Dossiê: “O papel dos tribunais constitucionais na definição do devido processo penal”
Presunção de inocência e a doutrina da prova além da dúvida razoável na jurisdição constitucional
Presumption of innocence and the doctrine of proof beyond reasonable doubt in judicial review
Presunção de inocência e a doutrina da prova além da dúvida razoável na jurisdição constitucional
Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 8, núm. 1, pp. 189-234, 2022
Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal
Recepção: 31 Janeiro 2022
Revised document received: 01 Fevereiro Fevereiro Fevereiro Fevereiro Fevereiro Fevereiro Março Março 2022
Aprovação: 02 Abril 2022
Resumo: Em razão da centralidade do princípio da presunção de inocência nos sistemas constitucionais democráticos, diversos tribunais constitucionais têm buscado, nos mais diversos quadrantes e a partir do recurso a diferentes metodologias, desenvolver parâmetros que tornem eficaz a dimensão do princípio ligada à exigência de que a condenação criminal esteja fundada em certo nível de certeza probatória. Para que o princípio da presunção de inocência desempenhe sua função de garantia, alguns tribunais constitucionais desenvolveram o standard da prova “para além da dúvida razoável”. A jurisprudência constitucional estrangeira deu passos significativos na superação do uso meramente retórico da categoria da prova “para além da dúvida razoável”, atribuindo-lhe significado normativo mais denso e operativo. Alguns tribunais constitucionais – e.g. Tribunal Constitucional da Espanha e Corte Constitucional da Colômbia – têm procurado tutelar essa dimensão do princípio da presunção de inocência por meio da exigência, por um lado, de comprovação da culpa para além de qualquer dúvida razoável e, por outro, da obrigatoriedade de valoração integral do conjunto probatório e de motivação lógica e racional acerca desses elementos probatórios.
Palavras-chave: presunção de inocência, prova “para além da dúvida razoável”, valoração integral do conjunto probatório, dever de motivação, jurisdição constitucional.
Abstract: Because the presumption of innocence is a fundamental principle for democratic-constitutional systems, several constitutional courts have sought, in the most diverse ways and using various methodologies, to develop parameters to ensure that criminal convictions are grounded on a certain level of evidentiary certainty. To perform the protective function of the principle of presumption of innocence, some constitutional courts have developed the “beyond a reasonable doubt” standard of proof. Constitutional courts in different countries have taken significant steps in overcoming the merely rhetorical use of “beyond a reasonable doubt”, assigning a more dense and operative normative meaning to this standard. Some constitutional courts – e.g. Constitutional Court of Spain and Constitutional Court of Colombia – seek to protect the presumption of innocence by demanding not only the burden of proof beyond a reasonable doubt, but also requiring full assessment of the evidence and logical and rational motivation regarding the evidence.
Keywords: presumption of innocence, proof “beyond a reasonable doubt”, full assessment of the evidence, motivation, constitutional review.
Introdução
O princípio da presunção de inocência é tradicionalmente decomposto em três dimensões básicas: (i) o direito de ser tratado como inocente no curso da persecução criminal, (ii) a atribuição à acusação do ônus da prova da realização de todos os elementos do injusto penal pelo acusado e (iii) a exigência de um grau probatório mínimo para a condenação. A primeira dimensão da presunção de inocência – conhecida como regra de tratamento –, além de ter seu sentido precisamente delimitado pela jurisprudência, possui considerável eficácia e ampla operacionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
A noção de que o investigado ou acusado deve ser tratado como inocente durante as investigações constituiu o fundamento principal da declaração de inconstitucionalidade da prisão preventiva obrigatória para o preso em flagrante por tráfico de drogas.2 Antes mesmo dessa decisão que declarou a inconstitucionalidade da vedação à liberdade provisória para o crime de tráfico de drogas, o STF já havia declarado a inconstitucionalidade do dispositivo legal que vedava a liberdade provisória para os acusados de cometer determinados crimes previstos no Estatuto do Desarmamento.3 E, para além desses casos de declaração de inconstitucionalidade de leis que restringiam de maneira ilegítima o princípio da presunção de inocência, o Supremo Tribunal Federal tem se valido da regra de tratamento deduzida desse princípio para controlar a validade de todo tipo de restrição de direitos fundamentais impostas pelo Judiciário antes da condenação criminal definitiva.4
As duas outras dimensões da presunção de inocência – atribuição do ônus probatório da culpa à acusação e estabelecimento de grau probatório mínimo para a condenação –, embora possuam conteúdo e feição metodológica autônomas, costumam aparecer de maneira superposta na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.5 De fato, o modo como o direito processual penal distribui os ônus probatórios não determina o grau de certeza probatória exigido para a condenação e tampouco oferece critérios para o reconhecimento de que há dúvida relevante sobre qualquer dos aspectos da imputação criminal.
No Brasil, apesar da ampla aceitação doutrinária6 e jurisprudencial7 de que o princípio da presunção de inocência impede a imposição ao acusado de qualquer ônus probatório na ação penal condenatória, não se verificou na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal o mesmo estágio de desenvolvimento em relação ao estabelecimento de parâmetros claros acerca do significado da dimensão da presunção de inocência ligado à exigência de um grau probatório mínimo para a condenação. A jurisdição constitucional brasileira, nesse campo, tem emprestado adesão, em linhas gerais, standard da prova para além da dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt) como condição para a superação do estado de inocência do acusado. Apesar das numerosas referências a esse parâmetro pela jurisprudência do STF,8 permanece presente o risco de que sua invocação apresente um caráter retórico, expressando, não raramente, um mero recurso a um topos, sem caráter sistemático ou conteúdo definido. A utilização da estrutura argumentativa da prova para além de qualquer dúvida razoável pode esconder uma nova forma de reprodução de indesejável subjetivismo no campo da justiça penal: se afirma que a condenação só é válida se passar pelo filtro da prova para além da dúvida razoável, sem que isso represente um efetivo controle sobre a racionalidade da sentença condenatória.9
Nesse contexto, pretende-se discutir o papel dos Tribunais constitucionais na delimitação do sentido da dimensão da presunção de inocência relacionado ao estabelecimento de parâmetros de segurança probatória exigidos para a válida imposição de condenação criminal. Para tanto, serão utilizadas decisões de outros Tribunais constitucionais que pertencem, assim como o Brasil, à tradição processual penal continental10 – e.g. Portugal, Espanha e Colômbia – para delimitar com maior grau de precisão o significado central do requisito da existência de prova para além de qualquer dúvida razoável para a condenação penal.11 Ao lado da pretensão de identificar um sentido mais claro e operacional dessa dimensão do princípio da presunção de inocência, buscou-se na jurisprudência desses Tribunais constitucionais – selecionados porque se inserem em sistemas processuais penais semelhantes ao brasileiro e admitem o acesso individual do acusado à jurisdição constitucional – critérios para o controle da constitucionalidade de sentenças condenatórias concretas à luz da exigência de prova para além de qualquer dúvida razoável. Esse esforço tem por objetivo contribuir para a atribuição de um sentido mais operativo ao standard da prova para além de qualquer dúvida razoável pela jurisdição constitucional brasileira, tanto pela via do recurso extraordinário como do habeas corpus.
1. Nota teórica prévia: as dimensões do princípio da presunção de inocência
O princípio da presunção de inocência é uma das colunas sobre as quais se alicerçam o Estado de Direito e as democracias modernas.12 Segundo a Observação Geral 13 do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, essa garantia é sintetizada como o direito a que “o ônus da prova recaia sobre a acusação e o acusado tenha o benefício da dúvida”, não se podendo “presumir a culpa de alguém, a menos que a acusação tenha demonstrado sua culpa fora de qualquer dúvida razoável”.13 Em sentido similar, a Observação Geral 32 assinala que a presunção de inocência “impõe o ônus da prova à acusação, garante que não se presuma a culpabilidade a menos que se tenha demonstrado a acusação fora de toda dúvida razoável, assegura que o acusado tenha o benefício da dúvida, e exige que as pessoas acusadas de um delito sejam tratadas em conformidade com esse princípio”.14
A presunção de inocência, mais do que espinha dorsal do processo penal,15 é considerada pela doutrina como “um princípio fundamental de civilidade” que é “fruto de uma opção garantista a favor da tutela da proteção dos inocentes, inclusive com o preço da impunidade de algum culpado”.16 Esse direito fundamental se encontra consagrado em diversos tratados internacionais de direitos humanos. A Declaração Universal de Direitos Humanos estabelece em seu art. 11 que “todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”. Por sua parte, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos estabelece no parágrafo 2º do artigo 14 que “toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa”. Adicionalmente, no plano do sistema interamericano de proteção de direitos humanos, o item 2 do artigo 8º da Convenção Americana de Direitos Humanos estabelece que “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa”.
Alguns países – e.g. Espanha,17 França,18 Portugal,19 Itália20 e Brasil – incorporaram expressamente o princípio da presunção de inocência em suas constituições. Mesmo nos Estados Unidos, em que a Bill of Rights não contém exigência expressa nesse sentido, a jurisprudência da Suprema Corte dos EUA reconhece status constitucional ao princípio da presunção de inocência, exigindo, inclusive, o standard da prova para além da dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt) para a superação do estado de inocência do acusado.21
No Brasil, o princípio da presunção de inocência é expressamente previsto pela Constituição Federal de 1988 por meio do art. 5º, LVII, e assume pelo menos três funções importantíssimas no Processo Penal: trata-se (i) de regra de tratamento processual – as pessoas sob investigação ou acusadas por um delito devem ser tratadas como inocentes; (ii) de regra probatória – o ônus da prova acerca da responsabilidade recai sobre a acusação; e (iii) de regra de juízo – ninguém pode ser considerado culpado a menos que se tenha comprovado a acusação para além de qualquer dúvida razoável, em processo que respeite seus direitos e garantias fundamentais.22
Como regra de tratamento processual, o princípio da presunção de inocência impede que o acusado seja tratado como culpado antes do trânsito em julgado do processo. Isso significa dizer que o acusado não poderá sofrer sanção antes de uma sentença definitiva. Dessa regra decorre, por exemplo, o caráter excepcional das medidas cautelares processuais, especialmente da prisão preventiva, que não poderão ser utilizadas como forma de antecipação da punição, antes do trânsito em julgado da decisão condenatória.23 Foi com base nessa perspectiva, por exemplo, que o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade de regras que estabeleciam presunção absoluta de necessidade da prisão cautelar para determinados crimes.24 Essa compreensão de que a prisão preventiva obrigatória viola o princípio da presunção de inocência tem sido reafirmada em diversas ocasiões pela Corte Constitucional da Itália.25
A regra probatória contida no princípio da presunção de inocência, por sua vez, impõe uma série de requisitos procedimentais para a superação do estado de inocência do acusado, sem a observância dos quais tem-se como violada essa garantia constitucional: o acusado só pode ser declarado culpado ao final de um processo cercado de plenas garantias processuais em que se tenha demonstrado sua culpabilidade, cujo ônus da comprovação compete à acusação. Um dos principais aspectos do princípio da presunção de inocência como regra probatória reside na atribuição à acusação do ônus de comprovar a culpabilidade do acusado. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal tem enunciado que “não cabe ao réu provar sua inocência, mas sim ao órgão acusador demonstrar, para além de qualquer dúvida razoável, a prática da conduta criminosa e a culpabilidade a ele imputada”.26 Apesar de o acusado não ser obrigado a demonstrar a sua inocência, ele tem o direito de fazê-lo. O acusado poderá, por exemplo, produzir provas para introduzir uma dúvida razoável sobre a hipótese acusatória, ou mesmo demonstrar a ocorrência de um elemento negativo do tipo, como a legítima defesa.27
Apesar da profunda identificação do direito fundamental à presunção de inocência com essa lógica de distribuição do ônus probatório no processo penal, o fato é que o julgamento de casos penais dificilmente se dá com base exclusivamente na regra probatória. Como advertiu Jordi Nieva Fenoll, “o ônus da prova é uma instituição que só é utilizada em uma situação realmente extrema: a ausência de prova”.28 Daí porque se tem conferido, mais recentemente, maior atenção à dimensão da presunção de inocência ligada ao estabelecimento de um standard probatório exigido para a imposição válida da condenação precisamente por sua capacidade para estabelecer um parâmetro objetivo e controlável acerca grau de probabilidade ou de certeza que autorizam a superação do estado de inocência.29
Sob essa ótica, e de acordo com a regra de juízo, a presunção de inocência somente poderá ser superada por uma condenação que resultar da valoração integral do conjunto probatório dos autos, realizada à luz de critérios racionais, e que seja devidamente motivada a respeito da existência de todos os elementos do crime e da participação do acusado. O juiz deve se debruçar sobre a totalidade das provas relevantes coligidas aos autos, inclusive aquelas que sustentam a tese defensiva.30 Além disso, de acordo com sólida diretriz jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, essa regra de juízo determina, ainda, um grau probatório mínimo para a condenação, correspondente à prova para além da dúvida razoável.31
As três dimensões do princípio da presunção de inocência foram objeto de importantes desenvolvimentos pela jurisdição constitucional nacional e estrangeira. Apesar da elevada relevância da jurisprudência constitucional em relação às duas primeiras dimensões do princípio da presunção de inocência, o presente artigo investigará o papel dos tribunais constitucionais na concretização da dimensão da presunção de inocência consubstanciada na regra de juízo, ou seja, na proteção da garantia de que a condenação criminal esteja fundada em certo nível de certeza probatória. Para os fins do presente artigo, portanto, o aspecto mais importante da presunção de inocência é a regra de juízo a ela inerente, que opera no momento da valoração das provas produzidas na instrução criminal.32
Em razão da elevada importância axiológica do princípio da presunção de inocência nas democracias constitucionais contemporâneas, os tribunais constitucionais têm buscado, nos mais diversos quadrantes e de variadas formas, desenvolver parâmetros que tornem operativa essa dimensão do princípio consubstanciada na conhecida regra de juízo, especialmente na perspectiva de garantir que o direito à presunção de inocência exige, a partir de uma valoração integral do conjunto probatório e de motivação lógica e racional, a comprovação da culpa para além de qualquer dúvida razoável.
Para discutir o papel dos tribunais constitucionais no desenvolvimento jurisprudencial dessa dimensão do princípio da presunção de inocência relacionado ao estabelecimento de requisitos de certeza probatória exigidos para uma condenação legítima, deve-se analisar não apenas a qualidade dos critérios materiais desenvolvidos, mas também os parâmetros com base nos quais os tribunais constitucionais admitem examinar arguições individuais de violação à presunção de inocência.
Nessa perspectiva, merece destaque o fato de que os tribunais constitucionais que contam com mecanismos de acesso individual – e.g. recurso de amparo em países latino-americanos ou reclamações constitucionais em países europeus33 – têm buscado desenvolver parâmetros para distinguir situações em que essa dimensão da presunção de inocência pode ser diretamente ou autonomamente violada – i.e. casos que assumem dimensão constitucional – daquelas em que o debate não ultrapassa os limites de uma controvérsia de natureza legal. Afinal, como afirmou o Tribunal Constitucional de Portugal, não cabe àquela corte corrigir a apreciação do juízo recorrido em matéria de prova e condenação, substituindo-se à decisão das instâncias.34 Apesar disso, é preciso garantir, tal como advertiram o Tribunal Constitucional da Espanha35 e a Corte Constitucional da Colômbia,36 que essa barreira procedimental não signifique uma autorização para a violação aberta, pelas instâncias inferiores, do princípio da presunção de inocência por meio da elaboração de condenações criminais com base em apreciação arbitrária do conjunto probatório.
2. O princípio da presunção de inocência e a doutrina da exigência de prova para além da dúvida razoável
A dimensão da presunção de inocência relativa à regra de juízo exige, tradicionalmente, um grau probatório mínimo para a condenação, correspondente à prova para além da dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt).37 Nesse sentido, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu, em 1970, que o parâmetro da proof beyond a reasonable doubt constituía um componente implícito do devido processo legal, cuja aplicação seria então obrigatória em casos criminais em todos os tribunais do país.38 Em Jackson v. Virginia, a Suprema Corte norte-americana criticou condenações sustentadas apenas por “modicum of evidence” ao afirmar que “[q]ualquer evidência que seja relevante – que tenha alguma tendência a fazer a existência de um elemento de um crime um pouco mais provável do que seria sem a evidência [...] pode ser considerado um ‘mero modicum’. Mas não se poderia afirmar verdadeiramente que tal ‘mínimo’ de evidências poderia, por si só, apoiar racionalmente uma convicção além de uma dúvida razoável”.39
A exigência de nível elevado de segurança probatória no processo penal costuma ser associada pela jurisprudência a uma regra de segunda ordem, que determina como o juiz deve agir em caso de dúvida. 40 É aí que entra em cena a faceta do princípio da presunção de inocência como in dubio pro reo, que impõe a absolvição do acusado nos casos de dúvida sobre a sua culpa. Mas a definição do standard probatório exigido para a condenação não se confunde com a noção de in dubio pro reo. Até porque, antes mesmo de afirmar que a dúvida se resolve em favor do acusado, é preciso definir o standard de prova suficiente para afirmar a presença da culpa e, nessa perspectiva, a ausência de dúvida.41 A confusão entre essas esferas está na base dos problemas relacionados à crise da doutrina da exigência de prova para além da dúvida razoável e à falta de delimitação precisa dos seus contornos.42
Sem desprezar a importância do rico debate dogmático em torno da relação entre o princípio da presunção de inocência e a doutrina da prova além da dúvida razoável43 – para alguns a discussão sobre o standard probatório demandado para a condenação não decorre do princípio da presunção de inocência –, há bons argumentos teóricos e pragmáticos em favor da afirmação de que a exigência de prova para além da dúvida razoável constitui uma dimensão do direito fundamental à presunção de inocência.
Em primeiro lugar, sob o prisma teórico, convém lembrar que a teoria externa dos limites aos direitos fundamentais determina que se atribua maior amplitude ao âmbito de proteção desses direitos. Na literatura brasileira, Virgílio Afonso da Silva sintetizou essa proposição ao afirmar que “o âmbito de proteção desses direitos deve ser interpretado da forma mais ampla possível, o que significa dizer que qualquer ação, fato, estado ou posição jurídica que, isoladamente considerado, possa ser subsumido no ‘âmbito temático’ de um direito fundamental, deve ser considerado como por ele prima facie protegido”.44 Não há razão, portanto, para uma rejeição à exclusão da controvérsia acerca do standard probatório exigido para a condenação criminal do âmbito de proteção do direito fundamental à presunção de inocência.
Em segundo lugar, e sob a ótica pragmática, o inegável status constitucional do princípio da presunção de inocência contrasta com a questionável natureza constitucional autônoma da exigência de prova além da dúvida razoável. A isso se deve associar o fato de que o princípio da presunção de inocência constitui a “chave de leitura” dominante na jurisprudência comparada para a verificação da legitimidade constitucional do nível de segurança probatória demandada para sustentar uma condenação criminal. O elevado grau de integração das cortes e tribunais constitucionais e o vertiginoso crescimento da importância da abertura nacional às experiências estrangeiras45 fazem com que a utilização de uma linguagem comum aperfeiçoe a reflexão científica e dogmática sobre os limites constitucionais do processo penal. A semelhança do roteiro argumentativo utilizado por diferentes cortes e tribunais constitucionais melhora a capacidade de diálogo entre eles e contribui para o aprendizado recíproco em torno dos problemas comuns.
A partir dessa perspectiva, a aparente perda de precisão dogmática decorrente da inserção da doutrina da prova além da dúvida razoável no âmbito de proteção do direito fundamental à presunção de inocência é largamente compensada pelo ganho de operatividade e de eficácia de um modelo que permita à jurisdição constitucional contribuir para a racionalização do processo penal. A despeito da eventual vagueza das formulações jurisprudenciais até aqui acumuladas sobre o tema, a utilização do parâmetro da prova além da dúvida razoável pelos tribunais constitucionais tem sido mobilizada pelo objetivo de evitar, no campo do processo penal, o enraizamento da fórmula da convicção íntima do juiz. A mais recente orientação jurisprudencial da Corte de Cassação italiana confirma a ideia de que o desenvolvimento da exigência da absolvição em caso de dúvida razoável surge como reação à tradicional ideia de livre convencimento do juiz em matéria criminal:
A doutrina tem reconhecido que o critério ‘oltre ogni ragionevole dubbio’ (além da dúvida razoável) representa a superação do princípio do ‘livre convencimento do juiz’ e, assim, a necessidade que a condenação seja baseada na avaliação da prova produzida em contraditório e que, para respeitar esse cânone interpretativo, deve ter aptidão suficiente para neutralizar com segurança a relevância antagonista das teses alternativas.46
Como se vê, a regra de valoração probatória contida na presunção de inocência constitui limitação ao princípio do livre convencimento judicial. Este não pode ser confundido com licença para o julgador valorar os meios de prova de modo arbitrário, sem qualquer tipo de critério, ou olvidando-se das regras da razão que norteiam a formação do conhecimento humano.47
O processo penal é parte integrante do aparato coercitivo do Estado, mas também expressa a função essencial de proteção da liberdade individual do acusado, ao garantir condições mínimas para a realização de uma avaliação imparcial da responsabilidade criminal.48 Um primeiro princípio de tomada de decisão no processo penal, portanto, pode ser deduzido do reconhecimento de que ele envolve interesses de imensa relevância axiológica – desde a honra e a reputação até a liberdade pessoal. Então, resulta profundamente injusto condenar alguém por cometer um crime quando houver uma dúvida razoável sobre sua culpa.49 Nesse sentido, a regra da tomada de decisão para além de qualquer dúvida razoável sinaliza a adesão a um princípio jurídico fundamental para o Estado Democrático de Direito.
Mas essa fórmula não pode ser empregada de forma meramente retórica, como um simples jargão vazio. Pelo contrário, a regra que presume a inocência até prova para além de qualquer dúvida razoável só pode desempenhar adequadamente a sua função de garantia se submetida a parâmetros concretos de aplicação.50 Daí a importância do desenvolvimento jurisprudencial do standard da prova para além da dúvida razoável. É mais promissor apostar no aperfeiçoamento dessa doutrina a partir de um aprofundamento da constitucionalização do processo penal pelos tribunais constitucionais do que na criação de uma nova teoria para resolver o problema da insegurança que tradicionalmente caracterizou esse parâmetro.51
Uma das principais consequências que os tribunais constitucionais têm extraído do standard da prova “para além da dúvida razoável” está precisamente em diferenciá-lo do modelo de “simples preponderância da prova no sentido da culpa do arguido”.52 O standard de prova genericamente adotado no processo civil é o da “preponderância da prova” (preponderant evidence). Diante de dúvida sobre questão de fato relevante para o deslinde da causa, esse standard permite ao juiz escolher, entre as versões contrapostas, aquela que lhe parece a mais provável, com base nos meios de provas disponíveis.53 Algumas matérias específicas do processo civil, como disputas relacionadas a direitos de paternidade, exigem um standard de prova mais rigoroso, consistente na “prova clara e convincente” (clear and convincent evidence), correspondente a uma probabilidade elevada.54 Apesar de demandar elementos de prova mais consistentes para a formação do convencimento judicial, esse segundo standard também confere ao magistrado certo espaço de liberdade na determinação da versão dos fatos, pois admite a condenação, apesar da existência de outras hipóteses razoáveis, embora menos prováveis, que igualmente pudessem explicar os fatos.
Contudo, é amplamente consensual a ideia de que, no processo penal, o standard que deve orientar uma condenação criminal é o da “prova para além da dúvida razoável” (proof beyond a reasonable doubt), importado do direito anglo-saxão, desenvolvido pela jurisprudência norte-americana55 e largamente incorporado ao sistemas jurídicas de tradição continental.56 A interpretação mais aceita desse standard probatório demanda prova incriminatória suficiente para descartar, por completo, qualquer versão alternativa e razoável dos fatos, que possa inocentar o acusado. Ou seja, exige uma quase certeza sobre a culpabilidade do réu.
Há formulações dogmáticas que exemplificam esse grau de exigência em termos probabilísticos, sugerindo que as provas incriminatórias devem apontar para uma probabilidade de pelo menos 99% de que os fatos tenham ocorrido de acordo com a versão acusatória, em contraste aos 51% exigidos para o atingimento da “preponderância da prova” (preponderant evidence)57 e aos 75% para “prova clara e convincente” (clear and convincent evidence).58 Contudo, como o Direito não se sujeita à lógica puramente matemática, os critérios para aferição do atendimento ao padrão da “prova para além da dúvida razoável” devem estar submetidos a parâmetros jurídicos seguros,59 cujos contornos o direito comparado tem progressivamente consolidado.
Nesse sentido, o direito espanhol oferece importantes balizas para a determinação do standard de prova necessário para uma condenação criminal.60 A doutrina espanhola afirma que devem concorrer os seguintes fatores para se considerar provada a culpabilidade do acusado: (i) os elementos probatórios dos autos devem explicar a hipótese acusatória, bem como (ii) refutar todas as outras hipóteses plausíveis que conduziriam à inocência do acusado. Caso contrário, impõe-se a absolvição.61 Essa formulação teórica foi incorporada à jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Tribunal Supremo da Espanha.
De acordo com o Tribunal Supremo da Espanha, o princípio da presunção de inocência impede o juiz de optar pela hipótese acusatória, sempre que os elementos probatórios constantes nos autos sejam compatíveis com versão alternativa para os fatos favorável ao acusado, ainda que esta seja menos provável.62 Com efeito, na STS 4500/2002, aquele Tribunal determinou a cassação de sentença fundada em provas que permitiam uma “conclusão distinta igualmente racional e plausível” para os fatos.63 Na mesma linha, na STS 7905/2000, o mesmo Tribunal reconheceu violação ao princípio do in dubio pro reo “dado não ser possível excluir a possibilidade de que os fatos tenham ocorrido de forma mais favorável ao acusado”.64 O Tribunal também tem aplicado essa regra para afastar a configuração de circunstâncias agravantes e causas de aumento de pena.65
Como se vê, o Tribunal Supremo da Espanha tem assentado que apenas a plena convicção sobre culpabilidade do acusado permite a sua condenação.66 Esse parâmetro geral ganha maior densidade a partir da compreensão manifestada por aquela corte em múltiplas oportunidades, no sentido de que o princípio da presunção de inocência, na sua vertente de regra de juízo, é violado nos casos em que a condenação ocorre mesmo diante da existência de versão defensiva alternativa favorável ao acusado, que se compatibiliza com o seu estado de inocência, e que também pode explicar os fatos, à luz do conjunto probatório obtido.67
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal adota abertamente o standard da prova para além da dúvida razoável68 e confere ao art. 5º, LVII, da Constituição Federal interpretação similar àquela atribuída pela jurisprudência espanhola sobre o princípio da presunção de inocência. Afirma nossa Corte Suprema que a presunção de inocência “impõe a necessidade de um quadro probatório robusto, com provas de todos os elementos da acusação”, além de que “as provas devem ser aptas a gerar a certeza da responsabilidade criminal do acusado, com o afastamento de todas as hipóteses contrárias, desde que razoáveis, a essa convicção”.69 Nesse sentido, não é dado ao juiz, ante o estado de dúvida, escolher a versão dos fatos atribuída pela acusação. No Brasil, de acordo com o Supremo Tribunal Federal, “tudo o que oferece duas vertentes lógicas não permite ao magistrado concluir em prejuízo do acusado”.70
Ainda mais claros são os critérios propostos pela doutrina italiana para a identificação da prova para além da dúvida razoável cuja satisfação depende dos seguintes requisitos:
i) deve ser sustentada em todos os elementos que a constituem; ii) a contraprova não pode estilhaçar seu núcleo essencial; iii) a hipótese contrária deve revelar-se indemonstrável ou não plausível; iv) a hipótese acusatória deve assumir uma coerência lógica, isto é, não deve ser auto-contraditória; v) a hipótese deve ser a única congruente no que diz respeito aos fatos; ou seja, a hipótese – sem ter a pretensão de explicar todos os aspectos do caso – deve ser a única que está em condições de refletir os fatos fundamentais e de explicar, segundo esquemas de racionalidade e bom senso (isto é, segundo os esquemas cognoscitivos próprios de uma determinada colectivadade numa determinada época).71
Ocorre que o uso distorcido da fórmula de inocência até prova para além de qualquer dúvida razoável pode propiciar equivocadas comparações entre duas versões dos fatos, com o objetivo de identificar a que seria mais razoável. Essa ótica transforma completamente o cânone em questão. O resultado prático dessa distorção é que a menor probabilidade da versão defensiva acaba corroborando a versão acusatória.72 E tal conclusão é abertamente contrária à lógica subjacente à fórmula de inocência até prova para além de qualquer dúvida razoável. Afinal, como tem advertido a Corte de Cassação italiana, a mera dúvida sobre a tese defensiva já é suficiente para excluir a condenação.73
Apesar de incumbir à acusação o ônus da prova no processo penal, o acusado tem o direito de produzir prova sobre a sua inocência. Mas não é possível exigir da defesa, para a demonstração da inocência do acusado, o mesmo grau de prova demandado da acusação para comprovar a culpabilidade do acusado. Para a absolvição, basta à defesa introduzir uma dúvida razoável ou plausível acerca da versão acusatória, com o que deverá prevalecer o princípio da presunção de inocência.74 Nesse sentido, registrou Jordi Ferrer Beltrán:
Não existe razão para que os standards de prova aplicáveis à hipótese de culpabilidade e à hipótese de inocência sejam iguais. Com efeito, a razão que temos para aplicar um standard de prova muito exigente no processo penal parece ser que o bem em jogo, i.e., a liberdade do acusado, é muito valioso e, portanto, é preciso ter um alto grau de probabilidade de acertar para sacrificá-lo. Mas essa razão não opera, obviamente, no caso da ou das hipóteses da defesa. Se aumentamos as exigências probatórias para diminuir as probabilidades de que um sujeito inocente seja condenado e, portanto, privado de sua liberdade, não tem sentido aplicar as mesmas exigências à hipótese da defesa. Por essa razão, no processo penal teremos standards de prova assimétricos para a acusação e para a defesa.75
As tentativas mais bem-sucedidas no direito comparado de racionalizar o padrão de teste subordinam a demonstração da tese acusatória à satisfação, no mínimo, das seguintes condições: a hipótese incriminatória deve ser capaz de explicar os dados disponíveis, integrando-os de forma coerente; e todas as outras hipóteses plausíveis, que permitam explicar os mesmos dados e que são compatíveis com a inocência do acusado, devem ter sido refutadas.76 Não há dúvida de que esse standard expressa ao menos um inequívoco significado principal: a exigência de “um grau particularmente alto de confirmação probatória da culpabilidade do imputado, que se aproxima da certeza, dado que só admite a presença de dúvidas ‘irrazoáveis’, com a evidente intenção de reduzir ao mínimo o risco de condenação de um inocente”.77
Para além dessas diretrizes gerais a respeito do alcance do princípio da presunção de inocência como regra de juízo – em grande medida a partir do desenvolvimento jurisprudencial do standard da prova para além da dúvida razoável –, algumas concretizações dessa doutrina merecem especial atenção pela relevância que apresentam para a garantia da eficácia desse direito fundamental. Em particular, será examinado o modo como o princípio da presunção de inocência, nessa dimensão da exigência de certeza probatória para a condenação criminal, tem sido concretamente tutelado por tribunais constitucionais na supervisão de casos concretos. Para tanto, serão particularmente relevantes os precedentes do Tribunal Constitucional da Espanha e da Corte Constitucional da Colômbia.
3. A verificação de violações individuais ao princípio da presunção de inocência pelos tribunais constitucionais: mecanismos de controle da suficiência do standard probatório nas sentenças condenatórias
Na dogmática constitucional, diz-se que os direitos fundamentais possuem dupla dimensão – subjetiva e objetiva. A dimensão subjetiva dos direitos fundamentais corresponde à sua faceta de direitos subjetivos. Já a dimensão objetiva decorre do reconhecimento de que, além de direitos subjetivos, os direitos fundamentais também representam bens jurídicos extremamente importantes para as sociedades democráticas, que devem ser protegidos e promovidos pelo Estado e pela comunidade.78 Entre as principais consequências dessa dimensão objetiva, figura a afirmação de um direito a organização e procedimento adequados à tutela efetiva dos bens jurídicos subjacentes aos direitos fundamentais.79
A existência de um direito à organização e procedimento parte da premissa realista de que os direitos não se efetivam por milagre ou prestidigitação, dependendo, portanto, de providências estatais como a instituição de órgãos públicos especializados ou, ainda, da criação de mecanismos procedimentais apropriados para que possam gerar os seus efeitos no mundo concreto.80 Dessa maneira, os direitos fundamentais ao acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva impõem que os instrumentos processuais sejam aptos a responder, de modo adequado, à violação dos direitos materiais que visam a salvaguardar.81
Nesse diapasão, o direito ao procedimento, subjacente à dimensão objetiva do acesso à justiça e da efetividade da tutela jurisdicional, recomenda o controle, por parte dos tribunais constitucionais, da observância, pelas instâncias inferiores, do conteúdo básico do princípio da presunção de inocência como regra de juízo. Afinal, pouco adiantaria proclamar a necessidade de que a condenação esteja fundada em certo nível de certeza probatória – i.e. “limiar mínimo de certeza quanto ao fato probando para que este deva ser dado como provado”82 – se as sentenças condenatórias pudessem considerar o réu culpado com base em exame incompleto do material probatório ou em fundamentação completamente desprovida de razoabilidade.
Daí ter ganhado relevância no campo do direito processual penal a ideia de que o direito fundamental à presunção de inocência se torna operativo, em grande medida, em razão da possibilidade concedida à defesa de, por meio dos recursos, fragilizar “a tese acusatória assumida pelo julgador a partir do lastro probatório produzido, verificando se realmente foi superada a dúvida razoável”.83 O sistema recursal deve ser apto a propiciar um “controle objetivo sobre a dúvida”,84 de modo a permitir uma verificação segura sobre o atendimento, pela sentença condenatória, do standard probatório exigido pelo critério da culpa para além da dúvida razoável.
Conquanto se saiba que, via de regra, o meio adequado para o controle da suficiência da motivação da sentença condenatória é o recurso ordinário – e.g. apelação no sistema recursal brasileiro –, não se nega que os Tribunais constitucionais podem realizar um controle excepcional, embora de grande relevância estrutural, sobre o atendimento aos requisitos mínimos de fundamentação para que uma condenação seja compatível com a dimensão do direito à presunção de inocência ligada à demonstração lógica da inexistência de dúvida razoável sobre a tese acusatória.
Ademais, embora não sejam desprezíveis os riscos de subjetivismo na aplicação da fórmula da prova para além da dúvida razoável, esse standard desempenha, a partir da jurisprudência dos tribunais constitucionais, um importante papel de racionalização da fundamentação exigida para a condenação precisamente na medida em que impõe, no mínimo, um dever de eliminação justificada das hipóteses absolutórias. Esse patamar mínimo de motivação determinado pela regra de juízo contida no princípio da presunção de inocência foi bem resumido na doutrina espanhola:
No entanto, a presunção de inocência não só reproduz o dever genérico de motivar senão estabelece uma forma específica (e mais exigente) de cumpri-lo. Vejamos; combinando o ‘ônus probandi’ da acusação com o ‘in dubio pro reo’, resulta que cabe à acusação provar que os fatos aconteceram desta ou daquela forma, bastando à defesa argumentar que não excluiu razoavelmente que os eventos poderiam ter acontecido de outra forma. Assim, infere-se, então, que a motivação de uma condenação deve enfrentar um duplo desafio: por um lado, justificar que a hipótese fática considerada é congruente com os elementos probatórios disponíveis e ademais coerente; por outro lado, desmontar a hipótese adversa pelos dados que ela deixa sem explicação e/ou porque a história resultante (reconstrução) é inverossímil.85
Ao menos nos países em que há acesso individual ao Tribunal Constitucional, percebe-se uma tendência de desenvolvimento de parâmetros que permitam o controle, ainda que em caráter excepcional, da legitimidade da condenação criminal à luz do princípio da presunção de inocência.
É verdade que, em toda parte do mundo, o percentual de condenações criminais anuladas ou revistas por tribunais constitucionais é baixo. E nem poderia ser diferente, já que não cabe ao tribunal constitucional aferir a justiça ou injustiça de cada decisão penal condenatória. Apesar disso, o acesso individual aos tribunais constitucionais pode dar uma especial contribuição à proteção efetiva da presunção de inocência. E a experiência comparada oferece importantes subsídios para confirmar essa ideia. A jurisprudência do Tribunal Constitucional da Espanha é particularmente importante a esse respeito. Apesar de reafirmar sistematicamente a máxima de que os recursos de amparo que alegam desrespeito ao direito à presunção de inocência devem ser examinados sob a ótica de que não cabe ao tribunal constitucional valorar a atividade probatória praticada no processo penal,86 o tribunal também tem enfatizado que o escopo do controle da jurisdição constitucional nesse campo pode ser assim resumido:
A função do tribunal de proteção do direito à presunção de inocência passa, em primeiro lugar, pela supervisão de que a atividade probatória foi realizada com as garantias necessárias à sua adequada valoração e à preservação do direito de defesa. Em segundo lugar, traz consigo a comprovação de que o órgão jurisdicional expõe as razões que o levaram a estabelecer o relato de fatos comprovados com base na atividade probatória realizada. Em terceiro e último lugar, do ponto de vista do resultado da avaliação, o trabalho do Tribunal limita-se a fiscalizar externamente a razoabilidade do discurso que relaciona a atividade probatória com o relato fático resultante. A função do tribunal não é julgar o resultado alcançado, mas o controle externo do raciocínio lógico seguido para alcançá-lo. O Tribunal Constitucional, em sua decisão, deve limitar-se a verificar que a prova existente foi obtida e praticada de acordo com a Constituição, que é exigível e que, consequentemente, os fatos declarados provados podem dela ser inferidos de forma razoável e não arbitrária.87
Com base nessa lógica voltada a garantir um patamar mínimo de proteção ao direito fundamental à presunção de inocência como regra de juízo, uma das principais consequências que o Tribunal Constitucional espanhol extrai da necessidade de controlar a razoabilidade e racionalidade com que a sentença condenatória valora as provas reside na exigência dirigida ao juiz criminal de valoração integral do conjunto probatório.88
A jurisprudência constitucional dos mais diversos quadrantes tem oferecido importante contribuição no tratamento da questão concernente ao controle da motivação das decisões que se omitem na apreciação de parte relevante do conjunto probatório. Nesse sentido, o Tribunal Constitucional da Espanha tem reconhecido a violação ao direito à tutela jurisdicional efetiva, na perspectiva que tem o jurisdicionado de obter uma resposta judicial motivada sobre a pretensão pleiteada, nos casos em que as sentenças não promovem a valoração expressa ou tácita do conjunto probatório como um todo. Tal omissão impede que as partes conheçam as razões que conduziram o órgão judicial a descartar a valoração de parte das provas produzidas.89 A jurisprudência do Tribunal Constitucional da Espanha afirma ainda que o direito à tutela jurisdicional efetiva encontra máxima efetividade no campo do processo penal, no qual a preterição da prova introduzida pela defesa importa igualmente em vulneração ao princípio da presunção de inocência.90
De fato, a jurisprudência constitucional espanhola tem destacado que o controle que compete ao tribunal constitucional em relação às alegações de violação à presunção de inocência se estende a verificar se a versão ou a prova fornecida para a defesa não foi submetida a avaliação, exigindo a ponderação dos diferentes elementos probatórios.91 Há precedente por meio do qual o tribunal considerou violado o direito à presunção de inocência em caso no qual a sentença deixou de valorar determinados depoimentos testemunhais favoráveis ao acusado. Em outra decisão, o tribunal constitucional considerou violado o direito à presunção de inocência em razão do fato de que o tribunal inferior deixara de valorar e considerar parte essencial da atividade probatória.92
Em igual direção, a jurisprudência da corte constitucional da Colômbia caracteriza a omissão da decisão em realizar a valoração integral do acerco probatório dos autos como um defeito fático sujeito a controle judicial estrito das instâncias revisoras.93 O defeito fático se configura nas hipóteses em que o julgador ignora uma realidade probatória determinante para o resultado do processo. Nesses casos, a corte constitucional colombiana tem reiterado que o controle dos defeitos fáticos se fundamenta na premissa de que, apesar de a análise do acervo probatório ser orientado por certa margem de discricionariedade, o juiz deve decidir com base em critérios objetivos e racionais.94
Ainda segundo a jurisprudência da corte constitucional colombiana, a independência judicial “jamais poderá ser exercida de maneira arbitrária; sua atividade valorativa implica, necessariamente, a adoção de critérios objetivos, não simplesmente pressupostos pelo juiz, racionais, é dizer, que ponderem a magnitude e o impacto de cada uma das provas alegadas, e que materializem a função da administração da justiça que se exige dos funcionários judiciais sobre a base de provas colhidas”.95 Sob essa perspectiva, o princípio do livre convencimento motivado não afasta a possibilidade do reconhecimento de um defeito fático por ausência de valoração do conjunto probatório.
A jurisprudência dos tribunais constitucionais da Espanha e da Colômbia mostra que é necessário construir parâmetros que permitam o controle por parte da jurisdição constitucional da violação pelas instâncias ordinárias do dever de motivação das decisões judiciais decorrente da omissão relevante na análise integral do conjunto probatório. Embora seja comum aos tribunais constitucionais a preocupação em evitar que a jurisdição constitucional seja acionada para revisar o exame das provas empreendido pelas instâncias ordinárias, a jurisprudência estrangeira tem mostrado a relevância do controle realizado pelos tribunais constitucionais da observância do dever de análise integral da prova, especialmente no âmbito do processo penal. Nessa perspectiva, incumbe aos tribunais constitucionais verificar se as decisões condenatórias proferidas pelas instâncias ordinárias estão racionalmente fundamentadas. Como adverte a doutrina espanhola, embora o Tribunal constitucional não possa substituir a decisão da Corte ordinária, pode “censurar a razoabilidade do discurso justificatório” por ela empregada na condenação.96
É relevante notar que o descumprimento desse dever de exame integral das provas produzidas em contraditório no processo penal passou a ser reconhecido por tribunais constitucionais como uma modalidade de violação direta das cláusulas constitucionais do direito fundamental à presunção de inocência. Além de enfatizar esse dever de valoração integral do conjunto probatório, o Tribunal Constitucional da Espanha chega até mesmo a controlar, em situações excepcionais, a legitimidade da motivação das decisões sobre os requerimentos probatórios.97 Isso para garantir que esse conjunto probatório a que o juiz deve se referir de maneira completa não seja arbitrariamente formado em prejuízo do acusado. Nesse sentido, o tribunal espanhol tem afirmado a sua competência para, por meio de recurso de amparo – equivalente aos nossos recursos de natureza extraordinária – controlar a legitimidade constitucional de decisões que indeferem a produção de provas relevantes sem motivação alguma, mediante a interpretação irrazoável ou aplicação arbitrária da lei,98 anulando-as sempre que da falta imotivada da produção da prova relevante requerida decorrer prejuízo ao direito de defesa.99
Ainda nesse contexto, a jurisprudência do Tribunal Constitucional da Espanha firmou-se no sentido de que o procedimento constitucional de amparo – que, naquele país, é recurso análogo aos nossos recursos de natureza extraordinária – é o veículo adequado para que o tribunal constitucional promova a revisão das decisões tomadas pelos órgãos jurisdicionais que tenham promovido uma análise incompleta do acervo probatório. De acordo com o tribunal constitucional daquele país, a possibilidade de controle judicial da motivação das decisões que valoram provas se insere no âmbito do direito à tutela jurisdicional efetiva.100 Exatamente no mesmo sentido é a orientação jurisprudencial da Corte Constitucional da Colômbia firmada a propósito dos defeitos fáticos.101
No Brasil, o nosso Supremo Tribunal Federal, antes da promulgação da Constituição de 1988, já conheceu de recursos extraordinários que versavam sobre a omissão na valoração da prova.102 Essa tradição foi abandonada pela jurisprudência do STF nas últimas três décadas. Embora seja correto afirmar que, em regra, o controle da observância do dever de análise integral do conjunto probatório deva ser exercido pelos Tribunais ordinários e, excepcionalmente, pelas cortes de cassação, não há dúvida de que as cortes constitucionais possuem relevante função subsidiária na fiscalização da observância desse importante requisito de validade das sentenças penais condenatórias.
A dimensão objetiva do direito fundamental à presunção de inocência envolve a existência de um direito à organização e procedimento adequados para a sua efetivação. E isso se realiza, em grande medida, por meio da adoção de mecanismos procedimentais que permitam o controle por parte do tribunal constitucional da observância, por parte dos juízes e Tribunais, do dever de análise integral do conjunto probatório e de motivação adequada – racional e logicamente sustentável – quanto à formação da culpa para além de qualquer dúvida razoável. Para garantir que essa valoração global das provas seja efetivamente implementada, o Tribunal Constitucional da Espanha afirma possuir competência para “verificar se há violação do direito à presunção de inocência porque não há provas válidas suficientes, porque a argumentação que liga a prova ao facto provado é desarrazoada porque é ilógica ou insuficiente, ou porque o resultado da sua apreciação não foi motivado”.103
No que diz respeito ao controle da racionalidade e logicidade da motivação da sentença na valoração do conjunto probatório, o Tribunal Constitucional espanhol tem afirmado, com base no princípio da presunção da inocência, que “toda condenação deve se basear em provas válidas, suficientes e decisivas” e também que essa idoneidade incriminadora do conjunto probatório “deve ser não apenas apreciada pelo juiz, mas também refletida na sentença, de modo que a falta ou insuficiência de motivação quanto à avaliação da prova e à fixação dos fatos provados acarretará ofensa ao direito fundamental à presunção de inocência”.104 Isso porque, como bem advertiu a Corte Constitucional da Colômbia, a amplitude da liberdade de apreciação da prova pelo juiz jamais pode se degenerar em arbitrariedade: “sua atividade de avaliação probatória implica necessariamente a adoção de critérios objetivos, não simplesmente supostos pelo juiz, racionais, ou seja, que ponderem a magnitude e o impacto de cada uma das provas prestadas”.105
A jurisprudência do STF, no Brasil, trilhou outro caminho ao afirmar indiscriminadamente a ausência de repercussão geral nos recursos extraordinários criminais que versam sobre a violação do dever de motivação.106 Com base nesse entendimento, o tribunal abriu mão da possibilidade de construção, pela via do recurso extraordinário, de parâmetros adequados de controle por parte da jurisdição constitucional do dever de análise integral do conjunto probatório no campo processual penal e de motivação racional e lógica quanto à avaliação da prova e à fixação dos fatos provados.
É verdade que o STF admite amplamente a impetração de habeas corpus contra decisões judiciais que interfiram na liberdade de ir e vir. Isso poderia viabilizar a construção de uma jurisprudência mais densa acerca dessa dimensão da presunção de inocência ligada à exigência da demonstração motivada da presença de certo nível de certeza probatória para que a condenação criminal seja legítima. O Supremo Tribunal Federal, no Brasil, chegou a conceder ordens de habeas corpus para invalidar sentenças condenatórias por violação direta ao princípio da presunção de inocência.107 Mas esses precedentes não representam o sentido geral da jurisprudência do tribunal, segundo a qual não cabe habeas corpus para discutir suposta violação ao princípio da presunção de inocência em função do não atendimento ao standard da prova para além da dúvida razoável.108 Os casos em que o STF aplica esse parâmetro da prova para além da dúvida razoável estão quase exclusivamente circunscritos às ações penais originárias em que o tribunal funciona como típico juízo criminal.109
4. Conclusões
A jurisdição constitucional tem contribuído, nos quais diversos quadrantes, para a atribuição de um conteúdo mais preciso ao princípio da presunção de inocência, especialmente por meio do desenvolvimento da doutrina da prova “para além da dúvida razoável”. As tentativas mais bem-sucedidas no direito comparado de racionalizar esse standard probatório subordinam a demonstração da tese acusatória à satisfação, no mínimo, das seguintes condições: a hipótese incriminatória deve ser capaz de explicar os dados disponíveis, integrando-os de forma coerente, e todas as outras hipóteses plausíveis, que permitem explicar os mesmos dados e que são compatíveis com a inocência do acusado, devem ter sido definitivamente refutadas.
A dimensão objetiva do direito fundamental à presunção de inocência envolve a existência de um direito à organização e procedimento adequados para a sua efetivação. E isso se realiza, em grande medida, por meio da adoção de mecanismos procedimentais que permitam o controle pelo tribunal constitucional da observância, por parte dos juízes e Tribunais, do dever de análise integral do conjunto probatório e de motivação adequada – racional e logicamente sustentável – quanto à formação da culpa para além de qualquer dúvida razoável. Nesse contexto, cabe aos tribunais constitucionais, em ordem a garantir um patamar mínimo de proteção ao direito fundamental à presunção de inocência, controlar a razoabilidade e racionalidade com que a sentença condenatória valora as provas, a partir da exigência dirigida ao juiz criminal de valoração integral do conjunto probatório.
O uso de precedentes estrangeiros em decisões judiciais brasileiras tem crescido exponencialmente nos últimos anos. Esse fenômeno é particularmente importante nas decisões do Supremo Tribunal Federal. A tendência crescente de invocação do direito comparado na interpretação constitucional é um sinal positivo de constante aperfeiçoamento da jurisdição constitucional brasileira. Afinal, o diálogo entre os Ministros do STF e a jurisprudência das cortes constitucionais de outros países decorre de uma salutar disposição para a aprendizagem recíproca, cujos resultados podem ser bastante positivos. A observação de decisões de outros tribunais constitucionais nos permite identificar “pontos cegos” no debate nacional, além de ampliar nossos horizontes argumentativos, mostrando novas soluções para superação de impasses comuns. A jurisprudência constitucional comparada produzida para densificar o conteúdo do princípio da presunção de inocência – notadamente na dimensão relacionada à exigência de certificação de um grau mínimo de certeza probatória desenvolvida a partir do desenvolvimento da doutrina da prova “para além da dúvida razoável” – pode contribuir para o aperfeiçoamento da jurisdição constitucional brasileira nesse campo tão decisivo para a conformação democrática do processo penal.
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Notas
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