Editorial

Editorial

Léo Peruzzo
Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Brazil
Jelson Oliveira
Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Brazil
Antonio Valverde
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brazil

Editorial

Revista de Filosofia: Aurora, vol. 33, núm. 60, pp. 739-740, 2021

Pontificia Universidade Catolica Parana

O diálogo não é apenas um dos primeiros modos de fazer filosofia ou de se expressar filosoficamente, como nos mostraram os pensadores originários, Sócrates, Platão e, depois, a partir deles, Santo Agostinho; como também a melhor forma de a própria filosofia se realizar enquanto tarefa do pensamento. Em diálogo, os argumentos se esclarecem e purificam; contraditas, as boas ideias se fortalecem e os erros vêm à tona; confrontados, os autores se autoiluminam, compreendem-se e esclarecem-se mutuamente. O diálogo constitui, não por acaso, um método filosófico e uma metodologia de ensino e aprendizagem de filosofia. Ele está por trás do nosso gosto especial por simpósios, congressos, encontros e reuniões de estudo e debate. Embora certa visão romântica tenha dado prioridade para a imagem do filósofo como um solitário em sua caverna, iluminado apenas pela luz das suas próprias ideias, o certo é que essa é apenas uma parte da tarefa do pensador: sua solidão, quase sempre, é só o momento (imprescindível, é verdade) de seu parto, mas a criança, essa vem à luz do público e cresce na forma de seus escritos ou de suas ações. Artigos e livros são testemunhos dessa criação e se nutrem dos leitores que cativam e convocam para a própria atividade do pensamento.

A Revista de Filosofia Aurora quer, com o presente dossiê Filosofias em Diálogo, celebrar essa maneira própria da Filosofia fazer-se enquanto forma de conhecimento. Porque todo escrito é um tipo de diálogo, que conecta e confronta. Este número da Aurora coloca em diálogo autores e correntes de diferentes tempos e prismas e, com isso, resgata o que muitos deles mesmos fizeram, quando tomaram emprestados conceitos e argumentos uns dos outros, como forma de levar adiante a sua tarefa. O que seria de um Schopenhauer sem um Kant, de um Rousseau sem um Voltaire, de um Nietzsche sem um Platão, de um Agostinho sem um Plotino, assim por diante e vice-versa? A filosofia é, nesse sentido, a história de um diálogo interminado, interminável.

No presente volume, o conceito de autoridade dos antigos é confrontado com aquele dos modernos, o ceticismo de Leibniz é resgatado por Reid, a tradição filosófica é confrontada por Nietzsche, a sombra megárica é identificada no Parmênides de Platão enquanto o sofrimento social é analisado em Schopenhauer e em Horkheimer, a um tempo que a presença de Lamarck é identificada na obra de Freud. Traz-se à tona, além disso, diálogos inauditos (Canguilhem e Foucault) e outros que são provocados para iluminar o tempo atual (Nietzsche, Feyerabend e Foucault, juntos, mostram que esse não é um diálogo de mortos).

Não desfazendo-se, é claro, das sutilezas e provocações do diálogo, o Fluxo Contínuo ainda dispõe de textos sobre o pensamento de Hobbes, Locke, Hegel e Habermas. Obviamente, mais do que intimidades conceituais entre os autores, os artigos ali publicados são expressão de que a maturidade do diálogo também é um exercício desconstrutor e reformador.

Depois disso, este volume da Aurora apresenta duas entrevistas (a forma moderna do diálogo, por excelência): a primeira, com Yuk Hui, o filósofo chinês de ampla repercussão hoje nos estudos da filosofia da tecnologia; a segunda, realizada por Valeria Campos-Salvaterra com o professor Iván Trujillo, a fim de celebrar a memória da visita de Jacques Derrida ao Chile, em 1995. Por último, publica-se a tradução do texto de Eric Weil sobre Violência e Linguagem, realizado por Judikael Castelo Branco.

Tudo isso levou os editores a optarem pelo plural Filosofias, para dar vazão ao fato de que esse diálogo produz pluralidades, algumas convergentes, outras não. E que nisso mesmo reside a arte de pensar: construir pontes sobre os abismos. Em épocas como a nossa em que o diálogo é interrompido tão facilmente em nome dos ódios e seus gabinetes, das intolerâncias e desavenças de quem, por não ter nada a dizer, perde-se no palavrório espinhento das ideologias polarizantes, o presente número da Aurora é também um gesto político, que quer mostrar do que somos capazes e, principalmente, do que a Filosofia pode nos fornecer como arte da compreensão - esse, afinal, é o conteúdo da relação amorosa com o saber que a etimologia da palavra evoca.

Prof. Dr. Léo Peruzzo Júnior - PUCPR

Prof. Dr. Jelson Oliveira - PUCPR

Prof. Dr. Antonio Valverde - PUCSP

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