No entanto, as regiões Norte e Nordeste continuaram a apresentar taxas acima da nacional. Especificamente no Nordeste, o valor desta referência é de 25,9% (vinte e cinco vírgula nove por cento) na faixa etária mencionada. A Paraíba, por sua vez, também se destaca pelo alto índice de jovens nessa situação, apresentando a marca de 26,4% (vinte e seis vírgula quatro por cento), atrás apenas dos estados de Alagoas, Piauí e Maranhão.

A cidade de Mamanguape fica a cerca de 60 quilômetros da capital paraibana (João Pessoa) e é sede da Região Metropolitana do Vale do Mamanguape, composta por outros oito municípios, todos caracterizados pelos baixos índices socioeconômicos e educacionais, e pela exploração da cana-de-açúcar e do trabalho nas usinas sucroalcooleiras como principal atividade econômica da região. Em 2016, pesquisas do IBGE indicaram que, considerando os domicílios com rendimentos mensais per capita de até meio salário mínimo, eles representavam 47,5% (quarenta e sete e meio por cento) da população local.

Em relação ao desempenho da educação, com base nos resultados do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), cujo principal objetivo é mensurar a qualidade do ensino ministrado nas escolas das redes públicas e é realizado a cada dois anos, o município de Mamanguape também apresentou índices abaixo da média do Estado da Paraíba. Em 2015, as médias gerais de proficiência nos anos iniciais (5º ano) e nos anos finais (9º ano) do ensino fundamental em Língua Portuguesa (leitura e escrita) e em Matemática foram (BRASIL, INEP, 2018):

Consoante o relatório dos resultados do Brasil no PISA 2015, elaborado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil tem um alto índice de alunos ocupantes das classes mais desfavorecidas. De acordo com os dados socioeconômicos colhidos na aplicação do exame (de forma amostral, em 2015), entre os alunos matriculados a partir do 7º ano do ensino fundamental e com faixa etária dos 15 (quinze) anos de idade, 43% (quarenta e três por cento) dos alunos se situam entre os 20% mais desfavorecidos na escala internacional de níveis socioeconômicos do PISA, enquanto a média dos países integrantes da OCDE é de apenas 12% (doze por cento).

Em relação à escolaridade dos pais/responsáveis desses jovens, de acordo com a OCDE, menos de 15% (quinze por cento) dos adultos na faixa etária de 35 a 44 anos de idade possuem o ensino superior completo. Esta média é confirmada pela a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Anual (Pnad) e a Pnad continuada (Pnad-c), ambas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as quais demonstram que a escolaridade média brasileira (em anos de estudo) da população de 18 a 29 anos de idade era, em 2016, de 10,2 anos. Entretanto, nas regiões Norte e Nordeste do país, a escolaridade média desse grupo baixa para 9,4 anos.

Quando se refere à escolaridade média, em anos de estudo, desta população (18 a 29 anos de idade) pertencente aos 25% mais pobres (com base na renda domiciliar per capita) no Brasil, este índice cai para 8,4 anos. Vale destacar que, segundo o IBGE, o rendimento nominal mensal domiciliar per capita da população residente no estado da Paraíba, em 2017, foi de apenas R$ 928,00 (novecentos e vinte e oito reais).

Quando se compara, contudo, a escolaridade desse grupo (vulneráveis) com a dos jovens e adultos pertencentes às classes de maior renda, a escolaridade média, em 2016, salta para 12,2 anos. Este é um dado tão preocupante que se transformou em um objetivo do Plano Nacional de Educação - PNE 2014/2024, inserido na Meta 8, isto é, o compromisso de elevar a escolaridade média da população de 18 (dezoito) a 29 (vinte e nove) anos:

De modo a alcançar, no mínimo, 12 (doze) anos de estudo no último ano de vigência deste plano, para as populações do campo, da região de menor escolaridade no país e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, e igualar a escolaridade média entre negros e não negros declarados à fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

Em relação ao mercado de trabalho local, conforme dados do IBGE, em 2016, o salário médio mensal dos trabalhadores formais em Mamanguape era de 1,8 salário mínimo. No entanto, neste mesmo ano, a proporção de pessoas ocupadas em relação à população total foi de apenas 15,6%. Dados do Ministério do Trabalho demonstram que a principal concentração dos empregos formais nesta área está ligada à indústria da cana-de-açúcar, seguida de atividades relacionadas à agricultura (trabalhador volante da agricultura)1.

4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A fundamentação teórica foi desenvolvida a partir da realização de uma pesquisa bibliográfica sobre o tema, que Martins e Lintz (2002, p. 29) definem como a pesquisa “baseada em referências teóricas publicadas em livros, revistas ou periódicos”, no intuito de se compreender se é possível a construção de um diálogo entre essas duas esferas (família e escola)? A seguir, algumas conclusões sobre este tema, que puderam ser formuladas a partir da experiência da extensão universitária relatada, assim como em decorrência da doutrina consultada/pesquisada.

4.1 FAMÍLIA - ESCOLA: O QUE ESTÁ POR TRÁS DESTA RELAÇÃO?

Durante a preparação das oficinas pedagógicas e das cartilhas, o principal objetivo foi delimitar qual a função social dessas duas instituições, já que a ambas competem a função e o dever de educar a criança (CF, art. 207; LDB, art. 43). Apesar desse ponto comum que lhes unem, não há, porém, entre elas, uma relação de dependência, mas sim um conjunto de expectativas recíprocas.

Existem entre essas duas instituições (família e escola), portanto, cujo dever de educar a criança lhes une, responsabilidades e papeis que foram mudando ao longo da história. A educação familiar, primeiramente, é mais antiga do que a escolar. Segundo diversos autores (SILVA, 2010; OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010), aquela assumiu diferentes formas ao longo do tempo e tem como principal função a transmissão de valores morais e costumes, conforme a época histórica e o tipo de sociedade na qual está inserida.

A esta educação, no sentido de transmitir papeis sociais, é tradicionalmente chamada de educação primária, uma vez que tem como “tarefa principal orientar o desenvolvimento e aquisição de comportamentos considerados adequados, em termos dos padrões sociais vigentes em determinada cultura” (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010, p. 101).

A segunda nasce junto com o processo formal de educação, que inclui, entre outros aspectos, a promoção do acesso à leitura e à escrita (SILVA, 2010). Tem como principal função a transmissão do saber letrado, da produção de conhecimento desenvolvida ao longo do tempo e exerce (historicamente) a função de legitimar a ordem social.

Para Saviani (1997), as teorias educacionais são divididas em dois grupos: as que entendem educação como instrumento de equalização social e, logo, de superação da marginalidade; ou as que compreendem educação como instrumento de discriminação social, portanto, um fator de marginalização.

Silva (2010, p. 444) é categórico ao afirmar que:

Dois traços caracterizarão durante muito tempo a “escola”: a) será, até recentemente, para uma minoria; e b) exige a separação de funções entre as famílias e alguém especializado no “saber escolar”.

Ao longo da história, o acesso à educação formal sempre foi restrito à elite. Não obstante, na Europa Central, nos Séculos XVI e XVII, como consequência da Reforma Protestante, os teóricos reformadores já defendiam o letramento universal para que todos os cristãos pudessem ler suas bíblias e interpretá-las, o que exigia a criação de escolas e a universalização do ensino (COMENIUS2, 1649 Apud SILVA, 2010, p. 445). No entanto, a consolidação do direito a uma escolaridade obrigatória e gratuita só veio se firmar mesmo no Século XIX.

Destarte, o processo de escolarização de massas do ensino primário somente se estabeleceu quando passou a ser interesse da burguesia educar os filhos do proletariado, para consolidar a ordem democrática vigente (SAVIANI, 1997), o que permitiu o acesso à escola por parte de uma maioria não letrada da população. A partir de então consubstanciou-se a especialização de funções entre pais e professores e, inevitavelmente, entre a família e a instituição escolar, que passou a se posicionar em um lugar de superioridade em face das famílias (SILVA, 2010).

Apesar da institucionalização da educação formal, até então restrita à elite, ter sido viabilizada com o apoio da burguesia, surgem, a partir de então, os conflitos de interesses (classes), os quais estavam submersos sob o objetivo em comum (SAVIANI, 2010). O acesso à educação pela classe dominada provoca sua organização e faz surgir os movimentos socais que conclamam a população para reivindicar seus direitos, especialmente em defesa da criação de escolas públicas para os trabalhadores.

A partir deste ponto, volta-se a ruptura, pois não mais interessa à burguesia que o povo se aproprie do conhecimento. A consequência é o surgimento de teorias pedagógicas que beneficiam e aprimoram o ensino destinado às elites e facilitam o “rebaixamento do nível do ensino destinado às camadas populares” (SAVIANI, 2010, p. 58). Assim, a educação passa mais uma vez a ser um instrumento que reforça a marginalização e que legitima a ordem social.

Seguindo este entendimento, Bourdieu e Passeron (1992, p. 22) apontam o sistema de ensino como um instrumento de legitimação da cultura dominante que provoca uma violência simbólica, uma segregação que favorece aqueles que se encontram mais próximos do capital cultural vigente, ou seja, um sistema que provoca a seleção e a legitimação dessa marginalidade:

A força simbólica de uma instância pedagógica define-se por seu peso na estrutura das relações de força e das relações simbólicas (exprimindo sempre essas relações de força) que se instauram entre as instâncias exercendo uma ação de violência simbólica, estrutura que exprime por sua vez as relações de força entre os grupos ou classes constitutivas da formação social considerada.

E continuam os autores (BOURDIEU, P.; PASSERON, J.C., 1992, p. 22):

Numa formação social determinada, a Ação Pedagógica (AP) que as relações de força entre os grupos ou classes constitutivas dessa formação social põem em posição dominante no sistema das Ações Pedagógicas é aquela que, tanto por seu modo de imposição como pela delimitação daquilo que ela impõe e daqueles a quem ela impõe, corresponde (...) aos interesses objetivos (materiais, simbólicos e, sob a relação considerada aqui, pedagógicos) dos grupos ou classes dominantes.

Ou seja, o sistema de ensino (escola) reproduz as relações de força entre as classes sociais, consequentemente, esse conflito também se repete na relação família- escola, uma vez que essa se apresenta em uma posição de superioridade em face daquela (família). E quanto maior a distância do capital cultural dominado pela família do educando em relação ao arbitrário cultural reproduzido pela ação pedagógica (escola), maior se converte a posição de superioridade da instituição em relação à família.

Os alunos que não se enquadram no suposto modelo desejado pela escola tornam- se responsabilidade da família, isto é, o sistema isenta-se de culpa pela não assimilação do arbitrário cultural e pela dificuldade de aprendizagem do estudante e culpam a família pelo problema. Surgem, então, as expectativas da escola em relação à divisão do trabalho de educar com as famílias (principalmente no que tange ao comportamento dos estudantes), porém, essa abertura de diálogo e divisão de responsabilidades é limitada aos interesses da escola.

Segundo Oliveira e Marinho-Araújo (2002, p.102), a ideia de que família é a base da criança, “o locus afetivo e condição sine qua non de seu desenvolvimento”, pode posicionar, mais uma vez, “a família no lugar de desqualificada”, quando este desempenho não é bom. Conforme explanam os autores:

Nesse enfoque, as razões de ordem emocional e afetiva ganham um colorido permanente quanto ao entendimento da relação família-escola e da ocorrência do fracasso escolar. Ganha status natural a crença de que uma “boa” dinâmica familiar é responsável pelo “bom” desempenho do aluno (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2002, p.102).

Destarte, este enfoque psicológico dado à relação família x escola considera o contexto psicológico do aluno um dos grandes responsáveis pelo baixo rendimento dele e acaba gerando um processo de culpabilização e não de responsabilização compartilhada (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010).

Por outro lado, estudos demonstram a correlação entre habilidades cognitivas e socioemocionais e o desenvolvimento do estudante. Recentemente, uma pesquisa elaborada pelo Centro de Políticas Públicas do Insper demonstrou que as diferenças nas quedas de desempenho dos estudantes ao longo de uma prova, especialmente exames que medem resultados com base em respostas objetivas, tal como o PISA, “refletem habilidades socioemocionais, tais como persistência, concentração e determinação” (SASSAKI et al., 2018, p. 02) da população dos países. De acordo com os autores, este impacto supera, inclusive, “indicadores construídos a partir de informações auto relatadas, que limita a comparabilidade entre indivíduos e regiões” (SASSAKI, et al., 2018, p. 02).

Sabe-se, portanto, que a família fomenta o processo de socialização, de proteção, na medida em que (idealmente) deve oferecer as condições de desenvolvimento social, cognitivo e afetivo a todos os seus membros. Entretanto, ao longo das últimas décadas, esta instituição vem sofrendo inúmeras transformações sociais, as quais vêm afetando sua relação com a escola e desconfigurando papeis sociais historicamente atribuídos.

Essas transformações sociais são dinâmicas e suas consequências, tanto de ordem interna quanto externa, ainda são assimiladas no cotidiano. O direito ao divórcio, a conquista do mercado de trabalho e à luta das mulheres pela igualdade de gênero, os novos arranjos familiares (famílias sócio-afetivas, monoparental, anaparental etc.), os direitos LGBTQ+ e as uniões homoafetivas, a luta por políticas inclusivas, o engajamento da sociedade civil organizada, as inovações e ferramentas tecnológicas que alteraram a dinâmica de comunicação das escolas com as famílias (como, por exemplo, o uso de aplicativos de comunicação como whatasapp, redes socais, entre outros) têm provocado alterações na relação família - escola.

Pode-se dizer que é um processo contínuo de mudanças de um padrão antes estabelecido para um cenário ainda em transformação. Em contrapartida, têm-se a instituição escolar, cuja estrutura mantém-se praticamente inalterada e que tem enfrentado dificuldades para acompanhar e para se adaptar frente a essas mudanças sociais e tecnológicas contemporâneas, especialmente as escolas públicas em comunidades de baixa renda, as quais, muitas vezes, insistem em reforçar esse modelo de hierarquia e de distanciamento das famílias.

Pedro Silva (2010, p. 446) aponta dois movimentos importantes decorrentes de todo esse processo de transformação e que influenciam diretamente a relação família x escola, mas no sentido ao da culpabilização das famílias, compreendendo que a escola passou a assumir funções/papeis sociais que antes não lhe cabiam:

Por um lado, nas famílias, temos cada vez mais ambos os membros do casal a trabalhar, o que provoca a entrada cada vez mais precoce das crianças para a instituição escolar ou para-escolar3 (creche, amas, jardim de infância, etc.). Isto tem como consequência uma alteração das relações tradicionais entre socialização primária e secundária, conduzindo a “uma espécie de secundarização da socialização primária e de primarização da socialização secundária” e àquilo que designo por um processo de parentização docente; b) por outro, a crescente dificuldade da escola em assumir sozinha a plenitude do seu projecto educativo.

Portanto, Silva (2010) descreve acima dois fenômenos da atualidade importantes que influenciam na relação família x escola. O primeiro é o que ele chama de “parentização docente”. Este é um fenômeno contemporâneo, em que, com a ida da mulher ao mercado de trabalho, ou, no caso dos novos desenhos familiares, com a necessidade do(s) membro(s) familiar(es) trabalharem por questões financeiras, há cada vez mais a urgência de matricularem seus filhos/responsáveis precocemente no sistema escolar, o que tem provocado duas consequências imediatas: a primeira é de ordem jurídica, que é a necessidade de o Estado ofertar instituições que atendam essa demanda. A segunda é ordem social, que é a alteração das relações tradicionais de socialização primária da criança, que antes ficava a cargo exclusivo das famílias, mas que agora, com a ida às creches em idade tenra, passou a ficar a cargo também das escolas, ocasionando uma espécie de “parentização docente” (SILVA, 2010, p. 446).

Assim, se de um lado esta relação/contato com a família do menor tem se iniciado cada vez mais cedo, já na educação infantil, com a ida do bebê às creches públicas, por exemplo; a medida que a criança vai crescendo e se desenvolvendo dentro do sistema educacional, a experiência demonstra que a relação da escola com a família vai se distanciando, e aumentando, consequentemente, a dificuldade da escola em assumir sozinha o projeto educativo e de formação da criança e do adolescente.

O momento atual, descreve Silva (2010, p. 446), direciona para uma “encruzilhada”: se, por um lado, a situação requer a construção de relações formalmente mais estreitas entre a família e a escola, na prática, se percebe que este diálogo nunca esteve tão distante, principalmente quando envolve escola pública e pais/familiares de estudantes de baixa renda. É possível, contudo, construir uma ponte entre tais instituições e estabelecer um diálogo em prol de um objetivo comum, sem que haja, porém, um processo de culpabilização ou animosidade?

A seguir, algumas sugestões neste aspecto e o exemplo de ações bem-sucedidas desenvolvidas por uma equipe multidisciplinar pela Secretaria de Educação do município de Lagoa de Dentro, localizada no limiar entre o agreste e a zona da mata paraibana.

4.2 RELAÇÃO FAMÍLIA - ESCOLA: É POSSÍVEL UM DIÁLOGO CONSTRUTIVO?

Não obstante, a presente pesquisa não visa esgotar o tema em questão. Contudo, apresentar-se-ão algumas ações que podem ser úteis na construção dessa relação. Assim, para se estabelecer um diálogo construtivo entre essas duas esferas (família e escola), é preciso, primeiramente, reconhecer a posição de desvantagem em que se encontra a família. Dessa forma, é importante que a iniciativa de contato parta da escola, isto é, a instituição precisa assumir uma postura ativa.

Ao contrário, para que haja o desenvolvimento desta relação, a escola não deve adotar um comportamento passivo, de espera, aguardando ou que os pais/responsáveis lhes procurem, ou procurando-os apenas em situações específicas ou extremas, reforçando o comportamento de culpabilização dos pais/responsáveis pelos problemas com o menor na escola (mau comportamento, nota baixa, etc).

A segunda sugestão é de que este não pode ser um trabalho individual, pontual, isto é, não compete exclusivamente ao docente de sala de aula, ao coordenador, ao diretor, nem à instituição escolar. Trata-se de um trabalho em rede, onde todo o sistema trabalha em equipe e em conjunto, onde cada instituição ampara a ação do outro. Um exemplo bem sucedido é o que está sendo desenvolvido, atualmente, na cidade de Lagoa de Dentro, município do agreste paraibano, em que uma equipe multidisciplinar, formada por pedagogos e psicopedagogos, trabalha amparada pela Secretaria de Educação do Município (que disponibiliza recursos e meios para que seja desenvolvida uma rede de trabalho), juntamente com os professores, diretores das escolas, coordenadores, e com o apoio, quando necessário, do conselho tutelar municipal e do Ministério Público Estadual.

Essa equipe multidisciplinar, além de visitar as escolas, inclusive às da zona rural (ou principalmente, já que, em geral, são as que possuem menos recursos), promovem encontros e treinamentos (contínuos) com os professores e profissionais da educação do município. Nesses encontros, ouvem-se as dificuldades locais de cada profissional/instituição, para então serem sugeridas as ações correspondentes. Eles são estimulados a ressaltarem características positivas de cada aluno dentro de sala de aula (Projeto “Faça três elogios por dia”). Além disso, são treinados para identificarem alunos em situações de vulnerabilidade e com dificuldade de aprendizagem. A direção da escola é incentivada a se aproximar da família desse aluno e ir conhecer o contexto social em que vivem.

Em um primeiro momento, tenta-se um encontro dentro da instituição, chamando- os para irem até a escola. Se, contudo, os pais/responsáveis se mantiverem indiferentes, reporta-se o caso à Secretaria de Educação. A equipe multidisciplinar, quando da resistência por parte da família do estudante, faz uma visita ao domicílio da criança/adolescente.

Em qualquer desses encontros, o contato com a família deve sempre buscar atender um apelo emocional e nunca de enfrentamento ou de culpabilização desses pais/responsáveis, já que eles próprios também se encontram, muitas vezes, em situação de pobreza e/ou extrema pobreza e possuem baixa escolaridade. A aproximação, portanto, deve ser muito mais no sentido de escutar com simpatia e com cuidado o que eles têm a dizer, seus medos e preocupações, do que para repreendê-los por alguma omissão no acompanhamento escolar do educando.

Os frutos de tais ações ainda estão sendo colhidos, entretanto já se percebe uma melhora no desenvolvimento escolar dos alunos, principalmente em itens como comportamento, concentração e frequência, conforme relato da psicopedagoga Déborah Kallyne Santos da Silva, das professoras-pedagogas Cláudia Costa dos Santos (Orientadora Educacional e Presidente do Conselho do CACS/FUNDEB) e Maria José de Andrade Silva (coordenadora Pedagógica do Ensino Fundamental -séries iniciais), todas servidoras do Município de Lagoa de Dentro/Paraíba, em palestra realizada no dia 16 de agosto de 2018, no Campus IV/Mamanguape4.

Portanto, para uma relação construtiva, a escola precisa ser integrada à comunidade, ter conhecimento dos problemas que acontecem dentro e entre a escola, ter uma rede de apoio onde possa reportá-los, no intuito de, em parceria com outros órgãos do Estado, tentarem, se não os resolver, amenizar seus impactos na aprendizagem da criança/adolescente.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo é resultado de análises e reflexões produzidas a partir de experiências decorrentes do projeto de extensão universitária (UFPB/Campus IV) “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”, que teve como fim trabalhar com pais/responsáveis de crianças/adolescentes matriculados no II ciclo do ensino fundamental de duas escolas da rede pública de ensino do município de Mamanguape-PB, com o objetivo de despertar a relevância do acompanhamento familiar para o desenvolvimento de aprendizagens.

Apesar da proposta inicial, no decorrer da experiência, percebeu-se a relação crítica que se estabelece entre a escola pública e os familiares dos estudantes de baixa renda. Assim, partindo de uma pesquisa bibliográfica sobre o tema, à luz da leitura de Saviani, Bourdieu e Passeron, Pedro Silva, analisou-se o que está por trás da relação família - escola, isto é, a função social, a natureza simbólica das instituições, as transformações sociais que as influenciaram/influenciam, e, por fim, reuniram-se algumas sugestões de ações que são consideradas benéficas para o estreitamento desse vínculo.

Quanto a este aspecto, concluiu-se que é preciso que a escola focalize seu olhar crítico em si e que crie condições para que os pais/responsáveis participem do trabalho escolar. Para tanto, é necessário que a mesma adote uma postura ativa e procure estabelecer uma relação de confiança com a família e com a comunidade na qual está inserida.

No entanto, este trabalho não pode ser desenvolvido de forma unitária, exclusiva pelo professor, pela coordenação ou pela direção da escola, porém em conjunto, com o amparo e o suporte de secretarias de educação, e até com o apoio de outras instituições públicas (Conselho Tutelar e Ministério Público), considerando sempre o melhor para o desenvolvimento da criança e do adolescente.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, P. e PASSERON, J. C. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora, 1992.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 10 de outubro de 1988. Brasília, DF: Congresso Nacional, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 20 jul. 2018.

. IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Panorama das cidades/Brasil/Paraíba/Mamanguape/Trabalho e Rendimento (2016). Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pb/mamanguape/panorama>. Acesso em: 23 jul. 2018.

. IBGE- INSTITUTO BRANSILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) - 2016, Educação. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas- novoportal/sociais/trabalho/17270-pnad continua.html?edicao=18971&t=resultados>. Acesso em: 22 jul. 2018.

. IBGE- INSTITUTO BRANSILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Rendimento nominal mensal domiciliar per capita da população residente, segundo as Unidades da Federação - 2017. [online] Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_D omicilios_continua/Renda_domiciliar_per_capita/Renda_domiciliar_per_capita_2017.p df>. Acesso em: 31 jul. 2018.

. IPEA - INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Atlas dos Desenvolvimento Humano no Brasil. Disponível em: <http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/o_atlas/quem_faz/atlas_regiao_metropolitana/>. Acesso em: 18 ago. 2018

. INEP - INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISA EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Relatório do 2º Ciclo de Monitoramento das meras do Plano Nacional de Educação. Brasília, DF: Inep, 2018. Disponível em: < http://portal.inep.gov.br/informacao-da-publicacao/-/asset_publisher/6JYIsGMAMkW1/document/id/1476034>. Acesso em: 22 jul 2018.

. INEP - INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISA EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Relatório SAEB (ANEB e ANRESC) 2005-2015: panorama da década. Brasília, DF: Inep, 2018. pp. 111 - 118. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/web/guest/educacao-basica/saeb>. Acesso em: 18 ago. 2018.

. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 26 de jul. 2018.

. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO/SECRETARIA DE ARTICULAÇÃO COM OS SISTEMAS DE ENSINO. Planejando a próxima década: Conhecendo as 20 Metas do Plano Nacional de Educação. Brasília, DF: MEC/SASE, 2014. pp. 33 - 34. Disponível em: <http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_conhecendo_20_metas.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2018.

. MINISTÉRIO DO TRABALHO. Informações para o Sistema Público de Emprego e Renda - Dados por Município. Disponível em: <http://bi.mte.gov.br/bgcaged/caged_isper/index.php#>. Acesso em: 22 jul. 2018.

FRANÇA. OCDE - ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO (OCDE). Programme for international student assessment (PISA) - Results from PISA 2015. Brasília, DF, dez. 2016. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/acoes_internacionais/pisa/resultados/2015/pisa_2015_braz il_prt.pdc>. Acesso em: 24 jul. 2018.

GOODE, W.;HATT, P. K. Métodos em pesquisa social. São Paulo: Nacional, 1973.

MAGALHÃES, A. M.; STOER, S. R. Inclusão Social e “Escola Reclamada”. In: RODRIGUES, D. (Org.). Inclusão e educação: doze olhares sobre a educação inclusiva. São Paulo: Summus, 2006. pp. 64 - 84.

MARTINS, G. A.; LINTZ, A. Guia para elaboração de monografias e trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Atlas, 2002.

MONTEIRO, A. Conquistas e desafios do movimento LGBT. Revista Princípios, São Paulo, ed. 96, jun./jul., 2008, pp. 51-53. Disponível em: <http://revistaprincipios.com.br/artigos/96/cat/714/conquistas-e-desafios-do- movimento-lgbt-.html>. Acesso em: 26 ago. 2018.

OLIVEIRA, C. B. E.; MARINHO-ARAUJO, C. M. A relação família-escola: intersecções e desafios. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 27, n. 1, 2010. pp. 99-108. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v27n1/v27n1a12.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2018.

PRODANOV, C. C.; FREITAS, E. C. Metodologia do trabalho científico: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013. Disponível em: <http://www.feevale.br/Comum/midias/8807f05a-14d0-4d5b-b1ad- 1538f3aef538/E-book%20Metodologia%20do%20Trabalho%20Cientifico.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2018.

RICHARDSON et al. Pesquisa social: métodos e técnicas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999. SASSAKI, A. H.; DI PIETRA, G.; MENEZES FILHO, N.; KOMATSU, B. Por que o Brasil vai mal no Pisa? Uma Análise dos Determinantes do Desempenho no Exame. Policy Paper, Insper - Centro de Políticas Públicas, n. 31, jun. 2018. Disponível em: <https://www.insper.edu.br/wp-content/uploads/2018/07/Por-que-Brasil-vai-mal-PISA- Analise-Determinantes-Desempenho.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2018.

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. 31. ed. Campinas: Autores Associados, 1997.

SILVA, P. Análise sociológica da relação escola-família: um roteiro sobre o caso português. Revista do Departamento de Sociologia da FLUP, Vol. XX, 2010, pág. 443-464. Disponível em: <http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/8812.Pdf>. Acesso em: 22 jul 2018.

YIN, R. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.

Notas

1 Conforme definição do Ministério do Trabalho: “Colhem policulturas, derriçando café, retirando pés de feijão, leguminosas e tuberosas, batendo feixes de cereais e sementes de flores, bem como cortando a cana. Plantam culturas diversas, introduzindo sementes e mudas em solo, forrando e adubando-as com cobertura vegetal. Cuidam de propriedades rurais. Efetuam preparo de mudas e sementes por meio da construção de viveiros e canteiros, cujas atividades baseiam-se no transplante e enxertia de espécies vegetais. Realizam tratos culturais, além de preparar o solo para plantio.” (MINISTÈRIO DO TRABALHO, Classificação Brasileira de Ocupação). . MINISTÉRIO DO TRABALHO. Informações para o Sistema Público de Emprego e Renda - Dados por Município. [ online ] Disponível em: <http://bi.mte.gov.br/bgcaged/caged_isper/index.php>. Acesso em: 22 jul. 2018.
2 Comenius, conhecido como o pai da didática moderna, defendeu a universalidade da educação em sua obra “Didática Magna”, também conhecida por “Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos”, publicado em 1649. (Quem foi Comenius? Editora Comenius. [documento eletrônico] Disponível em: <http://editoracomenius.com.br/index.php?id_cms=6&controller=cms>. Acesso em: 29 jul. 2018).
3 O que equivale no Brasil à Educação Infantil, que engloba creches ou entidades equivalentes (para crianças de até três anos de idade) e pré-escolas, para crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade (art. 30, LDB). In: BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 27 ago. 2018.
4 SILVA, D. K. S.; SANTOS, C. C.; SILVA, M. J. A. I Roda de diálogos do projeto de extensão universitária “Família, escola e desenvolvimento de aprendizagem”. Ocorrido no dia 16 de agosto de 2018, na sala da ADUF - PB/Campus IV, Mamanguape - Litoral Norte, das 15:00 às 18:00, na presença do professor coordenador Prof. Dr. Geraldo Alexandre de Oliveira Gomes, da bolsista-extensionista Layze Cristine Maia Alves e da aluna-colaboradora Ana Paula Taigy do Amaral.

Autor notes

paulataigy@gmail.com

HMTL gerado a partir de XML JATS4R por